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FACULDADE DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
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Salvador
2013
NEUBER LEITE COSTA
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Salvador
2013
SIBI/UFBA/Faculdade de Educação – Biblioteca Anísio Teixeira
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Banca Avaliadora
Por você
Eu dançaria tango no teto
Eu limparia
Os trilhos do metrô
Eu iria a pé
Do Rio à Salvador
Eu aceitaria
A vida como ela é
Viajaria a prazo
Pro inferno
Eu tomaria banho gelado
No inverno...1.
1
Por você. Música de autoria de Frejat - canta Barão Vermelho.
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais Carmen Leite Costa e Nilton Menezes Costa pela dedicação e o
amor incondicional.
A Cris
“Ainda bem
Que agora encontrei você
Eu realmente não sei
O que eu fiz pra merecer
Você2”
2
Ainda Bem, música e letra de Marisa Montes.
3
Muito Obrigado, música DP.
4
Amigo, música de Roberto Carlos e Erasmo Carlos.
Ao mestre Fumaça e Silvinha pela simpatia e pelos petiscos.
A Dayana Cristina Garcia, que também viveu essa fase comigo por um tempo.
Natasha, Silas, às irmãs Michele Machado e Milena Machado, Juliana Free Dance,
Igor Mandacaru, Neyla Marques, Érica Estevam de Santana, Deyse Martins e
Daiara.
A Augusto César Rios Leiro que me acompanha desde a década de 90, estimulando
a minha produção acadêmica, outrora como professor e atualmente como meu
camarada e colega de trabalho.
Ao Red Hot Chili Peppers, ao Camisa de Vênus, a Lenny Kravitz, Iron Maiden,
Metálica, Titãs e AC/DC que embalaram minha escrita.
À banca formada por Pedro Abib; mestre Luís Renato; César Leiro; mestre Xaréu –
Hélio Campos e Amélia Conrado. Estes são em maior ou menor grau: ídolos,
amigos, companheiros e exemplos para minha vida, para minha carreira e para a
capoeira.
Essa tese que analisa as políticas culturais voltadas para a capoeira se preocupou
em investigar através de pesquisa documental, entrevista semi-estruturada, análises
e nexos entre as políticas culturais, a educação e a capoeira. O trabalho objetivou
compreender as consequências das políticas culturais da capoeira, para suas
comunidades, principalmente no que diz respeito a sua formação. A pesquisa
destacou a relação histórica da capoeira com a política e os fatores que a levaram,
por um momento, a fazer parte de ações prioritárias nas políticas culturais do
Governo, culminando no seu reconhecimento como patrimônio imaterial do Brasil.
Aponta também os avanços, a estagnação e os retrocessos desse processo que
ainda encontra-se em andamento, através dos projetos: Cultura Viva, Capoeira Viva
e das ações de reconhecimento e salvaguarda da capoeira. Foram averiguadas
contribuições para o processo educacional das iniciativas de fomento, assim como a
ausência de estratégias para sua continuidade e democratização das produções.
Apontamos que as ferramentas que constituem os processos de editais necessitam
adequações para proporcionar autonomia às comunidades que compõe o universo
diversificado da capoeira. Ficaram constatadas que o processo de reconhecimento
apesar de se originar nas bases dos coletivos de capoeira, não significou ampla
participação desta, assim também como precisam ainda ser amplamente divulgados
e democratizados as ações de sua salvaguarda. Possibilidades de qualificação e
avanços nas políticas culturais voltadas para a capoeira foram indicadas na tese no
intuito de contribuir com os novos caminhos que esta manifestação irá trilhar.
This thesis examines the cultural policies aimed at poultry bother to investigate
through desk research, semi-structured interviews, analyzes and connections
between cultural policies, education and capoeira. The study aimed to understand
the consequences of cultural policies of capoeira, to their communities, especially
with regard to their training. The research highlighted the historical relationship of
capoeira with the policy and the factors that led, for a time, part of the priority actions
in the cultural policies of the government, culminating in their recognition as
intangible heritage of Brazil. It also points to the progress, stagnation and setbacks in
this process is still ongoing, through the projects: Cultura Viva, Capoeira Viva and
actions recognition and safeguarding of capoeira. We investigated contributions to
the educational process of development initiatives, as well as the absence of
strategies for its continuity and democratization of productions. We point out that the
tools that constitute the processes of edicts adjustments need to provide autonomy to
the communities that make up the diverse universe of capoeira. Were found that the
process of recognition despite originate at the bases of collective capoeira, not meant
broad participation, so as still need to be widely disseminated and democratized the
actions of its safeguarding. Possibilities qualification and advancements in cultural
policies aimed at poultry were indicated in the thesis in order to contribute to the new
ways that this manifestation will follow.
Esta tesis que analiza las políticas culturales enfocadas en la capoeira se preocupó
en pesquisar através de la investigación documental, entrevistas semiestructuradas,
análisis y vínculos entre las políticas culturales, la educación y la capoeira. El estudio
tuvo como objetivo comprender el impacto de las políticas culturales de la capoeira,
a sus comunidades, sobre todo en lo que respecta a su formación. La investigación
destacó la relación histórica de la capoeira con la política y los factores que llevaron,
durante un tiempo, a ser parte de las acciones prioritarias en las políticas culturales
del gobierno, que culminó con su reconocimiento como patrimonio inmaterial de
Brasil. También señala los avances, estancamientos y retrocesos en este proceso
sigue en curso, a través de los proyectos: Cultura Viva, Viva Capoeira y el
reconocimiento de las acciones y la salvaguardia de la capoeira. Se investigaron las
contribuciones al proceso educativo de las iniciativas de fomento, así como la
ausencia de estrategias para su continuidad y la democratización de la producción.
Señalamos que las herramientas que constituyen los procesos de notificaciones
requieren ajustes para proporcionar autonomía a las comunidades que conforman el
universo diversificado de la capoeira. Se constató que a pesar de que dicho proceso
de reconocimiento de las raíces de la capoeira se originó basado en las mismas, no
tuvo una gran participación, de este modo, se tiene que llevar a cabo amplias
acciones de difusión y democratización para salvaguardarla. Las posibilidades de
calificación y los avances políticas culturales enfocada a la capoeira se indicaron en
esta tesis con el objetivo de contribuir a las nuevas formas y caminos que esta
manifestación trazará.
3 AD Análise do Discurso
8 BA Bahia
9 BB Banco do Brasil
25 DA Diretório Acadêmico
27 DEM Democratas
28 DF Distrito Federal
32 DP Domínio Público
35 ES Espírito Santo
48 GO Goiás
57 JJ José Joaquim
60 MD Método Dialético
61 ME Ministério do Esporte
64 MG Minas Gerais
67 MP Ministério Público
69 NY Nova York
70 OAB Ordem dos Advogados do Brasil
74 PA Pará
79 PE Pernambuco
81 PL Projeto de Lei
82 PL Partido Liberal
85 PP Partido Progressista
91 RJ Rio de Janeiro
92 SC Santa Catarina
1 INTRODUÇÃO 22
REFERÊNCIAS 312
ANEXOS 327
22
1 INTRODUÇÃO
1
Música: Quem é você que acaba de chegar. Domínio Público (DP).
2
Na época, fazíamos parte do Grupo de Capoeira Kilombolas.
23
3
Orientador do Trabalho Final de Curso.
4
Desse modo, foi possível provar que existe resistência às investidas do sistema CONFEF/CREF e
que a capoeira não deveria aceitar essa condição.
25
modelo, a fim de não permitir que essa cultura, em seus aspectos mais profundos,
seja transformada por completo.
Foi apontada a necessidade de uma organização, em moldes mais
democráticos, acolhedores e amplos, respeitando-se a liberdade, a diversidade, a
ludicidade e as contradições geradas no seio da prática capoeirística. Assim também
a necessidade de um acompanhamento das políticas que estavam envolvendo esta
manifestação.
Naquele momento, a capoeira sofria as implicações das modificações do
mundo do trabalho e da regulamentação da Educação Física, que, baseadas em
políticas de profissionalização, por meio de reserva de mercado e monocultura da
formação acadêmica, pleiteavam que o ensino desta prática, em determinados
momentos, fosse de responsabilidade exclusiva do profissional 5 regulamentado.
As perseguições, impetradas por este conselho profissional, somadas ao
medo de perderem seus espaços de trabalho levaram os capoeiras a abrir várias
frentes alternativas de solução para o problema. Uma delas foi uma regulamentação
profissional específica e a criação de um conselho próprio, nos mesmos moldes do
CONFEF/CREF, 6 a outra pregava a não filiação, em hipótese nenhuma, e o
enfrentamento deliberado contra a fiscalização, além da luta pelo reconhecimento da
capoeira como patrimônio imaterial da cultura brasileira.
Não que esta busca por reconhecimento tenha surgido apenas nesse
momento, pois há muito que as comunidades de capoeiristas vêm reivindicando tal
afirmação, por parte dos poderes públicos. Porém, no nosso entendimento, essa
cobrança, ganhava força com as investidas dos conselhos sobre a capoeira. Essa
agitação corroborará o reconhecimento da capoeira, como uma manifestação
importante e que deve ser salvaguardada, valorizada, estimulada e democratizada.
O primeiro passo, no sentido do reconhecimento oficial da capoeira pelo
Estado, em termos de ações nacionais, que tivemos a oportunidade de testemunhar,
concretamente falando, acontece já na primeira gestão do presidente Luís Inácio
Lula da Silva, inicialmente no mandato do Ministro da Cultura (MinC), Gilberto
Passos Gil Moreira (Gilberto Gil).
5
Esse termo, que é utilizado pelos defensores dessas ideias, somente está sendo utilizado aqui para
manter a fidedignidade aos pensamentos.
6
Ideia criticada em nossa pesquisa.
26
7
Música: Capoeira Ô Lê Lê. DP.
27
8
Cinto usado pelo herói de quadrinhos Batman. O cinto é carregado de dispositivos que ajudam este
paladino da justiça a combater os bandidos e, principalmente, seus inimigos.
28
9
Levando em consideração o contexto atual da sociedade, no sentido de acessibilidade, promoção,
divulgação e salvaguarda.
10
Entendemos que existem na capoeira vários grupos e entidades que disputam diferentes projetos,
por isso utilizamos esse termo no plural.
11
Estes partiparam das concorrências públicas dos editais, a fim de disputar prêmios para dar
continuidade ao que, em grande parte, já proporcionavam à sociedade, sem a devida ajuda do
Estado.
29
Pega o berimbau
E começa a tocar
Capoeira no Cabula
Eu agora vou jogar
Olha que axé
Olha que axé
12
Capoeira do grupo Maré
com estas, no intuito de criar condições para entendermos como a capoeira, uma
manifestação de origem popular e amplamente discriminada na sociedade, trilhou
caminhos inundados de percalços até ser, atualmente, reconhecida legalmente
como uma prática cultural nacional.
Buscamos na história o respaldo concreto para contextualizar a sua prática na
sociedade, desde o seu aparecimento, enquanto atividade cultural marginalizada, de
rua e de origem negra, afro-brasileira e popular, até seu enquadramento em uma
política de segurança pública, sendo perseguida e mitificada, passando a ser
requisitada, posteriormente, para defender a pátria em conflitos regionais e guerras.
Abordamos a transformação da capoeira como uma possibilidade de se
constituir como uma tradição da cultura nacional. Seu percurso oficialmente fora da
marginalidade e sua inserção social, cheia de acolhimentos e conflitos, com
momentos de aparente reconhecimento e de tentativas de controle e formatação
pelo Estado.
Ainda criminalizada, registramos seu processo de ginasticalização, a tentativa
de seu enquadramento social e nacionalização. Sua esportivização (com forte
influência militarista e da Educação Física), sua marcialização, folclorização (com
uma forte intervenção pública, em ações voltadas para o turismo, principalmente em
Salvador) e pedagogização, que culminou em sua inserção nas escolas, sua
introdução como disciplina em cursos de formação acadêmica e a institucionalização
de algumas políticas públicas de Educação e Cultura.
Estabelecemos compreensões e análise a respeito dos aspectos que
delinearam o entendimento e o desenvolvimento das políticas culturais no Brasil,
sempre estabelecendo seus nexos com a capoeira. Exploramos conceitos, como
cultura, patrimônio, salvaguarda e memória, principalmente no âmbito legal.
Discutimos ainda as políticas culturais, a cultura e as relações geradas a partir
da relação com a capoeira, em uma análise que parte da história e de suas
consequências reais e concretas. Expomos nossa trajetória metodológica, bem
como elencamos também nossas estratégias de análise bibliográfica, documental e
dos discursos.
Em seguida, nos concentramos em aprofundar nossas reflexões sobre o
Programa Brasileiro e Internacional de Capoeira (PBIC). Optamos por realizar
nossas considerações sobre esse assunto, em duas partes, sendo que, na primeira:
31
1
Música de capoeira Domínio Público – DP.
2
Aqueles que cultuavam a prática da capoeira.
3
Refere-se aqui ao que chama de consciência histórica.
33
histórica do país, seus interlocutores passam a fazer parte da política. Esta primeira
fase culminará em uma política de segurança pública.
Quando a cultura é produzida e democratizada, tem-se a educação, que é
responsável pela disseminação da cultura. A forma como entendemos o mundo, as
relações sociais; como nos relacionamos com a natureza, produzimos trabalho e nos
tornamos seres humanos, tudo isso perpassa tanto a cultura quanto a educação.
A produção cultural oriunda das relações estabelecidas pelos africanos,
escravizados e ex-escravizados, formará, em um primeiro momento, determinados
comportamentos relacionados à capoeira, que será passada através da educação,
de geração em geração, inserindo-se socialmente, a partir de várias possibilidades.
Tanto essa manifestação, como os seus cultores irão se modificar, a partir de
suas relações sociais. Na Bahia, de uma determinada forma, no Pará, distintamente,
em Recife, de outra maneira, no Rio de Janeiro, de um jeito diferente, e assim
sucessivamente, em todas as regiões onde encontramos registros da capoeira.4
A política não é apenas a atividade de políticos (pessoas que possuem cargos
públicos, tais como vereadores, governadores, senadores etc.). Conforme o
Dicionário de política, o termo significa tudo o que se refere à cidade. Esse é o
conceito clássico de política. Nesta obra, Norberto Bobbio, Nicola Matteucci e
Giafranco Pasquino (1998) destacam o conceito de política como atividade humana,
mais especificamente como práxis humana.
Ao contrário do imaginário social, política não se constitui somente como uma
atividade das instituições sociais, dos palácios de governo, das câmaras de
vereadores, dos partidos. Ela se origina da própria essência da sociedade e
independe de institucionalização. É esse movimento que surge na rua, na praça, no
cais, conseguinte ao processo de escravidão, de discriminação, de preconceito e
falsos conceitos e do trabalho explorado, que levará a capoeira e seus cultores a
emergirem na história do Brasil, de forma incrivelmente política.5
A cultura, por exemplo, é responsável também por materializar, a partir da
realidade concreta, a subjetividade dos indivíduos, ou seja, os fatores sociais
4
Ela se constituirá de forma semelhante, contudo diferenciada, com movimentos específicos, rituais
diversos, objetivos e fins divergentes. Configura-se a partir do sentido e do significado que se lhe
atribuía.
5
A escravidão não foi invenção dos portugueses, Grécia e Roma também figuram como os principais
adeptos deste modo de produção, na história mundial. A sujeição negro-africana foi justificada por
fatores biológicos, alicerçada em pensamentos de superioridade da raça branca e determinismo,
alimentados pelas teorias positivistas, assim como pela religião e sua necessidade de catequizar os
pagãos. Entretanto, a vida social não é determinada somente dessa maneira.
34
6
O modo de produção escravocrata gerou no Brasil um processo de tráfico de seres humanos e um
bom negócio para os traficantes. Foi outro modo de produção, o mercantilismo, praticado pelos
europeus, que também propiciou essa prática nefasta, onde o dominador tenta destruir a cultura do
dominado e impor a sua. Esse procedimento de comercializar pessoas, trazidas de várias partes da
África para o território brasileiro, surge como algo lucrativo para uns e desumano para outros.
7
Até então, os explorados não tinham direitos, somente deveres. Deveriam trabalhar, seguindo
ordens, sem questionar, abdicando de suas crenças e produzindo riqueza, sem o mínimo acesso ao
que produziam, além de não participarem de forma direta da vida social e política da colônia. Na
relação tensa entre dominador e dominados, algumas das manifestações culturais desses últimos
eram permitidas, todavia somente serão desenvolvidas em outro contexto, sob outras necessidades.
35
12
A vinda da corte, sem dúvida, inaugura uma nova realidade na colônia. Estrangeiros e seus hábitos,
produtos, uso de utensílios, formas de consumir as coisas, enfim, e suas culturas desencadeiam
novas relações que irão incidir em novas formas de relacionamento e comportamento social.
37
13
D. Pedro I tinha pensamentos divergentes da sociedade da época sobre a escravidão e o negro.
Todavia, o movimento abolicionista no seu reinado não avançou muito, as perseguições e punições à
cultura africana e afro-brasileira continuaram.
38
14
O Brasil já se envolvia com mercenários desde a assunção de D. Pedro I ao cargo de imperador.
15
REGO, Waldeloir. Capoeira Angola: um ensaio sócio-etnográfico. Salvador: Itapuã, 1968. 416p.
39
18
Parte do texto da Canção do Exílio, de Gonçalves Dias. Ver referências.
19
A busca de novos temas e uma possibilidade de estabelecer uma maior comunicação que pudesse
atingir o público em geral, além de uma possível saturação do modelo racional vigente, todos estes
aspectos desencadearam um novo comportamento cultural.
20
Em especial França, Portugal e Inglaterra.
41
continente, mais transformações chegam a nossas terras. Dessa vez, com outra
perspectiva.21 Conforme Oliveira (2008), esse movimento lançará os fundamentos
para a formação simbólica da nossa nacionalidade.
A realidade do movimento expressa o que o filósofo Kosik (2002) irá chamar
de pseudoconcreticidade, abstendo-se de uma exposição real e concreta do
contexto brasileiro. Vale ressaltar também que, nesse momento, o negro e sua
cultura não eram cogitados como emblemas nacionais. Esse fato é reforçado, em
Renato Ortiz, no livro Cultura brasileira & identidade nacional, quando observa:
25
D. Pedro II foi um patrocinador de atividades artísticas e culturais, potencializando a educação e,
por conseguinte, a cultura no país.
26
É geralmente sabido que no Senado, na Câmara dos Deputados, no Exército, na Marinha e no
funcionalismo público havia capoeiras de fama, cujos nomes nos são conhecidos.
27
Nítida demonstração de envolvimento político e inserção social desse coletivo que, mesmo à
margem da sociedade, não se furtava a uma participação ativa.
28
Para maiores informações: Mattos (2009). Dessa forma, estavam os ex-escravizados capoeiras
inseridos no mundo da política. Apoio ao regime monárquico e resistência ao regime republicano.
29
O regime escravocrata estava fadado a acabar. Seu desenvolvimento gerou sua própria
decadência. Esse modo de produção já havia, de uma forma geral, sido extinto na Europa, há
tempos, vindo a dar lugar, mais tarde, ao que conhecemos hoje como modo de produção capitalista.
43
30
São esses homens simples que irão escrever grande parte da história das cidades e do nosso país,
muitas vezes esquecida e não divulgada. A Guarda Negra é formada por homens devotados, que
acreditavam fazer a coisa certa, em defesa da pátria e de sua própria sobrevivência. Mais do que
fazer parte da história, eles são a própria história.
31
Sem dúvida, esse coletivo expressa o que estamos tentando relacionar em nosso trabalho. O fato
de que a práxis cotidiana dos grandes centros urbanos, nos últimos anos da Monarquia, configurou a
consolidação dos capoeiras, envolvidos na política e na formação da sociedade brasileira. Esses
fatos vão contribuir para que a capoeira chegasse à contemporaneidade, sendo reconhecida como
uma manifestação cultural complexa e requerendo uma política cultural de valorização e manutenção
de suas tradições.
32
Mesmo com alguns defensores do passado de glória do país, os problemas estavam presentes. Um
deles, e que assombrava os republicanos à sombra da monarquia, era a capoeira.
33
Primeira equipe ministerial: Benjamin Constant, Rui Barbosa, Campos Sales, Quintino Bocaiúva.
34
Era filho do Conde de Matosinhos e também irmão de outro Conde.
44
35
Na ilha-prisão, o regime era semiaberto, porém associado a uma disciplina rígida. Entre altos e
baixos, sob denúncias de desmandos, corrupção e imoralidade, Noronha continuou sendo a prisão
central do Império e chegou à República. De acordo com Santos (2009), a ilha chegou a abrigar
2.364 presos. A ilha-prisão era o destino certo da política anti-imperialista de Campos Sales e
Sampaio Ferraz, principalmente. Este último marcou sua trajetória na história por combater e
perseguir contraventores e grupos que apoiavam o regime político anterior. Por isso, sua atenção em
especial para as maltas e capoeiras.
36
Então chefe do governo provisório da República dos Estados Unidos do Brasil.
37
A palavra capoeira ou capoeiragem, designou, por muito tempo, atos marginais.
45
38
O fato é que havia certo exagero nessas perseguições, que acabam atingindo outras parcelas da
sociedade, como foi o caso de Juca Reis que, ao se aliar aos capoeiras, passou a ser tratado como
tal, independente do seu status social. Apesar de não estar clara no código penal a questão do
flagrante, no caso do Capítulo XIII – Dos Vadios e Capoeiras, Juca Reis foi preso por ser
reconhecidamente um praticante da capoeiragem. Ele não a estava praticando, muito menos
promovendo desordem ou algum tumulto, no ato de sua prisão, como prescreve a lei.
39
A obra inaugura o que ficará conhecido como ufanismo. De acordo com a autora, o movimento
ufanista irá perpetrar construções simbólicas que utilizaram o discurso da identidade nacional.
40
A preocupação do autor está relacionada a um fenômeno que ocorre quando aceitamos que, para
se criar a cultura brasileira, categorias como origem, mitologia e essência se pulverizam.
46
41
Possivelmente, o Barão do Rio Branco, ao mudar o foco da política externa do país, de Londres
para Washington, contribuiu também para uma maior desvinculação da cultura europeia a nosso
território. Esse lugar seria ocupado futuramente pela cultura norte-americana junto com o seu projeto
imperialista de dominação cultural, política e financeira. Entretanto, contribuiu também para a
organização e a definição dos “valores nacionais”, ao implementar uma política de valorização
cultural, aproveitando-se dos serviços dos intelectuais como emissários da nação, segundo Oliveira
(2008). Apesar de seu envolvimento com a capoeira na juventude, como destaca Moura (2009), esse
importante estadista, que defendia ideias do Partido Conservador, não contribuirá diretamente com o
desenvolvimento dessa manifestação, fora o fato de sido seu cultor.
42
Os exercícios físicos na época eram organizados através da ginástica, com destaque para os
métodos: francês, alemão e sueco. Com o passar do tempo, o campo da ginástica também entrará
nas discussões sobre a nacionalização da cultura.
43
Significa: Ofereço, Dedico e Consagro. Moura (2009) defende que seu autor é Garcez Palha.
44
Mais à frente, essa situação irá servir como exemplo para a criação da mitologia nacional e o
fortalecimento, equivocado, da marcialização da capoeira, até hoje bastante propagada e reproduzida
por muitos, sem maiores reflexões sobre o significado de tal concepção.
47
Era uma peleja de um negro brasileiro contra um nipônico, mas não somente
isso, era a disputa da capoeira contra o jiu-jítsu, e representava a supremacia de
uma técnica e manifestação, que fazia parte da nossa cultura corporal, até então
perseguida e discriminada, frente a uma arte marcial estrangeira.45
O embate aconteceu no Pavilhão Internacional Paschoal Segreto, no Rio de
Janeiro. A contenda foi arranjada por estudantes da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal do Rio de Janeiro. Alguns destes, conforme Moura (2009),
eram, inclusive, discípulos de capoeira de Ciríaco.46
Ciríaco Francisco da Silva, utilizando a sua capoeira, derrotou Sada Miako,47
instrutor de jiu-jítsu da Marinha. O feito de Macaco, como era conhecido o
comerciante campista, saiu estampado em distintos jornais da cidade – O Malho,
Jornal do Comércio, A notícia e A Careta –, evidenciando a importância do feito.
Podemos perceber, a partir deste episódio, uma negligência da polícia e da
própria sociedade frente ao código penal. Na ocasião da luta entre Ciríaco e Miako,
a prática da capoeira ainda estava proibida, apesar de já notarmos, antes desse
acontecimento, um paulatino e progressivo abandono de tais imposições legais.48
Um ano depois, talvez ainda no rastro dos acontecimentos da grande peleja
de Ciríaco, Coelho Neto, conforme nos relata Moura (2009), tentou encaminhar à
Câmara dos Deputados, junto a dois parlamentares, um projeto que visava a
obrigatoriedade do ensino da capoeiragem nos quartéis e nos institutos oficiais.49
Na Bahia, em 1914, um fato envolvendo um célebre capoeira estampa os
jornais do período. Tratava-se de um atentado praticado por militares a um
capoeirista. Toda a confusão retratada nos jornais também se encontra registrada no
livro Mandinga, manha e malícia, de Adriana Albert Dias. Em sua obra, a autora
45
Simbolicamente falando, o que estava em jogo era a autoestima nacional que, naquele momento,
estava sendo representada contraditoriamente por uma atividade que a sociedade sempre fez
questão de repugnar e não reconhecer.
46
O fato de alguns estudantes de classes abastadas da sociedade serem identificados como
discípulos de uma manifestação que ainda vigorava como contravenção penal, e o fato, mesmo com
esse agravante, da luta ser realizada em espaço público bastante frequentado pela sociedade
carioca, demonstra que a capoeira, apesar de ainda ser socialmente discriminada e pertencer
juridicamente falando ao rol das ações relacionadas à marginalidade, já era aceita e defendida por
algumas representações da sociedade.
47
Vale destacar aqui um equívoco recorrente em alguns livros e sites da internet em afirmar que Sada
Miako é o Conde Koma. Otávio Mitsuyo Maeda, o verdadeiro Conde Koma, somente chegou ao Brasil
em 1914, ou seja, após a luta de Miako com Ciríaco. Maeda, além de nunca ter perdido um desafio,
foi quem ensinou essa arte suave a Carlos Gracie.
48
Se houve flexibilização por um lado, por outro, a vitória de Macaco serviu para alimentar a
esperança de alguns em tornar a capoeira uma manifestação da cultura corporal aceita socialmente.
49
Ao final, acabaram renunciando à ideia, pois não havia lugar para tal implementação, uma vez que
ainda pairavam ideias positivistas que propagavam o racismo.
48
relata que esse desfecho teve início provável em dezembro daquele ano, na Rua do
Saldanha, após tiroteio promovido por marinheiros.50
O interessante nessa história foi que Pedro Mineiro se apresentou em
depoimento à delegacia, como um trabalhador informal da justiça. Essa informação
é divulgada na mídia, no jornal Diário de Notícias, e reproduzida no livro de Dias
(2006).51
O governo baiano tinha como chefe maior José Joaquim Seabra (J. J.
Seabra), e como chefe de polícia Álvaro Cova. De acordo com o depoimento de
Mineiro, este último sabia da sua atuação como secreta de polícia.52 Existem relatos
de que Cova utilizava os capoeiras em sua segurança pessoal e como cabos
eleitorais, assim como também o fez J. J. Seabra.
O modernista Jorge Amado, no clássico: Tenda dos milagres, história que se
passa no início do século XX, registrará em sua literatura, o cotidiano dos baianos,
na história de Pedro Arcanjo (Ojuobá), também capoeira. Outro personagem que é
retratado nessa obra, em vários momentos e nos traz informações sobre os
elementos que constituíam a capoeira, é Budião.
Essa obra literária retrata a perseguição policial às manifestações de matriz
africana na Bahia. A figura central da repressão, aqui atendia pelo nome de Pedro de
Azevedo Gordilho.53
50
O que incentivou o ataque de Mineiro e Souza, que culminou em morte dos marinheiros, de acordo
com Dias (2006), foi provavelmente o ciúmes de uma mulher, mas existem outras versões para o
caso.
51
Fato que comprova o envolvimento da capoeira (que, importante aqui lembrar, ainda estava
enquadrada no código penal como crime) com as instituições de justiça, sobrevivendo e se
adequando, mesmo que ainda de forma escamoteada (mas não tanto assim), na sociedade.
52
Secreta de polícia: denominação da época para indivíduos que prestavam informações não formais
para os policiais sobre pessoas, lugares etc. (informantes de policiais).
53
O registro da obra do escritor baiano não possui a intencionalidade de trazer veracidade ao leitor.
Contudo, nos esclarece sobre o fato de que a Bahia também reprimiu a capoeira.
49
54
Isso também não significou que seu processo histórico fosse tranquilo, pelo contrário, os fatos
demonstram o mesmo tratamento: criminalidade, perseguição e discriminação.
55
Vamos Capoeirar: Música do Mestre Tonho Matéria.
56
Sua defesa como ginástica não impedirá que o termo esporte apareça em diversos momentos,
tratando das duas coisas, como se fossem somente uma.
57
Educar nesse momento tem o sentido de controlar e de regulação.
50
Bazar. O escritor maranhense também lança a crônica Nosso Jogo. Moura (2009)
enfatiza que o autor manifesta a sua decepção pela capoeira, em específico a do Rio
de Janeiro, não ter se expandido e alcançado o exterior.
Soares (2002) ressalta que, em 1926, uma série de publicações no jornal Rio
Sportivo, lança reportagens direcionadas à capoeira, sob o título Capoeiras e
Capoeiragens. O autor, o argentino Adolfo Morales de Los Rios Filho, apesar de não
ser brasileiro, defende ideias nacionalistas de incorporação da capoeira ao mundo
dos esportes.
Dois anos após a publicação dos artigos no jornal Rio Sportivo e seis anos
após a Semana de Arte Moderna era lançado, no Rio de Janeiro, pelo militar Annibal
Burlamaqui, o livro Gymnastica Nacional (Capoeiragem): methotisada e regrada.
Seu objetivo era expor suas ideias e vê-las aceitas socialmente, inserindo a capoeira
oficialmente como uma prática de exercícios.62
O prefácio da obra, de autoria de Mario Santos, deixa claro sua intenção:
“São meus votos que seja a ‘Gymnastica brasileira’ acceita e praticada, pois vae
n’isso, além de um acto de brasilidade, um pouco de integralisação na posse de nós
mesmos” [sic] (BURLAMAQUI, 1928, p. 5).63
As passagens do autor no livro também indicam isso, quando enfatiza seu
patriotismo, ao expor suas ideias: “Quis apenas ser um brasileiro – e um brasileiro
útil [...]”. [sic] (BURLAMAQUI, 1928, p. 7). Da mesma forma, no agradecimento ao
prefacista: “[...] esse patriótico gesto, para a destruição do archaico e tolo
preconceito de que a “GYMNASTICA BRASILEIRA” – a capoeiragem – desdoura a
quem pratica”. [sic] (BURLAMAQUI, 1928, p. 7).64
Em nossa linha de raciocínio, observamos a necessidade de pontuar políticas
que influenciaram a sociedade. Essas iniciativas intervieram nos rumos do
desenvolvimento e no entendimento da prática da capoeira, induzindo,
consequentemente, as políticas culturais voltadas ao seu trato.
62
Fortalece as ideias de cunho esportivista e nacionalista do argentino Rios Filho e de tantos outros
que, já há algum tempo, ansiavam por ver essa manifestação ajuizada a partir dessa formatação.
63
Não há dúvidas aqui sobre os objetivos de inserção social da capoeira e a compreensão, por parte
dos seus defensores, do benefício que tal adoção traria para a pátria.
64
No prefácio da obra, Mario Santos lamenta a falta de reconhecimento da capoeira enquanto sport
nacional e enfatiza as suas vantagens frente a uma luta (o boxe) e a uma arte marcial (o jiu-jítsu).
Ambiciona a aceitabilidade da proposição de Burlamaqui pela sociedade e espera futuramente a
formação de campeões nacionais frente aos estrangeiros. O discurso é arrolado por ideias higienistas
e positivistas, na tentativa de ganhar adeptos de outras camadas da sociedade que, até então,
repugnavam a capoeira.
52
66
Em Salvador, Mestre Bimba, auxiliado por discípulos e amigos, inicia um trabalho de
ressignificação da capoeira, para que a mesma saísse da marginalidade em que se encontrava e
fosse aceita pela sociedade. Sua metodologia chamou-se, inicialmente, Luta Regional Baiana.
Contudo, após a capoeira sair do código penal, o método de Bimba vai se transformar, influenciado
pelo contexto societal do momento, no que conhecemos hoje como Capoeira Regional.
67
Tanto uma como a outra serão influenciadas pelas ideias ginásticas, que ainda se mantinham
nessa época e se propagavam pelos cursos de formação em Educação Física e nas escolas baianas,
bem como pelas lutas e artes marciais e as competições de luta livre, e também pelo fenômeno do
esporte que, a partir desse momento, incidirá no país, com um forte apelo para o seu
desenvolvimento, contando inclusive com apoio estatal.
68
Evento promovido pela Frente Parlamentar de Apoio à Cultura Popular do Congresso Nacional do
Distrito Federal.
69
Este foi publicado posteriormente na revista Tempo Brasileiro – Patrimônio Imaterial.
54
70
que até hoje nos assombram. (CAVALCANTI, 2001, p. 2)
70
Esse trato com a capoeira, a partir de demonstrações previamente contratadas, vai ser fortemente
desenvolvido, em um primeiro momento, em Salvador, inicialmente através de Mestre Bimba, com as
suas demonstrações de capoeira (inclusive para políticos). Com o passar do tempo, se unirá junto a
outras manifestações da cultura afro-brasileira (maculelê, dança de orixás, puxada de rede do xaréu,
dentre outras) para formar o que se denominou inicialmente de show folclórico. Fica claro que a
noção da forma de viver e se relacionar distintamente entre grupos, em consequência do
desenvolvimento da sociedade e de sua produção em massa, gerando excedente, originando a
exploração do homem pelo homem, possibilitou o surgimento da divisão social do trabalho e a
desigualdade social. As classes sociais terão relação com as distintas formas de saber e fazer que
inicialmente o folclore tentará explicar.
71
Autores como Rego (1968) e Esteves (2004) já abordaram parte dessa fase da capoeira, na
perspectiva da folclorização. Os autores citados apontam os anos de 1930 como o início desta fase.
72
Nesta fase, podemos identificar alguns elementos que antes não faziam parte dessa manifestação,
como, por exemplo: a supervalorização de acrobacias, indumentária de cores exageradas, jogo
combinado e sem objetividade e demonstrações individuais de gestualidade corporal etc.
73
Grupo folclórico diz respeito a grupos que vivem na própria comunidade e que tentam manter uma
determinada tradição, a partir de seus ritos passados. Grupos para-folclóricos são coletivos formados
para apresentar artisticamente determinadas manifestações no âmbito da recepção turística.
74
Ao tempo que desmistificavam a marginalização da capoeira, exploravam a força de trabalho dos
seus praticantes e vendiam uma imagem (estética) que não condizia com o real e o concreto desta
prática, levando à ideia de superficialidade e esvaziando as possibilidades de sua práxis cotidiana.
55
75
Na Bahia, ainda persiste com grande força a utilização das manifestações da cultura local nessa
perspectiva, reforçada pelas constantes propagandas que utilizam símbolos da capoeira, muitas
vezes patrocinada pelos próprios órgãos estatais de turismo, como atração. Constantemente, a
propaganda dos órgãos públicos reforça a ideia de que o Estado, e principalmente Salvador, é a
cidade do turismo, criando, pela reprodução dessas ideias, um estereótipo de cidade “cultural”.
76
Criada por Gustavo Barroso, a partir do Decreto n° 24.735, de 14 de julho de 1934, e ligada ao
Museu Histórico Nacional. O Estado Novo cria o primeiro órgão federal de proteção ao patrimônio, em
1934. Mas essa é uma política que amadurece primeiramente em níveis estaduais, com ênfase no
Sudeste do país. Conforme Oliveira (2008), houve posteriormente experiências em Minas, na Bahia e
em Pernambuco, que contribuíram para que essa empreitada se consolidasse na criação do Serviço
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), em 1936/1937, em substituição à Inspetoria.
Vale destacar que há registros que apontam a década de 1920, como os primórdios da noção de
patrimônio em nosso país, que se institucionaliza, principalmente, através de projetos de proteção
(muitos sem sucesso), conforme destaca a professora Maria Lúcia Bressan Pinheiro, no texto Origens
da noção de preservação do patrimônio cultural no Brasil.
77
No caso, a capoeira poderia se enquadrar na categoria intitulada Arte Popular. Porém, como
também afirmam os autores citados, a capoeira não tinha reconhecimento e apoio social suficiente
para isso, como um elemento que a identificasse a nossa cultura, para ser definida como tal. No
ambiente desse momento histórico, encontramos tanto discriminações, preconceitos e estereótipos,
como também indivíduos obstinados em transformar tais concepções.
56
78
Além da criação do SPHAN, destacamos a criação do Serviço Nacional de Teatro (SNT), o Instituto
Nacional do Livro (INL), o Instituto Nacional do Cinema Educativo (Ince), o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), o Ministério da Educação e Saúde, o Ministério do Trabalho. Tudo isso
significa um aumento das atividades do Estado no campo da cultura, mas denota, ainda, uma
preocupação do próprio Estado com a reorganização social.
79
Carlos Drummond de Andrade, Mário de Andrade, Rodrigo Melo Franco de Andrade, Anísio
Teixeira, Fernando de Azevedo, Heitor Villa-Lobos, Manuel Bandeira, entre outros.
80
Quatro anos depois era criado o MinC.
57
87
O Departamento que tratava da Luta Brasileira (Capoeiragem) não mais estava atrelado a uma
federação, mas sim a uma confederação, que, na hierarquia esportiva, possui mais poder e status.
88
Várias ações coletivas são tomadas, com os objetivos de manter a paz mundial e garantir direitos
universais para a humanidade.
89
Nesse momento, cria-se a Organização das Nações Unidas (ONU).
90
O documento, redigido consensualmente por um grupo de vários representantes de países distintos
e que não tinha obrigatoriedade legal, expressa a necessidade da humanidade reconhecer
coletivamente os direitos universais.
91
Consultar 22º artigo do documento.
92
Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura.
59
educação para a paz e para a tolerância e o respeito ao ser humano – a sua história,
a suas crenças e a suas culturas. Enquanto isso, no Brasil, a capoeira, uma das
manifestações mais importantes do final do século XX, continuava, até então, no
ostracismo cultural.93
Vale destacar que seis anos antes da divulgação da DUDH, governos
europeus ponderavam a respeito de uma agência internacional para discutir,
promover e apoiar a educação, a cultura e a ciência, principalmente nos lugares
afetados pelas guerras. Imbuídos do espírito de paz, representantes de algumas
dezenas de países ratificaram a criação da UNESCO94 para esse fim.
No site oficial ainda encontramos seus objetivos que, assim como vários
outros textos relacionados ao organismo, destacam sempre as palavras cultura e
educação, e suas derivações: […]. Thus UNESCO’s unique competencies in
education, the sciences, culture and communication and information contribute
towards the realization of those goals95 (UNESCO, 2011).96
Dentre as missões da UNESCO também podemos detectar que a cultura,
assim como a educação, são destaques: “UNESCO’s mission is to contribute to the
building of peace, the eradication of poverty, sustainable development and
intercultural dialogue through education, the sciences, culture, communication and
information”97 (UNESCO, 2011).
Enquanto Bimba lutava para a capoeira ser reconhecida e respeitada em
Salvador, em São Paulo acontecia um passo importante para as políticas culturais,
de um modo geral. Mais uma vez Maria de Andrade se destaca:
93
Apesar da capoeira sempre demonstrar avanços em sua relação com o Estado.
94
Essa instituição foi criada em 16 de novembro de 1945, com 20 Estados-membros. Atualmente,
conforme o seu site oficial, a entidade conta com 195 membros e oito associados
95
[...] Assim competências únicas da UNESCO em educação, ciências, cultura e comunicação e
informação contribuem para a realização dessas metas. (Tradução nossa)
96
Grifos nossos.
97
A missão da UNESCO é contribuir para a construção da paz, a erradicação da pobreza, o
desenvolvimento sustentável e o diálogo intercultural através da educação, ciências, cultura,
comunicação e informação. (Tradução nossa)
60
98
Comissão Nacional do Folclore do Ministério das Relações Exteriores.
99
Em seus textos, tanto Cavalcanti (2001) quanto Cavalcanti e Fonseca (2008), concordam que, no
contexto do pós-guerra, marcado pela preocupação internacional com a paz, o folclore era visto como
um fator de compreensão e incentivo à apreciação das diferenças entre os povos.
100
Trabalho apresentado no XVI Congresso de Pós-Graduação e Pesquisa em Direito (CONPEDI),
em 2007, na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais.
101
Direitos humanos é uma categoria complexa, pois se origina em um contexto que nos remete a
uma abstração, uma possibilidade irrealizável frente a uma realidade que nos empurra cada vez mais
para o egoísmo, a concorrência e a desumanização.
61
103
Grifos nossos.
104
Esse é o marco da legislação sobre a proteção do patrimônio no Brasil: 30 de novembro de 1937.
Mas a expressão “fatos memoráveis” é fator restritivo para designar algo como patrimônio cultural,
assim como o termo “excepcional valor”, constitui uma lacuna do que é ou não excepcional e, afinal,
quem decide o que é ou não excepcional? Aqui se corre o risco de considerar tais fatos questões que
desencadearão, hegemonicamente, em consensos impostos pela classe dominante.
105
A origem de algumas ações, neste sentido, será verificada na ideologia do Estado Novo e do
governo populista e ditatorial de Getúlio Vargas. O nacionalismo contribui de forma consubstancial
para a incorporação da capoeira, ao projeto de construção e consolidação de um novo corpo de
cultura nacional e promoção da disciplina (corporal e espiritual) dos povos, dentre outros.
63
106
Enfim, em algo muito mais vasto. Podemos perceber na literatura a palavra patrimônio geralmente
acompanhada de termos como: cultural, histórico, artístico, arquitetônico, arqueológico, material,
imaterial, cultural ambiental, cultural subaquático. O que denota um movimento de ampliação da
noção e significado do mesmo. Mas nem sempre foi assim, como já vimos, o patrimônio estava muito
voltado para as artes, as construções e os objetos.
107
A ideia de continuidade, de ensino-aprendizagem, de como fazer determinada coisa não é uma
invenção da modernidade. É algo necessário e que está diretamente conectado à vida social.
108
Fruto também de sua formação educacional, com pouco ou nenhum acesso à escola. Essa
situação é observável principalmente nos velhos mestres.
64
109
Comunidades tribais, que viveram sob o modo de produção comunista primitivo, ensinavam às
suas gerações o que deveria ser lembrado, cultivado e guardado.
110
Utilizamos aqui a ideia de Gohn (1999).
111
Nossas observações acima devem estar resguardadas às devidas proporções, pois, ao mesmo
tempo em que o capoeira necessita sobreviver nesta sociedade, vendendo sua força de trabalho,
testemunhamos diversas iniciativas educacionais, que se preocupam com a educação de sua
comunidade, desenvolvendo trabalhos sociais, sem fins lucrativos, e enfocando a capoeira enquanto
cultura ancestral, que deve ter sua continuidade baseada nas matrizes africanas e afro-brasileiras.
65
Martin Cézar Feijó, autor do livro O que é política cultural, um dos primeiros a
escrever sobre esse tema, no Brasil, defende que: “A cultura é um elemento da
política. Há quem veja a política como um momento da cultura. De qualquer forma,
desde que existe política também existe elaboração cultural e uma ação comum em
torno dela” (FEIJÓ, 1990, p. 123).
Aceitamos a reflexão de que cultura seja um elemento da política e de que,
existindo a política, as elaborações culturais estarão presentes, porém essas
elaborações não estão totalmente sujeitas à existência do Estado. A capoeira
exemplifica isso muito bem. Não precisou do Estado para se difundir pelo mundo,
nem para atender, culturalmente falando, as camadas mais baixas, realizando
inclusive trabalhos socioeducativos.
Lembremos Karl Marx e Friedrich Engels, em sua famosa obra A ideologia
alemã, quando afirmam: “Não é o Estado que cria a sociedade civil, conforme
pretendia Hegel. Ao contrário, é a sociedade civil que cria o Estado. A sociedade civil
é o verdadeiro lar e cenário da história [...]” (MARX; ENGELS, 1998, p. 31).
Constatamos isso no capítulo anterior, quando discutimos o desenvolvimento
da capoeira, antes mesmo de estar inserida nas políticas culturais contemporâneas,
quando irá desenvolver um grande serviço, sem essa intenção, à sociedade
capitalista, ao cuidar das mazelas sociais produzidas pelas suas próprias
112
Música Parabolicamará. Canta: Gilberto Gil.
66
contradições.113
A cultura está viva, transcorrendo todo o tempo na sociedade. O Estado, em
determinado momento, a vasculariza, ora em determinadas áreas, ora envolvendo
determinado grupos e ações, dando visibilidade e democratizando certos
conhecimentos.114
Na nossa sociedade, a temática da cultura exprime a incompatibilidade
marcante entre as produções culturais oriundas das camadas mais populares e
trabalhadoras e as produções provenientes dos que detêm o poder e o capital.115
Quando o músico Gilberto Gil assume o MinC, sua gestão estabelece um
novo olhar sobre a cultura, imprimindo um trato diferenciado, incomum até então, na
gestão dessa área.
E o que entendo por cultura vai muito além do âmbito restrito e restritivo das
concepções acadêmicas, ou dos ritos e da liturgia de uma suposta ‘classe
artística e intelectual’. Cultura, como alguém já disse, não é apenas ‘uma
espécie de ignorância que distingue os estudiosos’. Nem somente o que se
produz no âmbito das formas canonizadas pelos códigos ocidentais, com as
suas hierarquias suspeitas [...]. (GIL, 2003)
113
Mais fortemente, a partir da década de 1930.
114
O pleito para o destino da capilarização das ações culturais se constitui em política. A disputa entre
grupos antagônicos das diferentes classes estabelecidas socialmente, representações e símbolos,
além de disposições políticas personalizadas destinarão atendimento às áreas culturais, em
determinada gestão.
115
Historicamente, as ações culturais eleitas pelos burgueses como suas preferidas têm
significativamente orientado os caminhos da produção, divulgação e manutenção da cultura no país.
67
116
A cultura europeia fixou-se a partir da nobreza e posteriormente da burguesia oligárquica, em
seguida industrial, no nosso país, reforçada por um modelo de educação eurocêntrico e,
posteriormente, sob forte influência norte-americana. É claro que nossa formação cultural exprime
costumes, crenças, tradições e fazeres da cultura negra e indígena, todavia as mesmas não
significam, hegemonicamente falando, um projeto de construção, valorização, reconhecimento e
conscientização cultural. Assim, tais manifestações são retratadas e reduzidas, na história da
construção política cultural do nosso país, a meras atividades folclóricas e turísticas, com ênfase
mercantilista e de entretenimento, sempre maquiadas em nome de uma estética burguesa e sob
padrões exóticos, aos olhos alheios. Isso é reforçado pelos nossos programas educacionais e pela
mídia, fazendo com que um determinado discurso se torne legitimador e único, pela sua constante
reprodução.
68
Até os anos de 1930, como vimos, a capoeira não será encarada pela política
brasileira, muito mais do que já relatamos.120 Apesar de já reconhecermos o trabalho
de perpetuação cultural desta manifestação, assim como a sua incrível
adaptabilidade à sociedade, que ora a tratava como luta, ora como ginástica ou
esporte, ora como atração turística e/ou como símbolo de brasilidade e identidade
nacional, dentre outros.
Feijó (1990) destaca, assim como Rubim (2007),121 que “a relação entre
cultura e política no Brasil começou a se tornar mais clara com o advento da
República” (FEIJÓ, 1990, p. 147). Analisando seus escritos, identificamos que, nos
primeiros anos de República nova, o Brasil ainda se encontrava no ostracismo
cultural, pois atitudes provincianas e cosmopolitas davam o tom de
subdesenvolvimento à nação.
Realmente, há uma elevada intervenção do Estado sobre a área cultural,
119
Estudos recentes tedem a incluir, sob este conceito, o conjunto de intervenções do Estado,
instituições civis e grupos comunitários organizados para orientar o desenvolvimento simbólico.
(Tradução nossa)
120
A capoeira configuraria as páginas dos jornais enchendo os noticiários policiais, com crimes e
conchavos políticos. Até nos momentos de guerra ou conflito, quando estava posto o êxito do
capoeira, sua história daquele momento seria apagada ou renegada, apesar de sua grande
contribuição. Os jornais estampariam também cartas da época, criticando-a, rebaixando-a a ato
marginal, em processos criminais, o que, mais tarde, na República, ganharia um artigo no código
penal.
121
Rubim (2007) não julgará suficiente a ação do Império, nem da República até os anos de 1930, em
relação à área cultural. Ele defenderá que estes momentos históricos não tiveram a capacidade de
construir, efetivamente, um cenário propício às políticas culturais, que surgiriam, com suas
características peculiares, apenas mais tarde. Em consequência disto, temos um incentivo para o
desenvolvimento e o fortalecimento da cultura nacional, que é muito superficial, e um caráter
hipertardio das políticas culturais em nosso território.
71
122
Segundo Rubim (2007), em 1937, o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN)
foi criado através de uma proposta encomendada pelo então Ministro de Educação e Saúde, Gustavo
Capanema, a Mário de Andrade, chefe do Departamento de Cultura da Prefeitura de São Paulo. A
criação desse órgão, que posteriormente se transformará no Instituto de Patrimônio Histórico Artístico
Nacional (IPHAN), fortalecerá o início das políticas culturais em nosso país.
123
A revista Cultura Política será um instrumento de divulgação da visão que identifica a cultura como
a essência da nacionalidade.
124
As ideias e ações para o desenvolvimento de uma identidade nacional têm início no Império.
125
Grifos nossos.
72
126
A formação cultural mais crítica, consciente ou não, perpassa por um processo de
intencionalidades, de ideologias e de contradições.
127
Conforme Ângelo Decânio Filho.
73
128
A capoeira enquadra-se nas manifestações que precisaram ser modificadas e adequadas para que
fossem aceitas socialmente. A sociedade brasileira não iria tolerar algo que nasceu nas ruas, a partir
de uma cultura de negros, africanos e afro-brasileiros escravizados, salvo se não sofresse sérias
modificações em suas estruturas. Nessa lógica, surgem os projetos de ginasticalização, de
esportivização e de nacionalização impostos, principalmente, na década de 1930.
129
As ações na área da cultura, por parte da política nacionalista da era getulista, e posteriormente do
movimento militar, fortaleceram, em determinadas medidas, o amadurecimento do país frente ao
reconhecimento de alguns símbolos, a necessidade de preservação, a salvaguarda e a valorização
das produções culturais nacionais, ora de forma mais livre, ora de forma controlada, ao extremo, mas
sempre com tensionamentos e disputas.
74
130
Essas alterações ocorrem em 1953. Não será um momento de grandes expressões neste campo.
131
Calabre (2006) afirma que, em fevereiro de 1967, o Conselho Federal de Cultura tomou posse,
com a seguinte composição: Adonias Filho, Afonso Arinos, Ariano Suassuna, Armando Schnoor,
Arthur Reis, Augusto Meyer, Cassiano Ricardo, Clarival Valladares, Djacir Lima Menezes, Gilberto
Freire, Gustavo Corção, Hélio Viana, João Guimarães Rosa, José Cândido de Andrade Muricy, Josué
Montello, D. Marcos Barbosa, Manuel Diegues Junior, Moysés Vellinho, Otávio de Faria, Pedro
Calmon, Rachel de Queiroz, Raymundo de Castro Maia, Roberto Burle Marx, Rodrigo Mello Franco.
Todos são intelectuais de reconhecida importância e projeção nacional.
75
132
Em 1961, o professor Lamartine Pereira Costa publica, pela Ediouro, Capoeiragem: a arte da
defesa pessoal brasileira e, logo em seguida, em 1962, o famoso Capoeira sem Mestre.
133
Mais especificamente em 1968 e 1969.
134
Exacerbação da técnica, cartolagem, espetacularização, racionalização, burocratização,
quantificação e mercadorização, dentre outros.
76
O Collor teve que construir a sua imagem anti-Sarney [...]. E o Sarney tinha
feito uma lei de cultura – quem fez a lei, na verdade, foi o Celso Furtado,
mas de qualquer maneira, foi chamada Lei Sarney. O Collor era o ferrabrás
do moralismo. Atacou a Lei Sarney com tudo que pôde. Pessoalmente, acho
que houve um erro grave. [...] Acabaram com a Lei Sarney quando deveriam
ter acabado com as incorreções da Lei Sarney. O erro básico é este.
(PRODUÇÃO CULTURAL NO BRASIL, 2010, p 5)
O pano de fundo que fez com que o então presidente Collor de Melo
reduzisse o MinC a uma secretaria, para Weffort, foram supostas fraudes
relacionadas à Lei Sarney.
135
No cargo do novo Ministério estava o pernambucano Marco Antônio de Oliveira Marciel, que, a
partir desta ação, agora ficaria somente com a responsabilidade sobre a pasta da educação.
77
[...] encontrei a Lei Rouanet e a lei do cinema, que são leis importantes com
todos os defeitos que possam ter. Encontrei algumas experiências deixadas
pelas administrações anteriores, como o programa de bandas de música.
Encontrei uma proposta extremamente interessante de recuperação da
documentação histórica brasileira na Europa, do período do Descobrimento
até a Independência. E também frangalhos das instituições do Ministério da
Cultura, especialmente da Funarte. [...] Havia um clima de muita
desesperança na cultura [...]. Collor deixou, fora a Lei Rouanet, um clima de
depressão. [...] O período da minha administração foi um grande esforço de
recuperar a possibilidade de um Ministério da Cultura [...]. (PRODUÇÃO
CULTURAL NO BRASIL, 2010, p 6)
136
Iniciadas por Collor e continuadas por FHC, no Brasil, essas reformas podem ser resumidas nas
palavras: terceirização, precarização, burocratização e institucionalização.
78
Sempre acreditei que o Estado tem o dever da cultura, tanto quanto o dever
da educação. Isso não significa que deva haver dirigismo de Estado para a
cultura, como não deve haver dirigismo para a educação. [...] A política da
cultura deve trabalhar com ‘duas mãos’: fundos públicos, que devem ser
aplicados a fundo perdido, e a possibilidade de captar recursos nas
empresas com dedução fiscal. (PRODUÇÃO CULTURAL NO BRASIL,
2010, p. 7).
[...] não temos um ministério da cultura preparado. [...] Eu nem sabia que ele
existia. Mas vi o ministro sendo entrevistado [...] e pensei: ‘Será que estou
ficando pirada? Esse ministro é da cultura ou da economia?’ Durante 50
minutos ele só falou em verbas, dinheiro e outros palavrões. [...] de tradição
ele não entende nada! (VELLOSO, 1996)
A cantora ainda cobra uma maior sensibilidade para gerir um país com tão
rica e diversa cultura. A capoeira, enquanto cultura popular terá, na gestão de
137
Ex-ministro e um dos fundadores do PT.
79
repetirá na gestão dos primeiros ministros da cultura dessa nova fase. Antes, porém,
ressaltaremos nossas estratégias para a realização da pesquisa.
141
Referência à frase do poeta espanhol Antônio Machado.
142
Enquanto houver Sol, música de autoria de Sérgio Brito. Canta: Titãs.
81
nesta pesquisa, mas sim os pensamentos. Estes são livres e não se aprisionam em
caixas teóricas. Estabelecemos, neste trabalho, um diálogo aberto com diversos
pensadores críticos e, a partir do nosso discernimento, formulamos críticas,
ponderações, proposições, discordâncias e aquiescências.
No livro Contribuição à crítica da economia política, Marx (2008) enfatiza,
somente para exemplificar, a importância das “tradições”, quando discute a
propriedade comunal dos eslavos. Dito isso, convém agora afirmarmos que o
raciocínio desenvolvido ao longo do nosso trabalho “[...] não nega as ações
exteriores e suas possibilidades de acarretar mudanças correspondentes nos
fenômenos submetidos a essa ação. Mas, não reduz a causa do aparecimento e da
existência de fenômenos às ações exteriores que eles sofrem [...]” (CHEPTULIN,
2004, p. 229).
É importante também demarcar aqui que não procuraremos a explicação dos
fenômenos fora deles mesmos, muito menos em outros. Para nós, a resposta está
no próprio fenômeno e sua essência. Observando o surgimento e a historicidade da
capoeira, bem como as relações estabelecidas entre esta e a sociedade, podemos
entender seu movimento.
Como percebemos, a capoeira surge em meio a uma sociedade explorada
pelo colonizador, que implementou, naquele momento, um modo de produção
escravocrata. Em seguida, o país inicia mudanças estruturais, consequência
também de pressões externas, que desencadearão no modo de produção
capitalista, ainda de forma bem rudimentar, no primeiro momento.
Na atualidade, a capoeira também é consumida, ou seja, os seus produtores,
ao produzi-la, a transformam, modificam a si próprios e também à natureza. Ao final,
a consomem, e o que consomem nada mais é do que a síntese dessa relação,
oriunda da própria natureza.
Tudo isso nos proporciona uma riqueza muito grande, ao estudá-la e
estabelecer uma tentativa de sua compreensão, enquanto fenômeno da atualidade,
no recorte da política cultural. Entra aqui o modo como enxergamos esse fenômeno,
bem como a realidade que emerge de suas relações.
Sendo assim: “A realidade é interpretada não mediante a redução a algo
diverso de si mesma, mas explicando-a com base na própria realidade, mediante o
desenvolvimento e ilustração das suas faces, dos momentos do seu movimento”
(KOSIK, 2002, p. 35).
82
143
Conforme Minayo (2008).
83
4 Políticas de Patrimônio
Lemos Belluco; – Salvador: Amélia Conrado e Adriana Albert Dias; – Recife: Vânia
Fialho, Izabel Cordeiro e Maria Jaidene Pires; Consultores: Frederico Abreu e
Matthias Röhrig Assunção.
Nossa pesquisa de campo foi fundamental para compreendermos o processo
que envolveu as políticas culturais voltadas para a capoeira. Esforçamo-nos para
envolver os cinco territórios brasileiros, com o objetivo de perceber o impacto das
políticas voltadas para a capoeira em nosso país. A investigação buscou ouvir
sujeitos que participaram, direta e indiretamente, destes processos, nas regiões
Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul.
Nosso trabalho divide-se em seis momentos. No primeiro momento,
realizamos pesquisas no Estado da Bahia, na capital, Salvador, e no interior, em
Cachoeira, Feira de Santana e em Bom Jesus da Lapa, efetuando entrevistas e
levantamentos em fontes primárias, na Biblioteca Pública do Estado. Vale destacar
nossa participação em eventos que discutiram o nosso objeto de estudo, como o VI
e o VII Fórum de Políticas Culturais, ocorridos em Salvador, e Diálogos Culturais, na
cidade de Cachoeira.
O segundo momento abarcou três viagens ao Rio de Janeiro. Na primeira
viagem, cursamos um seminário/disciplina intitulado Capoeira: cultura, patrimônio e
identidade, no Programa de Pós-Graduação de História Comparada, do Instituto de
História da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), ministrado pelo
professor-doutor Luís Renato Vieira.
Estabelecemos contato com o Museu da República e realizamos
levantamentos e pesquisas na biblioteca Amadeu Amaral, do Museu do Folclore. Na
segunda visita ao sudeste do país, fizemos entrevistas nas cidades do Rio de
Janeiro e Niterói e pesquisamos materiais bibliográficos e midiáticos, novamente na
biblioteca do Museu do Folclore, além de recolhermos materiais produzidos no PCV
e no processo de reconhecimento da capoeira como patrimônio imaterial.
Ademais, assistimos à aula da disciplina Cultura e Política: Sociologia da
Cultura – IFC02906, ministrada pelos professores Myrian Sepúlveda dos Santos144 e
Maurício Barros de Castro, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), no
Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Recolhemos algumas referências
trabalhadas na disciplina e participamos das discussões que se acrescentaram a
144
Myrian dos Santos foi uma das autoras trabalhadas como referência desta tese.
87
Punga, Marimba e
Projeto de Pernada – Aspectos da
Educação e capoeiragem na cultura
Cultura Terra Brasil popular do Maranhão.
Memorial da Capoeira
Pernambucana.
Patrimônio e
Salvaguarda e
Capoeira Angola: Estudos
PCV.
e Práticas.
145
Outros ministérios também desenvolveram discussões e (ou) ações voltadas para a capoeira
como: Relações Exteriores, Educação, Esporte e Previdência Social.
146
Trataremos aqui como políticas culturais.
91
Negro africano
Que é de sangue nosso irmão
Em terras brasileiras
Criou a capoeira para sua libertação
E na província
Quiseram ela, acabar
Mas como um broto de cana
1
Brotou, e voltou a plantar.
1
Música de capoeira de Toni Vargas. Título: Ajuda eu berimbau.
2
Item 35 das Concepções e Diretrizes do Programa de Governo do PT para o Brasil.
92
2
Item 35 das Concepções e Diretrizes do Programa de Governo do PT para o Brasil.
3
Grifo nosso.
4
No texto, são apontados seis temas que norteariam as políticas culturais do Governo Lula:
Cultura como Política de Estado; Economia da Cultura; Gestão Democrática; Direito a Memória;
Cultura e Comunicação e Transversalidades das Políticas Públicas de Cultura. Ao delimitar e
expor esses temas, o PT engloba, em sua proposição, desde o trato com a cultura como um
direito básico e permanente do cidadão, respeitando a diversidade do país; passando pela cultura
como um fator de desenvolvimento humano, assim também como da economia; a
descentralização política e administrativa; a regionalização das políticas culturais e sua
acessibilidade; a preservação da memória e do patrimônio material e imaterial; estímulos e novos
critérios para o trato das redes de entretenimento e a relação das políticas culturais com as
políticas sociais.
93
5
Juca Ferreira foi responsável por incluir a dimensão cultural nos projetos socioeducativos
voltados para crianças e adolescentes em situação de risco social do Projeto Axé, sendo a
capoeira uma das linguagens artísticas utilizadas para as suas finalidades educativa e
profissionalizante.
94
6
Cria o Programa Nacional de Cultura, Educação e Cidadania – CULTURA VIVA, com o objetivo
de promover o acesso aos meios de fruição, produção e difusão cultural, assim como de
potencializar energias sociais e culturais, visando à construção de novos valores de cooperação e
solidariedade. (PORTARIA nº 156, 2004)
7
Até 2008, chamava-se Secretaria de Programas e Projetos Culturais.
8
Dentre os seus objetivos podemos citar: Ampliar e garantir acesso aos meios de fruição,
produção e difusão cultural; – Identificar parceiros e promover pactos com atores sociais
governamentais e não governamentais, nacionais e estrangeiros, visando um desenvolvimento
humano sustentável, no qual a cultura seja forma de construção e expressão da identidade
nacional; – Incorporar referências simbólicas e linguagens artísticas no processo de construção da
cidadania, ampliando a capacidade de apropriação criativa do patrimônio cultural pelas
comunidades e pela sociedade brasileira; – Potencializar energias sociais e culturais, dando vazão
à dinâmica própria das comunidades e entrelaçando ações e suportes dirigidos ao
desenvolvimento de uma cultura cooperativa, solidária e transformadora; – Fomentar uma rede
horizontal de “transformação, de invenção, de fazer e refazer, no sentido da geração de uma teia
de significações que envolva a todos”; – Estimular a exploração, o uso e a apropriação dos
códigos de diferentes meios e linguagens artísticas e lúdicas nos processos educacionais, bem
como a utilização de museus, centros culturais e espaços públicos em diferentes situações de
aprendizagem, desenvolvendo uma reflexão crítica sobre a realidade em que os cidadãos se
inserem; e – Promover a cultura enquanto expressão e representação simbólica, direito e
economia. (MINC, 2005)
95
Estava dado, assim, o primeiro passo para uma nova postura em relação
ao Estado e à cultura do país. Somente restava agora gerenciar sua execução e
para que este programa fosse comprovadamente se respaldando, estratégias de
avaliação moldariam um perfil do seu sucesso ou insucesso.9
Entretanto, o instrumento mais contundente para isso são os critérios de
avaliação. À época da elaboração do PPA,10 2004-2007, a preocupação, no que
tange à questão da cultura, estava no acesso limitado da população aos produtos
culturais, bem como nos entraves à produção e à expressão da diversidade das
culturas locais. Dessa maneira, o acesso e a democratização foram dois dos
enfoques principais das políticas culturais do período.
O programa Cultura Viva11 envolve várias ações para atingir seus principais
objetivos: Pontos de Cultura; Agente Cultura Viva; Cultura Digital; Escola Viva e
Griôs – mestres dos saberes.
Uma das principais ações, destacada como prioritária, do Programa Cultura
Viva, sem dúvida são os Pontos de Cultura, desenvolvidos pela Secretaria de
Programas e Projetos Culturais (SPPC). Essa ação contribuiu para minimizar um
dos problemas detectados por vários estudiosos da área das políticas culturais,
em relação a Programas – a descentralização. Dessa forma, tanto as
9
Estas estratégias se processaram não somente através de instrumentos de avaliação, mas pelos
próprios participantes do programa e por aqueles que acompanhavam as políticas culturais.
10
O PPA é responsável por estabelecer todas as ações (projetos e programas) de longa duração
do governo, definindo objetivos e metas da ação pública; está previsto na Constituição Federal.
11
De acordo com o site oficial do MinC, em 2012, o programa passou por alterações devido a
mudanças no PPA de 2012/2015. A reestruturação do PPA, dentre outros objetivos, visou três
grandes objetivos: resgatar a função de planejamento; permitir a reorganização gradual do
orçamento e incentivar o trabalho intersetorial entre os ministérios. A partir destas transformações,
o Programa Cultura Viva constituiu-se como uma iniciativa do Programa Temático “Cultura:
Preservação, Promoção e Acesso”.
97
12
Pontos de Cultura é uma ação articuladora, que vem estimular trabalhos já desenvolvidos. Por
meio de uma nova gestão de política pública, através de editais abertos à sociedade civil, diversos
grupos concorrem para receber recursos. Além de ser inovadora, essa política se configura como
uma proposta democratizante, de acesso à cultura, protagonismo e autonomia cultural.
13
Os equipamentos são compostos por microcomputador, mini-estúdio para gravar cd, câmera
digital, ilha de imagem, dentre outros. Conectados estes formariam uma grande rede.
98
14
O Ponto de Cultura não é uma ação que aborda especificamente uma manifestação. Ele
envolve todas as expressões, sem limites. São iniciativas que envolvem a dança, o teatro, o
cordel, o esporte, a música, o circo etc. Atinge várias comunidades, nas cidades, no campo, nas
tribos indígenas, nas comunidades quilombolas, que buscam suas identidades, na esperança de
se reconhecerem como seres ativos e produtivos.
15
Para mais informações ver documento (Anexo B).
99
16
Esta ação é uma medida para garantir a formação cultural dos futuros cidadãos. Além de
movimentar a cultura local e desenvolver, em conjunto com as diversas instituições públicas (ou
não), atividades para a implementação e a difusão dos direitos da criança e do adolescente, os
Pontinhos estimulam experimentações culturais do universo infantil. Trata-se de uma política
pública que amplia as possibilidades do fazer artístico, em uma ação conjunta com a comunidade,
enriquecendo suas práticas e saberes, exercitando o direito ao brincar, como uma prática da
cultura corporal dos ser humano, construída historicamente, e que faz parte do nosso arcabouço
cultural, enquanto patrimônio.
17
Sérgio Vieira de Mello representante especial da ONU no Iraque ficou soterrado nos escombros
do quartel-general da Organização em Bagdá, mas, depois de horas esperando por socorro, não
resistiu aos ferimentos, conforme documentário feito em sua homenagem pela HBO, de autoria de
Greg Baker, intitulado Sérgio Vieira de Mello. Esse brasileiro pacifista morreu vítima de um
atentado terrorista.
18
A retaliação estava diretamente ligada à invasão e à ocupação desastrosa do Iraque pelos EUA,
mas a explosão da bomba não escolheu culpados, nem tão pouco responsáveis. De acordo com
outro documentário – Sérgio Vieira de Mello: a caminho de Bagdá, de Simone Duarte – era a
primeira vez que a ONU entrava em um país após sua ocupação e, para muitos, Mello era o
melhor representante que Kofi Annan tinha para essa missão. O atentado, atribuído à rede
terrorista Al-Qaeda, feriu cerca de 150 pessoas e o brasileiro foi um dos 22 mortos, naquele
fatídico 19 de agosto.
100
Oficial e publicamente, Gilberto Gil divulga ações que iriam dar a tônica das
políticas culturais voltadas para a capoeira. O ministro anuncia uma reunião com
representantes brasileiros e estrangeiros, com o objetivo de esboçar uma grande
ação para esta manifestação, e se compromete apregoando uma série de ações
que seriam implantada pelo que chamou de Programa Brasileiro e Mundial de
Capoeira:
19
Grifos nossos.
101
20
Grifos nossos.
21
Grifos nossos.
22
What Happens Tomorrow, da banda Duran Duran. Mas ninguém sabe o que vai acontecer
amanhã / Nós tentamos não demonstrar como estamos apavorados / Se você me permitir, vou te
proteger da maneira que eu puder / Você tem que acreditar que ficará tudo bem no final / Você
tem que acreditar que ficará tudo bem novamente / Você tem que acreditar que ficará tudo bem no
final / Você tem que acreditar que ficará tudo bem novamente. (Tradução nossa)
102
23
De acordo com o Edital, as instituições/organizações que tivessem seus projetos selecionados
seriam beneficiadas com um repasse no valor total de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais),
que seria efetuado em cinco parcelas semestrais. Conforme cronograma de distribuição dos
recursos, seriam R$ 25.000,00 após a assinatura do convênio; R$ 30.000,00 no primeiro
semestre de 2005; duas parcelas de R$ 30.000,00 no segundo semestre de 2005 e no primeiro
semestre de 2006, respectivamente, e, por fim, R$ 35.000,00, no segundo semestre de 2006.
103
24
Essa reflexão é coerente, porquanto logo em seguida, em 2006, foi lançado, no Rio de Janeiro,
um edital específico para capoeira e mais amplo. É bem verdade que de forma mais diversificada
do primeiro, que aconteceu somente na Bahia, pois já trazia um novo trato com a capoeira.
25
Como presidente desse coletivo, estava Célio Roberto Turino de Miranda, Secretário da SPPC.
Complementando a lista de membros da banca avaliadora, estavam: Elder Vieira dos Santos, que
exercia o cargo de Gerente da Secretaria de (SPPC); Franco César Bernardes, Assessor da
Secretaria Executiva/SE; Cliffor Luiz Abreu Guimarães, Gestor Especialista em Gestão Pública e
Governamental da Secretaria de Políticas Culturais (SPC); Sandra Silveira de Pereira Mendes,
Assessora de Gestão Estratégica da Fundação Cultural Palmares (FCP); Marcus Vinícius
Carvalho Garcia, Sub-gerente de Identificação do DPI do IPHAN; Elisiário Palermo, Consultor do
Programa Monumenta; Rosana Fernandes, Assessora de Projetos da Coordenadoria Ecumênica
de Serviços (CESE-BA) e Dulce Tâmara da Rocha Lamego da Silva, Diretora da Escola de Dança
da Universidade Federal da Bahia/UFBA-BA.
104
Após eu ter recebido esse prêmio, consegui levar para a comunidade [...]
técnicos em informática, fisioterapeutas, pessoas formadas em artes
cênicas. A capoeira foi responsável por tudo isso! Então, a ginga e o
27
Apesar da capoeira ser praticada em grande parte do Estado, e principalmente na capital, onde
existem muitos espaços e encontramos adeptos da sua prática, inclusive nas regiões mais
afastadas do centro da cidade, não existe uma política clara, nem da Secretaria de Cultura, nem
da Secretaria de Educação da Bahia, com vistas a fortalecer a disseminação e o ensino da
capoeira na região. Mesmo assim, encontramos a capoeira em todos os bairros da capital, em
academias, em sede de moradores, nas escolas e em projetos sociais.
28
O mais importante é que ela é um instrumento que ajuda os indivíduos a se reconhecerem
enquanto seres sociais e, consequentemente, a se emanciparem.
106
[...] o impacto provocado pela cifra de R$ 1,85 milhão, foi aos poucos se
desfazendo, inicialmente ao tomarmos conhecimento de que a quantia
destinada a cada projeto deveria cobrir seus gastos por três anos.
Ademais, essa verba estaria limitada a apenas 10 grupos, que, para
concorrerem ao processo seletivo, deveriam cumprir alguns pré-
requisitos básicos – cópia do CNPJ da entidade ou CPF do candidato;
cópia do estatuto da entidade; cópia autenticada da ata de posse ou de
eleição da diretoria da entidade; cópia autenticada do RG e do CPF do
responsável legal ou procurador nomeado (nesse caso, com cópia
autenticada da procuração); título de utilidade pública dentre outros – o
que tornava inviável a participação de grande parte dos grupos de
capoeira. (ARAÚJO, 2009, p. 4)
33
Grifos nossos.
108
34
O problema que teve foi a burocracia [...]. A prefeitura de Salvador
[...] quando nós instituímos a academia procuramos legalizar
juridicamente. Cada espirro que você desse dentro da Secretaria da
Fazenda você tinha que pagar e nós somos uma instituição sem fins
lucrativos. (MESTRE MARINHEIRO, Informação verbal, 2012)
34
Grifos nossos.
35
Taxa de Fiscalização de Funcionamento.
36
Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana.
37
O desabafo está relacionado à falta de domínio sobre o conhecimento necessário da
comunidade de capoeira, quanto ao registro e ao funcionamento de instituições legais. É um
problema que afeta, não somente a comunidade da capoeira, mas quase toda a sociedade.
38
Este prêmio visa contemplar entidades civis sem fins lucrativos que desenvolveram trabalhos, a
partir de seleções de editais publicados pelo ministério, como Pontos de Cultura. A iniciativa já
atingiu mais de sessenta projetos, que recebem, ao todo, um prêmio de R$ 80.000,00 (oitenta mil
reais).
39
O projeto Cidade Cidadã, da Associação Lapense de Capoeira, em 14º lugar, e o projeto
Capoeira Instrumento de Educação, do Grupo Ginga e Malícia, em 27º lugar.
109
A gente ganhou o prêmio Asas e têm assim uns dois anos [...]. A gente
nunca recebeu. Sempre a gente manda um e-mail pra lá procurando,
eles falam que ainda está em processo de pagamento 2008, 2009, e que
tenha paciência [...]. (MESTRE FAZINHO, Informação verbal, 2012)
No Governo Lula a capoeira deu um salto. Por que a capoeira está nos
países afora? Porque nós ensinávamos a “Paulo”, “Paulo” a “Pedro”, [...]
e aí nós espalhamos a capoeira nesse mundo. Essa cultura lá é mais
valorizada que aqui [...]. (MESTRE FAZINHO, Informação verbal, 2012)
40
Os demais ou estão inadimplentes, ou se encontram com suas prestações em análise pelo
Tribunal de Contas do Estado (TCE), conforme dados recolhidos em novembro de 2012.
41
Ver Anexo C.
110
[...] quando saiu Lula entrou Dilma, no meu ponto de vista, deu uma
parada. A cultura do território foi esquecida, inclusive os Pontos de
43
Cultura. Tá tudo parado! Envolveu essa figura que está no ministério,
que pra mim é nota zero. Se não me engano milhões de reais ela já tirou
[...] do interior e já está centralizando de novo na cidade grande.
Pessoas que nem precisam desse tipo de ajuda, que já têm o nome e
nós estamos esquecidos. Eu dou nota zero a essa ministra. Acabou com
o Ponto de Cultura [...]. (MESTRE FAZINHO, Informação verbal, 2012)
42
Grifos nossos.
43
Refere-se aqui à ex-ministra Ana de Hollanda.
44
Grifo nosso.
111
45
Esta inclusive tem sido uma grande discussão que toma uma e outra vez a dianteira nos
assuntos sobre cultura no país. Desde a saída de Juca Ferreira à assunção da também ex-
ministra da cultura Ana de Hollanda, especulações e ações demonstram os entendimentos, estilos
e caminhos da cultura, nesta nova fase.
112
46
A novidade. Música de Gilberto Gil.
47
Destacando as palavras do ex-ministro.
113
O Museu da República,48 foi escolhido pelo MinC para sediar o PCV, pelo
caráter simbólico, pois a República traz em sua história momentos de perseguição
e discriminação à cultura afro-brasileira, em especial à capoeira. Como este foi
sede da República do Brasil, entre 1897 a 1960, a justificativa da reparação e do
reconhecimento do valor da capoeira para o Estado fica registrada.49
O custo total, para o desenvolvimento de todas as ações previstas para a
implementação e o desenvolvimento da iniciativa, conforme divulgação do
Observatório dos Editais do MinC, ultrapassou a casa do milhão.
48
Na época dirigida por Ricardo Vieira Alves de Castro.
49
A função do Museu da República estava na coordenação técnica da ação, junto com a
Associação de Apoio ao Museu da República (APAMR), que tinha à frente de sua gestão Romílio
da Costa Leite. A empresa Petrobrás era a responsável pelos investimentos destinados ao PCV.
Dados divulgados pelo MinC confirmam que a primeira edição do projeto, no Rio de Janeiro,
abarcou o patrocínio da referida empresa através de R$ 930.000,00 (novecentos e trinta mil reais).
50
Esta ação se constitui como um projeto, apesar de ora os discursos sobre o PCV, em suas
primeiras aparições, permearem a esfera de um projeto, ora outra, de um programa, pelas
informações e discursos oficiais, divulgados em vários meios de comunicação.
114
51
Se os pleiteantes preferissem as inscrições também poderiam ser feitas por caixa postal,
todavia o prazo para isso era menor, os documentos tinham que estar registrados e a encomenda
precisava possuir aviso de recebimento.
52
Estas se configuravam em linhas de ações visando organização e delimitação das ações. O
investimento foi aplicado em três linhas de atuação: 1- Incentivo à produção de pesquisa,
inventários e documentação histórica e etnográfica sobre a capoeira; 2- Ações sócio-educativas;
3- Apoio a acervos e documentos. A primeira tinha como meta atingir o quantitativo de R$
20.000,00 (vinte mil reais) por projeto. No total essa categoria obteve disponível para investimento
R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais).
53
A última modalidade da categoria Ações Socioeducativas foram os projetos voltados para
experiências governamentais, que, neste caso, não receberam nenhum incentivo. Os aprovados
aqui, em número de 16, deveriam receber um certificado de qualificação emitido por um grupo de
mestres de capoeira, que foi denominado de Conselho de Mestres do PCV.
115
54
Dentre as ações do PCV, destacam-se palestras e seminários, com o objetivo de disseminar
conhecimentos sobre essa cultura e articular os saberes de seus mestres e estudiosos.
55
Inicialmente, Galeria dos Mestres, transformou-se, posteriormente, em Academia de Mestres.
56
Essas ações irão culminar com o reconhecimento da Capoeira como Patrimônio Cultural do
Brasil, Patrimônio Imaterial.
57
Três seminários nacionais foram realizados: na Bahia, em Recife e no Rio de Janeiro.
116
Moraes Trindade (mestre Moraes), Luiz Renato Vieira (mestre Luiz Renato),
Antônio de Menezes (mestre Burguês), Antônio Batista Pinto (mestre Zulu), José
Tadeu Carneiro Cardoso (mestre Camisa), Elton Pereira de Brito (mestre Suíno),
Marcelo Azevedo Guimarães (mestre Peixinho), Reinaldo Ramos Suassuna
(mestre Suassuna) e Rosangela Costa Araújo (Contra mestra Janja).60
Para entender melhor o que foi o Conselho de Mestres, fomos ouvir dos
próprios indicados, suas impressões, pensamentos e reflexões sobre esse
momento das políticas culturais. Dos dez mestres integrantes desse coletivo,
entrevistamos a metade. Nossa curiosidade inicialmente foi a respeito de como se
formou esse grupo e como esses nomes surgiram para integrá-lo.
Para a depoente a seguir, única mulher do grupo, sua participação está
diretamente ligada a seu envolvimento político e a representatividade de gênero.
O primeiro contato que eu tive, foi com o Gilberto Gil. [...] encontrei com
ele e falei sobre alguns problemas da capoeira e como ele, como
ministro, poderia contribuir bastante. O ministério da cultura vendo a
capoeira como uma manifestação cultural [...] foi no Rio de Janeiro,
depois em Brasília. E me convidaram para fazer parte de um conselho
de mestre. (MESTRE CAMISA, Informação verbal, 2012)
Outro depoente confirmou que sua convocação foi via web: “[...] eu me
lembro de ter recebido por e-mail esse convite e fiz minha confirmação de
imediato, porque eu procuro estar sempre à disposição da capoeira e dos
capoeiristas” (MESTRE ZULU, Informação verbal, 2012).
A ideia de formar um coletivo de mestres de capoeira partiu dos primeiros
gestores do PCV. Estes somente participaram do primeiro edital, afastando-se de
suas funções, quando do fechamento da ação. Em entrevista, o coordenador,
destaca como aconteceu o chamado para atuar nesta iniciativa: “Foi num
60
Graduação da época.
118
A Pelúcio foi uma estratégia porque todo dinheiro público pra poder ser
repassado é uma burocracia muito grande. A gente perde 5 a 10% do
dinheiro, só nessas tramitações e o tempo. Então, eu optei em fazer um
contrato com a Pelúcio, de modo que, como é uma Fundação de
fomento, ela então transformou isso num processo muito simples de
bolsas que, inclusive, isentava os recebedores, os capoeiristas de
pagarem impostos [...]. Então, essa foi a estratégia usada [...]. Como eu
já tenho costume, na área científica [...], já sabia que isso ia funcionar e
funcionou. (RUI PEREIRA, Informação verbal, 2012)
61
De acordo com Rui Pereira, o convite originou-se do professor Ricardo Vieira Alves, que era
diretor do Museu da República e atualmente desenvolve suas atividades como reitor da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).
62
O envolvimento da FJPF com o PCV foi estrategicamente pensado, pelo coordenador, que já
tinha experiência na área acadêmica, e conhecia o trato com verbas públicas.
63
A ideia que fundamentou a constituição dessa Academia de Mestres, conforme seu idealizador,
atrela-se à formação de uma agremiação que indicasse seus expoentes, assim como fazem as
Academias de Letras, dentre outras, além de ser uma forma de homenagear os mestres dessa
manifestação popular.
119
[...] o que me repassaram foi que eu ia fazer parte, com dez mestres, de
uma comissão. [...] e que esse Capoeira Viva ia pegar parte das
discussões, que a gente tinha feito no Encontro Nacional de Capoeira, e
contemplar algumas discussões. [...] Então, uma das propostas era fazer
como uma Academia de Letras, não é? Pegar os principais mestres e
fazer uma Academia [...]. (MESTRE SUÍNO, Informação verbal, 2012)
O que eu percebi [...] foi que eles mesmos não sabiam direito como é
que ia ser. Então, quando eu fui ao Rio de Janeiro para uma reunião, eu
percebi que eles não tinham as informações que a gente necessitava.
Poucas pessoas estavam sabendo as atribuições, como fazer, eu vi que
era algo muito novo pra todo mundo. Eu recebi o convite, por meio da
internet mesmo [...]. (MESTRE SUÍNO, Informação verbal, 2012)
nomes [...]”64 (MESTRE SUÍNO, Informação verbal, 2012). Indagado sobre isto,
um dos membros nos informa não ter participado de nenhuma: “Não! Tudo foi
pela internet” (MESTRE ITAPOAN, Informação verbal, 2012).
Não há registros em diários oficiais e nem mesmo em outro documento do
governo sobre o Conselho de Mestres, fora o que já citamos. Esta foi uma ação
da coordenação da primeira gestão do PCV, que possuía autonomia para tal.
Conforme também já ponderou nosso depoente, houve poucos registros oficiais.
O que sabemos pelos posicionamentos dos entrevistados é que ocorreu
um breve encontro, após o lançamento do que se chamou, no primeiro momento,
de Programa Capoeira Viva, no dia 15 de agosto de 2006, e que esse encontro
acabou se convertendo em uma reunião, no entendimento de alguns integrantes.
Foram estabelecidos os seguintes critérios para as indicações à
Academia:65 Importância do mestre, nacional e local, na preservação da capoeira;
quantidade de mestres por ele formados; sua contribuição e de seu grupo para a
valorização e a promoção da capoeira em sua região; a idade e a condição de
saúde e social.66
No Rio de Janeiro, algumas ideias foram expostas para o grupo. Em
seguida, pela própria dinâmica da iniciativa e das agendas dos mestres, as
discussões posteriores aconteceram virtualmente, sem um acompanhamento
rigoroso. Nem todo o grupo estava presente neste momento.
As ausências dos mestres Suassuna e Itapoan são relembradas por um
membro: “Parece que o Suassuna faltou! Eu não tenho certeza. O Itapoan
também tinha compromisso na data, e eu tenho uma vaga lembrança que foram
esses dois!” (MESTRE ZULU, Informação verbal, 2012).
Houve poucas reuniões presenciais do Conselho de Mestres. Não mais
que duas, conforme nossos entrevistados. As dificuldades de conciliação da
64
Mestre Suíno refere-se aqui ao lançamento do Conselho de Mestres. A segunda reunião foi para
a indicação do Conselho.
65
O Conselho de Mestres precisava estabelecer critérios, de acordo com os objetivos daquela
ação, pois os mesmos estariam influenciando diretamente o processo, dada a representatividade
que isto significaria, bem como a honraria. Consequentemente, a distribuição pensada inicialmente
ficou pendente. Outra questão chamada à atenção pelo primeiro coordenador do PCV é que
deveria haver uma equidade regional, na implementação desta ação, tendo em vista o objetivo de
contemplar o maior número de regiões.
66
A lista com os critérios que serviram de base para a indicação dos mestres (bolsistas) à
Academia do Capoeira Viva, ou conforme indicado em divulgações no próprio site do MinC, foi
validada. Ela deveria se organizar da seguinte maneira: além dos critérios discriminados, cada
membro do Conselho de Mestres deveria indicar uma lista com cinco nomes.
122
67
A indicação dos mestres que deveriam compor essa Galeria, ou como se denominou depois –
Academia –, se consolidou no campo virtual, enviadas on-line para a conta de e-mail do PCV, aos
cuidados de Rui Pereira.
68
Mestre Itapoan refere-se aqui ao Mestre Felipe de Santo Amaro.
123
69
Mestre Ananias (SP); mestre Zé de Freitas (BA); mestre Bigodinho (BA); mestre João Pequeno
(BA); mestre João Grande (NY); mestre Arthur Emídio (RJ); mestre Nestor Capoeira (RJ); mestre
Travassos (RJ); mestre Jair Moura (BA); mestre Mendonça (RJ); mestre Felipe (BA); mestre Celso
(RJ); mestre Brasília (SP); mestre Bigo (SP); mestre Moraes (BA); mestre Suassuna (SP); mestre
Carcará (BA); mestre Roque (RJ); mestre Curió (BA); mestre Joel (SP); mestre Vilmar (RJ); mestre
Genaro (RJ) e mestre Pinatti (SP). Alguns mestres homenageados na produção desse vídeo não
se encontram mais vivos.
124
fosse colocada à disposição do conselho, não é? Quanto mais tornar público para
o meio capoeirístico, de forma geral” (MESTRE ZULU, Informação verbal, 2012).
Nem mesmo alguns integrantes do Conselho de Mestres conseguem
analisar a sua ausência de continuidade. No segundo edital do PCV, o grupo foi
sumariamente ignorado e completamente excluído da gestão das ações.
O que podemos perceber é que a iniciativa poderia ser mais explorada pelo
PCV, uma vez que o Conselho era integrado por mestres renomados,
competentes em suas áreas, e que, pela sua história, já haviam contribuído
bastante com a capoeira e, por seus conhecimentos, poderiam qualificar melhor o
processo.
Eles emprestaram suas experiências, sem qualquer custo, contudo, foram
pouco consultados e até subutilizados. Em nossa análise, a segunda gestão do
PCV deveria ter mantido o Conselho de Mestres, com periódicas modificações em
suas cadeiras, favorecendo, assim, uma reciclagem dos membros.
É válido destacar que, apesar das decisões deste Conselho recaírem no
grupo como um todo, nem todos os mestres que o integraram participaram das
decisões, de forma coletiva como aparentou ser. Muitas foram efetivadas pela
própria coordenação do PCV, sem posicionamentos efetivamente coletivizados,
como, por exemplo, a indicação de alguns integrantes da Academia de Mestres,
para fins de conclusão da lista final.
Continuando a discussão sobre o Conselho de Mestres, questionamos os
integrantes sobre uma ação anunciada, inclusive no Caderno Informativo da
própria iniciativa, referente a um trabalho que seria desenvolvido pelo coletivo, e
que estava diretamente ligado aos projetos aprovados no primeiro edital do PCV.
70
Trata-se do Museu da República.
125
71
É apropriado esclarecer que o Conselho de Mestres não avaliou, em última instância, projeto
algum para concorrer ao edital do PCV, função que foi realizada por uma comissão de
avaliadores.
72
BUENO, Marcos Cordeiro. O Fetiche da Capoeira Patrimônio: quem quer abrir mão da
histórica da capoeira?. 2012. Dissertação (Mestrado em Educação Física). Escola Superior de
Educação Física. Universidade Federal de Pelotas. Pelotas. 2012.
73
COSTA, Neuber Leite. De ato marginal a patrimônio imaterial: análise das políticas culturais
para a capoeira. In RUBIM, Antonio Albino Canelas (org). Políticas Culturais no governo Lula. p.
287-306. (Coleção Cult)
74
Conforme Bueno (2012, p. 107).
75
Conforme indicado no site do PCV.
126
76
Registramos aqui a dificuldade de acessarmos a memória do primeiro edital do PCV. Conforme
a Diretoria atual, bem como os funcionários não há arquivo algum, sobre essa ação, no Museu da
República. A atual gestão afirma não possuir nenhuma documentação referente a essa ação que
foi desenvolvida com o seu apoio técnico. A APAMR não existe mais e conforme o primeiro
coordenador do Projeto o mesmo repassou o que possuía para a FGM.
No Museu do Folclore, mas especificamente na Biblioteca Amadeu do Amaral, encontramos
algumas poucas informações que se traduzem no Folder Informativo e em uma revista publicada
em 2007, denominada Capoeira Viva organizada por Gilberto Nahum que traz algumas
informações sobre os projetos aprovados no 1º Edital. O site não está mais acessível e poucas
informações ainda se encontram espalhadas pela internet.
127
77
De acordo com informações recolhidas no site do MinC a palestra que abriu os trabalhos foi
sobre a temática: A FORMAÇÃO DO MESTRE, ONTEM E HOJE e contou com a exposição de
três mestres renomados no mundo da capoeira brasileira. Mestre Camisa, Moraes e Suíno. No
segundo momento o tema gerador da discussão foi DE ARMA DA VADIAGEM A INSTRUMENTO
DE EDUCAÇÃO. Os expositores também foram membros do Conselho de Mestres, como já
destacamos: mestra Janja, Luiz Renato e Zulu. As falas foram seguidas de debates aberto, todos
mediado pelo professor sociólogo e também capoeira Muniz Sodré.
78
Na abertura do evento realizado no Teatro Gregório de Matos, foram apresentados os projetos
selecionados no PCV, pelo então Presidente da FJPF. Essa fundação atuou como parceira da
APAMR, conforme informações divulgadas nos folhetins do Projeto.
Em seguida a discussão se constitui a partir do tema “CAPOEIRA QUE É BOM, NÃO CAI...”: os
caminhos da Capoeira e as políticas governamentais. Participaram como responsáveis por essa
exposição o mestre Cobrinha Mansa, mestre Itapoan e mestre Moraes, bem como também
Frederico José de Abreu, pesquisador e fundador do Instituto Jair Moura e Wallace de Deus,
coordenador do Projeto Inventário para o Registro e Salvaguarda da Capoeira. Os trabalhos foram
mediados por Rui Fernando Rodrigues Pereira, que à época, era o coordenador do PCV.
79
Esse segundo encontro foi também uma oportunidade para ampliar as discussões acerca do
processo de formação do Dossiê para o Reconhecimento da Capoeira como Patrimônio Imaterial,
uma das ações que integram o Programa Nacional e Internacional de Capoeira. As pesquisas já
se encontravam em andamento e os coordenadores aproveitaram a oportunidade para fazer uma
parceria com o PCV, por isso a presença de Wallace de Deus na atividade.
80
Mestre Gigante, mestre João Pequeno, mestre Bigodinho, mestre Curió, mestre Boca Rica,
mestre Felipe de Santo Amaro, mestre Pelé da Bomba e mestre Decânio.
81
O primeiro painel foi composto por mestre Moraes, que falou sobre A Capoeira como
Instrumento de Resistência; seguido por mestre Rafael Flores, que abordou o tema Capoeira: de
volta às origens. Ainda se apresentaram o mestre Luiz Renato, que discutiu: O Estado Brasileiro e
a Capoeira e o professor Carlos Eugênio Líbano, tratando de: A capoeira entra na Universidade. O
segundo painel do III Seminário organizou-se de forma mais institucional do que os anteriores. O
então coordenador, Rui Fernando Rodrigues Pereira, apresentou publicamente uma avaliação e
os resultados do PCV, primeira ação específica para a capoeira, constituindo-se em uma política
pública de impactos maiores, democratizando, aos presentes, um relatório das ações realizadas
durante sua gestão. Foi um momento público de encerramento da primeira etapa.
128
82
Capoeira Olêlê. Música de Capoeira D.P.
129
que, é bom lembrar mais uma vez, em uma das categorias socioeducativas –
Experiências Governamentais – não houve premiação.83
Apesar da Bahia ser considerada pelo imaginário social e por muitos
cultores dessa manifestação, a Meca da Capoeira, não houve projetos aprovados
na Categoria Socioeducativos/Entidades Governamentais.84 Dos quinze projetos
contemplados, nenhum se encontrava nessa região.
Vale ressaltar que, desde o início da década de 1990, vários projetos que
objetivavam estimular o ensino e a prática da capoeira no Estado da Bahia, vêm
sendo desenvolvidos, tanto pelo governo estadual quanto pelo governo
municipal.85
Houve dificuldades em localizar os proponentes destes projetos, muitos
ligados a gestões públicas passadas, e que já não mais faziam parte das equipes
atuais. Entretanto, conseguimos conversar com o proponente deste último projeto,
desenvolvido na cidade de Colombo, no sul do país, no Estado do Paraná.
Fizemos um contato com Aristeu Oliveira dos Santos, conhecido na região
como mestre Mestrinho, idealizador do projeto Capoeira Arte Luta. Mestre
Mestrinho, além de tecer elogios a esta ação da política cultural, voltada à
capoeira, mostrou-se muito satisfeito com sua participação, nesse momento
histórico. Enfim, este mestre confirmou o recebimento do certificado do PCV.86
Como destacamos, nossa primeira preocupação gerou em torno do acesso
ao conhecimento referente a essa nova política cultural voltada para a capoeira,
implementada pelo MinC, na gestão de Gil. O PCV foi divulgado em vários meios
de comunicação, mas principalmente pela internet. Apesar de observarmos um
desenvolvimento significativo do acesso à web, no nosso território, ainda notamos
83
Para estes, havia apenas a previsão de recebimento de um certificado de qualificação.
84
A região onde mais projetos foram selecionados nesta categoria, obtendo o reconhecimento do
PCV pelas ações voltadas para a capoeira, foi o Sudeste do país, com 10 (dez) aprovações.
Temos, assim, 5 (cinco) em Minas Gerais, 4 (quatro) em São Paulo e 1 (uma) no Espírito Santo. O
Centro-oeste foi representado por Goiás, o Nordeste com 1 (um) projeto apenas, do Rio Grande
do Norte, e o Sul com 3 (três) projetos, sendo 2 (dois) no Rio Grande do Sul e 1 (um) no Paraná.
85
O que notamos é a falta de manutenção e de continuidade dessas iniciativas que se constituem
em projetos de governo e automaticamente, com o fim dos mandatos, as mesmas se esvaem
também
86
Trata-se de um trabalho educacional com crianças e adolescentes portadores de necessidades
especiais, que vem sendo desenvolvido pelo Mestre há algum tempo, nas dependências da
Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) da região. No site Capoeira Arte e Luta,
podemos encontrar mais informações sobre os trabalhos desenvolvidos pelo capoeira
paranaense. Para maior informações, acesse:
<http://www.capoeiraarteluta.com.br/?pg=noticias&limit=0>.
130
O site era muito intuitivo, a interface muito boa, tranquilo. Projeto muito
simples, eu acho que, pelo menos e, na primeira edição, eu acho que na
segunda também, porque foi o mesmo site, porque mudou pouco! Tinha
essa preocupação de facilitar o acesso, até pra pessoas que não
entendessem é, muito, de informática, não era nada complicado fazer o
projeto! (RAQUEL SILVA, Informação verbal, 2012)
87
Termo utilizado na Bahia para designar que a notícia ocorreu verbalmente, ou de boca a boca.
132
[...] eu tentei entrar. Teve um problema com web porque ele ficou fora do
ar no último dia. [...] Ficou muito chato, porque você preparou aquilo,
queria entrar e o website não tava funcionando. Depois, a gente
reclamou, mas o pessoal responsável do primeiro edital disse que não
podia fazer nada. [...] eu acho que não foi justo, porque foi um problema
do website, isso tá comprovado. Não é uma coisa de uma só pessoa.
Teve um monte de gente, eu inclusive estava em contato com outras
pessoas que experimentaram o mesmo problema. Acho que não foi
muito justo não aceitar essas propostas sabendo as dificuldades com o
site. (MATTHIAS ASSUNÇÃO, Informação verbal, 2012)
[...] eu não tive dificuldade [...] na verdade, o trabalho que foi aprovado
foi o da Raquel, [...] eu tava incluído nele. Era rever rapidamente a
dissertação de mestrado e tentar preparar ela da melhor maneira para
ser lida por um público não acadêmico. Ainda assim, não consegui fazer
isso muito bem. Ela ainda tá muito acadêmica, porque não deu muito
tempo entre o resultado do edital e a produção do livro. (BERNARDO
CONDE, Informação verbal, 2011)
Foi meu primeiro edital [...]; se eu for parar pra pensar botando a mão
nos dedos, na gratidão, foi meu primeiro passo. Me estimulou a buscar
outros, que eu já conquistei. Então, ali me abriu [...], foi o primeiro passo
mesmo e, como era de capoeira, ficou mais fácil concorrer. (RODRIGO
BRUNO, Informação verbal, 2012)
Selo Cultura Viva e o Prêmio Itaú Unicef. Além de outros prêmios e bolsas
recebidos pelo próprio Mestre Ananias, pelas suas contribuições no âmbito da
capoeiragem. Enfim, uma trajetória de sucessos e reconhecimento de anos de
trabalho e dedicação foi traduzida em todos esses prêmios e editais selecionados.
Mas é importante ressaltar que tudo se inicia com o PCV.
Nosso depoente, discípulo do mestre Ananias,88 inscreveu vários projetos,
nas duas oportunidades em que houve o PCV. Seus projetos, que sempre
envolveram ações voltadas para o trabalho desenvolvido pelo Centro Paulistano
de Capoeira e Tradições Baianas e o experiente Mestre Ananias, foram um dos
mais contemplados.
Ele foi selecionado no primeiro edital com o projeto Mestre Ananias e, no
segundo, com os projetos Casa Mestre Ananias – Centro Paulistano de Capoeira
Tradicional, Convivência e Cidadania, na Categoria Socioeducativa, e Casa
Mestre Ananias – Centro Paulistano de Capoeira e Tradições Baianas, na
categoria acervos. O depoente destaca a simplicidade do primeiro edital, o que
possibilitou o desenvolvimento do trabalho, assim como a sua prestação de
contas, em sua visão, bastante adequada para esse universo.
Eu lembro que foi muito bom o primeiro, foi simples e feito para quem era
realmente iniciante. Capoeirista é muito iniciante nessa questão de
política pública, de escrever projeto e se articular dessa forma, então, foi
excelente, a prestação de contas simples, então, foi tudo tranquilo. [...].
(RODRIGO BRUNO, Informação verbal, 2012)
88
Um dos percursores da capoeira baiana em São Paulo.
89
Segundo os planos, a proposta englobava o trato da memória da capoeira e, assim, se tornar
um local de pesquisa.
135
[...] pode se ver isso pelos agradecimentos que são feitos nas teses, em
várias partes do mundo. Teve um determinado momento que a gente
tinha a liderança nisso aí, não é? [...] a gente tinha um acervo e esse
acervo já era aberto [...], ele já funcionava antes do edital, [...] como um
alvo de consulta pública, entendeu? [...] já prestava o serviço público [...],
tinha um quarto em minha casa, aonde as pessoas iam lá e eu atendia
gente até de madrugada [...]. (FREDE ABREU, Informação verbal, 2011)
90
O Memorial Digital perdeu-se. A fase número um, conforme previsto no projeto não foi
completamente implantada e não houve continuidade, após o término do primeiro edital do PCV,
assim como em várias outras ações contempladas.
136
valorização e o apoio dos órgãos públicos, Frede Abreu não vislumbrou outra
opção.91
O depoente a seguir lembra que, apesar de algumas dificuldades no
desenvolvimento das ações do PCV, houve a tentativa de viabilizar diversos
projetos, com a interiorização das ações. Tudo foi feito para preparar as
comunidades da capoeira para essa forma de se fazer política cultural.
[...] tava com esse trabalho, sempre com esse foco, e o que eu tava
esperando era oportunidade [...]. A partir do Capoeira Viva, que foi a
vivência pro trabalho aqui de Arraias [...], acredito que foi uma coisa
muito positiva, que aconteceu com a capoeira, pra gente. (MESTRE
FUMAÇA, Informação verbal, 2012)
91
O pesquisador destaca que a execução do projeto já havia acabado e sua saída do espaço que
ocupava anteriormente se deu pela dissolução de sua sociedade, e não necessariamente por
atrasos ou ausência de verbas públicas.
137
do trabalho não ter sido aprovado, pois, segundo ele, seria uma oportunidade de
aprendizado para poder participar e concorrer, novamente, de uma forma mais
qualificada.
Não. Eu tinha curiosidade [...], porque eu documentei tudo. [...] Fiz uma
edição caseira, mas com alguma qualidade [...]. Enviei junto com toda a
documentação da minha pesquisa, da qualificação, tudo! Mandei pelo
correio, além da inscrição na internet, e não recebi nenhuma resposta
com relação a isso. (BERNARDO CONDE, Informação verbal, 2011)
[...] o material ficou todo na mão do produtor, porque eu não sabia fazer
esse negócio de edição, eu tinha que passar pra pessoa que sabia [...];
ele já é premiado a nível nacional, até no Doc TV, só que ele [...] foi
embora pra Alcântara e abandonou o processo, a gente passou o
material, pagamos [...] e ele não terminou, tá tudo na mão dele [...], tá
tudo com ele! (RAIMUNDO CARVALHO, Informação verbal, 2012)
138
92
[...] é um débito que eu tenho com o negócio. Mas se for pra repetir, eu
vou e pego todas as informações, por que as comunidades existem, as
pessoas me conhecem, me respeitam. Então, sabem que não é
brincadeira. Dá pra se refazer tudo de novo. [...] Aliás, eu vou refazer, eu
preciso refazer. (RAIMUNDO CARVALHO, Informação verbal, 2012)
[...] não que a gente queira sempre tá ganhando [...]. Acho que tem que
ter a democracia. [...] a partir do momento em que você concorre uma
segunda vez, com a bagagem que a gente tem da primeira. Então, eu
acho que teria mais chances de ganhar na segunda, do que na própria
primeira vez [...]. Eu acho assim: teria que ver os critérios de avaliação
[...] Ou distribuição por Estado [...] então, acaba que fica uma coisa muito
[...] generalizada. (SILVINHA, Informação verbal, 2012)
92
Refere-se aqui ao projeto PCV.
93
Vale destacar que outro projeto do nosso contemplado (acima) foi aprovado no segundo edital,
que foi executado pela Fundação Gregório de Matos (FGM), com o título de Punga, Marimba e
Pernada: aspectos da capoeiragem na cultura popular do Maranhão.
139
94
[...] a gente fica um pouco frustrado, essa história de [...] não ter sido
responsável, por parte dele, do processo. Não fiz um contrato que foi um
erro meu, não ter feito um contrato, pagamos sem fazer um contrato [...].
Isso foi uma coisa que eu achei que foi uma deficiência do processo [...].
(RAIMUNDO CARVALHO, Informação verbal, 2012)
[...] a pesquisa a gente conseguiu. Eu avalio que foi boa. [...] começou
com uma busca da gente pra fazer essa linha frevo-capoeira. [...] a gente
fechou, subsidiou [...] O produto da pesquisa, o roteiro audiovisual a
gente desenvolveu. [...] a gente pretendia dar continuidade ao livro – à
95
boneca, não é? (JUCIMAR SOUZA, Informação verbal, 2012)
94
Supressão do nome do citado.
95
A pesquisa tratou de produzir um roteiro audiovisual que subsidiou a produção da boneca de um
livro. O assunto gira em torno da implantação da Capoeira Regional em Caruaru, destacando a
presença afrodescendente na constituição da cidade, a partir da década de 1980, e seu
desenvolvimento, focando o estudo principalmente em dois mestres: Pintado e Geleia. Tivemos
acesso ao material produzido e orientamos um dos autores para encaminhá-lo para publicação,
pois contribuiria bastante para a comunidade da capoeira.
140
[...] foi um programa que realmente perguntava o que eles queriam saber
da gente, [...] sem exigir que a gente falasse palavra difícil, foi o
vocabulário que mais chamou a atenção, na época, porque qualquer
pessoa que fosse analfabeta ou não, ter uma ajuda pra alguém digitar,
podia ir falando e a pessoa escrevendo. Então, uma coisa que a gente
tirou o chapéu, pra esse projeto [...], que realmente falou a linguagem da
capoeira. (SILVINHA, Informação verbal, 2012)
De bom, eu acho que esse projeto vai ter um efeito disso adiante. Eu
acho que a gente tem que saber o tipo de efeito, [...] a capoeira tem que
ter um programa, como tem o programa Cultura Viva não é? Então que
dizer: se buliu muita coisa, muita gente, entendeu? De muita forma,
141
integrou! Tem gente que viajou, se misturou com outras linguagens. [...]
então, eu acho que isso é extremamente proveitoso na construção dessa
rede de cultura popular no Brasil. (FREDE ABREU, Informação verbal)
[...] acho que a principal coisa foi essa de conhecer mais a minha cidade,
a minha origem, [...] então, isso aí acho que foi uma coisa boa em termos
de você conhecer a sua origem. A outra, que ainda hoje se fala nessa
questão do negro; da miscigenação [...] Acho isso uma coisa
interessante. (JUCIMAR SOUZA, Informação verbal, 2012)
[...] a gente nem sabia como ia disponibilizar isso pras pessoas. Então,
nós não prevemos como enviar isso pra todas as escolas. Como as
pessoas teriam acesso? Se elas poderiam vir buscar aqui? Se eu
poderia cobrar? Quanto eu poderia cobrar? Pra onde que ia o lucro
disso? [...] Isso não ficou claro, quando eu estava fazendo o projeto. [...]
a tiragem foi pequena, não ia chegar aos alunos das escolas. (MESTRE
SUÍNO, Informação verbal, 2012)
O ponto negativo – acho que é divulgação. Eu acho que essa coisa tinha
que ser mais publicizada. [...] A própria publicização disso já é um
retorno mais garantido para as implementações que o próprio projeto
está propondo. (BERNARDO CONDE, Informação verbal, 2011)
E acabou que eles deram essa liberdade, essa confiança pra gente
aplicar o recurso, e sugeriam como poderia ser aplicado. E a partir do
momento que eles mandaram a planilha, eles davam orientações por e-
143
[...] Não tinha nada pra capoeira, então a Capoeira Viva [...] mostrou
assim o que eu sempre quis que a capoeira tivesse [...]. Você via tudo;
do karatê [...], de outras artes. Mas da capoeira você não via. O Capoeira
Viva deu sentido à capoeira, [...] Foi conhecida nacionalmente, foi
tombada como patrimônio imaterial, então foi tudo a partir daí, que eu
acredito que veio as coisas, as consequências [...] foi muito positivo esse
prêmio! (MESTRE FUMAÇA, Informação verbal, 2012)
96
Dentre os itens importantes da avaliação devem constar: (1) Facilidade ou dificuldades na
apresentação dos projetos (fase inscrição); (2) Adequação da linguagem utilizada na chamada
pública e na ficha de inscrição; (3) Página do Capoeira Viva na internet (acessibilidade, facilidade
de leitura etc.); (4) Relacionamento com a Coordenação do projeto (troca de informações,
respostas às questões referentes ao projeto, soluções de problemas – via e-mail ou telefone ); (5)
Burocracia (dificuldades no preenchimento de formulários, exigência de documentações, trâmites
para pagamentos dos auxílios, prestação de contas etc.); e (6) Estratégia de acompanhamento
dos projetos: críticas e sugestões.
144
97
Ficaram de fora do primeiro edital, na região nordeste: Sergipe e Ceará; na região Centro-
Oeste: Mato Grosso do Sul e quase fica de fora toda a região do norte do país, destaque para as
ausências de: Pará, Amapá, Roraima, Amazonas e Rondônia.
98
Por ter sido de certa forma uma experiência exitosa, a primeira coordenação do PCV alimentava
esperanças de desenvolver sem problemas, novamente, dando continuidade ao processo, o
segundo edital.
145
99
Letra de Roberto Frejat e Cazuza: Pro dia nascer feliz.
100
O filme apresenta praticantes de capoeira que cedem depoimentos onde registram a
importância dessa prática na integração e socialização das comunidades e a necessidade de
políticas públicas voltadas à capoeira. A obra, apoiada pelo MinC, contém ainda uma homenagem
ao diplomata Sérgio Vieira de Mello, que morreu no atentado terrorista de 2003.
146
101
Estas foram feitas pela internet e complementadas por via postal. Dois endereços foram
disponibilizados para as inscrições on-line. O acesso dava-se pelo próprio site do Projeto:
<http://www.capoeiraviva.org.br/>, ou pelo link da página da FGM:
<www.cultura.salvador.ba.gov.br>. As inscrições foram abertas, em todo o Brasil, no dia 22 de
outubro. A data final da postagem divulgada limitou-se a 17 de dezembro, a ser enviada para a
sede da coordenação da iniciativa, cujo endereço foi amplamente divulgado.
102
Como no primeiro edital, a seleção das propostas foi concretizada por uma comissão de
avaliação, formada por especialistas e estudiosos da capoeira, indicados pela própria gestão da
FGM e os resultados amplamente divulgados no Diário Oficial do Município (DOM) e diversos sites
oficiais e não oficiais.
147
103
O valor total deste projeto ficou em R$ 1.708.532,81 (um milhão setecentos e oito mil
quinhentos e trinta e dois reias e oitenta e dois centavos), sendo que 1.200.000,00 (um milhão e
duzentos mil) seriam destinados somente para o pagamento de projetos.
104
Participaram desse evento, conforme informações oficiais. cerca de 100 pessoas.
148
N REGIÃO CIDADES
105
Dados disponíveis em:
<http://www.jornalcazumba.com.br/index.php?conteudo=noticia&idconteud o=456>.
106
Pesquisa realizada com o propósito de fortalecer o trabalho de criação de um sistema de
informações culturais no Brasil, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em
parceria com o MinC.
149
107
Slides apresentados nas oficinas de formação do segundo edital do PCV.
150
108
Slides apresentados nas oficinas de formação do segundo edital do PCV.
109
São Luís (MA); Teresina (PI);Fortaleza (CE); Natal (RN); João Pessoa (PB); Recife (PE);
Maceió (AL); Aracaju (SE) e Salvador (BA).
151
Distrito Federal foi o território que menos obteve projetos aprovados, ou seja,
apenas 0,54% de ações incentivadas pelo PCV.
No segundo momento, houve uma pequena modificação nas categorias,
assim como na verba distribuída, conforme amplamente divulgado em sites
especializados.110 Uma nova categoria foi lançada: Ações relacionadas à capoeira
por meio de mídias e suportes digitais, eletrônicos e audiovisuais, incluindo filmes,
vídeos, exposições, instalações, sítios, portais e jogos eletrônicos, software livre e
produtos correlatos e iniciativas de produção e difusão.111
Outras novidades foram externadas nessa fase, como a ampliação em
30% no Valor Total de Premiação – de R$ 930.000,00 (novecentos e trinta mil
reais), em 2006, para R$ 1,2 milhão, em 2007, especificamente destinados aos
projetos selecionados. Valor considerável que mostrou, no momento, a disposição
do Governo em atender a demanda da comunidade da capoeira. Além disso,
estratégias de divulgação e estímulo à participação na ação pelos Estados não
contempladas no primeiro edital.
Com os mesmos objetivos das entrevistas realizadas junto aos
contemplados no primeiro edital, fomos à busca dos contemplados, neste
segundo edital, para ouvi-los e tentar compreender como foi, para muitos, essa
primeira experiência e, para outros, poucos, a segunda. Deste segundo edital
foram entrevistados 21 protagonistas, que, ao nosso contato, se disponibilizaram
a relatar suas vivências.
Quanto à divulgação, mantiveram-se as mesmas táticas, contudo, como
essa versão já era uma segunda experiência e aconteceram estratégias de
comunicação e seminários para a qualificação dos participantes, a maioria dos
entrevistados indicou que o processo de divulgação e inscrição foi tranquilo.
110
A Categoria Apoio a Ações Socioeducativas (pessoa física e pessoa jurídica) foi mantida,
agora, com um fomento total de: R$ 561.935,00 (quinhentos e sessenta e um mil e novecentos e
trinta e cinco reais); a Categoria Incentivo à Produção de Pesquisa, Inventários e Documentação
sofreu modificação no nome, passando a se chamar: Incentivo para projetos inéditos de estudos,
pesquisas, inventários e documentação sobre o desenvolvimento da capoeira, sendo destinado a
esta um fomento de R$ 171.000 (cento e setenta e um mil reais), a Categoria Apoio a Acervos
Documentais foi mantida e recebeu R$ 200.000 (duzentos mil reais).
111
O fomento total foi de R$ 270.160 (duzentos e setenta mil e cento e sessenta reais). A
Categoria Socioeducativa/sem fins lucrativos deixou de existir, sendo, assim, extinta em tese, uma
vez que houve continuidade em projetos que privilegiaram ações dessa natureza.
152
Pra mim foi bem tranquilo [...]. No segundo, já fiz com muita
antecedência [...]. Eu era monitora da ACC na época e a gente teve um
movimento muito legal, que a gente colocou uns 12 projetos no Capoeira
Viva, a gente deu essa força de preencher a inscrição pra galera. Foi
massa! (LILU, Informação verbal, 2011)
Outro fator que poderia dificultar ou simplificar as inscrições dos projetos foi
a organização dos beneficiários em duas categorias: 1) pessoas físicas, cujo
procedimento e documentação se constituíam da forma mais simples possível; e
2) associações, fundações e demais instituições sem fins lucrativos, modalidade
que exigia que estas estivessem legalmente constituídas, com o foco votado para
a promoção da capoeira como bem constituinte do patrimônio e da diversidade
cultural brasileira.
Como já vimos acima, esse foi um fator que acabou excluindo alguns
contemplados do acesso à concessão do incentivo. Mas o sucesso desta ação,
reflexo da ausência de uma política voltada para atender a demanda dessa área,
foi tão grande que alguns dos participantes inscreveram mais de dois projetos.
Nosso entrevistado, a seguir, concorreu com três projetos, mas somente um foi
aprovado:
Só aprovaram um. Acho que a maioria das pessoas aprovou um, a não
ser algumas exceções. [...] acho que escolheram não o melhor,
escolheram o que queriam escolher! [...] o melhor era aquele para o
encaminhamento do ensino em aldeias indígenas, que já estava fechado
o acordo com a FUNAI. (LIBERAC, Informação verbal, 2012)
112
Além também do próprio presidente da FGM e um especialista em Políticas Públicas e Gestão
Governamental da Secretaria Nacional de Políticas Culturais do MinC.
113
Luiz Augusto Pinheiro Leal (PA) – Socioeducativos Região Norte/Estudos e Pesquisas;
Raimundo Oswald Cavalcante Barroso (CE) – Socioeducativos Região Nordeste; Pedro Rodolpho
Jungers Abib (BA) – Socioeducativos Bahia/Estudos e Pesquisas; Flávio dos Santos Gomes (RJ)
– Socioeducativos Região Sudeste; Letícia Vidor de Sousa Reis (SP) – Socioeducativos São
Paulo/Acervo; Anselmo da Silva Accurso – Socioeducativos Região Sul; Luiz Renato Vieira (DF) –
Socioeducativos Região Centro-Oeste; Muniz Sodré de Araújo Cabral (RJ/BA) – Acervo; Álvaro
Augusto Malaguti (RJ/DF) – Mídias e Luis Felipe Machado Almeida (PE) – Mídias. Vale ressaltar a
ausência de Muniz Sodré, que não participou da atividade.
155
114
Diana Priscila Sá Alberto e Karla Cristina Damasceno de Oliveira (Região Norte); Simone
Oliveira de Castro e Paulo Sérgio de Brito (Região Nordeste); Gabriela Santos Cavalcante
Santana e Sante Braga Dias Scaldaferri (Bahia); Carlos Eduardo Moreira de Araújo e Juliana
Barreto Farias (Região Sudeste); Carolina Fonseca e Rosa Ribeiro (São Paulo); Mateus Ceni de
Oliveira e João Batista (Região Sul); Igor Marcio Corrêa Fernandes da Cunha e Bruno de Souza
Costa Pedroso (Região Centro-Oeste).
115
1289 é o número oficial divulgado de projetos inscritos nacionalmente.
116
Em alguns sites da internet, como no próprio site do MinC, é possível acessar a informação de
122 projetos aprovados. Contudo, de fato, da lista com o nome dos ganhadores consta o total de
113.
156
[...] resolveu dividir vários projetos [...]. Essa política de dar a todos, ter
que agradar a todos, é uma política errada, porque ela não cria
elementos de qualidade. Vários vídeos que eu vi já prontos, não têm
qualidade. Vários trabalhos não têm qualidade, entendeu? Porque, se
você pega um trabalho com trinta mil, e você vai fazer com onze,
obviamente a qualidade não existe! (LIBERAC, Informação verbal, 2012)
não mandar um vídeo incipiente, meras imagens que não vão servir para
propagar a capoeira, de forma qualitativa. Então, eu acho que esses
foram os problemas da seleção. Nos projetos, foi esse corte de verbas.
[...] de 30 mil, eles mandam 11 [...]. (LIBERAC, Informação verbal, 2012)
Contudo, algo que foi mais enfatizado por nossos entrevistados, como um
fator dificultador, foi o imposto, que deveria ser pago por aqueles que fossem
contemplados no PCV. Uma novidade para os que já haviam participado do
primeiro edital, quando, na oportunidade, ganharam um prêmio livre de impostos,
recebendo assim o valor exato do indicado na lista de contemplados, e uma
surpresa para aqueles que pela primeira vez estavam sendo agraciados no edital.
Então, talvez os principais problemas que eu tive com esse projeto foi a
redução do recurso, e, ainda desse recurso, nós tivemos que pagar
imposto de renda [...]. Sempre foi falado nas reuniões que Capoeira Viva,
era um prêmio [...]. Como é que se ganha um prêmio, e você ainda tem
que pagar imposto desse prêmio? [...] pelo que eu conversei com tantas
outras pessoas, todos eles se ressentiram de receber pela metade os
recursos financeiros, e que acabou não viabilizando o seu trabalho no
seu conjunto total! (HÉLIO CAMPOS, Informação verbal, 2012)
117
Grifos nossos.
160
Pessoa Jurídica:
Nos projetos cujos proponentes sejam instituições não há retenção de
impostos na fonte. Assim, devem ser incluídos, na planilha a ser
apresentada, apenas impostos referentes a outros objetos, como por
exemplo, os impostos sobre pagamento de pessoal (ISS/INSS
institucional), e outros.
Pessoa Física:
Em relação aos projetos cujos proponentes sejam pessoas físicas há
cobrança de imposto de renda, a ser retido na fonte. Isso significa que no
valor a ser recebido na conta bancária, já constará o
respectivo desconto. [...] esse imposto é cobrado conforme a tabela
118
Para pessoa física: a) Certidão de quitação de tributos federais e Dívida ativa da União; b) RG
e CPF do proponente; c) PIS/Pasep ou NIT; d) Comprovante de endereço do proponente; e) Cópia
de documento bancário do proponente, contendo nome do banco, conta-corrente e agência (não
pode ser conta poupança).
119
Para pessoa Jurídica: a) Certidão de quitação de tributos municipais; b) Certidão de quitação
de tributos estaduais; c) Certidão de quitação de tributos federais e Dívida ativa da União; d)
Certidão negativa de débitos com o INSS; e) Certidão negativa de débito FGTS; f) Estatuto; g) Ata
de posse da Diretoria atual; h) Cartão de CNPJ da entidade; i) Comprovante de Endereço da
Entidade; e j) Cópia de documento bancário da entidade, contendo nome do banco, conta-corrente
e agência (não pode ser conta poupança).
161
[...] a partir daí eu precisei pegar algumas pessoas pra me ajudar, porque
o negócio tinha que ser mais profissional do que só uma pessoa fazer.
Peguei, pensei no trabalhão que eu ia ter que desenvolver pelo projeto.
Era assim: tinha uma quantia “x” que você poderia gastar, então eu
pensei no projeto, distribuí naquele “x”, para aquilo que eu propunha. A
ideia principal do projeto era a gente tá divulgando a capoeira, em
escolas, lugares carentes, pontos culturais voltados pra criança e, como
a animação é mais esse caminho, tinha que ser mais por essa coisa.
(IONÁ, Informação verbal, 2012)
3.5 Capoeira Viva: “se arrastando que nem cobra pelo chão”
120
Nos referimos aqui ao fechamento de todas as pendências que se encontram em aberto.
121
Letra de Raul Seixas: carimbador maluco. A música é uma crítica à burocracia estatal.
122
Juca Ferreira.
164
[...] então, vocês têm que prestar conta [...], o dinheiro é do Estado. E
quem rompia com esse conceito eram eles, porque eles não repassavam
o dinheiro pra gente, no prazo determinado. [...] no meu caso, por
exemplo, eu tive que fazer dois empréstimos pessoais a bancos, que eu
pago até hoje. Eu tinha uma equipe fixa [...], eu não ia chegar pra uma
equipe no fim do mês e dizer: – Eu não tenho dinheiro pra pagar vocês.
E você tinha o trabalho diário dessas pessoas. Então, tive que fazer dois
empréstimos bancários [...]. (FREDE ABREU, Informação verbal, 2012)
123
A primeira experiência do PCV, executada pela Biblioteca Nacional não impôs tal situação aos
capoeiras e comunidade, tendo em vista que os proponentes deste primeiro edital foram
contemplados em forma de prêmio, modalidade menos burocrática, como vimos.
165
Além disso, a própria FGM possui seus trâmites legais e, para a efetivação
do pagamento, os processos tinham que percorrer as mesmas instâncias dos
outros procedimentos de pagamento da instituição. Sendo assim, a equipe do
PCV, que era contratada para prestar esse serviço em específico, também ficou
submetida a essa condição.
124
Fonte: Relatório de Atividade do Projeto Capoeira Viva 2007.
166
Caro Ministro,
Até o momento, nós os coordenadores dos projetos premiados na 2ª
edição do Programa Capoeira Viva, não entendemos o porquê da
retirada do Programa do Museu da República, que através de um
excelente coordenador e organizador da 1º edição do Programa
Capoeira Viva, Sr. Rui Pereira, estruturou o primeiro programa que
funcionou maravilhosamente, do começo ao fim. E, inexplicavelmente a
segunda edição foi colocada na mão da Fundação Gregório de Matos,
que já tinha dado provas de incompetência, quando em 2005 o
Programa Capoeira Viva, tinha sido lhe entregue para que o
desenvolvesse, coisa que a mesma não conseguiu e então foi entregue,
em 2006, para que o Museu da República o fizesse [...]. (MESTRE GIL
VELHO, Comunicação via e-mail, 2012)
O fato relatado foi logo esclarecido pelo MinC, que rebateu as acusações
da instituição soteropolitana:
Algo que emperra qualquer ação no setor público são as constantes trocas
de gestores. Quando o PCV ficou sob a responsabilidade da FGM, o gestor à
frente dessa instituição era o compositor e professor Paulo Costa Lima. Este, no
final de 2008, por questões políticas – troca de partido, e com a eleição municipal
e as mudanças na base de aliados, acabou sendo substituído pelo poeta,
dramaturgo e jornalista Antônio Lins.
A gestão de Lins foi conturbada, com uma série de denúncias, por parte de
funcionários da FMG, por parte da comunidade cultural do município e por
desentendimentos políticos entre os aliados. Em notícia divulgada no site de
Samuel Celestino, acessamos o desabafo de Lins:
O prefeito não dá bola para a cultura nem para a cidade. Sua assessora
cometeu uma série de desmandos, pedi inclusive auditoria na Secretaria
da Fazenda, mas chega a um ponto que a gente cansa. É um governo
fraco. Todo dia nos jornais tem denúncia de corrupção. Estou na
Fundação Gregório de Mattos há um ano e não deram bola. A cidade
não merece esse tipo de gente. Estou caindo fora para não me
contaminar [...]. (BAHIA NOTÍCIAS, 2010)
125
Eleito, em seu primeiro mandato, pelo Partido Democrático dos Trabalhadores (PDT), depois,
em 2007, filiou-se ao PMDB. Em seguida, no início de 2011, ingressou no Partido Progressista
(PP).
170
126
Apesar da FGM ser uma autarquia da Secult, esse acúmulo de cargos por Carlos Soares,
mesmo que temporário, graças à ideia do prefeito João Henrique de extinguir a Secretaria de
Esporte e Lazer do município, foi muito prejudicial à cultura, assim como a todas as ações que a
FMG vinha desenvolvendo, pois esse gestor já não vinha conseguindo atender as demandas de
todas as áreas – educação, cultura, esporte e lazer – que a gestão da Secult requeria, e, o caos
completo se instalou na cidade.
127
Nome do livro de Ziraldo, editado em língua espanhola: “Menino maluquinho” foi o apelido de
João Henrique, cunhado por seu ex-aliado, agora desafeto, Geddel Vieira Lima.
171
128
O segundo edital do PVC não foi concluído oficialmente, mas novamente houve mudanças na
gestão da prefeitura da cidade, com as últimas eleições. Atualmente, o gestor da FGM é o diretor
teatral Fernando Guerreiro.
172
129
Alguns dos autores já publicaram seus artigos em outros locais, pois compreenderam que,
devido ao rumo que as coisas estavam tomando, a ação em questão dificilmente seria executada,
mesmo com algumas poucas esperanças que, na época, ainda pairavam no ar.
130
Muitos dos nossos entrevistados afirmaram que receberam essa coleção da FGM, enviada por
correio, fato que não aconteceu com os outros produtos, frutos dos editais do PCV.
174
Não! No número um, não teve desconto, isso também foi [...] outra falha!
No número um eles fizeram certo, que era bolsa! No segundo, fizeram.
Inclusive eu participei com mestre Camisa, no segundo e eu consegui
que a instituição dele que era sem fins lucrativos, substituísse ele, pra
que não houvesse o desconto [...]! No primeiro, pessoa física não teve
desconto não! (RAQUEL, Informação verbal, 2012)
131
A ex-gestora, inclusive, já havia falecido, vitimada pelo agravamento de uma leucemia, em
2009.
175
Não tem continuidade. O último era para acontecer aqui, como não teve
já recolheram essa verba que iriam fazer aqui. Tem muita dessa no
Brasil que começa, mas não termina!! [...] começa e tem que ter porrada
pra terminar e dizer qual foi o resultado final. [...] É sempre assim todos
esses programas de capoeira que já teve até hoje [...]. (MESTRE
ITAPOAN, Informação verbal, 2012)
Isso tá mudando! Agora, pra mudar, tem que continuar. Houve esse
problema [...]. Se tivéssemos no quarto edital, já não teria essas
desculpas, mas, no primeiro, no segundo, naturalmente isso ia acontecer
[...] Mas não deram nenhum apoio. No meu caso, eu já estava
acostumada a fazer isso, mas, no caso de um cara, que tá acostumado a
da aula na rua, e na escola, a pegar o berimbau e é ocupado e tem um
monte de filho, e tem aluno, e tem não sei o que lá [...] tá mais
prejudicado. Não é ignorância, não! É que não tá acostumado. Não é
má fé, não é? É uma questão mesmo de lidar com a coisa toda [...].
(RAQUEL SILVA, Informação verbal, 2012)
132
Disponível em: <documentoscapoeira@gmail.com>.
179
133
Somente na categoria Projetos inéditos de estudos, pesquisas, inventários e documentação.
180
134
Este estudioso estabeleceu um recorte em torno da capoeira, assim como estamos fazendo.
Nosso envolvimento visceral com a capoeira aumenta em certa medida, mais ainda, o perigo de
exposição de uma análise equivocada da realidade concreta, pois, além de corrermos o risco de
um envolvimento pela aparência, o processo ainda está em construção, neste momento,
impossibilitando ponderar sobre as suas possíveis reverberações. Contudo, não nos furtaremos ao
desafio de contribuir, mesmo tendo consciência desses riscos.
135
Foram visitados: um projeto em Brasília; quatro projetos em Goiás; um no Espírito Santo; dois
em Minas Gerais; três no Maranhão; três no Pará; três no Rio de Janeiro; três em São Paulo; três
em Maceió; três em Pernambuco; um em Maceió; dois em Santa Catarina. Apesar da citação
acima, encontrada no relatório, não destacar dois projetos da Bahia, realizados na cidade de Feira
de Santana, estes também foram visitados.
181
Em nossa avaliação, esse foi outro ponto que ficou a desejar nas ações do
PCV – a divulgação das produções e sua distribuição/democratização. Tanto na
primeira como na segunda experiência. Não que fosse uma ação que estivesse
planejada e não tenha sido executada, não se tratava disso. Mas, com tantas
136
Referência às técnicas da FGM, que realizaram o acompanhamento de alguns projetos.
182
produções interessantes e inéditas, algo deveria ter sido feito para que isso
chegasse, por exemplo, às escolas públicas.
Este é o ponto crucial, que daria acessibilidade, perpetuando e
democratizando as produções de dezenas de contemplados ligados a essa
cultura, que produziram diversos materiais, com inúmeras temáticas relacionadas
à capoeira. Essa é uma lacuna que nem a primeira e muito menos a segunda
experiência do PCV conseguiu minimizar.
Seria nesta fase que o MinC, junto ao MEC e possíveis outros parceiros
poderiam potencializar as produções e distribuí-las, como kits, para as bibliotecas,
centros culturais, creches e escolas públicas, incentivando a discussão sobre a
capoeira, cultura, política, memória e patrimônio, nessas unidades, bem como
sobre as temáticas específicas de cada material produzido na iniciativa.
As divulgações e mobilizações que aconteceram, a partir do que se
produziu no PCV, emergiram de iniciativas dos próprios autores dos materiais e
se consolidaram em ações tímidas, localizadas, que não obtiveram grande
visibilidade nem maior impacto. Eles próprios não conseguiram se beneficiar
ainda deste material. O que dizer então da sociedade em geral? Capoeiras e não
capoeiras, jovens, adultos e crianças, completamente alheios ao que foi feito em
uma das maiores ações das políticas culturais voltadas para a capoeira.
É inevitável não estabelecer comparações entre o primeiro edital e o
segundo, principalmente para aqueles que participaram de ambas a edições.
Contudo, entendemos que estes momentos devem extrapolar a simples
constatação. Os depoimentos recolhidos formulam-se a partir de várias
indignações, reprovações, concomitantes a apontamentos para a superação das
dificuldades e a busca de melhorias.
[...] então, atualmente, eu acho que esse programa é válido, acho que
ajudou muito a capoeira, deu evidência à capoeira. Eu, particularmente,
não mandaria mais. Mas eu acho que outras pessoas devem mandar. Eu
acho que é cabível que tenha. Eu acho que ajudou muito aí,
principalmente os praticantes da capoeira. Ajudou, pelos trabalhos
comunitários da capoeira, eu acho que o principal disso tudo são os
trabalhos comunitários. (LIBERAC, Informação verbal, 2012)
Eu penso também que a Fundação deve ter feito uma avaliação das
mancadas que deram [...]. Ninguém tá aqui pra crucificar ninguém
também. Né, meu? [...]. Vamo acertar! Então, se tiver um próximo edital
eu vou concorrer. [...] Então, se tiver um outro edital, com certeza, eu
quero participar. Agora, eu gostaria que tivesse mais presença [...] Que
eles cumprissem o que eles nos cobram, entendeu? [...]. (MESTRE
PINÓQUIO, Informação verbal, 2012)
1
Capoeira Olêlê. Música de Capoeira D.P.
2
Como vimos, o período dos anos de 1930 demarcou efetivamente a primeira fase da política cultural
em nosso país, estando relacionado à preservação do patrimônio cultural, na lógica intervencionista
do Estado e na perspectiva de sua institucionalização. Quando nos debruçamos para estudar e
analisar essa fase, fica nítida a opção preservacionista, que alicerçou a noção de preservação do
patrimônio em nosso território. Já nos anos de 1970, constatamos paradoxalmente um Estado
repressivo, censurador, que tenta hegemonizar a cultura. Estratégias de restauração, mapeamento e
documentação, seguidas por linhas de ação de tombamento e preservação, atreladas ao que se
denominou de turismo cultural. Após essas fases iniciais, com o final da ditadura, o advento da Nova
República e a esperança de uma nova constituição política, econômica e social, surge também a
probabilidade de um novo trato da cultura.
3
Provavelmente, as ideias de Mário de Andrade e os esforços dos modernistas tenham ecoado mais
eficazmente nesse momento histórico.
185
O texto ainda destaca a inclusão das formas de expressão e dos modos de criar,
fazer e viver, entendidas aqui como imaterialidade.
Em 1982, é realizado na cidade do México a Conferência Mundial sobre
Políticas Culturais – MONDIACULT, cujo foco de discussão foi a relação entre
cultura e desenvolvimento. Tem-se, pela primeira vez, o princípio de uma política
cultural fundamentada no respeito à diversidade cultural.4
Outros objetivos do MONDIACULT buscavam “[...] estabelecer uma
conceituação antropológica de cultura, mas também o de conceituar política cultural
[...]” (JÚNIOR; VOLPINI, 2007, p. 6605). Em meados da década de 1980, a
Conferência Mundial sobre as Políticas Culturais confirmou mudanças no
entendimento de patrimônio cultural.
No texto do evento, há uma reflexão com a qual concordamos: “A educação é
o meio por excelência para transmitir os valores culturais nacionais e universais, e
deve procurar a assimilação dos conhecimentos científicos e técnicos sem
detrimento das capacidades e valores dos povos”. (DECLARAÇÃO DO MÉXICO,
1985, p. 5).
É impossível pensar uma iniciativa relacionada à área cultural, na forma de
uma política séria e compromissada, sem repensar a base para isso. Para nós,
somente a educação, com estruturas que se democratizam, pode inserir e consolidar
qualquer política cultural, em primeira e última instância. Qualquer ministro que
assuma o MinC, sem dialogar e compartilhar suas demandas com o MEC, com
vistas a impactar socialmente suas ações, está fadado ao insucesso.
Para as instituições da área educacional, esse desafio é menos difícil. As
iniciativas do MEC, por exemplo, conseguem estabelecer algumas mudanças na
vida cultural da sociedade, sem necessariamente contar com o apoio do MinC. Isso
se dá porque a educação precede a cultura, neste sentido, ou somente neste
sentido. Ou melhor, somente uma educação institucionalizada será responsável por
disseminar a cultura que deverá ser cultuada.5
A educação acontece fora e dentro das instituições. Esta, que podemos aqui
chamar de formal (aceita socialmente), ocorre no âmbito escolar. Diferente da
4
O entendimento de patrimônio que pairava no imaginário social da população era um reflexo das
políticas públicas desenvolvidas até aquele momento, e que acabavam por reproduzir ações em torno
da uma noção tradicional de patrimônio.
5
Em sociedades regidas pelo modo de produção capitalista, é a cultura do dominador que será
hegemônica, sendo ensinada e reproduzida socialmente, orquestrada pela escola.
186
6
São três recomendações. Solicita-se aos Estados-membros que apliquem as disposições
pertinentes à salvaguarda da cultura tradicional e popular, tomando medidas legislativas imperativas,
de acordo com suas práticas constitucionais, e que sejam adotados os princípios e medidas
abalizadas nessas recomendações; solicita-se, ainda, que tais recomendações sejam comunicadas
às autoridades, serviços, órgãos, enfim, que sejam democratizadas, para que as instituições, uma vez
a par de seu conteúdo, tomem as medidas cabíveis para salvaguardar a cultura tradicional e popular
e, além disso, solicita-se, enfim, fomentar o contato com organizações internacionais que possuam a
mesma responsabilidade.
187
7
A preservação de um bem está relacionada ao cuidado de sua biodiversidade, dessa forma, esta
deve-se preocupar com o meio ambiente e as comunidades. As condições de sobrevivência de um
determinado grupo estão diretamente ligadas à manutenção da sua cultura. Preservar também é
resguardar a vida humana, sua subjetividade e os fatores que fazem uma comunidade ser como ela
é. Apesar de termos registros históricos que datam de meados do século XVII, no que diz respeito à
preservação, o ato de se preocupar em conservar as coisas somente será legalizado em nosso país,
em 1923, através de um projeto de lei do deputado Luiz Cedro, e, posteriormente, do parlamentar
baiano Wanderley Pinho.
8
Texto proposto por cinco considerações, doze proposições e recomendações e seis moções, sendo
duas de defesa, três de apoio e uma de congratulações.
188
É lugar comum a afirmação de que o homem não pode ser concebido senão
como vivendo em sociedade, todavia não se extraem de tal afirmação todas
as consequências necessárias, inclusive individuais: a saber, que em
determinada sociedade humana pressupões uma determinada sociedade
das coisas. (GRAMSCI, 1966, p. 41)
9
Desporto é um termo português para designar o que na nossa língua chamamos de esporte.
10
Todavia, a capoeira não foi criada por brasileiros. A maioria dos pesquisadores aponta para uma
criação de evidência afro-brasileira, e não somente brasileira. Até porque a essência, ou melhor,
como diz Sodré (apud NETO, 2001, p. 20), o princípio, tanto o fundamento quanto o mito é africano.
11
Enfim, nessa lógica, acaba sendo e se constituindo conforme o contexto. A capoeira é e não é, ao
mesmo tempo, ao passo que continua sendo.
12
Porém, não devemos compreendê-lo sob a ótica de algo anacrônico, imutável e/ou acabado.
13
Como legitimador, o patrimônio se vale da memória para constantemente organizar e reorganizar o
passado. Para se constituir com sentido e significado, a memória traduz-se no mecanismo que
ajustará o material, formando-se através da natureza imaterial e construindo, pela educação, uma
identidade coletiva. Enfim, o patrimônio constitui-se como tal, através da sua dimensão imaterial.
190
de nossa cultura, a partir de várias propostas (como ginástica, como luta e como
esporte).14
Com as demonstrações públicas, as apresentações folclóricas e as lutas (que
Mestre Bimba e seus alunos realizaram); assim também com a nova formatação
dada por Mestre Pastinha e seus contemporâneos (antiga capoeira Tradicional
posteriormente denominada de Capoeira Angola), a capoeira vai ganhando espaços
institucionais, desenvolvendo-se e inserindo-se primeiro em academias15 e depois
em escolas. Vai, assim, estabelecendo-se a partir de várias lógicas (culturais,
folclóricas, artísticas), mas principalmente pela via esportiva.16
Como política de formação humana, pautada na complementação de um
ensino formal, a capoeira provavelmente inicia sua inserção na escola em 1959.17
Neste local é a disciplina Educação Física que mais se aproximará dessa
manifestação. Como vimos, essa área já se aproximava há tempos dessa cultura.
A forma como a sociedade moderna encontrou, para assegurar sua história,
intrinsecamente locada nos seus patrimônios, foi a preservação. Preservar é o ato
de cuidar do patrimônio. Mais uma vez, se consultarmos diversos dicionários,
encontraremos palavras semelhantes que dizem respeito ao ato de preservar:
conservar, defender e resguardar. Essas palavras remetem à seguinte reflexão:
quem conserva, defende e resguarda, o faz de alguém ou algo.18
No Decreto-lei 25/37, encontramos a forma escolhida naquele momento: o
tombamento. Sua inscrição deveria ser feita, em um livro, que se organizava a partir
de quatro possibilidades, denominado Livro do Tombo, assim organizado, no artigo
quarto:
14
Podemos citar, dentre eles: Coelho Neto, Gomes Carmo, Mario Aleixo, Garcez Palha, Annibal
Burlamaqui, dentre outros. Fonte: Moura, Jair. A capoeiragem no Rio de Janeiro através dos séculos.
2. ed.. Salvador: JM Gráfica e Editora Ltda., 2009.
15
Aqui, o uso do termo academia não está vinculado ao que representa seu uso na atualidade. Os
espaços onde se praticava capoeira, denominados de academias ou escolas de capoeira, se
diferenciavam, em muito, do modelo de academia de ginástica.
16
Apesar de seu forte apelo esportivo/ginástico, os praticantes de capoeira não abandonaram por
completo seu principal viés: o cultural. Seus fundamentos sempre tiveram alicerce na tradição, na
história, nas raízes e no fundamento cultural afro-brasileiro. Empiricamente falando, sua inserção nas
escolas e nos estudos da área pedagógica, de uma forma ou de outra, privilegiam esse aspecto, fato
que fortalece, mais ainda, sua prática como riqueza cultural do povo brasileiro.
17
De acordo com o Mestre Senna, citado em CAMPOS, Hélio Carneiro Ribeiro. Capoeira na
Universidade: uma trajetória de resistência. EDUFBA: Salvador. 2004.
18
Suscitam, assim, a ideia de que a preservação se faz necessária contra perigos ou danos que, de
alguma forma, a humanidade ou as forças da natureza podem imputar a algo.
191
outro. Essa talvez seja a ação mais importante da capoeira. Os capoeiras, há anos,
vêm, através do ensino dos golpes, toques e músicas de capoeira, educando a
sociedade brasileira, em especial as classes trabalhadoras menos abastadas.
Oralidade, circularidade, tradição, memória, ritualidade, historicidade,
corporeidade, identidade e singularidade são aspectos que se traduzem como
essenciais e pertencentes historicamente ao universo de ensino-aprendizagem
dessa manifestação cultural.
Estes aspectos já eram apontados, por Abib (2000; 2004) e Castro Júnior
(2000; 2002) e Sobrinho (2000; 2002), como fundamentais à manutenção dos
princípios pedagógicos da capoeira, pois não são acessados nos bancos
universitários, muito menos em estratégias metodológicas educacionais formais,
desenvolvidas nas escolas formais.
Conrado (2006) também já destacava, em sua tese Capoeira Angola e Dança
Afro: contribuições para uma política de educação multicultural na Bahia, as ações
pedagógicas dessa manifestação como um meio de educação e formação. A
pesquisadora aponta as tradições que acompanharam o desenvolvimento da nossa
educação, segundo um paradigma eurocêntrico e monocultural, e aponta a capoeira
como possibilidade de resistência e de construção de outra lógica.
Seu ensino acontece na rua, nos centros sociais, nas sedes comunitárias,
todo dia, dentre outros espaços, e muitas vezes percebemos ali um trabalho social,
evidenciando pouco ou quase nenhuma relação com o modo de trabalho capitalista.
Enfim, com a nossa experiência, percebemos que não se aprende capoeira, se vive
capoeira. Nesse caso, os objetivos são outros. As palavras de ordem são educação,
formação e cidadania. A cultura, nestes casos, é utilizada como meio de formação.
Igreja do Bonfim
E Mercado Modelo
Ladeira do Pelourinho
A baixa do Sapateiros
Por falar em Rio Vermelho
Eu me lembrei do Terreiro
Igreja do São Francisco
E a Praça da Sé
193
23
Música de Mestre Suassuna e Dirceu – Igreja do Bonfim.
194
24
Mestre Suassuna faz parte da nossa identidade enquanto capoeira, pois é nosso tataravô.
25
Conjuntos arquitetônicos, paisagens naturais e prédios, por muitos anos, constituíram-se, no Brasil,
a forma de entender o que seria patrimônio para o Estado. Qualquer outro bem que não comungasse
dessas características, burocraticamente falando, era desconsiderado, mesmo sendo considerado,
por determinada classe, também como patrimônio que deveria ser resguardado. Isso irá mudar com a
ascensão de um operário no poder e de seu “time”.
195
26
Em 1998, surge o Conselho Federal de Educação Física (CONFEF) e consequentemente seus
Conselhos Regionais de Educação Física (CREF). Nesse processo, o sistema CONFEF/CREF
estreia uma perseguição aos docentes de capoeira, na tentativa de fazer com que estes se
enquadrassem em uma nova lógica, orquestrada e alicerçada por uma nova constituição do mundo
do trabalho. Esse órgão quer regulamentar também a atividade de capoeira, o que gerou
descontentamentos na comunidade, desencadeando, assim, uma série de debates, mobilizações etc.
Para saber mais, consultar COSTA, Neuber Leite. Capoeira, Trabalho e Educação. 2007. 227 f.
Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia,
Salvador, BA, 2007.
196
27
Grifos nossos.
28
Ao final deste subcapítulo, discutiremos todas as recomendações do documento. Somente
registramos, nesse momento, a primeira recomendação, para ratificar a importância da discussão e
de nossa linha de pensamento.
29
Já apontamos isso em nossa dissertação, defendida em 2007. É importante explicar que nossas
discussões já vinham acontecendo no início de 2003, quando os problemas entre a capoeira e o
sistema CONFEF/CREF começam a se ampliar e também se iniciou a mobilização da comunidade da
capoeira da Bahia, para a Conferência Nacional de Capoeira (CNC).
197
30
Grifos nossos.
31
A Conferência Estadual de Capoeira ensejou uma grande mobilização na Bahia, com diversas
reuniões envolvendo diversos grupos e mestres de capoeira, para discutir as temáticas em voga e a
posição da Bahia, referente ao contexto sociopolítico posto naquele momento. Esta foi orquestrada
por várias lideranças, com destaque para um dos herdeiros da Capoeira Regional, Demerval Lopes
Machado, o Mestre Formiga, que faleceu ao retornar da Conferência Nacional. Nessas reuniões havia
uma preocupação em garantir todas as falas, discutindo ponto por ponto, sempre com o cuidado de
esclarecer a comunidade sobre o contexto e as consequências dos mesmos. Existiam, ali, vários
grupos políticos que estavam presentes para defender e garantir suas ideias, com perspectivas de
que a delegação da Bahia defendesse de forma representativa seus anseios.De fato, foi um momento
muito rico, produtivo e que aglutinou diversos representantes da capoeira a fim de discutir questões
esportivas, culturais e educacionais. Todavia, o que estava alicerçando e norteando as discussões
era a profissionalização da capoeira. Lendo os documentos norteadores do evento, tanto o estadual
quanto o nacional, isso fica bastante claro, não somente pela temática recorrente nas mesas e grupos
de trabalho, mas também pela participação ativa do assunto na programação oficial, assim como a
participação de parlamentares que estavam envolvidos com Projetos de Lei (PL) que tratavam desse
o assunto.
32
O primeiro bem a ser registrado e reconhecido oficialmente pelo país foi a Arte Kusiwa – pintura
corporal e arte gráfica Wajãpi, registrada no livro de formas de expressão, seguida pelo Ofício das
Paneleiras de Goiabeiras, no livro dos saberes. Ambos receberam reconhecimento em 2002.
198
Essa solicitação foi um pedido, a partir das demandas oriundas dos debates
com as comunidades da capoeira, da Liga Baiana de Capoeira (LIBAC) e,
posteriormente, da Frente Liberdade para a Cultura. Esta última surge das
discussões em defesa da capoeira contra o sistema CONFEF/CREF, como uma
possibilidade de emancipação desse coletivo, desvinculando de uma vez por todas a
capoeira de submissão à regulamentação desse conselho profissional.
Em 27 de agosto de 2004, Júlio Braga, atendendo ao pedido da Secretária da
Reparação, encaminhou o pleito36 e deu sequência ao trabalho, através da
divulgação de notificação pública, expedida no dia 22 de dezembro de 2004, em
evento público – Roda dos Mestres. Assim tem início, oficialmente, o processo de
reconhecimento da capoeira como patrimônio estadual da Bahia.
33
Através da lei 8.895/2003, promulgada em 16 de dezembro de 2003, pelo governador Paulo Souto.
34
Vale registrar, aqui, que o IPHAN, até a abertura do processo de registro regional da capoeira,
somente tinha reconhecido quatro bens como patrimônio imaterial.
35
Ela foi a primeira gestora da Secretaria Municipal da Reparação (SEMUR).
36
Seguindo a orientação do ofício nº 192, a técnica Milena Tavares encaminhou o pedido.
199
37
O documento é datado de 12 de julho de 2006, sendo assinado por Milena Luisa da Silva Tavares,
que desenvolvia a função de Subgerente de Pesquisa e Legislação Patrimonial, Maria da Conceição
Barbosa Costa e Silva, que tinha o cargo de Gerente de Pesquisa Legislação Patrimonial e
Patrimônio Intangível e Jorge Augusto Halla Guimarães, representando a Diretoria de Preservação do
Patrimônio Artístico e Cultural.
38
Em nossa dissertação, já tínhamos apontado esse percurso. As discussões sobre o registro da
capoeira como patrimônio imaterial surgem no bojo das discussões contra o sistema CONFEF/CREF.
Nossa participação nessa empreitada foi tão visceral que culminou na defesa da dissertação
Capoeira, trabalho e educação, em 2007, onde apontamos todo o processo, que foi amplamente
divulgado nos jornais da capital, conseguindo comprovar nossa tese. Na ocasião, presenciamos a
reunião solicitada pela Liga Baiana de Capoeira (LIBAC), com Arany Santana, na época Secretária
Municipal da Reparação, para tratar de tal empreitada. Apontamos, também, a necessidade do
reconhecimento da capoeira enquanto expressão cultural e a obrigação do Estado de cuidar dela. A
nossa única preocupação, sempre evidenciada nos diversos encontros, palestras, reuniões e fóruns,
era como esse reconhecimento se daria, quem o faria, que modelo seguiria e como de fato isso se
consubstanciaria na vida da sua comunidade.
39
Mais informações consultar a dissertação: Capoeira, trabalho e educação.
200
[...] apresentei à Câmara dos Deputados Indicação [...] na qual peço que o
Ministério da Cultura, através do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (IPHAN), proceda a inscrição da Capoeira no „Livro de Registro‟,
declarando esta manifestação cultural afro-brasileira „Patrimônio Cultural do
Brasil‟. (CARTA DE ALICE PORTUGAL, 2006).
40
Bens de natureza imaterial são registrados e salvaguardados e não tombados.
41
Mesmo que parte do grupo estivesse preocupada com a forma dessa ação e ansiasse por uma
maior amplitude e esclarecimento da discussão.
201
42
Entrega das Medalhas do Mérito Cultural.
43
Enumera, ainda, na correspondência, os pontos da legislação que abordam a temática e, por fim,
destaca que existem, de fato, todas as condições favoráveis ao atendimento de seu pleito. Alice
Portugal ainda faz um apelo para que a autoria do pedido de inclusão da capoeira no rol das
manifestações culturais reconhecidas como patrimônio seja dirigido a ela, o que não aconteceu!
44
Em primeira instância, de fato, as notícias oficiais não fazem menção a esse episódio, assim como
não o fazem, também, a respeito de toda a movimentação oriunda da Bahia, que culminou com o seu
reconhecimento no próprio Estado. Mas os documentos apontam e registram, indubitavelmente, que
Alice Portugal se movimentou quanto a isso, de forma pioneira, enquanto parlamentar.
45
A deputada federal não se preocupa em apontar onde a capoeira deveria ser inscrita, talvez
deixando essa questão para os técnicos do IPHAN, especializados em questões dessa natureza,
para ser discutida entre os mesmos, mais adiante.
46
Sendo assim, a necessidade de acesso a informações e a democratização destas discussões
seriam uma premissa de fundamental importância para a comunidade da capoeira amadurecer a
necessidade real e concreta do reconhecimento.
202
Essa questão fica clara em uma das passagens de um texto divulgado no site
Vermelho,48 quando destaca o assunto do reconhecimento da capoeira, sugerindo
que, a partir do seu reconhecimento como patrimônio imaterial do Brasil, estariam os
mestres com seus direitos docentes assegurados.
47
Grifos nossos.
48
Página da internet, mantida e gerenciada pela Associação Vermelho, em convênio com o PCdoB.
49
Grifos nossos.
50
Questões pairavam durante os momentos que precederam o ato final da iniciativa. Como seria feito
o reconhecimento? Quem seriam as pessoas responsáveis pelo trabalho? Qual a visão de capoeira
que estaria expressa no documento? O mesmo abrangeria a diversidade da manifestação, com seus
estilos, organizações e formas? Preocupações para não prejudicar a capoeira e seus praticantes.
203
Emblemático com relação a isso foi um dia, logo nas primeiras vezes que eu
fui me apresentar ao Mestre Curió, e dizia pra ele, [...]: Nós estamos aqui
pra coordenar o inventário da capoeira. Aí que ele, no primeiro contato,
logo, falou: – Inventário, meu filho? Então, quer dizer que a capoeira
morreu? Eu falei: – Não mestre, a capoeira continua muito viva! – Mas já tão
querendo fazer o inventário? Inventário que a gente faz é de morto. Então,
são esses termos que acabam provocando um ruído da comunicação. [...].
(WALLACE DE DEUS, Informação verbal, 2012)
Por outro lado, também entendemos que as políticas, quando não se efetivam
como políticas de Estado, ocorrem pontualmente nas gestões e, com isso, há certa
necessidade de encaminhar, de forma mais aligeirada, algumas demandas, pois,
caso o contrário, estas demandas correm o risco de não se materializar com a
continuidade da gestão, quiçá com a mudança destas.51
Em uma das solicitações da parlamentar Alice Portugal, em 31 de maio de
2004, podemos verificar o nome do primeiro gestor do IPHAN, no governo Lula e na
gestão de Gilberto Gil, Antônio Augusto Arantes Neto.52
Já destacamos que a ação pública que inicia oficialmente este processo partiu
do então Ministro Gilberto Gil, em 2004, no continente Europeu, na sede das Nações
Unidas, em Genebra.
51
Em nosso país, a história das políticas culturais está recheada de exemplos de descontinuidade.
52
Este antropólogo – autor do livro O que é cultura popular? – foi gestor da instituição por dois anos e
o primeiro, à frente do IPHAN, a registrar bens de cultura imaterial (arte kusiwa, ofício das paneleiras
e o acarajé). Foi também, na sua gestão, antes da entrada de Luiz Almeida, que se iniciaram os
estudos para o reconhecimento do samba e do frevo.
53
Grifo nosso.
204
54
Há um erro de digitação aqui. O termo correto é Iúna.
55
Desconhecemos esse movimento.
56
Logo em seguida à solicitação, está anexado um abaixo-assinado para o Inventário e o Registro
para Salvaguarda da Capoeira como Patrimônio Imaterial do Brasil. O recolhimento das assinaturas
aconteceu no I Seminário para o Reconhecimento da Capoeira como Patrimônio Imaterial, que
aconteceu no Rio de Janeiro.
57
Ana Claudia Lima e Alves; Ana Lúcia Ferreira de Castro; Carlos Eugênio Líbano Soares; Claudia
Márcia Ferreira; Franco César Bernardes; Juca Ferreira; Júlio César Tavares; Luiz Renato Vieira;
Márcia Sant´Anna; Marcus Vinícius Carvalho Garcia; Muniz Sodré; Tereza Cotrim de Paiva Chaves e
Marina Caldas Verne.
58
Nenhum dos participantes da primeira reunião oficial para o Reconhecimento da Capoeira como
Patrimônio Imaterial assumiu o trabalho de produzir um dossiê para o inventário da capoeira.
205
59
De acordo com ele, outros dois membros da comunidade da capoeira já tinham sido convidados
para realizar esse trabalho que, todavia, acabou não acontecendo.
60
No próprio documento, essa questão fica esclarecida. O LACED, órgão ligado à FUJB, que é uma
instituição relacionada à UFRJ, foi o responsável pela gestão da pesquisa. A FUJB contratou Wallace
de Deus que, consequentemente, convidou Maurício Barros de Castro, aconselhado pelo mestre
Carlão, antigo integrante do Grupo de Capoeira GCAP, e o indicou para ser seu assistente de
coordenação.
61
De acordo com um dos coordenadores, algumas pessoas não aceitaram participar da equipe de
trabalho, como, por exemplo, Mestre Moraes, que foi convidado e declinou do chamado. Os outros
integrantes foram se incorporando, a partir das relações de proximidade com os coordenadores,
assim também como de suas competências específicas.
206
Por fim, a equipe que compôs o dossiê do inventário final, assim como consta
em documento acessível através da internet, na página oficial do IPHAN, é formada
por um coletivo multidisciplinar de pesquisadores de três Estados da Federação. No
grupo do Rio de Janeiro, estavam: Carlo Alexandre Teixeira, Cristiana Nastari Villela,
David Nascimento Bassous, Hugo de Lemos Bellucco e Johnny Alvarez Menezes e
os estagiários Barbara Tinoco, Bernardo Guimarães e Filipe Gonçalves.
Em Salvador, podemos citar as pesquisadoras Adriana Albert Dias, Amélia
Conrado e Ricardo Biriba, e os estagiários Lucylane Oliveira, Nilo Ricardo Lobo.
Recife foi representado por Izabel Cordeiro, Marco Aurélio Lauriano de Oliveira,
Maria Jaidene Pires e Vânia Fialho, além dos estagiários Annelise Lins Meneses,
Graciane Costa Gomes dos Santos, Joice Poliana da Paixão Sales, Karina Lira da
Silva, Paula Natanny Rocha Bezerra e Silvia Carla Lafaiete.
Entendemos que o tempo para a realização dos trabalhos foi corrido, dado o
tamanho do campo de pesquisa, todavia, o coordenador discorda:
A gente tinha um tempo razoável. Foram dois anos, pra fazer quatro
encontros, para produzir o material, para produzir o DVD. Acho que tem que
ser assim mesmo [...]. Eu acho que o tempo foi razoável. [...] A gente teve
também um acompanhamento sistemático do IPHAN, da própria diretora,
que vinha de Brasília pra encontrar com a gente. [...]. (WALLACE DE DEUS,
Informação verbal, 2012)
62
O INRC é uma metodologia de pesquisa desenvolvida pelo IPHAN que tem como objetivo produzir
conhecimento sobre os domínios da vida social aos quais são atribuídos sentidos e valores e que,
portanto, constituem marcos e referências de identidade para determinado grupo social. Contempla,
além das categorias estabelecidas no Registro, edificações associadas a certos usos, a significações
históricas e a imagens urbanas, independentemente de sua qualidade arquitetônica ou artística.
Informação contida no site oficial do IPHAN. Para saber mais acesse:
http://portal.iphan.gov.br/portal/montarPaginaSecao.do?id=13493&retorno=paginaIphan
207
Não, a gente não fez muita adequação, não, até porque o IPHAN dizia pra
gente, o seguinte: – Vocês não podem fazer [...]. Uma vez alguém falou,
fizemos uma adaptação do INRC, e descobrimos que isso era uma
expressão maldita aos ouvidos do IPHAN. Eles diziam: – Vocês não podem
fazer uma adaptação em um instrumento de pesquisa, porque esse
instrumento foi testado [...]. (WALLACE DE DEUS, Informação verbal, 2012)
63
Entendemos ser essa questão um posicionamento regulamentar, pois, no fundo, a mesma se
compõe de objetividades e subjetividades.
208
64
A Instituição deverá declarar que assume a inteira responsabilidade em adotar a metodologia do
Inventário Nacional de Referências Culturais – INRC, de propriedade do Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, exclusivamente para a sua aplicação no projeto,
comprometendo-se a observar as seguintes disposições: 1. Aplicar todos os procedimentos
estabelecidos na metodologia do INRC; 2. Apresentar projeto de execução com todas as
especificações para aprovação do IPHAN; 3. Controlar os levantamentos de campo e manter a
guarda dos dados; 4. Contratar, arregimentar e credenciar todos os profissionais, estagiários e
auxiliares envolvidos na execução dos trabalhos; 5. Prover os meios necessários para que a equipe
de execução do projeto do INRC receba treinamento por técnicos do IPHAN ou por agentes por ele
credenciados, assim como para o acompanhamento da execução do inventário; 6. Consultar o IPHAN
em caso de dúvidas ou obstáculos, ou, ainda, quando houver necessidade de ajustes na aplicação da
metodologia, os quais serão admitidos, desde que realizados com a participação dos autores e do
IPHAN; 7. Assegurar o sigilo sobre os dados obtidos por meio do inventário, não expondo nem
divulgando informações relativas aos entrevistados e aos bens culturais, seus processos de produção
e seus produtores, sem a prévia e expressa autorização dos envolvidos; 8. Utilizar o conhecimento
produzido com a aplicação da metodologia do INRC, respeitados os direitos da propriedade
intelectual dos produtores dos bens culturais inventariados; 9. Inserir em todos os produtos derivados
da aplicação do INRC os créditos do autor da metodologia, assim com a logomarca do IPHAN; 10.
Disponibilizar para o IPHAN as informações coletadas na pesquisa, para fins de inclusão em seu
banco de dados, a quem é assegurado o direito de uso dos conteúdos, observados os devidos
créditos ao autor; e 11. Comunicar imediatamente ao IPHAN possível interrupção do projeto, que, a
qualquer momento, poderá requisitar o material produzido até aquela etapa. (TERMO DE
COMPROMISSO PARA USO DO INVENTÁRIO NACIONAL DE REFERÊNCIAS CULTURAIS –
INRC, 2010)
209
[...] foi uma estratégia que o Wallace inventou pra reunir a comunidade da
capoeira [...] pra saber qual eram as demandas [...] que os capoeiristas
tinham. Então, os encontros tiveram esse objetivo de criar um espaço de
discussão, que nos ajudasse a localizar, identificar as demandas e as
pautas que depois nós utilizaríamos pra formular as recomendações de
salvaguarda. (MAURÍCIO BARROS DE CASTRO, Informação verbal, 2012)
[...] a gente já sabia que haveria esse problema de poucas assinaturas pela
questão do afro-brasileiro. Por outro lado, a gente estava tentando
implementar um modelo de anuência que não fosse via abaixo-assinado,
que fosse por via virtual. E a gente estava trabalhando junto com a Capoeira
Viva. A gente entendia que todo inscrito no Capoeira Viva estava de certa
forma concordando, dando anuência àquela série de políticas que estavam
sendo implementadas. Se você concorda, você concorre ao edital.
(WALLACE DE DEUS, Informação verbal, 2012)
65
Mais à frente, encontraremos a gênese desse quantitativo reduzido de assinaturas.
210
96
6.000.000.000
66
Essa informação pode ser acessada através do Portal do Serviço Social do Comércio (Sesc).
Disponível em:
<http://www.sescsp.org.br/sesc/revistas_sesc/pb/artigo.cfm?Edicao_Id=175&Artigo_ID=2628&IDCate
goria=2673&reftype=1&BreadCrumb=1>. Da mesma forma, no site da Mundo Estranho, disponível
em: <http://mundoestranho.abril.com.br/materia/qual-e-o-esporte-mais-praticado-no-brasil>.
67
Analisando outros processos de reconhecimento, como o da Arte Kusiwa – pintura corporal e arte
gráfica Wajãpi, Jongo e o Samba de Roda do Recôncavo baiano, percebemos também que esse se
constitui de forma muito particular. Cada bem detém suas estratégias e histórias de reconhecimento
como patrimônio cultural. Assim também é o universo da capoeira, diferente e único.
68
O processo de anuência tornou-se, assim, mais um simples trâmite burocrático do que algo
realmente a ser cumprido à risca, ou algo que realmente fosse imprescindível para o processo
acontecer.
211
69
Trata-se de um movimento regional mais localizado no Estado de Pernambuco.
70
Grifos nossos.
71
O mesmo encontra-se em processo, mais especificamente na fase final, conforme divulgação.
212
É a esperança
é como cristaleira
resiste ao tempo
e as boladas que levou [...]
Eu bem tava dizendo
e olha lá
pois cedo ou tarde
72
toda espera tem seu fim [...].
72
Toda espera. Música de Jorge Vercilo.
73
Poucas informações podem ser localizadas na internet sobre esses encontros.
213
74
Paz no Mundo Camará.
214
78
Foi uma mesa longa e cansativa, onde se evidenciou pronunciamentos que nem sempre seguiram
a temática indicada, muito menos o tempo de fala dos expositores, que, sem uma mediação clara,
ocasionou o esgotamento do tempo previsto; consequentemente, o debate ficou prejudicado. De
acordo com o folder, esse evento foi realizado pelo IPHAN e o Departamento de Difusão Cultural
(DDP) da UFF, com apoios da PROEX da UFF, o LACED e o Centro Nacional de Folclore e Cultura
Popular. Ainda neste mesmo documento, encontramos a informação de que o evento fez parte do
Inventário para o Registro e Salvaguarda da Capoeira como Patrimônio Imaterial do Brasil.
79
Grifos nossos.
216
capoeira Angola, que defendem apenas uma origem africana. A partir desse
pensamento, o posicionamento dos capoeiras citados logo acima é coerente.
Nesse ínterim, as altercações foram acontecendo e algumas giraram em torno
dessa questão, conforme relata nosso depoente: “[...] essa discussão, ela foi até o
final do evento. Não! Do dossiê! [...]” (WALLACE DE DEUS, Informação verbal,
2012). Mesmo que esta fosse realmente africana, o que achamos pouco provável,
não poderia o Brasil, neste caso, reconhecer uma manifestação cultural de outro
continente, ou país, como seu patrimônio nacional? Isso inviabilizaria todo o registro
iniciado pelo IPHAN?
[...] tentava argumentar com ele que o fato dela ser africana ou afro-
brasileira, não significava que ela não podia ser brasileira, afinal de contas,
o afro-brasileiro, são os brasileiros, da mesma que forma que os índios são
brasileiros, não é? E aí eu falei pra ele, olha mestre eu tive aqui o ano
passado na sua escola, e vi com muita satisfação, com muito respeito, o
senhor hastear a bandeira do Brasil e cantar o hino nacional! [...] Você faz
uma veneração aqui, à nação brasileira, agora, vem dizer que não é
brasileiro [...]. (WALLACE DE DEUS, Informação verbal, 2012)
Aliás, nós incluímos Recife, já no final. Foi uma negociação, [...] eu estava lá
justamente pra fazer trabalho com os índios, encontrei uma colega que é da
Educação Física, que é Vânia Fialho. [...] e a Vânia Fialho disse: – Rapaz!
Tem o pessoal da capoeira aqui, que está querendo saber, esse negócio do
dossiê, aí que foi que eu fui encontrar o mestre, o Mago. E o Mago falou: –
Não rapaz, vamos fazer esse encontro aqui. Foi cordato, superinteressado
[...]. (WALLACE DE DEUS, Informação verbal, 2012)
Essa informação é confirmada por outro depoente, que nos traz mais detalhes
do momento e de como se configurou a inclusão de uma terceira cidade, nos
encontros sobre a patrimonialização da capoeira.
[...] essa história de vir a terceira reunião pra Recife, foi uma dessas
coincidências [...] Walace veio pra cá, [...] exatamente nesse momento que
ele passa em Recife e aí ele, conversando com Vânia sobre essa história do
inventário [...], Vânia disse: – Olha, cê precisa conhecer Bel, Mago, porque
são pessoas que trabalham aqui com a capoeira, estudam. E aí falou um
pouco da gente [...]. (MESTRE MAGO, Informação verbal, 2012)
80
De acordo com a divulgação, no primeiro momento, estava prevista uma apresentação da
Orquestra de Berimbaus do Ponto de Cultura “Vadeia, Menino, Vadeia”, do mestre Sabiá; a
apresentação do filme “Dança de Guerra”, com a presença do diretor, Jair Moura, e, em seguida, a
formação das mesas. Na Mesa I, o tema divulgado foi Patrimônio, Tradição e Cultura no Brasil,
coordenada pela professora Amélia Conrado, que também fez parte do grupo de pesquisadores que
desenvolveram o Projeto para Salvaguarda da Capoeira como Patrimônio Imaterial do Brasil. A
primeira fala prevista foi a de Wallace de Deus, sobre O Inventário da Capoeira e as Políticas de
Salvaguarda do IPHAN. Em seguida, a professora Maria de Lourdes Siqueira da UFBA se pronunciou
a respeito da Ancestralidade e Saberes Africanos no Brasil. O tema que abordava a Criação da
Capoeira Regional no Brasil ficou a cargo de mestre Nenel, da Fundação Mestre Bimba, seguido do
mestre Moraes do GCAP, que destacaria A Revitalização da Capoeira Angola. Mestra Jararaca do
ECAIG ficou com a responsabilidade de apresentar a Importância Social da Mulher enquanto Mestra
de Capoeira Angola, precedida de Adirana Albert Dias, também pesquisadora do Projeto de
Salvaguarda, que falou sobre Pedro Mineiro e Outros Personagens Históricos da Capoeira na Bahia.
Estava previsto para mestre Itapoan a temática Mundialização da Capoeira Regional e Ricardo Biriba,
outro pesquisador do Projeto de Salvaguarda, ficou de abordar o tema Um Olhar sobre a
Patrimonialização da Capoeira em Salvador. Ao final dos trabalhos, neste primeiro dia, foi prevista
uma roda de apresentação de Capoeira Angola, em homenagem a mestre João Pequeno de
Pastinha, organizada e realizada por integrantes do seu Centro. O segundo dia do encontro previu a
realização de uma roda de capoeira, com crianças do Ponto de Cultura “Ginga e Malícia”, do mestre
Marinheiro, seguido da roda de Capoeira Regional, em homenagem a mestre Decânio, organizada
pela Fundação Mestre Bimba. A segunda mesa teve a coordenação do professor Calos Eugênio
Líbano Soares, que abriu os trabalhos com a palestra da professora Márcia Sant‟Anna, na época
diretora de Patrimônio Imaterial do IPHAN, cujo tema foi O Patrimônio Imaterial do Brasil e as
Políticas de Salvaguarda. Desafios e Perspectivas para Mulher na Roda de Capoeira, era o tema da
contramestra Janja, do Instituto de Estudos de Capoeira Angola N‟zinga. Sobre A Mundialização da
Capoeira Angola estava prevista a fala do mestre Cobrinha da FICA. Apontamentos sobre o Registro
da Capoeira no Rio de Janeiro foi o assunto abordado por Maurício Barros de Castro. Assim como a
Etnografia de uma “Roda de Rua”, em Londres: homenagem a Jean Charles, ficou a cargo do mestre
Carlão. A capoeira na universidade brasileira foi discutida por mestre Xaréu (Hélio Campos), a
Reafricanização em Salvador, abordada por Arani Santana e A Capoeira e os Quilombos: recontando
a história do Brasil, por Zulu Araújo.
218
81
Especificamente, no período da tarde, às 17:00h, no painel intitulado: Perspectivas para a capoeira
no presente e no futuro: trajetórias, reflexões e demandas para a implementação de políticas públicas
para a salvaguarda da capoeira.
219
Pelos relatos recolhidos, Recife foi o momento mais tenso dos quatro
encontros realizados pela equipe responsável por esse desafio. Ainda sobre essa
questão, um dos nossos depoentes, avaliando o ocorrido, destaca: [...] as demandas
do mundo da capoeira no Recife; demandas extremamente conservadoras, do ponto
de vista político [...] (WALLACE DE DEUS, Informação verbal, 2012).
As atividades desse encontro em Recife têm início no turno da tarde, com a
previsão de uma apresentação de uma orquestra de berimbaus. Para abrir os
trabalhos, o evento contou com as falas de Wallace de Deus Barbosa e Maurício
Barros de Castro, ambos ligados ao projeto de Salvaguarda da Capoeira como
Patrimônio Imaterial do Brasil; Rui F. Pereira, como coordenador do PCV; Frederico
Farias Neves de Almeida que, na ocasião, era superintendente regional do IPHAN
de Pernambuco, e Tito Figueirôa, representando a Universidade Federal de
Pernambuco (UFPE).
Após esta mesa de abertura, estava previsto a exibição dos filmes: Mestre
Curió: o guardião da tradição e Bem-vindo capoeira, que conta a história do Mestre
Touro e Dentinho, que deveriam ser debatidos por Frede Abreu, Luiz Renato Vieira,
Wallace de Deus e Izabel Coordeiro, sob a mediação de Maurício Barros de Castro.
Estava previsto, logo em seguida, um coquetel de confraternização e uma
performance do Maracatu Batuque Estrelado, coordenado por Mestre Papagaio.
No dia seguinte, aconteceu a mesa redonda Patrimônio, Tradição e Cultura
no Brasil: capoeira, frevo e corporalidade na cultura contemporânea. Ao que parece,
o tema da mesa foi permeado de subtemas, pois a previsão, conforme divulgado,
220
era que Maurício Barros de Castro falasse sobre a Memória do Corpo na Capoeira;
Luiz Renato Vieira abordasse Reflexões Contemporâneas sobre a Prática da
Capoeira no Brasil e no Mundo, seguido pela fala de Rui F. Pereira, avaliando
preliminarmente o PCV, e por Frede Abreu, que abordou a Importância do
Levantamento de Documentação sobre a Capoeira em Pernambuco.
Contraditoriamente, também se torna um encontro mais profícuo. Após alguns
impasses, o interlocutor, que foi responsável por levar a discussão da capoeira, de
forma oficial, enquanto patrimônio para Recife, avaliou de forma positiva a atividade.
[...] Uma vez que essa é uma das ações de Registro consideradas
prioritárias em 2006, solicito urgência no encaminhamento junto ao MinC,
ao tempo que coloco-me à disposição para prestar qualquer esclarecimento
julgado necessário ou informação complementar. (MEMORANDO 051/06
GAB/DPI, 2006).
Outro encontro, desta vez o último, foi realizado novamente no Estado do Rio
de Janeiro, nos dias 16 e 17 de agosto de 2007. O evento aconteceu no Tetro Raul
Cortez, no município de Duque de Caxias, no centro da cidade. Nesse momento, os
trabalhos de realização do Inventário e Registro para Salvaguarda da Capoeira
como Patrimônio Imaterial do Brasil (IRSCPIB) já se encontravam na fase final e
esta ação se estabelece como o fechamento dos trabalhos.
Este evento teve início com uma roda de capoeira, com crianças do complexo
da Maré, coordenadas pelo mestre Emanoel. Após a sessão solene, estavam
previstas as falas de Márcia Sant‟Anna (Diretora de Patrimônio Imaterial do IPHAN),
Cláudia Márcia Ferreira (Diretora do Centro Nacional de Referência da Cultura
Popular), Wallace de Deus (Coordenador do IRSCPIB), Dalva Lazaroni (Secretária
de Cultura do Município de Duque de Caxias) e Rui Pereira (Coordenador do PCV).
A segunda mesa estava prevista para acontecer às 17h, sob a coordenação
de Wallace de Deus, e previa as falas de Muniz Sodré (UFRJ),83 Júlio Cesar Tavares
(UFF), Simone Pondé Vassalo (UERJ), Matthias Röhrig Assunção (ESSEX) e
Maurício Barros de Castro (Assistente de Coordenação do IRSCPIB).84
No segundo dia, uma mostra de vídeo foi realizada, seguida por um painel
com mestres do Rio de Janeiro.85 Constava ainda da programação uma roda de
mestres e novamente um espetáculo denominado de Água de Beber.
No percurso de elaboração do inventário da capoeira, foram amadurecendo
algumas ideias que poderiam contribuir para a melhoria da qualidade de vida dos
82
Grifos nossos.
83
Conforme alguns entrevistados, o professor Muniz Sodré não se fez presente neste evento.
84
Ao final das discussões, estavam previstos: a apresentação do filme Fina Flor da Malandragem, em
homenagem ao Mestre Leopoldina, um coquetel de confraternização e a apresentação de um
espetáculo denominado de Água de Beber.
85
No cartaz de divulgação, destacam-se os nomes de mestre Russo, mestre Emanoel, mestre Nestor
Capoeira, mestre Vilmar, mestre Gil Velho, mestre Peixinho e mestre José Carlos.
222
86
Nós ouvimos relatos de vários capoeiras, repetindo frases como: “não quero morrer como Bimba e
Pastinha”. E mesmo com essa preocupação, essa problemática ainda se repetiu por várias vezes.
Tantos outros morreram na miséria, abandonados pelos órgãos públicos e expurgados do imaginário
social, em consequência de uma educação, que não valoriza seus ícones e seus atores culturais, e
de um governo, que não estimula e nem democratiza a cultura nacional.
87
Tanto que gerou boa discussão, inserida na primeira tese voltada para a capoeira, na
FACED/UFBA, intitulada O Jogo da capoeira em jogo e a construção da práxis capoeirana, de José
Luiz Cerqueira Falcão. Neste trabalho, Falcão (2004) incluiu um capítulo para tratar da
internacionalização da capoeira no contexto da mundialização do capital, o que depois gerou um
vídeo de título análogo Iê da Volta ao Mundo Camará: A internacionalização da capoeira.
223
88
A discussão da internacionalização está registrada em jornais baianos, desde 2001, quando a
Fundação Internacional de Capoeira Angola (FICA) realizou, no mês de janeiro, um debate com o
tema Internacionalização da Capoeira: causas e consequências. Na ocasião, a discussão pairava
sobre a divulgação e a valorização da cultura afro-brasileira, que é repassada pela capoeira, como já
destacamos acima, a preocupação com o ensino-aprendizagem, além da formação e da competência
dos docentes que seriam os responsáveis por essa educação.
89
Contudo, a discussão da necessidade de flexibilização da docência para aqueles mestres que não
possuem formação acadêmica será posta, mais fortemente ,a partir do final da década de 1990.
224
90
Adilson Silva de Moraes, Aguinaldo de Freitas Souza, Carlos Henrique Mantovani, Claudio Ferreira
de Lima, Cristiano Rosa Farias, Daniel Nunes Vieira, Domingos Anastácio de Brito, Edson Mancusi da
Silva, Fábio Gabriel da Costa, Gerisnaldo da Silva Santos, Irandi Ferreira da Silva, Johnni Rodrigues
Kiss, José Abílio Pereira, José Carlos Machado de Araújo, José Macena da Silva Filho, Joseane Silva
de Albuquerque, Karina Basso Ferraresso, Lílian Patrícia Soares, Luiz Eduardo Manuel, Marcelo
Gomes Polidório, Marco Antonio da Costa, Marco Antonio Jeremias, Maria da Guia da Costa Batista,
Mauro Gomes dos Santos, Ordack Miranda de Oliveira, Priscila Regina Félix Nascimento de Oliveira,
Ramiro Markarian de Siqueira, Rodney Rogério Aregazone, Suzana Campos Cordeiro e Vladimir
Pereira Bezerra.
91
José Abílio Pereira, Irandi Ferreira da Silva, José Carlos Machado de Araújo, Cristiano Rosa Farias,
Carlos Henrique Mantovani, José Macena da Silva Filho, Gerisnaldo da Silva Santos, Suzana
Campos Cordeiro, Vladimir Pereira Bezerra, Karina Basso Ferraresso, Fábio Gabriel da Costa,
Ordack Miranda de Oliveira, Rodney Rogério Aregazone, Claudio Ferreira de Lima, Joseane Silva de
Albuquerque e Lílian Patrícia Soares.
225
95
Nosso depoente seria inclusive um dos prováveis coordenadores do projeto de produção do dossiê,
mas não aceitou o trabalho.
228
96
As referências do Inventário encontram-se cheias de erros. Faz-se necessário urgentemente que
os responsáveis pelo documento acrescentem, ao mesmo, erratas, minimizando os equívocos. Um
documento desta natureza não pode manter tais erros, por tanto tempo. Somente para ilustrar a
referência de uma tese de doutorado de Sérgio Vieira, que é atribuída à Luiz Renato Vieira, e três
textos de Luiz Cirqueira Falcão imputados ao saudoso Mestre Decânio. Um descuido possivelmente
relacionado ao tamanho do trabalho e da equipe.
97
Estes documentos migraram para a Fundação Palmares.
229
98
A pesquisadora está se referindo aqui à ausência desses materiais no momento de suas visitas
para entrevistar os mestres, ou seja, em um momento específico da pesquisa de campo. A captura de
imagens irá ser realizada, posteriormente, por uma equipe específica.
230
Foi um trabalho bibliográfico, como eu disse pra você, quer dizer, eu não
viajei pra pesquisar, eu não fiz pesquisa de campo pra pesquisar, foi um
trabalho mais instrumental pra finalização do dossiê, foi um trabalho de
levantamento mesmo. (HUGO BELLUCI, Informação verbal, 2012)
Já outra entrevistada nossa da Bahia afirma que: “[...] pelo que eu sei, eu fui a
pesquisadora responsável pelo levantamento da documentação da história da
capoeira na Bahia [...] desde as fontes secundárias [...] e todas as fontes primárias.
231
[...] todo esse material quem fez o levantamento fui eu!” (ADRIANA ALBERT,
Informação verbal, 2012)
Questionei um dos coordenadores sobre a existência de algo inédito,
encontrado no processo de pesquisa: “[...] tinha aquele trabalho daquele folclorista
que dizia o seguinte: que o frevo era uma derivação da capoeira, que o passo do
frevo tinha vindo da capoeira. [...] isso foi uma coisa interessante [...]” (WALLACE DE
DEUS, Informação verbal, 2012).
Na verdade, essa informação já é bastante conhecida. Quem já obteve
acesso ao livro de OLIVEIRA (1985), já adquiria essa informação na década de
1980. A ausência de ineditismo nos levantamentos e pesquisas produzidos para o
inventário é confirmada por outro participante na Bahia: “Não! Não teve nada inédito”
(ADRIANA ALBERT, Informação verbal, 2012). É confirmado, ainda, pelo depoente
a seguir, que teve acesso a documentos no Rio de Janeiro e em Recife.
A gente não achou nada de tão inédito assim, porque a capoeira, ela já tem
uma história bem contada [...] foi mais uma sistematização de informações
[...] Acho que a ideia da pesquisa foi apontar ideias, caminhos, lacunas pros
próximos pesquisadores [...]. (HUGO BELLUCI, Informação verbal, 2012)
possível que essa tenha sido a primeira vez que esse número foi divulgado, daí em
diante, o mesmo vem sendo reproduzido, sempre sem sua fonte.
O documento do dossiê, construído com base na pesquisa científica, deveria
ter indicado a origem da informação e até situá-la no tempo, vez que se constitui em
um dado bastante volátil, dado o intenso movimento de expansão da capoeira. Há
outros registros, ainda sem respectivas fontes, que apareceram depois, apontando o
número de 160 países que praticam capoeira. Não há, nesse sentido, até o
momento, uma preocupação a respeito da veracidade destas informações.102
Desta forma, documento expressa que a opção de abarcar os lugares
históricos onde a capoeira se desenvolveu ao longo do tempo. Contudo, ainda
informa que isto não significaria restrições. “De início, as capitais da Bahia e Rio de
Janeiro foram delimitadas como campo de pesquisa [...] O que não significava a
realização de um registro historiográfico restrito às duas cidades”103
(INVENTÁRIO PARA REGISTRO E SALVAGUARDA DA CAPOEIRA COMO
PATRIMÔNIO CULTURAL DO BRASIL, 2007, p. 9).
Mas não há, nesse sentido, o registro de outras áreas, urbanas ou rurais, do
território brasileiro, além das já citadas.104 Isso não foi notado somente por nós: “Na
verdade, outros Estados podem requerer a mesma importância, [...] saiu uma
pesquisa muito bacana sobre a capoeira no Pará, tem prisões de capoeira no Pará,
o Maranhão tem outro movimento de capoeira importante também [...]” (MESTRE
MAGO, Informação verbal, 2012).
Até mesmo cidades históricas, que não fazem parte dos grandes centros
urbanos, mas que possuem relatos importantíssimos para a história da capoeira,
passaram despercebidas na pesquisa, como é o caso da região do Recôncavo
baiano. Esta região conta apenas com uma rápida citação pontual, sobre o volume
de documentação de capoeira ali existente. Por fim, observamos que um dos
grandes mitos da capoeira baiana e que viveu naquela região, foi ignorado no texto
do dossiê do inventário para registro e salvaguarda da capoeira.
102
O documento destaca a amplidão da capoeira como campo, na contemporaneidade. Hoje, a
capoeira encontra-se espalhada em todo o território nacional e por vários países dos diversos
continentes.
103
Grifos nossos.
104
Não encontramos, somente para exemplificar, dados de áreas da região Norte, ou até mesmo de
outras áreas do Nordeste, como, por exemplo, o Maranhão, que conta com expressivo movimento da
cultura afro-brasileira, em suas cidades, com registros de capoeira.
234
105
Na Bahia, foram ouvidos: Mestre João Pequeno (João Pereira dos Santos); Mestre Curió (Jaime
Martins dos Santos); Mestre Virgílio (Virgilio Maximiniano Ferreira); Mestre Bamba (Rubens Costa
Silva); Mestre Gajé (José Izidro de Carvalho); Mestre Xaréu (Helio Campos); Mestre Demolidor
(Augusto Januário Passos da Silva) e Mestre Lua Rasta (Gilson Fernandes). Na cidade do Rio de
Janeiro: Mestre Vilmar (Vilmar da Cruz Brito); Mestre Nestor Capoeira (Nestor Sezefredo dos Passos
Santos); Mestre Gil Velho (Gilberto Cavalcanti); Mestre Russo (Jonas Rabelo); Mestre José Carlos
(José Carlos Gonçalves) e em Recife: Mestre Coca-cola (Marco Aurélio Moreira); Mestre Mulatinho
(João Ferreira Mulatinho) e Mestre Meia-Noite (Gilson Santana).
106
Mestre João Grande (João Oliveira dos Santos – BA); Mestre Arthur Emídio (Arthur Emídio – RJ);
Mestre Boca Rica (Manoel Silva – BA); Mestre Pirajá (Marcondes Luiz Ferreira da Silva – PE); Mestre
Leopoldina; (Demerval Lopes de Lacerda – RJ); Mestre Moraes; (Pedro Moraes Trindade – BA);
Mestre Lua de Bobó (Edvaldo Borges da Cruz – BA); Mestre Suassuna (Inaldo Ramos Suassuna –
BA); Mestre Itapoan (Raimundo Cesar Alves de Almeida – BA); Mestre Acordeon (Ubirajara
Guimarães Almeida – BA); Mestre Decânio (Angelo Augusto Decânio Filho – BA); Mestre Camisa
Roxa (Edvaldo Carneiro e Silva – BA); Mestre Camisa; (José Tadeu Carneiro Cardoso – BA); Mestre
Peixinho (Marcelo Azevedo Guimarães – RJ); Mestre Rafael Flores (Rafael flores Viana - RJ); Mestre
Celso do Engenho da Rainha (Celso Carvalho Nascimento – RJ); Mestre Pelé da Bomba (Natalício
Neves da Silva – BA); Mestre Felipe de Santo Amaro (Felipe Santiago – BA); Mestre Gigante
(Francisco de Assis – BA); Mestre Bigodinho (Reinaldo Santana – BA).
107
14 da Bahia, mais cinco do Rio de Janeiro e um de Pernambuco.
235
108
Somente não é citado o surgimento do termo “de Angola”, denominação comumente utilizada, a
partir da criação e desenvolvimento da Regional, desencadeando o processo de dicotomização da
capoeira, que até então não possuía adjetivações. Torna-se bastante notória a ausência dessa
discussão no documento.
236
111
Não conseguimos explicar cientificamente até o momento a origem etimológica do termo para a
prática da capoeira, como um conjunto de técnicas corporais, no contexto que a conhecemos hoje
como um jogo, diferente de outras manifestações da cultura corporal, que surgiram como esporte e
até os dias de hoje se configuram assim. A capoeira perpassa por várias caracterizações, ora como
defesa pessoal, ora com jogo, ora como exercício físico, ora como luta, ora como ginástica, ora como
folclore, dentre outras. Além disso, ela é utilizada com vários objetivos, para atingir os mais variados
fins: artísticos, estéticos, históricos, culturais, educacionais e filosóficos.
112
Grifos nossos.
238
113
Apesar do mestre Bimba, em diversos momentos, caracterizá-la como luta e participar, assim,
como seus discípulos, de desafios e competições em ringue.
114
1) a revitalização da capoeira angola; 2) a introdução da prática da capoeira nas escolas; 3) o
incentivo às pesquisas e estudos sobre o tema; 4) a importância de encontrar formas de amparo aos
velhos mestres e suas famílias; 5) a realização de novos eventos de capoeira; e 6) a busca de novos
espaços para a sua prática.
239
115
Nem os autores Carlos Pereira (Charles) e Mônica Carvalho e muito menos os pesquisadores do
dossiê informam a fonte de suas cogitações, constituindo-se em mais uma lacuna nas pesquisas.
116
Grifo nosso.
240
117
Grifo nosso.
241
118
Mas devemos alertar que a mesma não é mais comumente utilizada. A moeda a que se refere o
documento é uma peça antiga, de quarenta réis, do século XVIII, feita de bronze. Não esqueçamos
de que a ruela foi muito utilizada na década de 1990, na Bahia, somente para exemplificar.
119
Há uma citação sobre o dobrão atual, na página 82.
120
Grifos nossos.
242
É o a,
Éob
É o a, é o b é o c
É o a,
Éob
É o a, é o b é o c
É o a, de aú
É o b de berimbau
É o c, de capoeira.
121
Pensamos inclusive que deveria ser mais aprofundado, dado o problema que pode desencadear
em um futuro não tão distante.
122
Exceto o aço do berimbau, que é retirado de pneus de carro.
243
123
Podemos observar algo parecido com os chutes do Muay Thay, manifestação da cultura corporal
tailandesa, que tem seus golpes pronunciados na língua inglesa, sem tradução em muitos casos (jab,
uppercut, hight kick). Com o advento de shows, cobertos pelas mídias e transmitidos para diversos
países, onde lutadores que defendem suas lutas e artes marciais se enfrentam na tentativa de
provarem quais técnicas são melhores e mais eficientes, essa aculturação é potencialmente
ampliada, sendo ainda uma tentativa de universalização da cultura dominante.
124
A capoeira também foi privilegiada em outras linhas de atuação, como o edital de incentivo a
documentários (DOC TV) e os Pontos de Cultura.
245
[...] era na roda, sem a interrupção do seu curso, que se dava a iniciação,
com o mestre pegando nas mãos do aluno para dar uma volta com ele.
Diferentemente de hoje em dia, quando é mais freqüente se iniciar o
aprendizado através de séries repetitivas de golpes e movimentos,
antigamente o lance inicial poderia surgir de uma situação inesperada,
própria do jogo: um balão boca-de-calça, por exemplo. A partir dele se
desdobravam outras situações inerentes ao jogo, que o aprendiz vivenciava
orientado pelos „toques‟ do mestre [...]. (ABREU, 2003, p. 20)
Com Bimba, toda essa pedagogia foi modificada, inclusive sua metodologia,
que passou a se formatar através de uma organização didática e de sequências
pedagógicas. Destaque-se a Sequência de Ensino e a Cintura Desprezada. “As
sequências que inventou foram o primeiro método de ensino da capoeira”
246
125
Grifos nossos.
126
Na nossa compreensão, a capoeira foi sendo ensinada/aprendida através de várias influências,
conforme o seu movimento natural, de uma manifestação com suas características.
247
127
Dessa forma, temos o ensino através da oitiva; o método da Capoeira Regional (sequências
cintura desprezada etc.); o ensino com influência dos métodos ginásticos e esportivos; o método da
Capoeira Regional, com métodos ginásticos e esportivos (exercícios sistematizados de flexibilidade,
corridas, saltitos, apoios, abdominais, polichinelos etc.); a mesma foi ensinada com princípios da
sequência da Capoeira Regional, com exercícios do treinamento desportivo e complemento do treino
com atividades com pesos (não necessariamente nesta ordem); princípios da sequência da Capoeira
Regional e da Oitiva, treinamento com pequenos aparelhos e princípios do treinamento funcional,
dentre outros.
128
Grifos nossos.
248
129
Gostaria de destacar dois pontos a esse respeito: o primeiro desentendimento se produz por
causa do discurso construído, que muitas vezes se torna intransigente e imutável, tanto por parte de
um como de outro. E o segundo, pela representação de interesses distintos.
130
Grifos nossos.
249
131
Durante os três dias do evento, participaram cerca de trezentas pessoas. Dentre as várias
discussões, a patrimonialização se fez presente, como tema em diversos GTs, mesas-redondas,
apresentação de pôsteres e comunicação oral de trabalhos científicos.
250
Essas ações foram amplamente divulgadas, tanto pelo ME, quanto por sites,
jornais e entidades ligadas ao esporte no país.
132
Os pesquisadores são cautelosos, o que por um lado os livra das contradições. Possivelmente,
houve um consenso que momentaneamente deixou no texto um posicionamento mais claro, diferente
do Governo, que explicitamente expõe as contradições e os posicionamentos de grupos diferentes
que fizeram e fazem parte dele.
251
133
Somente há referências a alguns poucos golpes da Capoeira Regional de Mestre Bimba, na
página 75, e a alguns movimentos da Capoeira Angola, registrados através de fotos, na página
seguinte.
134
Há registros aligeirados na página 77.
135
Diz respeito aqui ao dossiê do inventário da capoeira.
252
[...] foi certo descompasso entre as falas por ocasião dos eventos, das
mesas, dos mestres, daquilo que se dizia, daquilo que se pedia, que se
encarava como demanda do mundo da capoeira. Havia visões muito
díspares. Muito variadas. (WALLACE DE DEUS, Informação verbal, 2012)
São coletivos extensos, dentro e fora do Brasil, que disputam ideias diversas
e em muitos casos incongruentes. Além disso, não há como simplesmente apagar
da memória a relação, extremamente conflituosa, que o Estado construiu com as
comunidades dessa manifestação cultural. Assim, uma ação como essa, torna-se
extremamente complexa e difícil.
136
O que indica que não houve o entendimento, por parte dos produtores do documento, da
necessidade de tal discussão.
253
A noite esfriou,
O dia não veio,
O bonde não veio,
O riso não veio
Não veio a utopia
E tudo acabou
E tudo fugiu
E tudo mofou,
139
E agora, José?
139
E agora José? Música de Paulo Diniz.
255
140
Vimos que a história da capoeira passou por várias tradições, estas se constituíam de forma
diferente, nas cidades em que a capoeira se desenvolveu, influenciando de forma significativa o
próprio movimento interno dessa manifestação, em alguns casos. Podemos destacar aqui algumas
tradições da capoeira baiana, que acabou de forma hegemônica influenciando grande parte da
comunidade nacional e internacional.
141
Estamos nos referindo às declarações de Antônio Natalino Dantas, ex-diretor da Faculdade de
Medicina (Famed) da UFBA.
256
142
Tal reconhecimento público e nacional se constitui a partir de dois registros em livros diferentes.
258
143
O documento escrito, que fundamentou o reconhecimento da capoeira como patrimônio, até o
primeiro semestre de 2010, não tinha sido democratizado à população, muito menos aos maiores
interessados: a comunidade da capoeira. No segundo semestre de 2010, o IPHAN postou na sua
página oficial da internet alguns desses documentos, mas não divulgou, devidamente, até o
momento.
144
Também a este foi solicitado anexar os cartazes dos encontros Capoeira com Patrimônio Imaterial
do Brasil; 61 folhas de abaixo-assinados referentes à anuência ao pedido de registro da capoeira e à
gravação de dois DVD‟s referentes ao primeiro e segundo encontros, para a discussão da temática
de patrimonialização da capoeira, ocorridos, respectivamente, no Rio de Janeiro e em Salvador,
como já destacamos neste trabalho. Todo esse material juntou-se ao processo.
145
Completam a lista: Arte Kusiwa – pintura corporal e arte gráfica Wajãpi, Frevo, Jongo no Sudeste,
Matrizes do Samba no Rio de Janeiro: Partido Alto, Samba de Terreiro e Samba-Enredo, Samba de
Roda do Recôncavo baiano, Tambor de Crioula do Maranhão e Toque dos Sinos em Minas Gerais,
tendo como referência São João del Rey e as cidades de Ouro Preto, Mariana, Catas Altas,
Congonhas do Campo, Diamantina, Sabará, Serro e Tiradentes.
146
Os demais são: Sistema Agrícola Tradicional do Rio Negro, Modo de Fazer Viola-de-Cocho, Ofício
de Sineiro, Modo Artesanal de Fazer Queijo de Minas, nas regiões do Serro e das serras da Canastra
e do Salitre/ Alto Paranaíba, Ofício das Baianas de Acarajé, Modo de Fazer Renda Irlandesa, tendo
como referência este ofício em Divina Pastora/SE, Ofício das Paneleiras de Goiabeiras.
259
[...] o Ministério teve uma parcela de culpa muito grande. Ele teve uma
morosidade de responder os processos, em 2009, 2010, a gente questiona
muitas coisas do Ministério, faz muitas solicitações onde a gente nao tem
resposta. A gente passa um ano sem ter resposta do Ministério sobre
nossas indagações, sobre o pedido de prorrogação do prazo de execução
do projeto. Só em 2011, que ele pede a prestação de contas e pede a
finalização, onde a gente responde, faz a prestação de contas e solicita a
necessidade de dar continuidade [...] e mais uma vez ele não se posiciona e
só agora, em 2012, ele aponta que vai fazer uma reanálise desse pedido.
(FRANCIANE SIMPLÍCIO, Informação verbal, 2012)
147
As outras ações, que já discutimos aqui, especificamente voltadas para a capoeira (Edital Pontos
de Cultura de Capoeira, primeiro e segundo edital PCV), que aconteceram na gestão Gil/Juca, no
Governo Lula, foram desenvolvidas antes do reconhecimento da capoeira como patrimônio imaterial,
auxiliando e ajudando inclusive essa ação, mas continuam sem previsão de continuidade.
260
A capoeira não, a capoeira é mais ampla. [...] a gente não podia escolher
uma instituição. Como é que você vai escolher uma instituição de capoeira
com um monte de grupos de capoeira [...]. A política é: – Não vamos dar
preferência a ninguém, vamos tentar ser o mais democrático e o mais
inclusivo possível. E foi essa a ideia que a gente começou a implementar
[...]. A gente nunca viu essa possibilidade de fazer um ponto de cultura na
capoeira, apesar de que teve, na época no Ministério, um projeto de fazer o
forte da capoeira virar um pontão, virar um centro de referência de
pesquisa. [...] e acabou não acontecendo também, não sei por quê.
(MORENA SALAMA, Informação verbal, 2012)
261
148
Este, conforme o DOU, era composto por cinco membros: Luiz Fernando de Almeida, Presidente
do Instituto do IPHAN; Edvaldo Mendes de Araújo, Presidente da FCP; Américo José Córdula
Teixeira, secretário da SID e José Luiz Herência, secretário da SPC.
149
Segundo ainda o site do IPHAN, as fichas poderiam ser encontras nos seguintes endereços:
<www.iphan.gov.br>; <www.cultura.gov.br/diversidade> e <www.palmares.gov.br>.
150
Através do Edital de Concurso nº 01/2010 – denominado Apoio à Formulação e Implantação do
Programa Nacional de Salvaguarda e Incentivo à Capoeira – PRÓ-CAPOEIRA.
262
151
Propaganda inclusive premiada no festival de Cannes, que destacava a importância da educação
e da cultura para o desenvolvimento humano.
263
A ideia de se contratar uma Oscip, era porque [...] o contrato [...] é muito
mais flexível, [...] ela pode fazer coisas a mais que uma associação comum
não pode fazer. Podia contratar alguns consultores, que eram essenciais.
[...] Então, assim havia várias outras facilidades que a gente percebia nesse
tipo de contrato, que é termo de parceria, que é híbrido, entre contrato e
convênio com a empresa. É uma coisa bem flexível [...] e se via que era
uma maneira mais simples e também mais barata de fazer os encontros.
(MORENA SALAMA, Informação verbal, 2012)
152
Ver Anexo O.
153
Grifos nossos.
154
Composto pelos integrantes: Gisela Pelegrinelli, como representante da Oscip Centro Cultural
Internacional – Intercult BSB; Teresa Paiva-Chaves, como representante do DPI-Iphan; Washington
Queiroz, como representante do Conselho Nacional de Política Cultura; Carolina Santos Petitinga,
como representante do GTPCGrupo de Trabalho Pró-Capoeira e Rívia Ryker Bandeira de Alencar.
264
[...] não era só indicar pessoas que viriam participar do encontro, mas
também fazer os textos e conduzir os grupos de trabalho, fazer mediação. A
gente precisava de alguém que soubesse escrever, [...] sistematizar.
Pessoas que tivessem experiência nessa área. Foi muito difícil encontrar
gente dessa forma [...] muita gente que apresentou currículo e não tinha
experiência nesse tipo de tema que a gente trabalha [...]. A gente teve muita
dificuldade, principalmente encontrar gente no nordeste e norte [...] teve que
156
republicar a chamada [...]. (MORENA SALAMA, Informação verbal, 2012)
155
A relação da Oscip com o IPHAN estabelecia-se através de apoio, orientações, suporte e
encaminhamentos. A primeira prestava serviços à segunda, a partir de demandas que surgiam.
156
Essa informação pode ser confirmada na reportagem Reabertura de seleção de consultores
Região Norte / Pro-Capoeira. Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br/portal/
montarDetalheConteudo.do?id= 15269&sigla=Noticia&retorno=detalheNoticia>.
265
157
Ela voltava. Canta Zenilton.
266
Esse desafio, que se traduz quase em uma missão impossível ficou a cargo
dos consultores que contataram esses representantes através de vários meios,
sendo um deles foi o mundo virtual.
Outra questão que tinha que ser pensada, e que não foi, ao que parece, trata-
se do domínio dos assuntos a serem discutidos nos encontros. Essa problemática
ficou visível em Recife. Como participar, por exemplo, de uma discussão que
envolve regulamentação da profissão, sem dominar minimamente o que isso
significa? Ou sem ter uma avaliação prévia dos impactos, das consequências ou
mesmo dos fatores que trouxeram essa discussão à baila?
Foi o que aconteceu no primeiro encontro, realizado em Recife. Os capoeiras
foram convocados para realizar discussões e apontar possibilidades de assuntos
que muitos não dominavam, não tinham acúmulo de discussão e, em alguns casos,
sequer informações básicas sobre os mesmos. Os seis eixos temáticos foram:
Capoeira e Educação; Capoeira e Política de Desenvolvimento Sustentável;
Capoeira e Políticas de Fomento; Capoeira, Esporte e Lazer; Capoeira Identidade e
Diversidade; Capoeira, Profissionalização, Organização Social e Internacionalização.
267
Para todos estes eixos foram construídos, pelos consultores, textos que
possuíam, em média, uma a duas laudas, e objetivavam introduzir a temática a ser
discutida pelos Grupos de Trabalho (GT).158
Ao percebermos o caos que constituiriam essas ações, sem os devidos
esclarecimentos, tratamos de organizar, inicialmente, em uma tentativa desesperada
de minimizar os impactos equivocados e improdutivos destas discussões, sem uma
preparação prévia ou um mínimo de organização dos coletivos, um encontro com os
representantes baianos, mas que logo se ampliou para qualquer interessado,
quando tivemos a participação de representantes de outros Estados do nordeste.
A mobilização aconteceu durante a abertura do evento, convocando os
capoeiras para realizar uma discussão prévia, antes de acontecerem as discussões
nos GT‟s, e solicitamos ao hotel um espaço onde pudéssemos nos reunir, dirigindo
as discussões auxiliados por capoeiras da Bahia.159
Outra preocupação era mobilizar esses representantes, para dar
conhecimento, replicando em seus grupos e associações etc., os últimos
acontecimentos relacionados às ações das políticas culturais voltadas para a
capoeira e os nexos que incidiam nas discussões das ações do Pró-Capoeira, com
vistas a ampliar os debates e torná-los o mais democráticos possível.160
161
O segundo Pró-Capoeira deveria acontecer em Brasília, reunindo representações da manifestação
das regiões norte e centro-oeste, nos dias 28 a 30 de setembro de 2010, e o terceiro e último
encontro regional estava previsto para ser realizado na cidade do Rio de Janeiro, entre os dias 27 a
29 de outubro do mesmo ano, e tinha como objetivo reunir representantes das regiões sul e sudeste
do país.
271
A reflexão da nossa depoente deve ser entendida como sendo algo que
estava em andamento, e até que se prove o contrário, a instituição é idônea. Essa é
a função da justiça e o processo se encontrava em andamento, quando de seu
depoimento. O IPHAN fez o que se esperava de uma instituição séria, coube ao
INTERCULT defender-se, apresentando provas de sua inocência, exatamente o que
aconteceu. Por outro lado, há também um processo da Oscip contra o IPHAN:
[...] a OSCIP já entrou com uma ação contra o IPHAN, pedindo recurso,
porque eles gastaram mais pra fazer o evento do que receberam,
receberam uma primeira parcela, fizeram mais do que tinham que fazer
nessa primeira parcela prevista no cronograma de execução. (MORENA
SALAMA, Informação verbal, 2012)
[...] nós não ficamos sabendo o que era, inclusive nós solicitamos a Dra.
Márcia pra fazer uma reunião conosco, com os consultores, porque nem a
Intercult fazia, nem o IPHAN fazia, então, quando da realização em
Brasília, ela veio reunir conosco pra dizer que estava havendo problemas na
prestação de contas e tudo o mais, mas exatamente o que era não, então,
nós ficamos assim, então, na verdade, o IPHAN suspendeu
temporariamente (foi o termo usado) [...]. (MESTRE ZULU, Informação
verbal, 2012)
Então, esse era o grande problema, alguns já sabiam que não éramos
consultores, outros não sabiam, e por não saber, faziam uma cobrança
como se fôssemos consultores, nós ficamos numa situação extremamente
difícil, e eu acho que ninguém saiu sem estar com a imagem arranhada.
Ninguém! Ppossivelmente, até hoje, nenhum documento foi publicado, nada
de esclarecimento do que aconteceu entre IPHAN e Intercult, [...]. (MESTRE
ZULU, Informação verbal, 2012)
[...] muito, uma força da Márcia Santana porque ela brigava por isso com os
ministros [...] eles jogaram na mão da Márcia. Ela pegou e fez. E eles
prometeram ajuda no orçamento, técnicos e não tinha essa ajuda.
Prometiam, prometiam, ia lá dava a cara a tapa. Comprometiam-se e, no
final, não tinha orçamento. Não tinha como fazer as coisas. [...] Fizeram
muita promessa que não foi cumprida. E aí, do meu ponto de vista, eu acho
que aconteceu mais por uma força da Márcia mesmo, uma briga da Márcia,
que a Márcia tomou pra si. (MORENA SALAMA, Informação verbal, 2012)
Sempre nos resta a esperança de que finalmente esta etapa seja concluída já
que, em discursos oficiais, a capoeira é pautada como prioridade: “Como uma das
prioridades do MinC atualmente é o estabelecimento de uma política pública
para capoeira enquanto saber, arte, tradição cultural e instrumento pedagógico, de
desenvolvimento físico e social [...]” (SALÉM, 2012). Esse é um discurso facilmente
acessível no site oficial do IPHAN.
No texto intitulado Encontro debate regulamentação, salvaguarda e incentivo
à atividade da Capoeira, além da afirmação, já destacada acima, encontramos
também o indicativo de outras ações já realizadas com esse fim: “diversas ações de
reconhecimento e incentivo à prática deste bem cultural têm sido empreendidas [...]”
(SALÉM, 2012). O que se constitui na mais pura verdade, entretanto, muitas destas
276
ainda sem conclusão. E não custa nada questionar, até mesmo para refletir: com
que qualidade e impactos na comunidade essas ações vêm sendo desenvolvidas?
Quase encerrando nossas reflexões acerca das ações das políticas culturais
voltadas para a capoeira, abordaremos, rapidamente, outra ação que também está
diretamente ligada e integrada às ações de salvaguarda e incentivo da capoeira,
que, para não fugir da regra, também foi cercada de polêmicas, desencontros,
atrasos e questionamentos. Estamos falando do Prêmio Viva Meu Mestre.
Trata-se de uma política de reconhecimento, conforme divulgado pelo MinC e
pelo IPHAN, bem como de valorização dos principais atores que compõem o
universo da capoeira. Os velhos mestres. Esta ação tem como objetivo:
O objetivo inicialmente era premiar 100 mestres de capoeira com uma quantia
em dinheiro, conforme destaca o mesmo edital:
15 mil reais vai resolver o problema dos capoeiristas? 15 mil e acabou! Isso
é resolução do quê? Muito pelo contrário, [...] é isso que vai resolver o
162
Estão envolvidas nesta ação palavras como reconhecimento, valorização, divulgação, transmissão
dos saberes e dedicação; todas elas ligadas ao trabalho desenvolvido há anos, muitas vezes sem
apoio algum aos nossos mestres de capoeira frente a suas comunidades, hoje reconhecidos como
verdadeiros patrimônios do país.
277
Além das questões relatadas, fica claro que não existia, por parte da gestora
que substituiu o então ministro Juca Ferreira, compreensão acerca da importância
dessa ação, assim também como a mesma disposição política para o assunto:
163
via presidência pra ministra, que a ministra pega e chama a gente: Ah! –
Vamos falar da capoeira. (MORENA SALAMA, Informação verbal, 2012)
Mas, ao que parece, o que é claro, para alguns, não o é para outros. Vale
registrar um fato intrigante e interessante, que ocorreu durante o desenvolvimento
desse edital. A primeira lista preliminar, com os contemplados do Prêmio Viva Meu
Mestre, que deveria ser um prêmio que contemplasse especificamente mestres e
mestras de capoeira, reconhecidos pela comunidade, apresentou nomes que não
faziam parte especificamente do universo dessa manifestação.
A lista, divulgada em 6 de abril de 2011, continha nomes de indivíduos que
não faziam parte do universo da capoeira164 e apresentava 152 pleiteantes, bem
como uma lista de 24 candidatos não habilitados. Dentre os habilitados, foram
selecionados quatro mestres de punga, na primeira lista divulgada.165
Após inúmeras discussões e posicionamentos da comunidade da capoeira,
em sites, blogs, ligações e nas redes sociais, cobrando esclarecimentos e um
posicionamento claro do IPHAN referente à problemática instaurada, a comissão de
seleção resolveu divulgar seu parecer sobre o caso.
163
Refere-se aqui a Ana de Holanda.
164
Ver no Anexo R a lista completa.
165
Izidório dos Santos – Seo Izidório – Cantanhede/MA; Lázaro Martins dos Santos – Mestre Lazinho
– Cantanhede/MA; Raimunda Nonata Pinto Nascimento – Dona Raimundinha de Mário –
Cantanhede/MA e Raimundo Lopes – Seo Chico Sarapião – Cantanhede/MA.
279
Outro fato que merece reflexão foi o óbito de três mestres de capoeira durante
o processo de execução do edital. Conforme divulgado no site da Fundação
Palmares, os mestres Artur Emídio, Peixinho e Bigodinho não chegaram a receber o
prêmio em vida.168
As inscrições para o prêmio Viva meu Mestre tiveram início em outubro de
2010, em seguida foram prorrogadas até 12 de dezembro, e o resultado final
somente foi divulgado em 25 de agosto de 2011, quase um ano depois. Esse fato é
166
Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br/baixaFcdAnexo.do?id=1791>.
167
Manifestação afro-brasileira praticada no Maranhão, que possui alguns aspectos semelhantes à
capoeira.
168
Esse acontecimento que envolve três personalidades que tanto contribuíram para o
desenvolvimento da capoeira, dentro e fora do Brasil, nos faz refletir sobre o quão demoradas foram
as iniciativas dessa natureza e como se fazem necessárias políticas culturais que, de fato, efetivem e
mantenham ações constantes para o desenvolvimento e a perpetuação da capoeira e de seus
cultores.
280
169
Mesmo com os encontros do Pró-Capoeira suspensos, naquele momento e sem previsão de
conclusão.
282
[...] alguns países que possuem um vasto e rico patrimônio imaterial, [...]
requisitaram à Unesco estudos no intuito de criar instrumentos jurídicos
para salvaguardar, sobretudo, as manifestações da cultura popular e
tradicional, incluindo-as também, como patrimônio da humanidade. (NETO;
171
FILHO, 2011, p. 5)
170
Continuando, o texto conclama a comunidade a fortalecer o pedido (assinatura de adesão) que, se
atendido, exigirá que o governo atente mais para essa manifestação, desenvolvendo políticas
culturais específicas.
171
A partir da descrição acima, estudos sobre o patrimônio imaterial começaram a pautar as
discussões de especialistas, assim como outras reflexões acadêmicas a respeito do assunto.
283
E felicidade
A gente não quer
Só dinheiro
A gente quer inteiro
172
E não pela metade [...].
Nossa pesquisa tem limitações, pois algumas questões discutidas aqui ainda
se encontram em trâmite, o que dificulta uma análise mais precisa e aprofundada.
De qualquer forma, não podíamos ficar somente observando esse momento, que foi
muito importante para o universo da cultura brasileira, principalmente da capoeira.
Preferimos arriscar e contribuir com o processo, assumindo o ônus dos possíveis
equívocos e contradições.
Para Mészáros (2002; 2007), o sistema de metabolismo social do capital
forma-se a partir de um núcleo central, oriundo de um tripé formado pelo próprio
capital, pelo trabalho assalariado e o Estado. O filósofo acredita que é impossível
romper com a lógica do capital rumo à verdadeira transformação, sem a extinção
deste tripé. Além disso, o sistema é essencialmente destrutivo, contudo, através do
seu metabolismo, sempre se expande, de forma mais incontrolável e destruidora.
Tomando emprestado este pensamento, observamos que as ações que
presenciamos, relacionadas às políticas culturais voltadas para a capoeira, não se
constituem em mudanças significativas na vida de sua comunidade, em razão da
impossibilidade de mudanças mais radicais, na atual sociedade em que vivemos.
Estas são proposta pelo Estado, alicerce fundamental de manutenção da lógica do
capital. Sendo assim, nenhuma política que brote desse contexto deverá alterar a
hegemonia mantida pela classe que está no poder.
As rédeas sempre serão reagrupadas, ao mínimo perigo de instabilidade da
estrutura e empoderamento dos trabalhadores. Os avanços serão cerceados e as
ações retroagirão na mesma velocidade que eclodiram, além disso, a burocracia
cuidará de dificultar o andamento, o desenvolvimento e a continuidade deste
movimento. Em uma das suas teses, Mészáros (2007) alerta que qualquer tentativa
de superar o sistema oriundo e restrito à esfera institucional e parlamentar está
destinada ao malogro.
Isso não significa que, nos últimos anos, as experiências não tivessem
alguma significância para o universo da capoeira. Nem tão pouco denota que as
172
Comida. Letra de Arnaldo Antunes.
285
Se o Sírio ensinou que nem toda ação deve ser salvaguardada, o Frevo
ensinou que a adesão foi maciça e tudo o mais. A capoeira foi um bem; um
antecedente importante! Foi o primeiro bem que teve que ser escrito em
dois livros diferentes. Por quê? Porque a capoeira tal como o Sírio também
não precisava de nenhum plano de salvaguarda. O que dizia pra gente,
desde a época do mestre Pastinha: a capoeira vai bem. Obrigado! Quem tá
mal é o mestre, não é? [...] Então, a gente tinha esse entendimento, que a
capoeira está bem, que a capoeira não necessita do IPHAN. Eles são muito
mais necessitados da capoeira do que a capoeira do IPHAN. (WALLACE
DE DEUS, Informação verbal, 2012)
173
Além de ter problemas para ser atendida e socorrida, pois o médico plantonista do hospital
Salgado Filho se ausentou do plantão de Natal, para o qual estava escalado, conforme anunciado
pelas redes de televisão, sites e programas de rádio, após sua morte o corpo da garota demorou a
ser liberado porque a ela não tinha certidão de nascimento.
174
Para maiores informações. Disponível em: <http://tvuol.uol.com.br/assistir.htm?video=vitima-de-
bala-perdida-menina-adrielly-e-enterrada-no-rj-04020C183668D0914326>;
<http://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/ 2013/01/ morre-menina-baleada-na-noite-de-natal-no-
rio.html>; <http://www.diariodepernambuco.com.br /app/noticia/brasil/2013/01/08/ interna_
brasil,416719/medico-isenta-colega-que-nao-atendeu-menina-baleada-no-rio.shtml>; <http://noticias
.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2012/12/25/familiares-tenta-invadir-hospital-que-atendeu-
menina-baleada-no-rio.htm>.
288
O fato diferente, nesta narrativa, é que a bala que alvejou o jovem capoeira,
comprovadamente, conforme indicou a perícia, foi disparada por um policial.175
O que dizer de uma sociedade, quando nos deparamos com casos como
estes? Como esperar que esta reconheça seus produtores culturais e possibilite que
mudem suas realidades? Muitos se situam na mesma classe que a falecida menina
se encontrava, muitos mestres de capoeira sofrem as mesmas necessidades: sem
acesso à educação formal, sem acesso à assistência de saúde, completamente
marginalizados. Estes mestres encontraram na capoeira uma tábua de salvação,
uma possibilidade de sobrevivência, de sobrevida social.
De nada adiantarão as políticas culturais voltadas para a capoeira, sem
alicerces que as sustentem e proporcionem condições para serem produzidas e
desenvolvidas, em suas bases. Estamos falando aqui, não somente de condições
igualitárias, mas condições de justiça social. Acesso à educação, transporte de
qualidade, assistência à saúde, trabalho, enfim condições dignas de viver em
sociedade. Isso para falarmos das questões mais gerais, que se encontram na base.
Para falamos de questões mais específicas, utilizamos as reflexões da filósofa
Marilena Chauí, expressas em um livro escrito a partir de suas experiências,
enquanto gestora da área cultural, à frente da Secretaria Municipal de Cultura
(SMC), de uma das maiores cidade da América Latina – São Paulo.
O livro em questão é a obra intitulada Cidadania Cultural: o direito a cultura.
Nele, Chauí, intelectual crítica atuante, reflete sobre as boas experiências através de
iniciativas e projetos, bem como as expectativas de implementar uma política cultural
diferenciada, na primeira gestão de um partido de esquerda no referido município.
Vamos nos ater, todavia, nas dificuldades, que não foram poucas, e nos
entraves que a gestora encontrou e relatou, para conjecturarmos o quão é difícil
quebrar paradigmas de uma estrutura viciada. O livro em questão poderia ser
chamado também de Missão impossível. Os primeiros passos, conforme relata a
autora, foram:
175
Para maiores informações. Disponível em: <http://noticias.terra.com.br/brasil/policia/ba-garoto-
morto-durante-acao-policial-e-enterrado-em-
salvador,52684fc7b94fa310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html>; <http://atarde.uol.
com.br/noticias/5654368>; <http://www.correio24horas.com.br/noticias/detalhes/detalhes-
2/artigo/tristeza-e-comocao-marcaram-o-enterro-do-menino-morto-por-bala-perdida-em-nordeste-de-
amaralina/>; <http://www.r2cpress.com.br/v1/2010/11/30/caso-joel-pms-envolvidos-em-tiroteio-
nao-comparecem-a-delegacia/>; http://www.bahianoticias.com.br/principal/noticia/81370-caso-joel-
wagner-comenta-acao-de-policiais.html.
289
O Ministério de Juca foi e tem sido o sopro tropicalista com que sempre
sonhamos na cultura brasileira: a inclusão de todas as partes, a expressão
de todas as artes, a fibra ótica ecoando o toque do tambor.
Tudo isso precisa continuar. Não podemos correr o risco de repassar todas
essas conquistas a mãos de pouco talento, a alguma gestão que reduza o
tamanho que o Ministério alcançou.
177
Benedicta Finazza, vidente que ficou famosa ao frequentar programas de televisão realizando
previsões futurísticas.
291
Por tudo e por muito mais, nossa música não cala e a nossa poesia fala.
Está nas rodas de samba, nos acordes da sinfônica, nos passos da
bailarina, na ginga da capoeira:
– Fica, ministro Juca Ferreira! (FICA JUCA, 2010)
Nada adiantou, pois sabemos como isso terminou. A pasta da cultura estava
entre as cotas para as mulheres que assumiriam os ministérios da recém-
empossada presidenta. Até o comediante, escritor e apresentador Jô Soares tentou
apoiar a recente empossada ministra, convidando-a a participar do seu programa –
Jo Soares Onze e Meia – como uma forma de ampliar o seu apoio, esclarecer
algumas polêmicas e fortalecer suas bases políticas, sem muito sucesso.
Um mínimo movimento em falso e os críticos às mudanças no MinC tentavam
desestabilizar a sua gestão. Às vezes nem precisava fazer muito esforço. Mas
Hollanda demonstrou grande resistência às pressões, que não foram poucas, vale
ressaltar, porém, que não é de toda a responsabilidade da sua gestão, esses
percalços, apesar de vivenciarmos poucas pautas ou quase nenhuma, voltadas para
a capoeira, principalmente no que diz respeito à continuidade das ações.
Não basta iniciar ações, é imprescindível, além da sua manutenção, a sua
melhoria. Essa é uma questão básica de qualquer política pública. Há de haver
manutenção, acompanhamento e principalmente educar para isso. Os
contemplados, já chamavam a atenção para isso nas entrevistas.
[...] Tem que ser uma política de Estado, não de governo, ou seja, muda o
governo, muda a política. Então, vai acabar [...] tem que ser uma
construção, uma política do Estado. Quem entrar tem que ter uma linha de
financiamento pra essa construção, então, eu acho que é isso que tem que
292
[...] Primeiro que terminou muito pela coisa, também, do capoeirista achar
que ele estava em outra fase, o que acreditar nessa fase, em vez de
mascarar também num processo que dá o ponto de associado aquela ação
desses pontos de cultura de capoeira que era o programa de capoeira viva
como patrimônio cultural da cultura brasileira, não é? [...] Então, quando a
gente esperava que a capoeira fosse virar, digamos, ultrapassar um limite
de uma cultura de governo pra uma cultura de Estado, ela atraiu uma raiva
sobre ela, em outro setor, de setores artísticos, não é? (FREDE ABREU,
Informação verbal, 2011)
178
Refiro-me aqui aos grupos de remanescentes quilombolas, ciganos, LGBT etc.
293
A primeira gestão cultural do governo Lula, assim como a que se seguiu, mas
principalmente a primeira, responsável pelo início das mudanças de planejamento
das ações marcou o imaginário social da comunidade da capoeira, imprimindo uma
marca que dificilmente será superada, pensamos nós.
Olha, o Gilberto Gil pra mim tá de parabéns! Foi um cara que [...], não teve
um ministro da cultura que olhasse mais pela cultura popular do que ele. Ele
abriu alguns precedentes, por exemplo – o ponto de cultura. [...] eu fiquei
maravilhado, cara, em ver a cultura popular organizada. A gente sentando
para debater políticas públicas pra capoeira, pro candomblé, sabe? [...] Me
arrepio quando falo, cara, eu digo: “Agora sim a coisa vai andar”, entende?
[...] Então eu penso que essa gestão, esse governo do presidente Lula pra
capoeira, entendeu? Teve realmente coisas concretas, entendeu, cara? E
penso que o Brasil daqui pra frente vai ser muito diferente, cara? (MESTRE
PINÓQUIO, Informação verbal, 2012)
[...] fui a várias reuniões lá, pra resolver esse negócio. Eu disse: – Isso não
é um prêmio, é um castigo! Porque, por exemplo, eu sou um profissional
liberal, aí, eu deixo de trabalhar para ir a reunião, aí, não tem reunião, ou
então tem reunião e não resolve nada, eu deixei de ganhar naquele dia, por
quê? E eles não tão nem aí pra isso, marcava reunião e a gente chegava lá
e não resolvia [...]. (MESTRE ITAPOAN, Informação verbal, 2012)
179
Não há dúvidas que o governo de Lula promoveu uma maior intervenção do Estado, também no
campo da cultura, mas isso não significou nem estatização, nem constituição de um novo bloco
histórico, que poderia inverter a hegemonia de classes atual.
180
Esta, desde seu surgimento, sempre foi diversificada e acolhedora, contudo, a maioria
esmagadora de seus integrantes são majoritariamente prepostos da classe trabalhadora, ou seja, a
classe mais sofrida e menos abastada da sociedade, composta em sua grande maioria de excluídos.
295
realmente possibilitem a ela usufruir de uma vida digna. Essa iniciativa precisa se
transfigurar em autonomia para os mestres, evitando que careçam de terceiros para
realizar seus projetos.
Tanto a Academia de Mestres como o Viva meu Mestre auxiliaram
momentaneamente nossos velhos mestres, contudo, estes, em sua grande maioria,
continuam com as mesmas necessidades anteriores. Ou seja, essas ações não
significaram necessariamente verdadeiras mudanças em suas vidas. É fato! Nossos
mestres continuam morrendo desamparados.181
Defendemos, mais uma vez, um Conselho de Mestres permanente, nos
moldes dos conselhos de cultura, onde os seus membros tenham uma alternância
constante e representatividade ampliada, por todo o território nacional,
estabelecendo formas de desenvolvimento e continuidade das ações, para auxiliar
as políticas culturais voltadas para a capoeira.
As produções originárias dessas políticas precisam ser amplamente
democratizadas e distribuídas para as instituições de ensino público, assim também
como em espaços culturais. Que sirvam de material didático e de formação para as
novas gerações. Ambos os editais do PCV desencadearam produções interessantes
sobre a capoeira, que, por vários motivos, acabaram sendo pouco divulgadas. Nem
a própria comunidade da capoeira obteve acesso a esses materiais.
Arriscaria dizer que, mesmo não participando, em nenhum momento, das
ações diretas do primeiro e segundo editais do PCV, registro o maior acervo de
produções feitas a partir dessa experiência. Se não somos aquele que mais possui,
somos, com certeza, um dos que possui. Possivelmente, o MinC, a FCP, o Museu
da República e a FGM detêm uma quantidade de material que, com a pesquisa,
conseguimos ter acesso. Isso é fruto da ausência de uma política de democratização
e de gestão das produções realizadas pelos selecionados nos respectivos editais.
Em relação à patrimonialização, reforçamos que o seu reconhecimento como
patrimônio imaterial corre o sério risco de se tornar um fetiche. Um dos nossos
entrevistados revela sua análise, desse momento, onde tudo vira patrimônio. “Agora
tudo é patrimônio material, começou a ter uma preocupação com relação a essa
coisa muito compulsiva, de registrar bens imateriais, mas que eu acho que deu
conta de uma lacuna histórica [...]” (WALLACE DE DEUS, informação verbal, 2012).
181
O Estado continua a virar as costas para os guardiões da nossa cultura, iludindo-os com falsas
aparências, quando na verdade os escraviza ou os faz de cooptados.
296
[...] então, o que foi que o Ministério da Cultura verificou? Que uma vez que
a capoeira não está nos livros de registros, fica difícil o próprio ministério
argumentar seu valor! O seu valor cultural, seu valor histórico, seu valor,
não é? Isso pra se transformar em benefícios e políticas, isso era o que
presidia. (AMÉLIA CONRADO, Informação verbal, 2012)
Em certa medida, ele tem razão. Não presenciamos ainda, nesta área, iniciativas
que, de fato, possam ser consideradas enquanto políticas de Estado.
Por parte do Estado, a gente vê que ainda é uma questão de governo, não
é de Estado, então nós estamos vendo que o governo passado se
empenhou com todos os percalços, mas estava acontecendo, era uma
coisa de ir acertando, porque agora é que estava se fazendo, quer dizer: a
esperança da capoeira ser um patrimônio cultural da humanidade, que a
base era o plano de salvaguarda, hoje ninguém fala mais. E a verba pública
que foi gasta com aqueles que participaram? [...] é um prejuízo ao
patrimônio público. (MESTRE ZULU, Informação verbal, 2012)
182
Grifos nossos. O texto atual foi modificado: “§ 3º É facultado aos tradicionais mestres de capoeira,
reconhecidos pública e formalmente pelo seu trabalho, atuar como instrutores desta arte-esporte nas
instituições de ensino públicas e privadas”. (BRASIL, 2006)
299
183
O trato com o trabalho nos exemplos dados não é a forma que defendemos, mas já se constitui,
no contexto atual, com determinado avanço.
300
[...] só que essas duas coisas [...] a gente só foi saber no processo final do
dossiê. Do ponto de vista político era inexequível! Impossível! O máximo
que o IPHAN poderia, era recomendar. Mesmo assim, com certa restrição,
por quê? Porque o plano de previdência tinha a ver com o Ministério da
Previdência, e o passaporte da capoeira tinha a ver com o Instituto Rio
Branco. Então, os próprios diplomatas, até onde a gente soube, ficaram
muito irritados, com essa coisa de serem comparados com mestre da
capoeira. Houve uma reação forte. (WALLACE DE DEUS, Informação
verbal, 2011)
184
Não devemos esperar mais do que isso dessa instituição.
302
185
Estes não são, via de regra, produzidos nas fábricas, em grande escala, pois, se assim fosse, a
situação estivesse pior.
303
Capoeira é Patrimônio!
Isso eu já Sabia
Foi o meu prezado Mestre
Que em 80 já dizia
Eu vou te ensinar
Coisa de grande valor
Velhos mestres me ensinaram
Antepassado quem criou
Mas, me diga o que adianta
O Brasil reconhecer
Mas de fato o que é que muda?
O que de bom aconteceu?
A capoeira vai bem
Lá fora se instalou
Mas os meus queridos mestres
Pra eles nada mudou
Continuam abandonados
De fato nada mudou
Ainda desamparados
Para eles nada mudou.1
1
Capoeira é Patrimônio, música de Mestre Soldado.
304
ser menosprezado
A cultura no país sempre foi diversificada e, ultimamente, geneticistas
defendem que esta variedade já nos acompanha há milhares de anos. No nosso
caso, podemos pontuar que as três principais matrizes fundadoras da nossa
sociedade contribuíram com a língua, a culinária, as lendas, a mitologia, as
vestimentas, as artes, a arquitetura, as danças, a música, a religião, a culinária e a
cinestesia.
Todos contribuíram em aspectos semelhantes, também em um emaranhado
complexo de conviver e perpetuar suas memórias. Todavia, em uma sociedade de
classes existem embates na área cultural, que também se constitui em um território
de disputas. Dessa forma, algumas culturas vão aparecer, influenciar, permanecer e
se oficializar, mais que outras.
As discussões que já vínhamos acompanhando, há tempos, e que
antecederam o reconhecimento da capoeira como patrimônio, o desenvolvimento do
processo e as sucessivas tentativas de estabelecer continuidade nas políticas
culturais e sistematizar suas ações de salvaguarda ratificaram, na prática, os
internexos de sua complexidade.
Os discursos acerca da cultura, na política atual, por exemplo, acabam se
constituindo de consensos de grupos majoritários, capazes de nortear essas ações,
sufocando os anseios de coletivos desorganizados, com outras formas de
organização e/ou minoritários. Não nos enganemos: a formulação de uma política
cultural se aparelha, organiza e se desenvolve a partir de um ciclo de negociações
entre os atores políticos que interagem em arenas formais, não formais e informais.
As políticas culturais como políticas públicas surgem em um processo de
decisão e vontade, bem como podem partir também de demandas históricas e/ou
reprimidas, provenientes de diversas camadas sociais, principalmente das que estão
com maior representatividade no poder. Percebemos, no que diz respeito ao
acompanhamento das ações e iniciativas no campo cultural, que essa premissa ficou
realmente a desejar. Esse é um fator que precisa ser rapidamente incluído nas
planilhas de qualquer política que ouse ser efetivada e anseie por sucesso, bem
como eficácia.
Não há dúvida que houve um trato diferenciado dessa gestão governamental
para com a capoeira, frente às gestões anteriores. Realmente, o governo Lula
inaugurou uma nova postura, uma nova política cultural no país. De fato, as ações
306
das políticas culturais voltadas para a capoeira estabelecem essa nova fase. É
importante também destacar que as ações de políticas culturais, implantadas na
primeira gestão do PT na presidência, tentaram estabelecer nexos com outras
políticas, como as educacionais, por exemplo.
A questão é que as ações não passaram de boas intenções, pois percebemos
que a cultura continua sendo vascularizada a partir de preocupações políticas e
econômicas, que continuam a infestar a base de quem domina o poder. De fato, a
proposta inicial perdeu-se e constatamos as mesmas velhas problemáticas:
descontinuidade, burocratização, acessibilidade, democratização e,
acrescentaríamos aqui, uma boa dose de vontade política.
Como consequência dessas ações, a cultura da capoeira se organiza de
forma diversa e já se articula a partir de outra premissa, desenvolvendo suas
atividades dignamente. Mas ainda podemos perceber resquícios do trato com essa
cultura, de governos passados, onde o clientelismo, a terceirização e o monopólio
beneficiaram alguns poucos grupos. Esses, que antes monopolizavam as migalhas
que lhes sobravam para suas ações pontuais, agora criticam, de forma infundada e
desarticulada, as ações do contexto vigente.
Organizada agora nos moldes da sociedade atual, mestres que antes viviam
na informalidade, não conseguiam acessar nenhum tipo de apoio e eram
discriminados pela sua posição sociopolítica, econômica e educacional, atualmente
desenvolvem seus trabalhos com certo apoio do Estado e/ou podem concorrer e ser
contemplados em editais, mesmo que com certas dependências.
Percebemos, como consequência positiva desse novo contexto, que a
participação política das comunidades da capoeira se qualifica, uma vez que os
coletivos passam a conhecer e participar mais de seminários, palestras, cursos,
editais e diversas ações implementadas pela gestão do MinC. Talvez isso venha a
ficar mais claro, após alguns anos, quando as consequências deste processo
educacional serão melhor visualizadas.
Por se tratar de um fato novo, nunca antes acessível à população, essas
ações incorrem em determinadas falhas e pendências que vão surgindo
ocasionalmente em sua implantação. Isto acaba prejudicando o andamento do
processo e precisa ser revisto, o quanto antes. Possivelmente, a política teve que
aproveitar as condições que se apresentaram no momento, o que fez com que as
disposições e os planejamentos não saíssem alinhados à realidade concreta.
307
desse governo, mas somente isto não constitui reparação a anos de negligência, de
intolerância, de incompreensão, de distorções, de invisibilidade, de exploração e
discriminações. Cabe aqui a garantia de manutenção, coisa que ainda não foi
alcançada. A história das políticas que se relacionam com a capoeira se formulam a
partir dessa premissa: avanços, paradas e retrocessos. Não necessariamente nesta
ordem, bem como não especificamente sectarizadas.
As comunidades da capoeira já sentiram, na pele, o gosto de serem acolhidas
e, depois, desamparadas, uma série de vezes. Mais recentemente, a falta de
continuidade do PCV impactou tanto os trabalhos que vinham sendo desenvolvidos,
como os que almejavam e almejam apoio. A possibilidade de, mais uma vez, se ver
abandonado pelo Estado já faz a capoeiragem desacreditar na seriedade das
políticas. Algo que, para alguns, não é novidade.
Ao mesmo tempo, temos possibilidades de garantias legais, que podem ser
articuladas e fundamentadas, mas que, na realidade, também não asseguram, de
fato, a permanência dos trabalhos que já estão sendo desenvolvidos e a esperança
de novas oportunidades. É preciso que a legislação traga, na sua formatação, um
modo de exigir dos futuros governantes a continuidade das ações, de maneira clara
e objetiva, o que se faz imperativo, na atualidade.
Acreditamos que, além de construir políticas culturais, faz-se imprescindível
articular políticas públicas. Nota-se que ainda estamos engatinhando nesse sentido.
As propostas do MinC devem estar envolvidas, dialética e dialogicamente, com
outros gestores e ministérios do Governo, a exemplo de Educação, Saúde e
Trabalho, e demais instituições, como secretarias estaduais e municipais. Será
somente com essa integralidade de fato, que estaremos contribuindo na formação
do ser humano, o que, no nosso entendimento, deveria ocorrer em toda ação
cultural dessa natureza.
É de extrema importância ressaltar que o reconhecimento da capoeira como
patrimônio cultural do Estado brasileiro fortalece a desvinculação do docente da
capoeira da obrigatoriedade de uma formação superior em Educação Física, fato
que insistentemente o sistema CONFEF/CREF tenta implementar, teima e insiste no
erro. Cabe, agora, a atualização dos setores jurídicos e trabalhistas, tendo em vista
apoiar os capoeiras que, desavisada ou coercitivamente, tiveram seus direitos
constitucionais, históricos e sociais, aviltados, sendo obrigados a se filiar e se manter
atrelados a essa instituição, para não ampliar os dados de desemprego no país.
309
Assim como a roda de capoeira, que mantém uma circularidade, tudo leva a
crer que as ações de salvaguarda rodaram e voltaram para o início das discussões –
regulamentação da profissão. Podemos até nos enganar, mas as discussões sempre
se remetem ao mundo do trabalho e não é por acaso, como chamamos a atenção
desde nossa dissertação.
Os últimos acontecimentos nos levam a crer que as políticas culturais
voltadas para a capoeira estão sendo pensadas sob a ótica do trabalho assalariado.
Estas devem se reverter primeiramente para a educação, com base em critérios
culturais, pois o que está em jogo finalmente é a manutenção do Oficio do Mestre de
capoeira, junto com todas as suas tradições culturais de formação.
Almejamos com esperança que as ações que deveriam valorizar, estimular,
democratizar, proteger e cuidar da capoeira, enquanto bem do patrimônio imaterial
do país, não se resumam a interesses menores e localizados, bem como a disputas
com fins privados, mesquinhos e corporativistas, seguidas de promessas surreais.
Percebemos que as ações implementadas pelo MinC, a partir do comando do
ex-ministro Gilberto Gil, assim como seus sucessores, contribuíram para a maior
acessibilidade, democratização, educação, o amplo incentivo à produção e o
aumento de investimentos. Mas notamos, também, posteriormente, certa paralisia,
amnésia, anemia, afasia, dentre outros traços que nos fazem questionar “se o pulso,
ainda pulsa”.2 Enfim, o MinC, a Fundação Palmares e o IPHAN não são mais como
eram antes.
Pedagogicamente falando, vale ressaltar as diversas formações ministradas
por especialistas, as diversas palestras de pesquisadores, estudiosos, mestres,
técnicos e professores, nos diversos encontros promovidos durantes as ações, que
formaram um grande fórum educacional para as comunidades da capoeira, o que, a
nosso ver, deveria ser constante.
Todo o processo também gerou a vontade de se atualizar, de conhecer e
participar ativamente, estimulando, inclusive, a retomada aos estudos, por parte de
alguns. Proporcionou, ainda, experiência para novas empreitadas e desafios, com
participações em outros fóruns, reuniões, conferências e editais relacionados à
cultura. Mesmo com os problemas apontados neste trabalho, pertinentes a este
momento histórico, quem passou pela experiência não saiu o mesmo, nem a
2
Pensamento que remete à música O pulso ainda pulsa, de autoria de Arnaldo Antunes.
311
mesma.
Mas isso não significou, junto a outras ações do governo, a diminuição da
desigualdade real, nem da acessibilidade, muito menos a democratização real e
concreta. As ações do PCV, com a Academia de Mestres, bem como as iniciativas
do Viva Meu Mestre não resolveram, de fato, o problema dos velhos mestres. Estes
continuam sofrendo as amarguras de uma sociedade desigual e morrendo, após
anos de serviços prestados à sociedade, através da cultura e da educação, muitas
vezes sem assistência estatal, privada ou algo semelhante; muitos em condições de
miséria.
Vimos também que existem cobranças e exigências para que uma
comunidade que nunca antes obteve acesso a determinadas políticas seguisse
exemplarmente, sem falhas, as orientações referente aos programas. Contudo,
percebemos vários problemas de gestão destas políticas também em sua execução.
O que foi e ainda é cobrado aos capoeiras, como a incapacidade de gerir verbas e
de prestar contas, também está presente na gestão de governos brasileiros, de
qualquer partido, em qualquer época.
As comunidades ainda precisam se organizar melhor, mas de forma
democrática, plural e livre. Unindo forças e fazendo valer suas reivindicações, para
que a capoeira e consequentemente seus cultores tenham de fato o seu verdadeiro
respeito e reconhecimento frente à sociedade. Se estas foram as ações e decisões
mais acertadas, que configuraram o contexto atual das políticas culturais voltadas
para a capoeira, somente os futuros pesquisadores e as comunidades da capoeira
irão apontar com maior clareza.
312
REFERÊNCIAS
ABIB; Pedro J. Cultura Popular e o Jogo dos Saberes na Roda. 2004. 170 f. Tese
(Doutorado em Ciências Sociais aplicadas à Educação) – Faculdade de Educação,
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ANEXOS
Ministério da Cultura
Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional
Departamento do Patrimônio Imaterial
Coordenação Geral de Salvaguarda
FASE I - 2009
Identificação
Nome da Unidade: Departamento do Patrimônio Imaterial
Programa: Brasil Patrimônio Cultural
Ação: Fortalecimento a Projetos de Capacitação e de Fortalecimento Institucional na Área do Patrimônio Histórico Urbano –
2C650000
Projeto: Formulação e implantação do Programa Nacional de Salvaguarda e Incentivo à Capoeira – Pró-Capoeira – Fase I
2. Contextualização
A capoeira é uma das manifestações culturais mais importantes do Brasil. No governo atual essa importância tem sido reconhecida
por meio de várias iniciativas de fomento do Ministério da Cultura, entre as quais se destacam a articulação para a viabilização dos
editais do Prêmio Capoeira Viva e a implantação de 112 pontos de cultura também voltados para o incentivo, transmissão e
desenvolvimento da capoeira enquanto manifestação artística e cultural. Por meio do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural do
IPHAN, em 15 de julho de 2008, seu valor histórico, memorial e cultural foi publicamente reconhecido com o registro do Ofício de
Mestre de Capoeira e da Roda de Capoeira como Patrimônio Cultural do Brasil.
Atualmente a capoeira é praticada em todo o Brasil e em, pelo menos, 150 outros países. Constitui, assim, um fenômeno mundial que
tem contribuído enormemente para divulgar a cultura brasileira nos quatro cantos do mundo. Além disso, no Brasil e nos outros
países onde é praticada, a capoeira tem sido utilizada como uma importante ferramenta para o desenvolvimento pessoal e social,
bem como tem sido valiosa como instrumento pedagógico e de afirmação de identidades. É fundamental, portanto, que, no país que é
o berço dessa manifestação cultural, o Estado organize, com o apoio e a participação dos seus praticantes e da sociedade em geral,
uma política pública que salvaguarde e amplie os benefícios dessa arte para a nossa população.
Uma política dessa envergadura demanda, certamente, a formulação de um programa específico de apoio e fomento e a atenção das
várias áreas de governo que podem contribuir para o fortalecimento e para o desenvolvimento pleno do potencial da capoeira como
cultura, como patrimônio, como arte e como atividade física e pedagógica. Um programa que também encaminhe soluções, no âmbito
nacional, para os problemas que a capoeira enfrenta para ter continuidade como tradição e saber popular, soluções que passam,
entre outras medidas, pelo reconhecimento da importância e pela valorização dos detentores desse saber que, ainda hoje, alimenta a
capoeira em suas várias expressões. Um programa, em suma, que inclua a salvaguarda dos aspectos patrimoniais da capoeira e
incentive sua prática em todo o país.
Em atenção à importância histórica, memorial e cultural da capoeira, o Programa Nacional de Salvaguarda e Incentivo à Capoeira
– Pró-Capoeira será coordenado pelo Ministério da Cultura. Deverá, contudo, contar também com o apoio e a participação dos
Ministérios da Educação, dos Esportes e das Relações Exteriores, além de ter a atenção das pastas do Trabalho e da Previdência em
razão da sua interface com as questões profissionais que a prática da capoeira suscita. O objetivo geral do Pró-Capoeira é, assim,
promover a salvaguarda dos elementos dessa forma de expressão que sustentam o seu valor como referência histórica, memorial e
cultural e incentivar sua apropriação como manifestação artística, como atividade física, como instrumento pedagógico e de
construção de cidadania, ampliando sua prática no território nacional e facilitando o intercâmbio com outros países que admiram e
praticam essa arte. São ainda objetivos específicos do programa:
Apoiar e fomentar a difusão da produção intelectual, acadêmica, cultural e audiovisual sobre a capoeira no Brasil e no mundo;
Cadastrar docentes, praticantes, grupos, entidades e instituições públicas e privadas dedicadas à prática, ao estudo e ao ensino da
capoeira no Brasil;
Fomentar a criação de mecanismos de participação e de consulta às instituições e aos representantes de grupos e indivíduos
praticantes de capoeira no Brasil, com vistas a organizar a regulamentação do exercício de atividades de ensino e de formação;
Estabelecer critérios para o reconhecimento do notório saber dos mestres de capoeira formados na tradição.
Apoiar a transmissão dos conhecimentos tradicionais ligados à prática da capoeira;
Incentivar a prática da capoeira como recurso cultural, lúdico, pedagógico e como atividade física na rede pública e particular, em
todos os níveis de ensino.
Promover o intercâmbio entre praticantes e estudiosos da capoeira do Brasil e de outros países;
Promover e difundir a capoeira no Brasil e no mundo com respeito à diversidade cultural presente em suas diferentes manifestações
rituais, técnicas e estilísticas.
343
Com a finalidade de coordenar as atividades necessárias à formulação e implementação do Pró-Capoeira, o Ministro da Cultura criou,
por meio da Portaria n° 48, de 22 de julho de 2009,1 Grupo de Trabalho, composto por representantes do IPHAN, da Fundação
Cultural Palmares, da Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural e da Secretaria de Políticas Culturais do MinC. O Grupo de
Trabalho Pró-Capoeira (GTPC) é coordenado pelo IPHAN e, no desempenho de sua missão, deve realizar as seguintes atividades :
Além das tarefas demandadas pela Portaria n° 48/2009, é importante também aproveitar a mobilização do campo que será
promovida nos encontros regionais para a articulação de apoios para as candidaturas da Roda e do Ofício de Mestre de Capoeira às
Listas da Convenção da Unesco para a Salvaguarda do Patrimônio Cultural Imaterial. Nesses encontros também se poderá realizar a
complementação da pesquisa e da documentação audiovisual produzida durante a instrução do processo de Registro desses bens,
pois naquela oportunidade, por razões de recorte histórico, foram documentados apenas mestres e rodas de capoeira da Bahia, do Rio
de Janeiro e de Pernambuco. Nos encontros regionais previstos, se poderá então expandir essa documentação para outros estados da
federação - razão pela qual se propõe a incorporação desta tarefa às demais que foram imputadas ao GTPC.
Diante da magnitude das tarefas acima mencionadas e com vistas a prestar o apoio técnico e logístico especializado que é necessário à
sua consecução, propõe-se a seleção, por meio de concurso de projetos, de Organização da Sociedade Civil de Interesse Público –
OSCIP atuante na área de cultura. Em conformidade com sua natureza legal, essa organização deverá dar suporte ao GTPC na
formulação e implantação dessa importante política de valorização, salvaguarda e incentivo.
3. Objeto
Estabelecimento de Termo de Parceria com Organização da Sociedade Civil de Interesse Público a partir de Concurso de Projetos, a
ser realizado mediante Edital, para a execução de Programa de Trabalho, 2 contendo as atividades da Fase I do projeto de formulação
e implementação do Programa Nacional de Salvaguarda e Incentivo da Capoeira – Pró-Capoeira.
4. Objetivos da Fase I
Mobilizar e definir critérios de representação dos agentes governamentais, não-governamentais e da sociedade em geral, que
compõem o campo da capoeira no Brasil, com vistas à discussão da proposta preliminar de escopo do Pró-Capoeira e à elaboração,
de modo participativo, do escopo definitivo, das linhas de ação, das prioridades e da estratégia de implementação desse programa.
Iniciar a implementação de sistema informatizado para o cadastro nacional dos docentes, praticantes, grupos, pesquisadores,
entidades e instituições ligadas ao ensino e à pesquisa da capoeira.
5. Meta
Elaborar e definir a estratégia de implementação de política pública voltada para a salvaguarda dos elementos que definem a
capoeira como patrimônio cultural e para o incentivo ao seu estudo, documentação e à sua prática como expressão artística,
atividade física, instrumento de socialização e aprendizagem e ferramenta para o desenvolvimento pessoal e social no Brasil e no
mundo.
6. Justificativa
A formulação e a discussão pública do escopo definitivo do Pró-Capoeira, bem como a definição e a implementação de suas ações de
curto, médio e longo prazo, deverão contar com a participação dos praticantes, estudiosos dessa forma de expressão e das
instituições governamentais e não-governamentais que atuam no campo. A mobilização e a identificação desses agentes demanda:
- a contratação de consultores especializados que possam apoiar o GTPC na elaboração da proposta preliminar do Pró-
Capoeira, bem como na proposição dos critérios para definição das formas e/ou mecanismos de representação dos diversos
segmentos do campo, com vistas ao planejamento e à organização das atividades necessárias à elaboração participativa da versão
final e consolidada do programa;
- a contratação de profissionais da área de ciências sociais para análise e sistematização dos dados existentes sobre
docentes, praticantes, grupos, pesquisadores, entidades e instituições ligadas ao ensino e à pesquisa da capoeira, para a análise e
sistematização das informações geradas nos encontros regionais e para a formulação do conteúdo do Cadastro Nacional da Capoeira;
- a contratação de profissionais da área de tecnologia da informação para elaboração do sistema informatizado do
Cadastro Nacional da Capoeira.
Além dessas atividades, a formulação e a implantação do Pró-Capoeira demandam o planejamento, a organização, a divulgação e a
realização de encontros regionais para discussão da proposta preliminar do programa, assim como para a identificação e mobilização
de parcerias, com vistas à organização e realização. do Encontro Nacional que lançará oficialmente o programa em 2010 (atividade
que faz parte da Fase II do projeto).
Considerando a deficiência de recursos humanos do IPHAN, notadamente na área de salvaguarda do patrimônio cultural imaterial e
no que toca a profissionais especializados nos campos da capoeira e da tecnologia da informação, torna-se imprescindível contar com
o apoio de serviços técnicos especializados.
1
Publicada no DOU n° 142, de 28 de julho de 2009.
2
Conforme determina a legislação que cria e regulamenta a formalização de Termos de Parcerias
com OSCIP’s.
344
Discussão e formulação de modo participativo e representativo do campo da capoeira do escopo geral, das linhas de ação e das
prioridades do Programa Nacional de Salvaguarda e Incentivo à Capoeira – Pró-Capoeira.
Mobilização de agentes governamentais e da sociedade para captação de parcerias e apoio à implementação do Pró-Capoeira.
- apresentação dos objetivos do Encontro Regional (organização e mobilização do campo para discussão do Pró-Capoeira e
estabelecimento de parcerias);
- apresentação das linhas gerais e das diretrizes do Programa Nacional de Salvaguarda e Incentivo à Capoeira – Pró-Capoeira,
conforme proposta preliminar do Grupo de trabalho criado pelo MinC;
- discussão de ações emergenciais, de curto, médio e longo prazo;
- apresentação e discussão de proposta de implantação de mecanismos de gestão e de participação na implementação do programa:
montagem de Conselho Gestor do Pró-Capoeira e de Fóruns Regionais ou Estaduais;
- proposição de mecanismos de financiamento e incentivo;
- discussão e estabelecimento de cronograma de implementação.
O serviço de concepção do material para divulgação dos encontros regionais deverá ser submetido ao GTPC para aprovação, assim
como a proposta de distribuição.
A coordenação da elaboração dos produtos e da realização dos serviços discriminados no item 8.1 será realizada pelo Departamento
do Patrimônio Imaterial do Iphan, mediante delegação do presidente desta instituição na qualidade de coordenador do Grupo de
Trabalho criado pela Portaria MinC n° 48/2009 e sob a supervisão e acompanhamento do grupo.
Para apoiar o referido grupo de trabalho nas tarefas de definição dos critérios para a organização dos Encontros Regionais previstos
nessa fase, a OSCIP vencedora do certame deverá mobilizar 10 (dez) consultores entre especialistas de reconhecida atuação no
campo da capoeira, considerando, como subsídio, o guia de fontes do dossiê de registro da Roda e do Ofício dos Mestres de Capoeira.
Além desses requisitos, os consultores devem ser identificados e mobilizados conforme a seguinte distribuição:
O material de divulgação dos encontros deverá ser produzido de acordo com as especificações e tiragem constantes do Anexo B
deste Termo de Referência.
A OSCIP vencedora do certame deverá comprovar experiência na área cultural e capacidade de atuar com isenção, neutralidade e
impessoalidade no campo da capoeira. Além desses requisitos, apresentar projeto de execução e cronograma de trabalho
contemplando todas as atividades necessárias à realização dos produtos e serviços discriminados para esta fase. Deverá ainda
mobilizar equipes técnicas com experiência comprovada e compatível com os produtos a serem apresentados, em conformidade com
o Edital e seus anexos.
Os currículos dos consultores e coordenadores de equipes deverão ser encaminhados juntamente com as propostas técnica e
financeira para a execução dos serviços e produtos listados.
Os demais profissionais que irão compor as equipes de trabalho poderão ser apresentados após a celebração do Termo de Parceria,
porém, todos os currículos deverão ser submetidos à aprovação prévia do DPI/IPHAN.
I. ceder gratuitamente ao Ministério da Cultura, ao Iphan e à Fundação Cultural Palmares os direitos autorais para fins de
promoção, divulgação e comercialização sem fins lucrativos, e o direito de uso e reprodução, sob qualquer forma, dos
produtos e subprodutos listados neste Termo de Referência;
II. colher todas as autorizações que permitam ao Ministério da Cultura, ao Iphan e à Fundação Cultural Palmares o uso de
imagens, sons e falas registrados durante a realização do trabalho.
III. ceder gratuitamente o material permanente adquirido durante a organização e realização dos Encontros para a
instituição gestora do Plano de Salvaguarda da Capoeira.
Todo o conhecimento e documentação produzidos no âmbito deste projeto são de propriedade do Ministério da Cultura e, sem a sua
autorização expressa, não poderão ser utilizados para outros fins que não a divulgação dos aspectos relevantes dessa política
pública.
PTRES –
PI –
Todavia, não podemos deixar de destacar e considerar Somente discutir a partir da documentação existente.
situações que envolveram a realização do mesmo. Esclarecimento sobre o que é regulamentação e como
podemos se organizar a partir disso.
Sendo assim questionamos e registramos nossas
Discriminação, visto para passaporte, Adido cultural.
reflexões no sentido de contribuir para uma construção
Criar políticas para melhoria do transito dos mestres
de políticas para a capoeira com ênfase na democracia, nos países estrangeiros.
acesso ao conhecimento e liberdade de expressão. Dito Criar setor específico para tratar da capoeira no
isso questionamos: Ministério das Relações Exteriores. (transito, incentivo,
apoio, etc) - Editais para capoeiras que estão fora do
1- Os critérios para escolha dos consultores. país. (que não tenha distinção para os capoeiras que
estão fora do país)
2- Os critérios para a seleção dos convidados e Desburocratização das viagens referente a capoeira.
participantes do evento e suas funções.
CAPOEIRA E POLÍTICAS DE FOMENTO
3- Quem é o grupo de trabalho que organiza os textos? Pontos de Cultura
Pois os mesmos não são assinados. Prazos Apertados (48h)
Atraso nas verbas
Muita burocratização nas documentações
Registramos também, neste documento, a Ausência nas orientação para utilização dos gastos
desorganização, a falta de comunicação e uma (orientação técnica)
incongruência no discurso do grupo organizador do (Prestação de conta)
evento desde o primeiro contato até a vinda dos Formação e cursos para conhecer a organização e
mestres. Decorrendo disto, em convites e 'desconvites' implementação dos editais.
a mestres e pesquisadores, se constituindo em uma Ausência de informações referente a correta
prestações de contas.
falta de respeito a esses capoeiras. Assim como,
Falta de instrumentalização para tratar com os editais
informações infundadas sobre os critérios de seleção,
Ausência de auto-avaliação. No encontro oficial não foi
participação e representatividade de gênero. discutido os pontos negativos.
Apoio a projetos sociais de capoeira
Capoeira Viva
Quando sai o terceiro edital? Falta de continuidade
Coletivo de Mestres e Capoeiristas A FGM não prestou contas e está atrapalhando o
Recife, 10 de setembro de 2010 processo.
CAPOEIRA IDENTIDADE