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Tecnologia e (des)emprego: breve síntese do debate atual

Introdução

Apesar da introdução no conjunto das economias desenvolvidas das novas tecnologias de


informação e comunicação (TIC`s) se verificou ao longo dos últimos anos do século passado
um incremento significativo nas taxas de desemprego, especialmente na Europa
Continental. Traçar a correlação entre essas novas tecnologias e o desemprego é tarefa
extremamente complexa. Esta, não é, portanto, uma relação direta, ela depende de fatores
sociais e institucionais, por isso, as economias nacionais respondem de forma distinta às
mudanças promovidas pelas recentes inovações tecnológicas. Não obstante, as TIC`s
promovem uma reestruturação das estratégias industriais, conformando inclusive, o início
de uma nova dinâmica econômica.
A problemática do emprego pós – 1970 do século XX, nos países desenvolvidos pode ser
sumariamente caracterizada pelos seguintes fatos estilizados: (i) desemprego estrutural
fortificando-se a cada recessão; (ii) crescimento das formas atípicas de trabalho; (iii)
significativos investimentos no treinamento da força de trabalho e (iv) exacerbação do
desemprego de longo prazo e dos jovens.
Este pequeno artigo tem por objetivo lançar alguma luz sobre o debate que se estruturou
em torno das relações existentes entre a mudança técnica com a respectiva introdução de
inovações e a geração de postos de trabalho. A fim de tentar atingir este ambicioso
objetivo, sem absolutamente esgotar o assunto, dividiu-se as principais contribuições sobre
o tema em duas correntes de autores. A primeira corrente apresentada considera o
desemprego atualmente existente, grosso modo, como sendo uma conseqüência de um
descompasso entre o ambiente institucional e os requerimentos e demandas das
tecnologias, esta visão é apresentada na primeira seção. A segunda seção analisa, mesmo
que rapidamente, as contribuições de autores que vêem o atual processo de introdução de
inovações como responsável pelo fim do emprego formal. Por fim encerra-se o artigo, com
uma breve conclusão.

Tecnologia e emprego: uma questão de ajustamento institucional

As inovações tecnológicas desenvolvidas nas últimas décadas do século XX foram fortes o


bastante para promover mudanças qualitativas no padrão de desenvolvimento das
sociedades capitalistas. Para Freeman (1995), não restam dúvidas quanto ao surgimento de
um novo paradigma técnico – econômico e o conseqüente início de um novo Kondratiev.
Mattoso (1995), chama este período, de desenvolvimento e introdução de inovações, de
terceira revolução industrial.
Dois são os processos a serem considerados no tocante a questão do emprego e da
tecnologia. O primeiro, é aquele que diz respeito ao ajustamento das economias
desenvolvidas ao novo paradigma tecnológico e o segundo, ao ajustamento à nova
realidade econômica de mundialização do capital. Estes dois processos forjam o novo
paradigma técnico – econômico. Os diferentes cientistas sociais que se dispõem a tratar do
tema vêem estes processos de formas distintas. Do ponto de vista do desemprego, há
aqueles que acreditam ser o mesmo um problema inerente à transição a um novo padrão de
produção. Por outro lado, tem-se os cientistas sociais que pensam ser a introdução das
novas tecnologias, o processo de globalização e a reengenharia, o fim do emprego formal e
o início de uma era de precarização e informalização das relações humanas.
Pettit (1995) considera o desemprego conseqüência de um processo no qual o descompasso
tecnológico entre as tecnologias empregadas pelos fornecedores e a aceitação das mesmas
pelo mercado tem papel fundamental. Pois, espera-se que as TIC`s possam aumentar a
produtividade e dinamizar a economia, gerando assim novos postos de trabalho. Uma vez
que, apenas nos modelos econométricos que consideram “tudo mais constante” ganhos de
produtividade significam desemprego. A experiência do pós-guerra, contudo prova o
contrário. Ou seja, os elevados ganhos de produtividade do período foram concomitantes à
geração de empregos. Assim, acredita-se que as mudanças tecnológicas promovidas pelas
TIC`s e a introdução das mesmas na economia gerem efeitos multiplicadores na economia.
Nesse contexto, a demanda pelas novas tecnologias tem sido muito fraca se comparada
com a oferta. Este descompasso é em certa medida responsável pela estagnação econômica
e pelo desemprego (Pettit, 1995).
Freeman (1995) aborda a relação das novas tecnologias com o emprego de forma distinta,
mas que possui como resultado uma explicação muito semelhante. Assim, o desemprego
verificado nas últimas décadas do século XX é resultado de um desencontro entre as novas
tecnologias e um obsoleto sistema social. Os países desenvolvidos, notadamente a Europa,
estão vivenciando um processo de ajustamento às novas condições impostas pelas TIC`s.
Este processo faz parte da “destruição criadora” promovida pelas inovações tecnológicas. O
desemprego deve-se então, ao ajustamento dos agentes econômicos a essa nova dinâmica.
As TIC`s não geraram aumentos significativos de produtividade e nem dinamizaram a
economia, pois, é a difusão e não a pura e simples introdução de inovações que garante que
o processo de “destruição criadora” seja iniciado. Dessa forma, levará tempo, segundo
Freeman (1995) e outros, para que os investimentos nas novas tecnologias gerem ganhos
de produtividade. Contudo, verifica-se no atual momento, apenas uma exacerbação da
competição entre firmas. Nesta forma de abordar o problema, torna-se latente a
necessidade de pesados investimentos em novas tecnologias e mudanças institucionais no
sentido de criar um ambiente social hospitaleiro ao novo paradigma técnico – econômico.
Entre elas a flexibilização da economia.
Castells (apud Dupas, 1999), acredita que as novas tecnologias não desempregam, pelo
contrário elas têm o poder de catalisar o progresso econômico e permitir a criação de novos
postos de trabalho. Para este autor o desemprego é um problema europeu, fruto de
políticas macroeconômicas equivocadas.
No processo de difusão destas novas tecnologias, o aprendizado por tentativa e erro é
fundamental para encontrar a forma de uso ideal para estas tecnologias. O aprendizado é
característica deste momento de transição do paradigma tecnológico, no qual está se
processando a “destruição criadora”. Pettit (1995), apresenta três explicações para a baixa
produtividade do período: (i) as firmas ainda não sabem empregar as TIC`s com eficiência;
(ii) os trabalhadores tem dificuldade em aprender a utilizar essas tecnologias e (iii)
existência de certo desencontro, quanto ao grau de importância das novas tecnologias que é
conferido pelos fornecedores e pelo mercado.
Este novo padrão produtivo, que tem início com a introdução das TIC`s é chamado por
Mattoso (1995) de terceira revolução industrial. Pois, destrói a forma como se dava o
desenvolvimento e recoloca novos problemas cujas respostas ainda não foram encontradas.
Daí a dificuldade em dinamizar a economia e gerar novos postos de trabalho.

Tecnologia e (des)emprego: o fim do trabalho formal?

As transformações produzidas pelas inovações tecnológicas no âmbito das comunicações e


dos transportes conformam uma nova realidade. Uma realidade marcada pelas estratégias
globais e pela segmentação das cadeias produtivas. As decisões de investimento agora,
nesse novo contexto, consideram as especificidades das economias locais, permitindo que
as grandes corporações tenham um grau de mobilidade nunca antes verificado. Como
conseqüência, num primeiro momento, as atividades mais simples foram deslocadas aos
países periféricos e num segundo estágio também atividades mais complexas. Estes fatos
aliados ao processo de ajustamento tecnológico corroboram para uma piora significativa do
nível de emprego verificado nos países centrais do capitalismo. Apresentando uma
abordagem qualitativamente diferente, Rifkin (apud Dupas, 1999) e Chesnais (1996),
mostram como as novas tecnologias e a mundialização do capital possuem efeitos deletérios
sobre o nível de emprego formal.
Rifkin (apud Dupas, 1999), afirma que a automação junta com as novas técnicas de
reengenharia acabaram com o emprego. “Socialmente a tecnologia traria mais desvantagem
do que vantagens”. Para Dupas (1999), o número de trabalhadores estáveis vem caindo
gradativamente e tende a cair ainda mais, como alternativa, o emprego informal e precário
tem crescido consideravelmente.
Como conseqüência, grande parte dos desempregados tem se constituído de jovens que
ingressam no mercado de trabalho, forçando boa parte dos recém formados a aceitar
empregos em atividades que requerem um nível de instrução inferior aos possuídos por
estes mesmos jovens.
De acordo com Dupas (1999), a “tendência geral” será a menor criação de postos de
trabalho pelas grandes corporações uma vez que, a automação e a informatização da
gestão aliada aos processos de seletividade de investimento, características da nova
dinâmica, vão gerar cada vez menos empregos por dólar investido. Assim três tendências
empíricas são verificadas na atual realidade: (i) geração cada vez menor de empregos
formais; (ii) flexibilização contínua da mão – de – obra e (iii) exploração crescente do
trabalho informal nas atividades mais simples das cadeias produtivas.
Em nome das estratégias empresariais que visam competitividade internacional, o capital
busca valorizar-se através do combate ao trabalho organizado, tencionando com isto tornar
o trabalhador cada vez mais dispensável de seu processo de valorização. Esta é a dinâmica
verificada na “modernização conservadora” da década de oitenta do século XX, na qual a
inovação de processo e as técnicas de reengenharia e automação possuíam destaque
(Mattoso, 1995).
O encolhimento dos Estados nacionais, forçado pela lógica da mundialização do capital,
termina por fechar este ciclo vicioso de valorização do capital, no qual cada vez menos são
criados novos postos de trabalho no setor público, corroborando ainda mais para a
deterioração dos níveis de emprego formal nos países avançados.
Para Chesnais (1996), o desemprego além de ser conseqüência da introdução das novas
tecnologias é atribuído também a mobilidade do capital permitida por estas mesmas
inovações tecnológicas, notadamente nos transportes e nas comunicações. O padrão de
acumulação fordista é destruído e o nível alto e bem remunerado de emprego desaparece,
em seu lugar surge a marginalização e o desemprego estrutural.
Para Dupas (1999), no contexto da globalização, apenas o crescimento econômico pode
desencadear um processo no qual novos postos de trabalho serão gerados.

“O Estado contemporâneo não se sente mais responsável pelo pleno


emprego. As corporações transnacionais também não. Agora sem a
proteção do Estado, o homem volta a sentir com toda a força sua
dimensão do desamparo” (Dupas, 1999).

Conclusões

A partir do exposto, conclui-se que a distinção fundamental entre os dois grupos (se assim
se pode classificar) diz respeito à temporalidade do desemprego, ou em outras palavras, o
que uns consideram apenas conjuntural outros pensam ser estrutural.
Assim, os autores que consideram ser a contemporaneidade marcada por um processo de
destruição criadora, acreditam que o desemprego atualmente verificado está associado à
certa incompatibilidade entre as possibilidades das tecnologias da informação e
comunicação e a infra-estrutura institucional marcada pela rigidez.
Noutro lado do espectro, tem-se um conjunto de pesquisadores que percebem ser este o
tempo em que o trabalho formalmente estabelecido fragmenta-se, e em seu lugar surgem
formas atípicas, porém não definidas de trabalho. Mas cuja, tendência geral é de
deterioração do chamado mundo do trabalho.

Bibliografia
CASTELLS. A sociedade em rede. Paz e Terra. Rio de Janeiro. 1999.
CHESNAIS, F. A mundialização do Capital. Xamã. Rio de Janeiro. 1996.
DUPAS. Economia global e exclusão social. Pobreza, Emprego, Estado e Futuro do Capitalismo. Paz e
Terra. Rio de Janeiro. 1999.
FREEMAN, C. Innovation in a new context. STI Review (15). 1995.
HOBSBAWN, E. A era dos extremos. Companhia das Letras. São Paulo. 2000.
MATTOSO, J. A desordem do trabalho. Scritta. São Paulo. 1995.
OCDE. Technology and Economy – The Key Relationships. OECD. Paris. 1992
PETIT, P. Technology and employment: Key questions in a context of high unemployment. STI Review
(15). 1995

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