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cristão-novo

Desde os alvores da nacionalidade, sempre existiram minorias étnicas e religiosase
m Portugal. Judeus e mouros e, mais tarde, ciganos, constituem os contingentesmai
s expressivos. Os primeiros antecedem provavelmente as invasões dossegundos, te
ndo gozado muitas vezes de proteção e favorecimento régios, mercêdas suas fortun
as e atividades mercantis, e até da sua preponderância cultural.Inseridos num Portu
gal agropecuário e piscatório, dedicar-se-ão aos ofícios ou aatividades liberais (ciênc
ia, medicina, farmácia...) e gradualmente ao comércio e àfinança, onde não conheci
am grande concorrência.Ao longo da Idade Média,habitaram preferencialmente - de 
acordo com as suas ocupações profissionais - nasmaiores aglomerações urbanas d
o País, em bairros próprios (judiarias; mourarias nocaso dos árabes ou mouros, men
os numerosos), praticando o seu culto, falando oseu idioma e mantendo as suas trad
ições ancestrais. Diplomaticamente, mantinhamfidelidade à Coroa, a ela se subordin
ando. À parte alguns incidentes, principalmentemotivados por questões religiosas, a 
sua vida no Reino não correu nunca grandesriscos de ser posta em causa.Tal acont
ecerá somente em finais do século XV,quando a sua posição social, económica e po
lítica está consolidada, mantendo umarelação quase simbiótica com o Portugal das 
Descobertas. Na verdade, após a suaexpulsão de Espanha por parte dos Reis Catól
icos (Isabel de Castela e Fernando deAragão) em 1492, muitos dos judeus que aí nã
o se quiseram converter à forçaatravessaram a fronteira e instalaram-se no nosso P
aís. Terão sido cerca de 60 000.D. João II, influenciado por judeus influentes na Cort
e (Mestre Vizinho, por exemplo,e talvez pelo rabi-mor peninsular, Isaac Aboab), acol
he-os, tanto mais que aquelespreferiram refugiar-se em Portugal a serem escravizad
os em Marrocos, para ondeteriam de ir de barco, o que não conseguiam obter. D. Jo
ão II impõe-lhes opagamento de 8 cruzados para cá permanecerem, a pagar sob pe
na da servilidadeou da expulsão. Pretendia-se a fixação de operários especializados 
que faltavam emPortugal. Falecido D. João II, sucede-lhe D. Manuel, monarca que s
e reveloutolerante para os judeus que não podiam pagar.Este monarca está, todavia
,conotado com as páginas mais tristes do Judaísmo em Portugal. Em março de 1497
,em troca da mão da princesa D. Isabel, filha dos Reis Católicos, como cláusulacontr
atual de casamento, é imposta a expulsão de Portugal da comunidade judaicaatravé
s de uma lei que entra em vigor nesse mesmo ano. Mas, habilmente, D.Manuel, para 
impedir uma saída tão numerosa de gentes do nosso País, envolvidona gesta ultram
arina, decreta o batismo forçado de mouros e judeus no prazo dedez meses. Caso n
ão o aceitassem, teriam que abandonar o País. Os menores de14 anos seriam entre
gues a cristãos.Esta medida visava o reforço do poder real. Osjudeus eram um bloco 
fechado detentor de certos privilégios e leis favoráveis noseio da sociedade civil. Tor
ná-los legalmente iguais era uma medida que agradava àmaioria da população. Há t
ambém a demonstração de uma útil tolerância por partedo monarca. Este, porém, m
andará fechar os portos do País para impedir a sangriajudaica: muitos, não querend
o ser cristãos, suicidam-se, por vezes com as suasfamílias. Perto de 20 000 ficaram 
retidos em Lisboa.A partir desta conversãoforçada, passarão a chamar-se cristãos-
novos, tendo um prazo de 20 anos paraabandonar os costumes judaicos e se cristia
nizarem exemplarmente. Mas,clandestinamente ou não, grande parte dos cristãos-
novos mantiveram os seushábitos ancestrais. Em 1499 um alvará régio proíbe a saí
da do País aos cristãos-novos. Todavia, não lhes era limitada a ascensão a cargos p
olíticos ouadministrativos. Ao mesmo tempo, poder-se-iam casar com cristãos-
velhos.
Apesar de uma certa liberdade de consciência (não poderiam ser interrogadosacerc
a da sua crença) e de alguma proteção régia, a situação assumiu contornosdramátic
os na fatídica Páscoa de 1506. Levantaram-se motins populares contra oscristãos-
novos, tendo a população sido instigada pelos frades dominicanos. Sãoperseguidos 
e exterminados cerca de 2000, acabando nas fogueiras do Rossio. Adesconfiança e 
a insegurança dos cristãos-novos, se nunca desaparecera, antesaumentava agora, 
obrigando-os a procurar outras paragens.
Em 1536, D. João III manda instalar o Tribunal do Santo Ofício (Inquisição) emPortu
gal, dentro de uma atmosfera de fanatismo religioso que reconhecia noscristãos-
novos a causa de todos os males de que padecia o País. D. João III, decerta forma, 
orquestrou todo este ambiente de fundamentalismo cristão, temendoos ventos da Re
forma que varriam a Europa. Também houve instigações de grandesfamílias terraten
entes, interessadas em derrubar a burguesia mercantil através daInquisição e da per
seguição aos cristãos-novos (conotados com os grupos demercadores e financeiros)
, no intuito de refazerem as suas grandes fortunas gastasem aventuras militares em 
Marrocos e de reconquistar as hierarquias da nação.Sobo espetro da Inquisição, nun
ca mais os cristãos-novos, maioritariamente judeus,tiveram no reino tranquilidade. C
ontinuaram, clandestinamente, a fugir para osPaíses Baixos, Constantinopla, Norte d
e África, Salónica (Grécia), Itália e Brasil,mantendo laços secretos e apoiando os cris
tãos-novos portugueses. A maioria das1500 vítimas da Inquisição portuguesa eram t
ambém cristãos-novos, tal como umaboa parte dos seus 25 000 processos até à sua 
extinção. No nosso País, o SantoOfício, por exemplo, influirá no desaparecimento do
s ofícios nas regiões de Trás-os-Montes e Beiras, onde os judeus eram os dinamiza
dores da produção de têxteis,sedas e lanifícios. Para além do confisco de bens, os c
ristãos-novos serão tambémvítimas dos atestados de "limpeza de sangue" nas candi
daturas a cargos públicos,militares ou da Igreja, o que os afastava por possuírem co
nfirmação inquisitorial.Oséculo XVII pouco traz de melhor aos cristãos-novos apesar 
da "primavera" de D.João IV e do apoio do Pe. António Vieira. O apoio financeiro e p
olítico dos cristãos-novos à Restauração (através das conexões judaicas de origem 
portuguesa naEuropa) ter-lhes-á permitido uma certa ascensão social e algumas libe
rdades egarantias, iniciando-se o ressurgimento dos grupos mercantis onde aqueles
prosperavam. Com a morte de D. João IV, porém, recomeça o pesadelo inquisitorial
e as perseguições contra os cristãos-novos. O Marquês de Pombal, em 1773, poráfi
m a este clima de instabilidade entre os cristãos-novos, acabando com asperseguiçõ
es e cerceando duramente as atividades do Santo Ofício, desde logo aoeliminar os a
testados de "limpeza de sangue". Os cristãos-novos perdem o estigmada culpabiliza
ção pela ruindade do mundo, a par do domínio da burguesia,eliminando-se as estrut
uras do Antigo Regime. Assim, transforma-se a Inquisição emtribunal de Estado, aca
bando com a encenação daquela instituição clerical contra oscristãos-novos que lent
amente assumirão o seu Judaísmo.Pedro Nunes(matemático), Abraão Usque (editor 
e tradutor), Garcia de Orta (médico enaturalista), António José da Silva (dramaturgo 
que morreu na fogueira inquisitorialum pouco antes das medidas de Pombal), Ribeir
o Sanches (médico), BaruchEspinosa (filósofo) e Rodrigues Lobo (poeta) são alguns 
dos cristãos-novosportugueses com dimensão histórica e cultural, herdeiros de um p
otencial intelectuale científico avançado em relação àquilo que o nosso país produzi
a em termos depensamento, técnicas, artes e letras. Muitas obras e indivíduos se pe
rderam nasteias da Inquisição, apenas por terem nascido cristãos-novos. Calcula-se 
hoje, poroutro lado, que boa parte das vítimas do Holocausto nazi descendiam de cri
stãos-novos portugueses fugidos nos séculos XVI e XVII.

http://www.infopedia.pt/$cristao-novo

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