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Situação problema 3

Sistemas Químicos

1. Contextualização
Diante de um vasto cenário de opções de sabores de cerveja encontrados, é importante o estudo
e análise dos impactos que cada etapa exerce. É sabido que a Brassagem (Mostura) é a etapa
com maior impacto no saber da cerveja. Essa etapa consiste no cozimento do malte na água, o
qual ocorre a ativação de enzimas, presentes no próprio malte, que são responsáveis por agir
sobre as proteínas e açucares, como o amido, presentes na solução malte + água.

Cada enzima tem sua maior eficiência baseado na temperatura em que se encontra, com isso é
possível aplicar rampas de temperatura por um período de tempo visando a ação de uma ou
outra enzima, resultando em características desejadas para a cerveja. As famosas enzimas
responsáveis para a geração de açúcares fermentáveis ou não são:

● Beta-amilase: sua temperatura ótima de ação fica na faixa de 55ºC à 65ºC e ela é
responsável pela geração de açúcares fermentáveis, que serão consumidos pelo
fermento resultando em uma cerveja com teor alcoólico maior e menos corpo.

● Alfa-amilase: sua temperatura ótima de ação fica na faixa de 68ºC à 73ºC e ela é
responsável pela geração de açúcares não fermentáveis, ou seja, quanto mais tempo
nesta faixa de temperatura, menor o teor alcoólico, e maior o corpo.

Para um melhor controle da ação dessas enzimas, faz-se necessário uma análise dos seus
comportamentos com relação a temperatura aplicada. Para tal análise, foi utilizado uma
modelagem matemática fenomenológica e em seguida é aplicado perturbações na temperatura
do cozimento, por fim é feito uma análise das concentrações de açucares fermentáveis e não
fermentáveis.

2. Modelagem Fenomenológica
É conhecido que, de maneira bem simplificada, as reações químicas presentes na etapa de
sacarificação podem ser representadas por:

Eq. 01

onde A representa o amido, F representa os açúcares fermentáveis, N representa os açúcares não


fermentáveis, k β e k αsão as taxas de reação da ação da Beta-amilase e Alfa-Amilase
respectivamente são simplificadas para:

Eq. 02
onde, r j é a constante cinética dada em 1/min, C A é a concentração de amido dentro da panela,
valendo inicialmente (C A (0)) 10 kmol/L, R é uma constante dada por 8.314462 J/(K⋅kmol), E j
é a energia de ativação dada em J/(K⋅kmol), T é a temperatura da mistura no interior da panela
dada em K, a je b jsão constantes empíricas de correções e j é um sub índice para indicar α ou β ,
onde seus valores são mostrado na Tabela 1.

j Ej rj aj bj

β 3361.5 0.05 0.09 -30.1535

α 1947.5357 0.05 -0.09 31.2535

Tabela 01 - Parâmetros da reação

2.1 Hipóteses utilizadas


Para a modelagem fenomenológica, é necessário inicialmente a definição das hipóteses
a serem utilizadas, que são:

 Reação em batelada;
 Perdas por evaporação são insignificantes em relação ao sistema total;
 Não existe entrada, nem saída de massa na panela, existindo apenas geração e consumo;
 A taxa de reação é de 1ª ordem;
 Todo o reagente (A) se converte em produto (F e N), não existindo formação de
subprodutos;
 O volume permanece constate durante todo o cozimento;
 Existe apenas 2 enzimas presentes no sistema: Beta-amilase e Alfa-Amilase.
 O sistema e encontra em sua totalidade com a mesma temperatura, não havendo
diferenças de temperatura em suas partes.
 A equação química da geração de açucares fermentáveis e não fermentáveis pelas 2
enzimas é representado pela Equação 1 e Equação 2, onde os parâmetros são
observados na Tabela 1.

2.2 Balanço de massa


O sistema consiste na transformação do amido, onde sua concentração é representada por C A,
em açucares fermentáveis e não fermentáveis representados, respectivamente por C F e CN, onde
o balanço pode ser visto na Figura 01.
Figura 01 - Balanço de massa das concentrações

Considerando as hipóteses, é possível observar na Equação 01 que 1 mol de A gera 1 mol de F


(Fermentáveis) e 1 mol de N (Não-Fermentáveis). A concentração C A acaba formando CF e CN,
como com isso, realizando o balanço, tem-se que a soma das variações das concentrações é
representada por:

C A +C F +C N =0 Eq .03

C A=− ( C F +C N ) Eq .04

O balanço por espécie pode ser compreendido da seguinte forma:

dCA
V =( C A 0 F 0−C A F )−Γ . V Eq.05
dt

Sendo, C A 0 e C A representado pela concentração do reagente A no início e no final da reação,


ao longo do tempo e F 0 e F sendo as vazões de alimentação e descarga do reator.

Como a reação é em batelada, não há alimentação e nem descarga do produto reagido, levando
o primeiro termo da Equação 05 a ter um valor nulo, pois F 0=F=0.

O termo Γ refere-se a taxa de reação, já demonstrada na Equação 02.

Substituindo cada taxa de concentração conforme a Equação 3 e Equação 4, têm-se:

−E β (a β T +bβ )
d CF RT
=r β e C A Eq.06
dt

−Eα (aα T+ b α )
d CN RT
=r α e C A Eq.07
dt

dCA d CF d CN
dt
=−
dt(+
dt
Eq .08 )
Substituindo os parâmetros da Tabela 1 nas Equações 06 a 08, têm-se as equações que
descrevem o consumo e geração dos componentes envolvidos, ou seja, o comportamento das
concentrações C A, C F e C N :
−3361,5 (0,09 T +(−30,1535) )
d CF 8,314462 T
=0,05. e . CA
dt
−1947,5357 ( −0,09 T +31,2535 )
d CN 8,314462 T
=0,05. e .C A
dt
−3361,5 ( 0,09 T+ ( −30,1535 ) ) −1947,5357 (− 0,09 T +31,2535 )
dCA 8,314462 T 8,314462T
=−10.0,05 . e +(−10. 0,05. e )
dt

É importante observar nas três últimas representações acima, que o ponto utilizado nas
expressões simboliza o sinal de multiplicação.

Como a reação acontece num sistema em batelada, não atribui-se ao sistema considerações
sobre vazão de alimentação e nem vazão de descarga. Por questões de simplificações, o sistema
não possui sistema de resfriamento, não sendo adequado falar sobre o balanço de energia do
sistema (tanque ou panela) e nem do balanço de energia do sistema de resfriamento (jaqueta ou
serpentina).

dCA
Vale destacar que a expressão em é atribuída com o sinal negativo, pois trata-se do
dt
reagente (concentração inicial), sendo o mesmo consumido para a geração do(s) produto(s). As
d CF d CN
representações de e são atribuídas com o sinal de positivo pois estão sendo
dt dt
formados ao longo do tempo (produtos).

O sistema abordado nesta atividade pode ser representado por uma configuração SIMO (
Single Input Multiple Output ), onde a entrada do sistema é a temperatura e as suas saídas são
as três concentrações (CA, CF e CN).

3. Simulações no sistema
Com base no sistema de EDOs encontrado, foi realizado simulações para verificar o
comportamento do sistema dada uma temperatura de cozimento.

1. Foi mantido a temperatura (T) constante durante toda a simulação em T = 55 oC,


gerando a Figura 02, T = 65 oC, gerando a Figura 03, T = 68 oC gerando a Figura 04 e T
= 73 oC gerando a Figura 05. A concentração inicial de A é igual a 10 kmol/L e as
concentrações iniciais de F e N são nulas.

As simulações confirmaram que temperaturas de 55°C a 65°C favorecem a Beta-amilase,


enquanto a faixa de temperatura entre 68oC à 73oC favorece a Alfa-amilase.

Nas figuras apresentadas a seguir, CA representa a concentração do reagente A, CF representa a


concentração do produto F (açucares fermentáveis) e CN representa a concentração do produto
N (açucares não-fermentáveis).
Figura 02 – Concentrações de CA, CF e CN para uma temperatura de 55°C

É observado que quando aplicado uma temperatura de 55 oC, a maior parte do amido é
transformado em açucares fermentáveis ( CF=8,799 kmol /L), isso ocorreu pelo fato da Beta-
amilase, responsável pela geração, é para essa temperatura mais ativa que a Alfa-amilase,
responsável pela geração de açucares não fermentáveis, em menor quantidade (
CN =1,201 kmol /L ).

Nota-se que a reação finaliza completamente no instante de tempo de aproximadamente 50


minutos, com um consumo total do reagente A (CA =0 kmol /L ).

Para esse tipo de reação a cerveja produzida apresentará um alto teor alcoólico e terá um baixo
valor de corpo.

Na Figura 03 é apresentado o comportamento das três concentrações quando a temperatura


passa para 65°C.
Figura 03 – Concentrações de CA, CF e CN para uma temperatura de 65°C

Ao aplicar uma temperatura de 65oC, é possível notar que a maior parte do amido resultou em
açucares fermentáveis, entretanto, devido a uma maior temperatura que na simulação anterior, a
proporção em relação aos açucares não fermentáveis se torna menor (
CF =5,564 kmol /L e CN =4,407 kmol / L), pois com o aumento da temperatura, a Alfa-
amilase se tornou mais ativa fazendo com que o sistema gerasse mais desses açucares não
fermentáveis. Para este cenário (T=65°C) a reação apresentou uma velocidade menor, visto que
o consumo total do reagente acontece somente no instante de tempo de aproximadamente 80
minutos.

Com este valor de temperatura a cerveja produzida apresentará um teor alcoólico maior do que
o corpo, porém seus valores estarão muito mais próximos, em relação a primeira simulação.

A Figura 04 apresenta a resposta das três concentrações para uma temperatura de 68°C.
Figura 04 – Concentrações de CA, CF e CN para uma temperatura de 68°C

Ao aplicar uma temperatura de 68 oC ocorre uma inversão na proporção dos açucares gerados. A
Alfa-amilase se encontra mais ativa que a Beta-amilase e com isso tem-se uma maior geração de
açucares não fermentáveis. O valor da concentração de fermentáveis e não-fermentáveis, no
equilíbrio, foi de 4,301 kmol/L e 5,658 kmol/L, respectivamente.

A reação completa ocorreu com um tempo de aproximadamente 90 minutos, onde todo o


reagente A foi consumido.

Neste cenário a cerveja produzida apresentará mais corpo, apresentando um sabor mais
adocicado, quando comparada com as duas primeiras simulações.

Na Figura 05 é apresentado o comportamento das três concentrações quando a temperatura do


sistema foi de 73°C.
Figura 05 – Concentrações de CA, CF e CN para uma temperatura de 73°C

Com uma temperatura de 73oC, a proporção de açucares é amplificada, gerando uma


predominância maior de açucares não fermentáveis. O valor da concentração de fermentáveis e
não-fermentáveis, no equilíbrio, foi de 2,488 kmol/L e 7,477 kmol/L, respectivamente.

A reação completa ocorreu com um tempo de aproximadamente 90 minutos, onde todo o


reagente A foi consumido.

Para os amantes de cerveja do tipo “encorpada” esse cenário é perfeito, pois, de acordo com a
resposta da simulação, esse tipo de cerveja apresenta um alto valor de corpo, com um baixo teor
alcoólico.

2. Para maiores análises, foi feito uma mudança, do tipo degrau, da temperatura em
determinados instantes de tempo, a serem: ts = 10 min, ts = 20 min, ts = 30 min e ts =
50 min.

Com isso, foi gerado, as simulações da Figura 06, Figura 07, Figura 08 e Figura 09. Na Figura
06 é apresentado o comportamento das curvas da concentração quando acontece um degrau na
temperatura no instante de tempo de 10 minutos.
Figura 06 – Concentração de CA, CF e CN para um degrau na temperatura de 65° para 70°C no instante
de tempo de 10 minutos

Inicialmente, pela Figura 06, é observado que a taxa do aumento da concentração de açucares
fermentáveis é superior a taxa de açucares não fermentáveis, entretanto, ao realizar a mudança
na temperatura, a taxa de crescimento diminui como visto na inflexão da curva no instante de 10
minutos, gerando, posteriormente, uma maior taxa de geração de não fermentáveis e com isso
ao fim da simulação, tem-se mais açucares não fermentáveis que fermentáveis.

É possível observar que em 65°C a formação de fermentáveis é maior e em 70°C a formação de


não-fermentáveis é mais acentuada, como visto nas simulações anteriores e na literatura (texto
base da atividade). Para a simulação da Figura 06 é observado que existe uma maior formação
de não-fermentáveis, não só pelo fato da temperatura final ser de 70°C, mais também por uma
outra consideração a ser analisada, que é a concentração do reagente A no instante de tempo de
10 minutos ainda ser elevada, com um valor aproximado de 5,5 kmol/L, tornando possível o
favorecimento da formação de não-fermentáveis.

Na Figura 07 é apresentado o comportamento das curvas das concentrações quando acontece


um degrau na temperatura no instante de tempo de 20 minutos.
Figura 07 – Concentração de CA, CF e CN para um degrau na temperatura de 65° para 70°C no instante
de tempo de 20 minutos

Com base na Figura 07, é possível observar uma inflexão na curva, semelhante a resposta
anterior, sendo que nesse caso ocorre no instante de 20 minutos, reduzindo a taxa de geração de
açucares fermentáveis e gerando uma proporção final muito próxima a 50% para cada tipo de
açúcar, ideal para quem quer um equilíbrio entre ambos no sabor (corpo) e teor alcóolico da
cerveja.

Para a simulação da Figura 07 é observado que existe uma igualdade (aproximado) na formação
de fermentáveis e não-fermentáveis pois, para este cenário, a concentração do reagente A no
instante de tempo de 20 minutos apresentou um valor aproximado de 2,9 kmol/L, tendo assim
pouco reagente para um maior favorecimento da formação de não-fermentáveis.

Na Figura 08 é apresentado o comportamento das curvas das concentrações quando acontece


um degrau na temperatura no instante de tempo de 30 minutos.
Figura 08 – Concentração de CA, CF e CN para um degrau na temperatura de 65° para 70°C no instante
de tempo de 30 minutos

É possível observar na Figura 08 que durante toda a simulação a formação de fermentáveis foi
maior, mesmo quando a temperatura passou de 65°C para 70°C no tempo de 30 minutos. Isso
ocorreu devido à baixa concentração do reagente A no tempo de 30 minutos, sendo
aproximadamente 1,5 kmol/L, valor esse insuficiente para favorecer o crescimento da
concentração de não-fermentáveis ainda que a temperatura esteja propícia para tal
acontecimento.

Na Figura 08 é apresentado o comportamento das curvas das concentrações quando acontece


um degrau na temperatura no instante de tempo de 50 minutos.
Figura 09 – Concentração de CA, CF e CN para um degrau na temperatura de 65° para 70°C no instante
de tempo de 50 minutos

A Figura 09 apresenta um comportamento semelhante à Figura 08, ocorrendo uma leve


superioridade no valor de formação da concentração de fermentáveis na Figura 08. No instante
da mudança da temperatura (tempo de 50 minutos), o valor da concentração do reagente A é de
aproximadamente 0,4 kmol/L, sendo possível afirmar que até o tempo de 50 minutos a
temperatura era de 65°C e todo amido já tinha sido convertido em açucares fermentáveis,
sobrando pouca quantidade de reagente para favorecer quaisquer invertidas da concentração de
fermentáveis e não-fermentáveis a partir de um tempo superior a 50 minutos.

As simulações apresentadas anteriormente servem para confirmar as análises do sistema por


meio das Equações (EDOs), onde, pela análise das Figuras 02 a 09, é possível observar um
comportamento de um sistema de 1ª ordem para as três concentrações. Pelas análises das
Figuras citadas observa-se que a concentração do reagente (CA), em todos os cenários
demonstrados, possui um ganho negativo pelo fato se estar sendo consumido ao longo do
tempo. As dinâmicas das três concentrações, representadas por sistemas de 1ª ordem,
apresentam constantes de tempo que variam conforme a mudança da temperatura do sistema.
Essa observação pode explicar conceitos sobre as velocidades das reações químicas (cinética
química), uma vez que os equilíbrios das reações ocorreram em tempos diferentes para
temperaturas diversificadas e serve para explicar os variados valores das concentrações finais
dos produtos CF e CN, para diferentes temperaturas, mostrando neste caso que os ganhos do
sistema também serão afetados por diferentes valores da entrada do sistema.

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