Você está na página 1de 34

UNIVERSIDADE DE SANTIAGO

DCEFL – Mestrado em Pedagogia

Pedagogia da Intersecionalidade: as
contribuições de bell hooks

Objectivos:
• Definir o conceito de Intersecionalidade;
• Discutir os fundamentos da Pedagogia
da Intersecional.

Profa. Dra. Rutte Tavares Cardoso Andrade- UNILAB


bell hooks
Gloria Jean Watkins (1952)

Pesquisadora, escritora,
professora, teórica
feminista, artista e
ativista socia,
estadunidense.
Em 2014, fundou o bell
hooks Institute em
Kentucky.
UNIVERSIDADE DE SANTIAGO
DCEFL – Mestrado em Pedagogia

Intersecionalidade

Interseccionalidade é o estudo da
sobreposição/intersecção de identidades sociais e
sistemas relacionados de opressão, dominação ou
discriminação.
A teoria procura compreender como diferentes
categorias biológicas, sociais e culturais, tais como
gênero, raça, classe, orientação sexual, religião, idade e
outros eixos de identidade interagem em simultâneos.
A interseccionalidade sustenta que as conceituações
clássicas de opressão - como o racismo, o sexismo, o
classismo, capacitismo, xenofobia, homofobia e a
transfobia e intolerâncias baseadas em crenças — se
inter-relacionam, criando um sistema de opressão
que reflete o cruzamento de múltiplas formas de
discriminação.
Intersecionalidade-
Kimberlé Williams Crenshaw (1959)
Intelectuais afro-americanas que tambem
contribuiram:

• Anna Julia Cooper e


Maria Stewart
(Sec.XIX);
• Angela Davis e
Deborah King.
• Sojourner Truth (1797 a 1883) -
abolicionista afro-americana e
ativista dos direitos da mulher.
• ”Não sou uma mulher?” -
Convenção dos Direitos da Mulher
em Akron, Ohio (1851).
“Aquele homem ali diz que é preciso ajudar as mulheres a
subir numa carruagem, é preciso carregar elas quando
atravessam um lamaçal e elas devem ocupar sempre os
melhores lugares. Nunca ninguém me ajuda a subir numa
carruagem, a passar por cima da lama ou me cede o melhor
lugar! E não sou uma mulher? Olhem para mim! Olhem para
meu braço! Eu capinei, eu plantei, juntei palha nos celeiros e
homem nenhum conseguiu me superar! E não sou uma
mulher? Eu consegui trabalhar e comer tanto quanto um
homem – quando tinha o que comer – e também aguentei as
chicotadas! E não sou uma mulher? Pari cinco filhos e a
maioria deles foi vendida como escravos. Quando manifestei
minha dor de mãe, ninguém, a não ser Jesus, me ouviu! E não
sou uma mulher? (Cont)
• E daí eles falam sobre aquela coisa que tem na cabeça, como é
mesmo que chamam? (uma pessoa da platéia murmura:
“intelecto”). É isto aí, meu bem. O que é que isto tem a ver com
os direitos das mulheres ou os direitos dos negros? Se minha
caneca não está cheia nem pela metade e se sua caneca está
quase toda cheia, não seria mesquinho de sua parte não
completar minha medida? Então aquele homenzinho vestido de
preto diz que as mulheres não podem ter tantos direitos quanto
os homens porque Cristo não era mulher! Mas de onde é que
vem seu Cristo? De onde foi que Cristo veio? De Deus e de uma
mulher! O homem não teve nada a ver com Ele.
Se a primeira mulher que Deus criou foi suficientemente forte para,
sozinha, virar o mundo de cabeça para baixo, então todas as
mulheres, juntas, conseguirão mudar a situação e pôr novamente o
mundo de cabeça para cima! E agora elas estão pedindo para fazer
isto. É melhor que os homens não se metam.” (S. TRUTH, 1851).
Livro: Ensinando a Transgredir, da autoria de bell hooks

Educação: quando a nossa experiência de vida está


intrinsecamente ligada à teorização, não existe uma
separação entre a teoria e a prática.
Cap. VII - A teoria como prática libertadora

Teorização - processo crítico e reflexivo que pode levar a


uma mudança, uma prática, uma cura do colectivo, desde
que seja direcionada para este fim.
Feminista negra interseccional, bell hooks reivindica a teoria
dentro do ativismo (escrita e oral) e centraliza a discussão
pedagógica voltando-se para esse movimento
sociopolíticoracial.
Para as mulheres negras, lecionar é um ato político, contra
hegemônico e que possui raízes na luta anti-escravocrata e
antissegregacionista.
No final da década de 80, a contribuição das mulheres
negras foi preponderante para a reconstrução de um
feminismo multicultural e crítico a respeito de raça,
gênero, classe, orientação sexual.

E alcançou as discussões modernas sobre a pedagogia.


E isso é fundamental para compreender a constante
preocupação da escritora com a descolonização do
conhecimento e seus questionamentos diante da
parcialidade das práticas de ensino.
bell hooks acredita que a construção de uma educação
humanista – antirracista, antissexista, anti-homofóbica e
etc. – que reconheça as peculiaridades das pessoas e que
garanta a voz dxs estudantes, promovendo consciência
crítico capaz de liberta-lxs das opressões do sistemática.
Mas para isso é necessário:
• Combater os métodos pedagógicos arcaicos;
• Descentralizar o conhecimento teórico;
• Reconhecer a falta de compromisso da academia em
aproximar a teoria da prática.
A supervalorização da produção acadêmica feminista
formulada num ambiente elitista/branco; obras escritas por
“pessoas de nome”, privilegiadas, muitas vezes, invisibilizam as
fontes poucos conhecidas;

Hierarquizam o debate e não contribuem na prática para o


coletivo.
Pensamento inútil, produzido na academia para manter o
status quo da classe dominadora intelectual, sem nenhuma
pretensão de intervenção prática na realidade social, só será
desafiada através da teoria da libertação.
A criação de um abismo entre a teoria e a prática na
academia é intencional porque é esse o artifício
utilizado para perpetuar o elitismo intelectual
que produz teorias irrelevantes para o todo e
promove uma falsa dicotomia entre a teoria e a
prática.
Por não se enxergarem dentro dessa hegemonia,
muitas mulheres negras tentaram resistir à
teorização acreditando apenas que a prática poderia
trazer uma solução concreta para a comunidade.
Entretanto, em um determinado momento “as
mulheres negras perceberam que permanecer calada (sem
teorizar) só ajudaria a perpetuar a ideia que podemos engajar
sem teoria”, pensando na teoria como algo apenas
abstrato, o que na visão da autora é inconcebível.
“Infinitas vezes, os esforços das mulheres negras para falar,
quebrar o silêncio e engajar-se em debates políticos
progressistas radicais enfrentam a oposição. Há um elo entre
a imposição de silêncio que experimentamos e censura anti-
intelectualismo em contextos predominantemente negros
que deveriam ser um lugar de apoio (como um espaço onde
só há mulheres negras), …
e aquela imposição de silêncio que ocorre em
instituições onde se dizem as mulheres negras e de
cor que elas não podem ser plenamente ouvidas ou
escutadas porque seus trabalhos não são
suficientemente teóricos (HOOKS, 1994, 95).”
hooks rejeita os formatos acadêmicos tradicionais
e defende que a teoria não acadêmica (como a
tradição oral) seja tão valorizada quanto à acadêmica
e também concorda na existência da prática sem a
teoria.
Os negros, em especial as mulheres negras, precisam
teorizar e subverter o feminismo branco, o
patriarcado e o racismo epistêmico dominante –
já que para a autora a prática envolve o processo de
teorização.
Por outro lado, intelectuais negros tentam superar a barreira
do pensamento hegemônico para mostrar que as palavras
servem para compreendermos a natureza da nossa situação e
os meios pelos quais podemos engajar e transformar a nossa
realidade.
bell hooks - mm tentando subverter o sistema, não
devemos tratar toda teoria dominante como inútil,
pois essa atitude reacionária é similar ao que os
brancos fazem quando rejeitam como teoria a
produção intelectual dos grupos marginalizados.
A teoria como prática libertadora, pressupõe uma educação
que não reproduz o status quo, que traz o pensamento
crítico, reflexivo e desconstrutivo para a sala de aula.

E necessário reconhecer a diversidade teórica; e a


diversidade teórica - experiências de vida.
Todas as pessoas levam algum conhecimento para a
sala de aula e essa pluralidade deve ser respeitada e
utilizada como metodologia pedagógica: Escambo de
vivências debates abertos, descentralização de
condutas e etc.
Num contexto multicultural, os alunos devem ser
convidados a conhecer a diversidade
epistemológica num espaço criado pelo
professor/a para incluir temas que promovem -
consciência de raça, sexo, classe ... associando-as a
disciplina oferecida.
Uma educação que liberta e que não faz dos estudantes
pessoas meramente passivas e engessadas exige:

• o despertar da criticidade acerca da sociedade que


vivemos, mas também, a visibilidade dos africanos no
continente e suas diásporas, das mulheres, dos
mestres e mestras da nossa comunidade, dos LGBT’s
e dos marginalizados.
Só com a “educação engajada” conseguiremos
visualizar como as relações de poder interferem
na educação e desarticularemos a escola como um
lugar opressão.
Uma educação que venha na direção oposta da
ideologia mercantilista e dominante, que atenda as
necessidades da população excluída dos direitos
básicos da existência humana e que forme sujeitos
críticos, conscientes e construtores de sua própria
história.
Referência:
• HOOKS, Bell; A teoria como prática libertadora.
In:___Ensinando a transgredir: a educação como prática
da liberdade. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2013. Cap.5,
p.83-104.

Você também pode gostar