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J ustiça militar democrática e

de direitos humanos

Cândido Furtado Maia Neto


Procurador de Justiça/Ministério Público do Estado do Paraná
Expert em Direitos Humanos

RESUMO: Trata-se de trabalho acadêmico referente a estudo jurídico


de alguns temas de direito penal militar à luz dos instrumentos
LQWHUQDFLRQDLV GH 'LUHLWRV +XPDQRV DGHULGRV HRX UDWL¿FDGRV SHOD
5HS~EOLFD)HGHUDWLYDGR%UDVLOPDLVHVSHFL¿FDPHQWHQRWRFDQWHjV
garantias judiciais e ao devido processo legal, de acordo com teorias
avançadas aplicadas no âmbito do direito penal comum, que precisam
ser adequadas à prática forense militar para a efetivação plena do
sistema acusatório democrático e prevalência dos Direitos Humanos,
nos termos da Constituição federal de 1988.

PALAVRAS-CHAVES: Justiça Militar. Democracia. Direitos


Humanos.Teorias penais. Reforma Processual. Sistema acusatório.
Garantias judiciais.

ABSTRACT: This academic work is related to legal study concerning


some aspects of military criminal Law under international Human
5LJKWV LQVWUXPHQWV DGKHUHG WR DQGRU UDWL¿HG E\ WKH )HGHUDWLYH
Republic of Brazil. The study is focusing the judicial guarantees and
due process of Law according to advanced theories applied in common
CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

criminal Law that must be suitable to forensic practice in military


system to reach the fully accomplishment of the military accusatory
system and the prevalence of Human Rights under the Constitution
of Brazil of 1988.

KEY WORDS: Military Courts System. Democracy. Human rights.


Criminal theories. Procedural reform. Accusatory system. Judicial
guarantees.

SUMÁRIO: 1. Introdução í 2. 7HRULDGRFULPHQD-XVWLoD0LOLWDUí


2.1. Concurso de pessoas e deslocamento de competência da Justiça
0LOLWDUí3ULQFtSLRGRGHYLGRSURFHVVROHJDOQD-XVWLoD0LOLWDUí
 3ULQFtSLR GD RUDOLGDGH í  6LVWHPD DFXVDWyULR H RV LQGtFLRV
QR SURFHGLPHQWR SHQDO GHPRFUiWLFR í  6LVWHPD DFXVDWyULR H D
DPSODGHIHVDí*DUDQWLDVMXGLFLDLVHFOiXVXODVSpWUHDVí&ULPHV
FRQWUDD6HJXUDQoD1DFLRQDOí$EXVRGH$XWRULGDGHHGH3RGHUí
3ULQFtSLRGDLQVLJQL¿FkQFLDHR-XL]DGR(VSHFLDO&ULPLQDOí
3ULVmR3URYLVyULDHD([HFXomR3HQDO0LOLWDUí5HJLPH$EHUWRH
0HGLGDV&DXWHODUHVí/LYUDPHQWR&RQGLFLRQDOQD-XVWLoD0LOLWDU
í  &RPLVVmR GD 9HUGDGH í  3URFHVVDPHQWR H MXOJDPHQWR GH
FULPHVFRQWUDRV'LUHLWRV+XPDQRVí7ULEXQDO3HQDO,QWHUQDFLRQDO
73,  í  ([WUDGLomR SDUD MXOJDPHQWR GH FULPHV RX PRWLYDo}HV
SROtWLFDVí7ULEXQDO0LOLWDUGH1XUHPEHUJí&RQFOXVmRí
Referências.

1 INTRODUÇÃO

O sistema para a justiça penal brasileira adotado pela Constituição


Federal de 1988 é “acusatório democrático”, em que imperam os
princípios da legalidade, taxatividade e imparcialidade judicial para

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o devido processo legal, compreendendo o juízo natural, a presunção


de inocência, o contraditório e a ampla defesa, de maneira ampla e
irrestrita, tanto para a área penal comum, como para a Justiça Militar1.

O Código de Processo Penal comum e o Código de Processo Penal


Militar, como normas infraconstitucionais de mesma categoria,
devem estar perfeitamente integrados aos ditames da Carta Magna,
especialmente no que se refere aos direitos fundamentais da cidadania,
em outras palavras, no tocante às garantias judiciais de todas as
pessoas processadas criminalmente, independentemente da instância
ou da competência de julgamento.

Nesse sentido, o princípio da presunção de inocência, do contraditório


e da ampla defesa, expressos na Carta Magna, vigoram para todo o
sistema legal e ordenamento jurídico pátrio, seja na aplicação da
norma no âmbito da justiça dos estados como na justiça da União.

A República Federativa do Brasil constitui-se em Estado Democrático


de Direito, tendo como fundamentos a soberania, a cidadania e a
dignidade da pessoa humana (art. 1º, I e II, CF/88); sem prejuízo à
SUHYDOrQFLDGRV'LUHLWRV+XPDQRV DUWž,,&) 

2&yGLJRGH3URFHVVR3HQDO0LOLWDU 'HFOHLQž UH]DR


seguinte:

Art. 1º “ O processo penal militar reger-se-á pelas


normas contidas neste Código, assim em tempo de paz
como em tempo de guerra, salvo legislação especial
que lhe fora estritamente aplicável.
1
Princípio da legalidade ou anterioridade da lei
&RQVWLWXLomR)HGHUDODUWž;;;,;
&yGLJR3HQDO0LOLWDUDUWž
&yGLJR3HQDO&RPXPDUWž

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CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

§ 1º Nos casos concretos, se houver divergência entre


essas normas e as de convenção ou tratado de que o
Brasil seja signatário, prevalecerão as últimas.

Portanto, imperam os instrumentos internacionais de Direitos


Humanos, em base ao princípio da boa-fé porque não se pode utilizar
disposição de legislação nacional para menosprezar, diminuir ou
afetar o contido nos tratados2.

Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos


218±5DWL¿FDGR3URPXOJDGRSHOR'HF
)

$UW ž   1mR VH DGPLWLUi TXDOTXHU UHVWULomR RX


suspensão dos direitos humanos fundamentais
reconhecidos.

Convenção Americana sobre Direitos Humanos


3DFWRGH6DQ-RVpGD&RVWD5LFD 2($±
5DWL¿FDGD3URPXOJDGDSHOR'HF

$UW  1HQKXPD GH VXDV GLVSRVLo}HV SRGH VHU


interpretada no sentido de permitir, supressão do gozo
e do exercício dos direitos e liberdades reconhecidos.

&RQYHQomR GH 9LHQD VREUH 7UDWDGRV 218


5DWL¿FDGD3URPXOJDGDSHOR'HF

$UWV  H  7RGR 7UDWDGR REULJD DV 3DUWHV H GHYH VHU H[HFXWDGR
SRUHODVGHERDIpHXPD3DUWHQmRSRGHLQYRFDUDVGLVSRVLo}HVGH
VHXGLUHLWRLQWHUQRFRPRMXVWL¿FDWLYDSDUDRLQDGLPSOHPHQWRGHXP
Tratado.

2
MAIA NETO, C. F. Código de Direitos Humanos para a Justiça Criminal
brasileira5LRGH-DQHLUR(G)RUHQVH REUDHVJRWDGD 

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REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR

Há tempo o Supremo Tribunal Federal já se manifestou em decisão


GD&RUWHTXHQDKLSyWHVHGHFRQÀLWRHQWUHOHLRUGLQiULDH7UDWDGRHVWH
SUHYDOHFH 67)+&Qž+&'-8GH .

O sistema da Justiça Militar, em tempo de beligerância, rege-se pelas


regras do direito humanitário, com muito mais razão e na mesma linha
em tempo de paz, norteando-se pelos ditames e princípios gerais de
Direitos Humanos, em que as cláusulas de reconhecimento universal
devem prevalecer substancialmente no sistema legal castrense de um
SDtVFRPUHJLPHGHJRYHUQRGHPRFUiWLFRQRVFULWpULRVHVSHFt¿FRVGH
processamento e julgamento da Justiça Militar.

Os direitos e garantias expressos na Constituição federal não excluem


outros decorrentes dos princípios constantes nos tratados (leia-se
3DFWRV &RQYHQo}HV HWF  LQWHUQDFLRQDLV DGRWDGRV SHOR JRYHUQR
IHGHUDOYLD3DUODPHQWRQDFLRQDO †žDUWž&) 

A legislação interna via Constituição federal, direito penal militar


e o direito penal comum, e a ordem internacional dos instrumentos
de Direitos Humanos protegem os bens jurídico-penais de máxima
importância para a convivência fraterna e social, garantindo assim o
sistema democrático de justiça.

Estamos vivenciando um momento de reforma nas leis criminais do


País, a saber:

D 3URMHWRGH/HLQž3/6UHIHUHQWHDRCódigo de Processo Penal


comum 'HFOHLQž 


MAIA NETO, C. F. Promotor de Justiça e Direitos HumanosHG&XULWLED
-XUXi

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CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

E &RPLVVmRGH-XULVWDVLQVWDODGDHPRXWXEURGHSHOD3UHVLGrQFLD
do Senado Federal, para reforma do Código Penal comum (Dec-lei nº
3DUWH(VSHFLDOH/HLQž3DUWH*HUDO 

$OpP GDV PRGL¿FDo}HV TXH YHP RFRUUHQGR DR ORQJR GRV DQRV
HVSHFLDOPHQWHDSyVLVWRpGHVGHDYLJrQFLDGD/HL0DLRU
brasileira.

Não se aceita, portanto, a existência de antinomias legislativas


FRQWUDGLo}HV HQWUH SULQFtSLRV  TXH DWHQWHP FRQWUD R UHJLPH
acusatório democrático adotado pela Carta Magna, porque este deve
regulamentar a Justiça penal comum e militar.

Note-se que se faz urgente a reforma do Código Penal Militar e o


&yGLJRGH3URFHVVR3HQDO0LOLWDUYLJHQWHVGHVGHSDUDLQWHJUDU
o sistema acusatório democrático e compor o ordenamento jurídico
criminal, em que o princípio da isonomia não se refere apenas
à igualdade da lei - estricto sensu -, como também à igualdade de
tratamento e aplicação da norma ante os juízos e tribunais do País, de
maneira ampla, incluindo-se a jurisdição militar.

A legislação anterior a 1988 necessita de obrigatória adequação


legislativa, visto que a Constituição Federal de 1988 revogou o
instituto do Decreto-lei, e em seu lugar passaram a vigorar as
0HGLGDV 3URYLVyULDV DUW  &)  0DV HP UHVSHLWR DR SULQFtSLR GD
representação popular (compete privativamente à União legislar em
matéria penal-processual (art. 22, I, CF), proibindo-se em Medidas

MAIA NETO, C. F. Bases democráticas e direitos humanos aplicados na
reforma do Código Penal brasileiro. Trabalho em Contribuição a Comissão de
-XULVWDV'LUHLWR -XVWLoDRHVWDGRGRSDUDQiFRPEU

Note-se que o Código Penal Militar e o Código de Processo Penal Militar foram
promulgados em base a Decretos-leis.

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Provisórias tanto a despenalização como a criminalização, isto é,


WLSL¿FDomRGHFULPHVHFRPLQDomRGHVDQo}HV.

2 TEORIA DO CRIME NA JUSTIÇA MILITAR

$UHIRUPDGD3DUWH*HUDOGR&yGLJR3HQDOGHRFRUULGDHP
UHYRJRXDWHRULDFDXVDOLVWDGRFULPHHLPSODQWRXDGRXWULQD¿QDOLVWDGD
ação, em que o dolo e a culpa, que eram elementos da culpabilidade,
passaram ser elementos constitutivos do crime, propriamente dito.

Essa situação não ocorreu na Justiça Castrense, visto que o Código


3HQDO0LOLWDUGHFRQWLQXDHPYLJrQFLDHDSOLFDELOLGDGHSUiWLFD
sob os mesmos fundamentos, quanto a teoria causalista do crime.

D &yGLJR3HQDOFRPXPGH±DUWWHRULDGRFULPH
¿QDOLVWDGDLQWHQomR GROR 

E  &yGLJR 3HQDO PLOLWDU GH  ± DUW  WHRULD GD DomR 
causalista pelo resultado.

Normatização das Forças Armadas
,/HLQž(VWDWXWRGRV0LOLWDUHV±'HF
,,5HJXODPHQWR'LVFLSOLQDUGD$HURQiXWLFD±'HF±5'$(5
,,,5HJXODPHQWR'LVFLSOLQDUGD0DULQKD±'HF±5'0$5
,95HJXODPHQWR'LVFLSOLQDUGR([pUFLWR±'HF5'(
9/HLQž±6HUYLGRU3~EOLFR)HGHUDO
9,(VWDWXWRGRV0LOLWDUHV/HLQžDOWHUDGRSHOD/HLQž
9,,/HLGH2UJDQL]DomR-XGLFLiULD0LOLWDU /HLQžDOWHUDGDSHODVOHLV
H 

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CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

2.1 Concurso de pessoas e deslocamento de competência da


Justiça Militar

Essa divergência quanto às teorias do crime, aplicadas pela Justiça


Comum e Militar, pode causar sérios danos ao sistema democrático,
diretamente às garantias fundamentais da cidadania, porque na hipótese
de deslocamento de competência, quando existir processamento pela
Justiça Militar com mais de duas pessoas - concurso in persona±, um
réu será julgado pela Justiça comum e outro(s) pela Justiça Militar;
ou até mesmo a transferência de competência da Justiça Militar para a
Justiça Penal comum, com todos os implicados (autores e coautores).

O foro de processamento distinto entre Justiça Penal comum e


Justiça Militar, ainda que respeitadas as respectivas competências,
afeta substancialmente a aplicação do princípio da igualdade da lei
penal, quanto ao tratamento ante os juízos e Tribunais, em face à
diferenciação das teorias da ação ou do crime, produzindo efeitos e
UHVXOWDGRVGLYHUVRVVHMDQRPRPHQWRLQLFLDOVHMDQR¿QDOGRSURFHVVR
com o oferecimento e recebimento da denúncia, na análise legal da
FRQ¿JXUDomRGRFULPHHFDUDFWHUL]DomRGDFXOSD1DWHRULDGR&yGLJR
Penal Militar o dolo se encontra na culpabilidade, e no Código Penal
comum é elemento constitutivo do tipo.

Podem ocorrer várias hipóteses, por exemplo:

a) civil autor de crime contra bens ou interesses da Justiça


Militar, em concurso com militar praticando crime de furto
GH SURSULHGDGH SULYDGD GH R¿FLDO PLOLWDU -XVWLoD 3HQDO
comum / Justiça Militar;

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b) militar estadual, em serviço, em concurso com militar da


União, não em serviço;

c) militar estadual, não em serviço, em concurso com militar


da União, em serviço.

$FRPSHWrQFLDMXGLFLDO¿[DVHHPUHODomRjFRQGLomRGDSHVVRD DXWRU
do crime), e da espécie do bem jurídico-penal tutelado.

3 PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL NA JUSTIÇA


MILITAR

3.1 Princípio da oralidade

O Código de Processo Penal comum adota o princípio da oralidade


/HLQž HR&yGLJRGH3URFHVVR3HQDO0LOLWDUGH
mantém o sistema escrito. Existe um vazio ou lapso temporal entre as
duas formas de processamento penal, com quase quatro décadas, ou
VHMDDQRV

Segundo a doutrina penal moderna e especializada, o sistema oral


de processamento é ideal porque atende de perto ao princípio da
FHOHULGDGH LQF/;;9,,,DUWž&) 

D &yGLJRGH3URFHVVR3HQDO&RPXPGH±DUWH
VHJWV /HLQž 

E  &yGLJR GH 3URFHVVR 3HQDO 0LOLWDU GH  ± DUW  H


segts.

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CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

Entendemos que o sistema processual acusatório oral deve imperar em


todos os procedimentos e espécies de crimes, em nome da isonomia
da lei e tratamento ante os juízos e Tribunais.

3.2 Sistema acusatório e os indícios no procedimento penal


democrático

A Justiça Militar prestigia o princípio do devido processo legal em


busca da verdade real, tanto para a condenação como para a absolvição.
O sistema acusatório democrático rejeita a validade ou a consideração
dos indícios para condenação, dado que deve imperar a prova certa,
concreta e absoluta da autoria e culpabilidade penal8.

Ressalte-se que, no Estado Democrático de Direito ex vi do art. 1º


da Carta Magna Federal, somente é possível condenação em base a
provas concretas e absolutas de culpabilidade. Na dúvida, sempre,
prevalecem os princípios sine culpa sine poena e in dubio pro reo,
assim trilha o direito penal democrático-liberal-humanitário pátrio
vigente. O busílis para a solução da culpabilidade resulta em favor
do agente.

Ninguém pode ser declarado culpado sobre a base de probabilidade.


O veredicto de culpabilidade deve ser certo e verdadeiro; portanto, a
probabilidade subjetiva, aquela que se refere a um evento que ocorreu
QRSDVVDGRVLJQL¿FDTXHLQIRUPDo}HV SURYDVFRQVWDQWHVQRVDXWRV 
são incompletas, razão pela qual desautoriza o juízo de valor contra

MAIA NETO, C. F. Procedimento acusatório democrático para todas as espécies de
crimes à luz dos Direitos Humanos, da Constituição Federal e da LHLQž
Jornal O Estado do Paraná. Caderno Direito e Justiça&XULWLEDS
Revista Prática JurídicaQDEULOSS(G&RQVXOH[%UDVtOLD')
8
$UW&yGLJRGH3URFHVVR3HQDOFRPXP LQGtFLRV
$UW&yGLJRGH3URFHVVR3HQDO0LOLWDU LQGtFLRV

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o agente, uma vez que seus fundamentos são parciais, não totais e
nem absolutos. O que logicamente é provável está acompanhado de
dúvidas, de crença e não coroado de verdade. A probabilidade no
procedimento criminal atropela a certeza e conduz o juízo a injustiças.
A opinião interpretada por uma suspeita não é correta porque tem
como base a evidência, e HVWD SRU VL Vy QmR SURGX]LX VX¿FLHQWH
informação que autorize condenação.

Já decidiu o Pretório Excelso (STF), a prova indiciária, aquela


produzida durante a investigação policial, não é capaz de sustentar
nenhuma condenação,

9LJH HP QRVVR VLVWHPD R SULQFtSLR GR OLYUH


convencimento motivado ou da persuasão racional,
segundo o qual compete ao Juiz da causa valorar com
ampla liberdade os elementos de prova constantes dos
autos, desde que o faça motivadamente, com o que se
permite a aferição dos parâmetros de legalidade e de
razoabilidade adotados nessa operação intelectual. Não
vigora mais entre nós o sistema das provas tarifadas,
segundo o qual o legislador estabelecia previamente o
valor, a força probante de cada meio de prova (RHC
63UHO0LQ0HQH]HV'LUHLWR7
'-( 

3.3 Sistema acusatório e a ampla defesa

Contraditório e da ampla defesa são princípios assegurados


constitucionalmente, como garantia fundamental individual da
FLGDGDQLD DUWžLQF/9&) 

$ DPSOD GHIHVD H DVVLVWrQFLD MXGLFLiULD OHL Qž   D WRGRV


os investigados e processados pela Justiça Militar deve ser integral,
QRVWHUPRVGD&RQVWLWXLomRIHGHUDODUWH/HLQž

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CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

GD'HIHQVRULD3~EOLFDGD8QLmRHPUHODomRj-XVWLoD0LOLWDU±DUWV
FF/HL&RPSOHPHQWDUQžH/HL2UJkQLFDGD$GYRFDFLD
Geral da União.

O artigo 11 da Declaração Universal de Direitos Humanos da ONU


formula a presunção de inocência:

Toda pessoa acusada de um delito tem o direito a


que se lhe presuma inocente, até que se demonstre
a culpabilidade segundo a lei e em um juízo público
em que terá todas as garantias necessárias para a sua
defesa.

4 GARANTIAS JUDICIAIS E CLÁUSULAS PÉTREAS

Estamos nos referindo às cláusulas pétreas autoaplicáveis do direito


penal processual democrático, instituídas no sistema judicial da
República Federativa do Brasil, que objetiva uma sociedade livre,
MXVWDHVROLGiULD DUWž,&) 

Tanto o ordenamento jurídico pátrio como o sistema internacional


de proteção dos Direitos Humanos blindam as garantias processuais
penais de maneira total e absoluta, não permitindo que sejam revogadas
RXPRGL¿FDGDVQHPVHTXHUYLDHPHQGDVFRQVWLWXFLRQDLV DUW†ž
,9&) VRPHQWHRSUHVLGHQWHGD5HS~EOLFDFRPRFKHIHVXSUHPR
do Poder Executivo, pode, por período certo e determinado, cancelar
VXDDSOLFDomRGXUDQWHR(VWDGRGH'HIHVDRX(VWDGRGH6tWLR DUW
e segts, CF/88)9.
9
MAIA NETO, C. F. Direitos humanos individuais fundamentais no processo
penal democrático: blindagem das garantias constitucionais ou vítimas do crime
de abuso de poder. Revista Jurídica da UNISEP±)DFXOGDGHGH'LUHLWRGD8QLmR
GH(QVLQRGR6XGRHVWHGR3DUDQiSJYRO$JR'H]Revista
de Estudos Criminais Qž $QR 9, -DQHLUR0DUoR  38&,7(& 3RUWR
Alegre/RG - Revista IOB de Direito Penal e Processual PenalYQžDEULO

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5 CRIMES CONTRA A SEGURANÇA NACIONAL

O sistema penal democrático, com base nas garantias individuais


asseguradas no Texto Maior e nos instrumentos internacionais de
Direitos Humanos, possui ampla esfera de aplicação, vale dizer, para
os procedimentos que envolvem crimes hediondos, atrozes ou de alta
gravidade, como por exemplo os crimes contra a segurança nacional,
FRQWUDRV(VWDGR'HPRFUiWLFR /HLQž 

A Comissão de Juristas encarregada da reforma do Código Penal


'HFOHLQž HPUHXQLmRGHDSURYRXDVHJXLQWH
VXJHVWmRSDUDRGHOLWRGHWHUURULVPRUHYRJDQGRD/HLQž
de Segurança Nacional; a saber:

TERRORISMO

$UW ; ± &DXVDU WHUURU QD SRSXODomR PHGLDQWH DV


condutas descritas nos parágrafos deste artigo, quando:

, ± WLYHUHP SRU ¿P IRUoDU DXWRULGDGHV S~EOLFDV


nacionais ou estrangeiras, ou pessoas que ajam em
nome delas, a fazer o que a lei não exige ou deixar de
fazer o que a lei não proíbe, ou;

,,±WLYHUHPSRU¿PREWHUUHFXUVRVSDUDDPDQXWHQomR
GHRUJDQL]Do}HVSROtWLFDVRXJUXSRVDUPDGRVFLYLVRX
militares, que atuem contra a ordem constitucional e o
Estado Democrático ou;

,,, ± IRUHP PRWLYDGDV SRU SUHFRQFHLWR GH UDoD FRU


etnia, religião, nacionalidade, sexo, identidade ou

PDLR 6mR 3DXOR63 SJ     PDLRMXQKR   www.anadep.org.br


DJRVWR $VVRFLDomR1DFLRQDOGRV'HIHQVRUHV3~EOLFRVRevista da OAB±
&RQVHOKR)HGHUDODQR;;;9,QžMXO'H]SJ%UDVtOLD')Revista
dos Tribunais 57  $QR  9RO  SJ  6mR 3DXOR   www.
editoramagister.com-RUQDO-XULG'LJLWDO ,661 

107
CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

RULHQWDomRVH[XDORXSRUUD]}HVSROtWLFDVLGHROyJLFDV
¿ORVy¿FDVRXUHOLJLRVDV

†ž±6HTXHVWUDURXPDQWHUDOJXpPHPFiUFHUHSULYDGR

†ž±8VDURXDPHDoDUXVDUWUDQVSRUWDUJXDUGDUSRUWDU
ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos,
conteúdos biológicos ou outros meios capazes de
causar danos ou promover destruição em massa;

†ž±LQFHQGLDUGHSUHGDUVDTXHDUH[SORGLURXLQYDGLU
qualquer bem público ou privado;

† ž ± ,QWHUIHULU VDERWDU RX GDQL¿FDU VLVWHPDV GH


informática e bancos de dados;

† ž ± 6DERWDU R IXQFLRQDPHQWR RX DSRGHUDUVH FRP


grave ameaça ou violência a pessoas, do controle, total
ou parcial, ainda que de modo temporário, de meios de
comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos,
HVWDo}HV IHUURYLiULDV RX URGRYLiULDV KRVSLWDLV FDVDV
GH VD~GH HVFRODV HVWiGLRV HVSRUWLYRV LQVWDODo}HV
públicas ou locais onde funcionem serviços públicos
HVVHQFLDLV LQVWDODo}HV GH JHUDomR RX WUDQVPLVVmR GH
HQHUJLDHLQVWDODo}HVPLOLWDUHV

3HQD±SULVmRGHRLWRDTXLQ]HDQRVDOpPGDVVDQo}HV
correspondentes à ameaça, violência, dano, lesão
corporal ou morte, tentadas ou consumadas.

)RUPDTXDOL¿FDGD

†ž6HDFRQGXWDpSUDWLFDGDSHODXWLOL]DomRGHDUPD
de destruição em massa ou outro meio capaz de causar
grandes danos.

3HQD ± SULVmR GH GR]H D YLQWH DQRV DOpP GDV SHQDV


correspondentes à ameaça,violência, dano, lesão
corporal ou morte, tentadas ou consumadas.

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Exclusão de crime

† ž ± 1mR FRQVWLWXL FULPH GH WHUURULVPR D FRQGXWD


individual ou coletiva de pessoas movidas por
propósitos sociais ou reivindicatórios, desde que os
objetivos e meios sejam compatíveis e adequados à sua
¿QDOLGDGH

Financiamento do terrorismo

$UW;±2IHUHFHURXUHFHEHUREWHUJXDUGDUPDQWHU
em depósito, investir ou de qualquer modo contribuir
SDUDDREWHQomRGHDWLYRVEHQVHUHFXUVRV¿QDQFHLURV
FRP D ¿QDOLGDGH GH ¿QDQFLDU FXVWHDU RX SURPRYHU D
prática de terrorismo, ainda que o atos relativos a este
não venham a ocorrer.

3HQD±SULVmRGHRLWRDTXLQ]HDQRV

Favorecimento pessoal no terrorismo

$UW;±'DUDEULJRRXJXDULGDDSHVVRDGHTXHPVH
saiba ou se tenha fortes motivos para saber, que tenha
praticado ou esteja por praticar crime de terrorismo.

Pena - prisão, de quatro a dez anos.

Escusa Absolutória

Não haverá pena se o agente for ascendente ou


descendente em primeiro grau, cônjuge, companheiro
estável ou irmão da pessoa abrigada ou recebida. Esta
escusa não alcança os partícipes que não ostentem
idêntica condição.

Disposição comum

$UW ; $V SHQDV SUHYLVWDV SDUD RV FULPHV GHVWH


capítulo serão aumentadas até a metade se as condutas

109
CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

forem praticadas durante ou por ocasião de grandes


eventos esportivos, culturais, educacionais, religiosos,
de lazer ou políticos, nacionais ou internacionais.

&OiXVXOD GH UHYRJDomR )LFD UHYRJDGD D /HL Qž  GH  GH
GH]HPEURGH

São delitos de lesa-nação contra a segurança nacional, territorial e a


soberania da lei.

-iHPRHPLQHQWHSHQDOLVWD+HOHQR&OiXGLR)UDJRVRDVVHYHUDYD

A Justiça Militar tem um importante papel a cumprir


ao momento atual. Ela deve trazer a sua contribuição
ao processo de democratização do País, em que o
presidente da República está empenhado. É esta uma
aspiração de todo o povo brasileiro. A Justiça Militar
SRGH DVVXPLU QHVWH PRPHQWR DV IXQo}HV PDJQt¿FDV
de um autêntico Poder Moderador, impedindo a
aplicação abusiva e terrorística da lei de segurança,
mantendo a vocação democrática que destacou e
GLJQL¿FRXRWULEXQDOPLOLWDUQRSDVVDGRHWUDEDOKDQGR
decisivamente em favor da construção de um regime de
liberdade. Para decidir democraticamente em matéria
política é preciso amar a liberdade. SEBASTIAN
SOLER, o grande jurista da América, dizia: “Assim
como a música se ouve sobre um fundo de silêncio, só
um fundo de liberdade permite entender o sentido das
normas de direito que a limitam e restringem”.

6 ABUSO DE AUTORIDADE E DE PODER

Qualquer violação às garantias individuais, isto é, desrespeito a


ordem legal processual, acarreta grave ameaça ao sistema acusatório
GHPRFUiWLFR FDUDFWHUL]DQGR DEXVR GH DXWRULGDGH /HL Qž  
em que o poder judiciário não deixará de apreciar qualquer ameaça
LQDUWLJRSXEOLFDGRQR-RUQDO2(VWDGRGH63DXORSGHGHDEULOGH


110
REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR

ou atentado contra os direitos e liberdades fundamentais; assim


GHWHUPLQDD&RQVWLWXLomRIHGHUDO DUWž;;;9H;/,&) 

1HVVHVHQWLGRKiRVDUWLJRVHGR&yGLJR3HQDO0LOLWDU
referentes aos crimes de violência contra inferior e ofensa aviltante,
cujas penas vão desde a suspensão do exercício do posto a 2 anos
de detenção. E ainda, o emprego da força, uso de armas e algemas,
VRPHQWHTXDQGRHVWULWDPHQWHQHFHVViULR DUW&330 11.

6.1 3ULQFtSLRGDLQVLJQL¿FkQFLDHR-XL]DGR(VSHFLDO&ULPLQDO

Em nome do princípio de humanidade, da utilidade do movimento da


máquina judiciária, da celeridade processual e da proporcionalidade
da sanção, quando não existir ofensa a bem jurídico-penal relevante,
ou quando o fato resultar em prejuízo ou ofensa de pequena monta,
FDEHDSOLFDomRGLUHWDGHSHQDVUHVWULWLYDVGHGLUHLWR DUWHVHJWV,
&3FRPXP DVVLPSUHYrDOHLQžVREUHR-XL]DGR(VSHFLDO
Criminal.

A Justiça Militar deve percorrer os mesmos trilhos, em que pese o


FRQWLGRQD6~PXOD670³$/HLQžGHTXHGLVS}H
sobre os Juízos Especiais Cíveis e Criminais e dá outras providências,
QmRVHDSOLFDj-XVWLoD0LOLWDUGD8QLmR´ '-QžGH 
usando a analogia e as regras de direito comparado, isto é, de mesma

11
Direitos Humanos comparados (polícia do Exército-Marinha-Aeronáutica)
1- Código de Conduta para Funcionários Encarregados de Fazer Cumprir a Lei
2185HV
2- Princípios Básicos sobre o Emprego da Força e de Armas de Fogo por
Funcionários Encarregados de Fazer Cumprir a Lei (ONU /adotado no 8º Cong.
+DZDQD&XEDj

'HFODUDomRGH3ULQFtSLRVGH-XVWLoDSDUDDV9tWLPDVGH&ULPH 218 

111
CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

espécie, ou seja criminal, e de mesma hierarquia ou verticalidade,


como normas ordinárias, sempre respeitando os princípios gerais
contidos na Carta Magna e nos instrumentos de Direitos Humanos
DUWžGR&33FFDUWž†žGR&330 

Assim, muitos crimes previstos no Código Penal Militar (Dec.


  SRGHULDP DGHTXDUVH DR VLVWHPD SHQDO FRPXP SDUD
aplicação de penas restritivas de direito no contexto do Juizado
Especial Criminal.

Porém, não é possível que crimes contra a autoridade ou disciplina


militar, ou crimes contra o serviço militar e o dever militar sejam
de alçada do Juizado Especial Criminal, considerando as suas
importâncias, visto que se referem à necessária manutenção da ordem
GDV LQVWLWXLo}HV PLOLWDUHV DGHPDLV GR GHYHU GH UHVSHLWR GH WRGRV
os militares e civis às Forças Armadas de seu país; como também
não é crível que crimes contra a administração pública ou contra
a administração da justiça comum sejam do rol de competência
do Juizado Especial Criminal, com destaque ao crime de abuso de
autoridade12.

No sistema de Justiça Militar se aplica o instituto da menagem, previsto


QRDUW&330TXHVLJQL¿FDSULVmRIRUDRHVWDEHOHFLPHQWRSHQDO
com compromisso judicial.

12
MAIA NETO, C. F. Juizado Especial Criminal www.jusvi.com.br (Jus
Vigilantibus±RXWXEUR  3UROLQN3XEOLFDo}HV± 

112
REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR

7 PRISÃO PROVISÓRIA E A EXECUÇÃO PENAL MILITAR

2VDUWLJRVHGR&330UHIHUHPVHjSULVmRHDRUHVSHLWRD
integridade física dos detentos. Nesse particular é de se ressaltar que
os presos da Justiça Militar possuem efetivamente garantidos seus
Direitos Humanos. Fato que não ocorre com os presos de competência
da Justiça Penal comum.

Para os presos da Justiça Penal comum, poderia pleitear-se os princípios


e regras do direito penal humanitário, utilizadas em tempo de guerra
(Convenção de Genebra), aos presos nacionais, em tempo de paz, para
receberem os direitos e garantias contempladas aos presos inimigos
(estrangeiros). Uma vez que os nacionais estão cumprindo detenção
HP FRQGLo}HV GHVXPDQDV H GHJUDGDQWHV DWHQWDWyULDV DR UHVSHLWR j
dignidade da pessoa humana, tornando na prática a execução da pena
SULYDWLYDGHOLEHUGDGHÀDJUDQWHPHQWHLQFRQVWLWXFLRQDO.

Aproveitamos uma passagem do jurista Sobral Pinto, eminente


DGYRJDGRTXDQGRHPGHIHVDGHXPDGHVXDVFDXVDVQRDQRGH
UHTXHUHXDRJRYHUQRDDSOLFDomRGRDUWLJRžGD/HLGH3URWHomRDRV
$QLPDLV 'HFUHWR Qž   UHYRJDGR  SRUTXH VHX FOLHQWH


MAIA NETO, C. F. Inconstitucionalidade da execução da pena de prisão: abuso
GHDXWRULGDGHHÀDJUDQWHYLRODomRDRVGLUHLWRVKXPDQRV UHYLVDGR 
- RT, Revista dos Tribunais3XEOLFDomR2¿FLDOGRV7ULEXQDLVGH-XVWLoD$QR
Q6HWHPEURGH6mR3DXOR63
- www.jusvi.com (site-XV9LJLODQWLEXV  ,QFRQVWLWXFLRQDOLGDGHGD3ULVmR 
- universojurídico.com.br 3UROLQN3XEOLFDo}HV 
-KWWSEUPRQRJUDILDVFRPWUDEDOKRVSGIDLQFRQVWLWXFLRQDOLGDGHD
inconstitucionalidade.shtml
- Conteúdo Jurídico:KWWSZZZFRQWHXGRMXULGLFRFRPEU"DUWLJRV YHU 
2(VWDGRGR3DUDQi&DGHUQR'LUHLWRH-XVWLoDSJ&XULWLED
,QIRUPDWLYR-XUtGLFR&RQVXOH[DQR;;,,,Qž%UDVtOLD')SJ

113
CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

estava sofrendo maus-tratos, ou seja, pior que um animal (hoje lei nº


GRPHLRDPELHQWH 

2 WUDEDOKR GR &RPLWr ,QWHUQDFLRQDO GD &UX] 9HUPHOKD de prestar


atenção aos prisioneiros de guerra, poderia ser ampliado no tempo de
paz, com atividades no interior dos presídios e estabelecimentos penais
do País, em prol dos Direitos Humanos das pessoas encarceradas,
YHUL¿FDQGRH¿VFDOL]DQGRDDSOLFDomRGRVSULQFtSLRVHGDOHLFRPR
yUJmRR¿FLDORXYROXQWiULRGHH[HFXomRSHQDO

7.1 Regime Aberto e Medidas Cautelares

1D UHIRUPD GR &yGLJR 3HQDO FRPXP GH  TXH LPSODQWRX R
UHJLPH DEHUWR DUW &3  SDUD RV FULPHV RQGH D FRQGHQDomR QmR
XOWUDSDVVHSHQDGH TXDWUR DQRVGHYHDH[HFXomRVHUGLIHUHQFLDGD
(PDLVUHFHQWHPHQWHD/HLQžDOWHURXSDUWHGR&yGLJRGH
3URFHVVR3HQDO 'HFOHLQž FULDQGRDVPHGLGDVFDXWHODUHV
alternativas à prisão provisória (art. 282 e segts. CPP). Note-se,
o Código Penal Militar e o Código de Processo Penal Militar não
GLVS}HPGHVVHVLVWHPDMXUtGLFR

As Regras Mínimas de Tóquio, sobre “penas não privativas de


OLEHUGDGH´ 2185HVGH SRGHPVHUDSOLFDGDVQD-XVWLoD
Penal brasileira, através de diversas espécies de medidas alternativas.
Trata-se de um instrumento internacional de Direitos Humanos, de
aceitação tácita universal, basilar aos sistemas penais democráticos.
Observe-se, ademais, que as Regras de Tóquio foram aprovadas pela

&RPLWr,QWHUQDFLRQDOGD&UX]9HUPHOKD &,&9 IXQGDGRHPFRPVHGHHP




*HQHEUD6XtoDWHPFRPRPLVVmRRGLVSRVWRQD&RQYHQomRGH*HQHEUDGHH
atividades humanitárias em geral.

114
REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR

$VVHPEOpLD *HUDO GDV 2UJDQL]DomR GDV 1Do}HV 8QLGDV HP TXH R


Brasil é Estado-Parte.

Pensamos que até uma possível reforma do Código de Processo Penal


0LOLWDU YHUDUWž†ž GHYHDGDSWDUVHYLDVXPXODVGR670 DUWž
&33 VXEVLGLDULDPHQWHQDOLQKDGD/HLQž

$ /HL GH ([HFXomR /HL Qž  DUW ž SUHFLVD VHU DSOLFDGD
corretamente, isto é, com base nas garantias constitucionais, pois o
&yGLJRGH3URFHVVR3HQDO0LOLWDUQRDUWTXHWUDWDGRUHVSHLWRj
integridade física e moral dos presos, é claro e taxativo.

Exceção: cabe à Justiça Militar averiguar e decidir sobre a real


necessidade do encarceramento provisório e do regime fechado,
de acordo com as circunstâncias e elementos probatórios do caso
sub judice, personalidade, antecedentes, conduta social do agente,
FRQGLo}HV H FRQVHTXrQFLDV GR FULPH PRGR GH H[HFXomR H PHLRV
HPSUHJDGRV DUW&30FF&3 

7.2 Livramento Condicional na Justiça Militar

O Código de Processo Penal Militar proporciona um verdadeiro


“Diálogo” do Estado-Juiz Militar com a pessoa do condenado,
FRQFHGHQGRREHQHItFLRGROLYUDPHQWRFRQGLFLRQDO DUWHVHJWV
CPPM), de maneira efetivamente democrática, tendo em vista que,
em audiência e ato solene, são explicadas as consequências do
descumprimento da medida legal.

5HVSHLWRDRV'LUHLWRV+XPDQRVGR3UHVR±/HJLVODomRFRPSDUDGD
&RQVWLWXLomR)HGHUDODUWž;/,;
&yGLJR3HQDOFRPXPDUW
/HLGH([HFXomR3HQDODUW

115
CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

A justiça penal comum deveria imitar e copiar tal prática processual;


no sentido de não somente expedir, via Cartório Criminal, o alvará de
concessão do benefício do Livramento Condicional, sem cumprir o
GLVSRVWRQRDUWLJR&33UHIHUHQWHjFHULP{QLDGROLYUDPHQWR DUW
HVHJVW&3FRPXPHDUWHVHJWV/(3 

Na prática a cerimônia do livramento condicional, tão importante no


processo de reintegração social do apenado, nos termos do art. 1º da
Lei de Execução Penal, como objetivo da pena privativa de liberdade,
acaba sendo “letra morta”. Teoria e prática devem ser equivalentes,
FDPLQKDUMXQWDVSDUDDFRUUHWDHH¿FLHQWHDSOLFDomRGDQRUPD

8 COMISSÃO DA VERDADE

Em respeito às regras gerais que norteiam a legalidade dos


compromissos jurídicos nacionais e internacionais (ius cogens), entre
HOHV R SULQFtSLR GD LUUHWURDWLYLGDGH GD OHL SHQDO SRGHVH D¿UPDU
que RV DWRV RFRUULGRV HQWUH  j   D 
 FKDPDGR (VWDGR 1RYR  H GH  D   SHUtRGR GH JRYHUQR
PLOLWDU QRVWHUPRVGRDUWLJRžGD/HLQžTXHFULRXD
&RPLVVmRGD9HUGDGH FFDUWž$WRVGD'LVSRVLo}HV&RQVWLWXFLRQDLV
Transitórias, CF/88), são inaplicáveis, visto que em matéria penal,
a norma somente retroage em benefício das pessoas, sem qualquer
distinção ou discriminação, em que todos são iguais perante a lei e
DQWH R WUDWDPHQWR GRV 7ULEXQDLV LQF ;/ DUW ž ³FDSXW´ &) 
para militares ou civis, seja em concurso, coautoria ou aqueles
FRQVLGHUDGRV HTXLSDUDGRV DUWV  H  &30 FF DUWV  H
&3 

116
REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR

Ainda que os crimes contra os Direitos Humanos sejam atentados


de “lesa-humanidade” e imprescritíveis, proíbem-se taxativamente
QR UHJLPH GHPRFUiWLFR ³WULEXQDLV GH H[FHomR´ LQF ;;;9,, DUW
ž&) HPTXHSDUDLPSHUDUDVHJXUDQoDMXUtGLFDGHWRGRVHGD
Nação, deve vigorar o devido processo legal, especialmente quanto
ao princípio do Juiz Natural, este vale para o futuro e não ao passado;
assim resta imprópria qualquer pretensão de propositura de ação
penal nesse sentido, por ser ilegal (inconstitucional), pois afronta
diretamente dispositivos dos instrumentos internacionais de Direitos
Humanos.

Sobre a irretroatividade da lei e sobre a proibição de tribunal ou


juízo de exceção, segundo os instrumentos internacionais de Direitos
+XPDQRVFLWRD'HFODUDomR8QLYHUVDO DUW R3DFWR,QWHUQDFLRQDO
GH&LYLVH3ROtWLFRV DUW HD&RQYHQomR$PHULFDQD DUWž 

Note-se também que a República Federativa do Brasil aderiu e


UDWL¿FRXDV&RQYHQo}HVFRQWUDD7RUWXUD 218H2($ 
R3DFWR,QWHUQDFLRQDOVREUH'LUHLWRV&LYLVH3ROtWLFRV 218 H
D &RQYHQomR$PHULFDQD VREUH 'LUHLWRV +XPDQRV 2($  QRV
anos de 1989 e 1992, antes da criação e aceitação da competência do
7ULEXQDO3HQDO,QWHUQDFLRQDOH

O juízo natural está previsto na legislação processual penal comum e


PLOLWDUQRVFULPHVHPWHPSRGHSD]HGHJXHUUDFRPSHQDVGH¿QLGDV
previamente, tudo previsto dentro da legalidade com anterioridade, ou
seja, antes da hipótese de ocorrência. Esse é um exemplo de Tribunal
Natural, sem qualquer exceção.

117
CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

Um Tratado internacional começa a ter validade e vigência após a


GDWDGHGHSyVLWRSHUDQWHR6HFUHWiULR*HUDOGDV1Do}HV8QLGDVRXGD
Organização dos Estados Americanos, do trigésimo quinto instrumento
GHUDWL¿FDomRRXDGHVmRHDLQGDSDUDRV(VWDGRV3DUWHVTXHYLHUHP
UDWL¿FDU R 7UDWDGR 3DFWR HWF FRPHoD D YDOHU DSyV GHWHUPLQDGR
SUD]RGDGDWDGHGHSyVLWRUDWL¿FDomRHDGHVmR$&RQYHQomR&RQWUD
7RUWXUD218 WHP VRPHQWH YDOLGDGH DSyV D UDWL¿FDomR GR WULJpVLPR
instrumento.

5HSHWLPRV D 5HS~EOLFD )HGHUDWLYD GR %UDVLO UDWL¿FRX H DGHULX


instrumentos de Direitos Humanos, após alguns anos da data de
promulgação da Carta Magna de 1988; assim os crimes contra
a humanidade são imprescritíveis para atos praticados depois da
UDWL¿FDomRGRV7UDWDGRV$OHLHPPDWpULDSHQDOVRPHQWHUHWURDJHSDUD
EHQH¿FLDUQXQFDHPSUHMXt]RGDSHVVRDDUHJUDGDLUUHWURDWLYLGDGH
GDOHLFRQVWDQDVSUySULDV&RQYHQo}HVLQWHUQDFLRQDLVFRPRSULQFtSLR
básico de Direitos Humanos.

Por exemplo, o crime de tortura ou outro que atente contra a


KXPDQLGDGHVmRLPSUHVFULWtYHLVFRPRFRQVWDQRV7UDWDGRVVLJQL¿FD
que a tortura para a lei penal doméstica é crime imprescritível da data
de sua vigência para frente, e não ao passado.

9HMDPRV R DUWLJR  GD &RQYHQomR GH 9LHQD VREUH R 'LUHLWR GRV
7UDWDGRV 2185DWL¿FDGRSHOR%UDVLOHPGH]HPEURGH 
expressa taxativamente sobre a irretroatividade dos tratados, não obriga
validade antes da entrada em vigor, exceto se tenha sido estabelecida
outra forma. No caso brasileiro não foi estabelecida vigência anterior
à data de promulgação do Tratado, Pacto ou Convenção; portanto,

118
REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR

HPVLWXDo}HVRXIDWRVSDVVDGRVTXHGHL[DUDPGHH[LVWLUDOHLWRUQDVH
LQDSOLFiYHOSRUyUJmRV&RPLVV}HVMXt]RVH7ULEXQDLV

2V SURFHGLPHQWRV GH LQGHQL]Do}HV SRU DWRV SUDWLFDGRV QR SHUtRGR


GH  GH VHWHPEUR GH  D  GH RXWXEUR GH  VmR PHUDPHQWH
administrativos, realizados pela Comissão de Anistia (Medida
3URYLVyULD Qž   H &RPLVVmR (VSHFLDO VREUH 0RUWRV H
'HVDSDUHFLGRV /HLQž'HFQž/HLQžH
/HLQž 1RWHVH.

$&RPLVVmRGD9HUGDGHQmRSRVVXLSRGHUGHSROtFLD MXGLFLiULDSDUD
investigar e relatar inquérito policial), e nem poderia tê-lo, apenas
irá relatar o sugerido ou o perseguido, com rara consistência jurídica
ante o grande lapso temporal fático, considerando a extinção da
SXQLELOLGDGH DUW,&3 DLUUHWURDWLYLGDGHDLQDSOLFDELOLGDGH
da lei e a incompetência para processamento e julgamento judicial,
nos termos dos princípios do Juiz Natural e da Legalidade. O relatório
GD &RPLVVmR GD 9HUGDGH SRGHUi VHUYLU SDUD RXWUDV LQGHQL]Do}HV D
serem pagas pelo erário brasileiro.

A questão de processamento e julgamento judicial penal DSyV 


anos da entrada em vigor da Constituição de 1988, tornar-se-á uma

$/HLQžGH$QLVWLDTXDQWRDVXDLQWHUSUHWDomRHDSOLFDomRIRLDQXODGD


SRUGHFLVmRGD&RUWH,QWHUDPHULFDQDGH'LUHLWRV+XPDQRV PDLR FRQWUDULDQGR


R HQWHQGLPHQWR GR 67) DEULO  PDV D GHFLVmR GD &RUWH ,QWHUDPHULFDQD GH
'LUHLWRV +XPDQRV QmR LQYDOLGD R FRQWLGR QR DUWLJR  GD &RQYHQomR GH9LHQD
SDVVRXDYLJRUDUSDUDR%UDVLOVRPHQWHQRDQRGHHPGLDQWH
9HU5HVROXomR218GR&RQVHOKR(FRQ{PLFRH6RFLDOVREUH3UHYHQomR
(¿FD] H ,QYHVWLJDomR GDV ([HFXo}HV ([WUDMXGLFLDLV $UELWUiULDV RX 6XPiULDV H
&RQYHQomRFRQWUDDWRUWXUD2182($ 
2WHUURULVPRHDWRUWXUDVmRLQVXVFHWtYHLVGHDQLVWLD DUWž;/,,,&) GH¿QLomR
dada após 1988, com a promulgação da Carta Magna.

119
CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

justiça eminentemente imperfeita, indevida ou de exceção, contrária


aos ditames das normas penais democráticas e regras principiológicas
gerais; em razão do tempo - ratione temporae -, desde 1989 o Conselho
(FRQ{PLFR H 6RFLDO GDV 1Do}HV 8QLGDV UHFRPHQGRX DSOLFDomR
GRV 3ULQFtSLRV UHODWLYRV D XPD H¿FD] SUHYHQomR H LQYHVWLJDomR GDV
H[HFXo}HVH[WUDOHJDLVDUELWUiULDVRXVXPiULDV 2185HV 
no marco da legislação nacional.

8.1 Processamento e julgamento de crimes contra os Direitos


Humanos

2GLVSRVWRQRLQFLVR9GRDUWGD&)UHIHUHVHDRVFULPHVTXH
R %UDVLO VH FRPSURPHWHX LQWHUQDFLRQDOPHQWH D UHSULPLU WUi¿FR GH
drogas, de pessoas, etc.), de acordo com a previsão legal expressa nos
DUWLJRVžžHžGR&yGLJR3HQDOFRPXP$FRPSHWrQFLDVHGH¿QH
HPEDVHDRDUWLJRHVHJWVGR&yGLJRGH3URFHVVR3HQDOFRPXPHP
nome do princípio da taxatividade e proibição de tribunal de exceção
LQF;;;9,,DUWž&) 

eQHFHVViULRSUHFLVDURWULEXQDORXMXt]HV DUW&) LQVWkQFLD


de jurisdição, para serem levadas em consideração as regras de


/HLQž &RQFHGH$QLVWLDSHUtRGRD 
0HGLGD3URYLVyULDQžH/HLQž &RPLVVmRGD$QLVWLD
/HLQž &RPLVVmRVREUH0RUWRVH'HVDSDUHFLGRV 
- Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas Contra o Desaparecimento
Forçado2185HV
Convenção Internacional para a Proteção de Todas as Pessoas Contra o
Desaparecimento Forçado218DVVLQDGDSHOR%UDVLOHPVyHQWUD
H YLJRU DSyV D  YLJpVLPD  UDWL¿FDomR (P  D 2($ DSURYD D &RQYHQomR
,QWHUDPHULFDQD VREUH R 'HVDSDUHFLPHQWR )RUoDGR DUW ;; H ;;, VREUH VXD
vigência).

120
REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR

competência, juiz natural, lugar do crime, local da residência da vítima,


quanto à matéria, ou referente à garantia de foro, por prerrogativa de
IXQomR ,³F´&) 

'HRXWURODGRVXVFLWDUDR6XSHULRU7ULEXQDO)HGHUDO±67-LQFLGHQWH
de deslocamento da Justiça Estadual para a Justiça Federal não assiste
razão;RGLVSRVWRQR†žGRDUW&)(&QmRpUHVWULWLYR
gera diversos entendimentos ou interpretação extensiva, proibida no
direito penal democrático. Em matéria de Direitos Humanos sempre
haverá repercussão.

Tanto a Justiça Estadual como a Federal s.m.j. são incompetentes para


julgar crimes contra os Direitos Humanos, propriamente ditos.

Não há jurisdição no sistema brasileiro nessa matéria, em regra,


DV YLRODo}HV GH 'LUHLWRV +XPDQRV VmR DSUHFLDGDV SHODV &RUWHV
internacionais, tendo o Estado como agente ativo, na qualidade de
pessoa jurídica de direito público internacional.

A jurisdição nacional, QRV WHUPRV GD /HL Qž  GHFLGH VREUH
o (des)cumprimento de garantias fundamentais constantes na Carta
0DJQD DUWž&) SRUPHLRGH5HFXUVR([WUDRUGLQiULR DUW
&33FFDUW,,,&) FXMDFRPSHWrQFLDpGR6XSUHPR7ULEXQDO
)HGHUDO±67)EHPFRPRDKLSyWHVHGHFRQWUDULDUWUDWDGRRXQHJDU
VXD YLJrQFLD DUW  ,,, &)  YLD 5HFXUVR (VSHFLDO LQWHUSRVWR
QR 6XSHULRU 7ULEXQDO GH -XVWLoD ± 67- VmR FDVRV HVSHFt¿FRV RX
individuais, em defesa da tutela efetiva que deve ser assegurada em
nome da pessoa natural (do investigado, processado ou condenado
pela justiça penal). Não sendo aceitos os recursos mencionados,
cabe o caso ser levado à julgamento nas Cortes internacionais de

121
CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

Direitos Humanos, da ONU e OEA, onde a decisão poderá ser contra


o Estado brasileiro, ou seja contra a pessoa jurídica de direito público
internacional, e não contra pessoa física.

A proteção dos Direitos Humanos se intercala e se subdivide entre a


jurisdição internacional e a jurisdição nacional, ora se dá o julgamento
da pessoa jurídica (do Estado), noutra se dá o restabelecimento das
garantias fundamentais da cidadania (da pessoa física), violada por
abuso de autoridade em desrespeito ao devido processo legal.

Com excepcionalidade a Convenção para prevenção e a repressão do


crime de genocídio 218 SURPXOJDGDSHORJRYHUQREUDVLOHLUR
'HF H/HLQžTXHGH¿QHRFULPHGHJHQRFtGLR
DMXULVGLomRHUHFRQKHFLPHQWRGHFRPSHWrQFLD DUWž GH7ULEXQDORX
juízo nacional, ou Tribunal Internacional para julgamento desse tipo
de ilícito de lesa humanidade18. Sendo competente a Justiça Federal,
em face do interesse da União na matéria, para julgamento de pessoa
física, e não do Estado.
18
Resta expresso no DUWLJRžGD&RQYHQomR e da Lei que não se considera o crime
GH JHQRFtGLR FRPR GHOLWR SROtWLFR SDUD ¿QV GH H[WUDGLomR 2 artigo 9º refere-se
sobre a controvérsia sobre termo ou conceituação, que poderá ser dirimida pela
&RUWH,QWHUQDFLRQDOGH-XVWLoDGDV1Do}HV8QLGDVTXDQWRDWLSLFLGDGHGRORHWF
E no DUWLJR  FRQVWD VREUH D YDOLGDGH WHPSRUDO ± ratione tempore ± SRU QmR VH
trata de norma imediatamente aplicável - self executingGHREULJDomRGLUHWD±vis
à vis±(VWDGRLQGLYLGXR(VWDGRD&RQYHQomRSDVVRXDYLJRUDUHPDQRV
DSyV VHX GHSyVLWR MXQWR DR 6HFUHWDULR *HUDO GDV 1Do}HV 8QLGDV IHLWR HP 
VHQGR VXFHVVLYDPHQWH UHYLJRUDGD GH  HP  DQRV LVWR VH TXDOTXHU  (VWDGRSDUWH
não apresentar denúncia, rescindindo o compromisso internacional. Podendo haver
reservaPRGL¿FDQGRRXH[FOXLQGRPDWpULDXQLODWHUDOPHQWHGHSDUWHGRFRQWH~GR
do Tratado (leia-se Convenção), desde que a reserva não seja incompatível com
o objetivo do Tratado (cláusula de proibição de reserva); ou ainda declaração
interpretativaTXDQGRQmRPRGL¿FDFRQWH~GRGHGLVSRVLWLYRPDVLQWHUSUHWDGDGH
outra ou de certa maneira.

122
REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR

$VGXDVSURWHo}HVGRV'LUHLWRV+XPDQRVVHEDVHLDPQRSULQFtSLRnom
bis in idem, quanto à proibição de duplo processamento pelo mesmo
fato contra a mesma pessoa. Assim vejamos:

a) Crimes contra os Direitos Humanos são cometidos


pelo Estado, por intermédio de seus agentes e não por
civis. Exceto os crimes de competência do Tribunal Penal
Internacional (TPI), onde o Estado, ao reconhecer a
jurisdição internacional, reduz sua soberania, autorizando o
processamento e julgamento de seus cidadãos.

Ex.: os instrumentos de Direitos Humanos (tratados,


SDFWRV FRQYHQo}HV  QmR GH¿QHP WD[DWLYDPHQWH R WLSR
SHQDOQHPSUHYHHPVDQo}HVSRUTXHVHSUHVWDPDGH¿QLUH
conceitualizar de um modo geral a abrangência de proteção
a toda comunidade internacional (ex. Tortura);

b) A proteção interna dos Direitos Humanos diz respeito a


processamento e julgamento de pessoas físicas, quanto aos
FULPHV GH¿QLGRV HP OHLV SHQDLV GRPpVWLFDV FyGLJR SHQDO
normas extravagantes), sempre respeitando o devido processo
legal, ou seja, a competência, juízo imparcial e natural, bem
como a ampla defesa e o contraditório, de acordo com o
sistema acusatório democrático.

A legislação doméstica, por exemplo, tutela a vida e garante


a segurança privada, em combate aos crimes de homicídio
e contra o patrimônio; já os Direitos Humanos protegem a
inviolabilidade da vida, no sentido de proibir a pena de morte
e todas as espécies de abuso de poder, caracterizado com o

123
CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

desrespeito às garantias constitucionais, que por sua vez, no


direito interno, ocasionam nulidades processuais.

$ /HL Qž  TXDQGR QR LQFLVR ,, GR DUWLJR ž
expressa crimes relativos aos Direitos Humanos, na verdade,
refere-se aos crimes comuns previstos na legislação penal
GRPpVWLFD1HVWHSRQWRFLWRD/HLQž FULPHVGH
WRUWXUD  GR PHVPR PRGR D /HL Qž  9LROrQFLD
'RPpVWLFD ± ³0DULD GD 3HQKD´  TXDQWR DR GLVSRVWR QR
DUWLJR ž 7RGR DWR GH YLROrQFLD SUDWLFDGR SRU FLYLO FRQWUD
a pessoa diz respeito a proteção da inviolabilidade da vida,
da sua integridade física e moral, reprimidos pelas próprias
leis penais internas, nada tem haver com o conceito stricto
sensu de crimes de Direitos Humanos, julgados pelas Cortes
internacionais.

c) A proteção internacional dos Direitos Humanos refere-


se ao processamento e julgamento do Estado, por Cortes de
Direitos Humanos, aceitas e reconhecidas pelos governos;
QRFDVREUDVLOHLURRV7ULEXQDLVGDV1Do}HV8QLGDV 218 H
da Organização dos Estados Americanos (OEA).

O direito penal (interno) é instrumento de proteção dos Direitos


+XPDQRV DWUDYpV GD GH¿QLomR GH FULPHV H VDQo}HV 7UDWDVH GH
compromisso de cada Estado com a comunidade internacional, na
tutela da vida, da integridade física, saúde, moral e patrimônio das
pessoas, tudo em respeito à dignidade humana19.

19
LUISI L. Direitos Humanos±5HSHUFXVV}HV3HQDLV'RXWULQDV(VVHQFLDLV
'LUHLWRV+XPDQRV9RO,(G576mR3DXORSHVJWV

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REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR

6mR RV DWRV GR (VWDGR DWUDYpV GH VXDV DXWRULGDGHV FRP YLRODo}HV
às garantias processuais (direito processual penal interno) que
caracterizam os crimes contra os Direitos Humanos, como a falta
de asseguramento constitucional com a ampla defesa e contraditório,
direito do réu ao silêncio, juiz natural e imparcial. Tudo que ofenda
o devido processo legal pode ser crime contra os Direitos Humanos;
e também nulidades processuais internas, em que qualquer abuso
GHYHUiVHULQGHQL]DGRSHOR3RGHU3~EOLFR LQF/;;9DUWž&) 
por determinação das Cortes internacionais de Direitos Humanos,
como também o Poder Judiciário nacional, que não excluirá lesão ou
ameaça a direito (inc. ;;;9DUWž&) 

(DLQGDRVFULPHVGHUHVSRQVDELOLGDGHGH¿QLGRVQD/HLQž
não se aplicam aos atos cometidos contra os Direitos Humanos.

9 TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL (TPI)

O Tribunal Penal Internacional (TPI) foi criado pelo Estatuto de Roma,


HPFRPDFHLWDomRSHORJRYHUQRIHGHUDOEUDVLOHLURDWUDYpV
GR 'HF Qž  DEULQGR SDUWH GH VXD VREHUDQLD HVWDWDO SDUD
admitir e reconhecer a jurisdição do Tribunal que a competência de
MXOJDPHQWR DUWžXVTXHž SDUDRVFULPHVGHJHQRFtGLR TXDOTXHU
ato de destruição de grupo nacional, étnico, racial ou religioso); crimes
contra a humanidade (homicídio, extermínio, escravidão, deportação
RXWUDQVIHUrQFLDIRUoDGDGHSRSXODo}HVHQFDUFHUDPHQWRHPYLRODomR
às normas fundamentais do direito internacional); crime de tortura;
FULPHVGHJXHUUD YLRODo}HVjV&RQYHQo}HVGH*HQHEUDGH H
os crimes de agressão.

125
CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

A entrada em vigor do Estatuto do Tribunal Penal Internacional ocorre


DSyVRVH[DJpVLPRGLDGDUDWL¿FDomRDFHLWDomRDSURYDomRRXDGHVmR
SHOR(VWDGRSDUWH DUW 

9.1 Extradição para julgamento de crimes ou motivações políticas

A Carta Magna não permite extradição, de nacionais e de estrangeiros,


SRUFULPHVRXPRWLYDo}HVSROtWLFDV DUWž/,&) DVVLPDV&RUWHV
internacionais não poderão julgar, sem a presença do(s) réu(s), se não
ocorrer a extradição; também não existem juízos e tribunais no Brasil
com competência para o julgamento de crimes contra os Direitos
Humanos ou contra a humanidade.

O julgamento pelo Supremo Tribunal Federal por crime político em


JUDXGHUHFXUVRRUGLQiULRHVWiSUHYLVWR $UW,,³E´&) 

9.2 Tribunal Militar de Nuremberg

Também denominado Tribunal Militar Internacional (TMI), o Tribunal


0LOLWDU GH 1XUHPEHUJ VXUJH GH XP $FRUGR ¿UPDGR HP DJRVWR GH
 &DUWDGH/RQGUHV SRUUHSUHVHQWDQWHVGD*Um%UDWDQKD)UDQoD
Estado Unidos da América e antiga U.R.S.S, com competência para
julgamentos dos crimes de guerra (Segunda Guerra Mundial), em
TXH R SULPHLUR   SURFHVVR VH GHX FRQWUD  PpGLFRV DFXVDGRV GH
envolvimento em experimentos humanos nazistas. O processo iniciou
HPHWHUPLQRXHP

Para muitos especialistas, trata-se de uma justiça imperfeita


organizada pelos vencedores da Grande Guerra, com escolha dos
juízes, dos casos e dos acusados. Note-se que a Declaração Universal

126
REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR

GRV'LUHLWRV+XPDQRVIRLDSURYDGDSHODV1Do}HV8QLGDVHP
em que prevê princípios e garantias penais quanto a procedimentos,
HVSpFLHVHOLPLWDo}HVGHVDQo}HV

Não se pode confundir o Tribunal Militar de Nuremberg com a


&RUWHGH+DLDRX7ULEXQDO,QWHUQDFLRQDOGH-XVWLoD±SULQFLSDOyUJmR
MXGLFLiULRGDV1Do}HV8QLGDVHVWDHQFRQWUDVHVHGLDGDQD+RODQGDMi
o TMI possui sua sede na cidade de Nuremberg, na Alemanha.

10 CONCLUSÃO

Novos postulados ante à modernidade e aos princípios do devido


processo legal e da dignidade da pessoa humana, em defesa das vítima
de abuso de autoridade ou de poder21 .

A atividade castrense na égide do regime democrático precisa ser


UHIRUPDGDHDGDSWDGDSDUDDVPDLVQREUHVIXQo}HVGDV)RUoDV$UPDGDV
com utilidade real e prática para a solução, prevenção e repressão da
criminalidade moderna, em apoio direto ao sistema de administração
de Justiça Penal, conferindo aos seus integrantes prestígio social
interno e na comunidade internacional.

A doutrina latino-americana outorga muito pouca importância ao


direito penal militar, devendo ser prestada maior atenção na elaboração
legislativa e na aplicação prática da Justiça Castrense, no sentido de
harmonizar e integrar os princípios constitucionais e jus humanitários
com o direto penal ordinário em garantia dos Direitos Humanos. Diz

Convenção sobre a imprescritibilidade dos crimes de guerra e dos crimes contra
DKXPDQLGDGH 218 
21
'HFODUDomRGH3ULQFtSLRV%iVLFRVGH-XVWLoDSDUDDV9tWLPDVGH&ULPHHGH$EXVR
GH3RGHU 218 

127
CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

o mestre Raúl Zaffaroni, que é preciso estabelecer cátedras de direito


penal militar nos cursos de graduação e de pós-graduação em direito22.

$PRUSHOR%UDVLOHSHOD1DomREUDVLOHLUDQmRVHWUDGX]HPUHWDOLDo}HV
ou em vinganças da opinião pública; o direito penal moderno e
democrático caminha para o futuro e não ao passado, este, na linha
da Justiça Retributiva, e aquele, da Justiça Restaurativa, na estrita
forma da lei, da Constituição e dos Direitos Humanos, para a solução
FRQÀLWLYDVRFLDOLQFHQWLYDGDSHODUHFLSURFLGDGHGHUHVSRQVDELOLGDGHV
Não se trata de impunidade, mas de legalidade interna e internacional.

11 REFERÊNCIAS

MAIA NETO, C. F. Código de Direitos Humanos para a Justiça


Criminal brasileira5LRGH-DQHLUR(GLWRUD)RUHQVH

MAIA NETO, C. F. Promotor de Justiça e Direitos Humanos


HG&XULWLED-XUXi

MAIA NETO, C. F. Bases democráticas e direitos humanos


aplicados na reforma do Código Penal brasileiro. Trabalho
em Contribuição a Comissão de Juristas. - Direito & Justiça.
RHVWDGRGRSDUDQiFRPEU

MAIA NETO, C. F. Direitos humanos individuais fundamentais no


processo penal democrático: blindagem das garantias constitucionais
ou vítimas do crime de abuso de poder. Revista Jurídica da
UNISEP ±)DFXOGDGHGH'LUHLWRGD8QLmRGH(QVLQRGR6XGRHVWHGR
3DUDQiSJYRO$JR'H]

22
 6LVWHPDV 3HQDOHV \ 'HUHFKRV +XPDQRV HG 'HSDOPD %XHQRV $LUHV 
Informe Final do Instituto Interamericano de Derechos Humanos.

Beristain, Antonio “Nova Criminologia à luz do direito penal e da vitimologia”,
HG 81%  %UDVtOLD') REUD RULJLQDO HG 7LUDQW /LEURV 9DOHQFLD(VSDQKD
7UDGXomRDRSRUWXJXrVSRUMAIA NETO, Cândido Furtado.

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REVISTA DO MINISTÉRIO PÚBLICO MILITAR

MAIA NETO, C. F. Inconstitucionalidade da execução da pena


GHSULVmRDEXVRGHDXWRULGDGHHÀDJUDQWHYLRODomRDRVGLUHLWRV
humanos (revisado). RT, Revista dos Tribunais3XEOLFDomR2¿FLDO
GRV7ULEXQDLVGH-XVWLoD$QRQ6HWHPEURGH6mR
Paulo-SP.

LUISI, L. Direitos Humanos±5HSHUFXVV}HV3HQDLV'RXWULQDV


Essenciais Direitos Humanos.9RO,6mR3DXOR(G57S
HVJWV

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CÂNDIDO FURTADO MAIA NETO

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