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I – Definição conceitual: serviços públicos em sentido amplo e restrito.

Segundo Di Pietro (2019, p. 274) a noção de serviços públicos pode ser


elaborada através de uma bifurcação entre serviços públicos em sentido amplo e em
sentido restrito, de forma que ambas definições conciliam uma dimensão material
(atividades de interesse coletivo), subjetiva (presença do Estado) e formal
(procedimento de direito público).
O conceito amplo de serviço público remonta o direito francês, mais
especificamente a chamada Escola do Serviço Público, liderada por Leon Duguit,
responsável pela elaboração das primeiras noções de serviço público, algumas delas tão
amplas que abrangiam todas as atividades do Estado. Para ele, em torno da noção de
serviço público gravita todo o direito público. Por essa perspectiva, toda atividade que o
Estado exerce para cumprir os seus fins seria um serviço público.
Em outro sentido, o conceito restrito de serviço público, “confina o serviço
público entre as atividades exercidas pela Administração Pública, com exclusão das
funções legislativa e jurisdicional; e, além disso, o consideram como uma das
atividades administrativas, perfeitamente distinta do poder de polícia do Estado” (DI
PIETRO, 2019, p. 279).
O termo, em nossa legislação é utilizado hora em sentido amplo, hora em sentido
restrito. No artigo 37, § 6º, da CF/88, por exemplo, a expressão é utilizada de forma
ampla, todavia, em outros dispositivos do mesmo diploma, como o art. 145, II, ou art.
175, a expressão assume sentido mais estrito.
Isso demonstra haver certo dinamismo próprio da definição, que pode variar de
acordo com o tempo, o espaço e as necessidades, motivo pelo qual adotaremos a
elaboração teórica de Di Pietro (2019, p. 286), que define “Serviço público” como
“toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça diretamente
ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer concretamente às
necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou parcialmente público”.
Assim, agora convém tratar dos elementos constitutivos do conceito, expostos de
forma geral linhas acima: elemento subjetivo, formal e material.

I.I – Elemento subjetivo.


O elemento subjetivo se refere a quem incumbe o serviço público, o qual, nos
termos do art. 175 da CF/88 depende sempre do Estado, responsável por sua criação,
através de lei, bem como por sua gestão, seja direta ou indireta (através de concessão ou
permissão).

I.II – Elemento formal.


O regime jurídico ao qual se submetem os serviços públicos é definido por lei,
sendo, com exceção dos serviços comerciais e industriais, regime de direito público.
Assim, nesses serviços os agentes são estatutários; os bens são públicos; as
decisões apresentam todos os atributos do ato administrativo; a responsabilidade é
objetiva; os contratos regem-se pelo direito administrativo.
Já nos serviços comerciais ou industriais temos um regime jurídico de direito
comum, parcialmente derrogado por disposições publicistas, com o pessoal sendo
submetido à legislação trabalhista, os contratos sendo regidos por normas de direito
comum, etc.

I.III – Elemento material.


Se traduz na ideia de que os serviços públicos são, em seu conteúdo, atividades
que buscam atender às necessidades concretas da coletividade, embora “nem toda
atividade de interesse público seja serviço público” (DI PIETRO, 2019, p. 289), vez
que, para além do objetivo de interesse público, é necessário, para que se caracterize o
serviço público, que a lei atribua esse objetivo ao Estado.

II – Princípios dos serviços públicos.


Di Pietro, ao tratar do tema, aborda que os princípios inerentes ao contrato
administrativo são, também, aplicáveis aos serviços públicos, quais sejam: o da
continuidade do serviço público, o da mutabilidade do regime jurídico e o da igualdade
dos usuários. O princípio da continuidade do serviço público, entretanto, em
decorrência do qual o serviço público não pode parar, teria aplicação especialmente com
relação aos contratos administrativos e ao exercício da função pública.
Quanto ao contrato administrativo, reflexos do sobredito princípio seriam, por
exemplo: (a) a imposição de prazos rigorosos ao contraente; (b) a aplicação da teoria da
imprevisão, para recompor o equilíbrio econômico-financeiro do contrato e permitir a
continuidade do serviço; (c) a inaplicabilidade da exceptio non adimpleti contractus
contra a Administração; (d) o reconhecimento de privilégios para a Administração.
Por outro lado, a autora também menciona que quanto ao exercício da função
pública, são efeitos da continuidade do serviço público: (a) as normas que exigem a
permanência do servidor em serviço, quando pede exoneração, pelo prazo fixado em lei;
(b) os institutos da substituição, suplência e delegação; (c) a proibição do direito de
greve.
Sem prejuízo, a mesma doutrinadora ainda destaca, como princípios aplicáveis
ao serviço público, o princípio da mutabilidade do regime jurídico e o princípio da
igualdade dos usuários perante o serviço público. De acordo com o primeiro, são
autorizadas mudanças no regime de execução do serviço para adaptá-lo ao interesse
público, que é sempre variável no tempo e, de acordo com o último, desde que a pessoa
satisfaça às condições legais, ela faz jus à prestação do serviço, sem qualquer distinção
de caráter pessoal.
Ainda cabe destacar que outros princípios estão previstos no art. 6º, § 1º da Lei
8.987/95, a que se saibam:
a) Regularidade: referente ao dever e necessidade de manutenção da qualidade do
serviço;
b) Eficiência: aplicável aos meios e resultados da prestação do serviço público;
c) Continuidade: O serviço público deve ser acessível e prestado de forma
contínua, não se considerando descontinuidade quando motivada por razões de
ordem técnica ou de segurança das instalações; e por inadimplemento do
usuário, considerado o interesse da coletividade;
d) Segurança: o serviço público não pode colocar em risco a vida dos
administrados, os administrados não podem ter sua segurança comprometida
pelos serviços públicos.
e) Atualidade: A Administração tem a obrigação de aproveitar na prestação de
serviços os avanços científicos e tecnológicos, que irão propiciar uma melhora
na qualidade da prestação. É um corolário do princípio da eficiência;
f) Generalidade: o serviço público deve ser prestado erga omnes;
g) Cortesia na sua prestação: os usuários são os destinatários dos serviços públicos,
desta maneira existe um dever legal, além de um dever, obviamente, moral, de
tratá-los de modo urbano e educado, recebendo um atendimento adequado.
h) Modicidade das tarifas: O serviço público deve ser prestado da forma mais
barata possível, de acordo com a tarifa mínima.
III – Classificação dos serviços públicos.
Seguindo a doutrina de Di Pietro (2019, p. 299-301), nosso marco teórico,
podemos estabelecer a seguinte classificação dos serviços públicos, a partir da doutrina
majoritária:

a) Quanto a essencialidade do serviço: os serviços públicos, por esse prisma


poderão são próprios ou impróprios. Os próprios são aqueles quesão aqueles
que, atendendo a necessidades coletivas, o Estado assume como seus e os
executa diretamente (por meio de seus agentes) ou indiretamente (por meio de
concessionários e permissionários). E serviços públicos impróprios são os que,
embora atendendo também a necessidades coletivas, como os anteriores, não são
assumidos nem executados pelo Estado, seja direta ou indiretamente, mas apenas
por ele autorizados, regulamentados e fiscalizados; eles correspondem a
atividades privadas e recebem impropriamente o nome de serviços públicos,
porque atendem a necessidades de interesse geral;
b) Quanto ao objeto: poderão ser administrativos, comerciais ou industriais e
sociais. Os administrativos são os executados para atender às suas necessidades
internas ou preparar outros serviços que serão prestados ao público (expressão
que a autora aponta como equívoca). Os comerciais correspondem a atividade
econômica assumida pelo Estado como serviço público correspondente ao
artigo 175 da Constituição, que determina a sua execução direta pelo Estado ou
indireta, por meio de concessão ou permissão. Por fim, os serviços sociais são
os que atendem a necessidades coletivas em que a atuação do Estado é essencial,
mas que convivem com a iniciativa privada;
c) Quanto à maneira como concorrem para satisfazer ao interesse geral, os serviços
podem ser: uti singuli e uti universi. Serviços uti singuli são aqueles que têm por
finalidade a satisfação individual e direta das necessidades dos cidadãos,
enquanto os serviços uti universi são prestados à coletividade, mas usufruídos
apenas indiretamente pelos indivíduos.

Há ainda parte da doutrina que promove a seguinte classificação:

a) Quanto a essencialidade do serviço e sua assunção pelo Estado, podem, os


serviços públicos serem: Originários ou congênitos (correspondem a atividade
essencial, própria e privativa do Estado, como a tutela do direito) e derivados
ou adquiridos (correspondem a atividade facultativa, não exclusiva do Estado,
como os serviços sociais, comerciais e industriais).

b) Quanto a exclusividade ou não do Poder Público na prestação do serviç)


Exclusivos (como os dos arts. 21, XI e XII, e 25, § 2º, da CF) e não exclusivos
(como os serviços sociais, abrangendo a saúde, a educação, a assistência social).

IV – Gestão de serviços públicos.

Os artigos 21, 25, 37 e 175 da CF/88 trazem, em seu corpo, trazem várias formas
de gestão dos serviços públicos. De acordo com Di Pietro (2019, p. 306-307), as
principais formas de gestão dos serviços públicos são:

a) A concessão e a permissão de serviços públicos, disciplinadas pela Lei nº 8.987,


de 13-2-95;
b) A concessão patrocinada e a concessão administrativa, englobadas sob o título
de parcerias público-privadas na Lei nº 11.079, de 30- 12-04;
c) O contrato de gestão como instrumento de parceria com as chamadas
organizações sociais, disciplinadas, na esfera federal, pela Lei nº 9.637, de 15-5-
98.

Todavia, cabe anotar que a administração Pública não é inteiramente livre para
escolher a forma de gestão dos serviços públicos, de modo que, a depender do tipo de
serviço, há uma dada vinculação legal em sua forma:

a) Quando se tratar de execução por meio de entidades da Administração Indireta, há


necessidade de lei, conforme artigo 37, XIX, da Constituição;

b) por meio de delegação a entidade privada, com cobrança de tarifa, de serviços


comerciais e industriais, concessão comum, concessão patrocinada ou franquia; forma
inadequada para: atividades exclusivas do Estado (porque são indelegáveis), serviços
sociais (porque prestados gratuitamente), e serviços uti universi, não usufruíveis
diretamente pelo cidadão;

c) para o serviço público de natureza comercial ou industrial, sem cobrança de tarifa do


usuário, o instituto cabível é a concessão administrativa;
d) Para os serviços sociais, são possíveis os contratos de gestão com as organizações
sociais e a concessão administrativa;

e) para qualquer tipo de serviço público é possível a gestão associada entre entes
federativos, por meio de convênios de cooperação ou consórcios públicos, previstos no
artigo 241 da Constituição e disciplinados pela Lei nº 11.107, de 6-4-05.

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