Notas sobre “Um crime de solidão” de Andrew Solomon.
O mesmo princípio basilar que semeia a vida e o brilhantismo parece
propiciar o desespero e o isolamento. Como uma estrela que para manter fecundo seu calor e energia colossais necessita encarar o vazio frio e longínquo do cosmo. Não há para onde fugir, como nos traz o livro, o padecer de figuras que atingem o glamour do topo da esfera social parece seguir em exata proporção o vazio por trás das massas que o almejam. Os suicidas são um espelho hediondo e sedutor da condição humana, refletem a luz e a sombra em proporções paritárias. Não há inteligência genuinamente humana que não flerte com a possibilidade de cessar a agonia da própria autoconsciência, no entanto, como flerta Camus¹, seria este fardo um dom para poucos? Conviver com esta possibilidade, ainda que distante em fantasia, mas real em angustia, torna-se matéria prima para a verdadeira humanidade em sua esfera mais virtuosa, profunda e empática. Temos por tanto a inteligência como o princípio espiritual da desgraça, e a singularidade como um fruto da des-conexão dicotômica com o todo. Se a morte fosse uma força passiva que nos toca sob a luz de uma certeza calma e recorresse aos que não se importam em resistir a ela, e a vida uma força ativa que nos comprime a busca-la rotineiramente no devir cotidiano, os problemas do mundo não orbitariam o excesso, mas a escassez da população². É justo este caráter ambivalente da morte e da vida dançando entre dinâmicas ativas-passivas que propicia o pertencer do existir dos gênios ao seu próprio tempo. Se nossa civilização tragada em seu contrato social fosse adepta das práticas civilizadas do país dos Houyhnhnms de Gulliver³ muito provavelmente assim como seus cidadões equinos não criaríamos arte, uma vez que seu papel parece transcorrer a necessidade de preenchimento do vazio, enquanto a morte dos Houyhnshnms no romance de Jonanthan Swift é encarada com a naturalidade de uma existência contemplativa, cujos instintos, os quais os seres humanos estão fadados e presos, já foram a muito dominados pelos seus habitantes, tornando o viver e o morrer um processo suave e ameno. Esta perspectiva quase estoica de encarar a angustia e o desejo permeia a forma como Solomon aborda com tamanha empatia e sensibilidade o suicídio e o sofrimento existencial, o livro traz