Na límpida Ria Formosa existia uma das maiores colónias de cavalos-marinhos do
mundo. Aí vivia um tímido mas veloz cavalo-marinho chamado Marine, de cor dourada e olhos grandes e redondos. Infelizmente estavam todos em risco, pois lá caçavam cavalos-marinhos para vender na Ásia. Marine tinha um passado triste: quando nasceu o pai foi raptado subitamente. Um dia, a mãe foi buscar algas e uma grande rede caiu sobre ela, arrastando todos os cavalos-marinhos! Eles bem tentaram agarrar-se às algas com as caudas, mas a rede acabou por levá-las. Marine, que era magrinho, conseguiu escapar por um buraco, mas foi horrível ver a mãe e os amigos a desaparecer no oceano. Ao tentar segui-los, passou por coisas assustadoras: primeiro ficou preso num saco de plástico, depois viu um peixe sufocado por um abre-latas e por fim um pé gigante quase o pisou. Aflito, foi esconder-se entre as algas devastadas. Quando achava que o dono do pé já se tinha ido embora, saiu, mas chocou contra dois pés. O pobre cavalo-marinho fingiu-se de morto, a desmaiar de susto, mas o gigante continuou de olhos fixos nele. Foi então que falou: — Olá, que fazes aqui sozinho? Marine, a tremer de medo, balbuciou qualquer coisa. O rapaz pediu que ficasse ali à espera, que já voltava. Marine não mexeu sequer um músculo, espantado com este humano que conseguia percebê-lo. O rapaz voltou com um balde, encheu-o de água, pegou em Marine e pousou-o lá dentro devagarinho. Sem dizer nada, levou-o para casa e tentou descansar, mas teve um pesadelo horrível: a mãe tinha sido arrastada por uma onda enorme! De repente o pai bateu à porta: — Salvador, não te esqueças do trabalho para o JRA! — O que é um JRA? — perguntou Marine. Ainda sem se ter habituado a falar com um cavalo-marinho, explicou-lhe que eram os Jovens Repórteres para o Ambiente, com quem tinha aprendido que os animais também têm direitos. Marine percebeu que nem todos os humanos são iguais e disse-lhe baixinho: — Olha, tu pareces um miúdo simpático! Podes ajudar-me com um assunto muito importante? O Salvador perguntou, espantado: — Que assunto? Marine contou-lhe e o rapaz, comovido, foi logo pedir ajuda: — Pai, podes ajudar-me a resolver um problema? — Pareces preocupado, o problema é assim tão difícil? — desconfiou o pai. O Salvador pegou-lhe na mão e levou-o até ao quarto, onde lhe mostrou o balde com Marine todo encolhido. — Tás zangado? — gaguejou. — Filho — disse o pai muito calmo —, quando era pequeno queria ser pescador e apanhei um peixinho. Fui mostrá-lo ao meu pai e ele ficou tão orgulhoso que disse que ia fritá-lo, mas eu salvei-o, como tu queres salvar o cavalo-marinho! Vai pô-lo no rio. — Mas pai, ele fala! — Não!... — disse o pai. — O-olá! — balbuciou Marine, assustado. Com o susto, o pai quase virou o balde, mas o Salvador conseguiu segurá-lo e contou- lhe tudo. — Temos de agir depressa — disse o pai, já a correr para o barco, seguido pelo filho, com Marine. Sabia onde achar os cavalos-marinhos, pois desconfiava de um pescador que tinha ouvido a marcar encontro numa cabana. Após muito remar, a ponto de já nem sentirem os braços, viram a cabana junto à costa. Saltaram para a margem e foram espreitar: os traficantes falavam do tanque de cavalos- marinhos no barco. O pai correu até ao barco e encontrou o tanque! Salvador pegou no cavalo-marinho e colocou-o lá dentro. — Mãe! Amigos! Estão todos aqui! — descobriu Marine. — M-marine!? — gaguejou a Sra. Cauda, aliviada. — Mãe, nem todos os humanos são maus! Foi graças a eles que vos encontrei! Enquanto abraçava a família, muito feliz, o Salvador e o pai ligaram o motor e desviaram o barco para a ria. Ao chegar à colónia, o cavalo-marinho agradeceu, emocionado: — Obrigado por nos teres salvo a vida! — Sempre às ordens! — disse o Salvador. — Marine, anda lá! — chamou a mãe. — Bem, parece que tenho de ir... — Marine mergulhou a abanar a cauda, imitando o aceno dos amigos. E os traficantes? O pai denunciou-os e foram todos presos até decidirem mudar de vida.