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CONTRIBUIÇÃO DOS SISTEMAS DE GESTÃO DA

QUALIDADE PARA O DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO


DA CONSTRUÇÃO DE EDIFÍCIOS

Palmyra Farinazzo Reis


Escola Politécnica da USP - Av.Prof. Almeida Prado, Trav. 2, PCC
CEP: 05508-500, São Paulo - SP Fone (011) 818 5422. Fax 8185544 E-mail: palmie@pcc.usp.br

Ana Lúcia Rocha de Souza


Escola Politécnica da USP - Av.Prof. Almeida Prado, Trav. 2, PCC
CEP: 05508-500, São Paulo - SP Fone (011) 818 5422. Fax 8185544 E-mail: arocha@pcc.usp.br

Silvio Burrattino Melhado


Escola Politécnica da USP - Av.Prof. Almeida Prado, Trav. 2, PCC
CEP: 05508-500, São Paulo - SP Fone (011) 818 5422. Fax 8185544 E-mail: silviobm@pcc.usp.br

This paper analyzes the importance of the quality systems in the building construction
companies technological development. The relationship between technology transfer to
building site and quality systems is discussed based on case studies that were carried out
in some construction companies and based on a literature survey too.

Through the case studies it is possible to observe how a quality system can help the
company to fix his technology and to promote changes in all its areas, like design, supply,
construction, control and personnel training and motivation.

Key words: quality management; building; construction

1 INTRODUÇÃO

O subsetor edificações é caracterizado pela alta incidência de patologias, por elevados


índices de desperdícios de diversas naturezas e pela baixa produtividade, função da reduzida
mecanização e uso intensivo de mão-de-obra.
Nos últimos anos, entretanto, a redução do número de obras, a diminuição da participação
do Estado no subsetor, a abertura do mercado nacional e a criação do MERCOSUL, o fim
da ciranda financeira e do processo inflacionário, a privatização de empresas estatais, a
queda de renda do mercado consumidor e sua maior exigência por qualidade, vêm
obrigando as empresas a promoverem profundas modificações para se adaptarem às
exigências de um mercado cada vez mais competitivo.
Dessa forma, motivadas pela busca por maior competitividade, melhor qualidade, pela
redução do desperdício, pelo aumento da produtividade e pela redução dos custos de
produção, algumas empresas começam a desenvolver as tecnologias construtivas existentes
e implantar sistemas de gestão da qualidade, procurando otimizar seus processos de
produção e melhorar sua organização interna.
Observa-se, atualmente, uma crescente preocupação das empresas atuantes na construção
de edifícios em investir em desenvolvimento tecnológico, o que pode ser demonstrado pela
realização de pesquisas em convênio com as universidades, antes praticamente inexistentes.
Por outro lado, essas mesmas empresas também vêm procurando utilizar métodos de gestão
mais modernos, que primem pela maior qualidade dos processos produtivos e do produto
final, através da padronização e otimização dos recursos internos de produção.
O presente artigo procura discutir a importância da implantação dos sistemas de gestão da
qualidade para a consolidação da mudança de tecnologia construtiva nos canteiros de obras,
sendo parte de um trabalho em desenvolvimento na disciplina PCC 848 - Inovação
Tecnológica no Processo de Produção de Edifícios, ministrada pela Profa. Dra. Mercia
Bottura de Barros, do curso de pós-graduação em Engenharia de Construção Civil e
Urbana da Escola Politécnica da Univerdidade de São Paulo.
Para sua elaboração, realizaram-se estudos de caso em quatro empresas de médio porte de
São Paulo, que apresentam o perfil de liderança quanto às mudanças induzidas pelo
mercado.

2 CARACTERIZAÇÃO DAS EMPRESAS

As construtoras analisadas foram fundadas, em sua maioria, na década de 80, procurando


incorporar no início dos anos 90 uma cultura voltada à qualidade de produção, para serem
competitivas no mercado. Ou seja, essas empresas passaram a ter como objetivo
racionalizar os serviços para reduzir os custos da obra; e isso tem implicado em
investimentos em projetos, controle de execução e treinamento de pessoal, entre outros.
São empresas de porte médio, assim caracterizadas em função de seu faturamento e área
construída por ano; atuam em diversas regiões do Estado de São Paulo, tanto na
incorporação como na construção de edifícios habitacionais, tendo como meta crescer e se
fixar no mercado, em média, com 6 edifícios por ano, considerando de 7 a 10 mil metros
quadrados por edifício.
Como metodologia, utilizou-se um questionário aplicado através de entrevistas com os
diretores técnicos das empresas, procurando caracterizá-las e identificar os principais
pontos relacionados com o binômio gestão da qualidade e desenvolvimento tecnológico.
Para isso, subdividiu-se o questionário em duas partes, uma ligada à implantação dos
sistemas de gestão da qualidade, e outra, relacionada às alterações tecnológicas ocorridas
nos últimos anos, nos processos administrativos e operacionais. O estudo teve caráter
exploratório e foi desenvolvido segundo uma abordagem qualitativa, procurando conhecer
as empresas profundamente e detectar suas novas tendências e rumos no cenário atual da
construção de edifícios.

3 O DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO

Com relação ao desenvolvimento tecnológico, as empresas vêm promovendo alterações, há


pouco mais de dez anos, em todas as etapas do processo de produção, a saber:
planejamento, projeto, execução, suprimentos, uso, operação e manutenção. Contudo, essas
empresas não vêm conseguindo atender suas expectativas de desenvolvimento da tecnologia
em função, principalmente, da falta de uma filosofia aberta a mudanças e da ausência de
uma visão sistêmica de seu processo de funcionamento.
DALCUL (1996), em seu trabalho sobre avaliação da capacitação tecnológica de empresas
construtoras, salienta que as empresas, apesar de investirem em tecnologia, não vêm
alcançando plenamente os seus objetivos, pois esse tipo de investimento gera uma ação
pontual, onde não existe a preocupação com a organização como um todo e nem o cuidado
em retroalimentar etapas anteriores, não ocorrendo, assim, o aperfeiçoamento contínuo e a
renovação do processo de produção para o futuro.
Nas entrevistas realizadas, a opinião dos diretores técnicos entrevistados confirma a posição
dessa última autora: "a racionalização dos procedimentos executivos e a implantação do
sistema de gestão da qualidade precisam ser desenvolvidos concomitantemente. O sistema
de gestão enfoca a empresa como um todo e não somente a área técnica"; "o principal
estímulo para a implantação do sistema de gestão foi a falta de organização da empresa.
Ela cresceu e começou uma difusão enorme de informações, surgindo a necessidade de um
sistema de gestão que coordenasse esse grande número de informações, necessárias ao
desenvolvimento de tecnologia. Anteriormente, por não existir definição de
responsabilidades e nem uma estrutura organizacional definida, fazíamos trabalho
dobrado ".
Hoje, as empresas vêm buscando a reestruturação pelo aperfeiçoamento do seu
conhecimento tecnológico, observando mais cuidadosamente sua organização interna e as
inter-relações existentes, sua capacidade de investimento e de relacionamento com o
ambiente externo.
Nos estudos de caso realizados, observou-se que as principais alterações tecnológicas em
fase de implantação nas empresas resumem-se aos seguintes subsistemas: estrutura,
alvenaria, impermeabilização, instalações e revestimentos; havendo, conseqüentemente,
modificações em várias etapas do processo de produção do edifício, como: projeto,
suprimentos, execução e controle. Diagnosticou-se também uma crescente preocupação em
melhorar a qualificação da mão-de-obra, bem como suas condições de trabalho no canteiro.
Apresentam-se, na seqüência, as principais alterações tecnológicas e organizacionais
encontradas nessas empresas:
a) na área de projeto: as empresas estão buscando implantar um modelo de
desenvolvimento de projeto que permita incorporar com maior facilidade as alterações
tecnológicas. O conceito de projeto, para essas empresas, mudou. A idéia atual é criar uma
relação cada vez mais estreita com a execução, através da elaboração dos projetos para
produção, resolvendo os problemas de construtibilidade antes do início da obra. Hoje, os
projetos para produção de alvenaria e de lajes de concreto armado já são amplamente
difundidos no mercado.
Essas construtoras e o mercado de uma maneira geral, em São Paulo, vêm buscando a
prática da coordenação, e não apenas a compatibilização entre projetos. Os projetistas das
diversas especialidades estão sendo contratados já na fase de anteprojeto, com o objetivo de
se formalizar uma equipe multidisciplinar e aumentar o nível de racionalização e de
construtibilidade dos projetos. A criação de um banco de informações, contendo erros e
acertos do processo de produção das empresas, também é uma tendência atual, visando
com isso que os procedimentos de execução embasem a elaboração de seus futuros
projetos.
Um dos diretores ratifica essa posição: "a empresa entende que o projeto é a alma do
negócio e, embora ainda existam muitos problemas, vem procurando fazê-lo
compatibilizado, pensado".
c) na área de suprimentos: as empresas, motivadas pelos Sistemas de Gestão da
Qualidade, vêm desenvolvendo procedimentos para solicitação e recebimento de materiais e
componentes. Existe uma tendência de não mais comprar por preço e sim, analisar o
binômio qualidade e custo, realizando uma compra técnica.
Depoimentos dos diretores técnicos das empresas visitadas comprovam essa tendência: “o
setor de suprimentos era considerado ‘um monstro’. Com a implantação do sistema de
gestão, os engenheiros e o próprio setor passaram a se conscientizar da importância do
papel que tinha o mesmo”; “antigamente, a empresa comprava ‘gato’ e recebia ‘lebre’. A
construtora não sabia fazer o pedido de material (faltavam especificações) e nem recebê-
lo; além da pouca durabilidade que o material apresentava, em alguns casos”.
As empresas vêm se organizando em busca de parceiros e não mais de fornecedores de
materiais, simplesmente. Agora, além de existir um maior cuidado na especificação,
embasando a solicitação, compra e recebimento dos materiais em obra, exige-se dos
fornecedores uma garantia da qualidade dos produtos. Nesse sentido, algumas empresas
possuem procedimentos formalizados para escolha destes fornecedores, procurando
diminuir, ou até mesmo eliminar, os problemas relacionados com a qualidade dos produtos
que chegam na obra.
Um exemplo dessa posição são os depoimentos registrados durante as entrevistas: “hoje, a
empresa possui uma ficha de avaliação dos fornecedores e eles nos respeitam”; “a
empresa prefere comprar materiais de fornecedores que assumam a responsabilidade pela
qualidade de seus produtos. Houve um aumento de exigência em relação aos fornecedores
com, inclusive, cancelamentos de pedidos. Pela inexistência de fornecedores-parceiros, a
empresa realiza, para alguns materiais, ensaios em laboratório e em canteiro e, algumas
vezes, só após a realização do ensaio é aceita sua entrega”; “a empresa já conseguiu
estabelecer uma parceria com um fornecedor de portas prontas, a ponto de não mais ser
necessário a realização de ensaios para a aceitação desse produto. Conseguimos
estabelecer uma relação de confiança”.
Porém, “a definição de uma política de aquisição e recebimento de suprimentos para as
obras de edifícios não é algo fácil de se estabelecer, sobretudo pelo número de variáveis que
interferem nesse processo e principalmente porque interage fortemente com o mercado”
(BARROS, 1996). Apesar disso, as construtoras vêm tentando desenvolver um setor de
suprimentos voltado à produção e, também, qualificar seus fornecedores. Percebe-se que
ainda existe um longo caminho a ser percorrido; mas a tendência aqui observada já reflete
um grande avanço do subsetor na busca de uma melhor qualidade em suprimentos.
c) na área de execução: as empresas vêm adotando uma série de procedimentos de
produção racionalizados, que já se encontram formalizados. No entanto, sua simples
formalização não garante que os mesmos estejam sendo usados corretamente nos canteiros
de obras. É necessário que vários fatores se inter-relacionem para garantir a consolidação
da tecnologia, como existência de projetos voltados para produção, intenso treinamento da
mão-de-obra, sistemática definida de controle e um sistema de informação ágil e eficiente.
Contudo, existem ainda inúmeros dificuldades para a transferência da tecnologia às obras.
Entre elas podem ser destacadas a dificuldade de comunicação entre engenheiros, mestres e
operários, a rejeição por parte dos mestres em utilizar novas técnicas de execução, a falta de
treinamento da mão-de-obra, o analfabetismo e a existência de uma cultura arraigada e
"fossilizada", difícil de mudar. Em uma das entrevistas, ouviu-se a seguinte afirmação:
“padronizar os procedimentos de execução é fácil; o difícil é a sua efetivação no campo
operacional da empresa".
Os sistemas de gestão da qualidade surgem como uma alternativa para minimizar essas
dificuldades de transferência de tecnologia, uma vez que propõem a participação de todas
as pessoas envolvidas no processo de produção do edifício, através dos times da qualidade.
Tal atitude reduz a resistência às mudanças, a hostilidade ao aprendizado, além de
proporcionar maior comprometimento das pessoas com as alterações a serem realizadas.
Segundo o diretor técnico de uma das empresas, “para minimizar a resistência às novas
formas de produção precisou-se de muita conversa e ao invés de impor tais mudanças, foi
melhor perguntar a opinião das pessoas diretamente por elas influenciadas”.
Apesar da dificuldade de transferir a tecnologia aos canteiros de obras, nota-se que os
projetos para produção, a padronização dos procedimentos e o treinamento da mão-de-
obra, mesmo que incipiente, já proporcionam uma evolução na forma de produzir os
edifícios, como constatado no depoimento a seguir: “antes, para você fazer uma alvenaria,
era necessário criar várias etapas de preparação para entrar em outros serviços, como o
revestimento, por exemplo. Agora não. Com base nos procedimentos de execução, nos
projetos para produção e no treinamento da mão-de-obra é possível criar uma melhor
condição para a realização do serviço e, com isso, aprimorar a qualidade do produto
final”.
d) na área de controle: percebe-se nas entrevistas realizadas que essa é a área mais
incipiente das construtoras. Identificou-se que as empresas possuíam procedimentos de
controle formalizados voltados apenas para a inspeção final dos serviços, utilizando para
isso uma ficha de verificação. As empresas possuem esse tipo de documentação para alguns
serviços, com diferentes graus de desenvolvimento.
Encontram-se em estágio bastante embrionário os mecanismos para reparos, quando
encontradas as não conformidades, e os procedimentos para orientar a retroalimentação do
processo de produção. Como comprova um diretor entrevistado: “a solução adotada
quando nos deparamos com algum problema durante ou após a execução dos serviços,
encontra-se apenas na cabeça das pessoas”.
Entretanto, as empresas demonstraram, ao longo da pesquisa, interesse em formalizar tais
procedimentos, pois a partir da sua utilização efetiva nos canteiros de obras será possível
diagnosticar os problemas e propor soluções ainda durante a fase de execução; soluções
essas que serão ainda documentadas e utilizadas em empreendimentos futuros.
É evidente que os procedimentos de inspeção de serviços já significam um avanço
tecnológico, em comparação ao controle informal. Porém, para galgar um patamar mais
elevado da qualidade, é necessário formalizar o que deve ser feito em caso de não
conformidade e de que maneira as informações do controle retroalimentarão a continuidade
do processo de produção.
As construtoras precisam buscar a padronização e documentação dos seus mecanismos de
controle. Caso contrário, "não haverá evolução no processo de produção de edifícios se as
empresas não souberem onde estão errando e onde precisam melhorar" (BARROS, 1996).
e) na área de recursos humanos: observou-se nas empresas visitadas uma preocupação
em desenvolver ao mesmo tempo os aspectos tecnológicos e humanos, tanto da gerência
como dos operários, mas percebe-se que na maioria da empresas o treinamento da mão-de-
obra ainda não é feito de forma sistemática.
É importante também ressaltar que nas empresas não há um patamar comum com relação à
política de recursos humanos. Algumas encontram-se em estágio de desenvolvimento mais
elevado do que outras e vêm percebendo que o problema não se restringe apenas à mão-de-
obra operária; um grande entrave é a gerência. Nesse sentido, essas empresas vêm
investindo em cursos de capacitação, com o objetivo de desenvolver mais o lado humano
dos gerentes.
Contudo, todas as empresas reconheceram a importância de se realizar investimentos em
recursos humanos, em todos os níveis hierárquicos. Apesar disso, ainda não existe uma
política formalizada para o treinamento da mão-de-obra, e acabam realizando o treinamento
da mão-de-obra no próprio canteiro, utilizando um técnico ou o próprio engenheiro da
obra.
Foi constatado também que, mesmo de maneira informal, existe uma constante busca da
motivação dos seus funcionários, visando a diminuição da rotatividade e o aumento da
produtividade nos serviços realizados. "A nossa empresa possui um plano de carreiras
para os nossos funcionários", "os mestres e encarregados têm prêmios por etapa", "os
engenheiros têm um percentual do que eles economizam ou se estabelece um prêmio para
os mesmos cumprirem as metas", "existe o operário do mês, como prêmio de
reconhecimento, ele ganha uma cesta básica e tem na obra uma faixa com o seu nome".
Um problema apontado nas entrevistas foi a alta rotatividade da mão-de-obra. "A
rotatividade dos funcionários é um fator complicante na aplicação dos procedimentos
executivos no canteiro, surgindo a necessidade de treinamento contínuo", relatou um dos
diretores. Esse problema também aparece nas empresas que trabalham com subempreiteiros.
Não existe ainda no mercado relações de parceria e é comum as empresas trabalharem com
diferentes subempreiteiros nas suas obras. Um dos diretores desabafa: "é a quarta vez que
treino alvenaria para um subempreiteiro; isso é desestimulante e cansativo".
No entanto, pode-se inferir que a preocupação com as pessoas que fazem a obra nasceu
juntamente com a filosofia do sistema de gestão, que coloca sempre em primeiro plano o
lado humano de todos os participantes do processo de produção. Como afirma DALCUL
(1996): "é de vital importância que todos os setores da empresa estejam conscientes para a
proposta de mudança, na qual a empresa está disposta a enfrentar, para que todos possam
se integrarem e, não simplesmente se envolverem mas, principalmente, se comprometerem
com o processo".

4 O SISTEMA DE GESTÃO DA QUALIDADE

Percebe-se, atualmente, que a introdução dos conceitos da qualidade vem estabelecendo


uma nova cultura no meio empresarial da Construção Civil, levando o país a uma nova fase
de grande destaque das questões direcionadas à qualidade, constatada através de iniciativas
como o lançamento do Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade - PBQP, em
1992, e do QUALIHAB, em 1996, este último promovido pela Companhia de
Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo.
Para MELHADO (1994), pelas próprias características do mercado consumidor, no
subsetor edificações, as motivações das empresas para implantação de sistemas de gestão da
qualidade estão voltadas, principalmente, à redução dos custos finais dos produtos, uma vez
que hoje existe a consciência de que se deve buscar maior competitividade e que as perdas
no processo de produção, os custos do retrabalho e as correções pós-entrega são bastante
significativos, embora nem sempre conhecidos.
O diretor técnico de uma das empresas fez a seguinte afirmação: “identificamos que
alcançar melhores índices de qualidade e produtividade era uma estratégia de
sobrevivência em um mercado altamente competitivo, devido às rápidas mudanças na
gestão das empresas e no diferencial pela racionalização do processo construtivo
tradicional".
Da opinião acima, é possível destacar que, na construção de edifícios, a gestão da qualidade
por si só não é suficiente para que se consigam reduções significativas no custo de
produção. A empresa deve estar sempre preocupada em aprimorar o processo construtivo
tradicional (estrutura de concreto armado e alvenaria de vedação com blocos cerâmicos),
utilizado pela quase totalidade das empresas de médio e pequeno porte do país, buscando
um diferencial, seja através da racionalização, ou através da introdução de inovações em
termos de máquinas e equipamentos, materiais, ou, até mesmo, através da adoção de novos
processos construtivos.
Os estudos de caso mostraram que as empresas construtoras optam pela racionalização do
processo construtivo tradicional, haja vista que o mesmo mantém a mesma base produtiva à
qual já estão adaptadas, não necessita de grande investimento, é possível ser utilizado em
pequena escala, elimina a dependência de grande número de unidades, além de garantir
maior flexibilidade da empresa frente às oscilações do mercado, como destaca BARROS
(1996).
Entretanto, a racionalização da produção exige que a empresa conheça seus processos
administrativos e produtivos atuais e saiba exatamente o que deve ser melhorado, a partir
do que já existe. Por isso, é de fundamental importância que a implantação de tecnologia
ocorra em conjunto com, ou esteja apoiada pela introdução de um sistema de gestão da
qualidade que auxilie a empresa a visualizar e compreender a complexa teia de
relacionamentos técnico-humanos que a envolve, a fim de otimizar o todo e não apenas
partes dele.
Essa opinião também é compartilhada pelos diretores técnicos das empresas visitadas, que
acreditam ser muito difícil implantar uma nova tecnologia sem apoio de um sistema de
gestão que defina responsabilidades, motive os funcionários para a mudança, estabeleça um
melhor sistema de informação, comunicação e tomada de decisão e que, principalmente,
padronize os procedimentos de execução de obras em todos os seus empreendimentos,
promovendo uma uniformização da linguagem e uma redução de variabilidade de processos.
Dentro dessa idéia um dos diretores salienta: “quando a empresa tem apenas duas obras
ainda é viável introduzir modificações no processo construtivo sem implantar um sistema
de gestão da qualidade. Mas, se existem cinco ou dez obras, já começa a ser fundamental
a existência de uma padronização de procedimentos formalizada, pois, caso contrário, a
empresa perde o controle da compatibilização dos procedimentos nos diversos
empreendimentos. Também na implantação de novas tecnologias é preciso que todos os
departamentos estejam envolvidos e é nesse momento que entra a visão sistêmica da
qualidade proporcionada pelos sistemas de gestão”.
No mesmo sentido, outro diretor técnico reporta que quando sua empresa começou a
crescer, houve um aumento considerável do volume de informações, tornando essencial a
implantação de um sistema de gestão que pudesse coordená-las e definisse melhor as
responsabilidades de cada funcionário, a fim de que decisões não deixassem de ser tomadas
ou fossem tomadas por pessoas diferentes de modos diferentes, afetando diretamente a
execução das obras.
A partir da observação das atuações das empresas dos estudos de caso, detectou-se que
todas elas, quando racionalizaram seu processo construtivo, sentiram a necessidade de um
sistema de gestão que organizasse a empresa como um todo e promovesse a integração de
seus diversos departamentos e de seus funcionários, na busca de um objetivo comum.
Assim, um diretor analisa: “começamos a perceber que se uníssemos o desenvolvimento
tecnológico com os princípios da gestão pela qualidade, a empresa ficaria mais
organizada, conseguindo uma série de benefícios, como redução do retrabalho, equipe de
trabalhadores mais motivados, melhor relacionamento com fornecedores, etc..
Acreditamos que com a evolução tecnológica e com a organização, desenvolvida através
do sistema de gestão, temos a receita para evoluir no mercado. Uma coisa está ligada à
outra. Talvez, se adotássemos somente novas tecnologias sem o sistema de gestão da
qualidade, não teríamos conseguido êxito e o contrário também é verdadeiro”.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Segundo SOUZA (1996), "algumas empresas perceberam dificuldades quanto à fixação da


tecnologia, no sentido de incorporá-la definitivamente às suas obras. Essas dificuldades têm
levado, mais recentemente, as construtoras a repensarem a organização da empresa e o
ciclo da qualidade como um todo", o que foi confirmado na pesquisa realizada neste
trabalho, por um dos entrevistados: “a implantação dos procedimentos racionalizados sem
a implantação do sistema de gestão teria sido muito difícil”. “A empresa acredita que o
sistema de gestão é um facilitador”.
O retorno a partir da implantação de novas tecnologias é, aparentemente, muito rápido,
dados os resultados imediatos obtidos em algumas obras; entretanto, se as empresas não
apresentarem uma estrutura organizacional definida, esses resultados não se reproduzirão
em novos empreendimentos. A gestão da qualidade permite uma abordagem mais
duradoura para a evolução da empresa, trazendo aos resultados obtidos uma maior
estabilidade.
O fator humano também merece destaque. Segundo BARROS (1996), "quanto maior o
nível de organização da empresa e quanto mais motivadas estiverem as pessoas que a
constituem, maiores são as chances de sucesso da implantação e, conseqüentemente, maior
o potencial de racionalização do processo de produção".

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BARROS, M. M. B. Metodologia para implantação de tecnologia construtiva


racionalizada na produção de edifícios. São Paulo, 1996. 422 p. Tese (Doutorado)
Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.
DALCUL, A.L.P.C. Avaliação da capacitação tecnológica de empresas construtoras: proposta de um
modelo facilitador (MACT). In: SIMPÓSIO DE GESTÃO DA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA, 19.,
São Paulo, 1996. Anais. São Paulo, USP/PGT/FIA/PACTo, 1996. v.2, p.851-66.
MELHADO, S. B. Qualidade do projeto na construção de edifícios: aplicação ao caso
das empresas de incorporação e construção. São Paulo, 1994. Tese (Doutorado) -
Escola Politécnica, Universidade de São Paulo.
SOUZA, A. L. R. O projeto para produção das lajes racionalizadas de concreto armado
de edifícios. São Paulo, 1996. Dissertação (Mestrado). Escola Politécnica,
Universidade de São Paulo.

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