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INTRODUÇÃO
As hélices α são o tipo de estrutura secundária mais comum presente nos níveis de
organização das proteínas, possivelmente devido à facilidade deste arranjo maximizar o número de
pontes de hidrogénio entre os grupos carbonilo e os grupos amina da cadeia proteica principal,
acomodando simultaneamente a ligação peptídica rígida.
Alguns aminoácidos ocorrem mais frequentemente em hélices α do que outros; cada um,
quando intrínseco num péptido, tem uma determinada tendência para formar hélices α. Esta
tendência é designada por propensidade helicoidal e reflecte-se nas propriedades das cadeias
laterais e no modo como estas afectam a capacidade dos átomos da cadeia principal adjacentes para
assumirem os ângulos diedros (ϕ e ψ) característicos. De acordo com a maior parte dos sistemas
modelo experimentais, a alanina é o aminoácido que apresenta uma maior tendência para formar
hélices α, ao passo que, excluindo a prolina, a glicina é o que tem menor propensidade para este tipo
de estrutura. De acordo com valores experimentais, surgem primeiro na escala de propensidade os
resíduos com grandes cadeias laterais hidrofóbicas; aparecem depois os com grupos polares
afastados por alguns carbonos do esqueleto; os aromáticos posicionam-se a meio da escala e, por
fim, os aminoácidos β-ramificados, os com grupos polares apenas a um carbono de distância do
esqueleto e a glicina (Pace et al., 1998).
MATERIAIS E MÉTODOS
Esta simulação foi realizada no software Putty, com acesso a um servidor através do
programa Filezilla e com auxílio do Pymol para visualização da mesma. As condições nas quais foi
realizada estão apresentadas de seguida.
Sistema base:
Sistema em estudo:
Dois parâmetros possíveis de análise são o RMSD e o raio de giração, parâmetros estes que
ajudarão na análise estrutural do péptido em estudo. RMSD (root-mean-square deviation) representa
a distância média entre os átomos de uma molécula em relação a uma estrutura de referência. Esta
medição é feita através do carbono α, sendo que, sempre que a sua posição é igual em ambas as
estruturas, este valor é igualado a zero; à medida que se vai afastando, o valor deste parâmetro vai
aumentando. No caso do raio de giração, este traduz o grau de compactação e tamanho da molécula,
sendo que, quanto menor for o seu valor, mais compacta se encontra a estrutura em questão.
A B
Fig. 1 – Representações gráficas para o nonapéptido Trp 9 ao longo do correr da simulação (t = 10 ns) da variação (A) do
RMSD e (B) do raio de giração (gráficos obtidos no putty).
Observa-se no gráfico A da Fig. 1 que o sistema se encontra relativamente estável até cerca
dos 3,5 ns e entre os 4 e os 8 ns. No restante tempo, verifica-se que o sistema sofre alterações que o
levam a uma instabilidade passageira. Para além disto, é de realçar a diferença entre a curva que tem
em conta apenas a conformação do esqueleto do péptido e a curva que inclui a influência das
cadeias laterais. No caso do triptofano, este é um aminoácido com uma grande cadeia lateral, que
inclui um anel indol. Este anel é bastante reactivo, o que pode dar origem às diferenças verificadas
nos valores de RMSD. No caso do gráfico referente ao raio de giração, observa-se que o péptido é
bastante instável durante praticamente toda a simulação. É de realçar o pico observável entre os 3,5
e os 4 ns em ambas as representações. Neste caso, o péptido sofreu uma destabilização na sua
estrutura, que o tornou menos compacto e de maior volume, facto que se verifica no aumento do raio
de giração e no aumento da distância entre os carbonos α. Para além disso, o triptofano é bastante
susceptível a alterações na sua estrutura, uma vez que pode adquirir inúmeras conformações quando
presente em água, o que leva às oscilações observadas no raio de giração.
Outra análise que pode ser feita a este péptido baseia-se na variação da sua estrutura ao
longo do decorrer da simulação.
Fig. 2 – Variação da estrutura secundária ao longo do correr da simulação (t = 10 ns) dos nonapéptidos (A) Trp 9 e (B) Ala 9 .
Por observação da Fig. 2, verifica-se que o nonapéptido Trp 9 é mais estável que o sistema
base Ala 9 , uma vez que se apresenta em hélice α durante mais tempo. O triptofano (Trp) apresenta
um valor de propensidade helicoidal equidistante à glicina e à alanina, o que sugere que as suas
capacidades de ligações por hidrogénio não afectam a formação da hélice α (Pace et al., 1998). Para
além disso, este aminoácido é um derivado da alanina, tendo um substituinte indol no carbono β, o
que o torna mais estável.
De facto, observando a Fig. 3, verifica-se que o péptido Trp 9 é bastante estável ao longo do
tempo. Neste caso, apenas no intervalo de tempo dos 3,5 a 4 ns se verifica uma perda circunstancial
do número de resíduos em hélice α, com consequente aumento de resíduos em turn. O turn é um
motivo estrutural das proteínas que consiste na inversão da direcção da cadeia polipeptídica, onde os
carbonos α de dois resíduos se aproximam. Este tipo de estrutura é estabilizado por ligações de
hidrogénio. No caso do coil, este corresponde a uma sequência de aminoácidos que não se encontra
nem em hélice α, nem em folha-β. Este tipo de estrutura é importante para entender o folding das
proteínas, bem como o seu turnover e o transporte através de membranas. Também a partir da
observação da Fig. 3, verifica-se que este péptido não ocorre em folha β em nenhum ponto da
simulação.
A B
Fig. 4 – Registo de dois momentos da simulação do péptido Trp9 obtidos no Pymol: (A) numa conformação instável aos 3,5 ns
(35 frames) e (B) numa conformação estável aos 7 ns (70 frames).
O triptofano é um aminoácido hidrofóbico, ou seja, não interage com a água para formar
ligações de hidrogénio, tal como acontece com a alanina. No entanto, este mostrou ser mais estável,
tal como se pode observar nos gráficos da Fig. 2. Tal facto deve-se ao anel indol presente na sua
cadeia lateral. Esta característica aromática dá ao triptofano a possibilidade de estabelecer
interacções atractivas não covalentes 𝜋 − 𝜋 com os anéis aromáticos adjacentes, tornando a
estrutura do sistema mais estável na maior parte dos casos. Para além disso, a presença de um
átomo de azoto neste anel torna-o mais reactivo.
Este aminoácido pode adquirir várias conformações espaciais, sendo que, em água, pode
apresentar-se em seis conformações de baixa energia diferentes. Para que ocorram as ditas
interacções 𝜋 − 𝜋, é necessário que o sistema apresente determinadas configurações. As duas
conformações mais propícias a este tipo de interacção apresentam os anéis dispostos paralelamente
ou em forma de T. Estas dizem-se as mais estáveis por serem isoenergéticas e representarem
mínimos de energia. Quando se observa alterações nos valores de RMSD, nomeadamente entre os
3,5 e os 4 ns, ocorre uma mudança estrutural no péptido, sendo que prevalece a estrutura em coil.
Neste caso, pode dizer-se que as interacções 𝜋 − 𝜋 eram mais fracas, possivelmente porque os
triptofanos se encontravam em configurações menos favoráveis à ocorrência das mesmas, tornando
assim o sistema mais instável. Tal facto pode ser comprovado por observação a Fig. 4, onde, no
gráfico A, as cadeias laterais dos triptofanos aparentam encontrar-se em posições bastante distintas,
não estando dispostas nas configurações mais propícias a que este tipo de interacções ocorra tão
fortemente, o que reflecte uma maior instabilidade do sistema.
Por comparação deste sistema, Trp 9 , com o sistema Ala 8 W, observa-se que este também se
apresenta bastante estável, inclusive apresenta um raio de giração menos oscilante durante o
decorrer da simulação. Tal facto mostra que, a introdução de um triptofano no péptido estabiliza, de
facto, o sistema, mas como não existem grupos aromáticos na sua vizinhança, este não forma
interacções 𝜋 − 𝜋 com outros anéis. Deste modo, as instabilidades provocadas por mudanças não
favoráveis a este tipo de ligação não ocorrem. Este segundo sistema é também mais estável que o
sistema base, Ala 9 , provando que o triptofano é, de facto, um aminoácido cujo anel indol presente na
cadeia lateral ajuda à estabilização da hélice α.
BIBLIOGRAFIA
• Sites:
http://en.wikipedia.org/wiki/Stacking_(chemistry)
http://www.biology.arizona.edu/biochemistry/problem_sets/aa/tryptophan.html
http://www.russelllab.org/aas/Trp.html
• Livros:
Nelson, David L.; Cox, Michael M. – Lehninger Principles of Biochemistry – 5ª edição, W. H. Freeman
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Quintas, Alexandre; Freire, Ana Ponces; Halpern, Manuel J. – Bioquímica, Organização Molecular da
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Pace, C. et al., 1998. A Helix Propensity Scale Based on Experimental Studies of Peptides and
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