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Gestão do Conhecimento: O Conhecimento Como Fonte de Vantagem Competitiva

Sustentável

Autoria: Ricardo Lanna Campos e Francisco Vidal Barbosa

RESUMO: Globalização, aumento da competitividade, necessidade de organizações mais


“enxutas”, grande avanço das tecnologias de informação: estes são os principais fatores que
devem ser considerados pelas as organizações a fim de que estas elejam o conhecimento como a
única forma de se obter vantagem competitiva sustentável. Neste sentido, a Gestão do
Conhecimento busca mapear os ativos intelectuais residentes em uma organização de forma a
converter as competências essenciais de cada indivíduo em conhecimentos que permaneçam na
organização, mesmo sem a presença de tais indivíduos. Este artigo tem caráter descritivo e
exploratório e tem como objetivo desenvolver um tema que vem sendo estudado de forma
crescente no meio acadêmico, e que, porém, ainda é pouco considerado, na prática, pelas
organizações. Através dos conceitos de conhecimento, criatividade, aprendizagem e tecnologia da
informação, busca-se fundamentar o que vem a ser a Gestão do Conhecimento, seus objetivos,
sua importância e como ela pode ser aplicada na prática pelas empresas.

1. INTRODUÇÃO

O contexto econômico atual se caracteriza pela alta competitividade, pela sofisticação dos
consumidores e pela velocidade com que ocorrem mudanças. A efetividade operacional, baseada
na redução dos custos, no aumento da produtividade e na melhoria dos produtos é, atualmente,
um imperativo para que as empresas consigam competir num mercado cada vez mais acirrado.
Por outro lado, as empresas devem ser flexíveis o suficiente para atender a sofisticação dos
consumidores, ou seja, oferecer produtos de qualidade e adequados às necessidades e
características individuais dos clientes. Para atingir estes objetivos, as empresas devem estar
continuamente revisando seus processos produtivos, seus produtos, seus relacionamentos com
clientes, fornecedores, etc. Para isso, é necessário que haja uma constante inovação que, por sua
vez, é responsável pela velocidade com que ocorrem as mudanças nas formas de gestão
empresarial.

Neste sentido, as organizações têm procurado desenvolver novas formas de trabalho, de


comunicação, de estruturas e tecnologias e novos vínculos com os diversos agentes com os quais
interagem. Num ambiente turbulento como o que se apresenta nos dias de hoje, não há vantagem
competitiva sustentável senão através do que a empresa SABE, como consegue UTILIZAR o que
sabe e a rapidez com que APRENDE algo novo.

No passado a vantagem competitiva era obtida através da localização, do acesso à mão de obra
barata, aos recursos naturais e ao capital financeiro. Entretanto, quase sempre, a concorrência
conseguia igualar estes diferencias competitivos. Hoje, uma das principais formas de se obter
vantagem competitiva sustentável é através da gestão pró-ativa do conhecimento, já que este é
passível de gerar retornos crescentes e dianteiras continuadas. Isto ocorre porque o conhecimento
reside nas pessoas e pode ser utilizado para a geração de novos conhecimentos, alavancando,
desta forma, os negócios de uma empresa.

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Assim sendo, o sucesso nos negócios do século XXI depende basicamente da qualidade do
conhecimento que cada organização aplica nos seus processos corporativos / empresariais. O
desafio de utilizar o conhecimento existente na empresa, com o objetivo de criar vantagens
competitivas, torna-se crucial.

Este trabalho tem como objetivo desenvolver algumas questões a respeito dos princípios da
Gestão do Conhecimento, bem como de seus conceitos correlatos. Somente através da
compreensão destes conceitos torna-se possível entender a importância do conhecimento nos dias
atuais e como ele pode se tornar uma fonte de alavancagem da competitividade empresarial.
Apesar do conhecimento não ser um tema recente - pelo contrário, foi discutido por diversos
filósofos da antiguidade que remontam a Aristóteles, Platão, entre outros - a utilização do
conhecimento na área empresarial, como fonte capaz de gerar diferenciais competitivos, ainda é
incipiente e carente de maiores estudos.

Este artigo se trata de um estudo exploratório de caráter descritivo sobre o tema Gestão do
Conhecimento. A metodologia utilizada para a sua realização consistiu de uma ampla revisão
bibliográfica do material acadêmico que vem sendo escrito nos últimos anos, incluindo artigos e
livros, nacionais e internacionais, e uma tese de doutorado defendida em 1999. Primeiramente,
será discutido o conhecimento frente a evolução das teorias organizacionais. Posteriormente
serão abordados temas referentes ao conhecimento, à aprendizagem e à criatividade, visando
construir um arcabouço de idéias no qual possa se fundamentar os aspectos referentes a definição
e implantação de uma Gestão do Conhecimento. Por último, serão feitas algumas considerações
sobre as características e a importância da Tecnologia da Informação para a Gestão do
Conhecimento.

2. A CONCEPÇÃO DO CONHECIMENTO FRENTE AOS PRIMÓRDIOS DAS


TEORIAS ORGANIZACIONAIS

Considerando a evolução do capitalismo e dos diversos modelos de gestão, pode-se dizer que
hoje se vive na era do Capitalismo Intelectual. TERRA (1999), em sua tese de doutorado, aponta
estudos que comprovam que as taxas de retorno sobre investimentos em qualificação são mais do
que duas vezes maiores que aquelas obtidas em investimentos em fábricas e equipamentos.

A evolução das tecnologias produtivas tem feito com que os trabalhadores sejam reconhecidos,
de uma maneira crescente, pelo seu conhecimento e criatividade, diferentemente de épocas
anteriores, onde se reconhecia apenas a força da mão de obra e se descartava qualquer tipo de
raciocínio no chão de fábrica. Máquinas e robôs têm se ocupado da realização dos serviços
manuais e cuja realização prescindia do esforço físico humano. De forma simultânea, os
trabalhadores assumem a função de planejar e controlar a produção e de pensar em novas formas
de eficiência produtiva. De uma maneira geral, as empresas se encarregam de estimular e
recompensar boas idéias e melhorias propostas pelos funcionários. Porém, a capacitação e a
responsabilidade de um trabalhador atual, só foi possível após uma lenta e gradual evolução dos
modelos de gestão.

Nos tempos do artesanato, os conhecimentos sobre produtos e processos eram dominados e


integrados numa única pessoa: o artesão. Porém, a partir da publicação do clássico “A riqueza
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das nações”, de Adam Smith, iniciou-se uma gradual separação do projeto do produto e do
processo em relação à produção propriamente dita, em virtude da divisão do trabalho e
especialização na execução das tarefas.

A tendência de desqualificação do operário atingiu seu momento crítico na virada do século XX


através da propagação dos conceitos e princípios Fordistas e Tayloristas.

A chamada “Administração Científica” proposta por Taylor visava resolver “cientificamente” o


uso eficiente dos recursos humanos e desta forma garantir a “eficiência nacional”. Através do
cronômetro foi possível realizar o Estudo de Tempos e Movimentos, que tinha como objetivo
analisar os movimentos necessários para a execução de uma atividade, propor formas ideais de
execução e, consequentemente, minimizar o tempo total de realização da tarefa. Para Taylor, a
gerência era responsável pela função de reunir todos os conhecimentos tradicionais e reduzi-los a
normas úteis ao operário para a execução do seu trabalho diário. Com essa separação, os
operários estariam teoricamente isentos de precisar de qualquer conhecimento sobre processo e
produto.

Utilizando-se princípios de padronização do trabalho e do trabalhador, Ford criou em suas


fábricas o trabalhador intercambiável. Em síntese, Ford buscava um ajuste ótimo entre as
demandas mecânicas do trabalho e os requisitos físicos do trabalhador, para que não houvesse
qualquer desperdício de energia. A inteligência e a comunicação eram totalmente desnecessárias.
Para viabilizar a implantação deste modelo de gestão houve uma inovação na forma de
remuneração: o chamado “US$ 5,00 / day”.

Hoje, vivemos uma situação na qual há certa reversão: o que era fragmentado e isolado precisa
ser integrado. O mais importante é a integração dos conhecimentos, não apenas em nível dos
indivíduos, mas em nível organizacional e, em certos casos, inter-organizacional.

Mais do que isso, o que antes tinha um caráter estático passa a ser visto de maneira dinâmica: não
basta integrar o conhecimento; é preciso estabelecer uma dinâmica de contínua aprendizagem,
uma postura de aprender a aprender, para mudar sempre.

3. CONHECIMENTO, APRENDIZAGEM E CRIATIVIDADE

Apesar das evidências da importância crescente do conhecimento na gestão de negócios, seriam


as organizações capazes de gerenciar o conhecimento? A resposta a esta pergunta não é simples.
O conhecimento é criado apenas pelos indivíduos e a eles pertence. Uma organização não pode
criar conhecimento sem as pessoas. O que pode fazer é apoiar pessoas criativas e prover
ambientes adequados para que estas gerem conhecimento. Além da geração e/ou aquisição de
conhecimento, é preciso cuidar para que ele seja catalogado, transferido, assimilado e utilizado.
Faz-se importante, neste ponto, uma revisão sobre os conceitos de conhecimento, aprendizagem e
criatividade.

TERRA (1999), através de uma ampla revisão bibliográfica, gera algumas conclusões a respeito
das principais teorias sobre aprendizagem, conhecimento e criatividade: estes podem ser
definidos como processos ativos e laboriosos, que envolvem todos os sentidos do corpo, não
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havendo distinção entre o processo emocional e mental; se processam, em grande medida, no
subconsciente, sendo importante ressaltar o conhecimento tácito, que será abordado
posteriormente; resultam da resolução de tensões e liberação de angústias; apesar de dependerem
das experiências, tentativas e erros individuais, são processos sociais que dependem da interação
com outros indivíduos; incluem a capacidade de combinar diferentes “inputs” e perspectivas e
compreender relações complexas, por meio de um permanente processo de reformulação dos
modelos mentais e mapas cognitivos; e, por fim, estão associados a mudanças de comportamento.

A seguir serão descritos, de uma maneira um pouco mais detalhada, alguns conceitos e
características do conhecimento, da aprendizagem e da criatividade.

3.1 CONHECIMENTO

Estabelecendo-se uma hierarquia de valores, pode-se identificar o conhecimento como o topo de


uma pirâmide que possui como base os dados:

CONHECIMENTO

INFORMAÇÃO

DADOS

Fonte: Autor

DAVEMPORT & PRUSAK (1998) definem dados como “um conjunto de fatos distintos e
objetivos, relativos a eventos”. Entretanto, os dados por si só possuem pouca relevância. Uma vez
que estes assumem algum propósito, ou significado, eles passam a ser considerados informações.

As informações, por sua vez, são consideradas como tal a partir do momento em que contêm uma
mensagem a ser transmitida de um emissor para um receptor. Sua função seria mudar o modo
como o destinatário vê algo, exercer algum impacto sobre seu julgamento e comportamento. Os
dados se transformam em informações a partir do momento que o seu criador lhes agrega valor.

O conhecimento se origina da informação da mesma maneira que esta se origina dos dados.
Entretanto, para ocorrer a transformação da informação em conhecimento, é necessário que haja
um trabalho de comparação, análise das conseqüências e das conexões entre as informações e um
processo de interlocução com outras pessoas para a validação do conhecimento.

De acordo com DAVEMPORT & PRUSAK (1998) “conhecimento é uma mistura fluida de
experiência condensada, valores, informação contextual e insight experimentado, a qual

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proporciona uma estrutura para a avaliação e incorporação de novas experiências e
informações” (DAVEMPORT & PRUSAK, 1998, p. 06).
O conhecimento possui algumas características próprias como o fato de ser difundível,
substituível, transportável e compartilhável. Com base na abordagem de POLANY (1997), o
conhecimento pode assumir duas formas:

• Conhecimento explícito: também chamado de conhecimento codificado ou formal, pode ser


articulado através da linguagem e transmitido a indivíduos. Este tipo de conhecimento se
relaciona aos procedimentos, aos bancos de dados, às patentes e aos relacionamentos com os
clientes. Apesar da possibilidade de codificação, o conhecimento explícito deve ser avaliado e
tornado acessível a pessoas que possam fazer algo com ele e beneficiar a organização.

• Conhecimento tácito: também chamado de informal, significa o conhecimento pessoal


enraizado na experiência individual e envolvendo crenças pessoais, perspectivas e valores.
Refere-se também ao poder de inovação e à habilidade dos empregados de uma empresa para
realizar as tarefas do dia-a-dia. Polany cita uma frase que representa bem o conhecimento
tácito: “Podemos saber mais do que podemos dizer.” O conhecimento tácito é substancial,
complexo e não é passível de ensino. Além disso, não é articulado, não se pode observá-lo em
uso e nem documentá-lo. Não existem formas eficientes de se codificar o conhecimento tácito
em documentos ou banco de dados. O que se pode fazer é tentar mapeá-lo para que ele seja
localizado quando necessário. Para que haja uma descentralização deste tipo de conhecimento
é necessário a sua disseminação através de orientações e processos de aprendizagem.

Numa visão mais objetiva, o que realmente importa é como o conhecimento é adquirido e como
nós podemos usar este conhecimento – tanto explícito como tácito – de maneira a alcançar
resultados positivos que venham de encontro às necessidades da empresa. Algumas formas de se
gerar o conhecimento são descritas abaixo:

• Aquisição: pode ocorrer através da compra de uma outra empresa ou da contratação de


indivíduos que possuam o conhecimento
• Aluguel: geralmente se dá através de convênios e incentivos para a pesquisa acadêmica e
através da contratação de consultorias
• Recursos dirigidos: criação de departamentos específicos para a criação e difusão do
conhecimento
• Fusão: união de pessoas de diferentes setores da empresa para trabalharem em um problema
ou projeto de forma a se chegar a uma resposta conjunta. A vantagem deste tipo de geração
de conhecimento é a sinergia entre as pessoas da empresa.
• Adaptação: necessidade de se adequar atividades, processos e conhecimentos organizacionais
impulsionada por fatores ambientais
• Redes informais: através de encontros e conversas informais, o conhecimento pode se
solidificar e se tornar formalizado com o tempo

Por fim, para que uma empresa seja bem sucedida na geração do conhecimento é importante a
presença de três fatores: o tempo, o espaço e o reconhecimento da importância e da necessidade
de se alimentar o projeto.

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3.2 APRENDIZAGEM

FLEURY & FLEURY (1997) definem aprendizagem como um processo de mudança resultante
de prática ou experiência anterior, que pode vir, ou não, a manifestar-se em uma mudança
perceptível de comportamento.

Entre os vários modelos desenvolvidos objetivando-se explicar o processo de aprendizagem, três


se destacam: o Modelo Behaviorista, o Modelo Cognitivo e o Modelo do Aprendizado
Experiencial.

Segundo o Modelo Behaviorista, o aprendizado é verificado à medida que as pessoas mudam seu
comportamento em resposta a estímulos do ambiente. O seu foco principal é o comportamento,
pois este é observável e mensurável. Neste sentido, planejar o processo de aprendizagem implica
definir todo o processo, em termos passíveis de observação, mensuração e réplica científica.

O Modelo Cognitivo tenta explicar o aprendizado de fenômenos mais complexos e ocorre a partir
da compreensão das relações lógicas entre meios e fins e entre causa e efeito. Este modelo
procura utilizar dados objetivos, comportamentais e dados subjetivos. Também leva em
consideração as crenças e percepções dos indivíduos que influenciam seu processo de apreensão
da realidade.

Por fim, o Modelo de Aprendizado Experiencial infere que o aprendizado é, por natureza, um
processo de tensão e conflito, que ocorre através da interação entre o indivíduo e o ambiente,
envolvendo experiências concretas, observação e reflexão, que geram uma permanente revisão de
conceitos aprendidos. Ou seja, o aprendizado é um processo e não um produto.

A Teoria da Gestalt, precursora do cognitivismo, pesquisa o processo de aprendizagem por


insights.. Insight caracteriza-se como um processo que, quando completado, dá à pessoa a
impressão de ter subitamente compreendido alguma coisa ou chegado à solução de um problema.

Na aprendizagem individual tem-se o processo de mudança de convicções que são codificadas


como modelos mentais individuais. A aprendizagem organizacional não pode ser apenas a
transposição da aprendizagem individual. O modelo de aprendizagem organizacional dever ser
capaz de resolver o dilema de conferir inteligências e capacitações de aprendizagem a uma
entidade não humana. Para KLEIN (1998) a aprendizagem organizacional pode ser vista como a
capacidade de uma organização criar novo conhecimento, difundi-lo na organização como um
todo e incorporá-lo a produtos, serviços e sistemas.

As definições mais comuns de uma organização que aprende enfatizam sua capacidade de
adaptação ao ritmo acelerado das mudanças que ocorrem atualmente. De acordo com SENGE
(2000), a adaptabilidade crescente constitui apenas o primeiro passo no processo de
aprendizagem. O desejo de aprender vai mais adiante: é criativo e produtivo. Ainda segundo este
autor, as organizações devem desenvolver cinco “disciplinas” fundamentais para este processo de
inovação e aprendizagem:

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• Domínio pessoal
• Modelos mentais
• Visões partilhadas
• Aprendizagem em grupo
• Pensamento sistêmico

O pensamento sistêmico é responsável pela integração entre as demais “disciplinas”, de uma


forma coerente de teoria e prática, o que evita que cada uma seja vista de forma isolada, como
modismos desenhados para provocar mudanças organizacionais.

3.3 CRIATIVIDADE

A criatividade é um aspecto que contribui para o êxito de vários tipos de profissões. Assim sendo,
a literatura sobre este tema se apresenta bastante fragmentada. Entretanto, a tendência mais
recente é de analisá-la como um processo mental e emocional. DUALIBE & SIMONSEN JR.
(1990), definem as soluções criativas como uma liberação de energia necessária à eliminação de
angústias. A este processo, SENGE (2000), chama “tensão criativa”.

TORRANCE ( 1998), em seu estudo sobre criatividade, considera quatro fases para a ocorrência
do processo criativo:

1. Sentir dificuldades, problemas ou gaps nas informações


2. Adivinhar e formular hipóteses sobre estas deficiências
3. Avaliar, testar e revisar estas adivinhações e hipóteses
4. Comunicar os resultados

Por fim, vale ressaltar que o conhecimento e a criatividade só podem ser realizados a partir do
estabelecimento de inter-relações entre pessoas e destas com o contexto no qual estão inseridas,
respeitando-se as diferenças individuais e equilibrando-se as emoções resultantes.

4. GESTÃO DO CONHECIMENTO

A Gestão do Conhecimento surgiu devido a diversos fatores como as mudanças na economia


global, a preferência por organizações enxutas e o grande avanço das tecnologias nos campos da
informação e das comunicações.

Os conceitos e princípios da Gestão do Conhecimento tem se difundido rapidamente. Isto tem


tornado este campo de estudo extremamente amplo de maneira a englobar diversos outros
conceitos, tais como o aprendizado organizacional, ensino à distância, inteligência competitiva,
etc. Um ponto positivo desta multidisciplinariedade é a reunião em uma linha de pensamento de
conceitos que têm o mesmo objetivo, ou seja, a utilização do conhecimento para se alcançar as
metas organizacionais. Entretanto, a multidisciplinariedade da Gestão do Conhecimento
apresenta algumas desvantagens como a perda de foco e a incapacidade de lidar, de maneira
precisa, com todas as questões que lhes são impostas por sua abrangência.

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Apesar da diversidade de conceitos e perspectivas a respeito do tema Gestão do Conhecimento, a
seguinte definição, proposta por SVEIBY (1998), parece sintetizar as definições propostas por
outros autores:

“Gestão do Conhecimento é a arte de criar valor alavancando os ativos intangíveis. Para


conseguir isso, é preciso ser capaz de visualizar a empresa apenas em termos de conhecimento e
fluxos de conhecimento.”

Esta definição, diferentemente do paradigma da era industrial no qual a agregação de valor se


dava pela adição de recursos como energia e mão de obra, infere que as organizações criam valor
através da inteligência e competência das pessoas, assim como do relacionamento entre elas e
seus clientes.

Na prática, a Gestão do Conhecimento inclui a identificação e o mapeamento dos ativos


intelectuais ligados a organização, a geração de novos conhecimentos para oferecer vantagens na
competição pelo mercado e a acessibilidade a grandes quantidades de informações corporativas,
compartilhando as melhores práticas e a tecnologia que torna possível este processo.

O mapeamento dos ativos intelectuais significa a identificação e localização de conhecimento de


um grupo de pessoas sobre um assunto específico. Este mapa é uma representação das
habilidades e competências segundo uma visão integrada com o processo de negócios da
organização, onde cada funcionário, ou colaborador, tem suas competências mapeadas e
classificadas de acordo com o nível de conhecimento do assunto. Através do mapeamento é
possível localizar os principais “detentores” do conhecimento, assim como as pessoas ou grupos
que apresentam uma maior deficiência sobre um determinado assunto específico. Desta forma, é
possível a disseminação do conhecimento e a formação de equipes de trabalho para novos
projetos de uma maneira mais ágil e dinâmica.

Como foi dito anteriormente, a geração do conhecimento pode se dar através da aquisição, do
aluguel, de recursos dirigidos, da fusão, da adaptação e / ou através de redes informais

No que se refere à disseminação do conhecimento, é importante que a empresa estimule o


“benchmarking interno”, ou seja, localizar os principais fatores da eficiência interna e
desenvolver a disseminação das práticas bem sucedidas. No caso específico do conhecimento
tácito, a disseminação ocorre através da interação entre as pessoas e este processo pode ser
auxiliado por alguns recursos computacionais como intranets, recursos multimídia e de
hipertexto.

O principal objetivo da Gestão do Conhecimento, em termos de aplicação, é converter o capital


humano em capital intelectual. Apesar das expressões Gestão do Conhecimento e Capital
Intelectual serem muitas vezes usadas indistintamente, é conveniente notar que a primeira
comunica uma idéia de processo, portanto dinâmica e abrangente, enquanto que a segunda refere-
se à noção de estoque, o qual pode e deve ser gerenciado. Faz-se necessário neste ponto, um
maior detalhamento do conceito de Capital Intelectual que aliado à Gestão do Conhecimento vem
sendo considerado uma nova fonte de vantagem competitiva sustentável.

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O Capital Intelectual é o conhecimento de valor para uma organização, compreendido pelo
somatório do Capital Humano, com o Capital Estrutural de Inovação, com o Capital de Clientela.
O Capital Humano é a parcela renovável do capital intelectual e se caracteriza como as
competências essenciais da cada indivíduo capazes de gerar vantagens competitivas para a
organização. Desta forma, as competências essenciais do Capital Humano seriam a experiência, o
know-how, as habilidades, a criatividade e os relacionamentos. Diferentemente do Capital
Estrutural de Inovação, o Capital Humano pertence às pessoas e não à organização. O Capital
Estrutural de Inovação se caracteriza como os processos, estruturas, sistemas de informação e
patentes que permanecem na empresa quando os funcionários a deixam. Por último, o Capital de
Clientela é representado pelo valor do relacionamento de uma organização com seus clientes,
incluindo lealdade para com um produto ou a companhia, baseado em reputação, padrões de
compra ou poder aquisitivo.

A figura abaixo demonstra a inter-relação entre o Capital Humano, o Capital Estrutural de


Inovação e o Capital de Clientela, de forma a gerar o Capital Intelectual:

Capital Estrutural de Inovação


Tecnologia da Informação
Capital Humano
Experiência
Know-How Documentos
Habilidades Planos
Criatividade Dados
Relacionamentos Invenções
Processos

Capital de Clientela
Padrões de Compra
Reputação
Poder Aquisitivo

Capital Intelectual
Patentes
Direitos Autorais
Marcas Registradas
Segredos Comerciais

Fonte: Autor

A conversão do Capital Humano em Capital Intelectual através da Gestão do Conhecimento


busca reduzir o risco de perda de valores e conhecimento caso pessoas deixem a organização. A
perda da memória da corporação como resultado de downsizing é uma das principais razões para
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a adoção das práticas em questão. As organizações vêem a Gestão do Conhecimento como uma
forma de se evitar a repetição de erros, de se reduzir a duplicação de esforços e o tempo para a
resolução de problemas, de se estimular a inovação e a criatividade, e de se aproximar dos
clientes.

5. IMPLANTAÇÃO DA GESTÃO DO CONHECIMENTO

A implantação de um projeto de Gestão do Conhecimento deve começar por um problema


empresarial reconhecidamente relacionado com o conhecimento. Alguns exemplos de problemas
seriam a perda de clientes, o mal desenvolvimento de novos produtos ou a perda de pessoas-
chaves dentro da empresa. Posteriormente, é necessário a identificação dos ativos do
conhecimento e como estes podem agregar valor dentro da organização. É preciso especificar as
ações necessárias para atingir uma melhor utilização e agregação de valor e revisar o uso do
conhecimento de forma a assegurar que os resultados obtidos estejam sendo úteis para o
desenvolvimento de vantagens competitivas para a organização.

A implantação da Gestão do Conhecimento pode ser resumida em sete etapas de acordo com
BUENO (1999):

1. Percepção do executivo quanto à necessidade de gestão do conhecimento para melhorar a


performance da organização
2. Identificar um problema a ser resolvido ou oportunidades de negócios capazes de serem
alavancadas pelo gestor do conhecimento
3. Elaborar um projeto-piloto para o problema ou oportunidade identificado na etapa anterior
4. Levantamento de características culturais e ambientais da organização que dificultam a troca
de experiências
5. Levantamento de competências.
6. Preparar a infra-estrutura, incluindo a tecnologia necessária, para aplicação em questões
cotidianas da organização
7. Reiniciar o ciclo continuamente

Estas etapas têm como objetivo conectar pessoas, independentemente de suas localizações físicas,
permitindo que elas troquem informações de forma colaborativa numa rede. O que se busca é que
o usuário certo esteja com a informação certa no momento certo e tome a melhor decisão.

Para que a implantação da Gestão do Conhecimento seja bem sucedida é imprescindível que haja
a presença de três condições fundamentais: uma cultura orientada para o conhecimento, uma
ampla infra-estrutura de tecnologia e de informação e o apoio da alta gerência. A cultura
orientada para o conhecimento é um dos principais alicerces para o sucesso de um projeto do
conhecimento. É através de uma cultura organizacional que valoriza o conhecimento que as
pessoas se sentirão propensas a compartilhar aquilo que sabem e se tornarão receptoras de novos
conhecimentos úteis para o desenvolvimento de suas atividades. No que se refere às tecnologias
de informação, os projetos do conhecimento terão uma maior probabilidade de sucesso se
contarem com uma ampla infra-estrutura tecnológica e informacional. Não se deve fazer uma
gestão centrada na tecnologia, porém uma infra-estrutura tecnológica é um ingrediente necessário
para o sucesso de projetos do conhecimento. A presença de tais ferramentas facilita a
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alavancagem de iniciativas e de idéias criativas. Por fim, como qualquer outro tipo de programa
de mudança, os projetos da gestão do conhecimento beneficiam-se com o apoio da alta gerência.
Este apoio se dá através da divulgação dos princípios da gestão do conhecimento de forma a
gerar uma cultura propícia para o desenvolvimento deste tipo de gestão. O provisionamento de
recursos para o estabelecimento de uma infra-estrutura adequada também seria uma forma de
apoio da alta gerência.

Nas organizações existem alguns cargos-chaves que, se bem trabalhados, no que se refere a
Gestão do Conhecimento, poderão alavancar, não só a produtividade e capacidade de um
determinado setor, mas da empresa como um todo. Tal é o caso de empresas que desenvolvem
novos produtos: se todos os projetistas compartilharem experiências adquiridas no
desenvolvimento de diversos projetos, a empresa será capaz de obter um maior rendimento de
seus funcionários e uma maior produtividade de uma maneira geral.

A Gestão do Conhecimento deve estar integrada ao processo normal de trabalho dos


funcionários. Para isso é necessário que as atividades sejam explicitadas e remodeladas com o
auxílio das pessoas que executam tais atividades. A autonomia é um objetivo chave de muitos
“trabalhadores do conhecimento” e desta forma, um modelo de reestruturação hierarquicamente
rígido seria, fatalmente, mal sucedido.

Alguns fatores podem gerar distorções capazes de inibir o fluxo do conhecimento dentro de uma
empresa. Um destes fatores é o monopólio, ou seja, a concentração do conhecimento em uma
única pessoa ou grupo. O monopólio pode fazer com que o conhecimento se torne de difícil
acesso para as demais pessoas da empresa, gerando aquilo que se chama de “escassez artificial”.
Além disso, o detentor do conhecimento pode exigir favores ou benefícios em troca da difusão
daquilo que sabe. Outro fator que pode afetar o desenvolvimento da Gestão do Conhecimento é a
denominada barreira de classe, que significa a má vontade em aceitar idéias e sugestões de
pessoas de outros setores ou de posições relativamente mais baixas dentro da organização.

Para superar as distorções descritas acima, as pessoas devem perceber que seus conhecimentos
disseminados na organização podem alavancar novos negócios, gerar melhores condições de
trabalho e, ao contrário do que se possa pensar, garantir o emprego. Uma pessoa que passa
abertamente o que sabe para seus colegas tem uma alta empregabilidade uma vez que, ao
disseminar seu conhecimento, ela lida com desafios e indagações que fazem crescer sua
consciência crítica.

Os gestores do conhecimento devem estimular a troca de informações e conhecimentos. É


interessante notar que boa parte desta troca é realizada em encontros e conversas informais entre
os funcionários, tais como o “cafezinho” e os “bate-papos” informais.

6. CONSIDERAÇÕES SOBRE A TECNOLOGIA DA INFORMAÇÀO

A utilização da informática no gerenciamento de negócios, a princípio, era voltada para o


gerenciamento de dados. Desta forma, os recursos informacionais eram construídos objetivando-
se a coleta e a disponibilização de dados. Entretanto os dados não são suficientes para o suporte
às decisões e, então, tornou-se necessária a utilização de ferramentas computacionais para a

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transformação dos dados em informações. Através do gerenciamento de informações é possível
alcançar a valorização do conhecimento.

As tecnologias úteis para a Gestão do Conhecimento são aquelas que propiciam a integração das
pessoas, que facilitam a superação das fronteiras entre unidades de negócio, que ajudam a
prevenir a fragmentação das informações e permitem criar redes globais para o compartilhamento
do conhecimento. Deve-se criar uma base de dados de clientes para, através das informações
fornecidas por estes dados, se estreitar o relacionamento com o consumidor, por exemplo. A
Tecnologia da Informação deve ser utilizada para facilitar as atividades essenciais, para a
evolução da empresa, com a solução de problemas e inovação. Deve fornecer meios para que as
pessoas possam representar seus problemas, desenvolver protótipos e criar soluções. As
ferramentas devem ser flexíveis e fáceis de usar.

A área de Tecnologia da Informação dentro da empresa tem como desafios identificar, encontrar
e implementar tecnologias e sistemas de informação. Além disso, esta área deverá proporcionar
apoio a comunicação e a troca de idéias e experiências para facilitar a integração entre as pessoas.
É importante também que a Tecnologia da Informação migre de sua posição de suporte a
processos para o suporte a competências e proporcione um ambiente favorável para o
desenvolvimento de redes (grupos) informais.

Dentro da Gestão do Conhecimento, a Tecnologia da Informação assume um papel estratégico,


sendo responsável por ajudar o desenvolvimento do conhecimento coletivo, e do aprendizado
contínuo, tornando mais fácil para as pessoas compartilharem problemas, perspectivas, idéias e
soluções.

Algumas das principais Tecnologias de Informação para a Gestão do Conhecimento são:

• Videoconferência
• Groupware
• Painéis eletrônicos e grupos de discussão
• Bases de dados on-line
• CD-ROOMs
• Internet e Intranet
• Sistemas Especialistas
• Agentes de pesquisa inteligentes
• Data warehouse / data mining
• Gerenciamento eletrônico de documentos

7. CONCLUSÃO

Com base no que foi discutido, foi possível constatar a importância do conhecimento nos dias
atuais. Através da utilização da capacidade de reflexão e análise dos indivíduos, uma organização
é capaz de obter vantagens competitivas reais e sustentáveis.

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Tão importante quanto a acumulação do conhecimento é a sua difusão por toda a organização. A
troca de experiências, de conhecimentos, de soluções criativas, permitem que os indivíduos
cresçam e se insiram num ambiente de aprendizagem constante. Como conseqüência, a
organização também crescerá e se tornará cada vez mais competitiva

Apesar de muitas organizações possuírem complexos sistemas de coleta e análise interna e


externa de dados, capazes de gerar um grande volume de informações, a maioria ainda não é
capaz de transformar estas informações em conhecimento e difundi-las de maneira organizada e
integrada dentro da empresa. Cria-se assim, um vasto campo para a difusão e aplicação dos
conceitos e princípios da Gestão do Conhecimento onde a verdadeira vantagem é a capacidade de
aprender e gerar mais conhecimento. Esse conhecimento está tanto na organização como fora
dela e pode ser criado, desenvolvido, copiado e adaptado visando a melhoria da estrutura
organizacional.

Para finalizar este trabalho, seria interessante ilustrar a importância e a função do conhecimento
através de uma frase proferida pelo Professor Paul Quintas da Open University, durante um
seminário sobre Gestão do Conhecimento:

“Saber é interagir e honrar o mundo usando o conhecimento como ferramenta.”

8. BIBLIOGRAFIA

BARROSO, A. C., GOMES, E. Tentando Entender a Gestão do Conhecimento. In: Revista de


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