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TEOLOGIA DA EVANGELIZACAO Regina Fernandes Sanches , , , : Introdugao Evangelho vem do termo grego euangélion, “evangelho”, que significa “boas novas” ou “boas noticias”. Ja as palavras evangelismo e evangelizago, conforme Carriker', traduzem igualmente o termo grego euangelizo e significam o ato de evangelizar. Evangelizar refere-se a0 amincio, do grande acontecimento do nascimento (encarna¢ao), vida, morte, ressurreigfio e ascensdo de Jesus Cristo, obra esta que possibilitou aos seres humanos a salvago ¢ a redenglo da criagdo. De acordo com Carriker a evangelizago possui o seguinte carter: 1) NARRATIVO —~ desde 0 periodo biblico 0 evangelho foi anunciado de modo narrativo, ou seja, contado por pessoas, porque tem a ver com a vida de Jesus Cristo e a vida dos seres humanos no mundo. 2) PROMISSORIO — porque tanto se refere as promessas do Antigo Testamento realizadas em Jesus Cristo, como &s novas promessas que nos foram anunciadas por Jesus Cristo. Tanto aquelas que jé se realizam no Reino presente como aquelas futuras. 3) HISTORICO - as noticias a que se refere o evangelho nio sio ficticias, so fatos que realmente ocorreram. Quem melhor expressa isso é Lucas em seu evangelho. Da mesma forma, o efeito dessa mensagem é real na historia humana e na histéria de cada um. A Evangelizagiio e a Conversio © acothimenta do evangelho requer conversia. A compreensia de conversto é variada “dentro do ‘cristianismo, mas sempre requisito para uma vida em conformidade com o evangelho de Jesus Cristo. © Batismo € 0 selo dessa alianga estabelecida com 0 préprio Deus em Jesus Cristo. © evangelho ndo é uma simples noticia de um fato passado, mas de uma ago atual de Deus. A obra salvadora de Cristo é vigente na histéria e sempre atualizada por meio do Espitito Santo em todos os lugares e pessoas onde ele € anunciado e acolhido. Ele envolve 0 perdio dos pecados, a regeneraeao e 0 dom do Espirito Santo. Com isso, percebemos que a evangelizago nfo pode ser reduzida @ atividade de acrescentar membros & uma igreja local ou denominagdo. Ela possui resultados muito mais CARIIKER, Timéteo. Proclamando as Boas Novas. Brasilia: Palavra, 2008. P. 17. abrangentes © imensuréveis. Também nio pode ser reduzida a uma estratégia ow método tecnicamente planejado, mas tem a ver com a vida e as Telagdes humanas e sua complexidade, A Evangelizasio e a Missio Evangelizagdo © missio so termos diferentes, que possuem origens e sentidos diferentes. Evangelizago vem de euangélion e, como ji afirmamos, refere-se ao anuncio dessas boas novas. Miso vem do termo apostéllo ou “apéstolo”, que significa enviado. Refere-se historicamente ao envio da Igreja ao mundo para conduzi-lo para Deus. A evangelizagao é tarefa prioritéria da Igreja em sua missio. Em certo sentido também tudo o que a Tgreja faz no mundo, como comunidade apostlica, visa 0 conhecimento de Deus revelado em Jesus Cristo. Mas, no sentido restrito, missto é mais ampla que evangelizacSo, ois se refere & prépria presenga da Igreja no mundo e sua propria natureza, I- Breve Historia da Evangelizagio a) A Reforma Protestante e a Missio da Igreja A Reforma Protestante marcou a histéria do Ocidente como movimento de carster teol6gico-celesial ocorrido no século XVI. Ela representou um divisor de éguas entre 0 periodo medieval ¢ a modernidade. Isso se deve ao cariter contestador em relago ao sistema religioso catélico romano vigente na época. Podemos afirmar que ela gerou uma nova mancira de viver a f& e de se organizar como igreja crista. A base teolégica que fundamentou a Reforma e foi defendida por todas as variagies V——__miudtioma 1no conjunto | z2uingliana e anabatista) foi a compreensio da teologia da Reforma, e relacionado aos | ace aL nteriores 0 sacerdcio universal de todas os | teolégica da justificagao pela graga (sola Pessoas crentes. Todos: ciéigos e pessoas | ‘ratia), come ‘nico © eufciente caminho Spies Posular, Inefintomente, Fyre acassn o para salvar as pessoas do pecado e da ponfos feolbgicos basearam a ortodoxia : Protestante e foram revitalzades nos Prisdo que ele representava. O acesso & _movimentos protestantes subsequentes. | graga somente seria possivel por meio da. —— {€ (sola fide) em Jesus Cristo ¢ sua obra salvadora. Como so as Escrituras que anunciam a Cristo e @ sua graga, elas seriam centrais no fazer teolégico e na vivencia crist& (sola seriptura. ‘Uma das criticas que normalmente se faz Reforma Protestante, é que ela no se ‘ocupou em sua época da cristianizagao dos povos chamados de “pagios”, localizados em terras distantes das européias. O empreendimento cristianizador foi realizado na América . Latina pelo catolicismo de contra-reforma, segundo o historiador da igreja Stephen Neill: No mundo protestante, durante o periodo da Reforma, houve pouco tempo para pensar em missdes. Até 1648 os Protestantes lutavam pela conservacao das préprias vidas [...]. Naturalmente os reformistas tinham conhecimento do mundo nfo-cristio que os rodeava... E evidente que a idéia do progresso firme da pregaco do Evangelho através do mundo no € alheia a este pensamento. Contudo, depois de indicar todas as razies explicativas e de citar todos os escritos possiveis dos Reformistas, tudo isso representa bastante pouco *, ? NEILL, Stephen. Hisidria das MissBes. Sto Paulo: Vida Nova, 1989. p25. ‘A auséncia evangelizadora da Reforma Protestante € atribuida, por James A. ‘Scherer, a fitores como: causas externas de ordem estratégica, ¢ causas internas de ordem teolégica relacionada ao entendimento restrito da missio da igreja, baseado na idéia da missio | Dei,ou seja, a misao é de Deus e ele Scherer afirma: “Para Luter, a missGo é sempre de : forma preeminente obra do Deus triino — missio Dei | mesmo a executaré, = seu alvo e resultado sGo a vinda do reino de s ee Deus. Lutero vé a Igreja, juntamente com a polavra © luteranismo restringiu ainda mais a tarefa missiondria da Igreja. ‘de Deus e todo crente batizado, como instrumentos divinos cruciais para a miso. Enfretanto, em enhum lugar o reformador faz da Igreja o ponto | Scherer ressalta que o protestantismo de partida ov 0 alvo da misao, como a missiologia do século XIX tendia a fazer. sempre a missdo do | Ftedoxo posterior 4 reforma One indo Co ra” de Dees oprecenta sy | *Preeefou uma postu ant Cculminagdo final”, _____| missionéria baseada na teologia da Missio Dei, que o impediu de empreender ages evangelizadoras entre outros povos: Embora mantivesse a visio de Lutero a respeito da missio como obra do priprio Deus, eles isolaram cuidadosamente 0 horizonte escatolégico presente na concepsio do reformador, segundo a qual a proclamago do evangelho continuaria até os confins da terra e até 0 iiltimo dia. Foram bem sucedidos em domesticar a missio Dei dentro das fronteiras eclesidsticas da cristandade’. A luz do conceito de misséo latino-americano, que concebe a libertagéo integral, a Reforma Protestante foi um movimento caracteristicamente missionério. Ela no somente construiu as bases para uma nova compreensao da miss da igreja, como foi nela que a ‘missio apresentou sua face amplamente libertadora. A defesa da Tiberdade humana pela via teolégica, baseada na graca do Senhor Jesus Cristo, por meio da fé, tanto para a vivéncia da vocagao cristl diante de Deus, como no mundo, foi uma ago integralmente missionéria. b) A Reforma Anabatista A Reforma Anabatista foi o segmento mais radical da Reforma Protestante, e sua influéncia perdura até os dias atuais em algumas vertentes do evangelicalismo. Os anabatistas defendiam que a igreja deveria manter-se institucionalmente separada do estado, e a sociedade deveria ser transformada pela via da fé. Seus ideais sécio-revolucionarios e a crenga de que a igreja deveria se organizar de modo auténomo em relago ao estado pareceram extremamente subversivos para época, mesmo para os préprios protestantes. Mas essa reforma chamada de > Thidem, p. $5. Radical, imprimiu no genoma da fé evangélica a luta pacifica pela liberdade sécio-eclesial ¢ a énfase na experiéncia da fé. ©) 0 Pietismo © Pietismo foi um dos mais impactantes movimentos posteriores a Reforma Protestante. Ele nasceu dentro do protestantismo alem&o, no final do sé. XVII. Foi considerado como uma segunda reforma, devido & influéncia que exerceu no protestantismo subseqiiente, nos aspectos da piedade crista e da pritica missionéria. Na teologia, os pietistas Preocuparam-se com a centralidade de Jesus Cristo em todas as questdes relacionadas & fé. A experiéncia da fé para eles era experiéncia com Cristo e sua obra salvadora, que conduzia para uma vida de dedicarao piedosa a Deus ¢ aos outros. Conhecer a Cristo era experimenté-lo na vida e defrontar-se constantemente com seu sacrificio e o perdéo gracioso que ele concede. Os elementos teolégicos defendidos pelo pietismo em relagdo a fé ea vivencia crista foram fundamentais para 0 esforgo missiondrio gerado dentro dele. Significavam também uu Fompimento ainda mais radical com a idéia de cristandade. Todos, indistintamente, deveriam ‘experimentar a Cristo, o seu perdio e a sua graga; mediante os quais sc tomnarism cristdos - segu’dores de Cristo. Tal compreensio se tomou forga de propulsio para a obra evangelistico- missiondria protestante entre 0s povos no cristos, empreendida principalmente pela ‘comunidade moraviana. O evangelicalismo herdou também a gene teologico-missiondria do ietismo que se tomnou determinante na sua configurago. O evangelicalismo latino-americano conservou virios elementos teolégicos pietistas, que alguns de seus segmentos so apelidados de “pietistas”, principalmente aquele da teologia da missdo integral. @) Os Moravianos Dentro da Reforma pietista destacou-se a igreja moraviana no século XVIII. Fram grupos protestantes peregrinos, procedentes da regidio da Moravia, e que foram acolhidos na fazenda do conde Nicolaus von Zinzendorf. Stephen Neil alega que os moravianos . Acesso em 1é de janeko de 2008, 15 ""7. Os latino-americanos eram organizagdes missiondrias norte-americanas e européias’ minoria se tomaram meros coadjuvantes na discussio sobre eles mesmos. No entanto, no espirito ecuménico de Edimburgo, este evento contribuiu para o fortalecimento da cooperacao ‘entre segmentos evangélicos ¢ para o surgimento posterior de uma teologia da missao latino- americana. ‘Da mesma maneira ocorreu com © congresso posterior, também organizado pela CCLA em Montevidéu — Uruguai, em 1925. Nele houve um aumento da participacao latino- americana, mas como afirmou Longuini, em nivel de participagio foi ainda “como algo cosmético™"*, muito pouco representative. No Congreso de Havana em Cuba, em 1929, a representago latina foi mais significativa e participativa. O Longuini Neto (missiélogo, pastor presbiteriano e brasileiro) faz: uma observagao importante sobre isso: ‘Ago Social. Foi a primeira vez que o tema apareceu com tal magnitude. Pode-se depreender disso que 4 medida que a igreja latino-americana foi-se despreendendo do paternalismo norte-americano ¢, nesse caso especifico, da tutela do CCLA ma condugao dos congressos, as questOes socials comegaram a fazer parte da agenda”, Ainda assim Samuel Escobar faz: uma avaliago bastante positiva do trabalho do CCLA. De acordo com ele o comité contribuiu através dos eventos, para 0 desenvolvimento de projetos de educagio teolégica, editoras ¢ entidades para-eclesiésticas. Isto resultou, conforme Escobar, no estimulo para “os primeiros esforgos de reflexto teol6gica de evangélicos latino- americanos”””. Outra observagao relevante é a énfase na discussio sobre as missdes dada pelos eventos, ressalta Escobar: “As primeiras expressies teolégicas forjadas por evangélicos na América Latina se centram nos temas de uma teologia da missio””'.O caminho teolégico percorrido pelos evangélicos latino-americanos no decorrer do desenvolvimento histérico do ‘movimento fol propositalmente 0 da teologia da misao. Devido a varias razies, mas principalmente & nova consciéncia histérica que emergiu no Terceiro Mundo, desencadeou-se nos setores evangélicos latino-americanos um anseio pela autonomia em relagao as igrejas e organizagSes norte-americanas e européias (uma espécie de emancipagio). Em referéncia nfo somente a lideranca e organizago eclesidstica, mas & propria teologia. Nos esforgos pela autonomia percebeu-se, no entanto, que ela passa necessariamente pela definigao da identidade. A busca pela identidade da igreja evangélica " LONGUINL © Novo Resto da Mis, p. 92, tbidem.p. 99. "ibidem.p. 104, c ESCOBAR, Lo Fé Evongéica y los Teclogios dela Uberacién, p51. 2 older pS 16 eee latino-americana tomou-se tema central em varios dos eventos realizados e literaturas produzidas em meados do século XX. h) FASF DAS CONFERENCIAS - CELA I, CELA Il E CELA IL AA fase posterior aos congressos foi a das conferéncias. A primeira delas foi a CELA I — Conferéncia Evangélica Latino-americana, realizada em Buenos Aires, Argentina em julho de 1949, pelo CCLA. Ela teve como tema principal “O Cristianismo Evangélico na América Latina”, Nesta conferéncia evidenciou-se a preocupagiio em relag%o 20 especifico do evangelicalismo latino-americana. Foi recomendado, como resultado das discussdes da conferéncia, que as igrejas protestantes nela envolvidas utilizassem 0 nome “evangélico” junto ao nome denominacional. Conforme Padilla o evento se deu em clima de guerra fria e de enffentamento entre capitalistas e socialistas”. O evento foi realizado no ano seguinte 4 criag&io do CMI, mas néo em conjunto a este. Tanto Padilla como Longuini concordam que a CELA I foi um marco no esforgo pela identidade do protestantismo evangélico latino- americano. ‘A CELA I, realizada em Lima, Peru, em 1961, sob >“+ma “Cristo, a Esperanga para a América Latina”, foi a tltima conferéncia organizada pelo CCLA. Ela aconteceu no mesmo ano de criagdo do ISAL — Igreja e Sociedade na América Latina, como iniciativa dos setores mais radicais do protestantismo ecumémico. Conforme Padilla o ISAL também assumiu contornos radicais em relagdo & questo sécio-econémica: “Em Huampani, ISAL deu os primeiros passos para a interpretagao da realidade latinoamericana desde uma perspectiva protestante e marxista”™*, Ainda de acordo com ele o ISAL influenciou diretamente, através dos seus relatérios, as discussdes da CELA I. Conforme Longuin‘.a CELA I" projetou 0 ISAL. O trabalho das comissées do ISAL “tomou corpo e expandiu-se por toda a América Latina, especialmente depois da CELA II”**. Por forga disso, as questées sociais assumiram lugar de importincia nesta conferéncia, a ponto de identificé-la, em plena época de lutas libertacionistas na América Latina, em uma posigaio mais de esquerda politica”. ‘As preocupagdes da CELA Il giravam em tomo da evangelizagio em relagdo aos problemas sécio-econémicos latino-americanos. Seu contexto era o da dependéncia e ZLONGUN, op. ct. p11 Ct. PADILLA, C, René. 25 anos de Teoloaio Evanadica Lotincamericana. Buenos Ates:FIL 1995.42, idem. p. 47. %LONGUNL op. cit. p. 139. 2 BUARQUE. Cistbvam. Nossa causa ~ comum: 0 educacionisme., Broslic: Senado Federal. 2007. p. 3. 7 ee a a a — a ae dominagZo econémica e cultural da América Latina. Por outro lado, se apresentava o comunismo materialista como possivel resposta a isto, mas que possuia uma Proposta revolucionéria e cerceadora demais dz liberdade humana, para os principios evangélicos. Outros desafios eram 0s movimentos libertacionistas de base, a emergente Teologia da Libertagio ¢ © cicscimento torrencial do pentecostalismo. O MCI — Movimento de Crescimento de Igrejas, que era fruto do trabalho da vertente evangélica fundamentalista horte-americana, © que crescia também com rapidez na América Latina influenciando as ‘erejas evangélicas em geral, surgiram como situagSes a serem tratadas também pela teologia da missio latino-americana. A CELA III foi sediada na Buenos Aires, Argentina, em 1969, em tomo do tema (Comissio Proviséria Pré-Unidade Evangélica Latino-americana e a Confederacdo Evangélica do Brasil. Samuel Escobar (batista e peruano) comentou que nesta conferéncia algumas mudancas estavam bem mais evidentes, como a relagio mais amistosa com o Catolicismo Romano”, ¢ o tratamento das questées histérico-sociais, Destacou ele: A outra mudanga esté no campo ideolégice, na maneira de interpretar a realide-te latinoamericana. Hi uma crescente consciéncia dos males estruturais da sociedade ¢ da inquietago social que envolve o continente. Precisamente neste aspecto se chegaria a uma conftontagao entre diferentes setores da CELA II”*, Longuini, ao citar Orlando Costas em seu comentério sobre CELA III, menciona: “Segundo Costas, tinha dimens6es de uma missiologia encamacional, uma eclesiologia diaconal, uma cristologia autéctone, uma antropologia libertadora e uma preocupasao pela pneumatologia””. A critica de Costas em relago ao CELA Ill refere-se ao distanciamento do tema da evangelizacao, que sempre foi tratado com prioridade pelo evangelicalismo latino-americano. Para ele isto implicava no comprometimento da prépria identidade evangélica do evento. O Povo evangélico, de acordo com Costas (pastor batista porto-riquenho), deveria aprender a viver em meio as ideologias predominantes na América Latina, mas nfo deveria perder de vista seu compromisso com o evangelho e as referéncias de base da sua fé. Sobre isso ele comentou: Z.Eimportante destacar que 0 evento contoy Inclusive com dos observadotes cotéicos & convite dos prtios evangétcos SLSCOBAR Somuel. Los movinientos de cooperacién evangéfca en Amica Latina. In: Revs lle Mion, uence Atos: Fundacién Koids, Revsia Be¥Onica Ge leoopis Evangeica Latno-ametcana. Deronivel oe * a vi r ># Acess0 em 16 de janet do 2K, > LONGUNL © Novo Resto da Miso, p. 125. 18 © protestantismo latinoamericano poder sobreviver dimensio ideolégica de sua crise, somente & medida que consiga manter sua criticidade frente as diversas correntes ideolégicas em meio as quais tem sido chamado a expressar sua fé. Em caso contrério, estard condenado a desaparecer como instrumento profético do Reino de Deus na América Latina”, Na CELA III a face mais radical do protestantismo evangélico latino-americano se evidenciou. Sua importancia também se refere a influéncia que exerceria sobre 0 novo movimento que se iniciaria no cenério evangélico latino-americano. Era, de fato, um processo de gestaco de uma teologia da missdo que refletisse tanto rosto da América Latina como 0 da fé evangélica. Samuel Escobar acrescenta & conquista das CELAS a criago do CLAI — Consetho Latino-americano de Igrejas. Ele salienta que “Os esforgos ecuménicos representados pelas CELAS, e logo pela UNELAM, culminaram em 1982 a0 constituir-se 0 Conselho Latinoamericano de Igrejas (CLAI)””'. As CELAS certamente marcaram importincia para a constituigdo da identidade evangélica latino-americano. Iniciaram as discussSes em tomo da missio da Igreja e a teologia delas resultantes. A continuidade™ as discussdes iniciadas pelas CELAS se daria através dos CLACES — Congressos Latino-americanos de Evangelizagio. Esta série de congressos foi inicialmente também patrocinado e liderado por organizages de fomento ‘evangelistico norte-americanas, em um novo esforgo de retomada do tema da evangelizacio, ‘mas tomou-se posteriormente um evento caracteristicamente latino-americano. ® COSTAS, Orlando. £1 Frotestanfsmo en América Latina Hoy: Ersayos Del camino (1972-1974). San José: INDEF, 1975. es. SY ESCOBAR. La Fé Fvanghira y oe ning de i Uneraciin, p. £2. : = A confinuidade fo relative, visto que © CLADE fora uma relomada evangetcal a0 tema da evangeliagio. No ‘entanto, ndo sem se infuenciaco pelos elaboragbes do CELA. que se evidenciom na sua preocupagde com 6 reakdade sécio-isérca da América Latina 19 MOVIMENTO ECUMENICO DE MISSAO Comin Conselho Mis. Intemacional 1948—CMI Consetho Mundial deterejas 20 liad ath GRATE EAE GR ald auutaiaauaaie eq uazauageaanasade i qiuiiseasee neti eHinaenaaiic © Evangelicalismo Latino-americano e a Teologia da Missio Integral a) O CLADE - Congresso Latino-americano de Evangelizagio O CLADE — Congresso Latinoamericano de Evangelizagao foi o Principal propulsor da Teologia da Missio Integral. Ele representa a Igreja evangélica latinoamericana, que se retine para discutir os problemas do seu contexto e responder teologicamente a eles em vista da evangelizacio. © CLADE I foi patrocinado, organizado ¢ liderado pela Associago Evangelistica Billy Graham, visando ser uma representagdo continental das discussdes iniciadas no Congreso Mundial de Evangelizagd, que {oi realizado em Berlim no ano de 1966 pelos ‘evangelicais de linha mais conservadora. Embora o movimento evangelical de missio do século XX encontra sua origem também na Conferéncia de Edimburgo (1910), foi em 1966 que ele realizou 0 Congresso sobre Missio Mundial na cidade de Wheaton, numa perspectiva mais conservadora e, de certa forma, em reagdo aos desdobramentos do movimento ecuménico de miss4o. No mesmo ano foi realizado em Berlim 0 Congresso Mundial de Evangelizaglo, fundamental para o desenvolvimento do movimento de missio evangelical. Em Berlim decidiu-se pela realizagao de congressos continentais para discutirem os rumos da evangelizago. A versio para a América Latina foi o CLADE ~ Congresso Latino Americano de Evangelizagio. No entanto, no se deve desconsiderar que os tedlogos evangélicos latinoamericanos que participaram deste nove movimento, o fizeram em continuidade &s discussBes em toro da igreja ¢ da teologia latino-amctivanm iniciadas pelos CELAS e os Congressos do Panama, Montevidéu e ‘Havana. (Os CLADES se tornaram um evento de grande importancia como férum de discussa0 da teologia evangélica latino-americana. Eles se organizam em tomo do tema da evangelizago, mas em uma perspectiva integral e a partir da América Latina. Desde o CLADE II estes congressos tém sido organizados pela FTL — Fraternidade Teol6gica Latino- americana, ‘O CLADE I, patrocinado por uma organizagio estrangeira, contou com a presenga de representantes do fundamentalismo evangélico norte-americano, atuantes junto ao movimento de erescimento de igrejas. Em contiapaitida, » evento também contou com a Presenca de teblogos latino-americanos que fizeram demonstrar que nessa regio jé florescia uma forma 21 | a ee ee een de teologia nativa, que aliava o pensar teolégico e a evangelizago aos problemas sociais do Povo latino-americano e seus anseios libertacionistas. O Relatério Final do evento inicia com a seguinte intengdo: Os aqui reunidos, crentes em Cristo, membros das diferentes comunidades denominacionais que trabalham em nosso continente entre 0 povo latino- americano [...] Cremos que 0 préprio Espirito Santo tem nos guiado a este encontro, com a finalidade de examinar de novo nossa missio cevangelizadora a luz do ensino biblico e da atual situag4o latino-americana®. Lufs Longuini acrescentou que foi neste congresso que se idealizou uma organizago ue fosse composta por latino-americanos e os representasse teologicamente. De acordo com ele “Nos corredores do CLADE I gestou-se uma constelag3o usando uma Plataforma de didlogo, tendo em vista a ‘fratemidade””™. A criagao da FTL foi uma das maiores conquistas rumo a autonomia e a identidade da Igreja e da teologia evangélica latino-americana. A Fratemidade Teolégica Latino-americana foi fundada em dezembro de 1970, em uma consulta realizada na cidade de Cochabamba, Bolivia. Participou deste momento histérico um grupo de vinte © cinco evangélicos latino-americanos formado, conforme Escobar, por “pastores, professores de seminérios e institutos biblicos, lideres leigos ¢ missionérios, unidos por um interesse especial no _,ue fazer teoldgico”™’. I1.teressante observar ‘que as pessoas que participaram da criagao da FTL eram gente envolvida na tarefa ministerial da igreja. Nao cram tedlogos de carteirinha, mas por demanda ministerial e do contexto. ‘Samuel Escobar descreve da seguinte maneira o perfil teol6gico e eclesial dessas pessoas: ‘Nem Arana, nem Padilla, nem a maioria dos outros evangélicos que fundaram a FTL poderiam ser descritos como fundamentalistas, porém se consideravam evangélicos cuja posigdo teolégica diferia em varios pontos do ‘que vinham expressando os tedlogos do ISAL. Estes evangélicos no criam como necessério adotar 0 marxismo como método de andlise da realidade social, nem compartilhavam dx fé de que o mundo eatava marchando ramo ao socialismo, porém tampouco compartilhavam do anti-comujiismo ‘ingémuo dos missionarios conservadores™*. Pode-se afirmar que este era 0 perfil caracteristico dos teblogos evangélicos da missio latino-americanos. Gente talhada em meio as discuss6es isalinas (ISAL), mas também do evangelicalismo conservador. Tedlogos envolvidos com as igrejas latino-americanas e com 08 movimentos evangélicos de juventude como a CIEE — Comunidade Intemacional de Estudantes Evangélicos, bem como com a educagio teoldgica e as organizages missionérias. LONGUIN © Novo Rosto da MiB0, p16. 3 Ibidom, p. 164 % ESCOBAR, La Fundactin de lo Ratemidad Teoliglen latienamascana: Breve ensayo hiskéice, in, PADILA, 25 ‘anos de Teologia Evangéice Latinoomericane. BJ. Sbidem,p. 11 | 8 ‘No entanto, tal potencial latino-americano ainda sofria restrigSes do intervencionismo protestante estrangeiro. Orlando Costas, bem como os evangelicais de Porto Rico no foram convidados a participar da reuniio de criago da FTL. Nesta mesma época as instituigdes evangélicas de Costa Rica, nas quais Costas atuava, passavam por um momento de nacionalizagio, dando origem a instituigdes autéctones. Isto parece ter gerado um mal estar com as forgas do movimento de missio externas a América Latina. Orlando Costas comenta sobre o fato: Foi durante esse mesmo tempo que se organizou a Fratcmidade Teolgica Latino-americana (F-T-L.). Interessantemente, todos os que trabalhavamos com 2 Misséo Latinoamericana ficamos de fora da reunido organizadora (Cochabamba, Bolivia). Forgas de fora da América Latina se haviam imposto para impedir a presenga daqueles que, segundo cles, representavam uma linha contestatéria dentro do movimento evangélico””. Costas esclarece que tanto Samuel Escobar como René Padilla que estiveram presentes no evento de criagéo da fraternidade, se manifestaram contra a decisio. Na reunigo Posterior em Tima, Peru, ele integrou o grupo da FTL e, como afirmou: “A partir desse momento minha reflexo teolégica tem estado ligada ao itinerdrio da Fraternidade”®*. ‘Um outro evento de grande porte organizado pelo evangelicalismo histérico foi o Congreso Internacional de Evangeliz: 740 realizado em 1974, na cidade de Lausanne —Suiga. Ele também foi muito importante para o evangelicalismo latino-americano e inspirou as discusses nos CLADES posteriores a ele. Foi um evento de cariter interdenominacional ¢ mundial, organizado pela Associagdo Evangelistica Billy Graham, do qual 0 CLADE I foi criado para ser a representa¢ao continental preparatéria. John Stott afirmou que 0 evento contou com mais de cento e cingdenta nagGes representadas. Sobre essa diversidade de povos ele comentou: [.-] pois os 2.700 participantes, com todo o espectro de pigmentagto de pele € de trajes colorides, pareciam ter vindo de todos os cantos do globo. Foi ‘special motivo de goz0 0 fato de que 50% dos panicipantes, e também dos oradores, bem como da Comissio de Planejamento, fossem oriundos do ‘Terceiro Mundo”. Samuel Escobar foi um dos palestrantes que representaram a América Latina em Lausanne. Ele falou sobre a “A Evangelizagdo e a Busca de Liberdade, de Justica ¢ de Realizagao pelo Homem”. A tese da sua palestra iniciou-se com a seguinte referéncia: * COSTAS. Teologo en ja encruciioda. In: C. PADILLA, René (Ed). Hacio una Teolagia Evangélica Latinoomericana. kane. Catbe, 1984, B25 f 2 toidem, p. 25. 2 STOT John, John Stott comento o Pacto de Lausanne. 0 Pav: ABU, 1962. p.9. 23 Imagine toda a populagZo do mundo condensada numa aldeia de 100 habitantes. Desse nimero, 67 seriam pobres. Os 33 restantes, em grau variado, seriam ricos. De toda populag%o, somente 7 seriam norte- americanos. Os outros 93 ficariam vendo os 7 norte-americans gastarem metade de todo o dinheiro, comerem um sétimo de todo o alimento e usarem metade de todas as banheiras existentes. Esses 7 teriam dez vezes mais médicos do que 02 outros 93. Nease interim, continuariam cnriquecendo cada vez mais, enquanto os 93 continuariam empobrecendo”. Outro palestrante latino-americano foi René Padilla que discursou sobre “A Evangelizagdo e 0 Mundo”. Sua tese envolveu o seguinte assunto: A falta de apreciagto das dimensdes mais amplas do Evangelho leva inevitavelmente a compreender mal a misso da Igreja. O resultado disso € ‘uma evangelizagdo tendendo a considerar 0 individuo como uma unidade em si mesma — um Robinson Crusoé a quem Deus dirigesse seu apelo muma ilha = cuja salvagdo s6 se dé em termos de relagéo com Deus. Deixa-se de perceber que 0 .individuo ndo vive isolado ¢, consequentemente, que € impossivel falar de salvagdo sem se referir ao mundo do qual ele faz parte" © Pacto resultante das discussdes de Lausanne elaborou ainda de forma timida a questao do compromisso sécio-politico e cultural da Igreja (acesse a0 Pacto no site de Riibens Amorese: http//www.amorese.com.br/COMUNICARTE/PactLaus.html). Mesmo assim, ele representou uma abertura do evangelicalismo para o tratamento destas questées. O chamado Pacto de Lausanne tomou-se um referencial para o evangelicalismo hist6rico e mundial, e a presenga do Terceiro Mundo no evento foi significativa para essa concluslo, Certamente, 0 terceiro mundo fez owvira sua voz entre os participantes em geral. O CLADE II foi convocado e dirigido pela FTL em 1979, na cidade de Lima, Peru, 0 que revela o avanco do movimento evangélico latino-americano rumo 4 autonomia. Ele teve como finalidade discutir a importéncia do Pacto de Lausanne para a América Latina. Longuini destaca como um dos principais articuladores teolégicos desse periodo o Pr. Orlando Costas, que fomentou a discussdo teologica em torno da evangelizagao ~=i relagSo a todas as questoes implicitas ao tema, Longuini ressakou: trabalho desenvolvido por Costas recebeu atengéo especial no campo da evangelizagdo e com um grupo de alunos no SBL iniciou um projeto para cexplorar os fundamentos histéricos, biblicas e sisteméticos da evangelizagao, ‘bem como sua problemética numa época extremamente conturbada para a ‘América Latina, O relevante naquele processo foi a reflexdo que tomou como paradigma no apenas a secularizagao vigente na Europa e Estados ‘Unidos como incluiu na pauta outro até eno intacado pelos evangclicais: 0 da revolugdo como um provesso social latino-americano”. © ESCOBAR. SamuSl A Evangelzagae @ @ Buses de Uberdade, de Jusica © de Realzaede pelo Homem. In. ‘GRAHAM, Bly e oL A Missd0 do lea. 2. ed. $80 Pao: ABU, 1964. 172. “PADILLA, C. René. A EvangolzagSo @ © Mund. In: GRAHAM, Bly et ol. A MissGo da kyeja. 2. ed. SBo‘Paulo: ABU, 1984. p.lai SLONGUN, op. ct. 183. ‘Orlando Costas foi um dos tedlogos mais importantes para o surgimento da Teologia da Missao Integral da Igreja, asseverou Longuini: “Costas iniciou um frutifero processo na busca de uma missiologia contextual e integral”. Ele o fez em preocupagao com 0 tema da evangelizacao, mas tratada no conjunto da TMI. Certamente estevam dados os passos hhistéricos iniciais para a construgao de uma forma de missiologia que tosse caracteristicamente latino-americana, diferenciada, dialégica e integradora. No documento do CLADE II transparece a consciéncia dos problemas reais da América Latina, e 0 desejo expresso de agir em prol da sua transformagao. O caminho proposto ¢ 0 da evangelizacao integral, visto ser o tema da evangelizago a razo do proprio evento e a preocupagio caracteristica do evangelicalismo. A. teologia evangélica latino- americana estava se definindo como uma teologia da missiio. Em 1989, na cidade de Manila, Filipinas, foi realizado 0 congresso que recebeu 0 nome de Lausanne II. A intengio era de retomada & énfase na evangelizagao nos moldes do fundamemalismo norte-americano. A agenda, infelizmente, nao oportunizou nova participago de teélogos latino-americanos. O congresso de Manilla, sem diivida, nao aleangou a importincia do Congresso de Lausanne que continuou sendo, através de seu pacte, ‘© marco pare 0 evangelicalismo histérico. © CLADE If foi sediado pela cidade de Quito, Equador, em 1992. Também foi organizado pela FTL e procurou continuar a discuss4o sobre a Missio Integral na América Latina. Sempre considerando os desafios sécio-eclesiais emergentes em nossa regio. O evento contou com a participagio de 1080 congressistas representando diversos grupos sociais, como mulheres, liderancas eclesiésticas, indigenas, leigos, académicos, ete. 26 paises da América Latina foram representados no congresco. Sobre ele Longuini faz a seguinte descrigio: © novo rosto do movimento evangelical latino-americano estava refletido no CLADE I, sobretudo no resto indigena, feminino e da raga negra. CLADE TI foi, também, uma reafirmacdo da missdo integral da igreja (holismo), um compromisso com a unidade dos cristlos e a relevincia da justiga social relacionada & pregagdo do evangelho™. O CLADE IV também foi realizado na cidade de Quito, em 2000. Nesta época a fase do movimento evangelical Istino-americano, conforme encabegado pela FTL, era de amadurecimento. Neste evento foram discutidos os temas da relaggo da missio da igreja evangélica da América Latina com as Escrituras, testemunho cristo, liturgia, gruzos sociais, ‘idem p. 183. “tbidem p. 199. 25 etc. O documento final do CLADE IV é bastante expressivo revela realmente um amadurecimento da Teologia da Misséo Integral da Igreja. Apés 0 reconhecimento dos /ersos problemas sociais da América Latina, ele apresenta a formalizagao do compromisso de esforgo pela transformagao desta realidade, sempre pela via da fé e da ago missionaria da igreja. Assim encerra 0 documento do CLADE IV: ‘Concluimos esta declaragio com a afirmagao de que a Palavra de Deus nos ‘convoca a ser comunidades proféticas e solidérias com a dor e o sofrimento que destroem a vida ¢ a dignidade de nossas nagées, pois entendemos que arte medular de nossa missdo é perseguir a justica para todos, no poder do Espirito Santo™. No Brasil, 0s eventos que buscaram discutir Lausanne e os CLADES para a realidade brasileira, foram os CBES ~ Congressos Brasileiros de Evangelizaco. Foram organizados dois eventos na cidade de Belo Horizonte, MG, um em 1983 e outro em 2003. Os responsaveis pela organizagio desses eventos foram a FTL —Setor Brasil e as organizagbes de juventude MPC — Mocidade para Cristo e ABU —Alianga Biblica Universitiria, Todos estes eventos foram decorrentes de um movimento maior denominado de Movimento de Missio. O impacto de tais movimentos na América Latina foi na forma do surgimenty da teologia evangélica latino-americana, a Teologia da Misséo Integral. s primeiros esforgos de organizacio intema da Teologia da Missio Integral, foram ‘empreendidos pela FTL na forma de artigos, livros, realizago de eventos como os CLADE e da criagdo de disciplinas académicas sobre 0 assunto em ambientes de educago teolégica. Dentre os varios teélogos que participaram do esforgo de pensar a missSo integral da Igreja, destacou-se o Pr. Orlando Enrique Costas (que morreu de cancer em 1987), devido ao volume de sua produsao teolégica. Ele tratou de varios temas em relaco & evangelizagSo integral, seu assuinto de preferéncia. No conjunto da Teologia da Missio Integral, o tema da evangelizagdo foi 0 fio que alinhavou reflexdes sobre a Trindade, Cristo, o Espirito Santo, a Igreja, a ‘bes destacam-se os livros: Hacia Una Teologia de La Teologia, etc. Entre as suas put Evangelizacién, Compromiso y Mision, Evangelizacion Contextual ou Liberating News: A Theology of Contextual Evangelization. La Iglesia y su Mision Evangelizadora, Hacia una Teologia Evangélica Latinoamericana, The Integrity of Mission, Que Significa Evangelizar Hoy? Os artigos: A vida no Espirito Artigo, Teblogo en la encrucijada, Proclamando # Cristo n0 Mundo dos Dois Tergos, La Teologia Evangélica em el Mundo de los Dos Tercios, ¢ outros. “SLONGUINL op. cit, p.214, 26 III- Teologia e Evangelizagao a teologia é a espinha dorsal da Igreja... A Igreja necessita entender ‘sua mensagem para poder ser verdadeiramente a Igreja. (Orlando Costas) a) Teologia e Evangelizacio: 0 problema da dicotomi Para que a Igreja cumpra realmente sua miss4o de evangelizagio, é preciso que ela possua um contetido teolégico que nao somente vai substanciar seu anincio, mas orientar sua apdo evangelizadora. © Congresso de Lausanne, que aconteceu em 1974 na cidade de Lausanne na Sufga tratou, entre varios outros temas relacionados a evangelizago, sobre a falsa dicotomia entre 4 responsabilidade social e a evangelizagao. Ele foi de extrema importincia para a Igreja ‘evangélica em geral c, principalmente, para a Igreja Latinu-amerivara. Nele foram definidos varios aspectos referentes & evangelizago que ainda hoje orientam a discussio sobre 0 assunto em nosso meio evangélico. Jé 0 CLADE ~ Congreso Latino- americano de Lvangelizagio, tém sido realizado, periodicamente, visando atualizar discutir 03 rumos do pensamento ¢ da pritica evangelizadora da Igreja na América Latina. No Brasil, 0 CBE — Congresso Brasileiro de Evangelizagéo visa cumprir 0 mesmo papel de fomentador da discussio sobre a evangelizagdo integral, para a Igreja brasileira. Porém, todas essas discussées ainda nao tem sido suficientes para ‘superar a dicotomia entre a evangelizagao e a reflexio teolégica, como se fossem duas priticas completamente distintas e irrelacionaveis. Esta postura tem resultado em um modclo de ‘evangelizago niio teolégico e desprovido de contetido. Valdir Steuernagel desabafa sua preocupago em relag&o a isso em uma de suas crénicas:“A minha preocupagao é que, no final das contas, o evangelho se transforme em mero artigo de marketing, onde ele acaba sendo aguado ¢ transformado num produto qualquer, embora religioso”. ' A preocupagao do missidlogo nfo é sem razo, pois hé necessidade de que nossas atividades evangelisticas sejam norteadas por principios biblicos, teoligicos e histéricos, tomnando seu discurso substancial e a metodologia context :almente eficiente. Caso contririo, nic passaré de mero ativismo religivsy geradur de membros da Igreja local,‘ mas néo necessariamente de discipulos de Jesus Cristo. 27 b) O conteiido teolégico do Evangelho e a Evangelizagio Como evangelho entendemos as boas noticias da realizagfo em Jesus Cristo do propésito redentor de Dens, que foi revelado no decorrer da histéria humana e teve em Jesus Cristo seu desfecho através de sua encamagdo, morte, ressurreigo, ascensio e teré sua consumacao na parusia. Este é 0 conteido fundamental da mensagem evangelizadora ¢ 0 Ponto de partida para a motivagio da evangelizacSo cristi que, deve ser integral, isto & envolvendo em seu discurso e pritica toda a realidade humana e tudo aquilo que a ela est relacionado. Como definiu Lausanne: “o evangelho todo para o homem todo”. Sabemos que Jesus Cristo é 0 contetido central da evangelizagao, através do seu evangelho. Nao ha outra mensagem que possa salvar o ser humano, a nfo ser aquela que ‘anuncia a sua obra salvadora. E a abordagem de Jesus deve ser integral, isto é, envolver tanto © conteiido teolégico como histético de sua vida e obra, entendendo que ambos so necessérios para a promogaio de uma real conversio a ele. Mas, é preciso entendermos que a obra de Jesus Cristo envolve a todalidade da hi.:¢.ia da salvagaio. Nada menos do que toda a atuayar de Deus no’ mundo, desde seus atos criadores até a parusia, é 0 contetido fizndamental do Evangelho de Cristo. Essas so as “boas noticias”: Deus no desistiu de sua criag4o, ainda que esta tenha se rebelado contra Ele, mas atuou na histéria humana, usando homens, mulheres, situagées politicas, culturais, sociais das mais diversas, a fim de resgatar para Si tudo aquilo e todos aqueles que legitimamente Ihe pertencem, ou que se submetem ao seu reinado. Sendo assim, a conversio deve ser muito mais do que uma mudanga de atitudes ¢ comportament6s eticamente incorretos ou socialmente inaceitaveis. Ela deve ser resultado de um arrependimento individual ¢ coletivo de rejeigdo e alienag3o de Deus, e isto abrange a histéria da salvagdo como um todo. Envolve, também, a compreensio de que Cristo possibilitou, através de sua obra salvadora, a reversio da condigdo de pessoas distantes de Deus para a condigo de filhos de Deus e participantes de seus propésitos de salvagio, bem ‘como integrantes dessa hist6ria com Deus. ‘Numa definigao simples Orlando Costas diz. que o “Evangelho sfo as boas novas da obra salvifica de Deus em Cristo” e que a evangelizagdo é “a confrontago dos homens com © evangelho”' . Sendo assim, evangelizar é tornar conhecida essa obra salvadora de Cristo tanto através de nosso testemunho, nosso servigo no mundo, nosso culto a Deus, como, Principalmente, através da proclamaeio do povo de Deus que se dé na histéria e no mundo. Essa proclamagao envolve em termos de distincia “até os confins da terra” e em termos de tempo: toda a histéria humana. No emtanto, somente poderemos entender eficarmente a encamagdo © sua importancia para nossa salvaedo se_compreendermos a revelagao histérica de Deus. Como entenderemos a cruz e seu poder salvador se no dimensionarmos a gravidade do pecado ¢ da alienago de Deus que © mesmo provoca? Nao hé como entendermos a ressurreigdo se no considerarmos a importincia da cruz ¢ seu poder regenerador. Como compreender a ascensto de Cristo se nio entendemos sua realeza, seu sumo- sacerdécio e seu senhorio? A f€ cristi no € um movimento religioso que surgiu ha dois mil anos atrés, através da lideranga de um homem judeu, eficiente em proselitismo. Ao contrario, a fé crist surge como o desfecho de toda uma atividade divina em prol da salvagio da humanidade. Atividade esta que deve ser lembrada e atualizada pelo povo de Deus, através de sna atividade teol6gica, citica e evangelizadora. Mas, somente compreenderemos methor estas verdades & partir da nossa reflexto sobre a fé, ou seja, fazendo teologia. Para isso, devemos considerar eu primeira mao os textos bfblicos, pois a Palavra possui primazia em nossa tarefa teolégica. Todavia, de forma alguma podemos desprezar a contribuigdo dos pais da igreja, os credos, os concilios e suas fSrmulas doutrinérias. Também devemos considerar toda a produglo dos diversos pensadores que a historia nos apresenta, principalmente os reformadores e seu legado para o Protestantismo. Os avivamentos do séeulo XVII e XVIII também sto fundamentais para ‘compreendermos nossa natureza evangelizadora, ¢ da mesma forma hé uma importincia ‘mprescindivel na teologia moderna, com todo o seu racionalismo. A Teologid Latino- americana entéo € vital para que possamos pensar uma evangelizagto contextualizada. ‘Sempre visando no um conhecimento especulativo, mas, como aponta Samuel Escobar, “o ovo de Deus ¢ sua capacitagio para a Missio”. Podemos afirmar, conclusivamente, que 0 contetido da mensagem do evangelho é absolutamente teol6gico. Quando a Igreja se distancia da teologia perde sua identidade como comunidade Profética e de evangelizagao, visto que ela deixa de compreender 0 contetido fundamental da ‘ua proclamagao e papel como igreja no mundo. O que Ihe resta a partir dai sio os modismos dos movimentos que se entitulam éclesiais, mas que no passam de técnicas de animasdo, agrupamento de pessoas e fidelizagdo de adeptos. A Ekklesia tou Theou, “Igreja de Deus”, ‘ilo € um ajuntamento de pessoas em torno de um nome de alguém eficiente em oratéria, 29 mas sim, em tomo do nome de Jesus Cristo, o filho de Deus. E a comunidade daqueles que reconhecem a obra salvadora de Jesus Cristo, a celebram em seu culto, a anunciam em sua proclamacdo ¢ a testemunham em seu servigo no mundo. O agrupamento daqueles que esto dispostos a tomar a sua cruz e seguir apés Cristo e manter-se figis em miso no aguardo da sua volta. E também extremamente importante para uma compreensfio da evangelizagio, entendermos que as ages de Deus sio de alcance universais e mesmo aquelas que se dio no meio do povo de Deus, seja Israel (0 povo da antiga alianga) ou seja a Igreja (da nova alianga), visam 0 mundo todo e toda a histéria, Timéteo Carriker faz a seguinte afirmagao “Nada menos que o mundo inteiro pertence & esfera do interesse de Deus”, fazendo referéncia a universalidade de Deus ¢ de seus atos como, conseqtientemente, da missio da Igreja. Nao podemos reduzir o agir de Deus aos ambitos da comunidade da f8. Assim afirmava 0 salmista em seu cAntico: “Pois do Senhor é o reino, é ele quem governa as ‘nngéeo” (SI. 22. 28). Outros Salius como 47. 8-9; 149. 6- 9 ensinam que toda a terra com seus paises ¢ nagdes esto & mercé das agGes de justiga de Deus. ©) A priixis da evangelizagao Assim, a evangelizagao néo deve surgir como mero esforgo estratégico ot metodolégico, ‘mas sim como resultado da propria teologia. Deve ser um esforgo individual e de vida do cristo, mas, 20 mesmo tempo, comunitario, pois é tarefa da Igreja, que foi comissionada pelo Senhor Jesus para a evangelizagao do mundo. A evangelizacio deve resultar do pensar sobre Neus, da conseiéneia teoligica do pove de Deus. Como no caso da Igreja do primeiro século, conforme Michael Green menciona a0 referir-se sobre a motivagdo evangelistica dos primeiros cristdos: ‘Nao pode haver muitas dividas de que a principal motivaao para a evangelizagao era teolégica... Fizeram- no por causa da experiéncia extraordinaria do amor de Deus que Jesus Cristo lhes proporcionara. A descoberta de que a maior forga do universo era o amor, e que este amor tinha descido ao ponto mais baixo da auto- humilhago para o bem da humanidade, teve um efeito sobre os que creram, que nada poderia remover.” Isto esta muito claro nos evangelhos, pois eles narram, teologicamente, a obra de Jesus, As énfases dadas pelos evangelistas e as relagdes estabelecidas com 0 Antigo Testamento demonstram claramente este esforgo. Embora 0 contetido histérico seja importante para a 30 » J ] > > > > > > > > > J > > > > > > > > > , p J > > » > J , , > > > > > > > > > é . > . compreenséo do evangelho é evidente que nfo esto falando simplesmente de uma pessoa ‘que surgiu na histéria fazendo coisas interessantes, ndio sto escritos biogrificos. Estes textos falam de alguém que desenvolveu uma obra espetacular em seu tempo histérico através de seus ensinos ¢ milagres, que anunciava a chegada do reino de Deus, que fora pré- anunciado pelo Antigo Testamento, ¢ que era reconhecido como o servo, 0 Messias, 0 filho do Homem, © filho de Deus, 0 logos divino, enviado de Deus, et.. Os evangelhos apresentam todo um conteiido teolégico sobre Jesus. Sao a base para a ‘compreenso Dele ¢ de sua obra, como do reino que Ele trouxe ao mundo. No entanto, no decorrer dos textos e, principalmente ao final na chamada “Grande Comissio” eles deixam claro que o propésito maior é tornar tais fatos conhecidos por todo o mundo. Seus registros esboram todo um contetido teolégico visando capacitar a Igreja para a missio querigmética que deveria ser desenvolvida ao longo de sua existéncia. Em relago a prixis evangelizadora podemos mencionar também que, quando a ‘evangelizago € orientada pelas Escrituras e surge de uma reflexio teol6gica, ela nfo teré dificuldades quanto abrangéncia. Pois a evangelizagfo biblica € integral, ou seja, compreende no somente o ser humano como um todo, mas integrado a uma realidade também abrangente. A evangelizagéio, nesse caso, é em fungao da criago e sua redencao. 4) Por uma Teologia evangelizadora Orlando Costas, 20 falar sobre a aco evangelizadora da teologia faz a seguinte adverténcia: De igual modo, uma atitude de inditerenga em relagdo & evangelizacio, seria © fim da teologia como espinha dorsal da Igreja, j& que, como temos indicado, a teologia tem a ver com o evangelho mesmo, que nfo é um conceito abstrato, sim um evento dindmico que se move em dirego a um fim e rumo a um propésito especifico. Assim como @ teologia procura entender a mensagem do evangelho, assim a evangelizagto da finalidade a esta mensagem, e por conseguinte, dé propésito e sentido & teologia. Assim como a Tareja necessita entender sua mensagem para manter sua identidade, assim também necessita transmitir essa mensagem para dar consisténcia a essa reflexdio.” © objetivo maior da teologia, além de ser pensar a mensagem do evangelho, € possibilitar 0 conhecimento de Deus exposto e declarado em Jesus Cristo e sua obra, que é 0 contetido do evangelho. Para tanto, faz-se necessério que a teologia reconheca ¢ considere seu carater soteriologico, como verdade redentora. Seu contetido € muito mais que um 31 conjunto de conclusées cientificas, ele ¢ transformador, € a sabedoria de Deus (I Cor. 1.24) revelada aos seres humanos em sua histéria e contexto. Paulo de Gées a0 escrever sobre 0 caréter € conteiido cientifico da teologia adverte: Estabelecer aparatos cientificos para a teologia sem levar em conta sua ‘natureza ¢ mais do que simplesmente quebrar sua fluéncia. E maté-la, por mais forte que seja esta expressto. E superficializar aquilo que brota das profundezas. E racionalizar verdades que nos chegam envolvidas pela paixo pelo sabor da existéncia, enquanto dons de Deus. Formlizi-las, apenas para que o discurso teol6gico ganhe identidade precisa no mundo das cigncias, € gelar sua cadéncia € quebrar o ritmo que Ihe é préprio, fazendo ‘com que a melodia se aliene de si mesma jé no seu nascedouro." O missi6logo Orlando Costas, que vimos citando no decorrer desse texto, também afirma que a teologia tem como ponto de partida a iniciativa de Deus em auto revelar-se a hhumanidade a fim de salvé-la. Ele faz uma observago que considero oportuna: A auto- revelag3o de Deus indica que 0 propésito tinico da teologia é, [...] 0 conhecimento pessoal de Deus, e as repercussées verticais e horizontais que hé nesse conhecimento: a adoragio © a piedade™ . Sendo assim, fica evidente a fungfo querigmética da teologia, visto que seu contetido maior e fundamental é a revelago de Deus ¢ esta é intencionalmente redentora. ©) Por uma evangelizasio teolégica Jé enfatizamos que a evangelizago sem o contetido préprio do evangelho, a obra salvadora de Cristo, no passa de mero ativismo que néo se caracteriza com o verdadeiro propésito de redimir os seres humanos distantes da comunhio com Deus. O verbo “evangelizar” tem sua origem no termo grego Euangelizé , que por sua vez significa 0 ato de “proclamar, anunciar as boas novas” ou o “euangelion”, neste caso, fazendo referéncia a obra de Deus em Cristo para nossa salvagao. Podemos concluir, entdo, que a evangelizagdo somente é evangelizayo quando é teolégica. Sua finalidade é a restaurago de toda a criago de Deus. Nosso problema no & metodolégico, muito menos de emprego das “técnicas” corretas de evangelizagfo, mas sim, de fundamentagio teol6gica, motivagio ¢ finalidades. Precisamos entender porque evangelizamos e qual deve ser 0 contetido de nossa mensagem. O “como evangelizar” & questio de contextualizagao ¢ seré muito mais determinado pelo contexto cultural e social de onde se daré a pritica evangelistica. e 32 IV - Igreja e Evangelizagio no CLADE Os CLADEs - Congressos latino-americanos de evangelizacio, sio eventos organizados pela FTL ~ Fraternidade Teolbgica Latino-americana, visanda discutir sobre a teologia evangélica latino-americana, 0 papel da Igreja em seu contexto e a sua responsabilidade evangelizadora. Jé foram realizados quatro CLADEs: CLADE I - 1969 - Bogoté Constituigiio da FTL ~ 1970 — Cochabamba (México) CLADE II - 1979 —Lima (Peru), tema: “Para que a América Latina ouga a voz de Deus”, CLADE III - 1992 ~ Quito (Equador), tema: “Todo o Evangelho, para todos os povos, a partir da América Latina”, CLADE IV - 2000 ~ Quito (Equador). Conhecemos as discusses dos CLADEs I ¢ Il a partir do relatério final dos eventos. Jé os CLADEs III e IV resultaram também em algumas publicagdes que organizam o conteiido nas Palct.as e outras atividades dos congressos. a) Uma Eclesiologia missiondria A compreensio de Igreja na TMI se depreende da propria teologia da missio. Nao se concebe outra Igreja, sendo aquela missiondria. Que se entende enviada ao mundo, para comunicar através da sua vida e movimento 0 conhecimento de Deus. No CLAWE I no hi uma eclesiologia latino-americana evidente, pois 0 evento foi ‘organizado sob a tutela do esforgo missionério do evangelicalismo mundial. A compreenséo de Igreja que o evento demonstra ¢ relacionada & unidade e diversidade da Igreje universal, na {qual é compreendida a igreja latino-americana. O documento afirma que a evangelizago é a esséncia do ser da Igreja e sua principal tarefa. No entanto, essa evangelizagio deve ser realizada na dindmica dos dons do Espirito Santo. E Ele quem capacita a Igreja para a sua misséo evangelizadora. No entanto, reconhecem que a evangelizago e, portanto, a Igreja se realiza “em situagdes concretas”. E devido a isso que ela precisa ser conhecedora de sua pripria realidade “se se desconhece essa realidade, desfigura-se 0 evangelho e empobrece-se a vida crista”, a 33 luz dos ensinos de Jesus Cristo e do que afirma a fé evangélica. Seu conhecimento da le deve ser em vista de seu papel como agente de transformagao da realidade sécio- hist6rica, em fungio da construgio de um mundo melhor para todos. Uma Igreja consciente de seu papel no mundo, se pre-ocupard com as demandas de seu tempo historico. Ela se envolveré tamto com a prociamagao do evangelho quanto com o ensino e a edificagao daqueles que 0 acolhem, promovendo, eqtltativamente, um crescimento orginico saudavel. Por outro lado, 0 documento em anilise esclarece que a Igreja evangélica nfo é uma instancia fechada em si, mas frente aos esforgos de renovaco do catolicismo, esforga-se por dialogar ouvi-lo a partir da fé evangélica. O texto conclui afirmando que a Igreja é aquela que recomhece suas limitagées, mas busca agir no mundo no poder do Espitito Santo que a ‘capacita para a miso, © CLADE Il foi o primeiro congresso organizado pela FTL ¢ com uma agenda mais especifica em relago a Igreja latino-americana. No documento, primeiramente eles descrevem o contexto em que sc localiza a igreja latinu-aucrivam de sua €poca: Temos levantado os olhos para o nosso continente e contemplado o drama e «a tragédia em que vivem nossos povos nesta hora de inquietacdo espiritual, confusto religiosa, d.cadénci~ moral e comvalsbes sociais e politicas. Temos owvido 0 clamor dos que tem fome e sed. «> justiga, dos que se ‘encontram desprovidos do que & basico para sua subsisténcia, dos grupos étnicos marginalizados, das familias destruidas, das mulheres despojadas do so de seus direitos, dos jovens entregues ao vicio ou impulsionados violéncla, das criangas que sofrem fome, abandono, ignordncia e exploracdo. Por outro lado, temos visto que muitos latino-americanos esto se entregando 4 idolatria do materialismo, submetendo os valores do ‘spirito aos valores impostos pela sociedade de consumo, segundo 0 qual 0 ser humano vale nao pelo que é em si mesmo, mas pela abundéncia dos bens que possui. Ha também os que, em seu desejo legitimo de reivindicar 0 direito a vida e liberdade ou de manter o estado de coisas vigente, seguem sdeotogias que oferecem wma andlise parcial da realidade Jatino-americana € conduzem a formas diversas de totalitarismo e & violagdo dos direitos umanos, Existem, ainda, vastos setores eseravizados pelos poderes saténicos que se manifestam em formas variadas de oculiismo e religiosidade. No entanto, o quadro ndo ¢ somente de softimento e de tristezas. A Igreja é o lugar onde se visualiza a esperanga, e, sobre ela eles afirmam: “Louvamos a Deus, contudo, porque em meio a esta situagdo 0 Espirito de Deus tem se manifestado poderosamente... Muitas Igrejas tém sido renovadas em sua vida e missio. O povo de Deus avanga em sua compreensio do que significa o discipulado radical em um mundo de mudangas constantes ou stbitas”. No entanto, as falhas da Igreja em relagdo a falta de unidade e de solidariedade para com os que sofrem na América Latina, comprometem seu testemunho do evangelho de Jesus 34 ‘Cristo. Mas, o documento encerra com a afirmagao de que é possivel umdar esse quadro ¢, no poder do Espirito Santo, a Igteja padert ser 0 que ela é chamada a sex no mundo e, assim, presenciar as segnintes obras de Deus em seu meio: “salvar integralmente a muitissimas pessoas, consolidar ou restaurar nossas familias ¢ levantar uma comunidade de £6, que seja uma antecipagao, em palayra e ato, do que seri o reino em sua manifestaco final”. © CLADE MI foi um evento marcante. Organizado pela FIL ele pode expressar os principais anseios da Tgreja evangélica que se reconhecia como latino-americana. Ao mesmo te10po, cle foi realizado em uma data mito significativa para os poves na Amériea Latina: quando se complstavam 500 anos da chegada dos colonizadores. Neste evento, mais que em nenhum outro, esta igreja se reconheceu como também responsivel pela misso, no somente ‘ns América Latina, mas em todo o mundo, Trata-se de uma Igreja missionéria. Conforme a “Declaragio de Quito” (Dcumento do CLADE Il) a Igreja é a ‘comunidade crisda por Deus “perdoada ¢ reconciliada chamada a ser agente de perdio reconciliagdo em um contexto de édio e discriminagdo”. Mas ela também € chamada a “comunidade o Espirito”, aquela através da qual o Espirito Santo age primeiramente no mundo através dos seus dons e poder. Sobre ela eles expressam A Igreia, comunidade de reconciliados com Deus, & enviada a0 mundo or Jesus Cristo. Nela se opera uma transformagdo radical que mostra 0 Propésito divino de eliminar toda a injustica, opresséio e sinais de morte. ‘Como comunidade do Espirito, a igreja deve proclamar liberdade a todos os ‘oprimidos pelo diabo e impulsionar uma pastoral de restawragao que traga consolo aos que softem discriminacdo, marginalizacao ¢ desumanidade. A Igreja do Senbor Jesus Cristo é também a comunidade do Reino que chegou com Ele. F, come tal, ela no somente aguarda a plena manifestago desse Reino, como ja o vive em gua realidade eécio-histérica. Como comunidsde do Reino ela é designada a encamacionalmente “ser agente na redengio de toda a criagio”, ¢, assim, assumir a vida e tmissio de Jesus. Sua vida de justiga testemunhara o evangelho de Jesus Cristo frente aos poderes do mundo. 0 fato de estar no mundo possibilita & Igreja uma historia que the confere também identidade. Em vista disso, & preciso que ela conhesa suas origens ¢ busque reconhecer suas raizes protestantes, evangélicas, missiondrias € pentecostais, Mas deve fizé-lo em uma perspectiva critica, de modo a “examinar quais tém sido os pontos positivos e negatives da missiologia européia ¢ norte-americana, bem como dos que surgem daqui mesmo”. Outro aspesto importante da Igreja é seu compromisso cultural. Bla deve consideragio para com a cultura que faz parte. No entanto, ela precisa de mecanismos hermenéuticos a fim de que 35 possa comunicar o evangelho integral de Jesus Cristo sem comprometer a cultura, mas, rincipalmente, sem comprometer o contetido fundamental do proprio evangelho, Porém, sua condicao intra-mundo faz da Igreja também um elemento cultural. Devido a isso, ela deve aprender a valorizar a sua cultura, conforme afirma o documento “nossas raizes indigenas, afficanas, mesticas, européias, asiéticas e crioulas... Como Igreja latino-americana confessamos que temos nos identificado mais com valores culturais estrangeiros que com os autenticamente nossos...”. ‘Nossa localizagao néo se encerra ai, pois como igreja evangélica possuimos origens na Reforma Protestante ¢ precisamos recuperar sempre este ‘aspecto que é fundamental em nossa identidade. Nio podemos nos esquecer também que a Igreja é una e deve, em fungao disso, superar 8 divisionismos e fazer do diélogo em prol da unidade cristi é uma forma contundente de testemunhar Cristo ao mundo. Certamente, uma Igreja consciente do contexto do qual faz Parte € seus problemas que comprometem a vide © o bem estar da criaro, que se entende como Povo de Deus, povo missionario, comunidade da fé ¢ comunidaac do Reino, buscard agir em prol da transformagio dessa realidade, pela forga do evangelho ¢ poder do Espirito Santo: “A Igreja deverd afirmar que todo aspecto da vida nacional ¢ um campo legitimo para 0 servigo cristo”, ¢, em continuagao a isso “ é necessério que a Igreja assuma sua fuung&o profética para denunciar entre outras coisas © abuso do sexo, a manipulagio dos meios de comunicagao, 0 endeusamento do Estado, o dinheiro € a violéncia... O exercicio da lideranga na vida das igrejas locais deverd ser marcado pelo modelo do servo sofredor... Como comunidade apostélica a Igreja & representante de um evangelho universal, no sendo ele entio sua propriedade particular. As orientagdes do CLADE III concluem com a ‘afirmago de que, bascado na teologia do sacerdécio universal de todos os crentes, devemos compreender que toda a Igreja é missionéria e esté chamada a fazer a missio integral, conforme o fez. Jesus. OCLADE IV, como de costume dos evangelicais latino-americanos, inicia seu relatério descrevendo 0 contexto s6cio-econdmico e cultural do qual a Igreja faz parte ¢ ¢ chamada a responder. Ele o descreve como critico, em vista do neoliberalismo econdmico, detetiorag#o do meio-ambiente, corrupedo e “pauperizacio dos setores mais amplos da sociedade”, Mas & lum contexto também marcado por pluralismo religioso, um crescimento quantitative das 36 igrejas evangélicas nem sempre acompanhado por um crescimento em qualidade. Outro fator Preocupante ¢ 0 envolvimento de muitas igrejas com a chamada Teologia da Prosperidade, que, conforme o documento visa o incentive do consumo ¢ a ambi¢So 20 poder. Em resposta a isso, afirmam a necessidade da igreja reafirmar a autoridade das Escrituras, reconsiderar a natureza libertadora do evangelho, buscar a iluminaco e renovagao do Espirito Santo, filgir do modelo empresarial de lideranga eclesial e desenvolver um modelo de servigo como o de Jesus, incentivar a pratica da oragio e leitura da Palavra, defender a unidade e a comunhio do corpo de Cristo, reconhecer a imagem e semelhanca de Deus nos ‘grupos minoritérios como indigenas, mulheres, idosos, imigrantes, etc. © documento antecede os compromissos firmados pelos participantes com a seguinte declaragio teolbgica: ‘Nosso culto comunitario tem de ser prazeroso, espontiinco e contextualizado, Para que, num clima de liberdade, adoremos ao Senhor, sustentados na Palavra sob o impulso do Espirito. Necessitamos de uma teologia espiritual e uma espiritualidade mais teolégica. Precisamos de uma espiritualidade ‘trinitdria, comunitaria, centrada na palavra de Deus, reconciliadora ¢ missiondria. A realidade do pluralismo religioso nfo debilitara o chamado de ‘Deus e a pratica evangelizadora da Igreja. E ne ‘se sentido que, a luz dos CLADEs, podemos afirmar que a Igreja é 0 POVO DE DEUS, em relag&o de continuidade com 0 povo de Deus no Antigo Testamento, mas agora sob a novidade de Cristo e da nova alianga. Mas ela ¢ também a “comunidade do Reino”. Aquela que representa, anuncia e vive em conformidade com o Reino presente e futuro de Deus e sua justipa. Como tal, ela é comunidade missionéria, apostélica, enviada a0 mundo por Jesus Cristo (Mat. 28.19-20; Atos 16.15; Atos 1.8), para fazer discipulos de Cristo em todo o mundo. Sua missio faz dela também uma comunidade pneumatolégica, porque ela a reali Santo, sua forga dinamizadora. Por ser encarnada e participante do tegral, tal como o evangelho de Jesus Cristo. A Igreja também é comunidade de adorago a0 Deus Trino, que o celebra em seu culto. Culto que é a constante atualizagio da obra salvadora de Jesus Cristo e a antecipagao da grande celebrasio a ser realizada na consumagéo do Reino (Apocalipse 5.8-14), e para onde converge nossa missio. 37 V - Cristologia e Evangelizacio em Orlando Henrique Costas A Cristologia de Orlando Henrique Costas“*, explicitada em sua Teologia Contextual da Evangelizagdo, parte de uma concepeo protestante-evangelica, a partir de um contexto Jatino-americano. Em seus escritos ele aponta Jesus Cristo como a boa nova anunciada pela Igreja em misso no mundo. Cristo também ¢ 0 contetido do kerigma neotestamentério, o que faz com ‘que a cristologia resulte necessariamente em soteriologia, pois nfio ha como pensar a Cristo sem considerar a salvagdo por ele providenciada. Sua obra salvadora, realizada através da encamagéo, morte, ressurreiggo e ascenso & que possibilita aos homens e mulheres a verdadeira libertago, entendida nfo somente na perspectiva sécio-politica, mas integral, a partir da compreensio do homem como um todo e que est no mundo fazendo parte de uma rede de relaydes que o afetam © sto afetadas por ele. Para Costas a libertacdo se dé principalmente em relago ao pecado humano, que é também abrangente. Sobre isto ele afirmou: “o pecado... nfo sb é violéncia contra o préximo, mas é violéncia contra si mesmo. Traz a conseqliéncia da alicnagao total do homem de seu préximo, da criagc, do Criador e de simesmo”, 0 que torna necessério uma salvaco integral, amplamente libertadora. Para que isto seja possivel, é preciso pensar em uma cristologia também integradora, que considere a pessoa de Jesus Cristo em conjunto com sua obra. Para Costas “Uma dicotomia entre a obra e a pessoa de Cristo compromete a autoridade efetividade evangelizadora do feito de Cristo” “”. E preciso considerar a Cristo também de forma integral ‘2 que oua obra aleanga a todos em todos 08 aspectos ¢ a tudo neste mundo. ‘Uma cristologia integral terd como ponto de partida a encarnago de Cristo em sua presenga ¢ obra histérica no mundo. Conceberd o fato “de que Deus se fez carne ¢ habitou centre 0s homens (Jn. 1.14)”, muito mais que isto, incorporou-se a esta humanidade “A encamagéo de Jesus aponta, pois, para sua necesséria incorporaggo & humanidade pecadora”®, mas o faz para salvar esta humanidade. Ele esclarece sobre isto: * Orlando Henrique Costas, pastor Batista, nascido em Porto Rico, naturalizado norte-americano, atuou na América Latina como pastor e missiélogo e produziu vérios textos sobre a Evangelizacao Contextual, numa Perspectiva evangélica e em dilogo com a Teologia da Libertagio. Faleceu aos 45 anos vitima de cincer, mas ‘gua teologia da evangelizagdo tem sido objeto de estudos, dissertagSes ¢ teses nos dias de hoje. ‘X Orlando H. COSTAS, Hacia uma Teologia de la Evangelizacién, p. 115. “Idem, p. 116. Idem, p. 117. 38 Jesus se situa culturalmente, condicionado pelo tempo € 0 espago. Nao leva @ cabo sua missdo evangelizadora em primeira instincia como o todo poderoso Filho de Deus, sim como pessoa enviada por Deus um um momento particular da histéria ¢ em uma situagdo cultural especifica. Se identifica com um povo concreto, fala sua lingua e vé a realidade desde sua situagao sécio-cultural”™ A euvarnayao no possui um fim nela propria, mas encontra seu sentido em toda a obra de Cristo. ‘A morte de Jesus dé sentido & sua encamagio. Conforme Orlando Costas ela significa Redengo, ou seja, libertago humana de forma integral, envolvendo todos os aspectos da vida humana afetados de alguma maneira pelo pecado. A morte de Jesus significa também Oferta Substitutiva, onde o préprio Cristo € oferecido como propiciagao pelo pecado da humanidade, 4 luz da tradigao sacrificial do Antigo Testamento. Conforme Costas “O sangue vertido, simbolo de uma vida santa e imaculada, fez possivel a satide da humanidade,e por tanto, sua regeneracdo ¢ transformacio”*'. Mas, a cruz também é Reconciliagao, onde todas as coisas fo rectauradas om Jecus Cristo, possibilitando a néo um relacionamento amoroso com Deus, conosco, com o préximo e com toda a criagao. Outro ponto a que remete a cristologia evangélica de Orlanio Costs & a ressurreig.o como cumprimento ¢ selo da cruz. E da ressurreigo que conforme ele se desprende o poder reconciliador ¢ redentor da cruz, tomtando-se 0 Spice do kerigma cristoligico. £ ressurreigo que a liberdade e a vida sdo restituidas aos homens, que delas j& podem usufruir ‘em sua vida no mundo, como antecipagao da propria parousia. por meio da A ascensio de to aponta para a sua entronizacao, ministério intercessério, e a0 ‘mesmo tempo em que Jesus Cristo & 0 Deus encarnado, que se fez homem, & também 0 Cristo césmico, que sustenta wdo e no qual tudo subsiste. Neste sentido, a mensagem evangelizadora é também 2 mensagem do senhorio de Jesus sobre todas as forgas dominantes no mundo. Mas, a cristologia da evangelizacdo também remete para a escatologia. O Cristo que ‘veio a0 mundo inaugurando o tempo escatol6gico, do reino que ja se faz presente, é também 0 Cristo que viré em cumprimento as suas préprias promessas. Nesta perspectiva, a evangelizagao além de conffontar 0 homem com o seu presente ¢ a libertago que Cristo oferece em sua realidade histérica, conffonta-o também com seu futuro ¢ a necessidade da salvagdo numa perspectiva que vai além do seu tempo hi-t6rico. ® Ortando H. COSTAS, Evangelizacién Contextual, p. 45. *" Orlando H. COSTAS, Hacia uma Tealogia ola Evangelzacién, p. 118. 39 A evangelizagao que surge desta cristologia é um convite a f€ a esperanca em Jesus Cristo, bem como a perceber na vida os sinais concretos da presenga e os efeitos da obra salvadora de Cristo, que terdo na perousia a sua plenitude. (Obs.: Outros textos sobre o assunto vocé encontra em: hy Jiwww.evteologiaemissas jextos_3.ht

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