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Sumário

Capítulo 1
Como surgiu a disciplina Introdução ao Desenvolvimento de Jogos na Universidade
de Brasília.........................................................................................................6

Capítulo 2
Behold Studios: Os Cavaleiros da Caneta e Papel Conquistam o Mudo................11

Capítulo 3
Advergames e jogos educativos pela Fira Soft......................................................25

Capítulo 4
Delta Creatures: A luta por um lugar entre os grandes..........................................37

Capítulo 5
Como andam as três desenvolvedoras e a disciplina de IDJ?..................................45

Referências Bibliográficas.................................................................................50
5
CAPÍTULO

1
Como surgiu a disciplina Introdução ao
Desenvolvimento de Jogos na
Universidade de Brasília.

No segundo semestre de 2007, o aluno Saulo Camarotti estava para começar


sua monografia do curso de Ciência da Computação na Universidade de Brasília.
Saulo fundaria no ano seguinte a desenvolvedora de jogos digitais Behold Studios,
que se tornaria a mais famosa de Brasília. Para orientar seu Trabalho de Conclu-
são de Curso (TCC), ele procurou a professora Carla Denise Castanho.
Carla já tinha interesse em trabalhar em pesquisas na área de games porque
já tinha percebido a ausência de uma disciplina que comtemplasse o desenvolvi-
mento de jogos digitais. Por ser uma pessoa muito atenciosa com os alunos, ela
sempre ouvia o pedido de uma matéria dessas dos calouros do primeiro semestre
do curso quando os questionava do porquê decidiram estudar Ciência da Compu-
tação. A maioria dos jovens, entre 16 e 17 anos, afirmavam querer trabalhar na
área de desenvolvimento e programação de games.
Então, os dois começaram a trabalhar no projeto JEOMM - Desenvolvimento
de um Jogo Educacional Online 3D Massivamente Multijogador ao lado de mais
três pessoas.
Ainda assim, o grupo de pesquisa na UnB em jogos sentia a necessidade de
estimular a pesquisa de games, mas não sabiam por onde começar. Com uma dis-
ciplina que orientasse e estimulasse a produção de games na UnB, haveria novos
parceiros para pesquisar esse tema. Aos poucos mais professores foram se unin-
do. Alguns deles estão o professor Guilherme Ramos de Inteligência Artificial e a
professora Fernanda Lima de Engenharia de Software.
Então Saulo teve uma ideia e a sugeriu para Carla: Como criar uma matéria
nova para um curso de graduação é um processo que leva tempo, na época eles
aproveitariam uma matéria já existente – Construção de Peças Multimídia – para
incluir ensinamentos sobre criação de jogos nela, o que foi um grande sucesso por
dois semestres até que surgisse a disciplina de Introdução ao Desenvolvimento de
Jogos, ou simplesmente IDJ.
A disciplina só começou a ser ofertada nos primeiros semestres de cada ano
a partir de 2010, sendo até hoje assim. Saulo auxiliou a primeira edição da disci-
plina, e depois vieram outros alunos que iam se tornando monitores e aprimoran-
do o conhecimento e material disponível nos planos de ensino.
Como a criação de jogos também depende de outras áreas profissionais
como som e design, Carla pediu ajuda de colegas de outros cursos. O primeiro a
colaborar foi o professor de desenho industrial Tiago Barros. Isso foi possível pelo
fato da UnB ter o costume de incentivar a interdisciplinaridade entre alunos de
cursos de Humanas com Exatas. “É muito raro você ver pessoal de Exatas traba-
lhando com de Humanas, né?”, diz Carla.
A IDJ se tornou uma disciplina optativa da Universidade de Brasília. Os alu-
nos que iam cursar a matéria já chegavam bem preparados com uma bagagem de
conhecimento de tecnologia. Foi assim que não só a Behold Studios, mas outras
desenvolvedoras de Brasília como a Fira Soft e a Delta Creatures foram surgindo.
O método de ensino criado pela parceria de professores e alunos foi não
utilizar ferramentas já existentes para desenvolvimento de jogos e, sim, trabalhar
para tornar os alunos capazes de construir uma engine (do inglês, motor), não se
valendo de nenhuma já conhecida durante o período letivo.
A educadora acredita que, por mais que um profissional possa usar uma
ferramenta pronta para o trabalho de criação de jogos mais elaborados dos feitos
na UnB, o curso tem que dar ao estudante o entendimento do que há por trás
da engine. “O principal é eles entenderem como é que uma ferramenta dessas
foi construída, o que há por trás dela e o que ela faz pra ajudar o programador”,
conta para explicar a vantagem que a disciplina dá ao aluno.
Times de programadores, artistas e músicos passaram a ser criados por se-
mestre, que no final dele, precisam desenvolver um jogo em junho de cada ano.
Carla viu que os jogos produzidos a cada etapa do curso vêm melhorando. Tam-
bém foram criadas votações e troféus para escolher os melhores jogos de acordo
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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

com a categoria. No total já foram criados 74 jogos até o fim do primeiro semestre
de 2013. 18 na época em que a disciplina foi ofertada como Construção de Pe-
ças Multimídia foram 18 games e 56 desde que passou a se chamar IDJ. Eles são
trabalhos de disciplina de graduação. Os jogos podem ser jogados, mas não são
produtos voltados para a comercialização.
O aluno de música Renan Ventura é um dos atuais colaboradores de Carla.
O jovem sempre teve interesse em jogos e músicas, sendo seu estilo favorito, a
ópera. Quando possível, assistia a Orquestra de Brasília tocar e fazia composições
na adolescência e passou no vestibular começando sua faculdade no segundo
semestre de 2009.
Dois anos depois, ele estava tendo aulas de Acústica Musical na UnB e seu
interesse por jogos o levou a ter conhecimento do trabalho de Carla. Curioso, ele
a procurou e foi muito bem recebido por ela, que o convidou para um encontro
da IDJ para que ele mostrasse seu trabalho.
Renan, então, separou músicas que havia composto na adolescência e apre-
sentou cada uma conforme a professora ia pedindo. Se no teste era requisitada
uma música para momentos de batalhas, Ventura a tocava.
O último dos atuais colaboradores de IDJ a entrar foi Mário Lima Brasil, pro-
fessor de matérias teóricas avançadas e de composição na graduação de música
da UnB. Ele já tinha conhecido Carla em um encontro de arraial que acontece na
UnB e começou a conversar com ela. Além disso, ambos eram vizinhos, e ainda
são, da Colina no 618, onde vivem professores e funcionários da universidade.
Foi assim que Mário soube da existência da disciplina de IDJ. O professor
nunca teve interesse em jogos eletrônicos até meados de 2009 e 2010 quando
comprou uma unidade do console PlayStation 3 para seu filho de 12 anos e come-
çou a ter um flerte com os games ao vê-lo jogar.
Mário também tinha sido um dos orientadores de Renan quando o aluno fez
o teste de habilidade específicas que existem nos vestibulares para alguns cursos
da UnB como Arquitetura e Música. Esse foi o principal fator para começar a co-
laborar com IDJ.
O professor de música sempre teve respeito pelo interesse e pela seriedade
de Renan com a disciplina. Essas características do aluno deram coragem a Mário
para caminhar junto com ele no compromisso de lecionar IDJ aos estudantes. Má-
IDJ

rio se define como um professor Paulo Freriano – Como o educador Paulo Freire,
ele costuma aprender ao lado dos alunos – e foi aprendendo muita coisa sobre
games por meio de Renan.
Apesar de ser especializado e também compositor de ópera, o professor
entendeu que a música pra videogame tem várias probabilidades, o que não se
aprende em composição. Geralmente uma trilha sonora é linear, pois segue um
roteiro definido. O educador teve que aprender que, em um game, várias coisas
podem acontecer como o jogador morrer ou conseguir passar pelo estágio do
jogo. Isso faz com que ele tenha que compor temas para cada ocasião.

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CAPÍTULO

2
Behold Studios:
Os Cavaleiros da Caneta e Papel
conquistamo exterior.

A Behold Studios pode ser considerada a maior desenvolvedora de Brasília,


já que seus jogos já foram notícias aqui e no exterior pela mídia especializada de
games. Seu fundador é o mesmo que sugeriu a matéria de IDJ: Saulo Camarotti.
Saulo nasceu no ano de 1986. Sua relação com os jogos começou desde a
infância, quando tinha cerca de quatro e cinco anos. Nessa idade, ele já jogava no
computador. Mas ele sempre gostou de fuçar, descobrir, modificar e desmontar a
máquina. Também tinha costume de desenhar games que tinha desejo de jogar.
Assim, Saulo já planejava trabalhar com jogos ou computação gráfica um dia.
Para isso, estudava, lia e pesquisava muito na internet durante a adolescência.
Também praticava seus próprios projetos, o que o ajudava a aprender sobre o de-
senvolvimento de jogos. “Sempre foi estimulado a buscar meus sonhos, mesmo
que não tivesse noção de como fazer”, conta. A pesquisa era fundamental nesta
etapa usando o que a internet tinha de oferecer a ele.
Desde que entrou na UnB, ele fez amizade com o também aluno Pedro Guer-
ra. Os dois cursaram Ciência da Computação praticamente juntos, estudando e
superando os desafios das disciplinas. Quando Saulo começou a trabalhar com
jogos, Pedro também se interessou e os dois fundaram a desenvolvedora Behold
Studios em agosto de 2009.
A Behold iniciou em uma incubadora entrando no Centro de Apoio ao De-
senvolvimento Tecnológico (CDT) na UnB. Para batizar a desenvolvedora, Saulo
e Pedro pensaram em referências de valores culturais para simbolizá-la. O pri-
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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

meiro nome veio de Beholder, uma criatura do RPG Dungeons & Dragons (que
originou o desenho Caverna do Dragão). Behold significa vislumbrar em inglês e
os jogos que eles queriam criar tinham de ser vislumbrados. “O nome caiu como
uma luva”, recorda Saulo.
Após se formarem na UnB, os dois então contrataram dez artistas de 3D e
2D para trabalhar com eles, além de comprarem computadores para o desenvol-
vimento de jogos. Em busca de aprimoração, Saulo foi fazer pós-graduação em
Desenvolvimento de Jogos Digitais no Instituto de Educação Superior de Brasília
(IESB).
Uma game engine é um software que auxilia o desenvolvimento de jogos
eletrônicos realizando as operações de computação gráfica, som e diversas outros
elementos de um game.
Os 12 beholdianos fizeram uma pesquisa de várias engines, e a Unity foi a
mais interessante para eles desde o nascimento da desenvolvedora em 2009 até
os dias de hoje. Mesmo com uma equipe diferente, nenhum outro motor chegou
a ser considerado mais apropriado pela atual equipe.
Saulo e Pedro já tinham mexido com a Unity, em 2008, na época da univer-
sidade. Ao fundarem a Behold Studios, a equipe comprou uma licença da versão
1.6 por 400 dólares no próprio site da engine.
Para criar os jogos, a equipe tinha reuniões de brainstorming, que são feitas
para explorar as possibilidades de ideias e as capacidades de todos os presen-
tes. Esses encontros da Behold duravam várias horas para planejar perfeitamente
como seria cada game feito. Os desenvolvedores só terminavam a reunião quan-
do consideravam ter tido uma boa ideia.
Nesse tempo, foram criados jogos como Furnas – Simulador de Subestação
de Energia Elétrica, criado em parceria com a Agência Nacional de Energia Elétrica
(Aneel) e a Eletrobras. Depois veio Luna Magnetoware Adventures premiado no
BRGames na edição de 2009. Evento criado pelo Ministério da Cultura para iden-
tificar novos talentos para fortalecer a indústria nacional. E por fim, foi criado The
Gravedigger, primeiro jogo da Behold para iPhone.

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Behold Studios

Foi o primeiro sucesso da Behold Studios. Em entrevista ao site brasileiro


Select Game, Saulo explica como funciona The Gravidigger:
“The Gravedigger é um jogo de estratégia em tempo real simples e cômico
para iPhone. O coveiro de uma pequena cidade do interior, resolveu procurar
por novas amizades nas covas do cemitério. O padre da igrejinha convoca seus
fiéis para acabar com essa atitude dos infernos. No jogo, você escolhe entre o
time dos humanos ou mortos-vivos, e cada um conta com diferentes unidades e
habilidades para evoluir durante as partidas. O estúdio inovou no contexto visual
e musical, incluindo características culturais brasileiras de uma cidade do interior,
como igrejas barrocas, casas coloniais e música de acordeão.
O jogo disponibiliza um modo “Campaign”(campanha) com 16 fases, onde o
jogador se aventura controlando o pequeno exército pela cidade para completar
os desafios. E um modo “Quick Play”(jogo rápido), onde vence quem primeiro
derrotar o líder do time adversário, seja o coveiro ou o padre.
O time dos humanos conta com armas diferenciadas, incluindo porretes em
chamas e espingardas de cano largo. O time adversário evolui suas unidades para
diferentes mortos-vivos, como zumbis, ghouls (espíritos de fábulas japonesas) e

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

esqueletos. O jogador controla a evolução das habilidades do seu exército. Assim,


deve investir seus recursos da melhor maneira possível para evitar uma derrota.
Ao contrário dos tradicionais jogos de estratégia em tempo real, o estúdio
resolveu fazer este jogo sem a construção de bases. Assim novas unidades para o
exército devem ser adquiridas ao conquistar casas no cenário de jogo. Este con-
ceito de jogo se encaixa melhor para o jogador casual da plataforma iPhone, per-
mitindo que as partidas sejam curtas e mais emocionantes.”

O game chamou a atenção da versão nacional da revista EGW (Entertain-


ment Game World) que entrevistou o estúdio na edição 106 de outubro de 2010.
Na matéria “Sonhar é Preciso”, Saulo contou a origem da empresa e as dificulda-
des de se trabalhar com desenvolvimentos de jogos no Brasil.
“As faculdades cobram cada vez menos dos alunos, os alunos estudam e se
esforçam menos”, criticou o desenvolvedor na matéria (págs 84-85). Saulo tam-
bém defendeu que o profissional começasse a trabalhar mesmo sem contrato
como “forma de estudar e se aprimorar” defendendo a máxima: “Seus dez pri-
meiros jogos serão ruins”.

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Behold Studios

Porém, Pedro e Saulo tinham visões diferentes dos rumos que a empresa
devia tomar e se separaram em outubro de 2011. O desenvolvedor pensou em
acabar com a empresa. Saulo teve que demitir todos os contratados, fechar o
estúdio e vender os computadores comprados.
Mas Saulo não parou e continuou a trabalhar na Behold Studios junto com
um integrante que continuou na equipe: Hugo Vaz. Depois Betu Souza e Guilher-
me Mazzaro se uniram aos dois. Assim a empresa pode se levantar novamente.
Guilherme tinha participado de um workshop de desenvolvimento de jogos
e ele e Saulo foram colegas nos tempos de colégio e eram vizinhos, embora não
costumassem se falar na época. A Behold estava procurando alguém para ajudar
na criação de um jogo para mobiles, dispositivos móveis. O programador concor-
reu a uma vaga dentro da empresa, conseguindo-a. Junto com ele, o artista Betu
Souza foi apresentar seu portfólio.
A Behold Studios iniciou uma parceria com a desenvolvedora Dynamic Li-
ght para trabalhar e trocar experiências para criar um jogo. Assim, nasceu Super
Cutes, um jogo para os sistemas operacionais Android e iOS onde o jogador as-
sumia o papel de um cabeleireiro e seu dedo era o corte da tesoura. A produção
durou de outubro a novembro de 2011.
Saulo explica que Super Cutes foi uma proposta para também resgatar a ve-
locidade do estúdio. A equipe estava desenvolvendo um grande jogo havia mais
de um ano e estava cansada. Após isso, de dezembro a março do ano seguinte,
surgiu Save My Telly.
No começo de 2012, a Behold Studios ainda não passava de uma peque-
na empresa que fabricava jogos. Seus produtos já tinham chamado um pouco a
atenção da mídia especializada em games como a revista EGW. Mas a situação
mudaria naquele mesmo ano com uma ideia que já estava na cabeça dos desen-
volvedores desde antes da criação de Super Cutes: o RPG Knights of Pen & Paper
(Kopp).
Antes de falar do Kopp é necessário explicar o que é um de RPG (Role-playing
game ou jogo de interpretação de personagens): Trata-se de um gênero de jogo
físico ou digital no qual o jogador tem a liberdade de construir seu personagem e
torná-lo mais forte em diversos aspectos (como força física e magias) conforme a
vontade dele.

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

O estilo mais tradicional é o de mesa, no qual amigos se unem para jogarem


com dados que chegam a ter vários lados dependendo da ocasião. A partida é
guiada por uma pessoa que fica de mestre lendo as regras do jogo em livros que
são encontrados à venda em grandes livrarias e lojas especializadas.

O Knights of Pen & Paper narra um encontro de amigos para uma partida
dessas. O usuário do tablet ou do smarthphone que escolhe quantas “pessoas”
participarão da partida, sendo que quem joga é ele. Acaba sendo uma história
dentro de uma história.

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Behold Studios

Guilherme foi responsável por criar o conteúdo do Kopp cuidando de ele-


mentos como a história do jogo, quests (missões) dele, magias. Apesar do traba-
lho, ele se divertia bastante e ia mostrando o game para amigos que, de acordo
com ele, iam gostando do que viam. Já Hugo cuidava da arte, por exemplo, dos
cenários, personagens e monstros enquanto Betu trabalhava no conceito, design
e efeitos sonoros. Ainda na arte, ele cuidou de alguns cenários, inimigos entre
outros detalhes do game.
Meses depois, em entrevista ao site UOL Jogos, a desenvolvedora contou
que seus membros eram fãs de jogos de RPG de papel e caneta como Dungeons
& Dragon, que inspirou o desenho Caverna do Dragão, e que sentiam falta de um
jogo digital que representasse o gênero.

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

A produção estava deixando os desenvolvedores felizes, pois já desconfia-


vam que o jogo fosse ser amado por muitos gamers, principalmente os fãs do
gênero dele, RPG. Mas, nunca imaginaram o que seria de fato até Knights of Pen
& Paper ser lançado em 9 de outubro de 2012.
De acordo com Saulo, até novembro, o jogo já tinha sido baixado 100 mil
vezes. O sucesso do game veio a ser comprovado menos de um mês depois no
Simpósio Brasileiro de Games (SBGames). O evento existe desde 2006 e, nele, há
uma feira onde desenvolvedores de todo o país exibem seus produtos, além de
outras atrações como debates sobre o que fazer pela indústria de jogos brasileira.
Saulo e a professora Carla Castanho tinham lançado a candidatura para que
Brasília sediasse a edição de 2012. Assim, Carla foi a organizadora da edição de
2012, que aconteceu nos dias 2, 3 e 4 de novembro no Centro de Convenções
Ulysses Guimarães, e contou com a ajuda de diversos produtores de games, entre
eles, os membros da Behold Studios. A desenvolvedora também estava expondo
Super Cutes, Save My Telly e o Knights of Pen &Paper nos estandes já que eles
tinham sido feitos no final do ano anterior e naquele.

Estande da Behold Studios no SBGames 2012. Foto tirada da pági-


na oficial da desenvolvedora no facebook.

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Behold Studios

Relacionado ao simpósio estava o Festival de Jogos Independentes


2012 que elegeu os jogos expostos ali. Em algumas categorias Kopp foi
classificado como jogo para PC/Web, embora o jogo ainda não estivesse
disponível para essas plataformas.
A entrega dos prêmios aconteceu no dia 3 de novembro de 2012. A
Behold Studios acabou levando sete troféus, que tinham formato de con-
troles de videogame pelos jogos Kopp e Save My Telly. Confira abaixo quais
foram as categorias e posições conquistadas:

Print retirado do link sbgames2012.com.br

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

Os beholdianos exibem os troféus ganhos no evento. De baixo para cima e da direita


para a esquerda: Betu Souza, Saulo Camarotti, Hugo Vaz, Ronaldo Nonato (Relações
Públicas da desenvolvedora na época) e Guilherme Mazzaro. Foto tirada da página
oficial da desenvolvedora no facebook.
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Behold Studios

A crítica especializada também aprovou Knights of Pen & Paper. Com


notas de 1 a 10, os sites estrangeiros IGN e Eurogamer deram, respectiva-
mente, 6 e 9. Já o Metacritic avaliou o game como 83 de 100. O caderno de
Informática do jornal Correio Braziliense também deu uma boa avaliação
ao Kopp. Usando sistema da época, a resenha deu os seguintes veredictos:
jogabilidade - fera, entretenimento - duca / gráficos - duca / som – duca.
“Mas, traduzindo para as notas de hoje, daria 9,5”, conta o jornalista Bruno
Silva, que resenhou o jogo.

Foto da matéria “SBGames reflete bom momento do mercado de desenvolvimento de


games no DF” da edição de 06/11/2012 do Correio Braziliense.

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

A tabela acima indica quanto o Koop já rendeu a Behold Studios e


quantas vezes foi baixado desde o começo do ano de 2013.
Já no Google Play ele já teve mais de 100 mil downloads:

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Behold Studios

Durante o SBGames 2012, Saulo e os demais beholdianos conheceram


a equipe da produtora de jogos suecos Paradox Interactive. A desenvolve-
dora brasiliense apresentou o Kopp que já existia para os sistemas iOS e
Android. Daí nasceu uma parceria para postar o jogo na plataforma Steam,
uma espécie de web-site onde os jogadores podem comprar diversos ga-
mes.
Kopp também foi transferido para a loja online da Paradoux no siste-
ma operacional Android, Google Play. Segundo Saulo, problemas técnicos
impediram que Kopp fosse transferido do mesmo jeito na AppStore.
Ao assinarem o contrato em 2013, a Paradox postou Knights of Pen &
Paper no Steam, ao mesmo tempo em que ele era atualizado, com o nome
de +1 Edition no mês de março. A atualização trouxe mais elementos como
cavernas adicionais e novos monstros. O mesmo aconteceu nas versões
tablets e smarthphones.
Embora já imaginassem que o jogo deles faria sucesso, os beholdianos
não acreditavam que a repercussão dele alcançaria a mídia estrangeira.
Saulo se sentiu orgulhoso ao ver seu trabalho elogiado por profissionais de
renomes internacionais. “Foi incrível, eu não imaginava tal coisa e fiquei
extremamente bobo”, lembra Guilherme. “Foi bem inesperado”, conta
Hugo, que diz ter ficado muito feliz de ver o Kopp sair no site americano
Kotaku.
Outros jogos produzidos pela empresa, ou apenas por um membro,
presentes em no portfólio dela são BitbitMachine e The Story of Choices.
O último foi feito por Saulo e Hugo numa jam, encontro onde equipes de
desenvolvedores tinham de produzir um jogo em dois dias a partir de um
tema dado, na sede da desenvolvedora, no CA 05 do Lago Norte no final
de junho de 2013.

23
CAPÍTULO

3
Publicidade e educação
pela Fira Soft .

No segundo semestre de 2007, Igor Rafael de Sousa estudava Ciência da


Computação na UnB. Enquanto isso, Felipe Modesto se tornava calouro da univer-
sidade dentro do mesmo curso. Os dois apenas se conheciam “superficialmente”
por amigos em comum.
No ano anterior, Igor tinha criado festas de jogos digitais chamadas Lan Par-
ties (Festas da Lan, de Lan House). Nelas, os convidados levavam seus computa-
dores para passar finais de semana inteiros jogando. Felipe acabou indo em uma
delas e eles se conheceram.
Durante a disciplina de Introdução ao Desenvolvimento de Jogos, os dois se
aproximaram mais e trabalharam juntos durante o curso de um projeto de Inicia-
ção Científica. Ambos tinham muitos gostos em comum como jogar RPG (gênero
de jogo que significa role-playing game. Do inglês jogo de interpretação de per-
sonagem).
Igor queria fazer algo na vida que não estudar para concursos públicos e
também possuía várias ideias e conversava sobre elas com Felipe e o também
estudante de computação Raul Santana.
Logo mais um futuro membro se une à turma de IDJ, Anderson Campos Car-
doso. Igor o via de vez em quando no CA de Computação e já tinha ouvido falar
dele por uns contatos e, no meio do semestre de IDJ que fez com ele, também
fizeram a disciplina denominada Programação Funcional e fizeram um jogo bem
simples como trabalho desta matéria e que não recebeu nome já que era mais
uma prova de conceito utilizando a mesma ferramenta de IDJ e não “era nada
demais”.
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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

Após concluírem a disciplina, os quatro se uniram e foram cursar a matéria


de Introdução a Atividade Empresarial, em julho de 2011, e formaram a Fira Soft.
O nome veio de um acrônimo dos nomes Felipe, Igor, Raul e Anderson. Também
havia um P por causa de um colega que se juntou a eles chamado Pedro. Fira
também é o nome fictício de uma magia de fogo da série de jogos Final Fantasy,
da qual Igor é fã.
Pelas regras dessa disciplina, era necessário criar um plano de negócios para
mostrar que podiam manter a empresa de desenvolvimento de jogos. Para o pla-
no de criar uma desenvolvedora, eles precisavam de alguém para cuidar das mú-
sicas dos jogos. . Aí chamaram o compositor Herman Ferreira. “A gente conhecia
ele, sabia que ele era muito bom”. A dedicação e talento do músico funcionaram
muito bem.
Como jogos digitais era uma área de interesse comum a todos os integran-
tes, as primeiras experiências foram positivas, mas ainda faltava o desenvolvi-
mento da arte. Foi aí que eles incluíram ao grupo o artista Rafael Benjamin.
Ele tinha trabalhado com composição para jogos e fez parte da turma de In-
trodução ao Desenvolvimento de Jogos e Computação Sônica. “A gente conhecia
ele, sabia que ele era muito bom”, conta Igor. A dedicação e talento do músico
funcionaram muito bem com o projeto da equipe.
Porém, Raul tinha outro emprego que o ocupava em período integral e a
equipe achou melhor ele sair. Com a proposta de fazer jogos educativos, Igor,
Anderson, Felipe, Rafael e Herman começaram a trabalhar nos jogos que seriam
parte do portfólio da empresa.
Igor quis criar jogos educativos, porque a área de aplicativos infantis tinha
uma grande demanda. Esta foi a maneira que o desenvolvedor criou para unir
altruísmo e lucro em uma coisa só. “Fazer a minha parte”, conta.
Como toda nova empresa, a Fira passou desafios em várias frentes, como a
daconstrução e consolidação da marca no mercado. Ao conseguirem, as deman-
das financeiras foram sendo superadas e eles tiveram que aumentar a eficiência
do ritmo de trabalho deles para que pudessem atender as demandas dos clientes
e também dedicar tempo a projetos internos. Nesse meio tempo, houve mudan-
ças de sócios e muitas adequações da equipe até que conseguissem engrenar a
equipe.

26
Fira Soft

A Unity também foi uma ferramenta escolhida, mas eles acabaram pegan-
do uma versão gratuita da mesma. A ferramenta permite a rápida adaptação de
jogos em múltiplas plataformas, ou seja, passar de um iPad para um celular com
Android, por exemplo, além de ajudar no desenvolvimento de conteúdo em 3D.
Em parceria com a Ansca Mobile, uma empresa de softwares, a Fira utiliza a
Corona SDK, uma engine específica para trabalhos em 2D que também possibilita
a adaptação a múltiplas plataformas.
Em setembro de 2011, Igor recebeu um e-mail de divulgação do 3º Concurso
de Desenvolvimento de Jogos Digitais, E-Games 2011, organizado pelo Senac de
São Paulo. Com isso, todos largaram o que faziam e se uniram a ele no desenvol-
vimento do Ligue os Pontos, pois tinham um mês para terminá-lo.
Após fazer a inscrição e enviar o jogo para a organização da competição, o
produto deles passou por um julgamento e conseguiu chegar a final. Com isso,
foram apresentar o game em São Paulo em novembro. Anderson juntou outros
amigos e foram para a Brasil Game Jam 2011. As jans são um encontro onde de-
senvolvedores criam jogos em um espaço de tempo fixo a partir de um tema dado
pela organização.
Em São Paulo, Igor achou que as possibilidades de vencer eram boas. Porém
Felipe e Herman não criaram muitas expectativas, pois competiam com o jogo
Smelly Cat – O Gatinho Fedido da desenvolvedora paulista Ipanema Games. Feli-
pe, Igor e Herman gastaram dinheiro nas passagens. Mas para surpresa dos dois,
o jogo ficou em primeiro lugar da categoria mobile, pela qual disputava. Além do
Troféu e-Games 2011, cada um dos três ganhou um iPad 2.

imagem retirada do site do E-games 2011. Link original: sp.senac.br/


hotsites/gd2/egames2011/index.html

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

A produção do evento confundiu os nomes e o Ligue as Estrelas foi chamado


erroneamente de Ligue os Pontos, de acordo com Anderson.
Na história do jogo, em uma galáxia distante, pequenas estrelas perdem o
brilho delas. Cabe ao jogador contornar os pontos delas para que elas tenham
luz novamente. O game foi desenvolvido para auxiliar na coordenação motora de
crianças em fase de crescimento e ensinar nome de constelações e países.

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Fira Soft

Em meados de 2012, a Fira Soft ganha mais um membro: Vinícius Santana


Rossignoli, diretor da Publisher (publicadora) Move Games. De uma parceria, Vi-
nícius fez amizades com os membros do estúdio. Ele é formado em marketing e
possui pós-graduação em Gestão de Negócios.
A Move Games e a Fira Soft ajudaram na produção do SBGames 2012. O
Simpósio Brasileiro de Games é um evento que visa discutir e divulgar a indústria
de jogos nacionais. A edição daquele ano tinha ocorrido em Brasília com apoio de
várias empresas e entidades do Governo Federal.
Um dos patrocinadores do SBGames era o Banco do Brasil. A entidade finan-
ceira queria um advergame para mobile em troca da participação que atingisse os
usuários do BB Universitário. Na parceria dos dois estúdios, nasceu Em Busca dos
Sonhos. A Fira Soft e a Move Games ficaram responsáveis por desenvolver toda a
parte de programação e sistema do jogo, além de publicar na loja da App Store e
Google Play. Já a Behold Studios cuidou a arte do game.

Abaixo segue a descrição do Em Busca dos Sonhos:

Jogo produzido pelas empresas parceiras Fira Soft, Behold Studios e


Move Games com apoio do Banco do Brasil para o SBGames 2012.

Conte ovelhas e conquiste seus sonhos!!!

objetivo é chegar ao topo clicando nas ovelhinhas enquanto salva


seu progresso no seu cartão universitário BB por meio de realidade
aumentada. Divirta-se!

***Este jogo requer o cartão universitário do Banco do Brasil***

Depois disso, Vinícius virou um sócio da Fira se tornando responsável de


cuidar da parte comercial, de lidar com os clientes da empresa e com o lado da
comunicação organizacional. E também participou da produção do jogo de maior
sucesso da Fira Soft: Conte Até 10.

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

Conte até 10 foi um grande desafio proposto pelo Conselho Nacional do Mi-
nistério Público. O objetivo era fazer um jogo lúdico que trouxesse a reflexão dos
usuários para o problema causado pelas atitudes tomadas em momentos de es-
tresse, o que gera um grande número de delitos. Na ocasião, a Fira Soft tive que
atender às várias demandas do projeto, que incluíam desde negociação de uso de
imagens dos lutadores até os detalhes de produção que enquadrasse o jogo ao
perfil mais infantil do público alvo. Todo o desenvolvimento de conta até 10 ocor-
reu em um frenético mês de outubro de 2012. No final o resultado foi um sucesso
e tivemos retorno acima das expectativas.

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Fira Soft

Conte Até 10 já teve mais de 5 mil downloads no Google Play. Na Apple


Store, de acordo com Igor, já teve mais de 40 mil e o trabalho rendeu
mais de R$ 60 mil a empresa.

Depois disso, a desenvolvedora chamou a atenção do público e da mídia


com o jogo Mexa-se. O Jornal da Comunidade escreveu a matéria “Imagem&Ação
Agora no Celular” falando do jogo na edição de 17 a 23 de agosto. O propósito
educacional da empresa também surgiu na matéria intitulada “Game Over nos
Preconceitos” do caderno Eu, Estudante do jornal Correio Braziliense.
O game trata-se de usar o tablet ou o smarthphone no lugar das fichas com o
nome das palavras que os competidores precisam adivinhar por meio de mímicas
na versão física do jogo.
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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

Foto da matéria do Jornal da Comunidade edição 17 e 23 de agosto de 2013.

A ideia do Mexa-Se foi Felipe Modesto já que sempre jogou e gostou de Ima-
gem & Ação. Quando a Fira Soft começou a trabalhar e cada um cuidou de seu
próprio projeto inicialmente. Felipe começou a trabalhar no dele em outubro de
2011, mas teve de larga-lo para ajudar no desenvolvimento do Ligue as Estrelas
para o E-Games 2011, como dito anteriormente.
Felipe não recorda direito quando voltou a dar atenção ao game e, para fina-
lizá-lo, contou com a ajuda de amigos de fora e de dentro da Fira Soft. O nome de
todos os envolvidos pode ser visto clicando no círculo cinza com um “I” no canto
inferior esquerdo da tela inicial, conforme visto na imagem a seguir:

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Fira Soft

O jogo foi disponibilizado gratuitamente para download nos sistemas opera-


cionais Android e iOS.
Porém, a Apple não disponibiliza esses dados nem para aqueles que dispo-
nibilizaram o aplicativo na loja online. Segundo Felipe, é difícil tentar descobrir
quantas pessoas baixaram o Mexa-se, mas garante que ele já teve mais de 15 mil
downloads.

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

Mexa-se alcançou mais de 10 mil cópias


baixadas no Google Play.

Foto de capa da página do facebook da empresa postada em 16 de agosto de 2013. Da


direita para a esquerda: Felipe Modesto, Vinícius Rossignoli, Herman Ferreira, Rafael
Benjamin, Gustavo Almeida Teixeira, Igor Rafael de Sousa, os estagiários na época
Gustavo e Ana Victória, e Anderson Vinícius.

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Fira Soft

A Fira Soft também possui outros quatro jogos experimentais como o Death-
-Needly, desenvolvido na Global Game Jam 2013. O tema da ocasião foi a exibição
de um áudio com o som de batimentos cardíacos. A jam aconteceu no Lago Norte
nos dias 25, 26 e 27 de janeiro de 2013.

35
CAPÍTULO

4
Delta Creatures:
A luta por um lugar entre os grandes

A disciplina de Introdução ao Desenvolvimento de Jogos recebe uma nova


turma no mês de outubro de 2010, entre eles estão os estudantes Luiggi Reffatti e
Eduardo Freire. Ambos cursam Ciência da Computação e se conheceram durante
o curso.
Os dois se tornaram melhores amigos. “Confio nele 100%”, conta Eduardo a
respeito do parceiro. A amizade nasceu de uma grande afinidade em interesses
comum, sendo um em especial: o de trabalhar com desenvolvimento de jogos
para grandes desenvolvedoras do mundo como a americana Blizzard Entertain-
ment, responsável por sucessos como as séries de jogos StarCraft e Diablo.
Luiggi não pensava em cursar IDJ naquele momento. Ele queria deixar para o
ano seguinte, mas Eduardo – Dudu, como ele chama – precisava fazer a disciplina
logo, pois se formaria no final daquele ano e não teria outra oportunidade. Então,
no dia 23 de julho de 2010, os dois entraram na matéria com um projeto do jogo
já em mente.
No primeiro dia de aula surgiu o nome da desenvolvedora: Delta Creatures.
Luiggi sempre dizia ao amigo que se ele tivesse uma empresa de jogos teria esse
nome, que significa variação de pessoas. No caso, um grupo de criaturas humanas
diferentes com o mesmo objetivo. Eduardo concordou com a escolha.
Eduardo é fã de jogos de estratégia como StarCraft e Dune 2. Sendo essa
preferência de gêneros de jogos mais uma semelhança com o amigo, os dois qui-
seram criar um jogo de RTS – Real Time Strategy (Estratégia em Tempo Real). A in-
tenção dos futuros desenvolvedores era fazer algo difícil, para que eles forçassem

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

a si mesmos a estudarem bastante durante a criação deles para depois estarem


aptos a trabalhar em jogos “tops”.
Desde aquele momento, eles viram que era necessário aprender a criar as
engines ao invés de simplesmente usá-las para criar games. Para entender o que
se passava na cabeça deles, pense em um carpinteiro que deseja se aprofundar
em seu ofício. Pois bem, eles querem aprender a construir um martelo.
Após alguns meses, mais especificamente em 8 de outubro daquele ano,
Luiggi e Dudu tiveram de apresentar o projeto do SW para Carla e tiveram que tra-
balhar nele para o trabalho final de IDJ. Ambos passaram duas noites seguidas em
claro para tentar colocar o Smile Wars pra funcionar, mas só conseguiram fazer os
personagens andarem e tiveram de ir para a apresentação que, devido a greves
ocorridas na universidade, acabou sendo no dia 8 de janeiro do ano seguinte.
Como esperado, Carla não gostou do projeto, que não era um game com-
pleto e apenas alguns “bonequinhos que se mexiam”. Então a saída foi Luiggi e
Eduardo continuarem a ideia na matéria de complementação Estudos em Com-
putação Multimídia. Isso foi possível, porque a UnB oferece disciplinas feitas para
pesquisas dirigidas de qualquer tema e eles decidiram fazer isso com o assunto de
desenvolvimento de jogos digitais.
A disciplina Estudos em Computação Multimídia durou um semestre. Edu-
ardo, como já ia se formar, conseguiu lidar bem com a carga de tarefas que tinha
que realizar. Aos sábados, ele trabalhava no Smile Wars e se focava na monografia
durante a semana.
Depois de um ano na UnB, os dois pararam para pensar no que iam fazer
e foi aí que perceberam o quão longe Smile Wars estava da grandeza dos jogos
estrangeiros. Porém, em vez de se entregarem ao desespero, também notaram
que se melhorassem o título deles, continuariam estudando as técnicas de desen-
volvimento e aperfeiçoando suas habilidades.
Luiggi e Eduardo viram que a versão inicial do jogo não era o que almejavam.
O nível de codificação poderia melhorar muito. Mas também notaram que o jogo
era divertido e poderia ser publicado.
Para tornar o produto mais atrativo comercialmente, era necessário que
mais gente trabalhasse nele. Ainda na época final de IDJ, o compositor de games
Herman Ferreira se tornou membro da Delta Creatures. Os fundadores da desen-
volvedora revelam que isso já estava acertado. Depois eles chamaram pessoas

38
Delta Creatures

que conheceram durante a graduação de Ciência da Computação na UnB. O tra-


balho de Herman pode ser conferido no link:

soundcloud.com/metaur.

Os programadores Guilherme Costa e Raul Santana se juntaram a equipe


após Luiggi e Eduardo concluírem a disciplina Estudos em Comunicação Multi-
mída. Durante todo o ano de 2011, mais de dez pessoas se voluntariaram para
ajudar no projeto da Delta Creatures, mas foram deixando os desenvolvedores
na mão. Depois, a Web Designer Mayara Rosa entrou na desenvolvedora como
membro permanente no começo de 2012.

Da esquerda para a direita (cima): Guilherme Costa, Mayara Rosa e Raul Santana.
Da esquerda para a direita (baixo): Eduardo Freire, Luiggi Reffati e Herman Pereira.

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

Para a criação do game, eles usaram uma game engine própria, que começa-
ram a criar na disciplina Introdução ao Desenvolvimento de Jogos e a desenvolve-
ram depois, além da linguagem de programação C++.

A produção de Smile Wars continuou até chegar o dia do SBGames 2012.


Os fundadores atuaram como organizadores do simpósio ao lado da professora
Carla. Por estarem atarefados, eles confiaram aos quatro membros do Delta Cre-
atures o estande do jogo.
Luiggi e Eduardo não davam como certo o sucesso de SW. Apesar de terem
aprimorado a arte do game com a ajuda dos novos colegas, não alteraram o sen-
tido “bonitinho”. Porém, a recepção do público os surpreendeu. Mesmo após
quase um ano do SBGames, até hoje eles não sabem quantas pessoas pararam no
espaço deles, mas descobriram que o espaço ficou cheio o tempo todo e que os
computadores não paravam de rodar o jogo.

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Delta Creatures

Foto tirada em 04 de novembro de 2012 após SmileWars ganhar a segunda


colocação na categoria voto popular.

Graças a experiência adquirida pela Delta Creatures, Herman conse-


guiu entrar na equipe da Fira Soft. Porém, isso fez com que ele tivesse que
dedicar menos tempo ao estúdio de Smile Wars. Ainda assim, representou
as duas desenvolvedoras no SBGames 2012.
Quanto à recepção de SW, Eduardo garante que sempre tinha cerca
de duas pessoas jogando. Algumas, segundo recorda, eram crianças de
aproximadamente oito a dez anos se divertindo e querendo ficar o tempo
todo na frente do computador. O sucesso do game é confirmado quando
ele conseguiu o segundo lugar na categoria jogo popular, em uma votação
feita durante o simpósio. Abaixo segue a sinopse do jogo:
Smile Wars é um jogo de estratégia em tempo real, rápido e fácil de
jogar e é focado nos jogadores casuais (que tem pouco tempo para jogar),
especialmente no público feminino e infanto-juvenil. O jogo segue a ideia

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

de que é muito mais divertido jogar com os amigos do que sozinho e por
isso até a versão atual não tem single player (onde um jogador joga apenas
contra o computador).
No jogo você pode escolher cada uma das partes das suas unidades:
Corpo, Pés, Mãos, acessório de cabeça e Habilidade especial. Cada uma
dessas partes pode ter ou não um dentre quatro elementos: água, ar, fogo
e pedra. Alterando as partes das suas smiles o jogador pode ter guerreiros
adequados a cada estilo e estratégia de jogo!
Os desenvolvedores colocaram o título para ser baixado gratuitamen-
te no site deles: http://deltacreatures.net/.
Luiggi e Eduardo nunca esqueceram seu objetivo principal ao entrar
na disciplina de Introdução ao Desenvolvimento de Jogos há alguns anos
atrás: trabalhar com os grandes. Por isso, nunca tornaram a Delta Creatu-
res uma desenvolvedora que funcione como empresa, mas sim como um
projeto em que todos os seus membros visam ganhar experiência com o
desenvolvimento de jogos e se valerem disso como portfólio para servir
como currículo. É como Saulo disse na entrevista para a EGW, mostrada no
segundo capítulo, que o profissional deve trabalhar mesmo sem contrato
como “forma de estudar e se aprimorar”.
Na opinião dos fundadores da Delta Creatures, para um dia poder tra-
balhar em uma empresa como a EA, ou criar um jogo como os dos Estados
Unidos, onde há o maior mercado de games do mundo, é necessária uma
experiência, que não é de ferramentas, programar jogos usando uma engi-
ne poderosa. “Você pode ter produzido trezentos jogos em Unity, que você
não vai conseguir fazer um Starcraft II”, exemplificou Eduardo.
Os dois contam que foram ao Game Development Confederence que
aconteceu em 25 a 29 de marco de 2013 na cidade de São Francisco no
estado da Califórnia. Eles juntaram dinheiro para passagens, hospedagem
e ingressos.
Além da chance de encontrar todos os grandes membros da indústria
de jogos, o desejo dos dois era averiguar a qualidade dos jogos que con-
correm no IGF (Independent Games Festival), pois, como também querem
competir na IGF, precisavam saber o quão bom era o trabalho dos concor-
rentes e quão difícil seria desenvolver jogos desse nível. Segundo Luiggi, o
quesito principal avaliado é inovação. Os dois julgam que não estão abaixo

42
Delta Creatures

da qualidade técnica exibida pela maioria dos jogos.


Luiggi conta que a Valve gostou do projeto e que a empresa sugeriu
que assim que a versão final dele esteja pronta, que ela seja colocada no
Steam Greenlight.
O Steam Greenlight é uma plataforma do Steam (um site da inter-
net onde jogos digitais famosos podem ser comprados por um preço mais
acessível) onde os desenvolvedores possam ter um acesso mais “democrá-
tico” para o desenvolvimento de seus jogos. Quando os desenvolvedores
enviam esboços ou vídeos de seus produtos, os internautas cadastrados
nos sites realizam uma votação para conferir se os games serão publicados,
embora não haja garantia de que serão.
“Mas não colocamos o jogo no Greenlight ainda, pois o mesmo não
está pronto. Não sabemos nem se vamos submeter, pois nosso critério de
pronto é meio alto demais”, explica Luiggi,
Mesmo assim, esse foi o melhor retorno e reconhecimento que a de-
senvolvedora obteve desde o prêmio do SBGames 2012.

43
CAPÍTULO

5
Como é a fase atual das três
desenvolvedoras e da disciplina de IDJ?

Após conhecer a origem da disciplina Introdução ao Desenvolvimento de


Jogos e de três desenvolvedoras fundadas por seus ex-alunos, é hora de falar um
pouco como andam as coisas hoje em dia.
Na Universidade de Brasília, a professora Carla espera que a matéria de In-
trodução ao Desenvolvimento de Jogos seja cada vez mais procurada por alunos
da UnB e que possa ser um ponto de partida para que outros professores criem
mais disciplinas relacionadas a games para o currículo dos cursos do Departa-
mento de Ciência da Computação. Também espera criar uma segunda disciplina,
que se chame IDJ 2 ou DJ (desenvolvimento de jogos) para ser cursada após a já
existente. Seu foco seria em aspectos mais avançados do desenvolvimento de
jogos que não podem ser explorados pela limitação de tempo de um semestre
letivo de IDJ.
A Behold Studios conta agora com mais três membros: o programador Leo-
nardo Leite, o artista 2D e 3D Bruno Ribeiro, que era aluno de Saulo no Iesb (O
fundador da Behold lecionou Jogos Digitais entre fevereiro de 2012 e Agosto de
2013) e o programador Leonardo Prunk. O último fazia parte da equipe original e
saiu no começo de 2012. “Mesmo saindo da empresa na época, eu nunca duvidei
do potencial da equipe e sentia que algo muito bom ainda iria sair dali. Fiquei bas-
tante feliz e muito orgulhoso da Behold quando soube do resultado do Knights, só
coisa boa veio pela frente”, conta Prunk.
Atualmente, o estúdio está envolvido com um novo projeto chamado de
Chroma Squad. Como o Knights of Pen & Paper trata-se de uma história dentro

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal
Atualmente

de uma história: um estúdio começa a filmar um seriado de super-sentai. A ideia


começou como um quadrinho digital em junho de 2013. Super-sentai é um gêne-
ro de tokusatsu (séries com atores japoneses reais como Changeman e Flashman
exibidos na década de 80 e 90 na finada TV Manchete).

O jogo pediu 55 mil dólares no site de financiamento coletivo conhecido


com Kickstarter e fechou com 97,148 e virá para computadores com Windows,
Mac e Linux. No dia 28 de agosto, o jogo entrou no Steam após ser bem votado
no Greenlight:

46
Atualmente

Nos dias 16, 17 e 18 de outubro, houve a edição de 2013 do SBGames na


cidade de São Paulo. Os jogos da Behold Studios foram bem votados novamente.
Save My Telly ganhou a primeira colocação em todas as categorias que disputou e
Knights of Pen & Paper também se saiu bem. A premiação completa pode ser vista
no site superbrbros.com/sbgames-´12-megawin/.
Já os planos para o futuro da Fira Soft é dividir a desenvolvedora nas tarefas
de desenvolver aplicativos, cuja demanda só cresce e que há uma grande pro-
posta (Igor prefere não comentar mais sobre isso) e na de trabalhar com mais
advergames. No tempo livre, eles trabalham na criação de jogos que pretendem
lançar no Steam.
Recentemente, surgiram consoles feitos exclusivamente para jogos indepen-
dentes. O Ouya foi o primeiro deles e nasceu pelo projeto kickstarter, onde inte-
ressados fazem uma doação para ajudar na produção do aparelho em troca de
algumas vantagens em relação aos que forem comprar em uma loja física.
Em entrevista ao caderno Informática do Correio Braziliense (15/10/2013),
Saulo contou que o Ouya lhe chamou a atenção da simplicidade de publicação
do sistema aberto, onde ele pode simplesmente testar o jogo que produziu e já
lançá-lo.
Já o estúdio Fira Soft investiu aproximadamente US$ 100 em uma unidade
do console, que ficou na sede dela. Até o fechamento do livro, os desenvolvedo-
res produziam mais um advergame do Banco do Brasil:

Somente com o Conte Até 10, a Fira Soft já conseguiu mais de


R$ 60 mil em seu orçamento.

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal
Atualmente

A Delta Creatures não forneceu muitas informações para a reportagem. Lui-


ggi Reffatti compareceu ao SBGames 2013. Smile Wars não esteve na lista de jo-
gos que competiam por troféus, de acordo com o site do evento. E com Eduardo
Freire, compareceram a Brasil Game Show, considerada “a maior feira de games
da América Latina”, que aconteceu entre os dias 25 e 29 de outubro no Expo Cen-
ter Norte na cidade de São Paulo.

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Jogos Distritais – A origem de três desenvolvedoras de games do Distrito Federal

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Referências Bibliográficas

FRANCK, Raphael. Sonhar é preciso: fundador de estúdio brasileiro produtor


do bem sucedido. The Gravedigger relata as dores e as flores de se trabalhar com
jogos no Brasil. EGW, São Paulo, v. 1, n. 106, p. 84-85, out. 2010.

IMAGEM e ação agora no celular. Jornal da Comunidade, p. 4, 17-23 ago.


2013.

SILVA, Bruno. SBGames reflete bom momento do mercado de desenvolvi-


mento de games no DF: número de empresas na cidade subiu de sete para 16 este
ano e foram fundadas por alunos de cursos de jogos digitais. Correio Braziliense,
Brasília, p. 3, 06 nov. 2012.

VALAREZO, Max. Micro no tamanho, macro na mudança. Correio Braziliense,


Brasília, p. 3, 15 out. 2013.

VASCONCELLOS, Gustavo. Entrevista com Behold Studios: The Gravedigger.


2010. Disponível em: <http://www.selectgame.com.br/entrevista-com-behold-
-studios-the-gravedigger/>. Acesso em: 26 out. 2013.

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