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UNIVERSIDADE FEDERAL

RURAL DO RIO DE JANEIRO


INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
DEPARTAMENTO DE DESENVOLVIMENTO, AGRICULTURA E SOCIEDADE
BACHAREL EM RELAÇÕES INTERNACIONAIS

A IMPORTÂNCIA DO ESTADO NO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO:


O INVESTIMENTO DA CHINA EM INOVAÇÃO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

Leonardo Fonseca

Seropédica, 2020

LEONARDO FONSECA
A IMPORTÂNCIA DO ESTADO NO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO:
O INVESTIMENTO DA CHINA EM INOVAÇÃO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

Monografia apresentada ao curso de Relações Internacionais da


Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro como requisito parcial
para a obtenção do título de bacharel em Relações Internacionais.

Orientadora: Profª Drª Ana Saggioro Garcia

Seropédica, 2020

LEONARDO FONSECA
A IMPORTÂNCIA DO ESTADO NO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO:
O INVESTIMENTO DA CHINA EM INOVAÇÃO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

Monografia aprovada em ___ de _________ de 2020.

Comissão Examinadora:

________________________________________________
Profª Drª Ana Saggioro Garcia – Orientadora
DDAS/ICHS – UFRRJ

________________________________________________
Profª Drª Débora Garcia Gaspar
DDAS/ICHS – UFRRJ

_______________________________________________
Prof Dr Luis Felipe Osório
DDAS/ICHS – UFRRJ

AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer aos meus pais por sempre terem me dado liberdade de ser quem
eu sou e poder seguir os meus sonhos. Em especial minha mãe Rosita que mesmo nos
momentos ruins não deixou de prover o necessário para que eu pudesse seguir com os meus
estudos.
Aos meus amigos José Marinato e Letícia Loureiro que foram minha fortaleza durante
a minha jornada na UFRRJ. Obrigado por terem acreditado em mim, por me incentivarem nos
momentos difíceis da graduação e por terem compartilhado seus conhecimentos comigo. Levo
vocês para a vida inteira.
Aos professores incríveis da UFRRJ com quais tive aula, que me fizeram enxergar
além do óbvio, a questionar e me posicionar diante dos conflitos, e também a entender o
mundo e todas suas particularidades, seja historicamente, politicamente ou culturalmente.
À minha orientadora Ana Saggioro Garcia por ter me aceitado como orientando e me
guiado de forma brilhante ao desenvolvimento do trabalho. Agradeço pela paciência, atenção,
dicas e também pelos incentivos para finalizar este trabalho.
À Rural por ter me abraçado de uma maneira tão especial, por ter mudado a minha
vida e por ter feito o homem que eu sou hoje. Obrigado pelos valores aprendidos e pelas
amizades construídas.

RESUMO
Esta monografia tem como objetivo analisar o papel do Estado no desenvolvimento
econômico, tendo como principal exemplo a China nos primeiros quinze anos do século XXI.
Ao debater sobre a participação do Estado no desenvolvimento econômico chinês, buscou-se
demonstrar a centralidade do papel estatal como propulsor da economia e da inovação
científica e tecnológica. A questão central é entender como as políticas e os incentivos
governamentais estão ligados ao crescimento econômico, principalmente na indústria de
inovação científica e tecnológica. Para compor essa análise foram utilizados notícias, gráficos,
relatórios e artigos acadêmicos sobre a trajetória chinesa e o papel do Estado na economia.
Entre os diversos autores estudados, a monografia teve como base as obras de Mariana
Mazzucato e Ha-Joon Chang.

Palavras-chave: Estado, inovação científica e tecnológica, desenvolvimento econômico,


China.
ABSTRACT

This work aims to analyze the role of the State in the economic development, utilizing China
in the first fifteen years of the 21st century as its main example. When debating about the
state’s participating in the chinese economic development, we intended to demonstrate how
the role of the state is important as a driver to the economy and to the scientific and
technological innovation. The central question is to understand how the politics and incentives
from the government are connected to the economic growth, mainly in the scientific and
technological industry. To compose this analyse we utilized news, graphics, reports and
academic articles about the chinese trajectory and the role of the state in the economy. Among
the many authors we studied, this work was based on the works of Mariana Mazzucato and
Ha-Joon Chang.

Key-words: State, scientific and technical innovation, economic development, China.


SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................8
CAPÍTULO 1: O PAPEL DO ESTADO NA HISTÓRICA ECONÔMICA MUNDIAL........10
1.1 – O Consenso de Washington e a Nova Ordem Econômica Mundial................................10
1.2 – A “mão invisível” do mercado vs a “mão visível” do Estado.........................................12
1.3 – O Estado no processo de desenvolvimento econômico dos Estados Unidos e do Reino
Unido........................................................................................................................................15
1.4 – O Estado no Leste Asiático; “o milagre econômico” .....................................................17

CAPÍTULO 2: O ESTADO NO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO CHINÊS NO


SÉCULO XXI: A INDÚSTRIA DE INOVAÇÃO CIENTÍFICA E
TECNOLÓGICA......................................................................................................................20
2.1 – O Estado na nova era da China........................................................................................20
2.2 – O século XXI e a indústria de inovação científica e
tecnológica................................................................................................................................23
2.3 – As reformas pós-1978 como o primeiro passo da inovação científica e
tecnológica................................................................................................................................25
2.4 – A indústria de semicondutores.........................................................................................29
2.5 – A inovação autóctone
chinesa......................................................................................................................................33
2.6 – Programa Mil Talentos e Made in China
2025..........................................................................................................................................37
2.7 – A indústria de energias
renováveis ...............................................................................................................................41

CONCLUSÃO..........................................................................................................................48
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS.................................................................................................................50
INTRODUÇÃO

O papel do Estado no mercado tem sido debatido desde os primórdios do estudo da


economia mundial, principalmente diante da premissa liberal  de que o mercado é auto
regulável e por tal razão, o Estado deveria intervir somente para ajustá-lo. Segundo essa visão,
o Estado é dispensável diante do livre-comércio, e os países que optassem pelo poder estatal
ao invés das forças auto regulatórias (a “mão invisível” do mercado), não conseguiriam obter
um bom desenvolvimento econômico. 
Com a globalização, o discurso neoliberal ganhou força e seu modelo de
desenvolvimento econômico com participação mínima do Estado se propagou por meio de
instituições internacionais, tendo os Estados Unidos como um exemplo de “sucesso” desse
modelo. Guiados pela potência mundial, muitos países em desenvolvimento adotaram o
modelo, mas não tiveram a mesma eficiência. Já outros, como a China, que decidiram não
seguir as orientações globais e sim um modelo de desenvolvimento com participação massiva
do Estado tiveram resultados benéficos e expressivos.
A chegada do século XXI e o forte avanço tecnológico fez com que a China levasse a
importância do Estado na economia a outro patamar, uma vez que o país se mantém em
crescimento contínuo desde as reformas de 1978, e hoje é a segunda maior economia do
mundo. A pergunta que permeia este trabalho é como a China conseguiu realçar o papel do
Estado em meio a uma onda tão forte de Estado mínimo no desenvolvimento econômico?
Quais foram os meios? 
Não é possível responder esta ampla questão no escopo deste trabalho, entretanto,
buscaremos analisar a China e o seu desenvolvimento econômico nos quinze primeiros anos
do século XXI por meio da indústria de inovação científica e tecnológica. Assim,
pretendemos contribuir com o debate sobre a participação do Estado no desenvolvimento
econômico de um país. 
Para compreender melhor a discussão em torno do Estado na economia, no primeiro
capítulo será exposto os argumentos das correntes teóricas da economia que são contra o uso
massivo do Estado no desenvolvimento e as que são a favor, passando pelo liberalismo,
nacionalismo e o modelo desenvolvimentista, destacando também a importância da indústria
de inovação para o mercado econômico e o papel do Estado frente à ela. Além disso, aborda-
se análises históricas de países que celebram a não intervenção do Estado, mas utilizaram ele
para se tornar um país atualmente desenvolvido.

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No segundo capítulo será exposta a importância da indústria de inovação científica e
tecnológica para o novo século e como a China usa do aparato estatal para promovê-la dentro
do país, alçando o desenvolvimento chinês rumo à liderança global da China. As reformas
chinesas pós-1978 são analisadas brevemente para que se possa entender o contexto seguinte
dos primeiros quinze anos do século XXI, buscando entender os interesses nacionais e as
indústrias-chave de inovação, e como as políticas governamentais são os principais
mecanismos de manutenção desses interesses em benefício ao desenvolvimento econômico do
país.
Concluiremos que o papel do Estado na economia chinesa é imprescindível para que
os objetivos nacionais sejam alcançados perante os imperativos externos, assim como também
para estabelecer o mercado interno e criar novos caminhos para o desenvolvimento
econômico do país.

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CAPÍTULO 1 – O PAPEL DO ESTADO NA HISTÓRIA ECONÔMICA MUNDIAL

1.1 – O CONSENSO DE WASHINGTON E A NOVA ORDEM ECONÔMICA MUNDIAL

O fim da Guerra Fria em 1991 foi visto por muitos como uma vitória do modelo
econômico dos Estados Unidos sobre o modelo econômico da União Soviética (URSS), que
até então travavam uma disputa desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Com o surgimento
da “Nova Ordem Econômica Mundial” após o fim desse embate, os Estados Unidos se
consagraram como a maior potência mundial e por conseguinte uma grande influência nas
diretrizes econômicas que deveriam ser seguidas pelos outros países, principalmente aqueles
em desenvolvimento.
O Consenso de Washington, formulado em 1989, teve um papel importante diante dos
novos rumos econômicos que os governos deveriam dar aos seus países. O encontro de
instituições como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e o Departamento de
Tesouro dos Estados Unidos, resultou no estabelecimento de dez medidas que incluíam
liberalização comercial, desregulamentação da economia, disciplina fiscal e outras
recomendações para os líderes mundiais de como gerir suas economias para as próximas
décadas, caso quisessem ter sucesso no crescimento econômico de seus países (REIS, 2019).
Havia na “Nova Ordem Econômica Mundial” uma tentativa de redefinir o papel do
Estado e por consequência transformar os modelos econômicos nacionalistas e
desenvolvimentistas, modelos quais os países periféricos recorrem como uma forma de mudar
suas posições no cenário do mercado econômico mundial (GILPIN, 2004, p. 329). O
neoliberalismo, uma versão mais radical do liberalismo, ganhou força, e com ele uma maior
valorização pelo livre-comércio e pela globalização que faria com que os países se tornassem
mais interdependentes e assim consequentemente melhores desenvolvidos. Porém, a ideia de
que interdependência entre os países é mutualmente benéfica, já que o “fluxo de mercadorias,
de capital e tecnologia [...] transmitem o crescimento das nações desenvolvidas para as menos
desenvolvidas.” (GILPIN, 2002, p. 294) não condizia com a realidade. As diferenças de poder
entre os países, assim como as conjunturas políticas internas e externas, poderiam interferir
nas negociações (GILPIN, 2002, p. 64).
A teoria liberal tende a negligenciar o contexto político dentro do qual se passa o
desenvolvimento econômico, embora o processo de desenvolvimento não possa ser
dissociado dos fatores políticos. As configurações de poder, nacionais e
10
internacionais, e os interesses de Estados e grupos poderosos são determinantes
importantes do desenvolvimento (GILPIN, 2002, p. 297).

Ainda na promoção do livre-comércio, acredita-se que os países em desenvolvimento


deveriam se espelhar nas instituições estabelecidas pelos países desenvolvidos, sendo essas
instituições consideradas essenciais para um bom governo. Entre essas instituições incluem
uma reforma no regime político do país, suas leis e também no setor financeiro público e
privado (CHANG, 2003, p. 124), tendo como principal referência os Estados Unidos. Porém,
mais uma vez, o argumento carece de uma análise que compreenda que as estruturas e o
contexto político e social de cada país são diferentes um do outro, e por assim, práticas de um
país x pode não funcionar para um país y. É preciso deixar que os países encontrem seus
próprios modelos de desenvolvimento.
“...o fato é que as políticas e instituições supostamente “boas” não conseguiram gerar
o prometido dinamismo de crescimento, nos países em desenvolvimento [...] Pelo
contrário, em muitos desses países, o crescimento simplesmente desapareceu.”
(CHANG, 2003, p. 230)

É diante dessas lacunas nos discursos do neoliberalismo econômico reforçados pela


nova conjuntura da economia mundial que o Estado ganha um papel importante, pois cabe aos
governos dos países em desenvolvimento orientar a economia, a política e as instituições de
acordo com as necessidades do país, ignorando, em alguma medida, imposições externas
(CHANG, 2002, p. 230).
Além da justiça e da segurança, vários pré-requisitos são necessários para que o
“curso natural das coisas”, ou seja, as forças de mercado, produzam resultados
favoráveis. Infraestrutura de transportes e energia, sistema financeiro avançado,
capacidade empresarial e técnica e contexto de estabilidade são alguns requisitos
necessários. O cumprimento dessas funções demanda certo grau de capacidade
estatal, que tende a ser maior quão mais retardatário é o processo de industrialização.
(GUIMARÃES, 2012, p. 104).

A relação entre a globalização e o Estado insere um novo capítulo na história mundial,


tornando-se um fator central dos debates políticos do século XXI. (CASTELLS, 1998, p.
377). É nesse contexto que a China se tornou um forte exemplo de como o Estado pode ser
um agente propulsor da economia, utilizando de um modelo econômico desenvolvimentista e
buscando seguir alternativas ao que foi proposto pelo Consenso de Washington. Enquanto
países em desenvolvimento que decidiram seguir as premissas liberais viram seu crescimento
estagnar, a China se manteve com sua política econômica de intervenção estatal e hoje é
responsável por cerca de 25% do crescimento da economia mundial (PAULINO, 2019).
No entanto, a utilização do Estado para impulsionar a economia não é algo único da
China, e muito menos do século XXI. Para entender como o Estado chinês conseguiu se

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ressaltar em meio de uma era de supressão estatal é preciso saber de onde veio a ideia de um
estado mínimo e quais foram seus desdobramentos na história econômica mundial.

1.2 – A “MÃO INVISÍVEL” DO MERCADO VERSUS A “MÃO VISÍVEL” DO ESTADO

No século XVIII, Adam Smith (1723-1790), considerado um dos maiores nomes da


literatura econômica, sendo referido como o “Pai da Economia Moderna”, escreveu sua obra
“Riqueza das Nações” (1776), que conta como seus principais temas as análises teóricas sobre
distribuição de renda, acumulação de capital e divisão do trabalho. O livro serviu como base
para diversas mudanças nas políticas econômicas, moldando o pensamento econômico no
mundo e dando início à corrente econômica liberal. De acordo com a premissa liberal, o
Estado não deveria intervir na economia, “ficando limitado à criação da infraestrutura básica
(escolas, hospitais, estradas) e à garantia que a propriedade e a “confiança” [...] entre os atores
fossem cuidadas e protegidas.” (MAZZUCATO, 2014, p. 78). O Estado não seria necessário
porque os mercados capitalistas se autorregulariam, guiados pela “mão invisível”, no qual em
caso de um desequilíbrio na economia por motivos exógenos (exemplo: tecnologia da
produção), o mercado tenderia a voltar ao equilíbrio de acordo com os mecanismos de preços
e quantidades (GILPIN, 2002, p. 47-48).
No entanto, Arrighi (2007, p. 58) argumenta que a verdadeira intenção de Smith sobre
o uso do Estado na economia foi deturpada pelos pensadores econômicos que surgiram após o
nascimento da corrente liberal. O conhecimento geral liberal sobre o Estado agindo somente
para corrigir as falhas de um mercado autorregulado não condiz com a verdadeira proposta de
Smith sobre um Estado forte, capaz de guiar o mercado interno a favor dos interesses
nacionais. Arrighi reforça que Adam Smith era sim a favor da liberalização do mercado, mas
sua concepção sobre as políticas governamentais na economia estava longe da premissa
liberal que perdura até os dias atuais.
Porém, essa visão “errônea” sobre Smith e a participação do Estado seguiu inabalada
pelos séculos que seguiram após a publicação da sua obra. A ideia de que o Estado é uma
força inerte e pesada, com grande dificuldade de manuseio perante ao dinamismo do mercado
capitalista, foi fortalecida por aqueles que possuíam os meios de produção, configurando um
discurso hegemônico no qual o setor privado e o setor público possuem uma forte
divergência, onde o primeiro é revolucionário e o segundo burocrático (MAZZUCATO, 2011,

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p. 54). Essa ideia foi propagada em grande escala e aceita como verdade, mesmo com teorias
e práticas que provem o contrário.
Na medida em que o modelo econômico liberal foi ganhando forte disseminação,
outras alternativas de modelo econômico também ganharam seu espaço, como é o caso do
nacionalismo, que antecedeu o liberalismo, mas só ganhou força no século XIX, e o
desenvolvimentismo, que surgiu após a Segunda Guerra Mundial (BRESSER-PEREIRA,
2018). O nacionalismo econômico é “uma doutrina que privilegia o Estado e afirma o fato de
que o mercado deve estar sujeito aos interesses estatais.” (GILPIN, 2002, p. 44). Nessa
vertente econômica, a participação do Estado aparece como uma forma de corrigir os ganhos
desiguais entre as relações comerciais e também para garantir a sobrevivência do Estado por
meio da defesa dos interesses nacionais diante das tentativas de imposição de políticas
externas negativas (GILPIN, 2002, p. 52). O nacionalismo econômico vai ao encontro da
teoria realista das relações internacionais, onde o Estado e a segurança nacional são os fatores
mais importantes (GILPIN, 2002, p. 61).
O desenvolvimentismo econômico não se difere muito do nacionalismo. Segundo o
economista Luiz Carlos Bresser-Pereira em entrevista de 2013 ao Instituto de Estudos
Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP), “o desenvolvimentismo é o
nacionalismo econômico bem pensado.”1. Ele caracteriza como um modelo onde o Estado
intervém na economia com políticas industriais que busquem incentivar o setor competitivo,
isto é, dos empresários, garantindo o emprego e a taxa de crescimento com fins de diminuir a
diferença de renda entre países em desenvolvimento e países desenvolvidos.
Porém, mesmo entre falhas evidentes do liberalismo e acertos do nacionalismo, essa
pesquisa não tem como objetivo tentar dizer qual é a melhor corrente teórica, muito menos em
rejeitar fundamentos normativos de um ou de outro, mas engrandecer o debate sobre o papel
do Estado diante das variáveis econômicas. Este trabalho tem como finalidade colocar em
pauta um ator que tem sido ofuscado pela forma tendenciosa de contar o desdobramento da
história econômica sem seus principais detalhes e mostrar que é possível desfrutar do
potencial econômico do Estado ao deixar de lado a imagem de inércia burocrática atrelada a
ele (MAZZUCATO, 2014, p. 58).
A evolução da ciência e da tecnologia e a necessidade de inovação em todos os setores
se tornaram ponto-chave para um bom crescimento e desenvolvimento econômico no século
XXI. Na visão “schumpeteriana”, apontada por Giovanni Arrighi (1997, p. 148), a inovação
destrói a estrutura econômica e cria uma nova dinâmica, incessantemente. Com as constantes
1
Disponível em: <http://www.iea.usp.br/noticias/entrevista-bresserpereira>. Acesso em: 18. jun. 2020.
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mudanças, gera-se uma necessidade entre as economias mundiais de se adaptarem para não
ficarem para trás frente à modernização. Assim então, o Estado se tornou um forte líder e
impulsor para a inovação em infraestrutura, aprimoramento de capacidades técnicas e
principalmente de Pesquisa & Desenvolvimento (P&D) (MAZZUCATO, 2014, p. 80),
formando como um todo a indústria de inovação científica e tecnológica, objeto de análise da
segunda parte dessa pesquisa. A economista italiana Mariana Mazzucato ressalta essa relação
entre Estado e inovação na sua obra “O Estado Empreendedor: Desmascarando o mito do
setor público vs setor privado.” (2014), onde ela expõe a importância do Estado não só como
um ator empreendedor, como o título do livro sugere, mas também como agente da inovação,
necessário para mover a economia, e um guia para o desenvolvimento.
De acordo com Mazzucato (2014, p. 59-63), a história mostra que o setor privado
tende a evitar grandes riscos econômicos por receio de não obter o retorno esperado, enquanto
o setor público se dispõe a investir sem expectativas aos futuros retornos. O medo de arriscar
do setor privado o levou à estagnação, cabendo ao Estado estar por trás da maioria das
grandes mudanças tecnológicas e por longos períodos de crescimento. Como exemplo a
economista cita o subsídio financiado pela Fundação Nacional da Ciência (NSF) dos Estados
Unidos, agência do setor público, que foi responsável pelo sucesso do Google, uma das
maiores empresas do mundo. Assim como também é o caso da descoberta por laboratórios
públicos do Reino Unido de anticorpos moleculares que serviram de bases para a
biotecnologia, entre outros exemplos que ilustram o papel importante do Estado.
Com o governo assumindo todo o risco de investir em inovação, principalmente em
Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), se torna necessário entender seu papel significativo
dentro do mercado econômico, para assim evitar que a narrativa de um Estado fraco continue
a subsistir na história econômica mundial, enquanto o setor privado é enaltecido mesmo
quando não é capaz de arriscar nas inovações científicas e tecnológicas.
Outro autor importante que apontou como falho o discurso liberal sobre o papel do
Estado foi Karl Polanyi. Segundo o historiador húngaro (POLANIY, 2000, p. 172), o governo
foi uma peça fundamental para atingir a “liberdade”, organizando e controlando por meios
burocráticos e legislativos. A histórica liberalização da economia britânica no século XIX
contou com um forte acompanhamento do Estado, o que não configura laissez-faire, termo
utilizado pelo liberalismo para designar o livre funcionamento do mercado sem interferência
estatal.
Não havia nada natural em relação ao laissez-faire nada tinha de natural; os mercados
livres jamais poderiam funcionar deixando apenas que as coisas seguissem o seu

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curso. Assim como as manufaturas de algodão - a indústria mais importante do livre-
comércio - foram criadas com a ação de tarifas protetoras, de exportações
subvencionadas e de subsídios indiretos dos salários, o próprio laissez-faire foi
imposto pelo Estado. (POLANYI, 2000, p. 170).

Evidências históricas mostram que o protagonismo da teoria liberal sobre o Estado


deu-se por meio de um obscurantismo das reais medidas econômicas feitas pelos países
desenvolvidos, principalmente por aqueles que são usados como grandes exemplos do livre
mercado: Estados Unidos e Reino Unido.

1.3 – O ESTADO NO PROCESSO DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DOS


ESTADOS UNIDOS E DO REINO UNIDO

Os maiores exemplos de como a teoria econômica liberal funcionou são dos Estados
Unidos e do Reino Unido, ambos em séculos diferentes. No entanto, o que não se conta (não
tanto como deveria) da história dessas potências é sobre como elas chegaram a esse patamar.
Buscando iluminar como se deu de fato a história contada por aqueles que acreditam na força
“livre” do mercado, Ha-Joon Chang analisa em “Chutando a escada” (2003) o
desenvolvimento econômico dessas grandes potências. Baseando-se em Friedrich List, Chang
busca mostrar como os Estados Unidos e o Reino Unido abusaram de medidas estatais para
impulsionar suas economias e hoje promovem um discurso contrário, influenciando nos
caminhos a serem seguidos pelos países em desenvolvimento, e como o título da obra de
Chang diz, “chutando a escada” por onde eles subiram para que outros países não façam o
mesmo, um termo que tem origem na obra clássica de Friedrich List.
Segundo Chang (2002, p. 59), não pode ser mera coincidência que o período que os
Estados Unidos mais cresceram aceleradamente envolveu um alto nível de protecionismo. Os
resultados positivos de crescimento do Reino Unido também tiveram grande relação com a
política protecionista, de acordo com Chang. Entre os principais meios de demonstrar o poder
do Estado estão as tarifas, as instituições governamentais e jurídicas e o incentivo à pesquisa,
usadas demasiadamente pelas potências liberais aqui citadas, assim como em outros países
desenvolvidos.
Os produtos manufaturados do Reino Unido tiveram altas tarifas até a década de 1820.
Antes, as ações do governo britânico envolveram medidas como proibição de exportações que
viessem de colônias, destruindo as indústrias de lã da Irlanda e de algodão da Índia (CHANG,
2003, p. 44). As duas indústrias eram superiores em relação a indústria britânica dos mesmos

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produtos, evidenciando um desejo do Reino Unido não apenas de proteger seus produtos, mas
também torná-los superiores, pois ao fim a Índia que se tornou a principal exportadora do
algodão inglês (Ibidem, p. 45).
A tentativa de impedir o desenvolvimento industrial de países menos desenvolvidos no
século XIX contou com um maior arcabouço, como foi o caso dos chamados “tratados
desiguais”. Chang (2002, p. 97) relata que os tratados foram apresentados como imperativos
do livre-comércio, envolvendo limites tarifários como obrigatoriedade, intervindo assim na
autonomia tarifária desses países. Ao passo que as tarifas ajudavam no crescimento da
economia inglesa e ela se tornava mais “autorregulável”, elas eram diminuídas. Em menos de
15 anos do século XIX os produtos tributáveis do Reino Unido passaram de 1.146 para 48
produtos; por volta dos anos 60 do século XX o número de produtos tributáveis já não cobria
meia página de um livro (CHANG, 2003, p. 47), evidenciando assim um estabelecimento
econômico sobre forte intervenção estatal.
Nos Estados Unidos, as elevadas tarifas impostas são geralmente ignoradas em
análises históricas econômicas do país, sendo reduzidas como irrelevantes e sem influência na
história do desenvolvimento do país (CHANG, 2003, p. 49). De forma gradual, as tarifas
norte-americanas começaram por volta de 5% para todos os bens importados no ano de 1789.
Três anos depois as tarifas já sofreram um aumento e ficaram com um nível médio em torno
de 12,5% até 1812, quando ocorreu a guerra com a Grã-Bretanha e o país foi obrigado a
dobrar as tarifas para cobrir as despesas da guerra (CHANG, 2003, p. 51). Em 1816, quase
todos os bens manufaturados ficaram sujeitos a tarifas de cerca de 35%, ficando próximo de
40% em 1820 (Ibidem, p. 52). Além das tarifas, também foi sugerido por Alexander
Hamilton, considerado “pai da indústria” dos Estados Unidos e também o primeiro Secretário
do Tesouro dos Estados Unidos, uma ajuda governamental para compensar os prejuízos que
seriam causados nas novas indústrias por conta concorrência estrangeira, marcando assim o
pioneirismo norte-americano na política de proteção às indústrias nascentes, uma medida
utilizada temporariamente por países com modelo econômico desenvolvimentista
(BRESSER-PEREIRA, 2018).
Após a Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos conquistaram a supremacia
industrial e assim finalmente se tornou de fato um país de livre-comércio. No entanto, Chang
(2003, p. 58) relata que o país norte-americano nunca contou com um período sem tarifa de
forma absoluta, revelando um protecionismo velado e com tarifas agressivas para seu próprio
benefício, sem se importar com ganhos iguais nas relações comerciais. O uso da força estatal

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fez com que a economia dos Estados Unidos crescesse disparadamente frente aos outros
países no século XIX e até as primeiras décadas do século XX, caracterizando-se assim um
crescimento econômico com forte protecionismo (BAIROCH, 1993, p.51-2, apud CHANG,
2002, p. 58).
Não foi apenas nas tarifas que os Estados Unidos e o Reino Unido usaram o poder do
Estado. O investimento em inovação tecnológica não é algo totalmente novo do século XXI,
essa tática foi usada por essas potências séculos atrás. Ambos países recorreram a medidas
que tinham como foco o investimento público em infraestrutura e manufatura. O
financiamento para obter novas tecnologias por meio de viagens para capacitação contou com
meios legais, mas também ilegais como espionagem industrial e contrabando de máquinas
(CHANG, 2003, p. 66). Além disso, foram criadas também fábricas-modelos e a liberação de
concessões para que o setor privado pudesse importar maquinarias e assim expandir o
conhecimento das tecnologias avançadas (Ibidem).
O governo norte-americano sancionou a Lei Morril em 1862 que consistiu em medidas
para conceder do governo para criação de faculdades e centros de pesquisa, visando o
aprimoramento da agricultura. De acordo com Chang (2003, p. 60), é provável que o país já
vinha investindo em pesquisas agrícolas desde a década de 1830. O investimento em P&D
contou com amplo apoio estatal, o que permitiu que atualmente os Estados Unidos ainda seja
referência na inovação de indústrias. Computadores e a internet, por exemplo, só foram
possíveis por conta do forte investimento do governo norte-americano em P&D (Ibidem, p.
61).
Séculos antes dos Estados Unidos, o Reino Unido investiu em pesquisa para
capacitação em 1485 quando Henrique VII trouxe estrangeiros para o país inglês para que
pudessem ensinar suas habilidades em manufatura ao seu povo (DEFOE, 1728, p. 96, apud
CHANG, 2002, p. 40). Mesmo com todo esse resgate histórico de como as potências liberais
realmente chegaram às suas posições, não é preciso ir muito longe na história para enxergar a
relação do poder estatal com um bom desenvolvimento econômico, como é o caso do
“Milagre Leste Asiático” na segunda metade do século XX.

1.4 – O ESTADO NO LESTE ASIÁTICO; O “MILAGRE ECONÔMICO”

Países leste-asiáticos como Japão, Cingapura, Taiwan, Coreia do Sul e Hong Kong
obtiveram um bom desempenho ao utilizar um modelo de desenvolvimento com participação
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do Estado. Os governos asiáticos investiram em educação ao passo que foi aumentando a
demanda por um maior nível escolar, o que resultou em mais indivíduos com maiores
habilidades técnicas, suprindo assim as empresas ao ponto de não precisarem mais proteção
em relação ao mercado internacional2. Esse quadro evidencia como o investimento
educacional e posteriormente em inovação e P&D está essencialmente ligado a um
crescimento eficiente.
Outro importante fator foram as “fases de intervenção seletiva”, isto é, o governo
decidia qual área receberia a intervenção estatal a cada intervalo de tempo, protegendo-as de
uma maneira que no geral cada área da indústria seria beneficiada 3. A grande proteção dos
governos leste-asiáticos representa o fato de que as economias em desenvolvimento e as
economias desenvolvidas não estão no mesmo patamar, e logo, seus problemas não seriam
solucionados com a mão livre do mercado, uma vez que o livre mercado acaba gerando
ganhos desiguais.
Para evitar que a intervenção estatal pudesse estagnar o desenvolvimento econômico
do país por conta de ausência competitiva e muita “proteção”, os países leste-asiáticos
exigiam um alto padrão de desempenho das indústrias, evitando que subsídios fossem tratados
como “presentes” mas sim como recompensas, o que evidencia que não basta intervir na
economia, é preciso saber onde intervir e com qualidade para gerar crescimento
(MOVAHED, 2019). Com o Estado criando um melhor ambiente para o mercado, o setor
privado se sentiu incentivado a investir em setores que tenha retornos sociais (STIGLITZ,
1996, apud BERHANE, 2012), funcionando assim como uma via de mão dupla.
O conjunto desses fatores denominou o que o Ocidente chama de “milagre
econômico”, um termo que se refere a capacidade de países de baixa renda de se sobrepor aos
empecilhos econômicos mundiais, tendo como comparação o desempenho dos países ricos
(ARRIGHI, 1997, p. 53).
Mas apesar do “Milagre do Leste Asiático” ter trago à mesa uma nova opção para um
bom desenvolvimento econômico com a participação do Estado, o que se viu depois foi uma
tentativa de abafar essa história quando o Banco Mundial emitiu uma análise econômica em
1993 (“The East Asian Miracle Report”) sobre o crescimento econômico do leste asiático e
foi capaz de ver somente sua própria imagem de políticas com participação mínima do Estado
(AMSDEN, 1994, p. 628).
2
EFFECT of State Intervention on Economic Growth of East Asian Nations. UKdiss.com, nov. 2018.
Disponível em: <https://ukdiss.com/examples/state-intervention-east-asia-economics-9922.php?vref=1>. Acesso
em: 9. jun. 2020.
3
Ibidem.
18
Apesar do Banco Mundial reconhecer que houve intervenção estatal, ele alega que não
é possível saber ao certo o efeito do Estado na taxa de crescimento, então assim os países em
desenvolvimento deveriam deixar de lado a intervenção e focar nos fundamentos neoliberais.
Como aponta Amsden (1994, p. 632), o Banco tenta procurar qualquer evidência para provar
seu ponto de vista, usando suas próprias referências neoliberais e argumentando, como
exemplo, de que o Japão poderia ter tido um crescimento maior se não fosse a intervenção
estatal. Ou seja, o relatório não examina e nem explora essas novas possibilidades, mas
procura reforçar as doutrinas orientadas no Consenso de Washington.
O relatório do Banco Mundial ignora fatores históricos como a Segunda Guerra
Mundial, que com o seu fim coube aos Estados intervir massivamente para reconstruir suas
economias abaladas pelo confronto. Amsden ainda completa que “O Banco (Mundial)
esquece a urgência dos governos em intervir no processo acumulativo dos países, como é o
caso do Leste Asiático, que tiveram uma industrialização “tardia, sem as vantagens
competitivas no mercado de inovação de produtos e processos.” (1994, p. 631, tradução livre).
Com o Estado ganhando notório papel no desenvolvimento do leste asiático, na China
não foi diferente. As reformas no país após a morte de Mao Tsé-Tung, somadas ao aumento
da tecnologia como um dos principais canais de crescimento econômico interno e externo,
colocaram o Estado como o principal condicionante para o desenvolvimento econômico desse
novo cenário, que será abordado na próxima seção.

19
CAPÍTULO 2 – O ESTADO NO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO CHINÊS NO
SÉCULO XXI: A INDÚSTRIA DE INOVAÇÃO CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

Este capítulo tem como objetivo demonstrar a importância da participação do Estado


na economia por meio de políticas de incentivo e financiamento, projetos e leis, atuando como
organizador e direcionador do caminho a seguir pela busca do desenvolvimento econômico do
país. O desempenho econômico e político da China perante a indústria de inovação científica
e tecnológica (C&T) será analisado por meio dos primeiros quinze anos do século XXI, onde
a dominação desse setor se tornou primordial para obter-se crescimento de lucro e produção,
tanto para o setor público quanto para o privado. Apesar da inovação tecnológica ter um vasto
campo de produção, a área possui seus elementos-chave para impulsionar seu
desenvolvimento e subsequentemente sua dominação, que serão explorados nesta segunda
parte. 

2.1 – O PAPEL DO ESTADO NA NOVA ERA DA CHINA

Na China, o Estado foi fundamental para a transição do modelo econômico de uma


economia fechada para o de uma economia aberta a partir de 1978. O país mantinha uma
postura isolada em relação ao mundo e via sua economia se degradar quando ocorreu a morte
do líder Mao Tsé-Tung em 1976 (PAULINO, 2019). Com o rápido avanço tecnológico e
grandes mudanças na economia, o Estado chinês viu a necessidade de se modernizar para
acompanhar o ritmo mundial, porém com o dilema de como manter o poder comunista se
inserindo no mercado mundial, liderado por premissas neoliberais (CASTELLS, 1998, p.
351). O caminho para a modernização teve Deng Xiaoping como guia após o mesmo ter
enfrentado maoístas e reformadores liberais, se tornando assim o novo líder do Partido
Comunista Chinês (PCC). Mais do que se modernizar, a abertura do mercado também foi
vista como uma forma de salvar o socialismo do país caso a medida de abertura trouxesse
bons rendimentos ao país4.
4
Fala de Deng Xiaoping ao 13º Comitê Central em 1990: “Se a economia melhorar, outras políticas poderão ser
bem-sucedidas, e a fé do povo chinês no socialismo se intensificará. Em caso contrário, o socialismo estará
ameaçado na China e também no resto do mundo.” Citado em Fim do Milênio, Vol. 3, (1998) por Manuel
20
Devido ao fracasso soviético na transição para o capitalismo, os passos que seriam
dados pela economia chinesa teriam que ser com muita cautela, gradualmente, e com uma
supervisão do Estado com o propósito de proteger as indústrias chinesas (CASTELLS, 1998,
p. 353).
A transição conduziu-se de modo que a introdução das forças de mercado fosse
acompanhada de medidas visando à correção das eventuais falhas de mercado [...] Ao
mesmo tempo, o governo preservou a capacidade de intervenção, que se mostrou
fundamental para proteger os grupos vulneráveis e os perdedores com o processo de
mudança. (GUIMARÃES, 2012 p. 104-105).

Não demorou muito para que a intervenção estatal da China se tornasse um sucesso.
Mantendo a inflação sob controle, estimulando a economia e produzindo empresas que
pudessem enfrentar a competição internacional, ao lado de um bom investimento em
educação e uma boa infraestrutura (GUIMARÃES, 2012, p. 105), ao fim do século XX a
China obtinha um nível estável de crescimento. Mesmo após a crise de 1997 que assolou
diversos países asiáticos, o país socialista manteve sua estabilidade (CASTELLS, 1998, p.
362). A China conseguiu combinar intervenção estatal com bons fundamentos econômicos,
surpreendendo governos e empresas ao redor do mundo (GUIMARÃES, 2012, p. 110).
Com o Estado sendo o líder para a modernização chinesa, a intervenção não agiu
apenas em prol de proteger as empresas estatais por meio de barreiras tarifárias e não
tarifárias, mas também para proteger as empresas privadas, e assim elevar a economia como
um todo. A dicotomia de um setor público pouco inovador e um setor privado revolucionário
não encontra forças no território chinês, uma vez que muitas empresas privadas são
subsidiadas por empresas estatais, tornando a conexão entre elas muito forte (CASSIOLATO
e PODCAMENI, 2015, p. 495).
O notório desempenho chinês demonstrou que há outros caminhos além dos propostos
pelo Consenso de Washington. A China somente entrou para a Organização Mundial do
Comércio (OMC) após garantir que suas indústrias estavam prontas para a concorrência
internacional, negando qualquer estratégia econômica apoiada pelo Fundo Monetário
Internacional (FMI), o que “expôs a fraqueza do Consenso de Washington sobre
desenvolvimento, que negou ao Estado o papel ativo que ele desempenhou no
desenvolvimento dos principais países industrializados, como Estados Unidos, Alemanha e
Reino Unido.” (MAZZUCATO, 2014, p. 93).
Defensores do modelo neoliberal argumentam que os países em desenvolvimento
precisam seguir as recomendações de políticas e instituições, pois não seguindo-as, poderiam

Castells.
21
ser punidas por uma falta de interesse dos investidores. No entanto, a China conseguiu uma
grande quantidade de investidores estrangeiros, mesmo com políticas contrárias ao “padrão”
(CHANG, 2003, p. 225). Há quem diga que o sucesso da China foi justamente por não seguir
as recomendações do Consenso de Washington (ARRIGHI, 2008, p. 361).
Talvez a China seja o melhor exemplo de país que deu ouvidos aos conselhos
estrangeiros, mas tomou decisões em função de suas próprias circunstâncias sociais,
políticas e econômicas. [...] Seja qual for a base do sucesso da China, com certeza não
foi a adoção cega das políticas [do Consenso] de Washington. A reforma com
“características chinesas” foi o traço que definiu o processo reformador da China.
(AGARWALA, 2002, p. 86-9, apud ARRIGHI, 2008, p. 368).

O crescimento da China por meio de suas próprias políticas industriais escancara a


assimetria da atual ordem mundial, que conta com um sistema internacional de comércio e de
financiamento onde a primazia é do dólar americano. Mesmo com a China e os países em
desenvolvimento possuindo mais participação no PIB mundial do que os países
desenvolvidos, essa grande parcela não era vista nas instituições globais como o Fundo
Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (PAULINO, 2019).
No entanto, apesar desse modelo “único” da China e todo o arcabouço sobre o uso do
Estado pela China ao direcionamento da sua economia nas últimas décadas, estudos revelam
que essa força estatal não é algo novo do último século no país chinês. No século XVIII, o
governo ajudou nos desdobramentos da agricultura, aprimorando-a de uma maneira que
pudesse compensar a desigualdade que assolava o país (ARRIGHI, 2008, p. 334). O aparato
estatal se deu por uma série de medidas políticas com apoio ao mercado, ao aperfeiçoamento
da classe trabalhadora em relação às novas técnicas e as já existentes, impostos em territórios
em prol da camada pobre, além de outras políticas que favoreciam o lado econômico e o
social (Ibidem). 
A diferença entre a presença do Estado na China dessa época para as últimas décadas
se dá no direcionamento do seu modelo de desenvolvimento baseado no mercado. Com base
na teoria marxista, Arrighi (2008, p. 104) declara que a razão da China não ter acompanhado
o crescimento dos outros países que também possuíam o mesmo modelo de desenvolvimento
está no seu não condicionamento às estratégias capitalistas, como por exemplo a de procurar
terras estrangeiras para a acumulação capital. Isso fez com que a China estagnasse, mesmo
possuindo um mercado interno forte. Mas se o país asiático não soube se adequar ao ritmo
capitalista séculos atrás, as reformas pós-1978 indicam a trajetória de um Estado
desenvolvimentista que decidiu embarcar nas tais águas capitalistas, mas preservando suas
características socialistas e seus interesses nacionais.

22
O modelo de desenvolvimento da China também se difere pelo viés pacífico. Ao
contrário dos países ocidentais, o país asiático procura se estabelecer como líder global
guiando-se pelos seus interesses nacionais sem precisar prejudicar outros países, mas
afirmando suas posições sobre qualquer tentativa de subalternização (CARRIÇO, 2013, p.
38). A ideia de criar guerras para alcançar os objetivos nacionais é uma prática ocidental que a
China não deseja que seja relacionada ao modo chinês de desenvolvimento.
Essas características do modelo chinês são bases do “Sonho Chinês”, um conceito
criado pelo líder chinês Xi Jinping em 2012 para se referir à priorização dos interesses
nacionais em busca de um país forte e com oportunidades de crescimento para toda a
sociedade5. O comprometimento com a diplomacia benigna pode ajudar também na
construção da imagem da China como um país mais atraente aos olhares externos,
fomentando não só um maior poder de negociações (MAH, 2013, p. 54), mas facilitando
também seu caminho rumo à liderança global, almejada para até a segunda metade do século
XXI. Tendo isso em vista, a China quer mudar a imagem dada ao país de “fornecedora de
sapatos, roupas e brinquedos baratos.”6, e torná-la em um exemplo de capacidade produtiva
em ciência e tecnologia, setor-chave do novo milênio. Dessa forma, o papel do Estado no
desenvolvimento econômico volta a ser ressaltado no novo século, com a China sendo seu
principal exemplo de eficiência, tendo como foco a indústria de inovação científica e
tecnológica.

2.2 – O SÉCULO XXI E A INDÚSTRIA DE INOVAÇÃO CIENTÍFICA E


TECNOLÓGICA

Com a virada do século, a “era da informação” se intensificou com a variedade de


processos e produtos tecnológicos que diversificou e ampliou a comunicação e o fluxo
internacional. Esse novo contexto trouxe também a otimização de tempo na produção
mundial, um fator positivo na ótica do mercado, já que uma produção maior em um espaço
curto de tempo significa uma diminuição no custo de produção, e por consequente, aumento

5
HEIN, Matthias von. Xi Jinping e o sonho chinês. Deutsche Welle, 07. mai. 2018. Disponível em:
<https://p.dw.com/p/2xIk8>. Acesso em: 06. set. 2020.
6
O AMBICIOSO plano 'Made in China 2025' com que Pequim quer conquistar o mundo. Instituto Humanitas
Unisinos, 08. mai. 2018. Disponível em: <http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/578718-o-ambicioso-plano-
made-in-china-2025-com-que-pequim-quer-conquistar-o-mundo>. Acesso em: 21. jun. 2020.
23
no lucro (SANTOS, 1983, p. 57). Diante desse benefício capitalista, o mercado econômico
torna-se sujeito às mudanças que a indústria de inovação propõe (Ibidem, p. 58).
A rapidez que um produto se torna obsoleto diante do surgimento de uma inovação
exige dos líderes mundiais a criação de estratégias que pudessem acompanhar essa rápida
evolução, um desafio ainda maior para os países em desenvolvimento com o processo de
catching up, mas que por meio da inovação científica e tecnológica enxergam a possibilidade
de mudar a situação econômica do país.
A indústria de inovação C&T possui um procedimento a longo prazo que requer
grandes investimentos em P&D, e ainda assim, o resultado pode não ser tão bem sucedido. É
um risco que como apontado no primeiro capítulo, somente o Estado está disposto a pagar,
fazendo dele o objeto central na busca pelo desenvolvimento econômico e tecnológico.
Mas o papel do Estado não está relacionado apenas ao investimento, envolve também
organização, preparação e suplementação dos atores envolvidos no processo, isto é, a
capacitação de pessoas na área da educação e de habilidades técnicas, pois grande parte da
pesquisa e o desenvolvimento dela vem das universidades e instituições de pesquisa públicas
(SANTOS, 1983, p. 68). Então, para chegar-se ao resultado desejável, o Estado precisa
fomentar todas as camadas do processo de desenvolvimento.
A China, que já vinha crescendo de forma acelerada e investindo em inovação
tecnológica, decidiu no século XXI orientar toda a estrutura da economia e sociedade chinesa
em prol do aprimoramento tecnológico, auxiliando os setores debilitados por meio do Estado.
De acordo com dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE), o país chinês se tornou o segundo país que mais investe em P&D, com um aumento
contínuo nos primeiros quinze anos do século XXI, indo de US$ 51 milhões de dólares em
2001 para US$ 409 milhões em 2015, de acordo com dados da OCDE (ver Gráfico 1), ao
passo que o PIB anual da China também manteve-se em crescimento até o ano de 2007 (ver
Gráfico 2), e mesmo com a crise de 2008 que assolou diversas economias, principalmente a
dos Estados Unidos, o país chinês manteve bons números nos anos que seguiram, mantendo-
se acima dos EUA, o país com a maior indústria de inovação C&T.

Gráfico 1 – Gastos em dólares do PIB chinês em Pesquisa & Desenvolvimento

24
   Fonte: elaboração própria com base em dados da OECD (2020), Gross domestic spending on R&D
(indicator).

Gráfico 2 – Evolução do PIB da China durante os anos 2001-2015

Fonte: elaboração própria com base em dados do Banco Mundial.

Esses números refletem as reformas introduzidas por Deng Xiaoping após 1978, que
tinham como foco não só a área de ciência e tecnologia, mas também a de agricultura,
manufatura e indústria. Para entender os resultados e as decisões tomadas pelo governo chinês
no século XXI é preciso analisar o contexto que levou ao cenário em que a inovação se torna
o principal motor para o desenvolvimento econômico chinês. Esse contexto inclui o uso da
25
pesquisa científica tecnológica para uso dual civil e militar, empresas spin-offs e joint-
ventures, que serão abordados nas próximas seções.

2.3 – AS REFORMAS PÓS-1978 COMO O PRIMEIRO PASSO DA INOVAÇÃO


CIENTÍFICA E TECNOLÓGICA

A tecnologia era vista como algo não essencial para a sociedade chinesa antes da
abertura econômica da China em 1978, mas com a liderança de Deng Xiaoping a tecnologia e
suas inovações se tornaram uma necessidade para manter a relevância do país no cenário
internacional (CASSIOLATO, p. 2013, p. 67). Com as “Quatro Modernizações”, que tinha o
objetivo de reestruturar as políticas de desenvolvimento da indústria, agricultura, manufatura
e C&T, o governo buscou focar em áreas que poderiam prosperar ao longo prazo,
direcionando forte investimento à pesquisa científica-militar para que esta pudesse remediar a
baixa capacitação espacial da China e com sucesso pudesse desenvolver outros tipos de
tecnologia, dentre eles sistemas de comunicação e informação, previsão climática,
biotecnologia e outras áreas high-tech, todas dependentes da pesquisa espacial, que poderiam
atender tanto a área civil quanto a militar (Ibidem). O Estado chinês contou com o complexo
industrial militar para a organização e a implementação dos processos de inovação
tecnológica (Ibidem).
A integração civil-militar, uma política de atender a defesa nacional e a sociedade por
meio da indústria militar, tornou-se prioridade do governo chinês. O uso dessa política é algo
feito pelos Estados Unidos desde a Segunda Guerra Mundial, que na busca por
aprimoramento de suas armas, uniu pesquisadores universitários à pesquisa e ao
desenvolvimento militar, que mais tarde seriam motivados pelo governo norte-americano a
comercializar os resultados (TREBAT e MEDEIROS, 2015, p. 525). O envolvimento civil-
militar norte-americano gerou o Vale do Silício, uma área nos EUA que comporta diversas
empresas com produção voltada à alta tecnologia. O papel significativo dado ao complexo
industrial militar pode ser lido como uma política característica de um Estado
desenvolvimentista, como apontam Trebat e Medeiros (2015, p. 525), uma vez que o
planejamento e os incentivos à produção de inovação estavam mediantes ao poder estatal.
O exemplo bem-sucedido dos EUA incentivou a China a abandonar as políticas pré-
1978 influenciadas pela União Soviética (URSS), nas quais abordavam a área civil e militar

26
como objetos distintos, mas seus resultados não foram satisfatórios. A diferença entre a
integração civil-militar da China com a dos EUA é que no caso chinês o Estado teve um forte
envolvimento (TREBAT e MEDEIROS, 2015, p. 533), o suficiente para que não fosse
necessário ler nas entrelinhas uma política de Estado desenvolvimentista. Após a
implementação da integração civil-militar, unidades usadas para pesquisa e produção militar
foram transformadas em centros e fábricas de produção civil, que mais tarde se tornaram
empresas (Ibidem, p. 526).
Desenhado em larga medida para superar os efeitos do atraso e das sanções
ocidentais, o sistema de uso dual da China tem o potencial para acelerar o processo de
inovação do país, por meio da integração de instituições civis e militares na pesquisa
e no desenvolvimento de novas tecnologias que viabilizem não apenas a
modernização militar, mas também a conquista de novos mercados para seus
produtos. (TREBAT e MEDEIROS, 2015, p. 545).

Os resultados da pesquisa civil-militar podem ser vistos trinta anos depois de sua
implementação, tendo como exemplo o supercomputador Tianhe-2, lançado em 2013, no qual
sua capacidade ultrapassou o modelo dos EUA, que até então era referência da mais alta
tecnologia lançada (TREBAT e MEDEIROS, 2015, p. 536), se mantendo como o
supercomputador mais rápido do mundo até o ano de 2016, quando a China superou a si
mesma e lançou o supercomputador Sunway TaihuLight 7, que manteve-se no topo dos
melhores supercomputadores até o ano de 2018.
Os supercomputadores são utilizados em diversas áreas, como mecânica, física,
química, biologia, meteorologia e medicina, somando assim um grande efeito para a produção
de inovação da China. Outra realização do uso dual foi a rápida evolução da tecnologia anti
satélite chinesa, que com efeitos de destruição jamais vistos na história acendeu um alerta
para o governo norte-americano (TREBAT e MEDEIROS, 2015, p. 543).
As reformas também introduziram as chamadas spin-offs que engloba as empresas
privadas criadas por um quadro de cientistas tecnológicos com as empresas criadas por
universidades, ambos casos recebendo incentivos do governo, politicamente e
financeiramente (CASSIOLATO, 2013, p. 78). O êxito dessa política pôde ser visto nos
primeiros cinco anos do século XXI, onde “as universidades chinesas possuíam mais de 2.300
empresas com um faturamento anual de RMB 80 bilhões e um lucro presumido de mais de
RMB 4 bilhões.” (CASSIOLATO, 2013 p. 74). Em dólar, o faturamento anual das mais de
2.300 empresas foi de US$ 11 bilhões e o lucro presumido de mais US$ 597 milhões8.
7
IBÁÑEZ, Alvaro. Sunway TaihuLight, o supercomputador mais rápido do mundo. El País, 27. out. 2016.
Disponível em <https://brasil.elpais.com/brasil/2016/10/26/tecnologia/1477480235_164392.html>. Acesso em
15 de agosto de 2020.
8
Em valores cambiais do dia 03/11/2020.
27
Entre essas empresas spin-offs surgiu a Lenovo, a maior fabricante de computadores
da China, e a Huawei, a segunda maior fabricante de equipamentos de telecomunicações,
ambas com forte participação no mercado global atual. O governo chinês não só promoveu a
criação dessas empresas, mas também ajudou na manutenção delas ao impor altas tarifas na
importação de computadores estrangeiros (XIE e WHITE, 2004, p. 410), permitindo assim
que empresas como a Lenovo e a Huawei pudessem crescer internamente e expandir seus
mercados internacionalmente. O fundador da Huawei, Ren Zhengfei, afirmou que a empresa
só conseguiu existir por conta das políticas governamentais de proteção à indústria nacional
(AHRENS, 2013, p. 24).
Buscando impulsionar o projeto de modernização e o desenvolvimento do país, o
governo da China lançou um pacote de regulamentações que estimulava a absorção de
tecnologias estrangeiras, permitindo importações de tecnologia (CASSIOLATO, 2013, p. 72).
A China utilizou seu crescimento contínuo como vantagem para atrair empresas e
multinacionais ao seu território, facilitando a absorção tecnológica, mas ao mesmo protegendo
sua indústria nacional, pois as empresas estrangeiras só poderiam instalarem-se no território
chinês com a condição de produção no mesmo nível do mercado chinês, assim como venda
somente para o mesmo. Assim o Estado chinês não só protegeria as empresas domésticas, mas
também facilitaria o aprendizado de novas tecnologias (Ibidem, p. 73). Esse conjunto de
fatores inseriu a política de joint ventures, termo utilizado quando duas empresas se unem
para atingir um mesmo projeto.
O início dessa prática chamou atenção para diversas empresas investir no território
chinês, como foi o caso da construção de uma represa chinesa onde o governo colocou como
prioridade a participação de empresas estrangeiras, na qual as selecionadas deveriam
compartilhar as formas de produção com as empresas chinesas que estariam no projeto
(Ibidem). Dessa forma, os chineses aprenderiam todos os métodos tecnológicos avançados
estrangeiros e equipariam o próprio mercado contra o mercado internacional.
Esse procedimento foi fortemente incentivado pelo governo chinês em âmbito
doméstico, em um sentido de que as empresas chinesas deveriam se acostumar com as
diferenças culturais para se equiparem com investimentos 9. Esse incentivo do Estado deu
acesso para o mercado interno as empresas estrangeiras que possuíam as inovações desejadas
pela China para o desenvolvimento da sua indústria.

9
MADE in China 2025. Institute for Security and Development Policy, jun. 2018. Disponível em:
<https://isdp.eu/publication/made-china-2025/>. Acesso em 21 jul. 2020.

28
Mas o percurso da indústria de inovação tecnológica da China começou mesmo a
partir da joint venture formada em 1999 pelas empresas Huahong da China e NEC do Japão,
ambas com o objetivo de produzir wafers, um material utilizado na construção de
semicondutores e circuitos integrados, ambos essenciais para diversos produtos tecnológicos
(GÉLIO, 2011, p. 27). A produção refletiu o Projeto 909 (1996) da China, que tinha como
meta a produção de semicondutores, o que condicionou políticas com o propósito de aumentar
a capacidade tecnológica do país chinês (Ibidem). O resultado não foi o esperado, mas deu
início ao mercado de semicondutores na China. 
A partir dos anos 2000 o governo chinês começou a estabelecer as políticas que
impulsionariam o desenvolvimento do país na indústria de inovações pelas próximas décadas.
Com a indústria de semicondutores como um dos principais pontos dessas novas políticas, o
plano da China foi manter o ritmo de crescimento econômico do país por meio de
investimento em inovação científica e tecnológica, visando uma mudança da posição do país
frente ao mercado internacional. Segundo os autores ARBIX et. alli (2018, p. 147), a
expectativa do governo era que a China se tornasse uma potência tecnológica na metade do
século XXI.

2.4 – A INDÚSTRIA DE SEMICONDUTORES

O 10º Plano Quinquenal (2001-2005) teve como prioridade o desenvolvimento


doméstico de semicondutores e circuitos integrados, que no ano anterior teve seu mercado
aberto para empresas estrangeiras de semicondutores, com respaldo às empresas domésticas
por meio de incentivos fiscais, e a criação da SMIC (Semiconductor Manufacturing
International Corporation) (GÉLIO, 2011, p. 27), uma fábrica de semicondutores promovida
pelo Estado, abrindo assim o longo caminho que a China iria percorrer nos próximos anos
para diminuir a disparidade da indústria de inovação tecnológica da China em relação aos
países mais avançados.
Além dos benefícios da formação de joint ventures, a mão de obra de custo barato
também foi um atrativo para as produções internacionais de semicondutores, que se
intensificou com a entrada da China na OMC (Organização Mundial do Comércio) em 2001
(VERWEY, 2019, p. 11). Grandes empresas internacionais de semicondutores, como Intel e
Hynix, passaram a usar a China como local de produção para os seus produtos (Ibidem, p.
17). A busca pela inovação como um meio de estimular o desenvolvimento econômico do

29
país teve resultados significativos ao passar dos anos, elevando a capacidade produtiva da
China de 1,5% em 2001 para 7,4% em 2005 (MAJEROWICZ e MEDEIROS, 2018, p. 19).
Segundo Kong, Zhang e Ramu (2015, p. 1), a indústria de semicondutores chegou a
ter crescimento anual de 15,8%, indo de 8,3 bilhões de dólares em 2000 para 41 bilhões de
dólares em 201110. Esse salto econômico contribuiu para o crescimento da indústria de
semicondutores chinesa em relação ao mundo, com dados de 4,8% em 2002 para 14,5% em
2011, como relatam os autores. 
Entre 2000 e 2015, a China se tornou a maior base de produção de semicondutores do
mundo, que além da fabricação, também ampliou P&D, com centros voltados para este fim, e
acréscimo de investimento de mais de 2% do PIB em 2014, superando a União Europeia (ver
Gráfico 3).

Gráfico 3 – Gastos do PIB chinês em P&D

Fonte: elaboração própria com base nos dados da OECD (2020), Gross domestic spending on R&D
(indicator).

O sucesso da indústria de semicondutores re-significou o termo “Made in China”,


bastante utilizado como exemplo de produtos baratos e de baixa qualidade. A China agora era
responsável pela produção de mais de 50% dos smartphones, computadores e televisões smart
utilizados no mundo (VERWEY, 2019, p. 6). Seu êxito também aumentou o número de

10
Em valores cambiais do dia 03/11/2020.
30
empregos no país ao passo que as empresas de semicondutores também foram crescendo,
como pode ser visto na tabela abaixo.

Tabela 1 – Nº de empresas e empregados na indústria de semicondutores da China


(2000-2010)

Fonte: Kong, Zhang, Ramu; 2018, p. 6.

Com esses fatores expostos é possível perceber o tamanho da importância da indústria


de semicondutores para o século XXI e as novas formas de produção. A razão é que os
semicondutores são partes dos circuitos integrados, que por sua vez compõe diversos produtos
eletrônicos. Os semicondutores são considerados o “cérebro” de tecnologias como
computadores, celulares, televisões, automóveis e outros dispositivos de alta tecnologia
utilizados pela Internet das Coisas (IoC). As armas modernas usadas para fins militares e
operações cibernética também estão inclusas nesse quadro, o que leva a importância da
indústria à nível de segurança nacional (MAJEROWICZ e MEDEIROS, 2018, p. 5).
Portanto, ter uma boa indústria de semicondutores também significaria uma boa defesa
nacional, e por consequência uma maior dimensão de poder internacional em relação a outros
países. E é aqui que os malefícios da indústria se tornam aparentes, pois se os semicondutores
são a chave para as novas formas de produção, a defesa da China estaria em “mãos alheias”,
já que a China produzia mais para empresas estrangeiras, o que preocupou o governo chinês
(MAJEROWICZ e MEDEIROS, 2018). 
O consumo chinês do mercado de semicondutores se tornou o maior do mundo em
2005 e por 2014 a posição continuava a mesma com a China sendo responsável por 56,6% do
consumo de semicondutores no mundo (MAJEROWICZ e MEDEIROS, 2018, p. 20). As
importações de semicondutores ultrapassaram a importação de petróleo, até então a maior
importação da China, de acordo com Ernst (2016, p. 3). Segundo o autor, as causas desse
consumo massivo estão nas exportações chinesas, que contavam com muitos produtos que
possuem os semicondutores em sua composição, e na produção de produtos internos como
31
trens, automóveis e serviços de software. Como exemplo, o autor cita a segunda maior
empresa de telecomunicações da China, a ZTE Corporation, que depende de importações dos
EUA para 43% da sua produção. Os semicondutores produzidos pela China não conseguem
cobrir a demanda do país (ver Gráfico 4).

Gráfico 4 – Diferença em dólares de consumo e produção de semicondutores e circuitos


integrados entre 2001-205 na China

Fonte: elaboração própria com base em PwC (2016).

A forma de absorver tecnologia estrangeira para aprimoramento interno também se


qualifica como uma forma de dependência, e ainda pior, limita o processo de catching up da
China, uma vez que muitos países avançados tecnologicamente protegem suas inovações com
patentes. Os processos de patenteamento são uma forma desses países criarem monopólios

32
sobre seus progressos científicos e tecnológicos e manter uma posição relativa de poder no
sistema internacional (SANTOS, 1983, p. 59). Essa prática também pode ser identificada
como uma maneira de não permitir que países em desenvolvimento cresçam da mesma forma
que os países donos das patentes cresceram (CHANG, 2003).
Como exemplo, a intenção da China de crescer tecnologicamente é considerada uma
ameaça aos EUA, principalmente quando se leva em consideração que a indústria de
semicondutores fez com que a participação da China no mercado internacional crescesse
consecutivamente, e isso pode tornar ineficazes as políticas norte-americanas de contenção do
mercado chinês (MAJEROWICZ e MEDEIROS, 2018, p. 17).
Para então reverter esse quadro de dependência, a China precisava criar seu próprio
mercado de oferta de semicondutores e outros produtos tecnológicos. E mais do que criar, era
preciso capacitar a indústria para que esta viesse a ser um importante player no mercado
internacional. Para alcançar esse objetivo de autossuficiência é preciso suplementar não só as
empresas públicas e privadas, mas também as pessoas, os intelectuais por trás das pesquisas.
Uma estratégia que envolve a percepção dos setores da sociedade que estão debilitados e
capacitá-los para que juntos promovam o desenvolvimento desejado pelo país, uma
coordenação que somente o Estado poderia prover. Assim, o governo da China dava início à
inovação autóctone (MAJEROWICZ e MEDEIROS, 2018).

2.5 – A INOVAÇÃO AUTÓCTONE CHINESA

A inovação autóctone se dá em toda ou grande parte da produção originada no país, o


que para a China significaria a mudança do termo Made in China para Created in China. E
para chegar a este patamar, o governo chinês precisou entrar com um plano de priorização das
diversas fontes de conhecimento que possam alavancar a inovação endógena, como P&D,
empresas e universidades e atividades e projetos econômicos, que por si só não conseguiriam
estabelecer a indústria de inovação autóctone, cabendo ao governo planejar e financiar essas
fontes.
O papel do governo na promoção da indústria de inovação autóctone é algo que pode
ser notado também na Segunda Guerra Mundial, quando os Estados Unidos incentivou P&D e
solicitou produtos que viriam a ter valor lucrativo, o que incentivou o setor privado a
desenvolver semicondutores e deu impulso para a indústria de inovação endógena do país,

33
como afirmam Majerowicz e Medeiros (2018, p. 13). Segundo os autores, a indústria não
poderia se firmar sozinha por conta dos altos valores e riscos, e por conta disso outros países
não tiveram sucesso no desenvolvimento da indústria, pois não houve o suporte estatal para
cobrir esses custos.
A criação de semicondutores e circuitos integrados nacionais revela um grande
dispêndio que somente o Estado tem coragem de arriscar. Para a fabricação de apenas um
chip o custo pode ultrapassar 1 bilhão de dólares, como foi o caso da primeira tentativa da
China com joint-venture em 1999 (GÉLIO, 2011, p. 27). Um outro exemplo desse grande
custo é a fábrica de chips construída em Taiwan com valor de US$ 16 bilhões (VERWEY,
2019, p. 15).
A indústria de semicondutores é composta por três fases de produção que em ordem
de fabricação são: 1) design do circuito integrado, que requer um investimento de até US$ 50
milhões; 2) a fabricação dos chips/wafer, que podem chegar a US$ 5 bilhões; e 3) a
montagem final do chip, que envolve testes e embalagem, com custos de até US$ 500 milhões
(AITA, 2013, p. 29-31).
O alto custo de se criar uma indústria nacional de semicondutores remete ao que
Mariana Mazzucato diz sobre como o setor privado tende a evitar projetos a longo prazo por
conta do risco envolvido, cabendo ao Estado fazer todo o investimento. A indústria de
semicondutores é exatamente esse projeto de longo prazo, sem ideia de possível retorno. Aqui
se prova mais uma vez como o Estado é necessário para máquina locomotiva da economia e
seu desenvolvimento, pois sem o próprio, a necessária indústria de inovação científica e
tecnológica poderia não ter acontecido.
A tática da China de ter uma indústria tecnológica endógena ganhou força em 2006
com o “Plano Nacional de Médio e Longo Prazo para o desenvolvimento da Ciência e da
Tecnologia” (conhecida como MLP em inglês), no qual o governo criou metas e índices para
atingir a autossuficiência em inovação científica e tecnológica em um período de 15 anos
(2006-2020) (CAO, SUTTMEIR e SIMON, 2006, p. 38).
O plano surgiu da quinta e última conferência nacional realizada em 2006, com suas
anteriores tendo o mesmo foco de renovar a sociedade por meio da ciência e da tecnologia. É
importante ressaltar que na primeira conferência (1978), Deng Xiaoping proclamou que os
intelectuais a partir daquele momento faziam parte da classe trabalhadora, como afirma
Cassiolato (2013, p. 68), o que evidencia que entre sucessos e fracassos, o plano de
desenvolver o país em direção à inovação continua sendo estimulado pelo governo.

34
A valorização da ciência e da tecnologia dada pela China desde tais palavras de Deng
Xiaoping pode ser encontrada na elaboração do MLP, que reuniu mais de 2000 cientistas e
engenheiros com executivos das principais empresas e economistas para que juntos pudessem
verificar quais medidas políticas seriam necessárias para que o país atingisse pleno
desenvolvimento com inovação autóctone (IEDI, 2011).
O plano possuía o objetivo de investir pelo menos 2,5% do PIB à P&D, limitar ao
número de 30% a dependência de importações e aumentar para mais de 60% a contribuição
chinesa para o crescimento econômico do país (CAO, SUTTMEIR e SIMON, 2006, p. 38). A
intenção era criar um ambiente favorável para o crescimento da indústria e ao
desenvolvimento do país, e para isso era necessário não só suplementar a baixa capacidade de
inovação endógena, como também fazer com que houvesse uma maior integração das
empresas com a área científica tecnológica, o que envolveria um estímulo ao investimento em
P&D (IEDI, 2011).
Havia também o desejo de que a China se tornasse um dos países com maior número
de patentes, com sua área científica sendo referência mundial (Ibidem). Para que isso
acontecesse, o governo chinês se dispôs a conceder incentivos fiscais para que as empresas
tivessem uma participação maior no sistema de inovação do país, principalmente em P&D.  
Dessa forma, em 2009 o governo chinês lançou a Circular 618, que anunciava a
criação de um catálogo com mais de 240 tipos de produtos desejados pelo governo, nos quais
os produtos fabricados nacionalmente teriam prioridade nas compras governamentais
(CASSIOLATO, 2013, p. 76). Além do incentivo para que as empresas nacionais buscassem
inovar, o governo queria também renovar sua indústria, retirando os produtos estrangeiros e
substituindo por aqueles produzidos na China (Ibidem). As empresas que se empenhassem
ganhariam subsídios e incentivos fiscais. O espaço que o governo da China deu para as
empresas privadas permitiu que a indústria de design de circuitos integrados chegasse a US$
17 bilhões em 2014, em comparação a um número inexistente no início do século (ERNST,
2016, p. 5).
O desejo da China de ter um desenvolvimento voltado à inovação se concretizou com
a forte integração entre as empresas e as universidades, onde os resultados de P&D destas
passaram a ser rapidamente encaminhados para as empresas. Além disso, algumas empresas
adquiriram laboratórios nas universidades, firmando a ponte entre pesquisadores e o setor
industrial (IEDI, 2011).
Uma das forças motrizes que contribuem para o nível de melhoria da capacidade
tecnológica da indústria chinesa de circuitos integrados são os vínculos estreitos com

35
instituições públicas de pesquisa, uma vez que a colaboração acadêmica industrial é
um importante fator impulsionador para o acúmulo de capacidades de inovação das
empresas nacionais. As empresas nacionais relataram a maior intensidade de P&D por
gastos em vendas. (KONG et. alli, 2015, p. 15, tradução livre).

Em 2012, uma pesquisa com empresas selecionadas apontou que 56% delas
contrataram universidades e institutos de pesquisa para elaboração de P&D, e que 90% delas
receberam ajuda do governo. A China conseguiu atingir a meta de uma maior inclusão das
empresas no setor de inovação tecnológica, mas como pode ser visto pelos resultados dessa
pesquisa, o governo ainda era o grande financiador da indústria de inovação científica e
tecnológica, com 63% do investimento governamental sendo consumido pelas empresas
(IEDI, 2011).
Até 2013, a ZTE Corporation recebeu subsídios e ajuda fiscal do governo, mostrando-
se como um dos exemplos de que as políticas governamentais de incentivo à inovação
científica e tecnológica deram certo. A ZTE investiu massivamente em P&D (ver Tabela 2) e
contribuiu para a valorização dos pesquisados científicos e tecnológicos, criando o Fórum de
Colaboração Indústria-Universidade-Instituto de Pesquisa, aproveitando ao máximo P&D
formuladas pelas universidades, visando o desenvolvimento a longo prazo (RAN e CHEOK,
2016, p. 261). O governo também ofereceu propriedades de baixo preço para que a ZTE
construísse institutos de pesquisa (Ibidem).

Tabela 2: Porcentagem de gastos em P&D da ZTE Corporation após o MLP 2006-2020

Ano Total de vendas (em milhões de Yuan) Gastos em P&D como % das vendas
2007 34.777,00 9.23
2008 44.293,40 9.02
2009 60.272,60 9.59
2010 69.906,70 10.14
2011 86.254,50 9.85
2012 84.118,90 10.50
2013 75.233,70 9.81
2014 81.471,30 11.06
2015 100.186,40 12.18

Fonte: Li Ran, Cheong Kee Cheok (2016)

A Huawei também foi uma das empresas que acompanharam a política de promoção à
P&D, sendo responsável por diversos centros de pesquisa pela China (IEDI, 2011). Em 2010,
ambas empresas foram listadas entre as principais empresas com mais solicitação de patentes
(Ibidem). Foi a primeira vez que empresas chinesas alcançaram essa conquista.

36
Mas além dos investimentos empresariais em P&D, para a eficácia de um
desenvolvimento voltado para a inovação, a China precisou investir também na fonte primária
de conhecimento: a educação. Ao longo da primeira década do século XXI, o governo chinês
investiu massivamente no ensino superior, abrindo espaço para mais estudantes, que em 2006
havia mais de 5 milhões de estudantes matriculados, uma quantidade expressiva em
comparação aos anos anteriores (Ibidem).
De acordo com o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI)
(2011), a cadeia de estudantes universitários continuou crescendo, ultrapassando 20 milhões
de matrículas na graduação e mais de 1 milhão na pós-graduação em 2009, somando 2.317
universidades, com apenas 334 sendo não públicas. O número de estudantes chineses
ultrapassou o número dos EUA e da União Europeia, refletindo o bom investimento do
governo chinês, que em 2010 direcionou 4% do PIB para a educação, segundo o IEDI.
O número de pesquisas, patentes e artigos publicados em revistas científicas é uma
maneira de medir a produtividade das universidades e centros de pesquisa, bem como se as
políticas governamentais foram eficientes e trouxeram desenvolvimento e capacidade de
inovação ao país (IEDI, 2011). De acordo com dados da UNESCO em 2015, os artigos
científicos da China estavam entre os 10% mais citados, uma porcentagem significativa tendo
em vista que a média da OECD daquele ano foi de 11,1%. A quantidade de publicações
científicas da China cresceu sem parar ao longo dos primeiros quinze anos do século XXI,
diminuindo a diferença em relação aos EUA, líder em inovação tecnológica, a partir de 2014
(ver Gráfico 5).

Gráfico 5: Comparação entre os EUA e a China na quantidade de publicações científicas entre


os anos de 2003-2015

37
Fonte: elaboração própria com base em National Science Board (2018).

Com esses dados expostos é possível dizer que a China conseguiu atingir grande parte
dos seus objetivos. Mas mesmo com esses resultados, o governo precisava continuar
investindo e financiando o sistema de inovação para que o país viesse a ser uma potência em
ciência e tecnologia. Dois projetos foram consolidados para dar continuidade ao
desenvolvimento chinês, o Programa de Mil Talentos, que continuaria a incitar o crescimento
da base estudantil e da ciência, e o Made in China 2025, que levaria a indústria de inovação
autóctone a outro patamar.

2.6 – PROGRAMA MIL TALENTOS E MADE IN CHINA 2025

Apesar da quantidade de publicações científicas ser um medidor de sucesso, a China


queria também ser referência em questão de qualidade. Com a massa de pesquisadores sendo
o núcleo da produtividade intelectual que estabelece o sistema de inovação tecnológico, havia
uma busca por aqueles mais capacitados e com grande criatividade. Dessa forma, para
reforçar sua base intelectual, o governo chinês queria trazer de volta os seus talentos que
saíram do país para estudar e não retornaram. Entre os motivos de não retorno estava o
sistema da China não sendo muito acolhedor aos seus talentos (ZWEIG e WANG, 2012, p.
11). Mas com as reformas feitas pelo governo, principalmente pelo incentivo de integração
entre as empresas e as universidades, a China queria mostrar que as habilidades dos

38
pesquisadores seriam reconhecidas, formando assim uma atração também para os talentos
estrangeiro, segundo o instituto de pesquisa Conference Board of Canada (CBoC) (2016, p.
4).
Assim, em 2008 nasceu o Programa de Mil Talentos (Thousand Talents Plan), que tem
como objetivo atrair talentos globais para o contínuo plano da China de ter um
desenvolvimento econômico baseado em inovação. Uma base de profissionais com grande
capacidade intelectual também serviria para dar credibilidade às instituições chinesas,
quebrando mais uma vez o estigma de baixa qualidade relacionado a China.
Foi criado um fundo para cobrir as viagens feitas pelos recrutadores e para outras
formas de busca internacional. De acordo com Zweig e Wang (2012, p. 21), o talento
selecionado deveria estar de acordo com as necessidades de desenvolvimento da China, e a
universidade que conseguisse atrair um talento global de acordo com as regras estabelecidas
receberia um incentivo com verbas no valor de 1,8 milhão de dólares 11, beneficiando todo o
corpo docente com o programa. Segundo eles, o governo certifica-se que os talentos
recrutados não precisem se preocupar em como se acomodar no país, fornecendo auxílios de
moradia, alimentação e educação, e também seguros de saúde e de acidente de trabalho.
Entre os estrangeiros, 3.000 cientistas haviam entrado no programa até o ano de 2014,
que logo deram resultados com 1.245 patentes e 4.416 publicações científicas (CBoC, 2016,
p. 12). No que tange à reversão da fuga de cérebros chineses, dados da UNESCO (2015)
revelam que a propaganda do governo chinês deu certo, atraindo cada vez mais estudantes
chineses de volta ao país (ver Gráfico 6).

Gráfico 6 – Números cumulativos de estudantes chineses que foram para o exterior e


retornaram no período de 2001-2013

11
Em valores cambiais do dia 03/11/2020.
39
        Fonte: Unesco Science Report (2015).

Porém, apesar dos indicadores positivos sobre a eficácia das políticas governamentais
para o desenvolvimento do país, a desaceleração da economia chinesa a partir do ano de 2010
(ver Gráfico 1) preocupou o governo chinês, mesmo que em nível mundial o crescimento da
China continuasse alto. O receio vem da possibilidade de a China cair na “armadilha da renda
média” (YU, 2019, p. 37), um conceito dado para aqueles países que ficam estagnados
economicamente após um crescimento contínuo.
Esse fenômeno ocorreu à China séculos atrás, o motivo estava na razão do país ter
explorado todas as suas possibilidades de crescimento, atingindo a estagnação. Como
abordado na primeira parte desse trabalho, uma das opções encontradas por outros países para
evitar cair nessa armadilha foi a exploração capitalista de recursos estrangeiros. Mas a força
para sair dessa inércia vem diretamente do Estado que com leis, instituições, incentivos e
direcionamentos (ARRIGHI, 2008, p. 64), move a economia rumo à inovação. No caso da
China no século XXI, um dos motivos que podem acarretar a estagnação é a incapacidade de
criar produtos nacionais, buscando a “imitação” como solução (REIS, 2018). 
Dessa forma, o governo chinês se empenhou para mudar esse cenário, como pôde ser
visto nas diversas medidas políticas e econômicas para impulsionar a inovação autóctone.
Porém, buscando acelerar esse processo, em 2015 nasceu o programa “Made in China 2025”
(MIC 2025). O plano é usar as vantagens que a China já tem, como o mercado, as empresas e
os talentos para elevar o nível dos dez setores-chave: tecnologia de informação avançada,
equipamento aeroespacial, ferramentas de controle e de robótica, equipamento marítimo de

40
alta tecnologia, equipamento ferroviário, veículos de energia eficientes e renováveis,
dispositivos médicos, máquinas agrícolas, equipamentos elétricos e novos materiais12.
Apesar do nome, o plano se estende até o ano de 2049, ano do 100º aniversário da
República Popular da China, com três fases. A primeira é até 2025 e consiste no
aprimoramento tecnológico e no crescimento da China como competidor internacional; a
segunda, até 2035, realizar a industrialização e produzir tecnologias essenciais; e a terceira,
até 2049, obter um sistema industrial avançado e consolidar a China como potência industrial
(YU, 2019, p. 33). As bases do projeto podem ser separadas em duas vertentes:
Restabelecimento e Estabelecimento.
No que tange ao Restabelecimento, a intenção do governo é continuar provendo os
meios necessários para que a dependência internacional diminua cada vez mais, com metas de
40% de autossuficiência até 2020 e 70% até 2025 (Ibidem, p. 36). O foco é em atualizar os
processos de fabricação tradicionais para que se tornem mais inteligentes e adquiram mais
qualidade. A prioridade em melhorar a qualidade reside em produzir produtos tão bons quanto
os de marcas de sucesso, para que assim os produtos chineses venham a ser alternativas a
essas marcas e consequentemente aumentem a participação do mercado chinês mundialmente
(VERWEY, 2019, p. 14). A robótica é uma das indústrias-chave para isso, pois além de
diminuir o custo de trabalho, ajuda a melhorar a baixa eficiência produtiva da China e insere a
qualidade desejada, competindo com indústrias dos EUA e da Alemanha (ARBIX et al, 2018,
p. 153).
No que tange ao Estabelecimento, a ideia é buscar as possíveis futuras vantagens de
liderança global, verificando as demandas em ascensão para estabelecer a produção o quanto
antes. O intuito é criar marcas chinesas, fortalecer a transição do “Made in China” para
“Created in China” / “Designed in China”. Os semicondutores analógicos são um exemplo de
futura prosperidade, pois com o aumento de veículos eletrônicos como ônibus e carros
automáticos, os semicondutores analógicos serão necessários para funcionalidades como
sensores e administração de energia (ERNST, 2016, p. 14). A importância dos analógicos está
ligada ao crescimento da automatização tecnológica da Internet das Coisas (IoC), que está
ligada chamada Quarta Revolução Industrial, que segundo autores, vai mudar a forma da
sociedade de viver, relacionar e trabalhar (ORTEGA, 2019).
Para que esses objetivos sejam alcançados, o governo chinês ofereceu fundos
nacionais para facilitar o desenvolvimento de P&D e aperfeiçoar a tecnologia. O MIC 2025 é
12
MADE in China 2025. Institute for Security and Development Policy, jun. 2018. Disponível em:
<https://isdp.eu/publication/made-china-2025/>. Acesso em 21 jul. 2020.
41
considerado o único meio para assegurar a defesa nacional e tornar a China uma potência
global (YU, 2019, p.31).
Devido ao avanço tecnológico e sua implementação em diversos setores, a indústria de
inovação científica e tecnológica se tornou o cerne da produção, portanto dominá-la não só
melhoraria o desempenho econômico do país como também impulsionaria seu poder frente ao
sistema internacional. Perante essa premissa, a China precisaria ter suas próprias criações
tecnológicas para que pudesse se tornar de fato um player na indústria mundial de inovação
C&T. Com isso em vista, uma indústria não muito explorada mas que está entre os dez
setores-chave do projeto MIC 2025, é a indústria de energias renováveis, que apesar de tomar
impulso junto ao projeto, vem ganhando espaço desde os primeiros anos do século XXI.

2.7 – A INDÚSTRIA DE ENERGIAS RENOVÁVEIS

Ao progresso das indústrias mundiais, a produção se intensificou e as consequências


desse avanço pôde ser vista nas variações do clima ao redor do mundo por conta das emissões
de gás carbono liberados pelas grandes fábricas. Os danos causados ao meio ambiente e à
saúde populacional logo puderam ser sentidas também pelas empresas, que ao ver suas rendas
afetadas, passaram a aderir a chamada Revolução Industrial Verde, que consiste na
transformação do atual sistema industrial para um que seja ambientalmente sustentável
(MAZZUCATO, 2014, p. 217). Com a economia moderna sendo movida em grande parte por
energias que provém do carvão e do petróleo, causadoras da emissão de gases do efeito estufa,
a reformulação da estrutura econômica ganha importante discussão no século XXI.
O caso da China é ainda mais preocupante por conta das mazelas que o país já sofre
com secas, enchentes, forte calor e outros infortúnios que podem se acentuar com o
aquecimento global. Em 2006, a China já era considerada a maior emissora de carbono
(ZOTIN, 2018, p. 99), e em 2013, sete cidades chinesas estavam no ranking das dez cidades
mais poluídas do mundo (CHIU, 2017, p. 4).
Para a China, que havia crescido rapidamente nas últimas décadas, a poluição poderia
vir a ser um obstáculo ao almejado desejo de ser um líder global até a segunda metade do
século. Os impactos negativos da crise ambiental do país ameaçam a eficiência das políticas
governamentais de criar uma sociedade próspera com qualidade de vida e crescimento
econômico.

42
Além disso, a crise ambiental causa também dependência econômica para a China,
que por ter se tornado um dos maiores fabricantes do mundo, o país lidera como o maior
consumidor de energia13. Isso faz com que a China precise importar fontes convencionais de
energia, como petróleo e gás, dependendo assim da capacidade energética de outros países
(ZHANG et al, 2017, p. 6). Assim como na questão dos semicondutores importados, essa
dependência coloca em perigo o ritmo da economia chinesa, causando uma insegurança
energética, pois o funcionamento da indústria chinesa poderia falhar com uma possível
ruptura de abastecimento estrangeiro (Ibidem).
As perdas econômicas também foram fonte de uma nova maneira de pensar o
abastecimento energético das indústrias, uma vez que as perdas anuais chegaram a atingir 6%
do PIB chinês (ZOTIN, 2018, p. 90). Os gastos médicos com trabalhadores adoecidos por
conta do ar poluído aumentaram e as mortes por conta do mesmo passaram de 1 milhão
chineses entre 1990 e 2015 (Ibidem). Ao passo que os problemas ambientais foram
aumentando, protestos passaram a ser corriqueiros na China, além da pressão vindo de outros
países e instituições para que o país chinês se comprometesse com a redução da emissão de
gás carbono. Diante de tais problemas econômicos e sociais, era preciso mudar.
Nesse cenário, o Estado age mais uma vez como o principal condutor da indústria de
energias renováveis, que se enquadra nas características das indústrias apresentadas neste
trabalho, pois precisa de grandes investimentos e seus resultados são a longo prazo. O risco
desta indústria foi ainda maior por não ter tamanha consolidação e não ser tão atraente aos
investidores. A responsabilidade de assegurar a indústria nascente cai totalmente ao governo,
principalmente por toda questão social envolvida no tema, uma preocupação somente do
Estado, uma vez que os investidores do setor privado almejam apenas o lucro.
Os governos têm um papel de liderança a desempenhar no apoio ao desenvolvimento
de tecnologias limpas além dos estágios de protótipos até sua viabilização comercial.
Para alcançar a “maturidade” tecnológica é preciso mais apoio para preparar,
organizar e estabilizar um “mercado” saudável, em que o investimento tenha uma
margem de risco razoavelmente baixa e o lucro seja possível. (MAZZUCATO, 2014,
p. 249).

Assim, em 2005, a China sancionou a lei que serviria como base para a indústria
chinesa de energia renovável, que nos próximos anos se expandiu descomunalmente (ZOTIN,
2018, p. 118). A Lei de Energia Renovável marcou o ponto que o governo integrou as novas
fontes de energia na indústria de inovação, que a China já vinha tentando utilizar como
ímpeto para o desenvolvimento do país.
13
CHINA é o maior consumidor de energia do mundo. Revista Veja, 06. mai. 2016. Disponível em:
<https://veja.abril.com.br/ciencia/china-e-o-maior-consumidor-de-energia-do-mundo>. Acesso em 20 de ago. de
2020.
43
Por conta dos custos de desenvolvimento de inovação serem altos, a lei implementou
as tarifas feed-in (FIT, na sigla em inglês), que serviriam para compensar o dispêndio que os
produtores teriam ao fornecer energia renovável (ZHANG et al, 2017, p. 10). Mas além da
motivação aos produtores, o governo chinês também pensou em como aplicar, isto é, as áreas
necessárias para as tarifas. As áreas que possuem maiores recursos para a efetivação das
energias renováveis receberiam tarifas mais baixas, enquanto as tarifas mais altas seriam
direcionadas para as áreas com menos abundância (Ibidem).
Além disso, a lei criou também o Fundo Especial de Desenvolvimento de Energia
Renovável para subsídios em áreas essenciais para a indústria e incentivo para projetos de
ciência e tecnologia (ZOTIN, 2018, p. 118). Outras leis foram sancionadas para ajudar na
efetivação dos planos de criação da indústria de energia renovável e no mercado chinês como
um todo, como é o caso da lei que tem como requisito que a composição das turbinas
utilizadas na indústria de energia eólica tenha pelo menos 70% de conteúdo local, o que fez
com que a participação doméstica fosse de 30% em 2005 para 90% em 2010 (Ibidem, p. 122).
Dois anos depois, em 2007, o governo lançou o Programa Nacional de Mudanças
Climáticas, um plano que impulsionaria a transição energética da China e o seu
desenvolvimento sustentável. A meta é de reduzir os impactos da questão ambiental no PIB
do país e aumentar até em 10% a dimensão das energias eólicas e em 15% o consumo, até
2020 (CHENG, 2010, p. 13). Já no primeiro ano da elaboração do programa, o uso de biogás
foi verificado em mais de 26 milhões residências, o que é equivalente a uma redução de mais
de 40 milhões de toneladas de dióxido de carbono (Ibidem). Esse programa revela um
desenvolvimento mais envolvido com o bem-estar social, comparado com a indústria de
semicondutores e outros setores tecnológicos, e cumpre com o desejo chinês de fazer com que
a sociedade se desenvolva ao lado da economia.
No mesmo ano foi implantado o Plano de Desenvolvimento de Médio e Longo Prazo
para Energias Renováveis, que com objetivos de curto e longo prazo (como propõe o nome)
buscou criar meios para sustentar a indústria que ainda era muito recente. Os recursos para
isso envolveram políticas fiscais para facilitar o desenvolvimento e a utilização de energias
renováveis, investimento público de US$ 263 milhões para expandir a capacidade das novas
energias e isenções fiscais para incentivar as empresas a investir em P&D (ZOTIN, 2018, p.
119).
Para diminuir ainda mais a dependência estrangeira, o número de subsídios cresceu de
forma expressiva, principalmente com o Programa Golden Sun (2009), que forneceu subsídios

44
para as empresas e atividades que tinham como interesse a instalação de painéis solares
fotovoltaicos. Segundo Zotin (2018, p. 124), a iniciativa fez com que o mercado interno de
energia renovável se tornasse mais competitivo, com as regiões competindo entre si para
atrair companhias que desejavam fabricar painéis solares e assim ganhar os subsídios estatais.
O resultado foi de excesso de capacidade, com mais de 2000 fábricas construídas. Os
subsídios indicam o grande investimento e o comprometimento do Estado com a indústria de
energias renováveis, que chegou a US$ 132 bilhões em 2017, ultrapassando os EUA e a
Europa, que antes da ascensão chinesa era a região com maior investimento (ver Gráfico 7).

Gráfico 7 – Comparação entre China, EUA e Europa em relação ao investimento na


indústria de energias renováveis.

           Fonte: Bloomberg New Energy Finance.

A importância das energias renováveis cresceu tanto após essas medidas políticas que
pela primeira vez a China incluiu a indústria no seu 12º Plano Quinquenal (2011-2015),
tornando-se assim uma prioridade para o país (MAZZUCATO, 2014, p. 229). As empresas e
outras instalações de geração de energia receberam incentivos para a produzir energias
renováveis por meio do sistema de Comércio de Emissões de Carbono (ETS, na sigla em
inglês) (ZHANG et al, 2017, p. 21), uma medida também utilizada por outros países, que
estabelece um limite de emissões de carbono. O limite é imposto por meio de licenças que
podem ser comercializadas de acordo com os preços do mercado14. 

14
EMISSION Trading Schemes in China. ETS in China. Disponível em: <https://ets-china.org/ets-in-china/>.
Acesso em 04 de set. de 2020.
45
O plano também abriu espaço para utilizar a indústria de inovação como forma de
reduzir as desigualdades do país. Em 2014 deu-se início ao projeto de “alívio da pobreza” que
promoveria um aumento nas rendas familiares e aceleraria o uso das energias renováveis.
Zhang et al. (2017, p. 31) descrevem que as famílias de áreas pobres são incentivadas a
instalar painéis solares fotovoltaicos, em espaços abertos ou telhados, evitando gastos ao
prover sua própria energia e também podendo comercializar seus resultados para as redes de
energia. Em troca de subsídios, as empresas também foram motivadas a participar, com a
condição de que deveriam compartilhar as vantagens das estações de painéis solares com as
famílias pobres. Estima-se que o projeto irá ajudar mais de 6.000 famílias até o ano de 2020
(Ibidem).
O projeto traz atenção para o papel do Banco de Desenvolvimento da China (CDB, na
sigla em inglês) no processo do desenvolvimento econômico chinês, que junto com o Banco
de Desenvolvimento Agrícola da China (ADBC), apoiaram o projeto de alívio da pobreza.
Mazzucato (2014, p. 225) relata que em 2010, o CDB possibilitou para as principais empresas
fabricantes de painéis solares voltaicos o uso de US$ 47 bilhões para cobrir os gastos
envolvidos na ampliação do setor.
O banco estatal reflete a importância do papel do Estado na economia, pois os bancos
privados evitam se comprometer em iniciativas que possam causar prejuízo e tem como único
objetivo o lucro dos investidores privados (Ibidem, p. 253), e por conta disso, indústrias como
a de energia renovável, não teriam surgido e crescido se dependessem somente da “mão livre”
do mercado.  O auxílio público dado pela China aos fabricantes de painéis solares permitiu
que a indústria se estabelecesse e se tornasse uma das mais importantes do cenário
internacional, ultrapassando os EUA em 2010 como o maior mercado de energia eólica do
mundo (Ibidem, p. 275) e a União Europeia em 2013 em termos de maior capacidade
instalada (ZOTIN, 2018, p. 138)
Por tal razão, o mercado da China de energias renováveis sofreu tentativas de boicote
vindo dos EUA e da Europa. Mazzucato (2014, p. 288) afirma que as os embates comerciais
travados pelo governo norte-americano e o europeu reforçam a premissa de que o Estado é
necessário para que o desenvolvimento do país siga de acordo com as necessidades do país.
Afinal, se o mercado se autorregula, estes governos não precisariam ter que conter o avanço
da China no mercado mundial.
A força do Estado chinês também pôde ser vista por meio das empresas estatais que
responderam por metade do mercado de energia (ZHANG et al, 2017, p. 26). Com maior

46
facilidade financeira, as estatais podem arcar com os riscos que a indústria traz e implementar
sem muitas objeções as medidas políticas para o crescimento das energias renováveis
(Ibidem). Com os possíveis resultados positivos, as empresas estatais podem vir a servir de
exemplos para que as empresas privadas adquiram a transição energética.
Os incentivos estatais para a indústria de energias renováveis e a transição energética
atingiram também o mercado de trabalho com resultados benéficos e prósperos para a
sociedade chinesa. Com as empresas aderindo as inovações energéticas, o número de
empregos subiu e em 2015 as oportunidades de trabalho no setor de energias renováveis
foram 35% maiores do que o oferecido pela indústria de combustível fóssil (Ibidem, p. 30).
Segundo a Agência Internacional para as Energias Renováveis (IRENA, em inglês), em 2016
a China gerou 3,5 milhões de empregos na indústria de energias renováveis, sendo o país que
mais gerou empregos na área, como pode ser visto na tabela abaixo.

Tabela 3: Empregos diretos e indiretos (em milhões) na indústria mundial de Energias


Renováveis (2016)

Fonte: IRENA Renewable Energy and Jobs - Annual Review 2016, p. 17.

No entanto, o governo chinês precisou pensar também nos malefícios que a indústria
trouxe, uma vez que com novas energias é preciso aprender novas técnicas e habilidades para
atuar na área, o que acabou afetando boa parte dos trabalhadores das regiões que dependem da
rede de energia tradicional. Dessa forma, políticas de auxílio social foram criadas, nas quais o
governo incentivava a realocação dos trabalhadores e permitia que pudessem se aposentar
aqueles que estivessem próximos ao ano previsto (ZHANG et al, 2017, p. 36). Cursos de
capacitação técnica também foram disponibilizadas para que os trabalhadores pudessem se
inserir no novo mercado (Ibidem).

47
Protegendo a indústria de energia renovável desde os seus primórdios e investindo na
inovação dela como um todo, movendo empresas e pessoas ao aperfeiçoamento da indústria, a
China atingiu o maior nível de capacidade instalada de energias renováveis, que se manteve
em crescimento até a realização desta pesquisa, como apontam dados da IRENA (2020, p. 2).
O indicador de que as políticas governamentais rumo ao desenvolvimento econômico e de
inovação foram eficientes pôde ser verificado em 2015, quando o número de patentes atingiu
o número de 45.700 registros, uma diferença de 94% em relação a 2005 (ZOTIN, 2018, p.
145).
Tendo em vista o “sonho chinês” (HEIN, 2018), a indústria de energias renováveis
torna-se um importante componente para a indústria de inovação científica e tecnológica,
possibilitando o almejado desenvolvimento social e econômico. A promessa de que a China
poderia ser novamente um líder mundial em aspectos econômicos, culturais e tecnológicos
séculos atrás, passa a ganhar seus primeiros indícios ao decorrer do século XXI com o Estado
agindo como seu principal condutor, feito o “maestro da orquestra”. 

CONCLUSÃO

48
Este trabalho teve como objetivo mostrar diversas políticas governamentais na área de
inovação científica e tecnológica para o desenvolvimento econômico da China, necessárias
para que o país alcançasse os objetivos nacionais em meio a imperativos externos, mostrando
como o papel do Estado na economia se torna imprescindível. Mais do que ajustar pequenas
falhas do mercado, o exemplo chinês mostrou que o Estado tem a capacidade de fazer com
que o mercado se estabeleça, como é o caso das energias renováveis, e crie novos caminhos
para o mesmo, como é o caso também da indústria de semicondutores. O sucesso do
desenvolvimento da China está estritamente ligado à força estatal.
O Estado chinês fez com que o mercado interno ficasse mais atrativo para os
investidores estrangeiros, consolidando a indústria de semicondutores no país, que por
consequência impulsionou a China a criar seus próprios produtos tecnológicos por meio da
inovação autóctone, que contou com respaldo estatal para que se realizasse. O “Programa de
Mil Talentos” e o “Made In China” são exemplos do esforço estatal para que o
desenvolvimento econômico do país continuasse a todo vapor, fortalecendo a conexão entre a
base estudantil e a indústria de inovação. E ao abrir caminho para a indústria de energias
renováveis, vista como não muito rentável por outros países, o governo da China fortalece
mais um meio de inovação que possa levar o país ao desejado posto de potência tecnológica
na metade do século XXI.
A trajetória chinesa no início do século XXI demonstra como é preciso “aceitar”, em
termos político-ideológicos, o Estado como um ator principal do mercado (nacional e
internacional), principalmente para os países em desenvolvimento que tentam se espelhar nos
países desenvolvidos. Uma vez que cada país tem sua própria história, cultura e economia,
somente o Estado, prevendo o bem-estar social geral (e não somente de produtores
individuais), pode localizar as áreas que precisam de suplementação para um bom
desenvolvimento. A narrativa de um Estado inerte perde força, e a China mostra como é
possível utilizar modelos alternativos ao modelo liberal ocidental.
Outro fator importante para o desenvolvimento econômico, como pôde ser visto ao
decorrer do trabalho, é a participação da ciência e da pesquisa, complementos essenciais para
que a indústria de inovação siga em movimento. O sistema educacional é uma das bases para
um bom desenvolvimento, algo que a China compreendeu antes mesmo de adentrar ao século
XXI quando Deng Xiaoping inseriu os pesquisadores como parte da classe trabalhadora,
como apresentado na seção 2.3. O Programa Mil Talentos evidencia o plano de valorização da
área acadêmica, buscando atingir a sua eficiência máxima. Tendo em vista o crescimento

49
contínuo da China ao lado de políticas que incentivam P&D, é possível dizer que sem
investimento em educação, não há crescimento econômico.
Ademais, o investimento estatal na capacitação de pessoas não fomenta apenas a
indústria de inovação, mas também as indústrias já existentes, uma vez que com uma maior
qualidade e quantidade profissional, o mercado interno se fortalece e atrai investimentos
estrangeiros, cooperando com o desenvolvimento do país.
Além da questão educacional, o Estado também toma a frente da questão ambiental,
que cada vez mais se torna um fator crítico diante do aquecimento global e suas adversidades.
Com um setor privado interessado na causa somente quando há lucratividade, cabe ao
governo ser o agente propulsor das novas energias e de processos industriais que sejam
sustentáveis, conscientizando a sociedade e tornando a indústria atraente para os investidores.
O investimento e a criação de meios para a funcionalidade do mercado interno e o
desenvolvimento do país mostram uma característica revolucionária do Estado, capaz de
direcionar o caminho da economia. Se torna importante enfatizar que a demonstração da sua
magnitude não indica uma rivalidade com o setor privado, e muito menos uma ideia de
sobrepô-lo, mas sim que o poder do Estado na economia não deveria ser subestimado.

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