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José Carlos de Azeredo

A linguístiCA,
texto e o
o

ensino dA línguA
Direção: Andréia Custódio
Capa e diagramação: Telma Custódio
Revisão: Parábola Editorial

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO NA FONTE


SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

A987L

Azeredo, José Carlos de


A linguística, o texto e o ensino da língua / José Carlos de Azeredo.
- 1. ed. - São Paulo : Parábola, 2018.
200 p. ; 23 cm. (Linguagem ; 84)

Inclui bibliografia
ISBN 978-85-7934-155-7

1. Linguística. 2. Língua portuguesa - Estudo e ensino. I. Título. II. Série.

18-52320 CDD: 410


CDU: 81'1

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ISBN: 978-85-7934-155-7
© do texto: José Carlos de Azeredo
© da edição: Parábola Editorial, São Paulo, outubro de 2018.
Para Célia Therezinha G. Oliveira
e Maria Helena Marques,
duas grandes mestras que tive na UFRJ
(in memoriam).
sumário

Apresentação.......................................................................................9

um
A linguística, o texto e o ensino da língua:
Notas para um debate............................................................................ 13

dois
Língua e texto: O livro didático de português nos anos
1960 e 1970............................................................................................. 21

três
Construção e funcionamento dos textos:
Conceitos básicos ................................................................................. 35

quatro
Apontamentos para uma filosofia de ensino da língua........ 51

cinco
“Sorria; você está sendo filmado”: As estratégias do dizer....... 65

seis
Construção sintática e coesão lexical................................... 91

sete
O aposto e o intertexto............................................................... 107

7
oito
Leitura e escrita na língua materna: Tarefa interdisciplinar..... 121

nove
Rosa, rosae: Uma estilística da irreverência..................................... 137

dez
De pedras e palavras: O atrito como estética................................ 153

onze
Usos e representações da palavra nas crônicas de
Carlos Drummond de Andrade ................................................ 163

doze
Entre a gaiola e o céu azul: O que é o mundo?........................ 181

Referências...................................................................................... 193

8 A linguística, o texto e o ensino da língua


Apresentação

O
modo humano de viver em sociedade é obviamente im-
pensável sem a presença da palavra. Na perspectiva do
senso comum, no entanto, a consciência desse fato se tra-
duz apenas na percepção do papel instrumental da lingua-
gem: as palavras são geralmente percebidas como um meio prático
de ‘dar nomes’ às coisas e aos fatos, com o fim de permitir o exercício
da comunicação entre as pessoas.

A par disso, o fato de o ser humano nascer anatomicamente equi-


pado para o desenvolvimento da fala ampara o sentimento de que a
posse de uma língua faz parte de sua natureza tanto quanto a apti-
dão para nadar ou distinguir sabores. No entanto, a linguagem não
se explica em termos estritamente naturais; ela tem fundamentos que
vão muito além da elasticidade muscular presente no movimento
dos braços ou da versatilidade sensorial do paladar; ela segue outra
ordem de estímulos, que têm de ser procurados no universo social,
já que se integra numa outra ordem de fenômenos: a dos fenômenos
culturais, portanto, aprendidos.

Leigos, mas práticos, somos quase sempre tentados a tratar as pa-


lavras como se elas pertencessem a um estoque guardado na memória,
como uma lista de etiquetas distintas e independentes que aplicamos
às entidades do mundo real e do mundo imaginário. Assim, cada vez
que precisamos mencionar alguma coisa ou exprimir alguma ideia,
buscamos naquela lista as palavras ou etiquetas apropriadas e as com-
binamos umas com as outras conforme um ordenamento lógico que
seria um reflexo da maneira como a própria realidade está construída.

9
Essa crença deriva, na verdade, de uma outra, mais ampla porém
menos óbvia: a de que o mundo a que nossas palavras fazem referên-
cia se acha organizado como um ‘conjunto de coisas, fatos, sensações’
prontos para receber a respectiva etiqueta. Ou seja, como uma es-
trutura autônoma, independente da linguagem. De acordo com essa
crença, os conteúdos do nosso pensamento seriam apenas reflexos
do mundo, e nossa linguagem não passaria de um simples meio de
pôr rótulos nesses reflexos ou de propiciar sinais para eles.

Essa crença é falsa, porém: a linguagem não é uma simples ferra-


menta ou instrumento, nem, tampouco, o espelho de um mundo de
objetos e fenômenos que preexistem à consciência humana. O con-
teúdo de nossos textos não é um ‘retrato fiel’ de nossas experiências
de mundo, simplesmente porque o que nossos textos significam re-
sulta de uma filtragem e modelação dessas experiências por meio
das categorias da língua em que eles são construídos1.

A transformação de nossas experiências de mundo em matéria


textual envolve, necessariamente, fatores socioculturais e recursos
de expressão comuns aos membros da comunidade. Uns e outros
se refletem em nossos textos, na medida em que, balizando nossas
escolhas por meio de um sistema coletivo de representações, fazem
do que dizemos/escrevemos um meio de contato que viabiliza o en-
tendimento entre dois sujeitos. Portanto, o que ‘vale’ para a interação
por meio da palavra não é o que ‘está na minha cabeça’, mas o que
meu interlocutor compreende graças aos sinais que produzo.

Ensinar a língua é ensinar a lidar com esses sinais, seja na constru-


ção dos nossos textos, seja na compreensão dos textos alheios. Essa
é uma verdade tão antiga quanto consensual, mas o consenso cede
lugar à polêmica quando a questão se refere aos meios adequados à
consecução desse objetivo.

Já é longo — mas provavelmente nunca será conclusivo — o debate


sobre a utilidade e os benefícios da reflexão sobre a língua no processo
de desenvolvimento e aperfeiçoamento de nossas habilidades de com-

Sobre a relação entre linguagem e conhecimento, ver Marcuschi (2007).


1

10 A linguística, o texto e o ensino da língua


preensão e de expressão. O tema não é novo, apenas voltou ao debate2.
Como também não é nova a tese de que a competência para analisar o
funcionamento de uma língua não é fator determinante do desenvol-
vimento das mencionadas habilidades3. A lição do bom senso, antiga,
mas não menos atual, é que ninguém aprende a ler e a escrever estu-
dando gramática e fazendo exercícios de análise gramatical.

Quando, porém, se fala em reflexão sobre a língua, não é de aná-


lise gramatical que se fala. Reflexão sobre a língua é outra coisa bem
mais abrangente: é uma prática que, sem perder de vista a função
instrumental da palavra, faz da língua o foco do processo de apren-
dizagem e constrói sobre ela um conhecimento que é, no fundo, um
conhecimento sobre a natureza humana e sobre a vida dos seres hu-
manos em sociedade4.

O ensino da língua é uma espécie de ideia fixa que percorre os


doze capítulos desta publicação, que reedita parte de uma obra es-
gotada — Ensino de português: fundamentos, percursos, objetos (J. Zahar,
2007) —, a que se somam três novos capítulos (1, 4 e 12). Em cada um
deles, insistimos na condição que o texto detém de objeto e objetivo
do ensino da língua materna. Os capítulos 1 e 2 focalizam os percur-
sos; os fundamentos (aspectos teórico-conceituais e metodológicos)
são matéria dos capítulos 3 a 8. Os capítulos 9 a 12 são incursões no
território da literatura brasileira pelo caminho da língua. Isso equi-
vale a dizer que os comentários e análises do conjunto final buscam
amparar nos recursos linguísticos a compreensão/explicação do sig-
nificado construído nos textos.

Embora não tenha havido o propósito explícito de oferecer nos


quatro capítulos finais exemplos de ‘aplicação’ dos conceitos desen-
volvidos a título de fundamentos, as análises empreendidas tendem
a realizar essa conexão.

2
Tratam desse tema os seguintes trabalhos, entre outros: Fonseca (1994), Franchi (2006), Ge-
raldi (1996), Mattos e Silva (2004), Neves (2003), Perini (2002), Pagliaro (1967), Possenti (1997).
3
Em um pioneiro Livro de composição, Bilac e Bomfim (1930) escreveram: “O aluno pode per-
feitamente estar senhor de todas as regras da gramática, e não saber dizer o que pensa e o que
sente. A gramática seca, abstrata e árida, com que se cansa o cérebro das crianças, não ensina a
escrever.”
4
Essa estratégia de trabalho é defendida nos trabalhos de Franchi (2006) e de Fonseca (1997).

Apresentação 11
O sucesso de qualquer empreendimento pedagógico depende de
que os estudantes estejam aptos a ler e escrever com desenvoltu-
ra, competência a ser cultivada ao longo de toda a vida escolar e
que pode ser contínua e eficientemente estendida por duas vias
conjugadas: a reflexão sobre a natureza simbólica da linguagem e
a revelação dos efeitos de sentido de um texto com base em sua
construção formal.
O que move as linhas deste livro é reafirmar a importância da pa-
lavra como eixo de qualquer projeto educacional, uma vez que é
na posse e no exercício da linguagem que se reconhece o traço
essencial do modo humano de ser.
O estudante pode dar um salto qualitativo nos planos intelectual
e cultural ao compreender que, para além de sua utilidade ins-
trumental na atividade comunicativa cotidiana, a língua que ele
fala é uma forma de conhecer, de ser e de atuar no mundo. Nesse
momento, a língua deixa de ser mera herança imposta aos indiví-
duos como membros da comunidade, e é posta a serviço de suas
escolhas e de sua capacidade de criar.
O ensino da língua é a ideia fixa que percorre os doze capítulos
desta obra. Em cada um deles, insistimos na condição que o tex-
to detém de objeto e objetivo do ensino da língua materna. Os
capítulos 1 e 2 focalizam os percursos; os fundamentos (aspectos
teórico-conceituais e metodológicos) são matéria dos capítulos 3
a 8. Os capítulos 9 a 12 são incursões no território da literatura bra-
sileira pelo caminho da língua.

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