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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA

INSTITUTO DE ARTES – IARTE


CURSO DE MÚSICA

Miguel Faria da Silva

Tarefa 3: Fichamento do trecho do livro "Feitiço Decente" de Carlos Sandroni

A síncope brasileira

No primeiro subcapítulo intitulado “A síncope brasileira”, o autor faz um grande


panorama contando e destacando a importância da síncopa no samba e na música popular
brasileira. Por ser um termo que foi criado pelos teóricos da música erudita ocidenteal, ao
autor discuti bastante essa relação da utilização do termo utilizada pelos sambistas,
fazendo um contraponto discutindo o significado do termo com base em dois dicionários
fazendo ligação com métrica e ritmo. Para entender um pouco mais sobre a síncope, o
autor discuti e traz referencias de pesquisadores que estudaram a música africana e que
acreditam que a síncope veio dos africanos na época da escravidão. Essa ideia de ritmos
sincopados com influência da África não existe só na música brasileira, mas também na
música norte-americana, com no jazz. Outro ponto abordado pelo autor foi sobre as linhas
guias e suas subdivisões e agrupamentos rítmicos.

O I Congresso Nacional do Samba aconteceu entre 28 de novembro a 2 de


dezembro na cidade do Rio de Janeiro, com a presença de compositores, intérpretes,
sambistas, estudiosos e amigos do samba, onde foi redigida uma Carta do Samba para
representar um esforço para coordenar medidas práticas e preservar as características
tradicionais do samba, sendo que uma delas era a utilização da síncopa.

“...alguns musicólogos viram na síncope uma característica definidora não apenas


do samba, mas da música popular brasileira em geral.”

Segundo Mário de Andrade, a síncopa é “característica mais positiva da rítmica


brasileira.”

“Na síncope, é como se o douto musicólogo paulista e o malandro carioca


encontrassem enfim um vocabulário comum.”

“As definições de síncope... deixam clara sua ligação com a ideia de que o ritmo
musical se estrutura com base na recorrência periódica de acentuações. Essa recorrência
periódica, que os autores citados chamaram também de “normal”, “esperada” etc., é
conhecida como “compasso”. Ora, o compasso, assim como a síncope, também não é um
universal da música. Na verdade, dentro da própria música ocidental ele é uma invenção
tardia, pois é só a partir do período barroco que seu emprego será sistematizado na
Europa.”
“Os pesquisadores brasileiros que escreveram sobre a importância da síncope
tenderam a atribuir a paternidade dela aos africanos que vieram com a escravidão.”

“...a rítmica ocidental é divisiva, pois se baseia na divisão de uma dada duração
em valores iguais.” “Já a rítmica africana é aditiva, pois atinge uma dada duração através
da soma de unidades menores, que se agrupam formando novas unidades, que podem não
possuir um divisor comum (é o caso de 2 e 3).”

“Ele percebeu a existência, na música africana, de um importante grupo de


fórmulas rítmicas em que a mistura de agrupamentos binários e ternários (as nossas
semínimas e semínimas pontuadas) dava sempre origem a períodos rítmicos pares: por
exemplo, a série 3+3+2 (ou seja, duas semínimas pontuadas + semínima) configura um
período de oito unidades; a série 3+2+3+2+2 configura um período de 12 unidades, e
assim por diante. Mas qualquer tentativa de dividir estes períodos pares em dois,
respeitando sua estruturação interna, levava a duas partes necessariamente desiguais,
estas ímpares. Assim, neste tipo de lógica rítmica, o período de oito não pode ser dividido
em 4+4, mas somente em 3+5 (ou 3+[3+2]); o período de 12 não pode ser dividido na
metade exata (6+6), mas apenas em quase metades (5+7, ou [3+2]+[3+2+2]). Arom
chamou este fenômeno de ‘imparidade rítmica’”

“Em muitos repertórios musicais da África Negra, “linhas-guias” representadas


por palmas, ou por instrumentos de percussão de timbre agudo e penetrante (como
idiofones metálicos do tipo do nosso agogô), funcionam como uma espécie de
metrônomo, um orientador sonoro que possibilita a coordenação geral em meio a
polirritmias de estonteante complexidade.”

“Ostinato variado”: “a fórmula rítmica assimétrica ora é repetida, ora variada


através de improvisações do músico responsável pela “linha-guia”.

“...o Brasil está muito mais perto da África do que da Europa.”

“No tambor-de-mina maranhense, no xangô e no maracatu pernambucanos, no


candomblé e na capoeira baianos, na macumba e nos sambas cariocas, entre outros,
fórmulas como 3+3+2, 3+2+3+2+2 e 3+2+2+3+2+2+2 fazem parte do dia a dia dos
músicos. Estas fórmulas em muitos casos comportam-se exatamente como timelines,
aparecendo sob forma de palmas, batidas de agogôs ou tamborins, em ostinati estritos ou
variados, muitas vezes coordenando polirritmias quase tão complexas quanto as
africanas.”

“Uma articulação rítmica será dita cométrica quando ocorrer na primeira, terceira,
quinta ou sétima semicolcheia do 2/4; e será dita contramétrica quando ocorrer nas
posições restantes, à condição de não ser seguida por nova articulação na posição
seguinte. Caso ocorra articulação em posição seguinte, ainda assim uma articulação nas
posições pares poderá ser contramétrica, mas à condição de apresentar algum tipo de
marca acentual.”
O paradigma do tresillo

No segundo subcapítulo intitulado “O paradigma do tresillo”, o autor discorre


sobre um ritmo assimétrico, bastante característico na música cubano que é o tresillo, que
se trata da construção de um ciclo de oito pulsações subdivididas em 3+3+2.

Esse padrão rítmico é encontrado atualmente na música brasileira de tradição oral


como o samba de roda baiano, coco nordestino, partido alto, maracatu e vários outros.
Esse padrão também aparece na música escrita no Brasil desde 1856, como por exemplo
o lundu “Beijos de frade” de Henrique Alves de Mesquita. Posteriormente, esse padrão
rítmico é encontrado em acompanhamentos de peças populares como as de Ernesto
Nazareth.

Segundo o autor, o tresillo possui algumas variações, dentre elas, a mais conhecida
como sincopa ou como Mário de Andrade definiu “síncope característica”, sendo um
padrão rítmico característico na música popular brasileira. Sendo assim, ele destaca:
“Afirmei que a ‘síncope característica’ podia ser considerada uma variante do tresillo.
Ora, o agrupamento de valores rítmicos proposto na versão com que costuma ser
apresentada na escrita musical não faz dela uma subdivisão do tresillo, mas do compasso
2/4 ocidental.” Ou seja, a síncope pode ser vista com um tresillo cujos grupos ternários
são subdivididos em 1+2.

“Se fizermos a experiência oposta, ou seja, se subdividirmos os mesmos grupos


ternários em 2+1, o resultado é uma figura rítmica que também aparece muito na música
popular brasileira...” “e que por ser constituída de cinco articulações recebeu de
musicólogos cubanos (pois também é frequente por lá) o nome de cinquillo.”

“Se, finalmente, subdividirmos o segundo grupo ternário, mas não o primeiro, o


resultado é outra figura rítmica de larga difusão na música brasileira da segunda metade
do século XIX e início do XX.” Trata-se da fórmula conhecida como o ritmo da habanera.

“A este conjunto de variantes proponho, pois, chamar de “paradigma do tresillo”.


Sua característica fundamental é a marca contramétrica recorrente na quarta pulsação (ou,
em notação convencional, na quarta semicolcheia) de um grupo de oito, que assim fica
dividido em duas quase metades desiguais (3+5).”

O argumento principal deste livro é que existe uma ligação entre o tipo de
contrametricidade (ou concepção do que seja música “sincopada”) configurada pelo
paradigma do tresillo e certa concepção do “afro-brasileiro” e do “tipicamente brasileiro”.
E que estas concepções musicais e não musicais associadas cederão lugar, por volta de
1930, a um novo paradigma rítmico e a novas ideias sobre o que é “ser brasileiro”, ao
mesmo tempo que os velhos gêneros confundidos cederão lugar ao samba como música
popular por excelência.
O paradigma do Estácio

Nesse subcapítulo, o autor traz um novo paradigma para incluir fórmulas rítmicas
que são despercebidas na literatura musicológica brasileira, diferentemente das fórmulas
rítmicas nos dois primeiros subcapítulos.

“Os sambas de Ismael Silva, Bide e Nilton Bastos, entre outros, diferenciaram-se
daqueles consagrados por Sinhô, pelo menos por sua pulsação rítmica mais complexa.
Enquanto estes guardavam vestígios de antigos maxixes, aqueles sambas que vinham do
Estácio [caracterizavam-se] pela agregação de mais uma célula rítmica à marcação.”

“Mukuna menciona, em sua obra sobre elementos bantu na música popular


brasileira, certo ciclo rítmico (a que não dá nome particular) que estaria presente no samba
e que “não tem sido discutido pelos estudiosos”. Este ciclo rítmico é por ele contraposto
à “síncope característica”, que também estaria presente no samba, mas como uma herança
do lundu.”

“O ciclo rítmico em questão é subdividido pelo autor em 16 colcheias,


segmentadas em dois grupos de 7 e 9. No entanto, indo mais longe, é possível concebê-
lo também — num segundo nível de segmentação — como sendo composto de
(2+2+3)+(2+2+2+3) colcheias, o que, como vimos, configura um caso de imparidade
rítmica.”

Sobre a clave d tamborim: “Qualquer pessoa que esteja familiarizada com o samba
de rua brasileiro, como pode ser visto no Rio de Janeiro pela época do Carnaval ... deve
conhecer a característica célula percussiva que atravessa esta música como um de seus
traços mais persistentes. Esta célula pode ser tocada em vários instrumentos, por exemplo
em um tambor agudo ... ou até num violão. Trata-se de um elemento focal, no qual os
outros instrumentistas, cantores e dançarinos encontram um pivô de orientação.”

“Qualquer habitante do Rio de Janeiro que tenha certo contato com rodas de samba
não terá dificuldade em reconhecer auditivamente estas figuras, ou mesmo em batucá-las
na mesa. Mas não sabemos ainda quais são as propriedades formais delas, pelas quais tal
reconhecimento se torna possível. Em outras palavras: não sabemos o que há de comum
entre todas estas variantes citadas por Didier, Mukuna, Araújo, Kubik, ouvidas nos discos
de Paulinho da Viola, Nelson Cavaquinho e tantos outros, tocadas em tamborins, cuícas,
garrafas — sem falar de outros instrumentos dos quais não dei exemplos —, que nos faz
em todos os casos situar sem sombra de dúvida o ritmo em questão como pertencendo ao
samba carioca posterior a 1930.”
REFERÊNCIA

SANDRONI, Carlos. Feitiço Decente: transformações do samba no Rio de Janeiro (1917-


1933). Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

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