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MARABÁ
2017
RONALDO GIUSTI ABREU
MARABÁ
A RESPONSABILIDADE PENAL AMBIENTAL DAS PESSOAS JURÍDICAS
Resumo
Introdução
O ser humano demorou milênios para adquirir uma consciência ambiental,
segundo a qual os recursos naturais são finitos e precisam ser preservados, para as
atuais e futuras gerações.
1
Advogado, bacharel em direito pelo Centro de Estudos Superiores do Estado do Pará-CESEP e
matriculado no curso de pós-graduação em Direito Ambiental do Centro Universitário
UNINTER .
2
Me st re e m Dire it o n a P UC/ P R. E spe cia list a e m Dire it o Crimin a l pe la Un icu rit ib a .
Esp e cia list a em Dire it o do Tra b a lh o p e lo Ce n t ro Un ive rsit á rio UNI NTE R. G ra du ad a
e m Dire it o p e la P UC -P R. A dvo ga da at ua nt e n as á re a s t rab a lh ista e cí ve l.
P ro f e sso ra O rien t ad o ra de TCC no Cen t ro Un ive rsit á rio UNI NTE R .
O Estado vale-se do direito penal para a proteção do meio ambiente, uma
vez que o Direito Ambiental tem como objeto maior a tutela da vida, em particular a
vida humana.
O presente trabalho tem como objetivo estudar e pesquisar sobre a
responsabilidade penal ambiental das pessoas jurídicas.
Institucionalmente, o objetivo deste artigo é a obtenção do título de pós-
graduação em Direito Ambiental pelo Centro Universitário UNINTER.
Cientificamente, o objetivo deste trabalho é analisar a problemática da
responsabilidade penal das pessoas jurídicas pelo cometimento de crimes
ambientais, tendo em vista o princípio societas delinquere non potestat, segundo o
qual, só cometem crimes as pessoas naturais.
Assim, desenvolvemos o seguinte problema de pesquisa, em razão dos
objetivos propostos:
- As pessoas jurídicas podem ser responsabilizadas penalmente pela
prática de crimes ambientais, face o princípio societas delinquere non
potestat?
Em virtude do problema desenvolvido, levantaram-se as seguintes hipóteses
para a pesquisa:
a) Não seria possível a responsabilização penal ambiental das pessoas
jurídicas, em razão do princípio societas delinquere non potestat,
segundo o qual só podem cometer crimes as pessoas naturais;
b) As pessoas jurídicas poderiam ser responsabilizadas penalmente por
cometimento de crimes ambientais, em que pese o princípio societas
delinquere non potestat.
Tendo como base a descrição do tema investigado, o método utilizado teve
como técnica de investigação a pesquisa bibliográfica, doutrinária e jurisprudencial.
Para Savigny, citado por POGGIO SMANIO (2004, p. 1), a pessoa jurídica
é uma criação artificial da lei e, como tal, não pode ser objeto de autêntica
responsabilidade penal, que somente pode recair sobre os reais responsáveis
pelo delito, os homens por trás das pessoas jurídicas. Esse pensamento ainda é
adotado nos dias de hoje por ampla doutrina.
Ensina o caput do art. 225 da Constituição Federal de 1988 (2015) que
“Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder
Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e
futuras gerações”.
O §3° do artigo 225 da Constituição estabelece a responsabilidade penal
das pessoas jurídicas, por infrações lesivas ao meio ambiente, ao dispor que “As
condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os
infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas,
independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.
Logo, resta evidente a intenção do legislador constitucional pátrio de
flexibilizar o principio societas delinquere non potestat, uma vez que ensina que
as pessoas jurídicas também estão sujeitas às sanções penais por suas condutas
e atividades lesivas ao meio ambiente.
b. Abordagem legal
No Brasil, a Lei n° 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, inseriu
definitivamente no arcabouço legal ordinário a responsabilidade penal das
pessoas jurídicas, pelo cometimento de crimes ambientais.
A referida lei, já no seu art. 3°, leciona: “As pessoas jurídicas serão
responsabilizadas administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta
Lei, nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante
legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua
entidade”.(grifamos).
CAMARGO (2011, p. 16), ao mergulhar nos ensinamentos de TEIXEIRA,
assim conclui acerca do advento da lei ambiental brasileira:
A Lei nº 9.605/1998 dispôs sobre as sanções penais e administrativas
para as condutas e atividades lesivas ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado e, ainda, precursoramente tipificou os delitos ambientais
imputados às pessoas físicas e às pessoas jurídicas de direito público ou
de direito privado, sendo impar ao dispor sobre responsabilidade penal
de pessoa jurídica, o que significou um grande avanço na proteção
ambiental.
c. Abordagem doutrinária
Quatros correntes doutrinárias abordam o tema, segundo CAVARET LOPES
(2016, p.2/3).
A primeira corrente sustenta que a norma foi interpretada de maneira
equivocada. Para essa corrente, o legislador constituinte quis dizer que às pessoas
jurídicas estão reservadas somente as sanções administrativas. As sanções penais
estariam reservadas somente às pessoas físicas.
A segunda corrente ensina que a responsabilidade penal, diferentemente da
responsabilidade civil, não é objetiva, por isso, esta corrente, baseada na teoria da
ficção, considera que nossa teoria criminal impossibilita a responsabilização penal
do ente coletivo, pois este não possui vontade própria, nem consciência da ilicitude,
ou seja, não possui culpabilidade. Desse modo, a pessoa jurídica assumiria o papel
de autor imediato, enquanto a pessoa natural seria o autor mediato do delito,
portanto o ser culpável. Sobre a culpabilidade, Cleber Masson leciona que "não se
admite a punição quando se tratar de agente inimputável, sem potencial consciência
da ilicitude ou de quem não se possa exigir conduta diversa" (2015, p. 110).
Seguida pelo Superior Tribunal de Justiça, a terceira corrente afirma ser
possível a responsabilização das empresas através do sistema da dupla imputação,
pois assim restaria preenchido o elemento subjetivo, qual seja, a culpabilidade do
ente moral.
Assim, a imputação simultânea da pessoa física e da pessoa jurídica seria
a maneira da pessoa coletiva figurar no polo passivo da ação penal. Seguindo esse
raciocínio, para que a pessoa jurídica seja condenada, é necessária também a
condenação da pessoa física. Afastada a pessoa natural da ação penal, esta, por
consequência, seria extinta em relação à pessoa coletiva.
De acordo com a quarta corrente, a aplicação do sistema das imputações
paralelas não é requisito obrigatório para o ajuizamento da ação penal contra a
empresa, pois a Constituição Federal não impôs tal exigência – a maneira de como
o ente moral será responsabilizado criminalmente – nem mesmo fez ressalva
alguma quanto a lei que irá dispor futuramente sobre o assunto, bem como o art. 3º,
da Lei 9.605/1998, que dispõe sobre quais são os requisitos para responsabilizar a
empresa, não faz menção ao concurso do ente moral com o natural. O Supremo
Tribunal Federal adotou este entendimento no julgamento do RE 548.818 PR.
Em reforço à tese de responsabilização criminal das pessoas jurídicas,
GOMES (1999, p. 89) bebe na fonte da doutrina inglesa, embora com ênfase nos
crimes cometidos contra a livre concorrência, pelo que ensina:
A doutrina inglesa, holandesa e americana, tendo à frente,
principalmente, John Vervaele, de Utrecht, sustenta que, se a pessoa
jurídica tem capacidade de ação para contratar, tem também capacidade
para descumprir, por exemplo, criminosamente o contratado, logo tem
capacidade de agir criminosamente. Além do mais, principalmente no
que se refere ao Direito Penal Econômico, ilícitos existem em que a lei
prevê, exclusivamente, a conduta da empresa. É o que acontece, entre
outros exemplos, com os crimes contra a livre concorrência. Quem
exerce a concorrência desleal é a empresa. A ação da pessoa natural
que atua por conta e no proveito dela é expressão do agir da empresa,
pois quem pratica a ação é a própria empresa.
Adequando a doutrina inglesa ao tema em estudo, quem agride o meio
ambiente, na maioria dos casos, é a pessoa jurídica, logo tem capacidade de agir
criminosamente e por tal ação deve responder.
d. Abordagem jurisprudencial
As decisões dos tribunais brasileiros acerca do tema enfocado demonstra
com clareza a dificuldade da afirmação das normas constitucional e legal pelo
Poder Judiciário.
Segundo ensina AYALA (2008, p. 402), essa dificuldade se situa em dois
aspectos principais: a) reconhecimento da própria possibilidade de
responsabilização da pessoa jurídica; b) aplicação da pena à pessoa jurídica, uma
vez reconhecida a eficácia da norma constitucional.
Acerca do primeiro aspecto, verifica-se o desenvolvimento dos debates
mais relevantes e a exposição das oposições mais severas em relação à eficácia
da norma constitucional.
Registre-se que somente no início do século XXI, através de acórdão do
Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (2001), admitiu-se, no Brasil, a
possibilidade de responsabilização penal de pessoas jurídicas pela prática de
delitos, independente de seus dirigentes.
Seguindo na esteira dessa decisão, o Tribunal Regional Federal da 4ª.
Região confirmou decisão da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba, que recebeu
denúncia contra a Petróleo do Brasileiro S/A.
Segundo PEDRO (2006, p. 6), no dia 6 de junho de 2005, o Jornal Valor
Econômico noticiou que, pela primeira vez um tribunal superior autorizara
processo penal contra uma empresa, por cometimento de crime contra o meio
ambiente.
De acordo com a reportagem, o processo envolve um posto de gasolina do
município de Videira (SC), que seria responsável pelo lançamento de óleo, graxa
e outros produtos químicos no leito de um rio. A inclusão da empresa na denúncia
foi permitida pelo STJ – Superior Tribunal de Justiça, por força de recurso do
Ministério Público do Estado de Santa Catarina.
Em caso envolvendo a Petróleo Brasileiro S/A, o Tribunal Regional Federal
da 4ª. Região (Ayala, 2008, p. 403) admitiu expressamente a possibilidade de
responsabilização penal de pessoa jurídica, ao confirmar decisão de primeira
instância, que recebera denúncia formulada pelo Ministério Público Federal.
O Supremo Tribunal Federal, mediante decisão de sua Primeira Turma,
filia-se à quarta corrente doutrinária, já que em decisão da relatoria da Ministra
Rosa Weber, rechaçou a tese de condicionamento da ação penal ambiental à
identificação e à persecução concomitante da pessoa física, haja vista que tal
condicionamento não encontra amparo no §3° do Art. 225 da Constituição
Federal. Essa decisão contou com a seguinte ementa :
EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO PENAL. CRIME
AMBIENTAL. RESPONSABILIDADE PENAL DA PESSOA JURÍDICA.
CONDICIONAMENTO DA AÇÃO PENAL À IDENTIFICAÇÃO E À
PERSECUÇÃO CONCOMITANTE DA PESSOA FÍSICA QUE NÃO
ENCONTRA AMPARO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. 1. O art.
225, § 3º, da Constituição Federal não condiciona a responsabilização
penal da pessoa jurídica por crimes ambientais à simultânea persecução
penal da pessoa física em tese responsável no âmbito da empresa. A
norma constitucional não impõe a necessária dupla imputação. 2. As
organizações corporativas complexas da atualidade se caracterizam pela
descentralização e distribuição de atribuições e responsabilidades,
sendo inerentes, a esta realidade, as dificuldades para imputar o fato
ilícito a uma pessoa concreta. 3. Condicionar a aplicação do art. 225,
§3º, da Carta Política a uma concreta imputação também a pessoa física
implica indevida restrição da norma constitucional, expressa a intenção
do constituinte originário não apenas de ampliar o alcance das sanções
penais, mas também de evitar a impunidade pelos crimes ambientais
frente às imensas dificuldades de individualização dos responsáveis
internamente às corporações, além de reforçar a tutela do bem jurídico
ambiental. 4. A identificação dos setores e agentes internos da empresa
determinantes da produção do fato ilícito tem relevância e deve ser
buscada no caso concreto como forma de esclarecer se esses indivíduos
ou órgãos atuaram ou deliberaram no exercício regular de suas
atribuições internas à sociedade, e ainda para verificar se a atuação se
deu no interesse ou em benefício da entidade coletiva. Tal
esclarecimento, relevante para fins de imputar determinado delito à
pessoa jurídica, não se confunde, todavia, com subordinar a
responsabilização da pessoa jurídica à responsabilização conjunta e
cumulativa das pessoas físicas envolvidas. Em não raras oportunidades,
as responsabilidades internas pelo fato estarão diluídas ou parcializadas
de tal modo que não permitirão a imputação de responsabilidade penal
individual. 5. Recurso Extraordinário parcialmente conhecido e, na parte
conhecida, provido. (RE 548181, Relator(a): Min. ROSA WEBER,
Primeira Turma, julgado em 06/08/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-
213 DIVULG 29-10-2014 PUBLIC 30-10-2014).
Conclusão
Referências