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A EUTANÁSIA NO BRASIL

No Brasil não existe na legislação a tipificação da eutanásia como crime, mas ela
é enquadrada como um homicídio, ou um auxílio ao suicídio, podendo levar a
condenação do profissional ou familiar que pratica a ação. Podemos dizer que a
eutanásia é condenatória especialmente no sentido moral dos profissionais (por ser
considerada antiética) ou familiares que são favoráveis à esta prática.
Segundo Santos (2019), os argumentos a favor, se baseiam especialmente no
princípio da autonomia, tendo direito de escolher sobre suas próprias vidas com a
eutanásia sendo apresentada de maneira humanística por “libertar” um indivíduo do
sofrimento e das condições precárias de qualidade de vida, situações terminais nas quais
não existe perspectiva de melhora.
Porém, os contrários, afirmam que se descriminalizada, a eutanásia pode ser mal
aplicada, sendo possível o paciente ser afetado por pressões psíquicas exercidas por
terceiros (familiares, amigos ou profissionais de saúde), motivados ainda por interesses,
sejam financeiros, ou de livrar-se do incômodo de manter o cuidado a uma pessoa
enferma. Pessoas abaladas com a descoberta de doenças incuráveis e terminais
tomariam decisões precipitadas, levando a mortes que poderiam ser evitadas. Ainda nos
contrários encontramos a influência religiosa que permeia o mundo político sendo
grande influenciadora nos legisladores. Outra questão importante nesse debate é a
responsabilidade ética dos profissionais da saúde, espera-se que eles façam o possível
para que o paciente continue vivendo, o que faria com que a eutanásia fosse
contraditória aos aspectos da ética destes profissionais.
O Brasil tem uma discussão longa ainda no que tange a eutanásia, pois temos
uma Constituição que oferta o direito à vida e a dignidade humana, no entanto o direito
a morte não é reconhecido. Portanto os pacientes não podem exercer seu livre arbítrio
pensando em autonomia, alívio e liberdade, quando não se têm perspectivas de
manutenção de uma vida com qualidade.

RELIGIÃO

A religião e a ciência por diversas vezes não encontram pontos de convergência


em assuntos relacionados à vida humana, ambas disputam o saber sobre vida e morte, a
definição de início e final de vida são assuntos frequentes de discussões entre religiosos
e cientistas.
As crenças religiosas estão ligadas à imposição de limites éticos e morais às
nossas ações, uma pesquisa no início dos anos 2000, destacou que indivíduos dos
Estados Unidos, acima de 60 anos tinham uma aceitação ou não da prática da eutanásia
proporcional a importância que eles atribuíam à religião na sua vida (MELEIRO apud
ALMEIDA, 2004).
A sacralidade da vida humana tem raiz na cultura teológica que Deus deu a vida
ao homem e nesse sentido o homem não teria o domínio da sua vida e tampouco da hora
da sua morte, sendo uma decisão apenas divina, destacando-se como imoral qualquer
forma de encurtamento ou violação deste dom divino. A maioria das religiões (exceto
mórmons, islâmicos e alguns grupos evangélicos) aceita o não prolongamento da vida
por meios extraordinários, o que corresponde a uma aceitação da ortotanásia, já a
prática de qualquer ato deliberativo visando a interrupção da vida é, para a grande
maioria das crenças, condenável (BRAGA, 2013).
É inegável que estas disputas entre religião e ciência tem reflexo na construção
jurídica dos países, que levam aos limites e alcance de autonomia do indivíduo sobre
sua vida e morte. De acordo com Braga (2013), a decisão de morrer deve ser tão
respeitada quanto a decisão de viver e lutar pela vida, pois ambas refletem a autonomia,
ou seja, um direito que cada pessoa têm de decidir qual a melhor conduta a ser adotada
em um tema que lhe diz respeito, direta e profundamente.

ACEITAÇÃO DA EUTANÁSIA NO MUNDO

Muitos países no mundo já consideram que a eutanásia é uma maneira de


permitir o direito de decisão do indivíduo, onde vai prevalecer o seu desejo de acabar
com um sofrimento que não terá fim, a menos que a vida termine (VIEIRA, 2012).
Países como Holanda e Bélgica a legalização e descriminalização da eutanásia
datam de 2002. Sendo os primeiros países a permitir essas intervenções, porém ambos
tem uma série de restrições para controle da prática. Na Holanda, por exemplo, cabe a
uma comissão de juízes, médicos e sociólogos a análise e aprovação de cada caso
solicitado. Na Bélgica os pacientes podem ter qualquer idade, sendo permitido o
procedimento em menores com autorização dos responsáveis legais e avaliação médica
e de psiquiatra infantil.
A Suíça não tem legislação específica, mas uma interpretação da lei de direitos
do cidadão permite que o procedimento seja realizado se o paciente optar pela morte.
No país existe uma fama de procedimento de morte assistida, consolidando uma ideia de
“turismo da morte”, levando pessoas de diversos países a ir até a Suíça para realizar o
procedimento.
O Uruguai assim como a Suíça não tem lei específica que autoriza a eutanásia,
apesar de condenar criminalmente o suicídio assistido. O país tolera a eutanásia e prevê
uma possibilidade de “perdão” a quem exerce “homicídio por piedade” mediante pedido
do paciente, desde que a pessoa que executou o ato tenha bons antecedentes.
Portugal está realizando um referendo sobre a legalização da eutanásia e apesar
de encontrar muita posição contrária, uma equipe de 400 profissionais da área médica
emitiu uma nota para que os legisladores levem em consideração os direitos a escolha
do indivíduo: “Recusamos manter ou iniciar tratamentos inúteis e sabemos as situações
em que a boa prática é deixar morrer. Conhecemos as vantagens dos cuidados
paliativos, mas também os seus limites. E conhecemos, ainda, as situações em que
respeitar a vontade e o sentido do doente, e o seu direito constitucional à
autodeterminação, significam aceitar e praticar a antecipação da sua morte face a um
pedido informado, consciente e reiterado, não fosse a lei considerar como crime essa
atitude exclusivamente movida pela compaixão humanista" (Petição subscrita por
médicos em defesa da despenalização da eutanásia, 2020).
Segundo Diniz (2011), é bom sempre recordar o conceito da Organização
Mundial de Saúde (OMS): ''Saúde é o completo estado de bem-estar físico, psíquico e
social". E esse bem-estar, se levado ao coletivo, seria a volta a um estado de plenitude e
felicidade, esse estado não é alcançado em vida por pacientes com diagnósticos
terminais e a única fonte de paz destes pode ser o fim da vida e consequentemente o fim
de um sofrimento a qual ninguém gostaria de enfrentar.
ALMEIDA, Alexander. Suicídio assistido, eutanásia e cuidados paliativos. In:
MELEIRO, A; TENG, C.; WANG, Y. P. (Eds.) Suicídio: estudos fundamentais. São
Paulo: Segmento Farma, 2004, p. 207- 215.

BRAGA, Ana Gabriela Mendes. Direito humano de vida e de morte: a eutanásia perante
o direito penal e a religião. Revista Interdisciplinar de Direitos Humanos, v. 1, n. 1,
p. 89-102, 2013.

DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 8º edição- São Paulo: Saraiva,
2011.

SANTOS, Joicy Leide de França; MORAIS, Edclécia Reino Carneiro de; ALESSIO,
Renata Lira dos Santos. Social Representations on Euthanasia between Students of Law
and Medicine: A Comparative Analysis. Trends Psychol.,  Ribeirão Preto ,  v. 27, n.
3, p. 805-818,  set.  2019 . https://doi.org/10.9788/tp2019.3-15.

VIEIRA, Mônica Silveira. Eutanásia: humanizando a visão jurídica. Curitiba: Juruá


Editora, 2012.

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