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Edna Castro

EXPANSÃO DA FRONTEIRA, MEGAPROJETOS DE


INFRAESTRUTURA E INTEGRAÇÃO SUL-AMERICANA

DOSSIÊ
Edna Castro*

As análises da relação entre políticas desenvolvimentistas e as dinâmicas socioterritoriais na


Amazônia têm se voltado para a dimensão nacional. Este artigo procura revelar o aumento do
interesse pela exploração dos recursos naturais da região para além de suas fronteiras políti-
cas, tornando-se a Pan-Amazônia um espaco central na geopolítica brasileira. Os Planos de
Aceleração do Crescimento (PAC I e II) e a Iniciativa para a Integração da Infraestrutura da
América do Sul (IIRSA) assumem a mesma orientação de integração competitiva, adotando
um modelo de modernização com base em megaprojetos de investimentos. A IIRSA, no âmbito
sul-americano, como bloco regional, e o PAC, em âmbito nacional, são programas voltados para
a logística de transporte, energia e comunicação. No plano continental, expressam dinâmicas
socioterritoriais irreverersíveis e representam interesses comuns do Brasil e dos demais paí-
ses, via modelo dominante de expansão da fronteira amazônica a partir dos anos 70 do século
XX.
Palavras-chave: fronteira, políticas estatais, integração, megaprojetos, Pan-Amazônia.

INTRODUÇÃO nova economia. Os Estados nacionais continuam


a ter papel importante na regulação social, política
As estratégias governamentais e empresa- e econômica, e permanecem protagonistas, mas sob
riais voltadas para a Amazônia, no Brasil, reve- uma lógica liberalizante do capital, tendo, inclusi-
lam o aumento do interesse pela exploração dos ve, sucumbido a certos acordos de agências regu-
recursos naturais da região para além de suas ladores internacionais e penalizado as relações de
fronteiras políticas. A Pan-Amazônia ocupa, as- trabalho, como se observa na atual crise dos paí-
sim, uma posição central na geopolítica brasilei- ses da Comunidade Econômica Europeia (CEE).
Nesse quadro da economia mundial, a competição

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ra. Por outro lado, os Estados nacionais vizinhos
na região amazônica também se movimentam eco- intercorporações e inter-redes tende a intensificar-
nomicamente na expansão da fronteira, que é con- se. Empresas impulsionadas pela concorrência
cebida como um espaço estratégico e um campo procuram continuamente reestruturar-se, buscan-
aberto à produção de commodities com a vanta- do formas de reduzir custos e visando demandas
gem competitiva de facilidade de escoamento para futuras (Castro, 2004). A articulação de grandes
o mercado mundial. empresas industriais e financeiras que funcionam
Empresas transnacionais e organismos em rede resulta também da unificação, nos países
multilaterais, como atores globais, têm pressio- mais avançados, dos mercados financeiro, cambi-
nado a esfera política para modificar dispositi- al, de títulos e valores (Chesnais, 1996).
vos legais e instituições a fim de adequá-los à Neste artigo, procuramos demonstrar a as-
sociação entre as políticas nacionais brasileiras e
* Doutora em Sociologia. Professora da Universidade Fede- os projetos de intervenção da Iniciativa para a
ral do Pará (UFPA). Coordenadora do Grupo de Pesquisa
Trabalho, Empresas e Transformações Sociais, do Diretório Integração da Infraestrutura da América do Sul
do CNPq.
Campus da UFPA. Av. Augusto Correa, n.01. Guamá. Cep: (IIRSA). Os Planos de Aceleração do Crescimento
66075-090. Belém - Pará - Brasil. edna.mrcastro@gmail.com (PAC I e II) e a IIRSA assumem a mesma orienta-

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ção de integração competitiva, adotando um mo- Integração (ALADI) a partir de negociações entre o
delo de modernização com base em megaprojetos Brasil e a Argentina, o Mercosul nasce com o mes-
de investimentos. Ambos estão articulados pela mo objetivo de integração de mercados, “enqua-
concepção de eixos de integração e desenvolvimen- drado na concepção do Consenso de Washington
to. A IIRSA, no âmbito sul-americano, como bloco do livre comércio como instrumento único e sufi-
regional, e o PAC, em âmbito nacional, são progra- ciente para a promoção do desenvolvimento, re-
mas voltados para a logística de transporte, energia e dução das desigualdades sociais e geração de em-
comunicação. No plano continental, essa logística pregos, na melhor tradição das Escolas de
representa interesses comuns do Brasil e dos demais Manchester e de Chicago” (Guimarães, 2008, p.32).
países nos projetos de infraestrutura. Ela reedita o Em 1994, os Estados Unidos lançaram, no contex-
modelo de desenvolvimento que orientou a expan- to da Cúpula das Américas, o projeto de uma Área
são da fronteira amazônica a partir dos anos 70 do de Livre Comércio das Américas (ALCA), apos-
século XX e provocou conflitos socioterritoriais que tando no livre comércio, que se “configuraria como
envolveram diferentes atores locais e intensificaram um processo unificador do território formado por
a exploração de recursos naturais e o desmatamento. todos os países sul-americanos, seguindo orienta-
A tendência observada na pesquisa em curso1 é a ções do Fundo Monetário Internacional (FMI) e da
irreversibilidade dessas dinâmicas, pois a Pan-Ama- Organização Mundial do Comércio (OMC)” (2008,
zônia tornou-se um grande palco de ações governa- p.36).
mentais e empresariais, é entendida como central não Na Primeira Cúpula dos Presidentes da
apenas para o Brasil, mas também para a América do América do Sul, realizada em 1999, foi assinado
Sul. Populações locais, com suas práticas sociais e um protocolo de intenções e de cooperação entre
saberes relativos ao território, têm produzido leituras 12 países pan-americanos, institucionalizando a
desse processo, a partir de movimentos sociais e ét- IIRSA, que pretendia traçar novas bases para uma
nicos que revelam novos processos de dominação regionalização no continente. Em setembro de
incorporados ao modo de implantação dos projetos 2000, em Brasília, doze presidentes dos Estados
de infraestrutura e às práticas de agentes que violam nacionais da América do Sul consolidaram a IIRSA
direitos sociais e étnicos, como o resultado da e reconheceram, como questão principal para
desterritorialização que atinge grupos de população direcionar investimentos, a infraestrutura física
tradicional, na extensão pan-amazônica. instalada na região, pois sua fragmentação im-
pedia o crescimento do mercado interno sul-
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americano e a abertura de novos mercados. Em


IIRSA, ANTECEDENTES E RELAÇÃO COM julho de 2002, a Cúpula de Estados reúne-se em
OS EIXOS DE DESENVOLVIMENTO DO Guayaquil (Equador) para decidir sobre o proje-
PLANEJAMENTO BRASILEIRO to de infraestrutura. Em dezembro de 2004, a
IIRSA é finalmente aprovada na cidade de Cuzco,
A Associação Latino-Americana de Livre no Peru, como estratégia principal de investi-
Comércio, criada em 1960, já visava a eliminar mentos. Outras organizações têm-se associado
as barreiras ao comércio entre os Estados, mas nesse processo de formulação de novas diretri-
não conseguiu impor-se. Em 1969, os países cri- zes geopolíticas, do espaço andino ao amazôni-
aram o Pacto Andino, fundado em um modelo co. Para os governos sul-americanos, a IIRSA re-
de planejamento do desenvolvimento com alocação presenta, para seus países, a possibilidade de tor-
de investimentos. Retomando princípios presen- narem-se mais competitivos no mercado inter-
tes na matriz da Associação Latino-Americana de nacional e, dessa forma, usufruírem de condi-
ções vantajosas no processo de globalização. Tal
1
Pesquisa do CNPq, bolsa de produtividade. perspectiva também constitui um dos fundamen-

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tos da política internacional do governo brasilei- no. Não se trata apenas de discursos diplomáti-
ro presente na proposta do Plano Plurianual 2004- cos, mas de ações concretas efetivadas por meio
2007. Em ambos os casos, trata-se da integração de novas regulamentações e acordos de coopera-
sul-americana a partir de sua integração física. ção que apontam na direção de financiamentos e
O conceito de integração, nessa perspec- projetos de infraestrutura e permitam uma ligação
tiva, pressupõe necessariamente ações estatais, multimodal entre os países. Observa-se a busca de
uma esfera supranacional. Não são menciona- eficácia simbólica atribuida às novas estruturas de
dos nem valorizados os processos de integração poder, que estão associadas, em última análise, a
existentes há séculos nas fronteiras, marcados estratégias do campo político (Bourdieu, 1989). O
por populações que ali vivem e têm suas práti- Brasil, por intermédio de suas instituições, como o
cas ancoradas em uma dada ordem social e eco- Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
nômica. As esferas supranacionais que conce- Social (BNDES), tornou-se um financiador de pro-
bem a IIRSA consideram-na como uma jetos em inúmeros fronteiras nacionais de países
da IIRSA.
estrutura sistêmica e de integração, cuja logística
tem por base o desenvolvimento da telecomuni-
cação, do transporte e de energia, a fim de criar as
condições para a sua integração econômica, polí- A “visão estratégica” do planejamento nacio-
tica, social, cultural (IIRSA, 2004, p.7; 2011, p.23).
nal e a concepção do PAC I e II

A integração da América do Sul constitui


O conceito de território foi retomado pela
um dos objetivos principais das estratégias polí-
área do planejamento no final dos anos 90 do
ticas e econômicas dos governos sul-americanos,
século XX, como possibilidade de inovação nas
estando no centro da política externa brasileira.
formas de intervenção pública, associada à no-
A noção de Eixos Nacionais de Integração cons-
ção de participação. O Ministério do Planejamen-
tituiu a estratégia maior para estreitar as rela-
to, Orçamento e Gestão, em documento
ções com os países da América do Sul, na gran-
intitulado Estudo da dimensão territorial para o
de fronteira política, conformando um bloco eco-
planejamento (volume I: Sumário Executivo) (Bra-
nômico com maior poder de fogo, dada a orga-
sil. Ministério do Planejamento, 2008a), informa a
nização em curso de outros nichos de mercado,
metodologia adotada, bem como justifica o uso da
nos diferentes continentes. Certamente, a
noção de território e de controle territorial, o que

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integração geográfica por meio da construção de
seria essencial para obter resultados nas estratégi-
vias de comunicação terrestres seria o primeiro
as de desenvolvimento nacional, em situação de
passo desse processo., pois, como analisa Gui-
alta concorrência e de economia fortemente
marães (2008, p.9), a
globalizada e competitiva. Essa noção foi redefinida
a partir de mudanças na produção capitalista que
política externa não poderá ser eficaz se não esti-
ver ancorada na política brasileira na América tenderam a comprimir espaço e tempo (Harvey,
do Sul. As características da situação geopolítica 1998 p.79) e funcionar sob uma lógica de
do Brasil, isto é, seu território, sua localização
geográfica, sua população, suas fronteiras, sua deslocalização. O território é importante, porém
economia, assim como a conjuntura e a estrutu- dentro de outra configuração, na qual o espaço é
ra do sistema mundial, tornam a prioridade sul-
desconectado de valores, lugares, tradições e pas-
americana uma realidade essencial.
sa a ser regido por relações econômicas e políticas,
Por outro lado, o governo brasileiro tem de- protagonizadas sobretudo por agentes do merca-
fendido seu projeto desenvolvimentista e testado, do. Por isso, o rompimento com as raízes, com as
nas relações internacionais, sua capacidade de heranças culturais e com as territorialidades passa
negociar novos mercados no espaço sul-america- a constituir um desafio para empresas, corporações

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e mesmo para o Estado, em suas políticas que fa- entar a intervenção na economia e no território.
vorecem o mercado, contrariando interesses lo- Ao PAC I estão associados: a Política de Desenvol-
cais que funcionam com base em uma outra con- vimento Produtivo (PDP), a Política Nacional de
cepção de tempo e espaço, ancorada no mundo da Logística e Transporte (PNLT), a Política Nacional
vida, na cultura, e, portanto, não mediatizada pelo de Transporte Hidroviário (PNTH), o Plano Naci-
mercado. A noção de território adotada pelas polí- onal de Viação, o Plano Nacional de Energia 2030
ticas governamentais contraria a noção de territó- e a Matriz Energética Nacional 2030, a Política Na-
rio e de territorialidade dos grupos que vivem na cional de Aviação Civil (PNAC), o Plano
Amazônia, regidos por outra ordem social de tem- Hidroviário Estratégico, o Plano Nacional de Mi-
po e espaço. Para esses grupos, o território é um neração e o Plano de Ordenamento Territorial. To-
“espaço sobre o qual um certo grupo garante aos dos esses dispositivos vinculam-se aos mesmos
seus membros direitos estáveis de acesso, de uso eixos de desenvolvimento e à mesma visão estra-
e de controle sobre os recursos e sua disponibili- tégica, unindo macropolíticas a políticas setoriais,
dade no tempo.” (Castro, 1997, p.105). regionais e territoriais.
Os Eixos Nacionais de Integração e Desen- O PAC constitui, assim, uma macropolítica
volvimento constituíram a matriz do planejamen- de crescimento econômico, uma estratégia do
to e da intervenção dos últimos governos brasilei- Estado e dos setores econômicos. A estrutura do
ros e pressupõem uma visão geográfica de domí- PAC I (2007-2010) dividia-se em três eixos:
nio e controle dos territórios. Os Eixos estão pre- Logística, Energética e Social e Urbana. No PAC
sentes no Plano Brasil em Ação (1996-1999), no 2, são seis eixos: PAC Cidade Melhor (enfrentar
Avança Brasil (2000-2003) e igualmente nos Pla- os principais desafios das grandes aglomerações
nos Plurianuais de 1996-1999, 2000-2003 e 2004- urbanas, propiciando melhor qualidade de vida);
2007, que revelam as prioridades espaciais do Es- PAC Comunidade Cidadã (garantir a presença
tado.2 A partir de 2007, o planejamento federal do Estado nos bairros populares, aumentando a
passa a adotar uma visão de futuro denominada cobertura de serviços); PAC Minha Casa, Minha
visão estratégica nacional, que pretende tornar-se Vida (reduzir o déficit habitacional, dinamizan-
uma premissa balisadora, orientar os investimen- do o setor de construção civil e gerando traba-
tos estratégicos e projetar metas para o desenvolvi- lho e renda); PAC Água e Luz para Todos
mento a médio e longo prazos (Brasil.Ministério (universalizar o acesso à água e à energia elétri-
do Planejamento, 2008b). Essa visão estratégica ca); PAC Transportes (consolidar e ampliar a rede
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nacional recobre programas, políticas e projetos logística, interligando os diversos modais, garan-
que o Estado considera importantes para o desen- tindo qualidade e segurança); PAC Energia (ga-
volvimento econômico do país. Assim, o Progra- rantir a segurança do suprimento a partir de uma
ma de Aceleração do Crescimento (PAC I), lança- matriz energética e desenvolver as descobertas
do em 2007, prossegue o alinhamento da política no Pré-Sal) (Brasil, 2011, p.31).
econômica. Para sua consecução, os instrumentos Uma primeira observação é que o PAC
normativos e as prioridades deveriam, em princí- orienta um modelo de crescimento econômico,
pio, estar articulados e adaptados de forma a ori- e não somente um plano de desenvolvimento
stricto sensu. Ora, trata-se de um modelo há déca-
2
Os Eixos seguem um perfil de intervenção consagrado em das criticado pelo seu reducionismo e pela sua ine-
décadas anteriores por meio dos polos de desenvolvimen-
to, de regionalização ou dos grandes projetos geopoli- ficácia social e ambiental. Ele retoma a experiência
ticamente referenciados. Os Eixos previstos para o Plano
2004-2007 consideraram quatro variáveis e seus indicado- do planejamento da década de 70 para a Amazô-
res; até aí, não há realmente muita diferença em relação ao nia e projeta, para essa região, uma modernização
planejamento estratégico dos anos 60 ou 70, como se pode
observar nos seguintes recursos de planejamento: rede com base na produção de commodities dos setores
multimodal de transportes, hierarquia funcional das cida-
des, identificação dos centros dinâmicos e dos ecossistemas. pecuária, madeira, grãos, minérios e energia.

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Efetivamente, os megaprojetos hidrelétri- este, do Oeste ao Sudeste, conferindo a fronteira e


cos, de transporte e comunicação formam a base as oportunidades de negócios. O Brasil faz fron-
dos investimentos do PAC I e II no Brasil, tanto teira geográfica com 11 países da América do Sul,
quanto os projetos do IIRSA na América do Sul. e mais de 2/3 dessa faixa de fronteira estão na re-
Essas estratégias baseiam-se no mercado global, gião amazônica. Trata-se de um olhar simplificador
nos padrões de competitividade e de produtivi- sobre o sentido das relações políticas entre países
dade que seguem lógicas econômicas e nos pro- com situações de fortes assimetrias. Justamente por
cessos de produção que obedecem a agendas de isso, é fundamental entender as injunções desse
diferentes empresas em redes de clientes, de for- processo, pois as políticas de integração revelam o
necedores ou consumidores. A questão em jogo poder de decisão do Brasil e o motivo de conten-
não é necessariamente o mercado nacional, em- das diplomáticas recentes entre os países. É uma
bora ele esteja potencialmente em expansão e postura defendida nos meios políticos, técnicos e
seja fundamental na regulação de custos, ultra- empresariais, que concebem o Brasil e seu futuro
passando inclusive o mercado representado pelo segundo uma visão estratégica e de dominação.
conjunto dos países da América do Sul. A mira Os projetos da IIRSA estruturam-se em
está nos países asiáticos, razão da insistência em Eixos de Integração. São, ao todo, 10 Eixos que
saídas pelo Pacífico e pelo Atlântico, para além recobrem o continente de norte a sul, de leste a
América do Sul. Esse mercado externo é alta- oeste. Três deles estão direcionados para a Pan-
mente competitivo e regula os tempos e usos do Amazôna e atendem ao interesse pelas vias de
território. Daí uma preocupação constante com transporte – estradas, ferrovias, rios – do Atlân-
os corredores de transporte, para reduzir os cus- tico ao Pacífico. Este artigo refere-se exclusiva-
tos e, consequentemente, aumentar a rentabili- mente a três eixos, os do norte-oeste.3 No eixo
dade e a competitividade nacional e global. do Amazonas (Brasil, Colômbia, Equador e Peru),
O avanço do grande capital nacional e in- encontram-se os projetos de duas hidrelétricas no
ternacional, representado pelas grandes empre- rio Madeira, no Brasil (Jirau e Santo Antônio), e,
sas apoiadas pelo PAC I e PAC II, busca acelerar na mesma bacia, estão previstas duas hidrelétricas
o crescimento da economia. Somente para o pe- na Bolívia e quatro no Peru, o que tem sido objeto
ríodo de 2007 a 2010, o PAC previa investimentos de contestação por parte de populações locais que
no montante de R$ 503,9 bilhões. Com essas obras, sentem seus direitos territoriais e identitários ame-
o Estado assegura a implantação de grandes gru- açados nos três países. O eixo Escudo Guianês,

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pos empresariais para os mesmos setores: minera- denominação dada à região formada pela parte ori-
ção, pecuária, exploração madeireira e agricultura ental da Venezuela, pelo extremo norte do Brasil
mecanizada. Todos eles são produtos de (estados de Amapá e Roraima), pelas Guianas e
commodities. pelo Suriname, elege cidades como referência na
logística de transporte e serviços: Manaus, Cara-
cas, Macapá, Georgetown, Paramaribo, Boa Vista,
Integração da América do Sul e da Pan-Ama- Caiena, Santa Elena de Uiarén, Ciudad Bolivar e
zônia Ciudad Guayana. O eixo Brasil, Peru e Bolívia, com
saída para o Pacífico, compreende uma enorme ex-
O Estado brasileiro está cada vez mais in- tensão territorial – sete departamentos da região
teressado nas fronteiras políticas. O pensamento
3
O objetivo principal dos projetos da IIRSA é interligar os
geopolítico brasileiro, cujas matrizes são encontra- sistemas modais desses países. Para o Brasil, estão
das no PAC I e II, considera a região amazônica projetadas inúmeras centrais de transporte, partindo dos
portos de Ilo e Matarani no Pacífico, por exemplo, mas
extraordinariamente rica em fronteiras e, num zoom também de Tumaco (na Colômbia), Esmeraldas (no Equa-
dor) e Paita (no Peru), que serão ligados aos portos brasi-
imaginário, percorre o olhar do Nordeste ao Noro- leiros de Manaus, Belém e Macapá.

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sul do Peru (Tacna, Moquegua, Arequipa, porte interno no país aos projetos na fronteira com
Apurimac, Cuzco, Puno e Madre de Deus), dois outros países. É o caso das rodovias que ligam
departamentos amazônicos da Bolívia (Pando e Rondônia e Acre à Bolívia e ao Peru, ligadas defi-
Beni) e quatro estados do Brasil (Acre, Rondônia, nitivamente ao sistema de transporte fluvial,
Amazonas e Mato Grosso) (BRASIL. Ministério do intermodal, do rio Amazonas/Solimões. É o caso
Planejamento, 2008a, p. 12)4 – e toma as vias de da ponte sobre o rio Oiapoque, ligando o Brasil à
transporte como estruturantes do território. Guiana Francesa e abrindo, a partir dela, outra sa-
Construídos na mesma perspectiva, os pro- ída para o Caribe. É ainda o caso da melhoria das
jetos do PAC e da IIRSA articulam-se e parecem estradas Manaus–Caracas (BR-432), Boa Vista–Santa
coordenados e complementares, como se observa Elena de Uiarém, também na fronteira com a
na consulta feita aos dados oficiais das instâncias Venezuela, e da rodovia Boa Vista–Bonfim–
sul-americanas de planejamento. As informações Lethem–Linden–Georgetown, na fronteira com a
contidas no Quadro 2 mostam uma coerência for- Guiana. Cabe ressaltar ainda que estão em curso
mal nos projetos nacionais e internacionais. os projetos de construção e de melhorias dos ter-
O PAC projetou a pavimentação das rodo- minais fluviais na Amazônia, que vinculam os
vias Transamazônica, Cuiabá–Santarém (BR-163) projetos do PAC aos do PNLT e aos da IIRSA.
e Porto Velho–Manaus (BR-394), que, aparentemen- Entende-se, nessa ótica, que se está diante de um
te, estão distantes da fronteira nacional, se consi- movimento ao mesmo tempo rápido e simultâneo,
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derada a dimensão geográfica. No entanto, a análi- em múltiplas direções, o que se configura em um


se de fluxos vincula esses grandes eixos de trans- novo espaço de fluxos.
4
As três principais saídas para o Pacífico apontadas nos
No Brasil, o conjunto de instrumentos que
projetos da IIRSA, que receberão investimentos seus ou compõem o sistema de planejamento tem reforçado
de governos nacionais, são: a) saída do Brasil pelo Peru–
Porto Velho até Cruzeiro do Sul e daí ao Peru; b) saída do projetos para os estados com grandes faixas de fron-
Brasil pelo Peru: corredor com o trajeto Porto Velho–Rio
Branco (BR-364); Assis Brasil (rodovia); Puerto teira – como Rondônia, Acre, Roraima e Amazonas
Maldonado–Juliaca–portos de Puno/Ilo ou Matarani); c) –, não apenas por razões de defesa territorial e segu-
saída do Brasil pela Bolívia: Porto Velho–Abunã–Guajará
Mirim (BR-364 e BR-317); Guayaramerín–Caracnavi–La Paz, rança, mas também por razões de ordem econômica.
de estrada; La Paz a Patacamaya–Tambo Quemado–portos
de Arica e Iquique. Amplia-se, assim, a intervenção do Estado e o

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ordenamento dos espaços amazônicos. Trata-se de faz presente estrategicamente com o peso do CADERNO CRH, Salvador, v. 25, n. 64, p. 45-61, Jan./Abr. 2012
um projeto, acima de tudo, de grandes impactos so- BNDES, que financia projetos nos diferentes países,
ciais e ambientais, por ser amplo, totalizante, e de empresas como a Petrobras e a Vale, que têm
hegemônico e autoritário. plantas de exploração de recursos naturais – minéri-
Por isso, o Programa de Aceleração do os, petróleo – em quase todos os países sul-america-
Crescimento, PAC I e II, precisa ser entendido nos. Instituições supranacionais também participam
na sua relação com o projeto de integração sul- do processo de mercantilização e financeirização da
americana. Ele tem a mesma matriz teórica e economia, no PAC I e II e na IIRSA. As seguintes
ideológica da IIRSA. Baseia-se, também, na mes- organizações também consideram a infraestrutura
ma matriz conceitual, por reproduzir a ideia de fundamental para o mercado: Banco Mundial (BM),
integração com os países vizinhos. Não é uma es- Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco
tratégia tão somente nacional, mas continental, Interamericano de Desenvolvimento (BID), Comis-
voltada para o mercado mundial, embora o papel são Europeia (CE), Organização de Cooperação e de
principal seja desempenhado pelo Brasil, que se Desenvolvimento Econômicos (OCDE), Comissão

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Econômica para a América Latina e o Caribe mia globalizada, o que produz, no mercado, um
(CEPAL), Organização Marítima Internacional efeito de estabilidade institucional, com concessi-
(IMO). Como mostram Boyer (2006, p.51-52) e onárias instaladas, mecanismos legais operativos
Chesnais (1996, p.80-86), essas instituições têm e expansão de mercado. Países imensos como o
dispositivos de regulação, acordos e convenções. Brasil, em todas suas regiões, são abastecidos com
um padrão de comércio relativamente compatível
com concorrentes instalados no parque automobi-
PAC E IRSA: o papel do transporte no espa- lístico brasileiro desde o século XX.
ço global de fluxos Assim, a logística de transporte passou a
ser integrada aos fluxos de produção por meio
As mudanças verificadas na economia de modelos sofisticados de aplicação just-in-time
mundial, com a reestruturação da produção e dos e de flexibilização de processos e produtos, com
meios de comércio e com a crescente base em sincronização de tempos entre portos
financeirização e globalização, alteraram o padrão internacionais, nacionais e regionais, indepen-
tecnológico e o de gestão, importantes para os dentemente de países e continentes, de distânci-
fluxos de mercadorias, de serviços e, sobretudo, as e produtos. Isso se tornou possível em função
de informações. Assim, inovações tecnológicas da reestruturação da gestão, com a redução do
adotadas pela engenharia naval foram significa- tempo de armazenamento de mercadorias, a ra-
tivas para alterar o porte e a capacidade dos na- pidez de fluxos, o direcionamento de fornece-
vios de longo curso, o perfil das grandes trans- dores e clientes (Harvey, 1998). Essa estrutura
portadores de contêineres e os processos de ges- ancora-se no sistema de informação que integra,
tão, reduzindo, portanto, o tempo de navegação em rede, tempos e processos diferentes, organi-
e ampliando o fluxo de negócios. Isso levou a zando o espaço global de fluxos de mercadorias
uma surpreendente dissociação do tempo e do e permitindo, dessa forma, a acumulação de ca-
espaço e, ao mesmo tempo, à compressão do pital por empresas parceiras no processo.
tempo e à relativização dos espaços de produ- Nos últimos anos, nas ações governamen-
ção, comércio e consumo. tais e nas estratégias empresariais, observa-se uma
Fluxos mais rápidos de transporte devido revalorização do transporte de cargas por via flu-
às tecnologias empregadas, menor tempo nos vial. Dá-se importância à logística de transporte,
portos, mais capacidade em volume de merca- adotando-se um novo modo de regulação de por-
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dorias e, consequentemente, o aumento do nú- tos e de controle das vias navegáveis. Alguns rios
mero de viagens levaram à redução dos custos passaram a ser valorizados, por estabelecerem uma
médios por tonelada transportada. Esse tipo de ligação entre oceanos, do Pacífico ao Atlântico e
transporte tem crescido no mundo e feito pres- ao Caribe. É o caso dos rios Huallaga, Marañón,
são para a liberação de impasses alfandegários, Ucayali e Amazonas no Peru, Putumayo e Napo
evidenciando processos de desregulamentação de no Equador, Putumayo na Colômbia e Iça,
dispositivos legais, encontrados em diversos pa- Solimões e Amazonas no Brasil, que abarcam
íses. Até o último quartel do século XX, não se- 6.000 km de vias navegáveis. Fala-se em moder-
ria economicamente viável, para o fluxo de acu- nização do transporte fluvial e aposta-se na com-
mulação, transportar quantidades imensas de pressão do tempo do transporte de cargas e na
mercadorias em fluxos contínuos. Hoje, produ- redução de custos, visando à competitividade da
tos da indústria automobilística, carros, trato- economia nacional.
res, peças de reposição circulam com regulari- A reestruturação produtiva e a flexibilização
dade da Coreia do Sul e da China para o porto de alteraram os fluxos de mercadorias, e houve tam-
Santos, e os fluxos funcionam no ritmo da econo- bém um aumento da produtividade, em decorrên-

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cia da melhoria de dispositivos organizacionais e territórios para onde se dirigem os investimentos:5


institucionais que permitiram a adoção de outro as fronteiras políticas do Brasil, nos estados mais
modo de regulação do trabalho e de apropriação de preservados, social e ambientalmente, da violência
qualidades da força de trabalho e da subjetividade dos processos ocorridos na Amazônia Oriental e
dos trabalhadores (Boyer, 2006), com base em um no Mato Grosso, dos anos 70 aos 90, sobretudo.
novo regime de acumulação. Com a globallização, a Identificamos, na Amazônia, 41 projetos voltados
economia de transporte é cada vez mais determina- para o setor transporte, dos quais 29 distribuídas
da por grandes empresas de armadores internacio- pelos seguintes estados: 15 obras no Pará, 10 no
nais. Esses armadores (megacarriers) dominam as Maranhão, 14 no Amazonas, 7 em Roraima, 11 em
rotas mundiais (Leste–Oeste e Norte–Sul). No Bra- Tocantins, 12 em Amapá, 14 em Acre e 17 em
sil, as megacarrriers têm o controle do transporte Rondônia (Brasil. 2011, p.37).
de longo curso. Elas participam de uma rota na Observam-se, ainda, corredores com
qual os armadores brasileiros funcionam conjun- conectividade de transporte, que são ligações
tamente com navios de bandeira estrangeira, aten- intermodais, como a integração da BR-319 à
dendo a um mercado crescente e com lucros extra- hidrovia do rio Amazonas (porto de Manaus), a
ordinários (Agência Nacional..., 2011a). integração da BR-163 à hidrovia do rio Amazo-
Ao estudar a reestruturação produtiva na nas e à hidrovia Teles–Pires, a integração da BR-
área portuária do Pará, Castro e Santos (2006, p.27) 230, Transamazônica, por meio da construção
mostram, para o caso de Belém, as dimensões con- de uma ponte sobre o rio Araguaia, a integração
traditórias entre as representações dominantes so- da hidrovia do rio Amazonas, via BR-230, à
bre a modernização, o poder de competitividade hidrovia do rio Tocantins, além das ligações com
entre empresas e os efeitos sobre o campo do tra- a ferrovia Norte–Sul–Estrada de Ferro Carajás.
balho. A introdução de técnicas de modernização, Esses corredores estão previstos no contexto da
como revelam as autoras, permitiu flexibilizar a malha nacional com sincronização de tempos, con-
gestão e o processo de trabalho, levando a grande forme as partes que compõem o sistema nacional
redução dos postos de trabalho,apesar da expan- de transporte. É importante destacar a comunica-
são da atividade no Porto da Vila do Conde. ção entre o planejamento da IIRSA e a experiência
A estratégia de transporte por meio de brasileira na área de transporte, no sentido lato,
contêiner possibilitou aos países exportadores para áreas de fronteira.
uma situação confortável na estrutura de comér- A região amazônica, nos diferentes paí-

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cio. Inclui-se aí o caso brasileiro, que teve um ses, tem uma tradição de transporte fluvial –
extraordinário crescimento, segundo informa a que remonta a milênios – para passageiros e cargas
Agência Nacional... (2011a, 2011b), de 20,57% em embarcações de pequeno, médio e grande por-
nesse setor, quatro vezes mais o alcançado em te, construídas em estaleiros regionais com mão
1994. No sistema da Companhia das Docas do de obra local. No entanto, uma polêmica divide
Pará, o movimento verificado quase triplicou o segmentos envolvidos nessa área de navegação flu-
volume de contêineres de 1997 a 2010 (Agên- vial a propósito da vontade política de modernizar
cia Nacional... 2011b). O crescimento do volu- os meios de transporte, substituindo a atual frota
me de cargas transportadas por via marítima e em madeira por transportes com base em ferro e
fluvial foi possível graças à introdução de téc- 5
Os recursos do PAC I para o transporte na região Norte
nicas que permitiram aumentar a conectividade sinalizam prioridades. Dos recursos alocados por modali-
dade de transporte, observa-se a seguinte distribuição:
entre mercados, viabilizar as ligações entre lo- setor rodoviário com 60,32%, o ferroviário com 23%; o
cal, regional e global e, consequentemente, re- hidroviário 13,22% e, finalmente, o aeroportuário, com
0,28% dos recursos. A integração modal e intermodal faz
duzir preços. parte de uma certa concepção de planejamento estratégi-
co, cuja logística é fundamental, sendo relevante no caso
As Figuras 1 e 2 mostram, de forma clara, os do planejamento voltado para a Amazônia (Brasil, 2011).

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EXPANSÃO DA FRONTEIRA, MEGAPROJETOS ...

Figura 1 e 2 – Mapas com obras de transporte rodoviário e ferroviário do PAC I e do PAC II, na Amazônia
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Edna Castro

aço, mais rápidos e com capacidade para transpor- gado a redes internacionais altamente sofisticadas e
tar maior quantidade de carga. As posições são di- a grandes empresas, como, por exemplo, a Petrobras,
vergentes: de um lado, as associações de constru- a Vale (do Rio Doce), a Andrade Gutierrez e a Cargill.
tores de barcos na Amazônia e de mestres tradici- Dos seis grupos de bens exportados pelo País – soja,
onais de carpintaria naval defendem a eficácia das carne, minérios, suco de laranja, petróleo e celulo-
embarcações tradicionais, testadas há séculos, com se em 2010 –, os três primeiros eram, majoritaria-
reduzida ocorrência de acidentes, comparativamen- mente, produzidos na Amazônia7 (Castro, 2010).
te ao tamanho da frota, e com geração de trabalho e Embora o Brasil tenha diversificado, ao lon-
renda com base em conhecimentos locais, em toda go das últimas décadas, seu parque industrial e sua
a extensão da região; de outro, setores do mercado inserção no mercado mundial, ele não deixa de ser,
e da engenharia naval, representantes de federa- por excelência, um produtor e exportador de
ções da indústria, e inclusive a Marinha do Brasil, commodities. A Amazônia contribui também para a
interessados em modernizar a frota, alegando que produção de dois outros produtos do ranking na-
as embarcações de madeira são obsoletas, não ofe- cional – celulose e petróleo (com gás natural) –, re-
recem segurança e não são condizentes com a mo- afirmando a importância da exportação no cenário
dernização do setor. Cabe ressaltar que a frota exis- nacional. Por outro lado, a globalização e o aumen-
tente percorre essa imensidão de cursos d’água to da competitividade têm provocado, no âmbito
cotidianamente e é produzida em centenas de es- local, o acirramento das estratégias de apropriação
taleiros localizados nas áreas ribeirinhas da Pan- de terras e de recursos por empresas nacionais e
Amazônia. Certamente, a relação com o tempo está internacionais, tendo em vista investimentos ime-
presente no confronto entre posições e estratégias, diatos ou reservas de nichos de mercado. Essas es-
pois há temporalidades em conflito. A moderniza- tratégias são responsáveis, em grande parte, pela
ção do setor de transporte é defendida nas políti- concentração fundiária, pela grilagem, pela
cas setoriais articuladas ao sistema nacional de pla- pistolagem, por conflitos em torno da terra e tam-
nejamento e à visão estratégica de futuro. bém pelo desmatamento acumulado (Castro, 2005,
p.46; 2009, p.85). E se atualizam com o avanço para
AMAZÔNIA BRASILEIRA: modelo de produ- as últimas fronteiras nacionais.
ção de commodities? A política que norteou o avanço da “frontei-
ra econômica” organizou-se de forma a permitir a
A Amazônia foi transformada em uma fron- integração do mercado nacional às estruturas pro-

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teira de commodities. A expansão da pecuária dutivas. Para os grupos que migraram em direção a
brasileira ocorre na sua fronteira, com frentes essa mesma fronteira, como colonos atraídos por
peruanas, bolivianas e colombianas. A expansão uma “política de integração”, o apoio do Estado foi
dos plantios de grãos (arroz, milho e soja) e a explo- reduzido. Nesse contexto, os projetos de coloniza-
ração de madeira empurram as fronteiras até os seus ção estavam subordinados ao projeto mais amplo
limites nacionais. Por outro lado, o interesse pela de modernização institucional e econômica do país.
mineração é bastante amplo, pois grande extensão Justamente por isso, o governo federal priorizou
da Amazônia tem jazidas minerais.6 A Amazônia políticas direcionadas à empresa agropecuária. Num
tornou-se um mercado de produtos e insumos, li- 7
Na Amazônia, essas ações são “incentivadas e alimenta-
das pelos grupos sojeiros e minero-siderúrgicos (ao de-
fenderem o asfaltamento das estradas e a implantação
6
Os minerais são de várias naturezas: minerais energéticos de projetos hidrelétricos) (grupos econômicos Amaggi,
(carvão mineral, linhito, urânio), minerais metálicos Bunge, Cargill, Vale), além de bancos (FMI, BID,
(chumbo, cobre, cromo, estanho, ferro, manganês, Corporação Andina de Fomento, BNDES), como tam-
molibdênio, nióbio, níquel, ouro, titânio, zinco), gemas bém grandes empreiteiras brasileiras – Odebrecht,
(água-marinha, amazonita, ametista, diamante, esme- Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez – que, com seu
ralda, granada, malaquita, opala, quartzo citrino, quart- enorme poder econômico, vêm exercendo o lobby à
zo hialino, topázio, turmalina e produção de integração de infraestrutura física nacional e internacio-
minerometalúrgicos siderúrgicos, entre outros. nal” (Couto, 2008, p.81).

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EXPANSÃO DA FRONTEIRA, MEGAPROJETOS ...

primeiro momento, os investimentos vão para a etc. e aportes financeiros públicos e privados com
pecuária, a exploração madeireira e a agricultura. capacidade de impor seus interesses no espaço e
O modelo desenhado pelo Instituto Nacional de no tempo. Por isso, levantamos a hipótese de que
Colonização e Reforma Agrária (INCRA) para cer- estamos diante de um grande investimento gover-
tas áreas da Transamazônica e para a rodovia namental que tende a provocar transformações para
Cuiabá-Santarém previa grandes propriedades, e além da fronteira nacional.
não por acaso surgiram as políticas destinadas a
apoiar a empresa agropecuária. Igualmente, o Pro-
grama Polamazônia foi concebido como um pro- Expansão da fronteira de commodities: pecuá-
grama de polos agropecuários, madeireiros e mi- ria e mineração
nerais, sendo projetados 15 polos no Pará.8 Em
um segundo momento, no correr dos anos 80, pre- Governos sul-americanos esperam desenvol-
dominam projetos de mineração e de infraestrutura ver estratégias empresariais de ampliação da capaci-
energética, estradas e comunicação. Os investimen- dade competitiva e adquirir melhores condições no
tos foram direcionados para a produção mineral mercado. Para ilustrar, examinaremos a pecuária e a
no âmbito do Programa Grande Carajás, inclusive mineração na Amazônia brasileira e refletiremos
para a construção das hidrelétricas de Tucuruí e sobre os impactos sociais e ambientais que poderão
Balbina. Nos anos 90, o Plano Brasil em Ação (1996- ocorrer com a abertura de estradas e a constituição
1999) e, logo após, o Avança Brasil (2000-2003), de corredores de escoamento para os principais
com os projetos de infraestrutura articulados em mercados mundiais.
eixos de desenvolvimento, traçam as linhas de Todas as grandes regiões do Brasil são pro-
intervenção no espaço regional com base em pro- dutoras de gado. Em 2009, o Brasil possuía qua-
jetos de infraestrutura de transporte e comunica- se 75 milhões de cabeças bovinas (74.679.513). Por
ção. No terceiro momento, abre-se a fronteira a em- isso, a pressão sobre a disponibilidade de terras
presas de mineração, de agricultura mecanizada, por parte da pecuária, no mercado de terras brasi-
de madeira certificada. O PAC viria a consolidar leiro, tem sido uma constante. O Sul e o Sudeste
um novo papel a ser dado à infraestrutura – ener- lideraram o setor, mas a pecuária cresceu em ritmo
gia, transporte, estradas, comunicação –, visando a mais acelerado nas últimas décadas nas regiões Cen-
criar estruturas de produção de energia, como as tro-Oeste (maior produtora, com 34%) e Norte (com
dezenas de hidrelétricas projetadas para os princi- 20%), o que corresponde ao total de 54% de parti-
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pais rios da Amazônia, sobretudo os afluentes das cipação no rebanho nacional. Porém as demais regi-
bacias do rio Amazonas e do Tocantins, e a intensi- ões têm ainda expressiva participação (46%).
ficar a produção de commodities e seu escoamento A expansão da pecuária no país foi possível
para novos mercados. graças ao avanço, nos últimos 50 anos, da fronteira
Em que são diferentes esses momentos? Atu- agropecuária sobre a floresta amazônica e o cerrado
almente, estão em jogo grandes interesses de em- mato-grossense. Contou, para tal, com financiamen-
presas, bancos, agências nacionais e internacionais tos públicos diretos, concedidos por meio de incenti-
vos fiscais e créditos bancários que privilegiaram os
8
A história econômica dessa região está marcada pela projetos de pecuária e a concessão de terras, e com os
influência dos investimentos do Programa Polamazônia
que, na década de 70, concedeu gordos subsídios públi- financiamentos indiretos, por meio da construção dos
cos a empreendimentos privados nos setores voltados
para a exportação: pecuária, madeira e mineração. projetos de infraestrutura que garantiam a abertura de
Rondônia, Mato Grosso, Tocantins e sudeste e sudoeste
do Pará são exemplos da ação de programas governa- novas fronteiras. Isso explica por que mais de um
mentais de colonização, de abertura de estradas, de mi- terço do rebanho brasileiro está em terras da Amazô-
neração, energia e incentivos fiscais a médias e grandes
empresas de pecuária e madeira, o que determinou o nia Legal. Mato Grosso, Pará e Rondônia são os esta-
avanço de novas frentes econômicas com apropriação
de imensos territórios da União. dos com maior participação – 27.357.089, 16.856.561

56
Edna Castro

e 11.522.891 de cabeças, respectivamente (Tabela 1) – tosas somas sendo repassadas pelo Banco da Ama-
e também com maior taxa de desmatamento cumulati- zônia. O rebanho do Pará chega, em 2003, a
vo no correr das últimas décadas, o que tem alterado 13.376.608 cabeças e, em 2005, a 18.063.669; em
profundamente a cobertura florestal e as formas tradi- 2009, haveria uma queda conjuntural para
cionais de ocupação do território. Daí a região ser pal- 16.856.561 bovinos, embora o Estado continue a
co de conflitos e violência. ser o segundo maior produtor do país.9
A pecuária no Estado do Pará foi tradicio- A mineração foi reconhecida pelo governo
nalmente praticada nas terras baixas da ilha do federal como um dos três pilares de sustentação
Marajó e do baixo Amazonas, conhecida como do desenvolvimento do País (os outros são a agri-
pecuária de várzea, padrão que foi, de longe, ul- cultura e o turismo), pela diretriz do Plano
trapassado pela pecuária de terra firme e nas áreas Plurianual (PPA) 2004-2007 do governo federal e
de fronteira, no corredor das estradas abertas pela do relatório de junho de 2007 do Departamento
colonização e pelas madeireiras. Para se ter ideia Nacional de Produção Mineral do Ministério de
da velocidade do crescimento da pecuária com a Minas e Energia (DNMP).10 Nesses documentos,
abertura da fronteira e as políticas estatais que fa- afirma-se que os indicadores de desempenho do
voreciam o seu financiamento público, ver os da- Programa Mineração e Desenvolvimento Sustentá-
dos da Tabela 1. Em 1990, o Pará contava com um vel apontam resultados “excepcionais” da indús-
rebanho já expressivo de 4.599.000 cabeças; em tria extrativa mineral (inclusive petróleo e GNP) no
1995, esse rebanho já ultrapassava seis milhões período (Castro; Sousa; Golobovante, 2010, p.11).
(6.080.000), chegando a quase 10 milhões Em 2007, a indústria da mineração e trans-
(9.668.000) em 2000. Na década seguinte, ganha- formação mineral contribuiu com aproximadamen-
ria mais velocidade o crescimento do rebanho; te 5,17% do PIB Brasil (o que significa U$S 70
coincidentemente, houve aumento no volume de bilhões), enquanto, na Amazônia, o setor partici-
financiamento da pecuária na Amazônia, com vul- pa com apenas 3% do PIB regional e gera, de for-

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pois o cruzamento dos dados mostra uma relação direta


com os Estados que mais desmatam. Em 20 anos, a área
9
Os Estados do Mato Grosso, Pará e Tocantins, com os ocupada por pastagens, no Mato Grosso, dobrou. E, no
maiores rebanhos, ocupam 75,12% das terras na Ama- Pará, multiplicou-se várias vezes.
10
zônia Legal com pecuária. Esse dado é fundamental para O setor mineral era responsável por 26% do PIB do
se entender a relação pastagens versus desmatamento, Estado do Pará em 2005. Se o garimpo, como forma mais

57
EXPANSÃO DA FRONTEIRA, MEGAPROJETOS ...

ma direta, menos de 2% dos empregos formais da trário, haveria uma integração para todos que vi-
região. Mas o setor responde por 40% do valor vem nos países envolvidos, superando as contra-
exportado pela Amazônia, e, no Pará e no dições do capital e a tendência histórica de exclu-
Maranhão, os metais e minerais, com destaque para são? (Lander, 2005). Tudo dependeria do modelo
alumínio, ferro e aço, representavam mais de 70% de integração em questão e da maneira como ele se
do valor exportado em 2006 (IMAZON, 2006). “adaptaria” à lógica dominante de integração de
Após o processo de privatização, a Vale tem blocos econômicos e de regulação da economia? O
ampliado sua lucratividade. Em 2002, seu lucro projeto de integração contempla espaços de auto-
líquido atingiu um total de R$ 2.043 bilhões (dois nomia e soberania e formula políticas públicas
bilhões e quarenta e três milhões de reais); em 2003, condizentes com as demandas da sociedade, com
o lucro líquido ficou em R$ 4.509 bilhões (quatro os territórios coletivos e com o desenvolvimento
bilhões e quinhentos e nove milhões de reais); em de seus processos produtivos, conforme pergun-
2004, a empresa teve o maior lucro líquido em 62 tam os movimentos sociais indígenas na Bolívia?
anos de existência, totalizando R$ 6.460 bilhões Os movimentos sociais de várias nacionali-
(seis bilhões e quatrocentos e sessenta milhões de dades são exemplos de formas de sociabilidade e
reais), crescendo até atingir R$ 21,3 bilhões no ano de integração que existem nas fronteiras entre Bra-
de 2008. Apesar da redução para metade no ano sil, Peru, Colômbia, Bolívia e Equador, que com-
de 2009, pois o setor foi fortemente afetado pela põem a grande faixa fronteiriça da Amazônia Oci-
crise global, a empresa recuperou-se e mantém-se dental, ou nas fronteiras com países do Caribe,
com lucros crescentes (Castro; Sousa; Golobovante, Venezuela, Suriname, Guiana, Brasil, Guiana Fran-
2010, p.11). O crescimento anual da mineração no cesa, já na da Amazônia Oriental. Os temas em
Pará é de 26%, e a economia do setor mineral tem discussão nesses fóruns são variados, mas, nos
impactado positivamente a evolução do Produto últimos anos, intensificou-se a discussão sobre o
Interno Bruto brasileiro (Sousa, 2011). território, as modalidades de afirmação de
territorialidades e de defesa de processos de traba-
lho. Alguns fragmentos mostram a diversidade
MOBILIZAÇÕES COLETIVAS NA PAN-AMAZÔNIA desses temas e seus impactos locais: como enfren-
tar os resultados do avanço de empresas brasilei-
As análises dos processos de integração sul- ras e do consequente desmatamento que ocorre no
americana têm sido apresentadas de forma lacunosa, leste do Peru, a exploração madeireira que avança
CADERNO CRH, Salvador, v. 25, n. 64, p. 45-61, Jan./Abr. 2012

pouco crítica e sem ligação com os reais processos em direção da Bolívia, os arrozeiros e garimpeiros
de dominação. É possível perceber as diferenças brasileiros na fronteira com a Venezuela, ou os pro-
entre o discurso dos planejadores e um projeto his- blemas apresentados pelos grupos indígenas brasi-
tórico de integração que recomponha as relações leiros na fronteira com a Guiana, ou ainda pelos
sociais e culturais, e não apenas econômicas. Lander garimpeiros no rio Oiapoque, em conflito com a
(2005) considera que, preliminarmente, é necessá- Gendarmerie francesa?
rio perguntar Para quem servirá a integração? Para Há um desconhecimento completo das ex-
os setores privilegiados das sociedades, para o ca- periências sociais e do campo de trocas, materiais
pital, seja ele nacional ou transnacional, que pode- e simbólicas que marcam as relações e conformam
rá mover-se livremente no continente? Ou, ao con- a vida social e as relações com a natureza nessas
rudimentar de exploração mineral, ainda resiste, a pro- regiões. Nesse quadro da fronteira, há movimen-
dução atual é dominada por mineradoras que utilizam
processo intensivo de tecnologia e robotização nas ex- tos migratórios mais ou menos intensos, que en-
plorações. Os próximos investimentos previstos até 2012, volvem migração de trabalho, mas também fazem
em novos projetos e na expansão dos atuais, somam
U$S 17 milhões. Desse total, 97% serão efetivados pela parte das formas de sociabilidade entre povos que
Vale, a maior parte deles na região sudeste do Pará, que
responderá pela maior fatia (86%). coabitam esses territórios, alguns milenarmente,

58
Edna Castro

independementemente de serem unidades nacio- que predominam na produção e no intercâmbio de


nais diferentes. São identidades e territorialidades bens e serviços, com forte interação com as institui-
em jogo, espaço de trânsito de culturas e etnias ções bancárias e financeiras que definem as aquisi-
pouco percebidas na superficialidade das interpre- ções e as fusões. Esses grandes projetos, construídos
tações sobre as fronteiras. A fronteira é um espaço para oferecer ao mercado os recursos naturais, são
complexo, com muitos atores sociais e étnicos e entregues a grandes empresas, nacionais e estran-
agentes econômicos, redes de comércio, migrantes geiras, que se localizam, via de regra, em territórios
que chegam com interesses diversos e veem aí um ocupados, mas se impõem à população local como
espaço também de oportunidades e de negócios. prioridade nacional.
Além disso, os projetos dos PAC I e II au-
mentaram a desterritorialização de povos tradicio-
CONCLUSÃO nais na Amazônia brasileira e têm manipulado iden-
tidades pelo esvaziamento de sentidos, trazendo
Procuramos sustentar a ideia de que as esses grupos para o contexto de suas representa-
macropolíticas nacionais atuais, voltadas para a ções sobre a modernização e o processo cilizatório.
Amazônia brasileira, ampliam sua abrangência Têm reproduzido, assim, de forma recorrente e
territorial. A Pan-Amazônia torna-se um espaço célere, formas de estigmatização, no sentido enten-
de repercussão das dinâmicas nacionais, da in- dido por Goffman (1982) e de Elias (1994). Esses
tervenção de megaprojetos que acabam por projetos têm sido motivo de contestações que di-
desestruturar uma dada ordem social e ambiental videm a sociedade brasileira, motivo de tensões e
existente e disponibilizar, assim, novas frontei- conflitos, embora se proponham a reduzir as desi-
ras de terras e recursos naturais. gualdades sociais e a diminuir a fragmentação in-
O Estado tem optado pela solução mais tra- terna, abordando temas como segurança alimen-
dicional de desenvolvimento – o que se tem reve- tar, patenteamento de conhecimentos tradicionais,
lado ineficaz social e ambientalmente –, que é a titulação de territórios de identidade, reforma agrá-
construção de grandes obras de infraestrutura, ria e soberania nacional.
usando argumentos que supervalorizam os bene- Finalmente, a Amazônia, vista no cenário
fícios do desenvolvimento. São obras localizadas nacional e internacional, sobretudo, pelo aumen-
no território brasileiro e nas áreas amazônicas de to das taxas de desmatamento e pelo acirramen-
países vizinhos, por intermédio da IIRSA. Produ- to dos conflitos socioterritoriais, localiza-se em

CADERNO CRH, Salvador, v. 25, n. 64, p. 45-61, Jan./Abr. 2012


tos como minério, madeira, gado e pescado, na uma outra configuração geopolítica. Os olhos
Amazônia, continuam a sair para o mercado por voltam-se para a Pan-Amazônia, imensa região e
cadeias curtas e com reduzido padrão tecnológico. a última mais preservada do planeta. Imensa fron-
Os projetos de grande escala, como as hi- teira de recursos, integrada pelas culturas e etnias
drelétricas em construção no Brasil, no Peru e que milenarmente aí vivem e produzem suas exis-
na Bolívia, ou as estradas, ferrovias e portos apre- tências, mas agora ameaçadas pelos programas
sentados pelos governos como obras para o de- neocoloniais que refazem discursos e prioridades
senvolvimento e a integração nacional e sul-ame- e por estratégias geopolíticas de dominação das
ricana, são densos em investimento e, por isso, fronteiras. O conhecimento e a demonstração des-
representam um modelo de intervenção no ter- ses processos de dominação e dos efeitos que pro-
ritório, não apenas do Estado, mas também de gran- duzem passam a ser prioridade política das socie-
des empresas, nacionais e internacionais. Chesnais dades amazônicas e nacionais.
(1996) mostra que a internacionalização é domina-
da mais pelo investimento internacional do que pelo
Recebido para publicação em 3 de novembro de 2011
comércio exterior, e, portanto, molda as estruturas Aceito em 5 de fevereiro de 2012

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EXPANSÃO DA FRONTEIRA, MEGAPROJETOS ...

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Edna Castro

BORDER EXPANSION, SOUTH AMERICAN EXPANSION DES FRONTIÈRES, GRANDS


INFRASTRUCTURE AND INTEGRATION PROJETS D’INFRASTRUCTURE ET
MEGAPROJECTS INTÉGRATION SUD-AMÉRICAINE

Edna Castro Edna Castro

The analysis of the relationship between Les analyses de la relation entre politiques
developmentalist policies and social and territorial de développement et dynamiques socio-territoriales
dynamics in the Amazon usually focuses on a en Amazonie s’intéressent de plus en plus à leur
Brazilian national perspective. This article aims to dimension nationale. Cet article cherche à révéler
reveal an increase of interest in the exploitation of l’intérêt accru pour l’exploitation des ressources
the region’s natural resources, beyond its political naturelles de la région, au-delà de leurs frontières
borders, thus turning the Pan-Amazon into a vital politiques, ce qui fait que la Pan-Amazonie est
zone in Brazilian geopolitics. The Brazilian Growth devenue un espace central de la géopolitique
Acceleration Programs (PAC I and II) and the brésilienne. Les Plans pour l’Accélération de
Initiative for the Integration of the Regional l’Économie (PAC I et II) et l’ IIRSA vont dans le
Infrastructure of South America (IIRSA) follow the même sens, celui d’une intégration compétitive qui
same direction of a competitive integration, adopte un modèle de modernisation basé sur des
adopting a modernization model based on mega-projets d’investissements. L’IIRSA, en tant
investment megaprojects. The IIRSA, carried on que bloc régional dans le cadre de l’Amérique du
in South America as a regional block, and the PAC, Sud, et le PAC, dans le cadre national, sont des
developed nationwide, are programs that aim to programmes tournés vers la logistique des
boost transport, energy and communication transports, de l’énergie et de la communication.
logistics. Continent-wise, they both indicate Sur le plan continental, ils sont l’expression de
irreversible social and territorial dynamics and dynamiques socio-territoriales irréversibles et
represent the common interests of Brazil and the représentent des intérêts communs pour le Brésil
other countries, based on the 1970’s dominant et les autres pays par le biais du modèle dominant
model of border expansion in the Amazon. d’expansion de la frontière amazonienne à partir
des années 70 du siècle dernier.

KEY-WORDS: border, state policies, integration, MOTS-CLÉS: frontière, politiques d’état, intégration,
megaprojects, Pan-Amazon. grands projets, Pan-Amazonie.

CADERNO CRH, Salvador, v. 25, n. 64, p. 45-61, Jan./Abr. 2012

Edna Castro - Socióloga do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos, da Universidade Federal do Pará - UFPA.
Doutora em Sociologia pela École des Hautes Études en Sciences Sociales. Pós-doutora pelo Centre National de la
Recherche Scientifique. Professora da UFPA. Pesquisadora do CNPq. Professora Visitante da Université de Québec
à Montreal Departamento de Sociologia, Canadá; da Universidade de Brasília, UnB, Departamento de Sociologia
e da Université Le Havre, França. Diretora do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos – NAEA/ UFPA – entre 2004 e
2008. Foi Presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional –
ANPUR, gestão 2007-2009 e exerceu função de Diretora na Associação Nacional de Pós-Graduação em Sociologia
– ANPOCS nos períodos (1986-1988 e 1994-1996), da Sociedade Brasileira de Sociologia - SBS (2009-2011).
Atualmente é diretora da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência - SBPC. Tem pesquisas e publicações
nos temas: trabalho, políticas públicas, cidades, identidades e territorialidades de grupos tradicionais e conflitos
sociais e ambientais, Amazônia, Pan-Amazônia, América Latina.

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