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1.

Os dois fatores da mercadoria: Valor de uso e valor (substância do valor,


grandeza do valor)

Marx inicia sua exposição tomando a mercadoria como ponto de partida. A


mercadoria aparece como forma elementar que constitui a riqueza de todas as
sociedades em que domina o modo de produção capitalista.

Para Marx, a utilidade de uma coisa faz dela um “valor de uso”. Este valor de uso é
algo material, e realiza-se somente no uso ou no consumo, portanto consiste no
conteúdo real de uma coisa, no caso de uma sociedade capitalista, uma mercadoria.
Assim, na sociedade capitalista, os valores de uso também constituem nos suportes
materiais do “valor de troca”.

No texto, o valor de troca aparece, de início, como a proporção na qual valores de


uso de uma espécie se trocam contra valores de uso de outra espécie, uma relação
intrínseca entre mercadorias que expressa seus diferentes conteúdos em uma
mesma grandeza. Uma mercadoria tem múltiplos valores de troca, pois isto depende
de com qual mercadoria ela é comparada, e que, portanto, são equivalentes entre si.

Sendo assim, o valor de troca expressa uma igualdade entre as mercadorias, algo
que possibilita que elas sejam comensuráveis. Marx explica que essa igualdade não
pode ser uma propriedade física ou uma grandeza geométrica, pois é a abstração
dessas propriedades materiais, ou seja, do próprio valor de uso, que caracteriza o
valor de troca.

A igualdade entre mercadorias que Marx encontra é o fato de serem produtos do


trabalho. Porém, ele não se refere às formas corpóreas do trabalho, mas as reduz a
trabalho humano abstrato. “Essas coisas representam apenas o fato de que em sua
produção foi despendida força de trabalho humana, foi acumulado trabalho humano.
Como cristais dessa substância social que lhes é comum, elas são valores – valores
de mercadorias.” (MARX, 2013, n. p.)

Assim, Marx entende que o “valor” expressa a quantidade de trabalho humano


indiferenciado despendido na produção de uma mercadoria. Porém, a grandeza do
valor de uma mercadoria não é determinada pelo tempo de trabalho despendido em
nela individualmente, mas é medida em um grau social médio de tempo de trabalho
necessário, levando-se em conta uma força de trabalho social média. “Portanto, é
apenas a quantidade de trabalho socialmente necessário ou o tempo de trabalho
socialmente necessário para a produção de um valor de uso que determina a
grandeza de seu valor. A mercadoria individual vale aqui somente como exemplar
médio de sua espécie.” (MARX, 2013, n. p.)

Seguindo este raciocínio, o autor observa que qualquer mudança na força produtiva
do trabalho, e portanto, também no tempo de trabalho socialmente necessário,
impacta no valor de uma mercadoria.

2. Duplo caráter do trabalho representado nas mercadorias

A natureza dupla da mercadoria retratada por Marx, que consiste no valor de uso e
no valor de troca, também se reflete no trabalho, que é expresso abstratamente no
valor ao mesmo tempo que produz valores de uso.

Este segundo consiste em determinadas atividades produtivas, como tecelagem e


alfaiataria, denominadas por Marx como trabalho útil. Ele também ressalta que, em
uma sociedade, a divisão do trabalho social é condição de existência da produção
de valores de uso.

Por outro lado, o valor da mercadoria expressa o trabalho humano abstrato, sem
distinção, levando em conta apenas a força humana de trabalho despendida na
produção.

“Todo trabalho é, por um lado, dispêndio de força humana de trabalho em sentido


fisiológico, e graças a essa sua propriedade de trabalho humano igual ou abstrato
ele gera o valor das mercadorias. Por outro lado, todo trabalho é dispêndio de força
humana de trabalho numa forma específica, determinada à realização de um fim, e,
nessa qualidade de trabalho concreto e útil, ele produz valores de uso.” (MARX,
2013, n. p.)

3. A forma de valor ou o valor de troca

Aqui, Marx anuncia sua intenção de explicar a essência da forma-dinheiro: “Cabe,


aqui, realizar o que jamais foi tentado pela economia burguesa, a saber, provar a
gênese dessa forma-dinheiro, portanto, seguir de perto o desenvolvimento da
expressão do valor contida na relação de valor das mercadorias, desde sua forma
mais simples e opaca até a ofuscante forma-dinheiro. Com isso, desaparece, ao
mesmo tempo, o enigma do dinheiro.” (MARX, 2013, n. p.)
Ele inicia essa análise pela forma mais simples, a relação de valor entre duas
mercadorias de espécies diferentes, expressa na relação: “x mercadorias A = y
mercadorias B” (MARX, 2013, n. p.) Nesta relação, o valor da mercadoria A é
expresso no valor de uso da mercadoria B, então Marx determina que a mercadoria
A tem um papel ativo e está em forma relativa de valor, enquanto que a mercadoria
B tem um papel passivo e está em forma equivalente de valor. Vale ressaltar que
nenhuma mercadoria pode figurar como equivalente de si mesma.

O autor enfatiza que as mercadorias de diferentes espécies podem ser igualadas


objetivamente por serem ambas fruto de trabalho humano. Assim, para se expressar
o valor da mercadoria A, em forma relativa de valor, utiliza-se o corpo material da
mercadoria B. A mercadoria B, em forma equivalente de valor, converte seu valor de
uso em manifestação do valor da mercadoria A. Sendo assim, a forma simples de
valor de uma mercadoria é manifestação da antítese entre valor de uso e valor
contida na mercadoria.

Da mesma forma que uma mercadoria A pode ser expressa em uma mercadoria B,
também pode ser expressa em todas as outras mercadorias de espécies diferentes.
“Sua expressão individualizada de valor se transforma, assim, numa série sempre
ampliável de suas diferentes expressões simples de valor.” (MARX, 2013, n. p.)

Esta é a forma de valor total, que se expressa na relação: “z mercadoria A = u


mercadoria B, ou = v mercadoria C, ou = w mercadoria D, ou = x mercadoria E, ou =
etc.“ (MARX, 2013, n. p.). O trabalho que cria valor pode ser equivalente a qualquer
outro trabalho humano abstrato. Assim, a mercadoria se relaciona não apenas com
outra mercadoria individualmente, mas com o mundo das mercadorias. Entretanto, a
forma de valor total é insuficiente em expressar as relações de uma mercadoria,
visto que sua série de representações nunca acaba.

Por isso, o autor a expande para a forma de valor universal. Esta expressa o valor
de todas as mercadorias por meio da sua igualdade com uma única mercadoria em
forma equivalente de valor. Assim, ela recebe o caráter de equivalente universal.
“Uma mercadoria só ganha expressão universal de valor porque, ao mesmo tempo,
todas as outras expressam seu valor no mesmo equivalente, e cada novo tipo de
mercadoria que surge tem de fazer o mesmo.” (MARX, 2013, n. p.).
Quando, pelo hábito social, um tipo específico de mercadoria passa a ser sempre
utilizado como equivalente geral, este tipo se torna mercadoria-dinheiro, forma de
valor que Marx denomina como forma-dinheiro.

4. O caráter fetichista da mercadoria e seu segredo

O caráter místico da mercadoria não provém de seu valor de uso, nem do dispêndio
de trabalho humano que lhes determina o valor. Esse caráter fetichista se origina do
fato de que as relações entre os produtores de mercadorias assumem a forma de
uma relação social entre os produtos de trabalho.

“O caráter misterioso da forma-mercadoria consiste, portanto, simplesmente no fato


de que ela reflete aos homens os caracteres sociais de seu próprio trabalho como
caracteres objetivos dos próprios produtos do trabalho, como propriedades sociais
que são naturais a essas coisas” (MARX, 2013, n. p.). Assim, os produtos de
trabalho assumem a forma social de mercadorias, estabelecendo uma relação social
entre os objetos, à margem dos produtores.

Os trabalhos privados atuam como membros do trabalho social total por meio das
relações de troca entre os produtos do trabalho. Uma vez que os homens
relacionam seus produtos de trabalho por meio do valor, eles, sem perceber,
igualam seus trabalhos privados enquanto trabalho humano abstrato formador de
valor.

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