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VIVENCIANDO A EDUCAÇÃO AMBIENTAL EM UMA ESCOLA DE EDUCAÇÃO INFANTIL NO

BALNEÁRIO CASSINO – RIO GRANDE – RS.

Mara BAINY1; Lílian FERREIRA2 & Rosane VIEIRA3


1
Bióloga, Laboratório de Recursos Demersais e Cefalópodes (FURG), Av. Itália Km 8, Campus
Carreiros, 96201-900, Rio Grande, RS, E-mail:marabainy@hotmail.com
2
Acadêmica de Pedagogia (FURG); 3 Diretora e Psicopedagoga Clínica, Escola de Educação
Infantil “Brincando e Aprendendo”, Balneário do Cassino, Rio Grande, RS, 2,3 Av. Rio Grande, 646,
Cassino, Rio Grande, RS, E-mail: escolabrincando@hotmail.com

RESUMO: As crianças nos dias atuais, possuem acesso fácil à informação acarretando em
diversas indagações, entre elas, aquelas relacionadas com o meio ambiente. Na Escola de
Educação Infantil “Brincando e Aprendendo” – Balneário Cassino, Rio Grande, RS, para sanar as
dúvidas infantis, foi inserido na didática escolar a Educação Ambiental. O objetivo foi implantar os
conceitos básicos e primários sobre ecologia e meio ambiente. Para tal procedimento utilizou-se
do processo lúdico: baseado em saídas de campo na beira da praia, recolhimento e análise do lixo
retido à beira mar; do processo teórico: aplicado em sala de aula com material didático adequado
a faixa etária em questão; e do processo prático: baseado na interação entre as crianças,
mesclando as diferentes faixas etárias. A capacidade de compreensão das crianças do ensino
Pré-Escolar III permitiu a elaboração de um livreto educacional infantil, redigido pela professora a
partir de idéias e ilustrações dos alunos e na montagem de uma peça teatral, ambos intitulados “A
Turma do Pré III e os Amigos do Mar”. Além disto, o lixo reciclado serviu de base para construção
de brinquedos e para os enfeites da “Festa Junina Ecológica”. Com isso, concluiu-se que as
crianças apresentaram uma criticidade perante o tema Educação Ambiental. As questões sobre
degradação/preservação começaram a ser esclarecidas em debates diários ocorridos durante
suas brincadeiras, ultrapassando as barreiras físicas da sala de aula. Isso mostrou a importância
da vivência no próprio ambiente das crianças relacionada à Educação Ambiental.

Palavras-chave: educação infantil, compreensão simbólica, métodos de ensino e aprendizagem.

INTRODUÇÃO
A construção do conhecimento segundo Piaget (1996), partiu da idéia que os atos
biológicos são atos de adaptação ao meio físico e organizações do meio ambiente, sempre
procurando manter um equilíbrio. Pois assim, a aprendizagem acontece a partir da vivência, ou
seja, em cima da pesquisa. Vygotsky (1989) ainda acrescenta que é necessário se apaixonar pelo
tema levando em conta a afetividade.
Lima (1998) equalizou a alfabetização de forma lúdica na educação infantil seguindo o
conceito de Piaget (1975), ou seja, ressaltando que a escola deve partir dos esquemas de
assimilação da criança, propondo atividades desafiadoras que provoquem desequilíbrios e
reequilibrações sucessivas, promovendo a descoberta e a construção do conhecimento. A criança
possui uma curiosidade natural de entender tudo ao seu redor, principalmente quando ocorrem as
interações com o ambiente circundante. Neste momento, a criança formula uma série de questões
relacionando-as com aquilo que está presente em sua vivência.
O Balneário Cassino, situado na porção leste da Planície Costeira do Rio Grande do Sul,
pertence ao município de Rio Grande. A Escola de Educação Infantil “Brincando e Aprendendo” é
uma instituição privada situada neste balneário,composta por 8 professoras e 2 auxiliares. Há mais
de 10 anos a escola ensina e educa crianças de 0 a 6 anos, distribuídas em 6 turmas (Pré-
Maternal, Maternal I e II, Pré-Escola I, II e III), nos turnos da manhã e tarde. As crianças
moradoras neste balneário convivem em um ambiente complexo e dinâmico. O ecossistema

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característico da região permite que uma grande diversidade de espécies utilize este local para
alimentação, reprodução e descanso de suas rotas migratórias (Vooren & Ilha, 1995). No âmbito
econômico há dois fatores preponderantes: as migrações sazonais turísticas, caracterizadas pelo
aumento de moradores na época de veraneio e os recentes empreendimentos imobiliários e
navais. Tais crianças elaboram diversas dúvidas diariamente em suas relações cognitivas
(Delgado, 2005), devido ao grande acesso que possuem a informação, principalmente àquelas
nascidas a partir de 1995. Especialmente neste caso, a informação visual decorrente do lixo
(resíduos sólidos) deixado pelos banhistas na zona entre marés - a beira da praia e dunas.
Observando a crescente preocupação destas crianças com o meio ambiente à beira mar,
a escola inseriu em sua didática a Educação Ambiental a partir do ano letivo de 2006. O objetivo
foi implantar os conceitos básicos e primários sobre ecologia e meio ambiente adequado ao
processo de aprendizado, conforme a faixa etária destas crianças respondendo assim suas
dúvidas e suas questões, bem como o de disponibilizar à comunidade cassinense, o trabalho
resultante de tal implantação.

MATERIAL E MÉTODOS
O conteúdo programático da Educação Ambiental foi subdivido em três processos: Lúdico,
Teórico e Prático. Sua aplicação foi realizada de maneira gradual em todas as turmas, visando
abranger a interação entre as crianças e o meio circundante.
Processo Lúdico (Antunes, 2000): Consistiu em pesquisas de campo, com caminhadas à beira
mar com as crianças da Pré-Escola III. Nestes passeios foram feitos dois tipos de observações: A)
Disposição da praia com os animais que vivem ali. As crianças aqui, tiveram consciência de como
a praia esta disposta; das diferentes alturas de dunas; dos animais que interagem e vivem nas
dunas; dos animais encontrados na beira da praia; e, dos animais que vivem no mar. B) Ações
antrópicas, expressas pelas crianças como “lixo no chão”. Nesta observação, as crianças
examinaram visualmente animais marinhos mortos na zona entre marés; quantidade e tipo de lixo
retido nas dunas e na beira da praia; recolheram e analisaram o lixo retido.
Processo Teórico (Alves, 1994): Este processo foi feito em sala de aula. As crianças debateram
sobre os animais e as plantas que vivem na beira da praia e sua interação com o lixo tendo por
base de pesquisa livros, vídeos e revistas infantis direcionados ao assunto.Outra atividade foi
separar o material recolhido à beira-mar classificando-o conforme a reciclagem.
Processo Prático (Antunes, 2000): Consistiu em interagir as crianças e seus aprendizados. Tal
interação propôs mesclar as diferentes faixas etárias (Piaget, 1973) de forma que as “crianças
pequenas”, ou seja, as crianças que estão nas turmas Pré-Maternal, Maternal I e II, através da
observação aprendam com as crianças que estão na Pré-Escola I, II e III, sendo chamadas de
“crianças grandes”. Estas por sua vez, adquirem noções de responsabilidade ambiental e social.

RESULTADOS
Como o início do período de alfabetização coincide com a passagem do pensamento
imaginativo ao pensamento simbólico, a capacidade de compreensão das crianças da Pré-Escola
III permitiu, a partir do levantamento lúdico, a elaboração de um livreto educacional infantil
intitulado “A Turma do Pré III e os Amigos do Mar”.
Totalizando 22 páginas, o livro possui 21 ilustrações contando com a capa. Os desenhos
foram elaborados pelas crianças em folhas de papel A4, utilizando canetas hidrocor, tinta guache
e cola colorida, onde cada uma expressou seu pensamento simbólico sobre o tema em questão.
Aos 6 anos de idade a criança necessita de um referencial. Logo para suprir esta
necessidade dentro do contexto literário, o livro conta a história de dois personagens em forma de
bonecos, João Pedro e Marisol. Estes bonecos são os amigos do mar e os representantes na
preservação do meio ambiente. Eles foram criados pelas crianças, onde o nome Marisol foi o
ponto de partida para o desenvolvimento da história. As crianças associaram “mar e sol” ao
substantivo próprio feminino Marisol, enquanto que o nome João Pedro foi escolhido por votação,
entre diversos nomes que as crianças tinham propostos.
A história foi idealizada em caráter de texto oral coletivo por estes autores mirins e
reescritos pela professora, por ainda não serem totalmente alfabetizados. Trata-se de uma
narrativa ambientada no meio marinho, onde os bonecos fazem um passeio deparando-se com
diversas situações de degradação antropogênica. Além disto, os bonecos, em seus diálogos,
explanam sobre o correto conhecimento adquirido pelas crianças em relação ao ciclo de vida, a
morfologia e o comportamento dos animais encontrados. Os desenhos e a história se
complementam, tendo em vista que ambos foram criados num mesmo momento. Porém, as

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crianças imbuídas do simbolismo valorizaram os desenhos, pois estes demonstraram


emocionalmente a satisfação em aprender e poder repassar tal aprendizado às pessoas de suas
convivências.
O processo prático resultou na produção de uma peça teatral apresentada aos pais, aos
parentes, bem como, à comunidade. A peça contou com todas as crianças participantes do quadro
escolar no ano letivo de 2006. O enredo teve por base o livro “A Turma do Pré III e os Amigos do
Mar”. Esta peça teatral foi o ápice de todo aprendizado, pois através deste ato de expressão
coletiva, as crianças demonstraram aos seus familiares toda a assimilação perante o tema. Com
isto, o sentimento de satisfação e a alegria de aprender e repassar o que foi aprendido, tornou
estas crianças mais capazes de distinguir suas emoções, bem como, de serem mais aptas ao
processo de absorção e compreensão como um todo.
A construção de brinquedos a partir do lixo reciclado foi outro resultado bastante
significativo, pois as crianças entenderam o mecanismo da reciclagem. Além da reciclagem
tradicional, ou seja, aquela feita através da separação do lixo conforme o tipo de material, as
crianças entenderam a idéia de se transformar um objeto velho em outro novo. Com isso, foram
manufaturados brinquedos simples, porém eficazes no trabalho cognitivo infantil, tais como, pé-de-
lata, bibloque (vai-e-vem), boliche, telefone-sem-fio, futebol-de-botão, varinhas-de-fadas, entre
outros. Ainda dentro do contexto de transformação dos objetos, as crianças começaram entender
como e quais eram os brinquedos infantis no passado. Com a realização de uma exposição aberta
à comunidade sobre a confecção dos brinquedos, as crianças mostraram que estavam brincando
com brinquedos parecidos aos de seus pais e avós quando eram crianças. Cabe salientar, que
nesta exposição também foram feitos pelas crianças e supervisionados pela professora, painéis
educativos contendo a preservação do meio ambiente como tema.
Durante o ano letivo de 2006, na intenção de aproximar todos os alunos da escola, bem
como seus pais e responsáveis, todas as atividades escolares englobaram o tema Educação
Ambiental. Na “Festa Junina Ecológica”, por exemplo, o material utilizado para fabricação dos
enfeites foi todo reciclado. Também foram elaborados cartazes pelas crianças, em conjunto com
as professoras, para a comunidade cassinense, sugerindo a colocação do lixo da festa nos latões
específicos. As crianças assemelham muito o lixo com aquilo que elas vêem, logo o fato de
alertarem as pessoas da festa para o “lixo no chão” já lhes atribuía à noção de responsabilidade
ambiental.

DISCUSSÃO
Os pais dos alunos compreendendo a importância sobre o aprendizado cognitivo de seus
filhos, se uniram e criaram um Círculo de Pais e Mestres (CPM) para otimizar as custas da
inserção da Educação Ambiental no conteúdo programático escolar. Com isso, as atividades
lúdicas e práticas também contaram com o monitoramento de membros do CPM, haja visto que
alguns destes membros possuem a capacitação necessária para colaborar com o trabalho das
professoras. Porém, mesmo com o empenho de muitos no início deste trabalho de inserção, a
escola deparou-se com a falta de incentivo ao aprendizado cultural infantil, pois se pretendia editar
o livreto “A Turma do Pré III e os Amigos do Mar” para distribuição gratuita nas escolas públicas da
comunidade, incentivando as crianças a produzirem suas próprias histórias, auxiliando no
crescimento cognitivo das mesmas.
Tendo em vista o alto custo de produção, o livreto foi feito apenas para as crianças que
participaram do projeto sendo, posteriormente, enviado para publicação em revista eletrônica,
levando-se em conta sua facilidade de acesso e divulgação.
A experimentação do processo de aprendizagem a partir da prática ocorre através das
observações, portanto “Brincar” com assuntos sérios como foi com o projeto “A Turma do Pré III e
os Amigos do Mar” elaborou um nível permanente no espaço cognitivo e afetivo destes alunos. A
interatividade permitiu distinguir o que é certo do que é errado. Neste caso, o que é lixo e onde
este deve ser colocado. A vivência no universo da educação infantil ocorre quando os projetos são
elaborados e executados pelos próprios alunos. De posse desta informação a professora elaborou
questões que lhes permitiram refletir, explicar, argumentar, defender um ponto de vista gerando
momentos de discussão dos quais os alunos teria a chance de utilizar o conhecimento que
possuíam sobre o tema tratado. Com isso, apostou-se que o fato de se trabalhar tais atividades
com as crianças desde os primeiros anos de vida no contexto educacional, contribuiria para
transformá-las em adultos mais responsáveis com capacidade de consciência, discernimento e
exigentes no momento das decisões políticas e econômicas perante a sociedade vigente.

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Trabalhando as crianças de forma lúdica na Educação Ambiental ou em qualquer outra


disciplina nas escolas de educação infantil, sendo estas públicas e privadas, estaríamos tornando-
as pequenas multiplicadoras de consciência ecológica portanto, mais perceptivas e interessadas.
Lembrando ainda que como a educação é um ato inserido dentro do ambiente em que
vivemos, a peça teatral apresentada aos pais, aos parentes e a comunidade que ali estava
presente, além de ser a ferramenta utilizada para interagir as crianças, serviu como alicerce para a
consciência social das mesmas, e como fonte de informação as famílias carentes econômica e
ambientalmente desta comunidade. A peça teatral foi apresentada na Sociedade Amigos do
Cassino – SAC. No salão de entrada havia um espaço reservado à arrecadação de alimentos não-
perecíveis para serem doados às famílias carentes cadastradas pela administração da SAC e pela
Autarquia do Balneário Cassino. Por um lado, este ato mostrou às crianças as diferenças
existentes entre as classes sociais de uma população. Por outro, as famílias carentes que
receberam estas doações absorveram a importância da informação passada pelos alunos dando
uma nova perspectiva da realidade e da qualidade de vida, introduzindo no inconsciente coletivo
destas famílias, mesmo que por breves momentos, a ação da lembrança e do cuidado.
De modo geral, percebeu-se que as crianças atingiram uma criticidade perante o tema
Educação Ambiental, os atos de degradação/preservação tornaram-se assuntos debatidos
diariamente em suas brincadeiras. Ocorreu uma visão interiorizada e interdisciplinar no contexto
educacional e ambiental, logo, o ensino ultrapassou as barreiras físicas da sala de aula,
alcançando as famílias destas crianças, bem como, a comunidade moradora fixa da Praia do
Cassino que possui contato com as mesmas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALVES, R.A. 1994. A alegria de ensinar. 6. ed. São Paulo : Ars Poética, 103p.
ANTUNES, C. 2000. Jogos para a estimulação das múltiplas inteligências. 8. ed. Petrópolis :
Editora Vozes, 295p.
DELGADO, A.C.C. (org.) 2005. Crianças pequenas: a arte de combinar razões afetos e emoções.
Rio Grande : Editora e Gráfica da FURG, 118p.
LIMA, A.F.S.O.1998. Pré-escola e alfabetização. 10. ed. Petrópolis : Editora Vozes, 227p.
PIAGET, J. 1973. A linguagem e o pensamento da criança - Importância das crianças
conversarem entre si. Fundo da Cultura, 79p.
PIAGET, J. 1975. A equilibração das estruturas cognitivas. Rio de Janeiro : Ed. Zahar.
PIAGET, J. 1996. Biologia e Conhecimento. 2. ed. Petrópolis : Editora. Vozes.
VOOREN, C.M. & ILHA, H.H. 1995. Guia das aves mais comuns da costa do Rio Grande do Sul.
Rio Grande, FURG Projeto Asas Polares v. 2, 23p.
VYGOTSKY, L.S. 1989. Pensamento e linguagem. 2. ed. São Paulo : Editora Martins Fontes.

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