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Seropédica
2019
1
JULIA VIEIRA TULHER
Seropédica
2019
2
FOLHA DE APROVAÇÃO
BANCA AVALIADORA:
_______________________________________________
Prof. Dr. Alexander Rezende Luz - UFRRJ
PRESIDENTE
_______________________________________________
Prof. Dr. Cláudia Barbieri Masseran
AVALIADORA
3
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente aos meus pais, sem seu esforço e dedicação esse momento
não seria possível. Agradeço também à paciência e compreensão deles nos momentos em que
eu estava ocupada demais para fazer qualquer coisa além de estudar. Por esse mesmo motivo,
agradeço aos meus amigos, ao meu amor e a todos ao meu redor. Sei que não é fácil escutar o
tempo todo uma pessoa falando e/ou reclamando do mesmo assunto.
Um agradecimento especial às minhas amigas e companheiras de caminhada Thayane
e Larissa. Nós três iniciamos a graduação juntas e terminamos juntas. Obrigada por toda a
ajuda, pelos conselhos e por entenderem a posição em que eu me encontrava por estarem
nesse barco comigo e nosso orientador Alexander. Saber que vocês estavam ao meu lado era
um grande alívio nos momentos difíceis.
Agradeço também ao Alexander, por me propor a realização desse trabalho. Obrigada
pela sua ajuda e atenção, e principalmente por ser a luz ao me mostrar qual caminho seguir
quando eu estava perdida em meio a minha pesquisa.
Por fim, mas não menos importante, agradeço à todas as mulheres - que conheço ou
não - que lutam por reconhecimento e igualdade. Graças à nós, a literatura feminina existe e
dá voz ao que nos falta em nossa cultura.
4
RESUMO
Palavras-chave: Herland; Terra das Mulheres; Charlotte Perkins Gilman; razão; emoção;
feminismo; essencialismo; construtivismo.
5
ABSTRACT
Generally, in communities where men are considered superiors to women, it is believed that
women act through emotion and men through reason, therefore, in Charlotte Perkins Gilman’s
work, Herland, the writer inverts these values when she shows to the reader male impulsive
characters and female rational characters. Bearing in mind that modern societies are mostly
patriarchal and, consequently the female parcel is handled with inferiority due their lack of
rationality, this article has as purpose question male’s influence on female’s reason and
emotion in the light of the constructivism and the essentialism while questions men’s
perception concerning women and exposes the counterpoint between reason and emotion in
the book using as base the feminist movement.
6
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 8
1. RAZÃO E GÊNERO 11
1.1 Razão e Gênero: Uma Breve História 11
1.2 A Razão Feminina de Herland 16
2. EMOÇÃO E GÊNERO 23
2.1 Uma Breve História das Emoções 23
2.2 Emoção em Herland 26
CONSIDERAÇÕES FINAIS 41
REFERÊNCIAS 43
7
INTRODUÇÃO
Herland de Charlotte Perkins Gilman é uma utopia publicada durante a primeira onda
dos movimentos feministas nos Estados Unidos que retrata um país habitado somente por
mulheres. Três amigos, ao escutarem sobre a terra, resolvem explorá-la, contudo, se deparam
com uma sociedade completamente diferente daquela que sua imaginação carregada de
estereótipos esperava: um país extremamente organizado e moderno; não possuinte de
problemas sociais comuns como fome, pobreza etc.; e com suas cidadãs símbolos de
racionalidade, inteligência e fraternidade. A obra foi um grande marco da literatura feminista
e chocou a sociedade do início do século XX pois quebrou as expectativas relacionadas aos
papéis de gênero - aumentou o papel da mulher na sociedade e explorou suas capacidades no
que diz respeito à educação, maternidade, bem estar social etc., ao mesmo tempo em que
subvertia construções sociais como razão ser um ramo masculino e emoção, feminino.
Charlotte Perkins Gilman foi uma escritora, professora e editora conhecida,
principalmente, por ser uma defensora dos direitos das mulheres e das reformas sociais.
Vivendo em meio à explosão dos movimentos feministas, a autora lutava a favor da igualdade
de gênero e era frequentemente avistada em manifestações públicas. Suas obras, refletiam seu
estilo de vida e incentivavam os sexos a mudar seus pensamentos a respeito dos papéis da
mulher e do homem na sociedade. A autora acreditava que as diferenças entre os gêneros
eram construídas socialmente e que as mulheres eram colocadas em uma posição inferior pois
a cultura vigente era machista e condicionava-as a se comportarem de acordo com moldes pré
estabelecidos.
Por ser uma obra classificada como uma utopia essencialmente feminista,
principalmente por conta da relação da autora com o movimento e de seu histórico
comportamental militante, a grande maioria das análises sobre o romance encontradas
abrange dois assuntos distintos presentes na obra: o gênero utopia e o papel do feminino,
como na dissertação de Matiolevitcz (2018). Além disso, muitos artigos têm como objetivo
comparar a obra com outras do mesmo gênero, como na obra Charlotte Perkins Gilman and
her contemporaries (2004). Outro ponto observado durante a realização do trabalho, foi que
com o advento do feminismo moderno, as opiniões sobre a obra se tornaram divergentes:
alguns autores acreditam que a narrativa têm um papel importante na causa feminista, outros
argumentam que o ponto de vista de Perkins sobre as nativas da Terra das Mulheres é um
8
desserviço para o feminismo. Entretanto, as duas posições foram levadas em consideração
durante a pesquisa.
Em Herland, Gilman apresenta aos leitores uma sociedade liderada por mulheres,
completamente avessas aos papéis conferidos à elas, livre dos males da sociedade em que
vivemos. Dessa forma, ela utiliza dos três exploradores como artifício para comparar as
nativas com as estrangeiras. Ela argumenta que o Estado, têm defeitos pois é comandado por
homens, ou seja, só é possível que se alcance a perfeição em um ambiente no qual as
mulheres são livres das amarras machistas.
O objetivo do presente trabalho é analisar a obra de Gilman no que diz respeito à
influência masculina no comportamento feminino. Ao expor as nativas da Terra das Mulheres
quebrando as expectativas dos exploradores no tocante às suas características construídas
culturalmente ao se mostrarem extremamente racionais e pouco emotivas - e,
concomitantemente, os três exploradores fazendo o contrário -; a romancista assume que a
presença dos homens afeta negativamente as mulheres em sua capacidade de raciocinar e de
sentir. Ou seja, as mulheres não são naturalmente emocionais e irracionais, mas colocadas
nesse lugar pois o patriarcado não lhes dá oportunidade de aflorar seus verdadeiros atributos,
dessa forma, o que é considerado essência feminina, é construto social.
Com o intuito de chegar à tais conclusões, recentes estudos sobre o romance em
questão foram utilizados. Essencialmente as teses que elogiam o trabalho de Perkins de Casia
Silva Matiolevitcz (2018) a qual enfoca na perspectiva do narrador a respeito da sociedade
utópica, e de Fatima Sousa (2008) que se preocupa em apontar os aspectos essencialistas e
construtivistas na Terra das Mulheres. Além das publicações que apontam os erros da autora
ao idealizar a Terra das Mulheres de Caplan-Bricker (2018) que objetiva em comparar sua
própria construção como mulher, com as moças de Herland, e ainda faz referência ao
movimento Me Too; e a crítica de Bowers (2018), a qual aponta a problemáticas da obra com
uma perspectiva feminista moderna, em que algumas representações de Gilman são
consideradas antiquadas. Apesar das pesquisas acima citadas abordarem de formas diferentes
a obra, o motivo pelo qual elas foram escolhidas como as principais referências do trabalho
em questão é o que elas têm em comum: abordar as questões essencialistas e construtivistas
na ficção de Charlotte Perkins Gilman.
Para dar conta de todas as camadas dos problemas sociais criticados por Perkins em
Herland e de explorar as questões essenciais e construídas nos seres humanos, esse trabalho
foi dividido em três capítulos: o primeiro, focado na subversão da razão e dos gêneros na
9
obra, o segundo, na expressão das emoções e o terceiro, no encontro entre o feminino e do
masculino.
O primeiro capítulo, Razão e Gênero, tem como objetivo analisar o contraponto da
razão na obra de Gilman. O ponto de partida do capítulo em questão é definir o conceito da
razão a partir de uma contextualização histórica à luz da filosofia - uma vez que o campo do
saber tem como base a busca pela razão - e discutir a associação da razão aos homens e a
emoção às mulheres. Em seguida, a partir de características da Terra das Mulheres e suas
nativas divergentes às do mundo no qual os exploradores vivem e das mulheres deste mundo,
são apontados os motivos pelos quais as nativas são racionais, enquanto os homens,
irracionais.
O segundo capítulo, intitulado Emoção e Gênero, tem como objetivo observar a forma
como as emoções são expressas ao longo da obra. Utilizando definições diversas no tocante à
emoção de acordo com a Filosofia, a Biologia, a Sociologia e a Psicologia, características
relativas ao lugar misterioso são analisadas a fim de verificar as influências de um gênero
sobre o outro na obra.
Por fim, o terceiro e último capítulo, Feminismo, Essencialismo e Construtivismo, é o
responsável pela união dos dois conceitos anteriormente discutidos neste trabalho. O seu
objetivo é expor como a presença masculina inibe as capacidades femininas comparando o
comportamento feminino do mundo exterior e do interior do país. Expõe-se brevemente a
história do movimento feminista e seus reflexos na literatura, principalmente no trabalho de
Gilman. Em seguida, se inicia a distinção entre o essencialismo e o construtivismo na obra em
questão utilizando como base autores com pontos de vista distintos. Debate-se, também, a
influência social acerca dos estereótipos de gênero e como esse fator altera o comportamento
das personagens, além de argumentar que a essência é construída socialmente.
10
1. RAZÃO E GÊNERO
1
No original: [...] “usually it refers to that faculty or process by means of which we gain “proper” knowledge or
truth” [...] ROONEY, Phyllis. Gendered Reason: Sex Metaphor and Conceptions of Reason. Hypatia, [s. l.], ano
1991, v. 6, n. 2, p. 77 - 103, Summer. 1991. p. 78.
2
No original: [...] ““Reason” has at least two different meanings: that of using complex thought processes such
as logical inference, and that of using means–end relationships to reach optimal problem solutions. The first
meaning contrasts reason with the intuitive and impulsive processes; the second contrasts it with the often
harmful and disorganizing aspects of emotions, and their command of primitive responses.” [...] FRIJDA, Nico
H. Interdisciplinary Foundations: The Psychologists’ Point of View. In: LEWIS, Michael; HAVILAND-
JONES, Jeannette; BARRETT, Lisa. Handbook of emotions. 3. ed. Nova Iorque: The Guilford Press, 2018. p.
82.
11
“verdade” e de “racionalidade” nunca são completamente imparciais, sendo fruto de cada
momento histórico.
O conhecimento acadêmico é gerado dentro de sistemas não completamente
democráticos, nos quais certos grupos têm privilégios, enquanto outros encontram grande
dificuldade de acesso. Apenas nas últimas décadas é que esforços mais sérios começaram a
ser empreendidos para que as vozes de grupos historicamente prejudicados, como as
mulheres, os africanos e os afro-descendentes, fossem ouvidos e respeitados por suas
reflexões. Os livros de História da Filosofia, até hoje, no entanto, continuam, em sua maioria,
ignorando as importantes contribuições desses grupos.
Embora não se ocupe de questões étnico-raciais, Herland subverte as associações
tradicionais entre Razão e o sexo masculino, muitas vezes provocando estranhamento em
certos leitores acostumados com a bagagem de significados preconceituosos que esse e outros
conceitos até hoje carregam no discurso popular. No enredo em questão, a primazia da razão é
atribuída explicitamente ao gênero feminino - uma vez que o próprio narrador o reconhece em
diversas passagens que “[...] eram inconvenientemente racionais aquelas mulheres [...]”
(GILMAN, 2018, p. 66). Para os exploradores, a racionalidade feminina é inconveniente
porque contraria a visão misógina derivada da História da Filosofia tradicional que tentaremos
reconstruir brevemente abaixo.
Na obra, The Man of Reason (1989), Genevieve Lloyd, conceitua a Razão, constituída
na filosofia clássica e influente, ainda hoje, na sociedade da seguinte maneira:
[...] A Razão figurou na cultura ocidental não apenas com relação às crenças, mas
também na avaliação do caráter. É incorporada não apenas nos critérios da verdade,
mas também em nossa compreensão do que a pessoa deve ser, os requisitos que
devem ser atendidos para ser uma boa pessoa e as relações adequadas entre os
nossos status como conhecedores e o resto de nossas vidas.[...]3 Além disso, o
pensamento racional é construído como a transcendência, controle ou transformação
das forças da natureza. [...] (LLOYD, 1989, p. IX, p. 2.) 4
Uma vez que durante séculos os homens impediram as mulheres de ter uma
participação mais ostensiva na vida social constrangendo-as às questões domésticas, e como
3
No original: [...] “Reason has figured in western culture not only in the assessment of beliefs, but also in the
assessment of character. It is incorporated not just into our criteria of truth, but also into our understanding of
what it is to be a person at all, of the requirements that must be met to be a good person, and of the proper
relations between our status as knowers and the rest of our lives.” [...] LLOYD, Genevieve. The Man of Reason:
"Male" and "Female" in Western Philosophy. In: LLOYD, Genevieve. The Man of Reason: "Male" and
"Female" in Western Philosophy. 3. ed. Minnesota: University of Minnesota Press, 1989. cap. Introduction, p. ix.
4
No original: [...] “Rational knowledge has been construed as a transcending, transformation or control of natural
forces;” [...] LLOYD, Genevieve. The Man of Reason: "Male" and "Female" in Western Philosophy. In:
LLOYD, Genevieve. The Man of Reason: "Male" and "Female" in Western Philosophy. 3. ed. Minnesota:
University of Minnesota Press, 1989. cap. Reason, science and the domination of matter:Introduction. p. 2
12
apenas eles costumavam ter acesso à uma educação mais completa, a consequência foi que o
sexo masculino fosse visto como o pólo ativo e racional, enquanto o feminino fosse
interpretado como “naturalmente” passivo e passional, quando na verdade esses estereótipos
foram socialmente construídos. Do mesmo modo, o que era aceito ou não como racional era
definido exclusivamente por homens e a serviço de seus próprios interesses. Ou seja, “[...] os
ideais de Razão vêm historicamente incorporados à exclusão do feminino e a feminilidade, e a
própria noção de feminino vem sendo parcialmente construída através desse processo de
exclusão.” (LLOYD 1989, p. x). 5
Tomando como partida as metáforas e ensaios de filósofos de renome como Platão,
Santo Agostinho, entre outros, podemos observar que os homens são vistos como seres de
pensamentos claros e determinados, enquanto as mulheres são consideradas vagas e confusas
por conta de sua proximidade com os sentidos e o corpo.
A dicotomia entre o feminino e o masculino, que favorece a esse último, pode ser
observada já na antiquíssima tabela Pitagórica da oposição, na qual a feminilidade era
explicitamente vinculada ao ilimitado, indeterminado, contra a masculinidade, ligada ao
delimitado, preciso. A tabela consistia (ver abaixo) em dez contrastes sendo que os
pertencentes à direita do quadro, eram vistos como superiores aos seus opostos. A
interpretação pitagórica desses elementos baseava-se no contraste entre forma (bom) e falta de
forma (ruim), de acordo com Aristóteles (2002).
Macho Fêmea
Limite Ilimitado
Luz Trevas
Bom Mau
Um Múltiplo
Direito Esquerdo
Repouso Movimento
5
No original:“our ideals of Reason have historically incorporated an exclusion of the feminine, and that
femininity itself has been partly constituted through such processes of exclusion.” LLOYD, Genevieve. The Man
of Reason: "Male" and "Female" in Western Philosophy. In: LLOYD, Genevieve. The Man of Reason: "Male"
and "Female" in Western Philosophy. 3. ed. Minnesota: University of Minnesota Press, 1989. cap. Introduction,
p. x.
13
Reto Curvo
Par Ímpar
Quadrado Retângulo
ARISTÓTELES. Metafísica: Livro A. In: ARISTÓTELES. Metafisica. São Paulo: Edições Loyola, 2002.
cap. A sapiência é conhecimento de causas, p. 29.
Platão argumenta, em seu diálogo Timeu (2001), que a Razão é menos clara nas almas
femininas pois elas são originadas das almas de homens que caíram pela falta de Razão.
Desse modo, elas estão mais próximas dos aspectos não racionais do mundo. Razão e
sentimentos ocupam campos opostos em alguns textos platônicos, mas se complementam em
outros. No livro IV de A República (2000), por exemplo, a alma é dividida em duas partes: a
racional e a irracional; ou seja, o ser humano precisa combinar a sabedoria com o prazer para
viver em harmonia uma vez que seu corpo é constituído das duas partes. Contudo, o alcance
da liberdade se dá com o domínio de sua parte racional sobre a irracional, assim, o emocional,
deve ser dominado para que se alcance conhecimento. Em, O Banquete (2003), no entanto,
Platão adiciona o conceito de amor e paixão na alma humana. De acordo com esse ensaio, o
amor apaixonado é o começo da caminhada da alma para alcançar a liberdade através do
conhecimento. O amor é o desejo pelo bem e pela felicidade e expressa a busca pela
imortalidade, uma vez que a procriação é a forma que a humanidade encontrou para se
imortalizar através das gerações.
Na Idade Média, Agostinho (1994) acreditava que a distância que existiria entre as
mulheres e a Razão tem uma causa biológica. Elas teriam menores funções intelectuais o que
tornaria mais difícil sua luta contra os desejos do corpo. E assim, ele explica porque, por falta
de controle, Eva foi influenciada pela serpente.
Aquino em Suma Teológica (2001), propôs que o primeiro homem simboliza o
funcionamento vital do ser humano, incluindo a Razão. Já a mulher, criada separadamente,
simbolizava a geração - a perpetuação da natureza sintetizada pelo seu oposto. Ele insiste que
a subordinação da mulher ao homem não significa que ela não tenha capacidades intelectuais.
No entanto, os sexos teriam papéis diferentes e igualmente importantes. A atividade
intelectual caberia ao homem, cabendo à mulher reproduzir a natureza humana, ou seja, gerar
filhos.
Em uma linha de pensamento semelhante, René Descartes, no início da Era Moderna,
afirma não haver diferença entre as mentes masculinas e femininas. Mesmo assim, caberia ao
14
homem ocupar-se com a reflexão, restando à mulher, preservar a esfera das atividades não
relacionadas ao pensamento, uma vez que o homem precisa descansar e relaxar. Embora
claramente em níveis hierárquicos diferentes, Descartes justifica essa desigualdade
argumentando que as atividades do puro intelecto e aquelas do resto da vida possuem o
mesmo peso e são igualmente importantes: “Se ele está a exercer a forma mais pura da Razão,
deve deixar as emoções e sensibilidade para trás; a mulher vai deixá-las intactas para ele.”6
(DESCARTES apud LLOYD, 1989, p. 50)
Durante o período Iluminista, considerado um marco na História da Filosofia,
filósofos como Kant, Rousseau e Hume defendiam o avanço do domínio da Razão, embora se
utilizassem de uma conceituação de “razão” muito mais ampla e complexa. Para Rousseau
(2001), por exemplo, a Razão não constituía-se em um conhecimento científico voltado para o
domínio da Natureza. De seu ponto de vista, a Natureza possui dois papéis no
desenvolvimento humano: ela está no passado, como um sentimento de nostalgia; e, no
futuro, como meta a ser cumprida:
6
Do original: If he is to exercise the most exalted form of Reason, he must leave soft emotions and sensuousness
behind; woman will keep them intact for him. LLOYD, Genevieve. The Man of Reason: "Male" and "Female" in
Western Philosophy. In: LLOYD, Genevieve. The Man of Reason: "Male" and "Female" in Western Philosophy.
3. ed. Minnesota: University of Minnesota Press, 1989. cap. Reason as attainment: Descartes method, p. 50.
7
No original: This enabled a new resolution of the ambivalence of the feminine to enter western thought. The
feminine was construed as an immature stage of consciousness, left behind by advancing Reason, but also as an
object of adulation, as the exemplar for Reason's aspirations to a future return to Nature. LLYOD, Genevieve.
The Man of Reason: "Male" and "Female" in Western Philosophy. In: LLYOD, Genevieve. The Man of Reason:
"Male" and "Female" in Western Philosophy. 3. ed. Minnesota: University of Minnesota Press, 1989. cap.
Reason and progress: Introduction. p. 58.
8
No original: “Reason as both the early flourishing of distinctively human nature and the beginning of its
corruption”. LLYOD, Genevieve. The Man of Reason: "Male" and "Female" in Western Philosophy. In:
LLYOD, Genevieve. The Man of Reason: "Male" and "Female" in Western Philosophy. 3. ed. Minnesota:
University of Minnesota Press, 1989. cap. Reason and progress: Rousseau: the lost youth of the world. p. 59.
15
verdade interior do ser humano; ela é ao mesmo tempo o modelo e a fonte da Razão. Através
do cultivo desta, a vida humana se torna expressão daquela. Assim, a Razão deve expressar o
natural e não o corrompido; desse modo, os dois são elementos complementares.
Com relação à dicotomia homem-mulher, Rousseau em Júlia ou a Nova Heloísa
(1994) acredita que as mulheres estão próximas a Natureza, de acordo com ele, elas nunca se
distanciaram da mesma. O que Rousseau diz, nas entrelinhas, contudo, é que as mulheres
nunca fizeram a jornada para alcançar a Razão. De acordo com Rousseau, permanecendo na
esfera doméstica, o gênero feminino ajuda a controlar os efeitos destrutivos das paixões na
esfera civil; os homens são bons cidadãos civis e, as mulheres, domésticas; o privado é o
domínio das virtudes, livre das corrupções mundanas, e é papel das mulheres influenciar a
sociedade civil através de seus maridos, filhos, pais irmãos etc.
Após a Era das Luzes, com o advento da Revolução Industrial, as chamadas “ciências
naturais” ganham cada vez mais prestígio. Durante o século XIX, os avanços no campo da
Biologia têm grande impacto nas concepções relativas ao Humano, em particular no que diz
refere à raça e gênero. O gênero era utilizado como metáfora para descrever a ordem “natural”
das raças: “As raças inferiores representam o tipo ‘feminino’ da espécie humana, e as
‘femininas’ a raça inferior do gênero” (STEPHEN, 1986, p. 264) 9. As “descobertas”
científicas influenciadas pelos estereótipos de gênero, os reforçavam. Buscava-se justificar
“cientificamente” a superioridade do gênero masculino muitas vezes através da comparação
anatômica do tamanho dos cérebros. Esses cientistas apresentavam o resultado de suas
pesquisas como se os dados empíricos revelassem imparcialmente uma superioridade que, em
realidade, já era tida como inquestionável antes mesmo de que os experimentos fossem
iniciados. Era esse o contexto da História das Ideias no qual Herland se insere ao ser
publicado ainda no início do século XX.
A primeira coisa que os homens exploradores do livro percebem relativo à Terra das
Mulheres é a organização excepcional do país. De fato, o lugar é tão organizado que antes
mesmo de aterrissarem o aeroplanador, eles já observam essa característica local: “[...] uma
9
No original: [...] “Lower races represented the ‘female’ type of the human species, and females the ‘lower race’
of gender” [...]. Stephan, Nancy. 1986. Race and gender: The role of analogy in science. Isis 77: 261-77.
16
terra perfeitamente cultivada, onde até as florestas pareciam bem cuidadas, uma terra que
parecia um enorme parque, e ainda mais um enorme jardim.” [...] “estradas limpas e bem
construídas, a arquitetura atraente, a beleza ordeira daquela cidadezinha.” (GILMAN, 2018. p.
20).
Os homens classificam as nativas como jardineiras e arquitetas, se surpreendendo com
seu domínio sob a natureza, capacidade que, para eles, está diretamente relacionada à
racionalidade e à inteligência. Essa associação é herdeira da concepção de conhecimento
utilizada por Francis Bacon (2015), filósofo que se utiliza do livro bíblico Gênesis para
explicar, em sua obra A Grande Restauração, que o homem precisa restaurar o seu domínio
da natureza perdida no pecado original.
Herland subverte a relação essa relação, dando outro sentido ao conceito de “domínio
da Natureza”. Ali, o desenvolvimento tecnológico é conduzido exclusivamente por mulheres,
e, talvez por isso, diferentemente do processo de industrialização Ocidental, elas conseguem
realizar suas intervenções na natureza sem tratá-la como um objeto a ser subjugado e
destruído, mas como uma parceira que merece respeito e cuidados.
17
Eu mesmo estava assombrado. Sou da Califórnia, e não há lugar mais agradável,
mas quando se trata de cidades… Com frequência eu grunhia ao ver a bagunça
ofensiva que o homem fazia na natureza, [...] Mas aquele lugar![...] -Não tem sujeira
[...] -Nem fumaça [...] -E nada de barulho.” [...] (GILMAN, 2018, p. 28)
Essas características, assim como outras que expõem a organização do país, são
enfatizadas durante toda a obra. Os avanços urbanísticos e tecnológicos dessa comunidade,
são frutos da engenhosidade feminina, representada como mais apta a respeitar a natureza.
Todas essas realizações, todavia, só se tornam possíveis devido à ausência de homens na
localidade.
Sem eles, as mulheres têm condições de desenvolver todo o seu potencial. Nem
mesmo as diferenças fisiológicas entre os sexos são capazes de impedir em Herland que as
mulheres se tornem tão, ou até mais fortes fisicamente, do que os homens. “Ela me chutou,
[...] eu estava encolhido de dor, é claro, então ela pulou em cima de mim [...] Elas me
dominaram logo depois. Acho que Alima podia até ter conseguido sozinha. [...] É forte como
um cavalo” (GILMAN, 2018, p. 156).
Ao ouvirem boatos sobre a Terra das Mulheres, Van, Terry e Jerry se empolgam com
a possibilidade de um lugar apenas com moças. A ideia de um paraíso no qual eles poderiam
desfrutar dos atributos femininos os agradou grandemente. Todavia, as mulheres que eles
encontraram eram muito diferentes dos estereótipos que eles conheciam. [...] “essas mulheres
não são femininas” (GILMAN, 2018, p. 69). Isso se dá não só pela grande capacidade física
das mulheres de Herland mas, entre outros motivos, também porque, diferentemente do
estereótipo feminino do final do século XIX e início do XX, elas não se importam com coisas
materiais, nem com vestimentas ou com sua aparência, de modo que elas são mais
racionalmente práticas do que os homens. Esses, por sua vez, demonstram diversas vezes
estarem preocupados com seus cabelos e barbas durante sua estadia no país feminino:
É claro que eram meninas, meninos nunca teriam aquela beleza resplandecente, mas
nenhum de nós teve certeza a princípio. (GILMAN, 2018, p. 24)
[...] Seu cabelo tinha crescido desde a última vez que fora ao barbeiro, e os chapéus
disponíveis lembravam os dos príncipes dos contos de fadas, tirando a pena. O
figurino era parecido com a roupa das mulheres (GILMAN, 2018, p. 36)
[...] -Se usassem o cabelo um pouco mais comprido, ficariam muito mais femininas
[...] estamos convencidos de que cabelo comprido ‘pertence’ à mulher [...] também
senti falta do cabelo longo. (GILMAN, 2018, p. 41)
[...] Não queríamos manter a barba [...].” (GILMAN, 2018, p. 55)
Não por acaso, em seu país, a educação é a parte mais importante de sua sociedade e
não se limita aos espaços familiares e escolares - conceitos esses que nem mesmo existem em
seu país.
Elas herdaram toda a devoção e o cuidado que aquele grupo inicial poderia ter
deixado. [...] Os registros do passado foram preservados, e por anos as mulheres
mais velhas usaram seu tempo ensinando aquilo do que eram capazes, passando para
o grupo de irmãs e mães tudo o que possuíam em termos de habilidade e
conhecimento. (GILMAN, 2018, p. 68)
Era a psicologia desgraçada delas! Ali estavam aquelas mulheres, com um sistema
educacional profundamente desenvolvido, tão arraigado que, mesmo que não fossem
professoras por profissão, todas tinham certa proficiência no assunto - era algo
natural para elas. (GILMAN, 2018, p. 141)
A cada passo da enriquecedora experiência que era viver, descobriam que o assunto
que estudavam se alargava mediante o contato com uma gama infinita de interesses
comuns. Tudo o que aprendiam estava relacionado, desde o primeiro tópico;
relacionado umas às outras e à prosperidade nacional. (GILMAN, 2018, p. 114)
19
O método de educação apresentado por Gilman faz com que as meninas aprendam
coisas complexas de forma simples, sem nem mesmo perceberem:
- [...] Nosso trabalho nos leva pelo país inteiro [...] Não podemos viver em um
único lugar o tempo todo. [...]
- Um homem quer casa própria onde a esposa e os filhos possam ficar. [...]
- E o que a esposa faz lá? [...] -Qual é o trabalho dela?
- [...] nossas mulheres não trabalhavam, com algumas exceções.
- Mas o que elas fazem se não trabalham? [...]
- Cuidam da casa e das crianças. [...] Falamos em ‘deveres sociais’ [...]
falamos de hospitalidade, entretenimento, inúmeros ‘interesses’ [...]
(GILMAN, 2018, p. 109 - 110)
20
Certos costumes e crenças de Herland, apesar de causarem certo estranhamento inicial
nos visitantes também são representados como mais racionais do que seus correspondentes na
cultura Ocidental. Um deles é sua peculiar forma de maternidade. Por ser um país
inteiramente baseado na coletividade, e conceito de família não existir, todas as meninas são
filhas de todas, mesmo quando a mulher não é mãe biologicamente. [...] “temos milhões de
crianças para amar e servir. Nossas filhas” (GILMAN, 2018, p. 82). Os homens se surpreendem
ao perceber as diferenças entre as mães do mundo exterior e as do exótico país. “Não
queríamos que aquelas mulheres pensassem que nossas mulheres, de quem tanto nos
vangloriávamos, eram de alguma forma inferiores a elas” (GILMAN, 2018, p. 81).
A importância que essas mulheres dão à maternidade vêm a partir do modo como elas
se reproduziam em um país com a ausência de homens. No começo da narrativa, acredita-se
que existam alguns homens para que a espécie se perpetue, contudo, as nativas explicam que
o nascimento acontece a partir da partenogênese; ou seja, elas engravidam através do desejo
de gerar uma vida, sem a necessidade da figura masculina. Essas mulheres são tão
cientificamente evoluídas que não precisam sequer do sexo oposto para perpetuar a sua
espécie. Dessa forma, a autora não só inferioriza o masculino na esfera racional como o exclui
integralmente.
As mulheres da Terra das Mulheres passam seu conhecimento de geração a geração,
mas o conceito de imortalizar a sua linhagem familiar não lhes é atribuído uma vez que elas
não se separam por famílias.
- Mas não há sobrenomes então? [...] Nenhum nome de família? [...]
- Por que haveria? Descendemos da mesma fonte. Somos uma única família.
[...]
- Mas cada mãe não deseja que sua filha carregue seu nome? [...]
- Não. E por quê? A criança já tem nome.
- Ora para identificação. De modo que as pessoas saibam de quem é a criança.
- [...] quanto a todos saberem quem é a filha de quem… Que importância tem
isso?” (GILMAN, 2018, p. 87)
21
Foi então que um milagre aconteceu: uma dessas mulheres ficou grávida. [...] E essa
é a origem da Terra das Mulheres! Uma família, descendendo da mesma mãe! [...]
viveu como Rainha-Mãe e Sacerdotisa de todas elas; [...] (GILMAN, 2018, p. 67-68)
Seu Deus é um homem maior que os outros? [...]
-Bem, sim [...] insistimos na ideia Dele como pessoa, um homem… de bigode. [...]
ideia patriarcal [...] atributos do patriarca, do avô. (GILMAN, 2018, p. 126)
22
2. EMOÇÃO E GÊNERO
Como foi dito no capítulo anterior, ao longo dos anos, o conceito de Razão sempre foi
prioritariamente atribuída ao sexo masculino, e a Emoção ao feminino. Vimos, a partir de uma
contextualização histórica, os motivos pelos quais o conhecimento/racionalismo foi conferido
aos homens pelo menos desde Pitágoras, e como essa crença foi alvo da crítica de Gilman.
Nesse capítulo, observaremos os rótulos emocionais socialmente concedidos aos gêneros, e
como Charlotte Perkins Gilman problematiza esses estereótipos em sua obra Herland.
É longa a trajetória da ideia de que as emoções são obstáculos para a razão. Os
filósofos estóicos já compreendiam “as emoções como erros conceituais que levam o homem
à infelicidade” (SOLOMON, 2018, P. 5) 10. Em A retórica (1982), Aristóteles dedica uma
parte de sua tese para definir as emoções; e ali, ele assume que as emoções afetam os
julgamentos e os transformam, de modo que um homem, quando assolado por emoções, perde
sua capacidade de julgar corretamente.
Considerada o oposto da razão, principal campo de interesse da Filosofia, a emoção
era vista como uma armadilha, um perigo a ser evitado na busca pelo conhecimento. Ou seja,
as emoções eram - e muitas vezes ainda são - colocadas em um campo inferior quando
comparadas ao racionalismo; sendo vistas como “mais primitivas, menos inteligentes, mais
bestiais, menos dependentes e mais perigosas” (SOLOMON, 2018, p. 3) 11.
Em A República, Platão (2000) diz que a alma é dividida entre a Razão e a Emoção e
para que se alcance a liberdade, a Razão deve controlar a parte emocional da alma. Ele
também acredita que o apetite está localizado na parte irracional do ser, assim, os desejos são
resultados da emoção.
Essa associação se assemelha, até certo ponto, à realizada filósofos cristãos, como
Tomás de Aquino e Agostinho, ligando as emoções diretamente aos desejos. Pudemos
observar essa visão no capítulo anterior, quando mencionamos que esses filósofos em suas
10
No original: [...] “emotions as conceptual errors, conducive to Misery.” [...] SOLOMON, Robert C.
Interdisciplinary Foundations: The Philosophy of Emotions In: LEWIS, Michael; HAVILAND-JONES,
Jeannette; BARRETT, Lisa. Handbook of emotions. 3. ed. Nova Iorque: The Guilford Press, 2018. p. 5.
11
No original: [...] “more primitive, less intelligent, more bestial, less dependable, and more dangerous” [...]
SOLOMON, Robert C. Interdisciplinary Foundations: The Philosophy of Emotions In: LEWIS, Michael;
HAVILAND-JONES, Jeannette; BARRETT, Lisa. Handbook of emotions. 3. ed. Nova Iorque: The Guilford
Press, 2018. p. 3.
23
obras relacionavam o conhecimento ao masculino, e o corpo e a emoção ao feminino a partir
de suas leituras do livro Gênesis. Seu principal objetivo em suas obras era relacionar esses
desejos ao pecado como a ganância, a gula, a luxúria, a raiva, a inveja, o orgulho, etc.
Certamente as emoções exercem influência no resultado de processos decisórios
(LANDIS; HUNT, 1949), mas essa influência nem sempre é negativa, como alguns
pensadores começaram a sugerir a partir do século XVIII. Filósofos como Hume e Kant
acreditavam que as emoções não eram necessariamente inferiores. A chamada “Era da
Razão”, da qual esses pensadores são considerados expoentes, bem como a própria noção de
“razão” por eles defendida, são mais complexas do que normalmente se imagina.
Hume (2000) explica, por exemplo, que as paixões são indissociáveis do pensamento
humano, e que ao invés de almejar utopicamente livrar-se por completo delas para desobstruir
os caminhos da razão, os pensadores deveriam admitir que só lhes resta tentar ser conduzidos
por paixões que sejam boas, as quais ele chama de “paixões calmas”. Ele diz na sua
importante obra Tratado da Natureza Humana que “a Razão é, e deve ser, apenas a escrava
das paixões, e não pode aspirar a outra função além de servir e obedecer a elas.” (HUME,
2000, p. 451). De acordo com ele, a vida humana se resume na luta entre as “paixões calmas”
- sentimentos como benevolência e amor - e as “paixões violentas” - sentimentos como fúria e
desejo, sentimentos imediatistas - e, é essa luta que torna a vida humana diversa e cada ser
diferente do outro.
Antes do século XX, muitos cientistas chegaram a considerar as emoções como uma
desorganização neural. No século XIX, todavia, a partir das pesquisas biológicas de Darwin,
as emoções começaram a ser vistas como uma vantagem necessária para a nossa
sobrevivência, ao invés de um impecilho ao nosso crescimento. Assim, as emoções seriam
resultado da adaptação humana, e teriam funções evolutivas como a exploração e expansão de
competências, a regulação de interações sociais, a adaptação em diferentes situações, etc.
Embora no séculos XX e XXI os pesquisadores do campo da psicologia nem sempre
estejam de acordo sobre o caráter evolutivo das emoções, parece haver um certo consenso de
que elas são reações do corpo acerca de mudanças ao redor do indivíduo, como apontado por
William James, ainda no século XIX (JAMES, 1884).
Dessa perspectiva psico-fisiológica, as emoções são definidas como respostas
corporais à estímulos internos ou externos. Por exemplo, uma criança que cai ao correr, sente
a emoção da dor, como resultado de sua queda. De acordo com Frijda (2018), “as emoções
24
não se iniciam voluntariamente nem podem ser modificadas com o desejo” (p. 72)12. Contudo,
hoje acredita-se que as emoções, apesar de serem involuntárias, são passíveis de regulação
através de estratégias que as eliminam, mantêm ou modificam. A regulação de emoções se dá
de acordo com pressões culturais (regras, estereótipos, poder/status) e/ou de acordo com
fatores relacionados à personalidade (motivações, conflitos, metas…) (ibidem).
É notória a diferença comportamental no que diz respeito ao emocional de cada pessoa
em contextos sociais distintos. Segundo Farmiga (2006), “ao tratar dos comportamentos
emocionais entre homens e mulheres essa diferença aumenta” (p.1). Isso se dá porque
mulheres e homens crescem em sociedade de modo a terem motivações e objetivos distintos,
o que faz com que tenham diferentes processos mentais/emocionais.
Conforme apontam Brody e Hall (2018), os objetivos sociais/interpessoais que
diferem para homens e mulheres incluem papéis de gênero prescritos culturalmente,
motivações sociais, e o desequilíbrio entre poder e status entre os dois sexos. Ou seja, as
diferenças no campo emocional entre os gêneros se dá por questões culturais, não naturais ou
biológicas.
Para Shields, Garner, Leone e Hadley (2007), a conexão entre gênero e emoção tem
relação com estereótipo primários, como “ela é emocional, ele não”. Esses estereótipos
influenciam as respostas das pessoas sobre suas próprias experiências. Assim, os estereótipos
socialmente construídos ditam como as pessoas devem agir em determinadas situações. Essas
crenças sobre os gênero afetam as interações interpessoais de modo inconscientemente.
Hall e Briton (1993) afirmam que os estereótipos geram expectativas sobre nós
mesmos. Os padrões são implícitos e agem de acordo com as normas culturais que regulam
como, quando e onde as emoções podem ser expressas por homens e mulheres. Os indivíduos
de determinada sociedade são mais ou menos compelidos a se enquadrar no que é socialmente
aceito como “adequado”. É o caso de discursos como “garotos não choram” e “meninas são
boas”.
Existe uma conexão entre masculinidade e expressão de poder (FISCHER, 1993). “Os
estereótipos de emoção de gênero são fundados na crença de que os homens expressam
emoções poderosas, enquanto as mulheres expressam emoções imponentes” (SHIELDS et al.,
2007, p.70). Porém, esse estereótipo vigente na maioria das sociedades - incluindo a dos
homens do livro - desconsidera que o gênero masculino também fica triste e que sentimentos
12
No original: [...] “They are not initiated by voluntary planning, cor can they be readily modified by will.” [...]
FRIJDA, Nico H. Interdisciplinary Foundations: The Psychologists’ Point of View. In: LEWIS, Michael;
HAVILAND-JONES, Jeannette; BARRETT, Lisa. Handbook of emotions. 3. ed. Nova Iorque: The Guilford
Press, 2018. p. 72.
25
menos poderosos podem significar mais controle emocional - que é o caso das mulheres da
obra de Gilman.
As emoções, portanto, não são úteis ou inúteis por elas mesmas, mas poderão
beneficiar mais a determinado grupo do que outro, de acordo com o contexto discursivo nos
quais os sujeitos estejam imersos.
[...] Falamos coisas muito bonitas sobre as mulheres, mas em nosso coração
sabemos que são seres bastante limitados - a maior parte delas. Nós as honramos por
suas capacidades funcionais e às vezes as desonramos por fazer mal uso disso; nós
as honramos por sua virtude meticulosamente forçada ao mesmo tempo em que
mostramos com nossa própria conduta quão pouca consideração damos à virtude;
nós as valorizamos, sinceramente, pelas atividades maternais que fazem de nossas
esposas calorosas serviçais, ligadas a nós pela vida com o salário que desejamos;
todo o que fazem, com exceção dos deveres temporários da maternidade caso à
atinjam, é para atender às nossas necessidades de um jeito ou de outro. Ah, nós as
valorizamos, isso é certo, ‘em seu lugar’, que é o lar [...] Mas essa combinação de
tarefas [...] não desperta o tipo de emoção generosa proporcionada pelas mulheres
daquela terra. Era preciso venerar aquelas mulheres, em vez de rebaixá-las. Não
eram animais de estimação. Não eram criadas. Não eram serviçais, inexperientes,
fracas. (GILMAN, p. 154-155)
As nativas são mais passivas no que diz respeito ao emocional, são mais calmas e
compreensivas; os homens são mais viris, explosivos, nervosos e impacientes - isto é, os
gêneros agem emocionalmente de acordo com esperado na sociedade - todavia, no que tange
à exposição de emoções, os exploradores não economizam ao serem explosivos e impulsivos
ao passo que as mulheres se relacionavam em sociedade com tranquilidade: “Elas esperaram
tranquilamente [...] eram calmas como vacas” (GILMAN,p. 32).
Em outra ocasião, elas são descritas como sem paciência em um contexto de tentativa
masculina de dominação. Essa caracterização, no entanto, talvez tenha se dado de maneira
injusta, pois Terry está frustrado por ter brigado com Alima, e Van discorda de sua opinião:
26
[TERRY:] - Elas não têm paciência, não são submissas, não têm nada da docilidade
natural que é o maior charme da mulher.
[VAN:] - Essas mulheres têm a maior virtude da humanidade, com menos falhas que
qualquer outra pessoa que já vi. Quanto à paciência, teriam nos lançado no penhasco
no dia em que aparecemos, se não a tivessem. (GILMAN, p. 111)
Assim, a calma e a sensatez das nativas de Herland, são resultado de sua criação, do
meio social em que vivem, de sua cultura; distantes da impulsividade masculina, a raiva, o
descontrole, do mundo exterior. “É o que todas queremos, é claro. Paz, beleza, conforto e
amor ao lado de Deus! E progresso também, não esqueça; crescimento sempre. É o que nossa
religião nos ensina a querer e a trabalhar para conseguir.” (GILMAN, p. 130).
As mulheres da Terra das Mulheres tinham uma preocupação constante com sua
evolução “O tema da evolução lhes interessava muito; de fato, todo o campo das ciências
naturais era irresistível para elas. Muitas teriam arriscado tudo para ir estudar as nossas terras
desconhecidas e estranhas” (GILMAN, p. 157). É notório que, a “falta” de emoções
“negativas” das nativas, era resultado de sua evolução. Elas não tinham motivos para ter
medo, ou raiva, inveja etc., assim, essas emoções não as afetavam, diferentemente dos
homens, que vieram de uma terra na qual essas emoções eram comuns e se sentiam
intimidados pela perfeição da sociedade matriarcal “Ninguém de nós queria contar àquelas
mulheres sobre as falhas de nossa amada terra. Assumíamos que eram necessárias e
essenciais, e até criticávamos (apenas entre nós) a civilização excessivamente perfeita delas.”
(GILMAN, p. 130).
As nativas têm certeza de seus ideais e desejos, e não são seduzidas facilmente: “Mas
o que eu sinto e o que você sente, querido, não me convencem de que você esteja certo. Até
que eu esteja segura disso, não posso fazer como deseja” (GILMAN, 2018, p. 152). No que se
refere aos relacionamentos, elas não conhecem outro amor além do de mãe, enquanto os
homens buscam o amor romântico que eles conhecem de sua terra natal. Vivendo em uma
sociedade “perfeita” - como o narrador diz algumas vezes - as moças não sabem como reagir
em situações que elas não conhecem, como o crime cometido por Terry: “Elas não sabiam
como abordar aquele tipo de coisa; desconheciam por completo o costume da indulgência
matrimonial que reina entre nós.” [...] (GILMAN, p. 151) Essa abordagem explica, também, a
calma das moças, sua falta de desejos sexuais e impulsividades; assim como o contrário no
tocante aos homens do livro. As moças não têm desejos contra os quais lutar [...] “o
sentimento sexual que havia entre nós na mente delas se expressava em termos de amizade, o
único amor puramente sexual que conheciam e de familiaridade” (GILMAN, 2018, p. 109).
27
Enquanto as nativas da terra descoberta não agem da forma esperada pelos homens, os
homens ora são representados de modo a quebrar os estereótipos associados ao seu gênero,
ora são estereotipicamente viris, sexuais, orgulhosos.
Ao longo da obra podemos notar a impulsividade masculina - principalmente no que
diz respeito ao Terry. No início da obra, os homens se sentem desconfortáveis pela situação
em que se encontram, por isso, sentem o desejo de fugir mesmo estando em um ambiente
pacífico, controlado e sendo respeitados, ao longo do capítulo 3 de Herland, Terry cita
diversas vezes que quer fugir e que está farto, ignorando as circunstâncias.
Notei a mandíbula apertada de Terry. Não era lugar para homens? Perigoso? Ele
parecia capaz de subir a cachoeira naquele mesmo instante. (GILMAN, 2018, p.
109)
[...] Terry logo se deu conta de que era inútil insistir e aproveitou um segundo em
que conseguiu se soltar para puxar o revolver e atirar para cima (GILMAN, 2018, p.
33)
13
No original: [...] “those in higher-ranking positions experience positive emotions such as happiness and pride,
while those in lower-ranking positions experience negative emotions like anger and fear.” TURNER, Jonathan
H.; STETS, Jan E.. Interdisciplinary Foundations: The Sociology of emotions. In: LEWIS, Michael;
HAVILAND-JONES, Jeannette; BARRETT, Lisa. Handbook of emotions. 3. ed. Nova Iorque: The Guilford
Press, 2018. p. 35.
28
Terry protestou - Ir a uma escola para moças… A essa altura da vida! Quero sair daqui!”
(GILMAN, p. 43).
O machismo presente na obra é o motivo pelo qual os homens atribuem expectativas
de acordo com suas concepções de mundo com relação às nativas da Terra das Mulheres. “Lá
estava eu, com um ideal em mente, o qual eu desejava com ardor;” (GILMAN, p. 143) Suas
emoções acerca do que buscavam encontrar, faziam-nos perder a razão e não agirem de
acordo com o que era julgado correto pela sociedade vigente - a Terra das Mulheres, nesse
caso. Percebe-se isso na naturalidade com a qual Van lida com a tentativa de estupro cometida
pelo seu companheiro. Segundo ele, o ato não era considerado crime e Terry estava em seu
direito de marido: “-Ah, por favor, é uma palavra dura demais para o que ele fez. Afinal,
Alima era esposa dele - eu disse, sentindo uma repentina explosão de simpatia por Terry”
(GILMAN,p. 152) .
Perkins atribuiu o desejo ao sexo masculino em diversas passagens. Prova disso, é que
a iniciativa dos personagens de explorarem a Terra das Mulheres se deu pelo desejo dos
mesmos de encontrarem um paraíso constituído apenas de moças as quais eles pudessem
desfrutar. “Ele estava bastante animado. [...] -Se voltarmos -sugeri animado. [...] -Seria
preciso uma ordem judicial para me deter! [...] -Vou me sair bem com todas elas, e jogar umas
contra as outras. Serei eleito rei em pouco tempo!” (GILMAN, p. 14-17)
Em Herland, apesar dos homens terem bagagem cristã, não possuem qualquer controle
com relação a sua sexualidade e não a reconhece como pecado sexual, assim como não o
fazem com a raiva, o orgulho etc. Prova disso é que Terry tenta estuprar sua esposa, e não
sente qualquer remorso com o ato, assim como seu amigo Van, que o defende em algumas
passagens. Contudo, ao mesmo tempo em que os filósofos, classificavam essas emoções como
pecaminosas, outras como esperança, amor e fé eram consideradas virtudes para o
cristianismo e, em alguns casos, relacionadas ao estado racional.
29
3. FEMINISMO, ESSENCIALISMO E CONSTRUTIVISMO
A chamada primeira onda do feminismo teve seu início no final do século XIX na
Inglaterra. As sufragistas reivindicavam, principalmente os direitos políticos femininos, como
o direito ao voto e a liberdade de expressão. O feminismo acaba perdendo força na década de
1930, e só recupera seu vigor na década de 1960.
Durante esses 30 anos, a publicação do Segundo Sexo de Simone De Beauvoir em
1949 considerada ainda hoje uma das maiores obras feministas, marcou as mulheres e
embasou as teorias da segunda onda do movimento. Outro livro importante nesse período foi
A mística feminina de Betty Friedan, lançado em 1963.
Nessa segunda etapa, o movimento torna-se mais libertário e foca nas relações de
poder entre os homens e as mulheres. Essa é considerada a fase do feminismo radical e foi
marcada pela oposição binária entre os gêneros. Esse ponto de vista pode ser observado na
obra de Firestone (1970), The Dialectic of Sex. De acordo com Caplan-Bricker (2018), a
segunda onda “traçava uma linha que ia do pensamento binário das feministas radicais e das
lésbicas separatistas até o essencialismo biológico que podia facilmente ser um tiro pela
culatra”.
30
Essa visão da superioridade feminina e o essencialismo da diferença entre os sexos
foram abandonados, em larga medida, com o advento da terceira onda. A vertente feminista
radical - hoje em dia chamada de femismo14 - contudo, ainda conserva esses pressupostos.
Por fim, a terceira onda, se iniciou nos anos 1990 e foi ao mesmo tempo uma
continuação da luta pela liberdade e uma reação aos extremismos que lhe antecederam.
Admitindo um ar mais profissional, com a criação de ONGs, o movimento se tornou mais
respeitado e reconhecido mundo afora, além de ter se aproximado do Estado. “Uma das
questões centrais dessa época era a luta contra a violência, de que a mulher é vítima,
principalmente a violência doméstica” (PINTO, 2010. p. 17). O ponto chave dessa onda
feminista é que o movimento percebeu que diferentes grupos de mulheres, reivindicavam
diferentes questões, ou seja, um feminismo só não era pertinente à todas.
Hoje em dia, o movimento não se atém à classe média branca europeia - como a
primeira onda -, nem à polarização sexual - como a segunda -, mas reconhece a pluralidade
feminina e dá voz a distintos grupos de mulheres. Por isso suas diferentes vertentes como:
feminismo liberal, negro, radical, transfeminismo etc.15
No que diz respeito à literatura, a crítica feminista expõe os efeitos do patriarcado na
sociedade. Considerando a literatura como um ato político, as diferentes formas de arte são
vistas como refletindo as ideologias e as relações de poder inseridas em determinada cultura
(VENTURINO, 2013). Os homens colocaram a si próprios ao longo da história literária como
o centro do universo, enquanto as mulheres são objetificadas ou apenas ignorados. Os homens
representam o universal, enquanto as mulheres só podem representar o particular:
14
Para mas informações acerca do termo ver: Laura VIEIRA Moura, LOUYSE DE FREITAS MACHADO,
STELLA DE SOUZA SCHIMIDT, SINARA CASARIN. Feminismo x Femismo 2016. Disponível em:
http://trabalhos.congrega.urcamp.edu.br/index.php/micjr/article/view/528. Acesso em 18 de outubro de 2019.
15
Para mas informações acerca das diferentes vertentes do feminismo, ver: https://medium.com/qg-
feminista/quais-s%C3%A3o-as-principais-vertentes-do-feminismo-ae26b3bb6907 Acesso em: 18 de outubro de
2019.
16
No original:[...] an androcentric worldview also splits men and women indo radically unequal categories.
Since man is associated with universality, he is seen as the model of normality, as well as of reason and activity
in the outside world. Woman, without subjetivity, becomes an object of particularity, of excedption, and is
associated with the body, the emotions, passivity, and the home. [...] VENTURINO, Steven. The C. I. G. to
Literary Theory and Criticism. New York: Alpha Books, 2013. p. 153
31
A crítica literária feminista argumenta que um jeito de mascarar o patriarcado é fazê-lo
parecer natural e necessário. Dessa forma, a natureza textual masculina se torna
manipuladora, ou seja, a literatura escrita por homens é uma força política e social que
objetiva impor socialmente a divisão dos sexos e transformar a lei moral em natural. Como
resultado, as mulheres-leitoras internalizam as características a elas atribuídas e as tomam
como atributos inatos. Assim, as mulheres se tornam oprimidas.
No mundo patriarcal, os livros favorecem aos homens e suas experiências. Dessa
forma, as mulheres eram forçadas a ler sobre personagens femininas criadas a partir do
preconceituoso ponto de vista masculino. Isso fez com que, ao longo da história literária, as
mulheres fossem colocadas para desempenhar dois papéis básicos: o de anjo ou de monstro;
i.e, a mulher excessivamente boa, ou exageradamente má.
A mulher suburbana é o modelo perfeito de esposa, filha e mãe; ou seja, assume papel
de submissão e é vista como o “outro” do homem. Já a mulher que inverte esses estereótipos é
entendida como fora de controle, um monstro. Na literatura feminista ou feminina, a autora
deve, transcender os papéis atribuídos pelos homens às mulheres e, então, escapar da
dicotomia anjo/monstro.
A escrita feminina surge, então, no final do século XIX, com a intenção de subverter
essa visão conferida às mulheres pela literatura masculina. De acordo com Elaine Showalter
(1997)17 houveram três fases na escrita feminina, assim como as três ondas do feminismo,
entretanto, as três fases daquela, não acompanharam as dessa - a primeira onda literária da
escrita feminina, antecedeu a criação do conceito de “feminismo”.
Entre 1840-1880, na primeira fase da escrita feminina - feminine phase -, as autoras
buscavam as conquistas masculinas e mostravam-nas internalizando as crenças masculinas a
respeito das mulheres. Poucas eram as escritoras valorizadas nessa época, por essa razão,
muitas utilizavam pseudônimos a fim de publicar suas obras como Mary Ann Evans que
escrevia como George Eliot, por exemplo.
A segunda fase, intitulada feminist phase, ocorreu juntamente com a primeira onda do
feminismo - por isso esse título -, entre os anos 1880 e 1920. Nessa época, escritoras como
Charlotte Perkins Gilman e Kate Chopin, passaram a usar a literatura para rejeitar a
acomodação da feminilidade e confrontar diretamente os efeitos negativos do patriarcado
sobre as mulheres.
17
Newton K.M. Elaine Showalter: ‘Towards a Feminist Poetics’. In: Newton K.M. (eds) Twentieth-Century
Literary Theory. Palgrave, London, 1997. p. 216-220
32
Por fim, o terceiro, e ainda vigente, período da escrita feminina começou nos anos
1920. Nele se consagraram escritoras como Virginia Woolf e Dorothy Richardson que
rejeitavam as duas posturas anteriores: imitação e protesto; ou seja, agora o foco da literatura
feminina se torna a experiência das mulheres, não a comparação com os homens.
Agora que já apresentamos as 3 ondas da história do movimento feminista, e os 3
períodos da escrita feminina/feminista, retomemos os conceitos de “essencialismo” e
“construtivismo” (ou construcionismo).
De acordo com a crença essencialista, o natural é reprimido pelo social. “A tradição
Essencialista defende a idéia de que a sexualidade é determinada por fatores biológicos e
fisiológicos, confirmando então sua estabilidade, não sendo suscetível a nenhum tipo de
variação” (FUSS, 1989. p. 250). Sendo assim, segundo essa visão, o gênero é uma
característica estável e permanente nos indivíduos.
Com o avanço dos estudos essencialistas e de gênero, o termo passou a ser entendido
em sentido mais amplo:
O essencialismo não implica necessariamente determinismo biológico ou uma
ênfase do biológico para a explicação das especificidades do gênero (embora
historicamente o determinismo biológico tenha sido uma forma de essencialismo
referente ao gênero). É o fato de se assumir a existência de qualidades ou
características de e nos indivíduos, e não as suas origens (biológicas ou sociais) que
define o essencialismo (NOGUEIRA, 2001, p. 55).
33
Diana Fuss (1989), vai mais longe em seu argumento e afirma que a própria essência é
construção histórica, isto é, o natural é produzido pelo social. Isto é, o construtivismo
interpreta o essencialismo como um mecanismo de preservação de poder social, econômico e
político. “O discurso do gênero envolve a construção da masculinidade e da feminilidade
como pólos opostos e a essencialização das diferenças daí resultantes” (NOGUEIRA, 2001,
p. 56).
Dessa forma, tanto homens quanto mulheres aceitariam - inconscientemente - as
distinções de gênero visíveis a nível estrutural, a ponto de assumirem para si os traços
pertinentes a cada sexo dentro de sua cultura. Segundo Crawford (1995), além dessa
internalização de atributos considerados femininos, as mulheres também internalizam a
inferioridade, a desvalorização e a subordinação a elas designados. Constata-se, assim, que o
gênero, é performativo, isto é, se faz, se constrói, como afirmado por Simone de Beauvoir e
Judith Butler.
“As observações do mundo sugerem que existem duas categorias de seres humanos—
homens e mulheres” (NOGUEIRA, p. 47), contudo, o construtivismo questiona e busca
responder os motivos pelos quais essa categorização e distinção é tão importante a ponto das
categorias de personalidade se basearem nela. Ou seja, construtivistas como Gerden (1992)
buscam compreender a necessidade dessa distinção entre homens e mulheres uma vez que
elas não refletem nenhuma realidade concreta além das diferenças referentes aos órgãos
reprodutores.
34
sua opinião acerca do feminino, mas também The Yellow Wallpaper (1892), um conto
inspirado em sua experiência com a maternidade que aborda a depressão pós-parto, e os
antiquados e preconceituosos diagnósticos e tratamentos psiquiátricos para mulheres no
século XIX; Women and Economics (1898), obra na qual a autora disserta sobre o papel da
mulher na sociedade, na política e na economia; e a revista feminista editada por ela The
Forerunner (1909-1916).
Em Women and Economics, a autora toma uma posição claramente construtivista pois
“sugere que a feminilidade e a masculinidade são construções sociais que podem ser
modificadas para que possamos nos enxergar como seres humanos [em primeiro lugar] que
podem ou não ser de gênero distintos” (DE SIMONE, 1995). Ela tinha consciência que a
cultura vigente possuía - e ainda possui - construções estereotipadas dos papéis masculinos e
femininos. As mulheres nascem condicionadas a condutas estabelecidas socialmente que as
privam de liberdades de escolhas. Para Gilman, as mulheres deveriam ser parceiras de seus
maridos, e não submissas; homens e mulheres deveriam evoluir juntos para manter uma
sociedade equilibrada.
Gilman acredita que a transformação social é necessária, tanto as mulheres, quanto
os homens teriam que mudar. Essa mudança viria a proporcionar um mundo melhor,
onde todos sairiam ganhando, as mulheres com a possibilidade de ampliar os
horizontes profissionalmente, ajudando no sustento do lar, e os homens ganhando a
possibilidade de experimentar participar do sustento emocional do lar, da vida
familiar. (MATIOLEVITCZ, 2019, p. 39)
18
No original: [...] “By stating that the society is free of fear due to the absence of men Perkins Gilman is not
promoting equality of sexes as she is perpetuating the stereotype of violence being associated with men.” [...]
BOWERS, Elinor. Exploration of how Charlotte Perkins Gilman’s Herland is Problematic as an Feminist
Utopian Novel
35
antes em Women and Economics (1998) na qual homens e mulheres poderiam construir uma
sociedade melhor em conjunto.
Já, segundo Matiolevitcz (2018), Gilman apresenta um espaço em que os indivíduos
podem agir e coagir sem pressupostos restritos ao gênero, ou seja, ela idealiza um país em que
haja equilíbrio entre os sexos e todos os seres humanos são capazes de contribuir ativamente
na sociedade; a estudiosa utiliza a seguinte passagem para provar seu argumento: “Estamos
tentando aprender o máximo que podemos com vocês, assim como ensinar tudo o que tiverem
dispostos a aprender sobre nosso país” (GILMAN, p. 77). Ou seja, para as nativas, a presença
dos exploradores em suas terras é uma oportunidade de evolução e prosperidade. Desse modo,
não há contradição entre a utopia e sua obra anterior Women and Economics (1998).
Existe ainda uma terceira visão sobre essa questão na obra. Segundo Sousa (2008), a
autora ora se aproxima do construtivismo, ao dizer que os gêneros são construções sociais, ora
se aproxima do essencialismo, ao mostrar as qualidades que as mulheres possuem as
distanciam do masculino. Essa perspectiva parece ser a melhor, pois compreende que para
fazer justiça à obra como um todo, não devemos desconsiderar nem seu lado essencialista,
nem seu aspecto construtivista. Assim, chegamos à conclusão que Gilman tenta equilibrar a
força dos condicionamentos sociais com a força dos indivíduos.
Na obra The Man Made World, Gilman defende que as crianças nascem e são criadas
em um ambiente endocêntrico que as influenciam na misoginia, pois os homens têm acesso à
educação enquanto as mulheres são influenciadas apenas pelas suas mães no campo
doméstico. Desse modo, o ser é construído e sua essência não é valorizada. Seguindo esse
pressuposto, Sousa advoga que na opinião de Gilman, “a essência dos indivíduos deve ser
considerado o aspecto mais importante do ser. Deve, sublinho, mas não é”. Em Herland - a
obra aqui analisada - a autora explicita o seu ponto de vista ao atribuir à mulher o direito de
ter identidade própria descolada de estereótipos.
Na utopia em questão, Charlotte Perkins Gilman projeta uma sociedade gerida pelo
gênero feminino com aspectos que superam a sociedade misógina exterior regida pelo gênero
masculino que impossibilita uma participação feminina mais ativa. A escritora exalta, desse
modo, as capacidades das mulheres, normalmente consideradas sensíveis e dependentes, além
de impossibilitadas de realizarem tarefas “masculinas”.
Segundo Sousa (2008), Gilman procurou mostrar que para que os valores humanos
imperem, é preciso propiciar um ambiente alheio à valores sexistas - no caso do livro, um país
livre do patriarcado. Para Caplan-Bricker, “imaginar um mundo onde as mulheres são livres
sem definição binária de gênero, é imaginar as mulheres intocadas pela misoginia”
36
(CAPLAN-BRICKER, 2018, p.11)19. Podemos observar a superioridade das nativas da terra
com relação à construção dos exploradores na seguinte passagem:
19
No original: [...] “to imagine a world where women are free of this binary is to imagine a state of nature of
sorts, a womanhood uncorroded by misogyny.” [...] Issue 16. Essays. 23 de abril de 2018. Leaving Herland by
Nora Caplan-Bricker. Disponível em: https://thepointmag.com/politics/leaving-herland/ . Acesso em 20 de
outubro de 2019. p.11
20
No original: [...] “Motherhood is the society’s dominant ethic, and childcare is the most sought-after job in the
nation.” [...] Issue 16. Essays. 23 de abril de 2018. Leaving Herland by Nora Caplan-Bricker. Disponível em:
https://thepointmag.com/politics/leaving-herland/ . Acesso em 20 de outubro de 2019. p. 7
37
Algumas pesquisadoras criticam o fato de que Gilman tente conciliar essencialismo e
construtivismo. Bowers (2018) acredita que a obra de Perkins peca, por exemplo, ao fazer
como que as mulheres de Herland se conformem com a visão essencialista de que o sexo
feminino foi criado para a maternidade: “Como vocês veem, somos mães” (GILMAN, 2018,
p. 78). Bowers também acha equivocado por parte da autora ter posicionado os exploradores
no papel de aventureiros que ensinam as nativas, pois isso corrobora estereótipos a respeito de
ambos os gêneros. Por fim, ela critica a perpetuação da crença da falta de desejo sexual
feminino, representando-as como seres que não pensam em nada além das crianças. “[...] não
tinham a mais vaga noção do amor - no sentido sexual, quero dizer. Para aquelas garotas, a
maternidade era a máxima ambição [...]” (GILMAN, 2018, p. 100).
Caplan-Bricker (2018), também critica a visão essencialista de gênero na obra,
segundo ela, as mulheres na novela eram brincalhonas, graciosas e atrativas aos homens sem
ao menos se esforçarem para o ser. E isso reforça o estereótipo de que o sexo feminino é mais
sentimental, cooperativo e altruísta. Elas escolhem as crianças acima de qualquer outra coisa;
a natureza do poder feminino, para ela, em Herland, é o bem da espécie - por esse motivo, a
autora às compara às formigas e às abelhas: “- Observe as formigas [...] elas não cooperam à
perfeição? Não há argumento contra isso. Este lugar é como um enorme formigueiro. Você
sabe que um formigueiro pode ser reduzido à um berçário? E quanto às abelhas? Elas não
cooperam e vivem em harmonia?” (GILMAN, 2018. p. 78)
Sousa assume que [...] “Herland é a terra do essencialismo, o local onde a sociedade
não “faz” mulheres, a terra em que as mulheres nascem mulheres, não são construídas e
transformadas nesses mesmos seres”, ponto de vista que se tornaria ainda mais interessante se
não desconsiderasse que existe também uma dimensão construtivista na obra. Em certas
passagens, o feminino é representado como tendo sendo sido construído para atender à
masculinidade:
38
narrativa, três estereótipos masculinos distintos, a autora trabalha a visão e a construção do
mundo de cada um dos indivíduos.
Jeff Margrave - Um dos três exploradores que descobre Herland. Médico e botânico,
Jeff também é um cavalheiro do sul, com noções refinadas e românticas de
feminilidade pré-idealizada, noções que são fortemente desafiadas pelas mulheres
atléticas e independentes de Herland. Jeff se apaixona por Celis e a manipula com a
insistência de que ele pode cuidar dela, em vez de simplesmente tratá-la como
parceira e igual. Jeff logo vem preferir Herland a qualquer país da Terra, embora sua
apreciação sobre a cultura Herlandiana esteja tingida com sua visão geralmente não-
realista e de forma idealizada sobre a feminilidade.
Terry Nicholson - Um dos três exploradores que descobre Herland. Terry é a força
motriz por trás da expedição para Herland e o mais forte dos três amigos. Machista
clássico, Terry acredita ser o homem das senhoras e se orgulha de seu conhecimento
e controle sobre a mente feminina. Convencido de que as mulheres gostam de ser
"dominadas" emocional e fisicamente pelos homens, Terry torna-se completamente
irritado pelas mulheres de Herland, que não precisam de homens. Terry é incapaz de
se relacionar com as mulheres como iguais [...] (SIMONE, 2016)21
39
como tratariam qualquer um. É como se o fato de sermos homens fosse mero detalhe.”
(GILMAN, 2019, p. 40) -, uma vez que todos são tratados em concomitância com sua
natureza e não com seus aspectos biológicos.
40
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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