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Resumo
O interesse pela interação da radiação eletromagnética com a matéria foi o primeiro
impulso para a estruturação de uma série de fórmulas, postulados e teorias que seriam
o alicerce para a física quântica. Sob a sombra do determinismo estatístico, nos séculos
XIX e XX, iniciaram-se os estudos sobre a radiação do corpo negro, uma consequente
reformulação de várias teorias da física clássica e a introdução da quantização de
energia, radiação e partículas. O presente artigo abordará, de forma resumida e
cronológica, a evolução da antiga teoria quântica.
Palavras-chave: Modelos atômicos; efeito fotoelétrico; radiação do corpo negro.
1. Introdução
2. Da problemática do corpo negro à introdução do termo quanta
2.1. Wilhelm Wien
2.2. Ludwig Planck
3. Dos quantas de luz ao equilíbrio térmico da radiação
3.1. Albert Einstein
3.2. Niels Bohr
3.3. Sommerfeld
4. Da equação de onda do elétron ao cálculo de sua energia e momento
relativísticos
5. Conclusão
Dos vários caminhos que a teoria quântica Um corpo, após absorver energia,
poderia ter seguido, o mais aceito pelos normalmente calor, emite radiação
físicos, químicos e historiadores é que esta eletromagnética com intensidade variável.7
surgiu através de estudos sobre as Corpos que absorvem completamente a
propriedades térmicas da radiação do corpo radiação eletromagnética que nele incide são
negro,13 consolidando-se em 1900. Para denominados corpos negros.17 Conforme o
melhor entendimento do desenvolvimento Teorema de Kirchhoff, um corpo negro ideal
da teoria quântica é necessária uma é uma cavidade com um pequeno orifício,
retrospectiva dos fatos que levaram a ela, pelo qual a radiação pode entrar e sair
partindo das tentativas mais notáveis de livremente. Esta relação é dada pela seguinte
descrição dos corpos negros. fórmula:
�
= Eq. 1
∞ � �⁄ ∞ ∞
=∫ =∫ �∫ � � �∫ , = �∫ , Eq. 2
+∞
∫ v, v= � Eq. 3
MAX ∝ Eq. 4
, =v Eq. 5
= α exp − Eq. 6
= Eq. 7
�
Sendo que é a constante dos gases J/K), naquela época ainda não conhecida por
perfeitos (8.314472 J/mol.K), � o número de este nome, e hoje dada pelo símbolo � .
Avogrado (6.0221415x1023 moléculas/mol) e
Conforme Rayleigh, a densidade de
�
a constante de Boltzmann (1,3806503x10-23 energia obedeceria a seguinte equação:
8�
= �
Eq. 8
= | | Eq. 9
��
+∞
= ∫−∞ exp �� Eq. 10
′ ′ ′
� = ∫ sin[ � − ] Eq. 11
�
�
= √ Eq. 12
�
Sabendo que a potência de um ressonador é dada pela Eq. (13), Planck relacionou essa
equação com a densidade da radiação eletromagnética ( ), obtendo a Eq. (14).
′
� = �∫ �̇ Eq. 13
�
� = Eq. 14
Para um caso generalizado, a potência dos ressonadores pode ser expressa como:
�
� = , Eq. 15
�= � ̅̅̅
� Eq. 16
̅ , = � ̅̅̅
� Eq. 17
� = � ̅ , Eq. 18
8π
, = ̅ , Eq. 19
Este resultado auxilia na compreensão das pelas Eqs. (6) e (7) acerca da radiação do
propriedades da radiação eletromagnética corpo negro, Planck obteve a entropia do
emitida por diversos corpos, além do corpo sistema formado pelo equilíbrio
negro.7 termodinâmico entre os ressonadores e a
radiação, que, por não ser decrescente,
A partir da Eq. (19) e dos conhecimentos
obedece à segunda lei da termodinâmica:8
sobre os trabalhos de Wien demonstrados
= − ln Eq. 20
exp
Sendo a energia média dos osciladores de onda. Caso isto fosse verdade o
harmônicos e = . comportamento da radiação já estaria
8� completamente descrito pelas equações de
No início de 1900, Lummer e Pringsheim Rayleigh e Wien.
mediram a radiação entre os comprimentos
No dia 7 de outubro de 1900, após a visita
de onda 12 µm e 18 µm a temperaturas entre
de Heinrich Rubens, Planck ficou ciente de
300 K e 1.650 K, enquanto uma segunda
que para longos comprimentos de onda, a
equipe composta por Rubens e Kurlbaum
densidade de energia era proporcional à
varreu os comprimentos de onda entre 30
temperatura,9,10 o que o auxiliou a encontrar,
µm e 60 µm a temperaturas entre 200 K e
nesta mesma noite, sua fórmula da radiação,
1500 K, concluindo, ambas as equipes, que a
representada na Eq. (24),7 que foi
fórmula Wien não era válida para
comunicada à Academia Alemã de Física no
comprimentos de onda mais longos dentro
dia 19 de outubro, mesmo dia em que foi
de uma longa faixa de temperatura.7,8,10
apresentado que os resultados experimentais
Era o início de uma nova pesquisa, em que do comportamento da radiação em longos
físicos teóricos e experimentais procuravam comprimentos de onda não eram
fórmulas que descrevessem a radiação para compatíveis com as equações de Wien.9
todos os comprimentos de onda do espectro.
Para propor a Eq. (24), Planck considerou
Entretanto, essa busca era complicada;
que a entropia dos osciladores poderia ser
alguns pesquisadores chegaram a considerar
dada por:
que a radiação comportava-se de maneira
diferente nos longos e curtos comprimentos
=− Eq. 21
+
+
ln + = Eq. 22
= exp ⁄
Eq. 23
−
Utilizando a Eq. (19) e observando a lei de deslocamento de Wien, Planck verificou que
seria uma função linear de , e assim, a Eq. (23) foi reescrita:
8�
, = ⁄
Eq. 24
exp −
�
= Eq. 25
exp � ⁄�� −
=ℎ Eq. 26
E assim:
8� ℎ
, = Eq. 27
exp ℎ ⁄�� −
Por fim, Planck encontrou os valores das experimentos que comprovavam a teoria
duas constantes naturais presentes em sua ondulatória da luz estavam abalados.19
fórmula, com ajuda de medidas já
Max Planck, após rever seus conceitos
disponíveis, sendo elas denominadas de:
tratou a energia de forma não contínua,
constante de Planck ℎ = , x −
conseguindo assim estabelecer uma equação
J.s e constante de Boltzmann � =
que descrevesse a radiação luminosa que saía
, x − J K-1.10 Estes resultados de um corpo negro limitando a
foram apresentados à Sociedade de Física no descontinuidade da energia à emissão dos
dia 14 de dezembro de 1900, quando Planck osciladores do corpo negro.13
declarou que a energia não é contínua.9
Albert Einstein, em seu trabalho de 1905,
No decorrer do tempo, e com o advindo Um ponto de vista heurístico sobre a
das pesquisas de Einstein, Planck passou por
produção e transformação da luz , introduziu
uma mudança radical tanto em seu
uma hipótese que generalizou as
vocabulário como em seu modo de pensar, características dos osciladores de Planck para
adotando o termo quantum, para o elemento a própria radiação. Assim a energia não
de energia , e admitindo sua estaria distribuída de maneira contínua, mas
17
descontinuidade. por um número finito de quantas de energia
localizado em pontos do espaço.18 Desta
maneira, a teoria corpuscular da luz ressurgia
3. Dos quantas de luz ao equilíbrio diferente daquela imaginada por Newton.20
térmico da radiação Neste mesmo artigo, em que Einstein
discorreu sobre a quantização do campo de
radiação,21 também propôs uma explicação
3.1. Albert Einstein para o que ficou conhecido como efeito
fotoelétrico. Conforme a teoria clássica do
eletromagnetismo, a energia cinética do
A discussão sobre a constituição da luz elétron deveria aumentar com a intensidade
vinha sendo travada desde o século XVII, com da luz, mas observava-se, pelo efeito
Isaac Newton e Robert Hooke (que fotoelétrico, que a emissão dos elétrons
defendiam a teoria corpuscular para a luz) e devido à incidência de luz aumentava não
Christiaan Huygens (que defendia a teoria com a intensidade da fonte incidente, mas
ondulatória da luz).18 Por um longo tempo, com a frequência.19
sobreviveu a teoria de Isaac Newton, até que Ao estudar o efeito fotoelétrico, Einstein
a hipótese ondulatória voltou a ter força com percebeu que a energia cinética do elétron
o inglês Thomas Young. Entretanto esta ejetado era igual à diferença da energia do
teoria não conseguia descrever a intensidade quantum de luz (ℎ ) e a profundidade do
de radiação luminosa emitida por um corpo poço de potencial. Assim, o elétron só seria
negro. E com o desafio lançado por Gustav ejetado se possuísse certa energia cinética ,
Kirchhoff, em 1896, de formular uma teoria o que implicaria em uma frequência de corte
que descrevesse com precisão o como descrito na Eq. (28):22
comportamento do corpo negro, os pilares e
=ℎ − Eq. 28
=ℎ = = Eq. 29
ℎ
= Eq. 30
= ( − ) Eq. 31
� �
Onde: � > , é o comprimento de onda núcleo, atuaria sobre ele uma força
correspondente à linha espectral em centrípeta que seria igual à força
centímetros e é a constante de Rydberg, eletrostática Coulombiana,23 pois neste caso
com valor de 109 677 cm-1. o movimento orbital do elétron seria como o
movimento acelerado de uma carga
De acordo com a Física Clássica, quando o
elétrica.23 Assim:
elétron estivesse girando em torno de um
v
= Eq. 32
��
= Eq. 33
��
=− Eq. 34
��
=− Eq. 35
��
v
= Eq. 36
�
O elétron em seu movimento orbital perderia energia de maneira contínua,23 esta perda
satisfaria variações do tipo:
Δ� , = − = ��
− ��
Eq. 37
Desta maneira, com a perda de energia, o excitados, Bohr postulou que os elétrons se
raio orbital tornar-se-ia cada vez menor movem em certas órbitas sem irradiar
enquanto a frequência de radiação energia. Nesta situação, os elétrons estariam
aumentaria. Este processo terminaria na em estados estacionários.
colisão do elétron com o núcleo atômico,23 o
A irradiação de energia ocorreria apenas
que não é observado experimentalmente.
quando o elétron sofresse uma transição de
Sabe-se que o átomo é estável e que seu
um estado estacionário para outro, e a
espectro de emissão não é contínuo e sim
frequência da radiação emitida estaria
discreto.
relacionada à energia das órbitas. Esta
Compreendendo que os átomos irradiam energia emitida durante a transição
certas frequências definidas apenas ao serem corresponderia à:26
ℎ = − Eq. 38
Sendo a energia do estado inicial e a raio da órbita, pois de acordo com a equação,
energia no estado final (após a emissão). o raio seria a única variável contínua. Com o
propósito de obter o raio quantizado, Bohr
Considerando que a energia é descrita
postulou que o momento orbital angular do
pela Eq. (35), seria necessário quantizar o
= ħ Eq. 39
ℎ
= = = ħ Eq. 40
�
ħ
v= Eq. 41
Ao substituir v na Eq. (32), Bohr obteve o raio quantizado, também chamado de Raio de
Bohr, :
�� ħ
= Eq. 42
=− Eq. 43
ħ ��
= Eq. 44
� ħ ��
Δ� = ℎ Eq. 45
Δ� = ℎ Eq. 46
Δ�
= Eq. 47
ℎ
= −
�
Em que:
= 8� ℎ
Eq. 48
∮ �= �ℎ ∴ = �ℏ Eq. 49
∮ = ℎ ∴ − = ℏ Eq. 50
� ℏ
= Eq. 51
�
= Eq. 52
=− Eq. 53
� ℏ
= ∴ Eq. 54
√ −v
= − [ + − ] Eq. 55
� ℏ �
�
� = exp Eq. 56
�
�
� = exp Eq. 57
�
= Eq. 58
= , Eq. 59
= Eq. 60
� = � Eq. 62
′
′
= + Eq. 63
Em que = , obtendo:
√ −�
� = �[ − ] Eq. 64
√ −
v
= Eq. 65
√ −v
obteve-se:
=− + ∴ = √ − Eq. 66
= =√ + Eq. 67
12
Agradecimentos Barbosa, A. G. H. A estranha e contraditória
relação entre os químicos e a química teórica.
Revista Virtual de Química 2009, 1, 212.
Os autores gostariam de agradecer o [CrossRef]
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