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Caxias do Sul
2012
SAMUEL MARTINI CASAGRANDE
....................................................................
Prof(a). Ms. Marcio Leandro Wildner
Orientador(a)
...................................................................
Prof(a). Nome
...................................................................
Prof(a). Nome
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, Ildegard Martini Casagrande e
Remi Carlos Casagrande, pelo exemplo de
vida que são e por terem acreditado no meu
sonho.
À minha namorada, Rosiana Boniatti, por todo
o amor, carinho e companheirismo
demonstrados durante toda esta trajetória.
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, Ildegard e Remi, por todo amor, carinho e confiança que
sempre deram a mim. Por me ensinarem a sempre persistir nos meus objetivos e por muitas
vezes terem se sacrificado para dar-me tudo que necessitei. Vocês são minha base, os grandes
responsáveis por eu ter me tornado a pessoa que sou hoje.
À minha namorada, Rosiana, pelo seu amor por mim, pelo conforto nos
momentos difíceis e por me ajudar a acredita que eu era capaz. Pelos conselhos, carinho,
cumplicidade e compreensão nos momentos em que tive que ficar afastado por causa dos
estudos. Sem contar na paciência em ouvir minhas reclamações nos meus momentos de mau
humor. Graças a ti, foi mais fácil passar pelos dias de cansaço e desânimo.
Ao meu orientador, professor Ms. Marcio Leandro Wildner, pelos importantes
ensinamentos jurídicos e científicos passados a mim. Foram seus incentivos, lições,
observações e dedicação na orientação que tornaram possível a concretização desta pesquisa.
A todos os demais professores do curso de Direito da FSG, por transmitirem
seus conhecimentos, mostrarem-se amigos preocupados com o aprendizado do aluno e pelas
lições de vida.
Aos meus grandes amigos da mesa de RPG, que me propiciaram memoráveis
momentos de divertimento nas madrugadas de sexta-feira, quando cruzávamos a barreira da
realidade para nos aventurarmos em mundos habitados por criaturas fantásticas, em busca de
glória, poder e tesouros (e, de quebra, arranjar confusão com algum rei ou mago poderoso)!
A todos os demais amigos e amigas, pelo apoio e pelos grandes momentos que
passamos juntos!
Aos meus amigos felinos, Fredi e Kimi que, mesmo sem falar, me divertiam
com suas brincadeiras e me confortavam com seus ronronares, nas noites em que o presente
trabalho fora elaborado.
“Não acrediteis em uma coisa apenas por ouvir
dizer. Não acrediteis na fé das tradições só porque
foram transmitidas por longas gerações. Não
acrediteis em algo só porque é dito e repetido por
muita gente. Não acrediteis em uma coisa só pelo
testemunho de um sábio antigo. Não acrediteis em
uma coisa só porque as probabilidades a favorecem
ou porque um longo hábito vos leva a tê-la por
verdadeira. Não acrediteis no que imaginastes
pensando que um ser superior a revelou. Não
acrediteis em coisa alguma apenas pela autoridade
dos mais velhos ou dos vossos instrutores. Mas,
aquilo que vós mesmos experimentastes, aquilo que
vós mesmos provastes e aquilo que vós mesmos
reconhecestes como verdadeiro, aquilo que
corresponde ao vosso bem e ao bem dos outros, isto,
sim, deveis aceitar, e, por isso, moldar a vossa
conduta.”
Siddhartha Gautama, o Buda
RESUMO
Este estudo tem como objetivo analisar a incidência do imposto sobre a renda nos ganhos
líquidos em renda variável face aos princípios constitucionais tributários informadores do
imposto de renda, isto é, os princípios da capacidade contributiva, generalidade,
universalidade e progressividade. Para tanto, parte-se do estudo do instituto do imposto de
renda, abordando os conceitos de renda, bem como os pressupostos para a incidência de tal
tributo. Feita esta primeira abordagem, serão examinados os princípios constitucionais
tributários informadores do imposto de renda. Por fim, é analisada a sistemática do imposto
de renda nos ganhos em renda variável e, aplicando os conceitos anteriormente estudados,
passa-se a verificar se o referido tributo é constitucional ou não.
1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 12
2 UM TRIBUTO CHAMADO IMPOSTO DE RENDA ..................................................... 15
2.1 Aspectos históricos do Imposto Sobre a Renda no Exterior ........................................... 16
2.2 Aspectos históricos do Imposto Sobre a Renda no Brasil ............................................... 19
2.3 O Imposto Sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza – Considerações Iniciais . 21
2.4 O Fato Gerador do Imposto Sobre a Renda.................................................................... 25
2.4.1 Do conceito de renda .................................................................................................. 26
2.4.2 Diferenças entre renda e rendimento ........................................................................... 32
2.4.3 A expressão “proventos de qualquer natureza” ............................................................ 33
2.4.4 Da aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica ............................................... 35
2.5 O Aspecto Temporal do Fato Gerador do Imposto de Renda ......................................... 37
2.5.1 Os modos temporais .................................................................................................... 40
3 OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS TRIBUTÁRIOS ORIENTADORES DO
IMPOSTO DE RENDA ....................................................................................................... 43
3.1 A Importância dos Princípios no Ordenamento Jurídico Brasileiro ................................ 43
3.1.1 Diferenças entre princípios e regras............................................................................. 46
3.2 Os Princípios Aplicados ao Direito Tributário ............................................................... 48
3.3 O Princípio da Segurança Jurídica ................................................................................. 50
3.4 O Princípio do Não-Confisco ........................................................................................ 55
3.5 O Princípio da Capacidade Contributiva ........................................................................ 59
3.5.1 Capacidade contributiva e o princípio da igualdade ..................................................... 61
3.5.2 O sentido da expressão “sempre que possível” ............................................................ 62
3.5.3 Capacidade econômica x capacidade contributiva ....................................................... 63
3.5.4 O objeto da capacidade contributiva ............................................................................ 65
3.5.5 Capacidade contributiva e o mínimo vital ................................................................... 68
3.6 O Princípio da Generalidade.......................................................................................... 71
3.7 O Princípio da Universalidade ....................................................................................... 73
3.8 O Princípio da Progressividade...................................................................................... 75
4 O IMPOSTO DE RENDA E OS GANHOS LÍQUIDOS AUFERIDOS EM RENDA
VARIÁVEL ......................................................................................................................... 80
4.1 O Regime de Tributação do Imposto de Renda nos Ganhos Líquidos em Renda
Variável ............................................................................................................................... 83
4.1.1 O fato gerador ............................................................................................................. 83
4.1.2 A base de cálculo do imposto de renda nos ganhos em renda variável ......................... 84
4.1.3 A alíquota e o recolhimento do imposto de renda nos ganhos em renda variável ......... 88
4.2 Imposto de Renda nos Ganhos em Renda Variável: Tributação (In)Constitucional? ...... 91
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................... 98
REFERÊNCIAS ................................................................................................................ 105
12
1 INTRODUÇÃO
teorias sobre a renda mais aceitas e estudadas pela literatura especializada. Como não poderia
deixar de ser, neste capítulo inicial também é estudado o fato gerador do imposto de renda e
sua sistemática de apuração.
Outra questão pertinente a ser abordada no primeiro capítulo refere-se ao
aspecto temporal do imposto de renda, isto é, sua periodicidade. Tal assunto também merece
atenção, pois enquanto a Declaração de Ajuste do imposto de renda é anual, o recolhimento
do imposto de renda sobre os ganhos em renda variável dá-se de forma mensal. Então, ver-se-
á se o que diz a Constituição, legislação infraconstitucional e doutrina a respeito desta
periodicidade aplicada ao imposto de renda.
Na segunda parte da pesquisa serão abordados os princípios constitucionais
tributários. Vale dizer, os princípios constitucionais, não somente os tributários, formam o
“espírito” do ordenamento jurídico, e o legislador, intérprete e aplicador da lei deverão
sempre observá-los. Então, por óbvio, devido à ampla gama de princípios existentes, serão
abordados somente aqueles princípios informadores do imposto de renda, isto é, os princípios
da capacidade contributiva, generalidade, progressividade e universalidade. Outro princípio a
ser abordado é o princípio da vedação aos efeitos de confisco. Isto porque, como poderá ser
visto no presente estudo, este princípio informa todos os tributos, vez que nenhum poderá
apresentar efeitos confiscatórios, embora tal efeito possa ser de difícil constatação no caso
concreto. Outrossim, devido a sua importância para o ordenamento jurídico e, diga-se, para a
existência do próprio Estado Democrático de Direito, também será abordado o princípio (ou
sobreprincípio) da segurança jurídica.
Na terceira parte desta pesquisa tratar-se-á, especificamente, do imposto de
renda sobre os ganhos líquidos auferidos em operações de renda variável. Com efeito, será
feita uma breve abordagem da legislação que regula tal imposto, bem como demonstrar-se-á
sua sistemática.
Ainda, no terceiro capítulo, complementando a matéria vista de forma geral na
primeira parte da pesquisa, o imposto de renda sobre os ganhos líquidos em renda variável
será estudado, como o seu fato gerador, formação da base de cálculo, alíquota aplicada, bem
como será visto como é realizado o recolhimento desse imposto. Encerrando a terceira parte
da pesquisa, realizar-se-á ponderações acerca dos fatores contrários e favoráveis à
(in)constitucionalidade do tributo em questão.
Neste diapasão, será feito um confronto entre as regras de incidência do
imposto de renda e a sistemática do imposto de renda dos ganhos em renda variável com
princípios constitucionais tributários. Nesta parte, também serão apresentadas as posições dos
14
especialistas a respeito do imposto de renda sobre os ganhos em renda variável, bem como a
posição dos tribunais brasileiros sobre o assunto.
Vale ressaltar, ainda, que este estudo não irá abordar toda a legislação atinente
ao imposto de renda, mas tão-somente àquela que afeta diretamente a matéria em estudo. Isto
porque a legislação do referido imposto é ampla e complexa, sendo que abordá-la por
completo fugiria ao escopo dessa pesquisa. No entanto, as normas mais relevantes ao tema
serão abordadas.
Finalmente, nas considerações finais desta pesquisa, far-se-á um juízo crítico
do imposto de renda sobre os ganhos em renda variável, com base nos dados levantados neste
estudo, demonstrando, assim, se o tributo em estudo, no tocante ao objeto desta pesquisa, é
constitucional ou não.
15
1
SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2011.
2
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL. Estudos Econômico-Tributários.
Disponível em: <http://www.receita.fazenda.gov.br/Historico/EstTributários/Estatisticas/default.htm>. Acesso
em: 03 de jan. de 2012.
16
3
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 32.ed. São Paulo: Malheiros, 2011.
4
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL. Primórdios do imposto de renda no Brasil. Disponível em:
<http://www.receita.fazenda.gov.br/Memoria/irpf/historia/histPriomordiosBrasil.asp>. Acesso em: 03 de jan.
2012.
5
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL, 2012, loc. cit.
6
CORREA, Walter Barbosa. Subsídios para a história legislativa do Imposto de Renda no Brasil In: Estudos
sobre o Imposto de Renda (em memória de Henry Tilbery). São Paulo: Resenha Tributária, 1994.
7
LEMKE, Gisele. Imposto de renda: os conceitos de renda e de disponibilidade econômica e jurídica. São
Paulo: Dialética, 1998.
17
Decima Scalata, em que decima era a denominação dada aos impostos; e scalata significava
algo gradual, progressivo. Contudo, a decima scalata não incidia sobre a renda, mas sim sobre
sua capitalização. Assim, a renda servia apenas como índice para apurar o patrimônio
necessário à sua produção; era sobre este patrimônio que a tributação incidia. É importante
salientar, ainda, que a decima scalata teve uma curta duração.8
Embora haja discordância quanto ao momento exato da criação do imposto
sobre a renda no mundo, tem-se que o surgimento formal do imposto de renda deu-se com o
advento do Estado Moderno, na Inglaterra do século XVIII. Neste período, Napoleão
Bonaparte ameaçava a Inglaterra, por isso, os britânicos necessitavam de recursos para
financiar a guerra iminente.9
Em 1798, o então primeiro-ministro britânico, Willian Pitt, apresentou ao
Parlamento Inglês uma proposta para modificar as chamadas assessed taxes, transformando
este tributo – que originalmente era uma taxação baseada nos gastos do indivíduo – num
imposto sobre a renda. Com as modificações, o tributo passaria a ser um imposto temporário
que incidiria sobre as fontes de renda mais importantes. Surgia, deste modo, o imposto sobre a
renda, denominado income tax, cujo montante arrecadado seria utilizado para financiar a
guerra.10
Já em 1802, por causa da paz transitória entre Inglaterra e França, o imposto de
renda foi suprimido. No entanto, um ano após, as hostilidades recomeçaram e, com isto, o
imposto de renda ressurgiu, com uma série de aperfeiçoamentos, tais como: a) passou-se a
estabelecer e tributar categorias distintas de rendimento, de acordo com sua origem; b)
implantação de cobrança na fonte; c) isenção de rendas de pequeno valor; e d) dedução para
encargos de família. 11
Em 1816, com a queda de Napoleão em Waterloo, o imposto de renda foi
extinto. Porém, com o passar dos anos, a Inglaterra começou a entrar num período de crises e
grandes déficits orçamentários. Então, em 1842, o Parlamento Inglês concordou com a volta
do imposto de renda, numa tentativa de reestabelecer o caixa do país. Há registro de discursos
de políticos e ministros que se comprometiam a extinguir o imposto quando fosse possível. 12
8
CAMPOS, Dejalma de. O Doutor Henry Tilbery e o imposto de renda In: MARTINS, Ives Gandra da Silva
(Coord.). Imposto de renda: conceitos, princípios, comentários. 2.ed. São Paulo: Atlas, 1996.
9
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL. Primórdios do imposto de renda no Mundo. Disponível em:
<http://www.receita.fazenda.gov.br/Memoria/irpf/historia/histPriomordiosMundo.asp> Acesso em: 03 de jan.
2012.
10
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL, 2012, loc. cit.
11
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL, 2012, loc. cit.
12
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL, 2012, loc. cit.
18
13
LEONETTI, Carlos Araújo. O imposto sobre a renda como instrumento de justiça social no Brasil. Barueri:
Manole, 2003.
14
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL. Primórdios do imposto de renda no mundo, ibid.
15
LEONETTI, ibid.
16
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL, 2012, loc. cit.
19
17
Tratado dos Impostos apud LEMKE, Gisele. Imposto de renda: os conceitos de renda e de disponibilidade
econômica e jurídica. São Paulo : Dialética, 1998, p. 14.
18
LEMKE, ibid., p. 14.
19
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL. Primórdios do imposto de renda no Brasil, ibid.
20
BORBA, Bruna Estima. Imposto de renda das pessoas físicas. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 5.
20
imposto, bem como propostas de adoção. Defendia o Ministro que o imposto sobre a renda
seria mais justo do que o imposto indireto, muito comum na sua época, por ser de fácil
implementação e apresentar resultados imediatos. Suas ideias, no entanto, não foram postas
em prática.21
Nos anos subsequentes, diversas foram as tentativas em instituir o imposto
sobre a renda; sem sucesso, porém. A principal justificativa dos parlamentares contrários era a
mesma de outrora: o Brasil não estaria preparado para a instituição de um imposto tão
complexo e cuja cobrança seria muito difícil de ser realizada. Entretanto, após tantas
tentativas, o imposto sobre a renda finalmente foi instituído no Brasil por meio do Decreto n°
4.625 de 31 de dezembro de 1922. Para aprovação do novo tributo pesou o fato de o imposto
sobre a renda participar cada vez mais da receita tributária dos países em que foi instituído.
Além disso, de acordo com parlamentares, governantes e juristas da época, o imposto sobre a
renda seria um importante meio de angariar recursos e de possuir um sistema tributário mais
justo.22
Por ser um imposto complexo, o Estado iniciou estudos para melhor elaborá-lo.
Coube ao engenheiro Francisco Tito de Souza Reis, estudioso das questões tributárias,
elaborar melhorias ao imposto sobre a renda. Nos anos subsequentes à implantação do
imposto foram realizadas importantes alterações ao imposto de renda, como a classificação
dos rendimentos em categorias e a tributação do onerado segundo sua capacidade
contributiva.23
Até então, o imposto sobre a renda era matéria tratada pela lei orçamentária do
país. Somente a partir da Constituição Federal de 1934 o imposto de renda passou a ter nível
constitucional, fazendo parte da relação dos tributos de competência da União. A Constituição
de 1967 modificou sobremaneira a redação relativa ao imposto de renda, dando competência à
União em instituir impostos sobre “renda e proventos de qualquer natureza, salvo ajuda de
custo e diárias pagas pelos cofres públicos”. 24 Tal alteração fez com que se criassem no Brasil
duas classes de cidadãos: aqueles que pegavam imposto de renda e aqueles que não pagavam
o imposto. Isto porque, do valor total dos vencimentos percebidos, os contribuintes ligados ao
Poder Público recebiam um pequeno valor a título de salário, sendo que o montante maior era
recebido a título de ajuda de custo e diárias; desta forma, esta classe de contribuintes escapava
da tributação.
21
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL, 2012, loc. cit..
22
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL, 2012, loc. cit..
23
SECRETARIA DA RECEITA FEDERAL, 2012, loc. cit..
24
Constituição Federal de 1987 - Artigo 21, IV. Onde referência
21
Em 1985, por meio da Lei n° 7.450, a tributação da renda passou a ser feita a
partir das chamadas “bases correntes”. Este sistema tinha uma sistemática semelhante ao
PAYE, ou seja, o imposto passava a ser devido à medida que os rendimentos eram auferidos.
Entretanto, mesmo sendo apenas informativa, ainda era necessário que o contribuinte
apresentasse declaração de sua renda. Detalhe interessante era a progressividade de tal
imposto: para as pessoas físicas, as alíquotas variavam de 5% a 45%.25
Com a promulgação da Constituição Federal, em 1988, a antiga divisão entre
os contribuintes criada pela Constituição de 1934 foi eliminada. O novel texto constitucional
continuou a outorgar competência à União no que se refere à instituição do imposto sobre a
renda e proventos de qualquer natureza, todavia a instituição de tal imposto deverá sempre ser
pautada nos princípios constitucionais tributários da generalidade, da progressividade, da
universalidade e da capacidade contributiva.
Segundo Bruna Estima Borba,26 o imposto de renda quando de sua criação,
"não foi criado para satisfazer os anseios de equidade ou de justiça distributiva (...). Ao
contrário, tinha fins arrecadatórios (...)". Atualmente, em tese, o imposto de renda busca, além
da arrecadação de dinheiro aos cofres públicos, a concretização dos objetivos supracitados.
Feito este breve apanhado histórico acerca do imposto sobre a renda, tanto em
relação ao contexto internacional quanto ao interno, nota-se que, inicialmente, o imposto foi
instituído com o intuito de financiar guerras; depois, foi utilizado pelo Estado como meio para
arrecadar dinheiro em tempos de crise econômica; até finalmente tornar-se um tributo
permanente, quando evoluiria até se tornar a principal fonte de recursos para o Estado.
25
QUEIROZ, Mary Elbe. Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza – tributação das pessoas
físicas In: SANTI, Eurico Marcos Diniz de (Coord.). Curso de especialização em direito tributário: estudos
analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho. Rio de Janeiro : Forense, 2005, p. 451.
26
BORBA, ibid., p. 5.
27
Art. 153, caput e III da Constituição Federal de 1988: “Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:
(...) III - renda e proventos de qualquer natureza; (...)”.
22
28
MACHADO, ibid., p. 319.
29
Art. 153, §2º, I, da Constituição Federal de 1988: “I - será informado pelos critérios da generalidade, da
universalidade e da progressividade, na forma da lei;”.
30
Art. 145, §1º, da Constituição Federal de 1988: “§ 1º - Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal
e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária,
especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos
termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte”.
31
Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato
gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:
I - de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;
II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no
inciso anterior.
§ 1o A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição
jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. (Incluído pela Lcp nº 104, de
10.1.2001)
§ 2o Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento
em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo. (Incluído pela Lcp
nº 104, de 10.1.2001)
Art. 44. A base de cálculo do imposto é o montante, real, arbitrado ou presumido, da renda ou dos proventos
tributáveis.
Art. 45. Contribuinte do imposto é o titular da disponibilidade a que se refere o artigo 43, sem prejuízo de
atribuir a lei essa condição ao possuidor, a qualquer título, dos bens produtores de renda ou dos proventos
tributáveis.
Parágrafo único. A lei pode atribuir à fonte pagadora da renda ou dos proventos tributáveis a condição de
responsável pelo imposto cuja retenção e recolhimento lhe caibam.
32
CARRAZZA, Roque Antônio. Imposto sobre a renda: perfil constitucional e temas específicos. 3.ed. São
Paulo: Malheiros, 2009, p. 52.
23
33
QUEIROZ, ibid., p. 456-457.
34
O responsável tributário é um terceiro que, por definição legal, terá a obrigação de reter e recolher o tributo.
Nesta esteira, existe o responsável substituto e o responsável por transferência.
A substituição ocorre quando, ao criar uma hipótese de incidência tributária descrevendo a conduta a ser
praticada pelo contribuinte, o legislador define que, sendo concretizada aquela conduta, outra pessoa seja
responsável pelo recolhimento do tributo devido. Como exemplo, pode-se citar a legislação do ICMS. Ela
estipula que o imposto devido pela venda realizada por agricultores a comerciantes seja pago por estes. Neste
caso, quem gerou a saída da mercadoria (fato gerador do tributo) foi o agricultor, mas quem figura no polo
passivo da obrigação é o comerciante.
A responsabilidade por transferência, a seu turno, envolve dois fatos distintos: aquele que faz nascer a pretensão
tributária e um fato jurídico. Este outro fato passará a obrigação para o responsável por transferência. Assim,
Luís Eduardo Schoueri explica que a responsabilidade por transferência surgirá quando “o legislador, embora
definido um sujeito passivo pela verificação do fato jurídico tributário, determina, em virtude de outro fato
(diverso do fato jurídico tributário) que outra pessoa passará a ser responsável (solidariamente ou não) pelo
recolhimento do tributo devido pelo primeiro”.
A título de exemplo deste caso, pode-se citar a responsabilidade devido à aquisição de um estabelecimento. A
empresa era devedora de tributo e, no momento do fato gerador deles, o adquirente não existia na relação
tributária. Porém, devido à aquisição do estabelecimento, passa a responder por seus tributos.
(SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 1ª Ed. São Paulo : Saraiva, 2011, pp. 478-479.)
35
Cf. Art. 121, II, do Código Tributário Nacional: “II - responsável, quando, sem revestir a condição de
contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei”.
36
MARTINS, Marcelo Guerra. Considerações em torno do aspecto temporal do imposto sobre a renda. In:
Revista CEJ. Brasília, DF, v. 9, N.º 28, p. 84-89, jan./mar. 2005. Disponível em:
<http://www2.cjf.jus.br/ojs2/index.php/cej/article/viewFile/650/830>. Acesso em: 10 de mar. 2012.
24
37
QUEIROZ, ibid., p. 469.
38
QUEIROZ, ibid., p. 461.
39
QUEIROZ, loc. cit.
40
QUEIROZ, ibid., p. 469.
41
MARTINS, ibid.
25
42
Tabela progressiva mensal com as alíquotas e base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Física (ano-
calendário 2012), de acordo com a Lei 12.469 de Agosto de 2011. Disponível em
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12469.htm>. Acesso em: 10 mar. 2012.
43
Art. 46 da Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010: “Art. 46. Os ganhos líquidos auferidos em alienações
ocorridas nos mercados à vista, em operações liquidadas nos mercados de opções e a termo e em ajustes diários
apurados nos mercados futuros sujeitam-se ao imposto sobre a renda à alíquota de 15% (quinze por cento)”.
44
CASSONE, Vittorio. Direito Tributário. 12.ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 249.
45
SOUSA, Rubens Gomes. Pareceres 3: Imposto de renda. Coordenação IBET, Instituto Brasileiro de Estudos
Tributários. Edição Póstuma. São Paulo: Resenha Tributária, 1976, p. 276-277.
26
Roque Antonio Carrazza afirma: “estamos convencidos, porém, de que há uma noção
constitucional de renda, que não pode ser desconsiderada pelo legislador infraconstitucional
(seja o complementar nacional, seja o ordinário federal)”. 46
Como se não bastasse, os juristas também divergem quanto ao aspecto
temporal do imposto de renda. Há uma celeuma na doutrina no que se refere à periodicidade
do fato gerador, isto é, qual o lapso de tempo necessário para considerar a aquisição de
disponibilidade da renda como efetivo acréscimo patrimonial. Neste sentido, há aqueles que
defendem um lapso de tempo anual, como Roque Antonio Carrazza, ao afirmar que “o fato
imponível do IR só ocorre ao cabo do exercício financeiro, acompanhando, destarte, o ciclo
das leis orçamentárias e do próprio funcionamento do Estado Brasileiro”.47 Por outro lado, há
aqueles que defende caber à lei ordinária estabelecer um período, como Ricardo Mariz de
Oliveira, que ensina que “o imposto sobre a renda pode incidir sobre qualquer acréscimo
patrimonial obtido em cada período de tempo previsto em lei”. 48
Sendo assim, para melhor compreender o imposto sobre a renda nos ganhos
auferidos em renda variável, no intuito de verificar se a incidência do mesmo, nesta hipótese,
é, ou não, constitucional, é necessário que antes se entenda com precisão o fato gerador do
imposto sobre a renda. Para tal, faz-se mister conhecer o conceito de renda, investigar o que
vem a ser a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica e, ainda, verificar se existe um
período mínimo para a aferição do acréscimo patrimonial que enseja a tributação pelo imposto
em exame.
46
CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 27. ed. rev. ampl. e atual. até a
Emenda Constitucional n. 67/2010. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 759.
47
CARRAZZA, id., 2009, p. 132.
48
OLIVEIRA. Ricardo Mariz de. Princípios fundamentais do imposto de renda. In: Curso de especialização em
direito tributário: estudos analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho. Rio de Janeiro: Forense,
2005, nota 23, p. 778.
27
49
BIFANO, Elidie Palma. O mercado financeiro e o imposto sobre a renda. 2.ed. São Paulo: Quartier Latin,
2011, p. 121.
50
BIFANO, ibid., p. 123.
51
Alguns dos principais estudiosos desta teoria são: Adam Smith, Alfred Marshall, Jean Say, John Stuart Mill e
Irving Fischer.
52
Renda realizada seria o seu montante respectivo transformado em moeda ou passível de avaliação monetária;
renda separada é a renda autônoma, que possibilita a sua realização.
53
BELSUNCE, Horácio A. Garcia. El Concepto de credito em la doctrina y em El derecho tributario. Buenos
Aires : Depalma, 1967. In: LEMKE, Gisele. Imposto de renda: os conceitos de renda e de disponibilidade
econômica e jurídica. São Paulo: Dialética, 1998, p. 17-18.
54
Isto é, deve subsistir após o ato de produção da renda.
28
indivíduo - contudo, não se considera o poder de compra. Neste caso, considera-se a renda
líquida, que seria a renda bruta deduzidos os gastos necessários na obtenção, conservação e
manutenção do capital; porém, os gastos necessários à aquisição do capital não são
dedutíveis.55
A Teoria da Renda-Acréscimo Patrimonial56 define que a renda é a riqueza
nova, originada do emprego do capital, do trabalho ou do esforço de ambos. De acordo com
Horácio Belsunce, citado por Gisele Lemke, esta teoria não se baseia em um conceito
econômico de renda, pois a referida teoria busca atender aos fins fiscais. Isto fez com que
houvesse uma expansão no conceito de renda, objetivando atender às necessidades do Fisco.
Desta feita, na Teoria da Renda-Acréscimo a renda é compreendida como sendo todo o
ingresso de riqueza passível de avaliação em moeda; a fonte de riqueza pode ser transitória,
periódica ou excepcional, não havendo necessidade de a fonte produtora permanecer intacta
após o ato de produção. Assim como as demais teorias, não é necessária a realização e
separação da riqueza ingressa. Em derradeiro, a Teoria da Renda-Acréscimo considera a
renda como sendo resultado da renda bruta diminuída das despesas para a obtenção do
ingresso e manutenção da fonte produtora.57
A seu turno, a Teoria Legalista defende que o conceito de renda é aquilo que a
lei determinar, isto é, o legislador federal teria ampla competência para definir o conceito de
renda, devendo ater-se somente aos objetivos socioeconômicos delineados pela a legislação
tributária. Segundo Gisele Lemke, a Teoria Legalista pode ser analisada a partir de seu
sentido estrito ou de seu sentido amplo. Em sentido estrito, o ordenamento jurídico tem
autonomia para definir a renda, sendo que a legislação ordinária deverá atentar-se aos
preceitos constitucionais. Já em sentido amplo, entende-se que a legislação ordinária é livre
para definir o que pode ser considerado renda para fins de incidência do imposto sobre a
renda.58
Dino Jarach, partidário da teoria legalista, defende que não existe um conceito
de renda a priori a ser adotado pela legislação. Para ele, o conceito de renda decorre do
55
LEMKE, ibid., p. 21.
56
Segundo José Artur Lima Gonçalves, acréscimo patrimonial é o incremento material ou imaterial,
representado por qualquer espécie de direitos ou bens, de qualquer natureza; ou seja, é a riqueza nova
incorporada ao patrimônio da pessoa.
57
LEMKE, ibid., p. 23.
58
LEMKE, ibid., p. 30.
29
próprio ordenamento jurídico do país, tendo (o conceito) que respeitar somente o princípio da
igualdade e os critérios de política fiscal adotados pelo legislador.59
Outro defensor da teoria legalista, Rubens Gomes de Sousa entende que o
conceito de renda é dado pela legislação de cada país. Afirma o jurista que o conceito de
renda estaria posto de forma detalhada no art. 43 do Código Tributário Nacional. 60 Para o
citado autor, a renda tratar-se-ia de aquisição de riqueza nova, o que estaria implícito na
palavra “produto”.
Neste sentido, Rubens Gomes de Souza destaca:
Assim, no art. 43, o CTN define como segue o imposto de renda, dentro da sua
técnica de conceituar os diferentes impostos pelo fato gerador da obrigação de pagá-
los (CTN, art. 4º) [...] Esta circunstância – de tratar-se de riqueza nova – está
implícita, no caso da “renda”, na palavra “produto” (CTN, art. 43, I), que envolve a
noção de algo novo produzido por, ou seja, decorrente de, algo existente: a fonte
produtora (capital, trabalho ou combinação de ambos). 61
59
JARACH, Dino. Finanzas Públicas y Derecho Tributario. In: LEMKE, Gisele. Imposto de renda: os
conceitos de renda e de disponibilidade econômica e jurídica. São Paulo: Dialética, 1998, p. 59.
60
SOUSA, ibid., p. 276-277.
61
SOUSA, ibid., p. 276-277.
62
A evolução do conceito de rendimento tributável; Imposto de renda: tratamento tributário dos títulos de renda
fixa; Imposto de renda: despesas não dedutíveis pelas pessoas jurídicas apud LEMKE, Gisele. Imposto de
renda: os conceitos de renda e de disponibilidade econômica e jurídica. São Paulo : Dialética, 1998, p. 24.
63
QUEIROZ, Luiz Cesar Souza de. Imposto sobre a renda: requisitos para uma tributação constitucional. Rio
de Janeiro : Forense, 2003, p. 119.
64
CARRAZZA, id., 2011, p. 759.
30
65
CARRAZZA, ibid., p. 759.
66
MACHADO, ibid., p. 319.
67
CARRAZZA, ibid., p. 760.
68
MACHADO, ibid., p. 59, (os grifos estão no original).
31
Portanto, embora não haja um consenso na doutrina sobre qual teoria foi
adotada pelo ordenamento brasileiro, pode-se dizer que, abstraindo as nuances de cada teoria,
elas convergem num ponto: para o conceito de renda, é fundamental que haja o aumento de
patrimônio, isto é, o ingresso de riqueza nova no patrimônio existente da pessoa. Inclusive, é a
interpretação que se dá da hipótese de incidência do imposto de renda, a partir do art. 43 do
CTN.73
69
MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 27.ed. São Paulo: Malheiros, 2010, p.
60.
70
QUEIROZ, id., 2003, p. 239.
71
SAKAKIHARA, Zuudi. Código tributário nacional comentado. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2004, p.155.
72
SAKAKIHARA, loc. cit.
73
PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário. 11.ed. São Paulo: Saraiva, 2005,
p.156.
32
Na análise realizada no subitem anterior foi visto que não é pacífica a definição
do conceito de renda, existindo diversas correntes que buscam interpretar e determinar tal
definição.
Pode ocorrer, ainda, certa confusão entre o que os conceitos de rendimento e de
renda. Entretanto, é preciso salientar que o conceito de rendimento não deve ser confundido
com o conceito de renda. Juridicamente, há diferenças.
O rendimento é o ganho isolado; a remuneração advinda de qualquer fonte que
produza riqueza e que independe do fator tempo. A renda, por sua vez, é a riqueza excedente
incorporada ao patrimônio da pessoa, obtida em determinado espaço de tempo, deduzidos os
gastos para sua manutenção e obtenção. Logo, não seria qualquer ingresso econômico que
será considerado renda, mas sim aquele (ingresso econômico) que efetivamente traduzir-se
em acréscimo patrimonial. 74
Noutras palavras, rendimento seria tudo aquilo que aumenta o patrimônio 75 da
pessoa, como: salário, aplicações financeiras, rendimentos de poupança, entre outros; ao passo
74
DERZI, Misabel. Tributação da renda versus tributação do patrimônio. In: LEMKE, Gisele. Imposto de
renda: os conceitos de renda e de disponibilidade econômica e jurídica. São Paulo: Dialética, 1998, p. 76.
75
Segundo Antônio Chaves, patrimônio é o “conjunto de relações jurídicas positivas (patrimônio ativo) e
negativas (patrimônio passivo) pertencentes a uma pessoa física ou jurídica, dotado de utilidade econômica e
suscetível de avaliação pecuniária”. Introdução ao Direito Civil apud LEMKE, Gisele. Imposto de renda: os
conceitos de renda e de disponibilidade econômica e jurídica. São Paulo : Dialética, 1998, p. 66.
33
que a renda é o acréscimo patrimonial efetivo, isto é, o saldo entre as entradas e saídas do
patrimônio, dentro de um determinado período.76
Por fim, cabe referir a observação de Mary Elbe Queiroz, de que a legislação
ordinária define rendimento como sendo os valores provenientes de determinada fonte
pagadora que são recebidos pelo contribuinte; já a renda seria a soma de todos os rendimentos
percebidos pelo contribuinte. 77
Portanto, como é possível observar, renda e rendimento são institutos
diferentes, com conceitos diferentes. Sendo assim, para os fins desta pesquisa, adotar-se-á o
conceito de rendimento baseado na noção de que este é a remuneração recebida isoladamente
das mais diversas fontes de riqueza, como o rendimento obtido do salário ou o rendimento
auferido em operações financeiras.
76
COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 11.ed. Rio de Janeiro: Forense,
2010, p. 439-430.
77
QUEIROZ, Mary Elbe. Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza: tributação das pessoas físicas.
In: DE SANTI, Eurico Marcos Diniz (Coord.). Curso de especialização em direito tributário: estudos
analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 467.
78
Cf. Art. 43 do Código Tributário Nacional: “O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos
de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:”
79
Cf. Art. 43, II do Código Tributário Nacional: “II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os
acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior”.
80
LEMKE, ibid., p. 65.
34
81
SOUSA, Rubens Gomes. Pareceres 1: Imposto de renda. Instituto Brasileiro de Estudos Tributários
(Coord.). Edição Póstuma. São Paulo : Resenha Tributária, 1975, 17-58.
82
AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1997, p. 57.
83
ANDRADE. Mairo Caldeira de. Imposto sobre a renda: A aquisição de disponibilidade jurídica ou econômica.
In: LEMKE, Gisele. Imposto de renda: os conceitos de renda e de disponibilidade econômica e jurídica. São
Paulo: Dialética, 1998, p. 65.
84
MOSQUERA, Roberto Quiroga. O regime jurídico tributário das aplicações financeiras realizadas no mercado
financeiro e de capitais brasileiro In: Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo,SP, N.º 9, p. 59-68,
jun. 1996, p. 58.
85
MOSQUERA, ibid., p. 58.
86
LEMKE, ibid., p. 68-69.
35
“proventos de qualquer natureza” qualquer outro acréscimo patrimonial, também devendo ser
medido dentro de um lapso temporal, e advindo de outra fonte diferente do capital, do
trabalho ou da combinação de ambos.
87
MACHADO, ibid., p. 321.
88
HOUAISS, Antônio; VILLAR, Mauro de Salles. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro:
Objetiva, 2001.
89
Art. 1.1228 do Código Civil de 2002: “Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da
coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha”.
36
90
ROSENVALD, Nelson; FARIAS, Cristiano Chaves. Direitos reais. 6.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010,
p. 189.
91
PAULSEN, Leandro; MELO, José Eduardo Soares de. Impostos federais, estaduais e municipais. 5. ed.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 47.
92
MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). O fato gerador do imposto sobre a renda e proventos de qualquer
natureza. Caderno de Pesquisas Tributárias. São Paulo, SP, v. 11, Resenha Tributária/Centro de Extensão
Universitária, 1986, p. 266-267.
93
SOUSA, Rubens Gomes. Pareceres 1: Imposto de renda. Coordenação IBET, Instituto Brasileiro de Estudos
Tributários. Edição Póstuma. São Paulo : Resenha Tributária, 1975, p. 248.
94
SOUSA, ibid., 1975, p. 248.
37
vista – até então existe a disponibilidade jurídica – que faculta ao seu portador transformá-lo
em disponibilidade econômica, convertendo o título em moeda. Logo, na disponibilidade
jurídica existe somente a posse de direito da renda, representado por um título jurídico que
goza de liquidez e exigibilidade, cujo contribuinte tem o direito de convertê-lo na sua
expressão monetária correspondente.
Em poucas linhas, Hugo de Brito Machado resume a diferença entre
disponibilidade econômica e jurídica da seguinte forma: i) disponibilidade econômica nasce
do recebimento do valor que vem acrescentar ao patrimônio do contribuinte; ii)
disponibilidade jurídica nasce do simples crédito de valor do qual o contribuinte passa,
juridicamente, a dispor, embora este valor ainda não lhe esteja em mãos. 95
Destarte, pode-se concluir que na disponibilidade econômica o contribuinte já
incorporou ao seu patrimônio o montante que lhe é devido, gerando o acréscimo patrimonial.
A seu turno, a disponibilidade jurídica representa um crédito exigível, porém ainda não
colhido, isto é, há uma relação obrigacional de débito e crédito – seja por força de lei ou
contrato - onde o devedor está obrigado a cumprir com a prestação, sob pena de execução, e o
credor tem o direito ao crédito, que será acrescido ao seu patrimônio. 96
De acordo com a análise realizada, foi visto que o fato gerador do imposto de
renda é a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica da renda. Logo, muito embora
os juristas não sejam unânimes em conceituar a renda, eles concordam que renda é a riqueza
nova incorporada ao patrimônio da pessoa. Também é do entendimento da doutrina que o
aferimento do acréscimo patrimonial havido pela pessoa implica em realizar a análise do
patrimônio em dois períodos de tempo diferentes.
Conhecer a periodicidade é crucial para a análise da incidência do imposto de
renda nos ganhos em renda variável. Portanto, sabendo da importância do aspecto temporal
para a incidência do imposto de renda, este subitem não pretende esgotar o assunto, mas, sim,
tem o intuito de esclarecer, brevemente, qual o posicionamento da doutrina referente ao
critério temporal.
Nesse sentido, indaga-se: qual é o período de tempo que deve ser levado em
consideração para a análise da alteração patrimonial? Como será apresentado a seguir, alguns
95
MACHADO, ibid., p. 321.
96
BIFANO, ibid., p. 131.
38
doutrinadores entendem que este período é anual, ao passo que outros defendem que cabe ao
legislador ordinário, ao editar a regulamentação do tributo, definir um período, ainda que
breve.
Então, referente a este lapso de tempo necessário, Mary Elbe Queiroz explica
que não se deve estabelecer um intervalo muito curto, pois poderia descaracterizar o imposto
de renda. Além disso, para que o imposto de renda atenda aos preceitos constitucionais, deve
haver um lapso de tempo suficiente para permitir a aferição do acréscimo patrimonial. 97
A mencionada autora continua o seu raciocínio afirmando que a incidência do
imposto de renda para as pessoas físicas é anual, com o seu fato gerador se perfectibilizando
no dia 31 de dezembro de cada ano, alcançando todas as rendas e/ou proventos e despesas
compreendidas entre 1º de janeiro e 31 de dezembro.98
Já Paulo Ayres Barreto afirma que a norma constitucional estipula o prazo de
um ano para verificar se houve o efetivo acréscimo patrimonial, ensejando, então, a incidência
do imposto sobre a renda. Para ele, a fixação de um prazo temporal inferior a um ano
prejudicaria a análise dos ingressos e desembolsos.99
Da mesma forma, José Artur Lima Gonçalves, citado por Roque Antonio
Carrazza, entende que a Constituição Federal estabelece, ainda que de forma implícita, uma
periodicidade anual na aferição da renda. Isso porque, de acordo com o citado jurista, toda
organização estatal, de acordo com a Constituição Federal de 1988, está calcada na ideia de
periodicidade anual. Então, assim como ocorre com o conceito de renda, também a
periodicidade deve ser interpretada em consonância com as demais disposições que tratam da
mesma questão.100
Coaduna-se com esse entendimento Geraldo Ataliba, ao explicar que pelo fato
de o art. 165, §8º da CF/88 determinar ser anual a lei orçamentária - e a receita que advém do
imposto, por ser um ingresso público, deve constar no orçamento - a periodicidade do imposto
de renda também deve ser anual. 101 Nessa linha, afirma Roque Antonio Carrazza que:
O fato imponível do IR só ocorre ao cabo do exercício financeiro, acompanhando,
destarte, o ciclo das leis orçamentárias e do próprio funcionamento do Estado
97
QUEIROZ, Mary Elbe. Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza: tributação das pessoas físicas.
In: DE SANTI, Eurico Marcos Diniz (Coord.). Curso de especialização em direito tributário: estudos
analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 462-463.
98
QUEIROZ, ibid, p. 463.
99
BARRETO, Paulo Ayres. Imposto sobre a renda – Pessoas jurídicas In: DE SANTI, Eurico Marcos Diniz
(Coord.). Curso de especialização em direito tributário: estudos analíticos em homenagem a Paulo de
Barros Carvalho, 1ª Ed., Rio de Janeiro : Forense, 2005, p. 779.
100
Imposto sobre a renda – pressupostos constitucionais apud CARRAZZA, Roque Antônio. Imposto sobre a
renda (perfil constitucional e temas específicos). 3ª Ed. São Paulo : Malheiros, 2009, p. 131.
101
Periodicidade do Imposto de Renda In: Revista de Direito Tributário n.º 63, p.22.
39
102
CARRAZZA, id., 2009, p. 132.
103
OLIVEIRA ibid., p. 778.
104
CASSONE, Vittorio. Direito Tributário. 12ª Ed. São Paulo : Atlas, 2000, p. 236.
105
COSTA, Alcides Jorge. Imposto sobre a Renda: A aquisição de disponibilidade jurídica ou econômica como
seu fator gerador. Limite de sua incidência. In: LEMKE, Gisele. Imposto de renda: os conceitos de renda e
de disponibilidade econômica e jurídica. São Paulo: Dialética, 1998, p. 78.
106
MARTINS, id., 2012.
107
SAKAKIHARA id., 2001, p. 152-153.
108
SAKAKIHARA, loc. cit..
40
Pelo exposto até agora pôde-se observar que, para a análise do acréscimo
patrimonial havido, há a necessidade de considerar algum período. Nesta esteira, alguns
juristas entendem existir três possibilidades ou modos.
Primeiramente, Marcelo Guerra Martins explica que o “modo estático” está
voltado a um período fechado, de uma realidade estática. Neste sistema, pode o legislador
determinar que a variação patrimonial seja apurada somente após o término do período-base,
geralmente definido entre 1º de janeiro e 31 de dezembro. O aumento patrimonial seria
demonstrado pelo saldo patrimonial positivo ao final do período estipulado. É estático, porque
não se consideraria o fluxo de renda durante todo o interregno.109 Misabel Derzi explica o
modo estático da seguinte forma:
O sentido estático da renda, que somente se encontra encerrado em um período de
tempo, é um artifício ou uma ficção legislativa, que tem como objetivo realizar a
justiça retrospectiva ou tradicional, aquela que olha os ganhos e despesas passados e
presentes, sem divisar o futuro.110
109
MARTINS id., 2005.
110
DERZI, Misabel. Justiça prospectiva no imposto sobre a renda: em homenagem a Souto Maior Borges In:
ROCHA, Eduardo Morais da. A Análise do Aspecto Temporal do Imposto de Renda das Pessoas Físicas e
Jurídicas à Luz das Limitações Constitucionais do Poder de Tributar. Revista Eletrônica da Seção Judiciária
do Distrito Federal, Brasília, Nº. 15, ano II, p. 2, set. 2010. Disponível em:
<http://www.jfdf.jus.br/revista_eletronica_justica/setembro10/artigo_Eduardo1.html>. Acesso em: 02 de abr.
2012.
111
SAKAKIHARA, ibid., p. 153.
112
MARTINS loc. cit.
41
que a periodização da renda possa gerar efeitos futuros injustos e confiscatórios ao sujeito
passivo da relação jurídico-tributária. 113
Concluindo a explicação dos modos, há o chamado “modo complexo”. Neste
sistema, Marcelo Guerra Martins explica que é facultado que os aumentos patrimoniais já
computados sejam tributados de imediato, e, quando findado o período-base, haja um acerto
de contas. Este acerto ocorre quando da entrega da declaração, no exercício posterior. Neste
caso os gastos com despesas médicas e outros facultados por lei são considerados para fins de
abatimento da base de cálculo. Tal modo normalmente é utilizado naqueles rendimentos que
são tributados durante o ano-base, como o salário. Este modo é chamado de complexo por ser
uma fusão dos dois modos anteriores.114
De todo o exposto neste capítulo, é possível concluir que o imposto de renda é
um tributo complexo, que apresenta importante função fiscal e extrafiscal em nosso país. Com
efeito, o próprio conceito de renda não é unânime entre os estudiosos. Porém, em que pese
existam diversas teorias acerca do seu conceito, pensa-se que a Teoria Constitucional é a mais
consistente. Isto porque a Constituição é a norma suprema do nosso ordenamento jurídico;
além de trazer a regra-matriz do imposto de renda expressa em seu bojo. Logo, seguindo uma
interpretação sistemática do ordenamento jurídico, com a Constituição como balizadora,
pode-se dizer que o conceito se encontra na Constituição Federal.
Importante destacar, por oportuno, que renda e rendimento não podem ser
confundidos. Neste sentido, tem-se que os rendimentos são as remunerações, isoladamente
consideradas, advindas das mais diversas fontes pagadoras, como o salário ou os rendimentos
da poupança. Ao passo que a renda, em linhas gerais, é o acréscimo patrimonial efetivo - isto
é, a soma de todos os rendimentos percebidos - que é incorporado ao patrimônio, após as
deduções dos gastos para a sua manutenção e obtenção.
Outra constatação relevante está no fato de que a questão temporal também
deve ser levada em consideração ao aferir a renda do indivíduo. Existem doutrinadores que
entendem que pode ser considerado como renda qualquer acréscimo patrimonial que ingresse
ao patrimônio do contribuinte. No entanto, pela análise realizada, observa-se que, novamente
se utilizando de uma análise sistemática do sistema jurídico-tributário, a Constituição Federal
113
DERZI, Misabel. Las rentas de capital em las relaciones internacionales. In: ROCHA, Eduardo Morais da. A
Análise do Aspecto Temporal do Imposto de Renda das Pessoas Físicas e Jurídicas à Luz das Limitações
Constitucionais do Poder de Tributar. Revista Eletrônica da Seção Judiciária do Distrito Federal, Brasília,
Nº. 15, ano II, p. 3, set. 2010. Disponível em:
<http://www.jfdf.jus.br/revista_eletronica_justica/setembro10/artigo_Eduardo1.html>. Acesso em: 10 de
março de 2012.
114
MARTINS, id., 2002.
42
também estabelece, mesmo que implicitamente, uma periodicidade anual para aferir o efetivo
acréscimo patrimonial.
Também ficou latente a importância da Constituição Federal no ordenamento
jurídico brasileiro, bem como na influência dela no entendimento das regras de incidência do
imposto de renda. Todavia, a Constituição Federal vai além. Neste sentido, o legislador
constituinte definiu diversos princípios tributários, no intuito de barrar a discricionariedade e
abusos do Estado na hora de criar, alterar, fiscalizar e recolher os tributos. Especificamente
em relação ao imposto de renda, a Constituição Federal estipula como princípios
informadores os princípios da capacidade contributiva, generalidade, progressividade,
universalidade. Além deles, os tributos devem observar o princípio da vedação aos efeitos de
confisco. Portanto, frente à importância do tema, estes princípios serão abordados em detalhes
no próximo capítulo deste estudo.
43
115
FAZOLI, Carlos Eduardo de Freitas. Princípios Jurídicos. Revista Uniara. p. 15, 2007. Disponível em:
<http://www.uniara.com.br/revistauniara/pdf/20/RevUniara20_03.pdf>. Acesso em: 10 mar. 2012.
44
utilizado para definir a “proposição filosófica que serve de fundamento a uma dedução”; na
Física é empregada como sendo a “lei de caráter geral com papel fundamental no
desenvolvimento de uma teoria e da qual outras leis podem ser derivadas”.116 Em seu sentido
etimológico, porém, a palavra “princípio” remete à ideia de origem ou base. 117
Na ciência do Direito, Celso Antônio Bandeira de Mello ensina que os
princípios são o mandamento nuclear de um sistema jurídico, pois são eles que compõem o
“espírito” das normas. Assim, é por meio dos princípios que se torna possível a compreensão
do sistema jurídico como um todo. Ainda, por conferir harmonia ao sistema normativo, os
princípios também servem de critério para a compreensão e inteligência das diferentes normas
existentes no ordenamento.118
Ou seja, os princípios são diretrizes fundamentais do sistema jurídico. Também
é possível afirmar que os princípios acabam por fixar e direcionar o sentido da ordem jurídica
vigente, ao juridicizar os valores ético-morais exprimidos pela sociedade. 119
Concepção semelhante apresenta o jurista Ivo Dantas, citado por Carlos
Eduardo de Freitas Fazoli, ao discorrer que os princípios, quando incorporados a um sistema
jurídico-constitucional-positivo, refletem a estrutura ideológica adotada pelo Estado,
representando os valores consagrados por uma determinada sociedade.120
Nessa esteira, Walter Claudius Rothenburg explica que os princípios podem
servir como limites para regras ou um conteúdo para a norma. O citado jurista continua sua
explanação falando que os princípios são uma expressão dos valores principais de uma
determinada concepção do Direito. No entanto, apesar do seu alto grau de abstração,
apresentam um significado passível de ser concretizado.121
Contudo, os princípios não poderiam existir de forma isolada. Eles devem
sempre apresentar-se relacionados com outras normas e princípios, pois são elas que lhes
darão equilíbrio e proporção.122
Pode-se notar que os princípios ocupam posição de destaque dentro de um
ordenamento jurídico. Afinal, são eles que formam os alicerces de todo o sistema jurídico-
constitucional, compondo a viga mestra deste mesmo sistema.123 Partindo para a Constituição
Federal, é de se destacar que a nossa Lei Maior é essencialmente principiológica, logo, a
116
HOUAISS, ibid..
117
SCHOUERI, ibid., p. 265.
118
MELLO ibid., p. 958-959.
119
QUEIROZ, ibid., p. 436-437.
120
FAZOLI, ibid., p. 16.
121
FAZOLI, loc. cit.
122
CARRAZZA, ibid., p. 47.
123
BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 7.ed. São Paulo: Malheiros, 1998.
45
interpretação de qualquer norma, constitucional ou legal, deverá ser balizada pelos princípios.
Noutras palavras, são os princípios que traçarão os limites da atividade do intérprete.124
Sobre o assunto, expõe Luís Roberto Barroso, citado por Roque Antonio
Carrazza, que:
O ponto de partida do intérprete há que ser sempre os princípios constitucionais, que
são o conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição, seus postulados
básicos e seus fins. Dito de forma sumária, os princípios constitucionais são a norma
eleita pelo constituinte como fundamentos ou qualificação essenciais da ordem
jurídica que institui.125
124
LACOMBE, Américo Masset. Princípios constitucionais tributários. 2.ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p.
15.
125
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. In: CARRAZZA, Roque Antônio.
Curso de direito constitucional tributário. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 53.
126
BONAVIDES, ibid., p. 259.
127
CARRAZZA, ibid., p. 55.
128
LACOMBE, ibid., p. 14.
129
FAZOLI, ibid.
46
outras normas; ao passo que um princípio do Direito Civil, por exemplo, terá a sua
abrangência muito mais restrita, particularizada.130 Neste sentido, temos os ensinamentos de
Luís Roberto Barroso, que diz:
A atividade de interpretação da Constituição deve começar pela identificação do
princípio maior que rege o tema a ser apreciado, descendo do mais genérico ao mais
específico, até chegar à formulação da regra concreta que vai reger a espécie. 131
Embora possa haver conflitos entre princípios, é de suma importância que eles
sejam preservados, ainda que, para isso, seja necessário a renúncia de alguns benefícios ou
vantagens. Nas palavras de Konrad Hesse:
Quem se mostra disposto a sacrificar um interesse em favor da preservação de um
princípio constitucional fortalece o respeito à Constituição e garante um bem da vida
indispensável à essência do Estado democrático. Aquele que, ao contrário, não se
dispõe a esse sacrifício, malbarata, pouco a pouco, um capital que significa muito
mais do que todas as vantagens angariadas, e que, desperdiçado, não mais será
recuperado.132
130
CARRAZZA, ibid., p. 47.
131
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição. In: CARRAZZA, Roque Antônio.
Curso de direito constitucional tributário. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 53.
132
HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Tradução: Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre:
Sérgio Antônio Fabris, 1991, p. 22.
47
Alexy, citados por Ruy Samuel Espíndola, ambos são normas jurídicas, carregando consigo
todas as possíveis consequências que isso possa resultar.133
Posto isso, por terem maior grau de abstração, os princípios são estruturas
abertas, incidindo sobre uma pluralidade de situações. As regras, a seu turno, apresentam uma
estrutura fechada, por isso, apresentam maior objetividade, incidindo unicamente às situações
as quais se dirige.134
Para Humberto Ávila, a distinção entre princípios e regras não é meramente
doutrinária. O citado jurista elenca dois motivos pelos quais a classificação se justifica, a
saber:
1) [...] antecipar características das espécies normativas de modo que o intérprete ou
o aplicador, encontrando-as, possa ter facilitado seu processo de interpretação e
aplicação do Direito. 2) [...] aliviar, na medida em que a uma qualificação das
espécies normativas permite minorar – eliminar jamais – a necessidade de
fundamentação, pelo menos indicando o que deve ser justificado.135
133
ESPÍNDOLA, Ruy Samuel. Conceito de princípios constitucionais. 2ª Ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002, p. 66.
134
BARROSO, Luís Roberto; BARCELLOS, Ana Paula. Começo da história: A nova interpretação
constitucional e o papel dos princípios no direito brasileiro. In: FAZOLI, Carlos Eduardo de Freitas. Princípios
Jurídicos. Revista Uniara. Araraquara, São Paulo, Nº. 20, p. 19, 2007. Disponível em:
<http://www.uniara.com.br/revistauniara/pdf/20/RevUniara20_03.pdf>. Acesso em: 10 de mar. de 2012.
135
ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da definição à aplicação dos princípios jurídicos. 2.ed. São Paulo:
Malheiros, 2003, p. 57.
136
ÁVILA, ibid., p. 70.
137
ÁVILA, ibid., p. 70.
48
dependendo de fatores fáticos e jurídicos; já as regras são normas imperativas, isto é, as regras
impõem, permitem ou proíbem uma exigência, que é ou não cumprida. 138
A violação de um princípio também é muito mais gravosa do que a violação de
uma regra ou outra norma qualquer. Nesta esteira, Celso Antônio Bandeira de Mello afirma
que:
Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A
desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento
obrigatório, mas todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade
ou inconstitucionalidade, conforme o escalão de princípio atingido, porque
representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores
fundamentais, contumélia irreversível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua
estrutura mestra.139
Embora a explanação realizada no subitem anterior tenha sido sucinta, ela foi
suficiente para aferir a grande importância dos princípios dentro de um determinado
ordenamento jurídico. A seara tributária, assim como nas demais áreas do Direito, também
apresenta seus próprios princípios, que carregam consigo valores superiores a qualquer outra
norma reguladora da incidência, fiscalização e recolhimento dos tributos.140
Vale lembrar que o Sistema Tributário Brasileiro está posto na Constituição
Federal de 1988; logo, é nela que serão encontrados os fundamentos e as regras-matriz de
incidência tributária. É o texto instituidor da ordem jurídico-tributária brasileira. Neste
diapasão, é importante lembrar que a Constituição Federal de 1988 traz em seu bojo todos os
fundamentos do Direito Tributário. Estes fundamentos se projetam sobre as ordens jurídicas
parciais definidas pela União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios.141
Portanto, observa-se que no Direito Tributário os princípios têm ainda mais
força, vez que eles advêm da Constituição Federal e não são mais apenas frutos da pesquisa
138
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4.ed. Coimbra :
Almedina, 2000, p. 1124.
139
MELLO. ibid., p. 959.
140
QUEIROZ, id., 2005, p. 437.
141
COÊLHO, ibid., p. 43-44.
49
142
SCHOUERI, ibid., p. 265.
143
COÊLHO ibid., p. 44.
144
A competência tributária pode ser entendida como quem tem o poder de tributar. Quem atribui essa
competência é a Constituição Federal, assim, no Brasil, a competência tributária é dividida entre União,
Estados-membros, Distrito Federal e Municípios. Isto é, cada ente estatal tem sua própria esfera de atuação.
Neste sentido, ensina Luís Eduardo Schoueri que haverá matérias "que estarão dentro do campo de
competência de um ente tributante e outras que estarão fora". Pode-se citar, a título de exemplo, que aos
Estados-membros é assegurada a competência para a tributação da propriedade de veículos automotores, mas
os Estados-membros não têm competência para tributar a propriedade de imóveis urbanos, pois tal tributo é de
competência dos Municípios. (SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 1ª Ed. São Paulo : Saraiva,
2011, pp. 219-220)
Ainda sobre a competência tributária, Hugo de Brito Machado explica que "só às pessoas jurídicas de direito
público, dotadas de poder legislativo, pode ser atribuída competência tributária, posto que tal competência
somente pode ser exercida através de lei". O citado jurista explica, ainda, que a competência tributária é
indelegável, ou seja, a pessoa jurídica à qual a Constituição Federal de 1988 tenha atribuído competência pra
instituir o tributo não poderá transferir essa competência. Em resumo, a competência tributária refere-se à
possibilidade de instituir o tributo e definir os seus elementos essenciais, como o fato gerador, alíquotas e base
de cálculo. (MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 32ª Ed. rev., ampl. e atual. São Paulo :
Malheiros, 2011, pp. 28 e 275).
Decorrência da competência tributária, a capacidade tributária deve ser compreendida como a capacidade para
figurar no polo ativo da relação jurídico-tributária, Essa capacidade é atribuída por lei. Neste sentido, aduz
Hugo de Brito Machado que a capacidade tributária "é atribuída pela Constituição, ou por uma lei, ao ente
estatal não necessariamente dotado de poder legislativo. É exercida mediante atos administrativos". Como
exemplo de capacidade tributária pode-se citar a Receita Federal do Brasil. (MACHADO, Hugo de Brito.
Curso de direito tributário. 32ª Ed. rev., ampl. e atual. São Paulo : Malheiros, 2011, pp. 29)
Nesta esteira, a capacidade tributária refere-se às funções de recolher e fiscalizar os tributos, bem como executar
leis, serviços, atos ou decisões administrativas em matéria tributária. (ALEXANDRE, Ricardo. Direito
Tributário Esquematizado. 4ª Ed. São Paulo : Editora Método, 2010, p. 205)
50
traçam diretrizes que o legislador infraconstitucional e o Fisco devem observar, sob pena de
violar os direitos do contribuinte.145
Os princípios gerais do Direito Tributário são apresentados a partir do art. 145
da Constituição Federal. Entretanto, frise-se, este trabalho não irá abordar todos os princípios
constitucionais tributários, pois estes são muitos, e a investigação de todos fugiria do escopo
da pesquisa. Desta forma, serão analisados a seguir os princípios constitucionais tributários
específicos do imposto de renda, quais sejam, o princípio da capacidade contributiva, o
princípio da universalidade, generalidade e progressividade e o princípio do não-confisco, não
sem antes estudar um princípio que, apesar de não-escrito de forma expressa na Constituição
Federal, é informador de todos os demais: o princípio da segurança jurídica.
145
QUEIROZ, ibid., p. 438.
146
CAIS, Cleide Previtalli. O processo tributário. 7.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 44.
147
BIFANO, ibid., p. 143.
51
sentido amplo, e pode ser visto por meio do princípio da legalidade, da garantia aos efeitos da
coisa julgada, ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito. O referido jurista cita, ainda, que
a segurança jurídica também é implementado pelo princípio da separação dos Poderes e pelo
princípio do duplo grau de jurisdição.148
Cleide Previtalli Cais afirma que os direitos e garantias fundamentais,
expressos no art. 5º, da Constituição Federal de 1988, são exemplos do princípio da segurança
jurídica.149
A seu turno, Humberto Ávila entende que o fundamento para o princípio da
segurança jurídica é construído primeiramente pela interpretação dedutiva do art. 1º da
Constituição Federal; e, posteriormente, pela intepretação indutivas de regras constitucionais
como a proteção ao direito adquirido e as regras da legalidade, irretroatividade e
anterioridade.150
Logo, a função precípua do princípio da segurança jurídica é garantir aos
cidadãos que todos conheçam previamente quais normas devem ser observadas, evitando
surpresas nas relações jurídicas. Noutros dizeres, é indispensável para a manutenção do
Estado Democrático de Direito a existência de um nível razoável de previsibilidade das ações
estatais.151
Ao explicar o conteúdo deste princípio, Humberto Ávila o decompõe em duas
perspectivas: tratando do aspecto formal-temporal, entende-se que os cidadãos devem ter a
possibilidade de conhecer previamente quais são as normas vigentes. No entanto, isto só é
possível se estas normas estiverem em vigor em período anterior ao acontecimento dos fatos
por elas regulamentados (irretroatividade), e se as pessoas puderem conhecer com
antecedência o conteúdo destas normas (anterioridade). 152 No que tange ao aspecto material, o
citado autor refere que as normas jurídicas devem apresentar uma razoável
compreensibilidade, clareza, calculabilidade e controlabilidade conteudísticas para os seus
destinatários.153
Também nesse sentido é o entendimento de José Afonso da Silva que, citando
Jorge Reinaldo Vanossi, leciona que a segurança jurídica nada mais e do que o “conjunto de
148
LACOMBE, Américo Masset. Princípios constitucionais tributários. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p.
76.
149
CAIS, ibid., p. 45.
150
ÁVILA, ibid., p. 308.
151
ÁVILA, ibid., p. 310.
152
ÁVILA, loc. cit.
153
ÁVILA, loc. cit.
52
154
ÁVILA, ibid., p. 433.
155
ATALIBA, Geraldo. República e constituição. In: CAIS, Cleide Previtalli. O processo tributário. 7. ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011,p. 51-52..
156
CARRAZZA, ibid., p. 455.
157
CARRAZZA, ibid., p. 457.
158
CAIS, ibid., p. 47-50.
53
159
RODRIGUES, Marilene Talarico Martins. Limitações ao poder impositivo e segurança jurídica. In:
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Limitações ao poder impositivo e segurança jurídica. Pesquisas
Tributárias. São Paulo, SP, Nova série, v. 11, RT, 2005, 211-265.
160
ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 310.
161
. ÁVILA, ibid., p.
162
PAULSEN, Leandro. Segurança Jurídica, Certeza do Direito e Tributação: A concretização da certeza
quanto à instituição de tributos através das garantias da legalidade, da irretroatividade e da anterioridade. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 64.
163
PAULSEN, p. 65.
54
164
Pelo princípio da anterioridade, deve existir um prazo entre a lei instituidora ou majoradora do tributo e o
início de sua vigência. Neste sentido, há a anterioridade anual e a anterioridade nonagesimal. Pela
anterioridade anual, tem-se que, a União, Estados, Distrito Federal e Municípios não poderão cobrar os tributos
no mesmo exercício financeiro (compreendido do dia 1º de janeiro a 31 de dezembro) em que tenha sido
publicada a lei que os criou ou aumentou. Assim, se um tributo fosse criado em maio, por exemplo, ele só
poderá se exigido a partir do próximo 1º de janeiro, bem como se um tributo for criado ou majorado em 1º de
janeiro, terá que esperar até o próximo exercício financeiro para a sua vigência.
Oportuno destacar que existem exceções ao princípio da anterioridade anual. Assim, podem ser cobrados no
mesmo exercício financeiro imposto sobre: i) importação de produtos estrangeiros; ii) exportação de produtos
nacionais ou nacionalizados; iii) operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos e valores
mobiliários; iv) produtos industrializados; v) imposto de guerra; vi) empréstimo compulsório destinado a
atender despesas extraordinárias decorrentes de calamidade pública, de guerra ou sua iminência.
A anterioridade nonagesimal, por sua vez, veda a cobrança de tributos antes de decorridos 90 dias da data em
que a lei que os instituiu ou majorou tenha sido publicada. Desta forma, se um tributo foi instituído ou
majorado após o dia 3 de outubro (quando faltam 90 dias para o término do exercício financeiro), a cobrança
não pode mais ser feita a partir do 1º de janeiro próximo, pois estaria infringindo a anterioridade nonagesimal.
Destaca-se que a anterioridade anual e nonagesimal não se opõem; ao contrário, andam juntas.
(ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 4ª Ed. São Paulo : Editora Método, 2010, pp.
139-144; MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito tributário. 32ª Ed. rev., ampl. e atual. São Paulo :
Malheiros, 2011, p. 283.)
O princípio da anterioridade está previsto no Art. 150, III, ‘b’ e ‘c’, da Constituição Federal de 1988: “Art. 150.
Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito
Federal e aos Municípios: (...) III - cobrar tributos: (...) b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido
publicada a lei que os instituiu ou aumentou; c) antes de decorridos noventa dias da data em que haja sido
publicada a lei que os instituiu ou aumentou, observado o disposto na alínea b; (...)”
Já as exceções são listadas no Art. 150, § 1º: “A vedação do inciso III, b, não se aplica aos tributos previstos nos
arts. 148, I, 153, I, II, IV e V; e 154, II; e a vedação do inciso III, c, não se aplica aos tributos previstos nos
arts. 148, I, 153, I, II, III e V; e 154, II, nem à fixação da base de cálculo dos impostos previstos nos arts. 155,
III, e 156”.
165
CAETANO, Marcelo. Direito constitucional, v. I. In: LACOMBE, Américo Masset. Princípios
constitucionais tributários. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 78.
166
CAIS, Cleide Previtalli. O processo tributário. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 45.
55
167
CARRAZZA, p. 456.
168
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 4.ed. São Paulo: Método, 2010, p. 48
169
HORVATH, Estevão. O princípio do não-confisco no direito tributário. São Paulo: Dialética, 2002, p. 49.
56
efeitos de confisco busca garantir um sistema tributário justo, ao impedir a tributação sobre
aquele que não demonstrou capacidade contributiva.170
A doutrina entende que o princípio do não-confisco apresenta um conceito
aberto, indeterminado. Neste sentido, aduz Eros Grau que não existe conceito indeterminado
no Direito; o que existe são conceitos com termos jurídicos indeterminados. Já Karl Engisch,
citado por Estevão Horvath, afirma que conceito indeterminado é aquele cujo âmbito e
conteúdo são incertos.171
Apesar de o princípio da vedação ao confisco ter um conceito indeterminado,
entende-se que o efeito confiscatório ocorre quando a tributação apresentar um caráter
insuportável ao contribuinte. Isto é, por causa da tributação excessiva, a pessoa desestimula-se
a continuar sua atividade produtiva ou, até mesmo, verá sua vida pessoal ser atingida. 172
No que tange ao imposto de renda, pode-se dizer que o princípio da vedação ao
confisco – além do vínculo com a capacidade contributiva - também está fortemente ligado ao
princípio da progressividade. Isto porque a progressividade das alíquotas encontrará o seu
limite no momento em que o patrimônio do contribuinte for atingido. A partir deste momento,
o IR passa a ser confiscatório. E pelo princípio do não-confisco, tal situação é vedada. 173
Porém, definir quando um tributo passa a ter efeitos confiscatórios é tarefa
árdua. A doutrina ainda debate acerca do que pode ser considerado como sendo confiscatório.
Em breves linhas, Estevão Horvath explica que o confisco ocorre quando se supõe existente
uma riqueza que, de fato, inexiste.174
Roque Antonio Carrazza entende que um tributo passa a ter efeito confiscatório
quando este apresentar um potencial de esgotar a riqueza tributável do contribuinte, isto é,
quando não for considerada a capacidade contributiva da pessoa. Nas palavras do citado
professor: “quando ignora a aptidão de uma pessoa, física ou jurídica, de entregar parte da
riqueza que possui, sem comprometer sua subsistência”. 175
Entretanto, a dúvida na doutrina ainda persiste. Quando, ou a partir de qual
alíquota, o imposto sobre a renda passa a ser confiscatório? Para tal, é necessário seja feita a
análise da capacidade contributiva da pessoa em questão, que varia conforme o caso concreto.
Daí a necessidade de conjugar os princípios da vedação ao confisco e o princípio da
170
HORVATH, ibid., p. 67.
171
HORVATH, ibid., p. 34 - 49.
172
SCHOUERI, ibid., p. 324.
173
CARRAZZA, Roque Antônio. Imposto sobre a renda (perfil constitucional e temas específicos). 3ª Ed.
rev., ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, 2009, nota 104, p. 72.
174
HORVATH, ibid., p. 67.
175
CARRAZZA, ibid., p. 118.
57
176
LUI, Ana Paula Schincariol. Imposto de sobre a renda e provento de qualquer natureza auferidos pela
pessoa física: princípios constitucionais e sistemática de apuração. PUC SP: 2007. 200 f. Dissertação
(Mestrado em Direito). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2007, P. 61.
177
LUI, loc. cit..
178
ibid., p. 110.
179
ALEXANDRE, ibid., p. 148.
180
HORVATH ibid., p. 60.
181
SCHOUERI ibid., p. 322.
58
caráter confiscatório do tributo há de ser avaliado em função do sistema, vale dizer, em face
da carga tributária resultante dos tributos em conjunto”.182
Entendendo que deve-se analisar o sistema tributário como um todo para a
verificação do confisco, Ives Gandra da Silva Martins diz que:
Se a soma de diversos tributos incidentes representa carga que impeça o pagador de
tributo de viver e se desenvolver, estar-se-á perante carga geral confiscatória, razão
pela qual todo o sistema terá que ser revisto, mas principalmente aquele tributo que,
quando criado, ultrapasse o limite da capacidade contributiva do cidadão. Há, pois,
um tributo confiscatório e um sistema confiscatório decorrencial. A meu ver, a
Constituição proibiu a ocorrência dos dois, como proteção do cidadão.183
182
MACHADO, ibid., p. 41.
183
HORVATH, ibid., p. 82.
184
HORVATH, ibid., p. 83.
185
GOLDSCHMIDT, Fábio Brun. O princípio do não-confisco no direito tributário. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003, P. 281.
186
GOLDSCHIMIDT, ibid., p. 84-85.
187
HORVATH, ibid., p. 49.
59
tributo em isolado, de acordo com suas peculiaridades; e do sistema em conjunto, embora este
último seja de grande dificuldade para sua implementação.188
Nesta esteira, Fábio Brun Goldschmidt faz uma ressalva. Embora exista, de
fato, a aludida dificuldade, não pode o Judiciário eximir-se da análise desta questão. Isto se
deve ao fato de que:
o Estado é uno, ainda que sua administração seja dividida em mais de uma esfera de
Poder. Os direitos fundamentais em jogo são os do cidadão, fonte do poder do
Estado, conceito que transcende em muito o de simples contribuinte de uma dada e
específica exigência tributária. Seria, aliás, uma ironia cruel se a federação pudesse
servir de escudo para a perpetração de abusos contra o povo brasileiro, em vez de
funcionar como um instrumento para a sua proteção e desenvolvimento.189
188
HORVATH, ibid., p. 86.
189
GOLDSCHMIDT, ibid., p. 283.
190
MACHADO, ibid., p. 40-41.
191
BRASIL. Supremo Tribunal Federal – Plenário. ADI 2010/DF. Requerente: Conselho Federal da OAB.
Requerido: Presidente da República Congresso Nacional. Relator Ministro Celso de Mello. Julgada em
13.06.02. Publicação no DJ em 22.03.2004.
60
192
ÁVILA, ibid., p. 369.
193
BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. 7. ed. à luz da Constituição de
1988 até a Emenda Constitucional n° 10/1996. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 687.
194
CARRAZZA, ibid., p. 113.
195
CONTI, José Maurício. Princípios da capacidade contributiva e da progressividade. São Paulo: Dialética,
1997, p. 29.
196
CARRAZZA, loc. cit.
61
197
CONTI, ibid., p. 25-26..
198
CARVALHO, Fabio Junqueira de; MURGEL, Maria Inês. IRPJ: Teoria e prática jurídica. São Paulo:
Dialética, 1999, p. 19.
199
SILVA ibid., p. 222.
200
ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 371.
62
Contudo, Roque Antonio Carrazza rebate esta ideia afirmando que a expressão
não é vazia, nem uma simples recomendação ao legislador ordinário. Ao contrário, uma vez
que a regra-matriz do imposto permita, o tributo deverá mandatoriamente obedecer ao
princípio da capacidade contributiva e ter caráter pessoal. Daí o “sempre que possível”; se a
natureza do imposto for compatível com a capacidade contributiva, o legislador deverá
imprimir ao imposto caráter pessoal e graduá-lo igual à aptidão econômica do contribuinte.203
Hugo de Brito Machado também entende que a expressão constitucional
vincula o legislador ordinário na criação dos impostos. A aplicação do princípio ao imposto
não depende, portanto, da mera vontade do legislador:
Não é razoável entender-se que o legislador tem ampla liberdade para resolver
quando é e quando não é possível exigir-se a obediência ao princípio da capacidade
contributiva porque tal compreensão anula inteiramente a sua supremacia. Em outras
palavras, essa interpretação rebaixa o princípio em questão do nível da Constituição
para o nível das leis ordinárias, o que não é razoável admitir-se. 204
201
CARRAZZA, id., 2011, p. 112.
202
CARVALHO, ibid., p. 65.
203
CARRAZZA, loc. cit.
204
MACHADO, ibid., p. 39.
63
A cláusula sempre que possível não é permissiva, nem confere poder discricionário
ao legislador. Ao contrário, o advérbio sempre acentua o grau da imperatividade e
abrangência do dispositivo, deixando claro que, apenas sendo impossível, deixará o
legislador de considerar a pessoalidade para graduar os impostos de acordo com a
capacidade econômica subjetiva do contribuinte.205
No entanto, Roque Antonio Carrazza faz um alerta: existem impostos que, por
sua própria natureza, não seriam compatíveis com a capacidade contributiva. Pode-se citar
como exemplo o ICMS, cuja carga econômica do tributo é passada para o preço da
mercadoria ou serviço. O valor do imposto é repassado a terceiros, e quem suporta a carga
tributária não é o contribuinte, mas o consumidor final. Por isso, seria impossível atender à
norma disposta no art. 145, §1º, da Constituição Federal de 1988.206
Discordando de que existem impostos incompatíveis com a capacidade
contributiva, José Maurício Conti entende que todos os impostos, mesmo aqueles cuja
aferição direta do princípio em tela não seja possível, podem sujeitar-se ao princípio da
capacidade contributiva. Para este autor, a expressão ”sempre que possível” busca unicamente
permitir a existência de exceções, como é o caso dos impostos com função extrafiscal,
utilizados para direcionar as atividades dos agentes econômicos.207
Encerrando a discussão, tem-se a lição de Humberto Ávila. Para este autor, a
expressão “sempre que possível” é supérflua, caso se refira à possibilidade de mensurar a
capacidade econômica, haja vista que “prescrições comportamentais instituídas por normas
jurídicas pressupõe possibilidades fáticas de aplicação”, de modo que a expressão não é uma
permissão, mas, sim, uma obrigação, onde seu significado irá depender da possibilidade de
graduar a capacidade econômica do contribuinte. 208
Por fim, corroborando com os ensinamentos de José Maurício Conti, Humberto
Ávila conclui que a expressão “sempre que possível” configura-se numa abertura expressa à
possibilidade de instituir tributos de caráter extrafiscal. 209
205
BALEEIRO, ibid., p. 694.
206
BALEEIRO, ibid., p. 112-113.
207
CONTI, ibid., p. 48.
208
ÁVILA, id., 2010, p. 374.
209
ÁVILA, loc. cit.
64
econômica”, pois o art. 145, §1º, da Constituição Federal de 1988, menciona “capacidade
econômica”.
Analisando o conceito de “capacidade econômica”, Geraldo Ataliba explica
que ela consiste na possibilidade real em diminuir o patrimônio do contribuinte, sem destruir
ou perder a possibilidade de continuar gerando riquezas. 210
A seu turno, Emílio Giardina aduz que a capacidade contributiva é a
capacidade econômica de pagar o tributo. Noutras palavras, é a posse de uma riqueza, num
montante suficiente para arcar com exigência fiscal. 211
Já Humberto Eustáquio Mota Filho entende que a utilização do termo
“capacidade econômica” é equivocada, justificando sua posição a partir da ideia de que a
capacidade econômica é a disponibilidade genérica de produzir ou dispor de riqueza, isto é,
qualquer indivíduo que dispõe de riqueza – ou mostra aptidão para tal – terá capacidade
econômica; ao passo que a capacidade contributiva “denota uma noção jurídico-econômica,
manifesta pela determinação de riqueza, que constitui justificação da imposição tributária”. 212
Mesmo entendimento apresenta Ives Gandra da Silva Martins ao lecionar que
capacidade econômica seria a manifestação do potencial econômico do indivíduo em razão de
seus rendimentos, independente deste estar vinculado a um tributo em específico; e a
capacidade contributiva seria a capacidade econômica específica relacionada à imposição do
ônus tributário, ou seja, a aptidão do contribuinte em arcar com o ônus tributário.213
Explicação semelhante é apresentada por Regina Helena Costa. Ela aduz que a
pessoa pode ter capacidade econômica para comprar os bens necessários à sobrevivência;
contudo, não apresentar capacidade contributiva, pois consumiu sua renda com o mínimo vital
necessário.214
Entretanto, para Hugo de Brito Machado 215 e Roque Antonio Carrazza216, as
expressões se equivalem, devendo ser tratadas como sinônimos. Noutras palavras, a expressão
contida na Constituição Federal determina que o imposto seja graduado conforme a
210
CONTI, ibid., p. 32.
211
CONTI, loc. cit.
212
MOTA FILHO. Humberto Eustáquio. Introdução ao princípio da capacidade contributiva. Rio de Janeiro:
Forense, 2006, p. 80.
213
MARTINS, Ives Gandra da Silva. Capacidade econômica e capacidade contributiva. In: CONTI, José
Maurício. Princípios tributários da capacidade contributiva e da progressividade. São Paulo: Dialética,
1997, p. 34.
214
LEMKE, ibid., p. 40.
215
MACHADO, ibid., p. 39.
216
CARRAZZA, id., 2011, p. 113.
65
217
CONTI, ibid., p. 37.
218
QUEIROZ, ibid., p. 443.
219
LEMKE, ibid., p. 41-42.
66
220
CARRAZZA, ibid., p. 99.
221
BALEEIRO, ibid., p. 692-693.
222
BALEEIRO, ibid., p. 693.
223
CARRAZZA, ibid., p. 102.
224
SCHOUERI, ibid., p. 314.
225
BALEEIRO, loc. cit.
226
BALEEIRO, loc. cit.
227
SCHOUERI, ibid., p. 313.
67
De acordo com Gisele Lemke, existem alguns estudiosos que, embora sejam
minoritários, defendem que basta apenas o critério objetivo da capacidade contributiva - isto
é, que a hipótese de incidência descreva fatos de conteúdo econômico - para que este
princípio seja respeitado.228
Neste sentido, Eduardo Domingos Botallo, citado por Gisele Lemke, assevera
que o magistrado só pode anular norma tributária se esta não apresentar qualquer fato
representativo de riqueza – a capacidade contributiva objetiva.229
João Caio Goulart Penteado, por sua vez, considera os dois aspectos da
capacidade contributiva. Todavia, o critério subjetivo da capacidade contributiva só pode ser
invocado quando a tributação atingir o mínimo vital ou apresentar efeitos confiscatórios.230
Da mesma natureza é o ensinamento de Alfredo Augusto Becker, ao aduzir que
é facultado ao aplicador declarar a inconstitucionalidade da norma que institua tributo de fato
que não seja demonstração de riqueza acima do mínimo legal. E finaliza o citado jurista
dizendo que “não cabe ao juiz deixar de aplicar a norma por constatar que num determinado
caso concreto ela não atende ao princípio da capacidade contributiva”.231
Referente à redação constitucional, é importante destacar que Roque Antonio
Carrazza entende que o dispositivo constitucional refere-se à capacidade contributiva
objetiva;232 a seu turno, Sacha Calmon Navarro Coelho entende que o aludido dispositivo
refere-se à capacidade subjetiva, ou seja, à capacidade econômica real do contribuinte. 233
Vale ressaltar, contudo, que a doutrina majoritária entende que tanto a
capacidade contributiva objetiva quanto a capacidade contributiva subjetiva devem ser
consideradas ao instituir e exigir o tributo.234
Porém, como determinar a aptidão do contribuinte em arcar com o tributo? O
tema é de grande importância, vez que o critério escolhido integrará a hipótese de incidência
do tributo. Apesar de, num primeiro momento, imaginar que a renda pessoal possa ser o
melhor critério para a mensuração da capacidade contributiva, a doutrina elenca três critérios
para fazer este aferimento.235
Alguns juristas argumentam que a melhor forma de aferir a capacidade
contributiva é por meio do consumo. Os partidários desta tese defendem que o consumo é ato
228
LEMKE, loc. cit.
229
LEMKE, ibid., p. 42.
230
LEMKE, loc. cit.
231
LEMKE, loc. cit.
232
CARRAZZA, ibid., p. 99.
233
COELHO, Sacha Calmon Navarro apud CARRAZZA, Roque Antonio. Op. cit., 2011, nota 48, p. 99.
234
CARRAZZA, ibid., p. 101-102; LEMKE, ibid., p. 43.
235
CONTI, ibid., p. 42.
68
egoísta, por isso deve ser punido com a tributação; enquanto a poupança e o investimento
trariam benefícios à sociedade, devendo ser incentivados. Estes alegam, ainda, que a
tributação da renda poderia ser considerada como uma bitributação da poupança. Isto porque,
tributando a renda auferida, nos dizeres de José Maurício Conti, “estar-se-ia tributando o
consumo e a poupança do indivíduo que auferiu essa renda”. 236
Há, também, aqueles que defendem ser a riqueza parâmetro da capacidade
contributiva. Neste caso, se mensuraria a capacidade contributiva pela análise do patrimônio,
capital ou renda acumulada. A principal justificativa para a utilização deste critério é a de se
pode gerar renda do capital, isto é, que determinados bens podem gerar renda. 237 A fim de
ilustrar este último critério, destaca-se o exemplo de R. A. Musgrave, invocado por José
Maurício Conti:
Supor que o rendimento do capital seja da ordem de 10%. Um bem de valor 1.000
geraria uma renda de 100. Assim poder-se-ia cobrar um imposto na base de um
percentual (ex: 10%) sobre esse montante de rendimento do capital (ou seja, sobre
os 100).238
Por conseguinte, José Maurício Conti entende que a renda ainda é a melhor
medida da capacidade contributiva, vez que ela inclui todas as fontes de receita pelas quais a
pessoa percebe a renda ou então onde ele utiliza estas receitas (analisando sob o prisma do
consumo e poupança).239
236
CONTI, ibid., p. 42-43.
237
CONTI, ibid., p. 43.
238
CONTI, loc. cit.
239
CONTI, ibid., p. 42.
240
Acerca da posição doutrinária sobre o assunto, ver CONTI, ibid., p. 53; HORVATH, ibid., p. 75.
69
Assim, mesmo sendo certo que o cidadão tem o dever de contribuir com as
despesas públicas, não se admite que a tributação venha a atingir o mínimo necessário para a
241
QUEIROZ, id., 2005, p. 447-448
242
CONTI, ibid., p. 55.
243
CARRAZZA, ibid., p. 111.
244
CARRAZZA id., 2009, p. 41.
245
MICHELI, Gian Antonio. Curso de direito tributário. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1978. In:
HORVATH, Estevão. O princípio do não-confisco no direito tributário. São Paulo: Dialética, 2002, p. 75.
70
subsistência do indivíduo. Mesmo porque tributar o mínimo vital equivale a tributar alguém
que se revela sem capacidade contributiva ou econômica.246
Em ampla análise sobre os impostos, Klaus Tipke afirma que não basta o
imposto de renda respeitar o mínimo existencial; o imposto deve ser estruturado de forma
harmônica entre capacidade contributiva e mínimo vital, e arremata dizendo que “o Estado
não pode, por meio de impostos, tirar renda do contribuinte ou de sua família que ele deveria
lhes devolver, a título de assistência social, para garantir a sua existência” 247
Finalmente, é importante destacar, também, que o mínimo vital apresenta forte
relação com o princípio do não-confisco, abordado anteriormente. Em linhas gerais, pode-se
dizer que o imposto não pode retirar da pessoa o mínimo para sua existência, pois, agindo
desta forma, o imposto passaria a ter efeitos confiscatório.248
Destarte, pode-se concluir que o princípio da capacidade contributiva tem
como principal fundamento a igualdade tributária e, por conseguinte, busca realizar a justiça
fiscal. Para tal, o referido princípio busca imprimir um caráter pessoal ao imposto, ao adequar
a carga tributária conforme a possibilidade de contribuir que o contribuinte apresenta. Noutras
palavras, quem ganha mais deverá contribuir mais; e quem ganha menos deverá contribuir
menos. Em não existindo capacidade econômica por parte do contribuinte, não há que se falar
em incidência do imposto de renda.
Convém destacar, ainda, que o conceito de mínimo vital está intimamente
ligado ao princípio da capacidade contributiva. Isto porque, ao tributar um indivíduo que não
apresente capacidade contributiva, estar-se-ia tributando a parcela mínima necessária à
subsistência do indivíduo, o que seria inadmissível.
Merece destaque, ainda, o fato de o princípio da vedação ao confisco também
apresentar forte vínculo com o princípio da capacidade contributiva, vez que se a exigência
tributária exceder a capacidade contributiva, as condições pessoais apresentadas pelo
contribuinte, a obrigação tributária estará apresentando efeitos confiscatórios.
Resta evidente, portanto, a relevância que o princípio da capacidade
contributiva apresenta para a análise da (in)constitucionalidade do imposto de renda.
246
QUEIROZ, ibid., p. 449.
247
TIPKE, Klaus. Sobre a unidade da ordem jurídica tributária. In: QUEIROZ, Mary Elbe. Imposto sobre a
renda e proventos de qualquer natureza: tributação das pessoas físicas. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p.
449.
248
HORVATH, ibid., p. 75-76.
71
249
HOUAISS, ibid., p. 1441.
250
HOUAISS, ibid., p. 2807.
251
QUEIROZ, ibid., p. 329.
252
QUEIROZ, loc. Cit.
72
que tenha realizado o fato gerador do imposto, e apresente capacidade contributiva, deverá
contribuir ao Fisco, cada qual na medida de suas possibilidades. 253
De igual modo, Renato Romeu Renck leciona que a generalidade está
relacionada ao contribuinte, ao sujeito passivo, e não à renda. Logo, a generalidade abrange a
totalidade de contribuintes, não admitindo qualquer tributação especial. Isto é, pelo princípio
da generalidade, não se admite classes de contribuintes; todo contribuinte deve ser tratado de
uma só forma, sem discriminações.254
Portanto, devido ao critério da generalidade, Renato Romeu Renck explica que
todo o acréscimo novo que decorra do ato de produção de renda deve ser objeto de tributação
pelo imposto de renda.255
No entanto, o entendimento acerca do conceito da generalidade não é pacífico.
Neste sentido, Ricardo Mariz de Oliveira diverge do entendimento exposto até então, ao
afirmar que “generalidade significa que o imposto deve tratar por igual todo e qualquer tipo
de renda ou provento, melhor dizendo, todo acréscimo patrimonial deve receber o mesmo
tratamento”.256
Paulo Ayres Barreto também apresenta outra explicação, fundada na noção de
que, pelo princípio da generalidade, a renda deve ser considerada como um todo, de modo que
o imposto de renda não incida somente sobre certas espécies de renda, e desconsidere os
efeitos negativos de outras.257 Interessante destacar que essa interpretação é mesma que a
doutrina majoritária utiliza para conceituar o princípio da universalidade, abordado no
próximo subitem.
No que tange às isenções, o jurista Roque Antônio Carrazza ressalva que, em
respeito ao critério da generalidade, elas só devem ser concedidas quando coroarem o
princípio da igualdade; noutras palavras, quando as isenções buscarem realizar objetivos
constitucionais consagrados como a proteção aos idosos, à família, aos economicamente mais
fracos, dentre outros.258
Já no que concerne aos incentivos e benefícios fiscais, o professor Roque
Antonio Carrazza afirma que eles não ofenderiam o princípio da generalidade, desde que tais
253
QUEIROZ, ibid., p. 445.
254
RENCK. Renato Romeu. Imposto de renda da pessoa jurídica: critérios constitucionais da apuração da
base de cálculo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010, p. 54.
255
RENCK, loc. cit.
256
OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Princípios fundamentais do imposto de renda. In: SCHOUERI, Luís Eduardo;
ZILVETI, Fernando Aurélio (Coord.). Direito Tributário: Estudos em homenagem a Brandão Machado. São
Paulo: Dialética, 1998, p. 213.
257
BARRETO, ibid., p. 771.
258
CARRAZZA id., 2009, p. 69.
73
259
CARRAZZA, loc. cit.
260
QUEIROZ id., 2005, p. 444.
261
CARRAZZA id., 2009, p. 69.
74
pelo contribuinte dentro do período-base definido pelo legislador, frisando, ainda, que a
universalidade deve observar a capacidade contributiva.262
Semelhante é a lição de Mary Elbe Queiroz, que afirma:
Relativamente ao imposto sobre a renda, a universalidade impõe que a incidência do
imposto deverá alcançar todas as 'rendas' e 'proventos', de qualquer espécie,
independentemente de denominação ou fonte, que deverá ser considerado no seu
conjunto. O sentido mais adequado é que a apuração da base de cálculo do imposto,
que deverá ocorrer em um dado instante, abrangerá o total de rendimentos que foi
percebido em determinado período de tempo fixado na lei (periodicidade) como
necessários para que se possa aferir a real capacidade contributiva dos sujeitos. 263
262
LEMKE id., 2001, p.37.
263
QUEIROZ id., 2009, p. 70.
264
LEMKE, ibid., p. 771.
265
OLIVEIRA, Ricardo Mariz de. Princípios fundamentais do imposto de renda. In: SCHOUERI, Luís Eduardo;
ZILVETI, Fernando Aurélio (coord.) Direito Tributário: Estudos em homenagem a Brandão Machado. São
Paulo : Dialética, 1998, pp. 213-214.
266
RODRIGUES, ibid., p. 194.
267
BARRETO, ibid., p. 771.
75
268
CARRAZZA, ibid., p. 771.
269
LACOMBE, Américo Masset. Princípios constitucionais tributários. 2.ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p.
42; QUEIROZ id., 2005, p. 446.
270
QUEIROZ, ibid., p. 134.
271
XAVIER, Alberto. Mesa de debates do VI Congresso Brasileiro de Direito Tributario. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1994. In: ÁVILA, Humberto. Sistema constitucional tributário. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p.
390.
76
272
MACHADO, ibid., p. 323.
273
CONTI, ibid., p. 76.
274
CONTI, ibid., p. 75.
275
CONTI, ibid., p. 76
276
HORVATH, ibid., p. 77.
277
HORVATH, ibid., p. 78.
278
HUGON, Paul. O imposto. Teoria moderna e principais sistemas. São Paulo: Renascença, 1945. In: CONTI,
José Maurício. Princípios da capacidade contributiva e da progressividade. São Paulo: Dialética, 1997, p.
76.
77
279
HUGON, ibid., p. 76.
280
BIFANO, ibid., p. 145-147.
281
BLUM, Walter; KALVEN JR., Harry. The uneasy case for progressive taxation. The University of Chicago
Law review, v. 19, 1952. In: SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 357.
282
CONTI, ibid., p. 357.
78
283
CONTI, ibid., p. 78.
284
A base de cálculo é composta dos rendimentos tributáveis auferidos no período de apuração, menos os
descontos previstos em lei.
285
Tabela progressiva mensal com as alíquotas e base de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Física (ano-
calendário 2012), de acordo com a Lei 12.469 de Agosto de 2011. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12469.htm>. Acesso em: 10 de mar. 2012.
79
286
O autor refere-se à alíquota vigente no ano-calendário 2011. Atualmente, no ano-calendário 2012, a alíquota
de 27,5% incide sobre os rendimentos mensais superiores a R$4.087,65.
287
CARRAZZA, ibid., p. 128.
288
SCHOUERI, ibid., p. 356.
289
CARRAZZA id., 2009, p.72.
290
LEMKE, ibid., p. 51.
80
291
PASSOS DE SOUZA, André Ricardo. A tributação da renda nas operações praticadas no âmbito do mercado
financeiro e de capitais e os novos títulos para financiamento do agronegócio. In: Revista de Direito
Mercantil, São Paulo, SP, N.º 141, ago. 2006.
292
Código Tributário Nacional, art. 43, I: “de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da
combinação de ambos”.
293
MOSQUERA, ibid., p. 62.
294
PASSOS DE SOUZA, ibid., p. 217-218.
81
Assim como as demais normas, as regras jurídicas atinentes ao mercado de capitais devem
submeter-se à Constituição Federal de 1988 e aos princípios norteadores ali contidos.295
Em seu bojo, a legislação atinente ao imposto de renda apresenta normas
específicas quanto à tributação dos ganhos líquidos auferidos nas operações em renda
variável. Neste contexto, ressalta-se que, segundo a legislação tributária brasileira, o fato
gerador do imposto de renda constitui-se em auferir ganhos líquidos nas operações realizadas
pelo contribuinte, ou seja, obter resultados que representem acréscimo patrimonial. 296 Além
disso, o produto destas operações deve estar disponível econômica ou juridicamente ao
investidor.297
No entanto, a tributação sobre os ganhos líquidos obtidos em operações com
renda variável é recente; tem pouco mais de trinta anos.298
Fazendo um breve apanhado histórico, é de se destacar que até a edição da Lei
4.728/1965 não havia uma distinção objetiva no que pertine às regras tributárias aplicadas à
renda fixa e à variável. A definição do conceito de “ganho líquido” surgiu apenas em 1988, no
art. 40, §1º, da Lei 7.713.299 Em síntese, o referido dispositivo estipulou que o ganho líquido é
o produto da soma algébrica dos ganhos, deduzidos os custos e despesas operacionais. Em
1996, a Lei 9.430 passou a determinar que os ganhos líquidos no mercado de balcão (ativos
não negociados em Bolsa) tivessem o mesmo tratamento dos ganhos obtidos em Bolsa.300
Hodiernamente, as regras atinentes à tributação dos ganhos líquidos em renda
variável são expressas pela Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010. Assim, para fins de
incidência do imposto de renda, a Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, complementando
a Lei 8.981/95 e posteriores, define como operações em renda variável: i) operações
praticadas por clubes de investimento, fundos de investimento e congêneres que investem em
ações; ii) swaps (de índices, preços, taxas, entre outros); iii) operações à vista, a termo ou a
futuro realizadas nas bolsas de valores, mercadorias e futuros ou, inclusive, operações fora da
bolsa (vista, opções, termo, futuro e ouro, ativo financeiro).
295
MOSQUERA, ibid., p. 218.
296
PASSOS DE SOUZA, ibid., p. 222.
297
SILVA, Genison Augusto Couto. Imposto de renda em aplicações financeiras. In: Revista Dialética de
Direito Tributário, São Paulo, SP. N.º 71, p. 77-83, ago. 2001.
298
BIFANO, ibid., p. 246.
299
Art. 40, §1º, da Lei 7.713/88: “Considera-se ganho líquido o resultado positivo auferido nas operações ou
contratos liquidados em cada mês, admitida a dedução dos custos e despesas efetivamente incorridos,
necessários à realização das operações, e à compensação das perdas efetivas ocorridas no mesmo período”.
300
BIFANO, ibid., p. 247.
82
301
Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 45, §3º: “Considera-se ganho líquido o resultado positivo
auferido nas operações de que tratam os arts. 47 a 51 realizadas em cada mês, admitida a dedução dos custos e
despesas incorridos, necessários à realização das operações”.
302
Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 18, §2º: “Para efeito do disposto neste artigo, consideram-se
fundos de investimento em ações aqueles cujas carteiras sejam constituídas, no mínimo, por 67% (sessenta e sete
por cento) de ações negociadas no mercado à vista de bolsa de valores ou entidade assemelhada, no País ou no
exterior, na forma regulamentada pela Comissão de Valores Mobiliários.”
303
CORRÊA, Arnaldo; RAÍCES, Carlos. Derivativos agrícolas apud PASSOS DE SOUZA, André Ricardo. A
tributação da renda nas operações praticadas no âmbito do mercado financeiro e de capitais e os novos títulos
para financiamento do agronegócio In: Revista de Direito Mercantil, n. 141, São Paulo : Malheiros, 2006, p.
223.
304
Informação retirada do site da BM&F Bovespa. Disponível em: <http://www.bmfbovespa.com.br/pt-
br/educacional/iniciantes/mercados-de-derivativos/tipos-de-mercados-derivativos/tipos-de-mercados-
derivativos.aspx?idioma=pt-br>. Acesso em: 06 de abril de 2012.
305
Informação retirada do site da BM&F Bovespa. Disponível em: <http://www.bmfbovespa.com.br/pt-
br/educacional/iniciantes/mercados-de-derivativos/tipos-de-mercados-derivativos/tipos-de-mercados-
derivativos.aspx?idioma=pt-br>. Acesso em: 06 de abril de 2012.
83
306
BIFANO, ibid., p. 248.
84
307
SOUZA, André Ricardo Passos de. A tributação da renda nas operações praticadas no âmbito do mercado
financeiro e de capitais e os novos títulos para financiamento do agronegócio In: Revista de Direito
Mercantil, n. 141, São Paulo : Malheiros, 2006, p. 222; Site da BM&F Bovespa. Disponível em:
<http://www.bmfbovespa.com.br/pt-br/regulacao/custos-e-tributos/tributacao/tributacao.aspx?Idioma=pt-br>.
Acesso em: 06 de abril de 2012.
308
LEMKE ibid., p. 68.
309
MOSQUERA, Roberto Quiroga. O regime jurídico tributário das aplicações financeiras realizadas no
mercado financeiro e de capitais brasileiro In: Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo, n. 9,
jun/1996, p. 62.
310
Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 45: “Esta Seção dispõe sobre a incidência do imposto sobre a
renda sobre os ganhos líquidos auferidos por qualquer beneficiário, inclusive pessoa jurídica isenta, em
operações realizadas nas bolsas de valores, de mercadorias, de futuros e assemelhadas, existentes no País”.
311
Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 48, I e II: “Art. 48. São isentos do imposto sobre a renda os
ganhos líquidos auferidos por pessoa física em operações efetuadas: I - com ações, no mercado à vista de
bolsas de valores ou mercado de balcão, se o total das alienações desse ativo, realizadas no mês, não exceder a
R$ 20.000, 00 (vinte mil reais); II - com ouro, ativo financeiro, se o total das alienações desse ativo, realizadas
no mês, não exceder a R$ 20.000,00 (vinte mil reais)”.
85
312
Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 47: “Nos mercados à vista, o ganho líquido será constituído pela
diferença positiva entre o valor de alienação do ativo e o seu custo de aquisição, calculado pela média
ponderada dos custos unitários”.
313
Cf. Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 18, §1º: “A base de cálculo do imposto será constituída pela
diferença positiva entre o valor de resgate e o custo de aquisição da cota, considerados pelo seu valor
patrimonial”.
314
Cf. Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 18, §1º e §5º: “§1º A base de cálculo do imposto nas
operações de que trata este artigo será o resultado positivo auferido na liquidação do contrato de swap,
inclusive quando da cessão do mesmo contrato; §5º Na apuração do imposto de que trata este artigo, poderão
ser considerados como custo da operação os valores pagos a título de cobertura (prêmio) contra eventuais
perdas incorridas em operações de swap”.
315
Cf. Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 50: “Nos mercados futuros, o ganho líquido será o resultado
positivo da soma algébrica dos ajustes diários por ocasião da liquidação dos contratos ou da cessão ou
encerramento da posição, em cada mês”.
316
Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 38, I, ‘b’: “no mercado a termo nas bolsas de que trata a alínea
“a”, em operações de venda coberta e sem ajustes diários”.
86
Destaca-se que, de acordo com a Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 45, §3º,
qualquer das situações expostas admite a dedução das despesas operacionais incorridas.317
A apuração da base de cálculo do mercado de opções é um pouco mais
intrincada. Vale dizer, dependerá do tipo de negócio realizado, e é determinada da seguinte
forma: i) negociação de opções: a base de cálculo é formada pelo resultado positivo apurado
no encerramento de opções da mesma série; ii) titular da opção de compra: base de cálculo é a
diferença positiva entre valor de venda à vista do ativo da data do exercício, acrescido do
valor do prêmio; iii) lançador da opção de compra: o ganho líquido constitui-se na diferença
positiva entre o preço de exercício da opção, mais o valor do prêmio e custos de aquisição da
ativo objeto do exercício; iv) titular da opção de venda: considera-se ganho líquido a
diferença positiva entre o preço de exercício da opção e o valor da compra à vista do ativo,
juntamente com o valor do prêmio; v) lançador da opção de venda: neste último caso, a base
de cálculo será o resultado positivo da diferença entre o preço da venda à vista do ativo da
data do exercício da opção e o preço de exercício da opção, acrescido do valor do prêmio. 318
É importante salientar que nas operações denominadas day trade319 a base de
cálculo será composta pelo resultado positivo apurado no encerramento da operação. Detalhe
interessante é que a legislação referente aos ganhos em renda variável denomina o montante
auferido em operações day trade como sendo rendimento.320
Vale destacar, ainda, que é permitida a dedução das despesas operacionais para
fins do cálculo do montante tributável. Embora num primeiro momento possa-se associar
estas despesas a qualquer valor cobrado do contribuinte em relação às operações realizas,
estas deduções não são tão abrangentes assim. Desse modo, tem-se como “despesas
operacionais” as despesas descontadas que constam nas notas de corretagem, tais como, valor
317
Cf. Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 51, I, II e III: “Art. 51. Nos mercados a termo, o ganho
líquido será constituído: I - no caso do comprador, pela diferença positiva entre o valor da venda à vista do
ativo na data da liquidação do contrato a termo e o preço nele estabelecido; II - no caso do vendedor
descoberto, pela diferença positiva entre o preço estabelecido no contrato a termo e o preço da compra à vista
do ativo para a liquidação daquele contrato; III - no caso de vendedor coberto, pela diferença positiva entre o
preço estabelecido no contrato a termo e o custo médio de aquisição do ativo apurado na forma do art. 47,
exceto na hipótese de operação conjugada a que se refere a alínea ‘b’ do inciso I do caput do art. 38”.
318
BIFANO ibid., p. 269-270.
319
Cf. Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 55, I: “I - day-trade: a operação ou a conjugação de
operações iniciadas e encerradas em um mesmo dia, com o mesmo ativo, em uma mesma instituição
intermediadora, em que a quantidade negociada tenha sido liquidada, total ou parcialmente; (Redação dada
pela Instrução Normativa RFB nº 1.236, de 11 de janeiro de 2012)”.
320
Cf. Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 54, §1º, II: “rendimento: o resultado positivo apurado no
encerramento das operações de day-trade”.
87
da corretagem, emolumentos, etc. Então, esses valores devem ser deduzidos do preço de
venda dos ativos ou contratos negociados.321
Como será visto no item 4.1.3, nos ganhos líquidos também há a incidência do
imposto retido na fonte. Este imposto, apesar de constar na nota de corretagem, não é uma
despesa dedutível. Contudo, o imposto de renda retido na fonte poderá ser deduzido
diretamente do imposto devido, conforme será mais bem estudado no item supracitado.322
Menciona-se, por oportuno, que também é possível haver a compensação de
perdas incorridas no mês com o ganho líquido auferido. Porém, antes de prosseguir, é
importante fazer uma distinção acerca do termo “compensação”. Tem-se no Direito Tributário
que quando o contribuinte paga um tributo que não deve, ou paga a maior, este tem direito à
restituição ou compensação. No entanto, aqui, a compensação refere-se às perdas havidas em
determinado período, que é aplicada ainda na determinação da base de cálculo.323
Feito este breve esclarecimento, parte-se para a explicação da compensação do
imposto de renda nos ganhos em renda variável. Neste sentido, só poderão ser compensadas
perdas com rendimentos ou ganhos líquidos obtidos em operações da mesma espécie, ou seja,
só será possível compensar perdas em operações day trade com rendimentos auferidos em
operações dessa espécie, assim como perdas incorridas em operações comuns só poderão ser
compensadas com ganhos auferidos em operações comuns.324
Entretanto, no que tange às modalidades, não há esta restrição. É possível
compensar resultados positivos obtidos no mês em qualquer tipo de operação (à vista, opções,
futuro, etc.) com as perdas havidas no mês nas demais modalidades, desde que seja o mesmo
tipo de operação (comum ou day trade). Assim, pode-se, por exemplo, compensar uma perda
havida no mercado futuro com o ganho obtido no mercado à vista.325
Com efeito, é possível, ainda, compensar as perdas havidas nos meses
anteriores com os resultados positivos obtidos nos meses seguintes, para a determinação da
base de cálculo desses meses subsequentes. Todavia, o oposto é vedado, isto é, não se pode
aproveitar perdas atuais a fim de compensá-las com ganhos passados, pois o imposto em
comento apresenta tributação definitiva e incide mensalmente.326
321
LO VISCO, Murillo. Imposto de renda no mercado de ações: a tributação sobre os ganhos de pessoa física
na bolsa de valores. São Paulo: Novatec, 2012, p. 91-92.
322
LO VISCO, ibid., p. 93.
323
LO VISCO, ibid., p. 45.
324
LO VISCO, ibid., p. 261.
325
LO VISCO, loc. cit.
326
LO VISCO, ibid., p. 271.
88
Desta forma, em sendo negativo o resultado mensal nas operações, não haverá
como compor a base de cálculo, então, não há imposto devido. Também não existirá base de
cálculo e, consequentemente, imposto a ser recolhido, se o resultado da compensação entre o
resultado mensal positivo e o eventual saldo de perdas acumulado nos meses anteriores for
negativo.327
Apesar de a formação da base de cálculo das mais diversas operações de renda
variável não ser algo uniforme, seu entendimento não é complicado, eis que, em resumo, é o
ganho líquido auferido na operação realizada. Agora, tendo conhecimento do fato gerador e
da base de cálculo a ser utilizada na tributação dos ganhos em renda variável, passa-se a
estudar a alíquota incidente nestes ganhos.
327
LO VISCO, ibid., p. 271.
328
De acordo com Mary Elbe Queiroz, a incidência definitiva significa que “no momento em que se auferir o
ganho de capital ou o ganho líquido no mercado de renda variável, o próprio contribuinte apura o valor do
tributo devido, com base em alíquotas fixas, e faz o respectivo recolhimento” (QUEIROZ, Mary Elbe. Imposto
sobre a renda e proventos de qualquer natureza – tributação das pessoas físicas In: Curso de especialização em
direito tributário: estudos analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho, 1ª Ed., Rio de Janeiro :
Forense, 2005 2005, p. 463).
328
BIFANO, ibid., p. 253.
329
LUI, ibid., p. 151.
330
Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, arts. 18 e 46: “Art. 18. Os cotistas dos fundos de investimento em
ações serão tributados pelo imposto sobre a renda exclusivamente no resgate de cotas, à alíquota de 15%
(quinze por cento). (...) Art. 46. Os ganhos líquidos auferidos em alienações ocorridas nos mercados à vista, em
operações liquidadas nos mercados de opções e a termo e em ajustes diários apurados nos mercados futuros
sujeitam-se ao imposto sobre a renda à alíquota de 15% (quinze por cento).”
89
isenção,331 estarão sujeitos a uma alíquota fixa de 15%. No caso de operações day trade, a
tributação terá uma alíquota de 20% sobre os ganhos mensais auferidos neste tipo de
operação, de forma isolada às demais operações realizadas no mercado de capitais.332
Ciente da alíquota aplicada, faz-se necessário fazer uma breve explicação
acerca da periodicidade do recolhimento do imposto em estudo.
A Lei 7.713/88 estabeleceu ser mensal a periodicidade de recolhimento do
imposto de renda nos ganhos em renda variável, sendo que o tributo deve ser pago até o
último dia útil do mês subsequente à sua apuração. Atualmente, o art. 45, §4º, da Instrução
Normativa RFB n° 1.022/2010333 mantém a periodicidade mensal. Importante ressaltar que a
tributação dos ganhos em renda variável é feita de maneira autônoma aos demais rendimentos
auferidos pelo contribuinte.334
Aqui, é relevante referir que o aspecto temporal do imposto de renda suscita
divergências doutrinárias. Entretanto, sobre a questão do aspecto temporal do imposto de
renda, não cabe aqui maiores discussões, vez que tal assunto foi superado no item 2.5 desta
monografia.335
Além do imposto de renda recolhido pelo próprio contribuinte de forma
definitiva, conforme estudado acima, há a incidência do imposto de renda retido na fonte.336
Tal tributação é recente, uma inovação trazida pela Lei 11.033/2004, vez que antes de sua
edição, o imposto de renda sobre os ganhos em renda variável era recolhido só na forma
periódica.337
Então, nas operações em bolsa de valores, mercadorias, futuros e assemelhados
a alíquota do imposto retido na fonte é de 0,005%, e incide sobre os seguintes valores: i) no
mercado à vista: sobre o valor da alienação nas operações com ações, ouro (ativo financeiro) e
outros valores mobiliários negociados no mercado à vista; ii) no mercado de opções: sobre o
331
Cf. Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 48, caput, I e II: “Art. 48. São isentos do imposto sobre a
renda os ganhos líquidos auferidos por pessoa física em operações efetuadas: I - com ações, no mercado à vista
de bolsas de valores ou mercado de balcão, se o total das alienações desse ativo, realizadas no mês, não
exceder a R$ 20.000, 00 (vinte mil reais); II - com ouro, ativo financeiro, se o total das alienações desse ativo,
realizadas no mês, não exceder a R$ 20.000,00 (vinte mil reais)”.
332
BIFANO, ibid., p. 248.
333
Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 45: “§ 4º O imposto de que trata este artigo será apurado por
períodos mensais e pago pelo contribuinte até o último dia útil do mês subsequente ao da apuração”.
334
BIFANO, ibid., p. 252.
335
Matéria examinada no item 1.5 do primeiro capítulo desta pesquisa.
336
A incidência na fonte, segundo Mary Elbe Queiroz, constitui-se de “retenções efetuadas pelas fontes
pagadoras soba a forma de antecipações, apuradas com base na tabela progressiva, no momento do pagamento
ou crédito do rendimento, seja mensal, no caso dos assalariados, ou, a cada pagamento, quando tratar de
autônomo” (QUEIROZ, Mary Elbe. Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza – tributação das
pessoas físicas In: Curso de especialização em direito tributário: estudos analíticos em homenagem a
Paulo de Barros Carvalho, 1ª Ed., Rio de Janeiro : Forense, 2005 2005, p. 463).
337
BIFANO, ibid., p. 253.
90
resultado positivo da soma algébrica dos prêmios pagos e recebidos no mesmo dia; iii) no
mercado futuro: sobre o resultado positivo da soma algébrica dos ajustes diários, apurado na
ocasião do encerramento da posição, seja no seu vencimento ou antecipadamente; iv) no
mercado à termo: a diferença positiva entre o preço do termo e o preço à vista, na liquidação,
em havendo a entrega do bem. 338 Ainda referente ao imposto de renda retido na fonte,
exceção aplica-se às operações denominadas day trade. Neste caso, a alíquota será de 1%
sobre o resultado positivo apurado.339
Vale destacar, por fim, que as operações em renda variável realizadas fora da
bolsa, como no mercado de balcão, também sujeitas ao imposto de renda retido na fonte.340
Destaque-se, por oportuno, que o montante retido na fonte é passível de
deduções e compensações. Neste sentido, o imposto de renda retido na fonte poderá ser: i)
deduzido do imposto sobre os ganhos líquidos auferidos no mês; ii) compensado com o
imposto incidente sobre os ganhos líquidos a serem apurados no mês subsequente; iii)
compensado na declaração de ajuste se, na dedução e compensação citadas anteriormente,
ainda houver saldo de imposto retido; e, por fim, iv) será possível compensar com o imposto
devido sobre o ganho líquido havido na alienação de ações.341
Cabe uma ressalva no que pertine ao mercado swap. O imposto de renda nas
operações realizadas neste mercado apresenta alíquotas progressivas e tem somente tributação
na fonte. Neste caso, a alíquota diminui conforme o tempo em que o investidor mantiver a
operação, da seguinte forma: i) aplicações até 180 dias: 22,5%; ii) aplicações de 181 a 360
dias: 20%; iii) aplicações de 361 a 720 dias: 17,5%; iv) aplicações acima de 720 dias: 15%.342
De vital importância dizer, diferente dos demais ganhos líquidos em renda varável, neste
mercado não cabe ao contribuinte recolher o imposto de renda; ele incide diretamente na
fonte.343
338
BIFANO, ibid., p. 253-254.
339
FORTUNA, Eduardo. Mercado financeiro: produtos e serviços. 17. ed. Rio de Janeiro: Quality Mark, 2008,
p. 635.
340
BIFANO, ibid., p. 254.
341
FORTUNA, ibid., p. 635-636.
342
Cf. Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 37, I a IV: “Art. 37. Os rendimentos produzidos por
aplicações financeiras de renda fixa e de renda variável, auferidos por qualquer beneficiário, inclusive pessoa
jurídica isenta, sujeitam-se à incidência do imposto sobre a renda na fonte às seguintes alíquotas: I - 22,5%
(vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento), em aplicações com prazo de até 180 (cento e oitenta) dias; II -
20% (vinte por cento), em aplicações com prazo de 181 (cento e oitenta e um) dias até 360 (trezentos e
sessenta) dias; III - 17,5% (dezessete inteiros e cinco décimos por cento), em aplicações com prazo de 361
(trezentos e sessenta e um dias) até 720 (setecentos e vinte) dias; IV - 15% (quinze por cento), em aplicações
com prazo acima de 720 (setecentos e vinte) dias”.
343
Cf. Instrução Normativa RFB n° 1.022/2010, art. 40, §2º: “Art. 40. Estão sujeitos à incidência do imposto
sobre a renda na fonte, às alíquotas previstas no art. 37, os rendimentos auferidos em operações de swap. (...)
91
§ 2º O imposto será retido pela pessoa jurídica que efetuar o pagamento do rendimento, na data da liquidação ou
da cessão do respectivo contrato”.
344
Filiam-se à esta corrente os autores Elidie Palam Bifano, Hugo de Brito Machado, Mary Elbe Queiroz, Roque
Antonio Carrazza e outros.
92
345
BIFANO, ibid., p. 317-324.
346
CARRAZZA id., 2009, p. 323.
347
CARRAZZA, ibid., p. 317-319.
348
CARRAZZA, ibid., p. 323.
349
CARRAZZA id., 2011, p. 126-127.
350
Cabe fazer uma rápida explicação acerca da seletividade. Por exemplo, o IPI e o ICMS são tributos que
devem sujeitar-se ao critério da seletividade. Neste sentido, de acordo com Luís Eduardo Schoueri, “a
seletividade se encontra vinculada à essencialidade, indicando que os referidos impostos podem ter alíquotas
variadas, não em função da base de cálculo, como na progressividade, mas em função dos próprios produtos”.
(SCHOUERI, Luís Eduardo. Direito tributário. 1ª Ed. São Paulo : Saraiva, 2011, p. 373)
351
CARRAZZA id., 2009, p. 70.
93
352
BALEEIRO, ibid., p. 169.
353
Os princípios fundamentais de imposto de renda e a tributação das aplicações financeiras apud BIFANO,
Elidie Palma. O Mercado financeiro e o imposto sobre a renda. 2ª Ed. São Paulo : Quartier Latin, 2011, p.
173.
354
BIFANO, ibid., p. 154
355
A supremacia constitucional e o Imposto de Renda In: MARTINS, Ives Gandra da Silva (Coord.). Imposto
de renda: conceitos, princípios, comentários. 2ª Ed. São Paulo: Atlas, 1996, pp. 41-56.
356
Os principais defensores desta corrente são os juristas Alcides Jorge Costa, Fábio Fanucchi, Ives Gandra da
Silva Martins e Zuudi Sakakihara.
94
357
SAKAKIHARA, ibid., p. -153.
358
MARTINS, Marcelo Guerra. Considerações em torno do aspecto temporal do imposto sobre a renda. Revista
CEJ, Brasília, v. 9, n. 28, p. 86, jan./mar. 2005. Disponível em:
<http://www2.cjf.jus.br/ojs2/index.php/cej/article/viewFile/650/830>. Acesso em: 10 de março de 2012.
359
Art. 43, caput do Código Tributário Nacional: “Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e
proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica”.
360
A hipótese de imposição do Imposto sobre a Renda e proventos de qualquer natureza, etc., em Imposto de
Renda – Estudos 37, 04/93, pp.09-25 apud LEMKE, Gisele. Imposto de renda: os conceitos de renda e de
disponibilidade econômica e jurídica. São Paulo : Dialética, 1998, p. 78.
361
A hipótese de imposição do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza. A convivência de
regimes jurídicos distintos para a apuração do 'quantum debeatur' concernente ao referido tributo - opinião
legal In: Suplemento Tributário, LTr, 28/1993.
362
Imposto sobre a Renda – A aquisição de disponibilidade jurídica ou econômica como seu fato gerador. Limite
de sua incidência. RDT 40, pp. 103-107 apud LEMKE, Gisele. Imposto de renda: os conceitos de renda e de
disponibilidade econômica e jurídica. São Paulo : Dialética, 1998, p. 94.
95
Fanucchi, cada fato gerador é possível de originar uma obrigação tributária distinta, portanto,
sendo passível da incidência do imposto de renda, mesmo que isoladamente.363
Ainda acerca da constitucionalidade da tributação isolada e definitiva, o
consultor da União, Oswaldo Othon Pontes Saraiva Filho, em parecer dado em 28 de
setembro de 2000, manifestou-se no sentido de que tal tributação respeita os princípios
constitucionais informadores do imposto de renda, sendo muito eficiente nos casos em que a
apuração do real acréscimo patrimonial seja difícil de aferir. 364 Com efeito, explica o
consultor que:
O fato é que, como regra geral, a Constituição Federal utilizou o conceito de renda e
proventos como acréscimo patrimonial, variando esse conceito nos dois polos: um
deles como renda líquida ou lucro líquido, nos termos da lei comercial, mas acolheu,
também no outro polo, a incidência do imposto de renda sobre a receita bruta, nas
hipóteses em que, sucedida a disponibilidade da renda, ocorrendo aí o rendimento,
há a impossibilidade de o Fisco brasileiro quantificar em termos reais esse
acréscimo.365
363
Curso de direito tributário brasileiro, vol. II, p. 66 apud LEMKE, Gisele. Imposto de renda: os conceitos de
renda e de disponibilidade econômica e jurídica. São Paulo : Dialética, 1998, p. 78.
364
Parecer acerca da incidência ou não do Imposto de Renda sobre receitas provenientes do exterior. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_18/parecer_gm12.htm>. Acesso em: 16 de fev. de
2012.
365
Parecer acerca da incidência ou não do Imposto de Renda sobre receitas provenientes do exterior. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/revista/Rev_18/parecer_gm12.htm>. Acesso em: 16 de fev. de
2012.
96
numa aplicação financeira pode ser considerada acréscimo patrimonial. Por isso, concluem os
tribunais não haver ofensa aos princípios da generalidade, progressividade e universalidade. 366
Além dos tópicos acima expostos, outra questão tormentosa a respeito da
constitucionalidade do imposto de renda nos ganhos em renda variável reside na
periodicidade da exigência de tal tributo. De acordo com o estudo realizado no subitem
anterior, foi visto que o imposto de renda nos ganhos líquidos auferidos em operações de
renda variável tem periodicidade mensal, definida pela Lei 7.713/88 e ulteriores alterações.
Embora a periodicidade já tenha sido objeto de análise no primeiro capítulo
deste estudo, vale lembrá-la quando se aborda a (in)constitucionalidade do imposto de renda
nos ganhos em renda variável.
Então, discorrendo acerca da periodicidade, Mary Elbe Queiroz ensina que,
para o imposto de renda atender aos preceitos constitucionais, deve haver um lapso de tempo
suficiente para permitir o cômputo do acréscimo patrimonial. 367 Para ela, a incidência do
imposto de renda para as pessoas físicas é anual, com o seu fato gerador se perfectibilizando
no dia 31 de dezembro de cada ano, alcançando todas as rendas e/ou proventos e despesas
compreendidas entre 1º de janeiro e 31 de dezembro de cada ano.368
José Artur Lima Gonçalves entende que advém da Constituição Federal, ainda
que implicitamente, a noção de que a periodicidade da incidência do imposto de renda é
anual. Conforme o autor, a organização estatal, estipulada pela Constituição Federal de 1988,
está calcada na ideia de periodicidade anual. Então, assim como ocorre com o conceito de
renda, também a periodicidade deve ser interpretada em consonância com as demais
disposições que tratam da mesma questão.369
Contudo, alguns doutrinadores entendem que os rendimentos podem ser
cobrados de maneira isolada, sem desrespeitar a Constituição Federal, vez que ela não impõe
um período anual, como defendem os juristas anteriores.
Com efeito, embora Ricardo Mariz de Oliveira se oponha à tributação isolada,
ele defende ser possível que a lei ordinária estipule um período de apuração do acréscimo
patrimonial. Nas palavras do autor citado, “o imposto sobre a renda pode incidir sobre
366
Neste sentido: TRF, 4ª R, 1ª T, AMS 96.04.44065-9/RS, 2000; TRF, 4ª R, 1ª T, AMS 95.04.29818-4/RS,
1997.
367
QUEIROZ, Mary Elbe. Imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza – tributação das pessoas
físicas In: DE SANTI. Eurico Marcos Diniz (Coord.). Curso de especialização em direito tributário: estudos
analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho, 1ª Ed., Rio de Janeiro : Forense, 2005, pp. 462-463.
368
Ibidem, p. 463.
369
Imposto sobre a renda – pressupostos constitucionais apud CARRAZZA, Roque Antônio. Imposto sobre a
renda (perfil constitucional e temas específicos). 3ª Ed. rev., ampl. e atual. São Paulo : Malheiros, 2009, p.
131.
97
qualquer acréscimo patrimonial obtido em cada período de tempo previsto em lei”. 370 Por este
prisma, não haveria problemas em aferir, mensalmente, os ganhos líquidos em renda variável.
Adepto do conceito de renda dinâmica, abordado no primeiro capítulo, Zuudi
Sakakihara também não vê inconstitucionalidade alguma na periodicidade mensal do imposto
de renda nos ganhos em renda variável. Para ele, a Constituição Federal, bem como o Código
Tributário Nacional, não estipulam um prazo mínimo para a análise da variação patrimonial.
Estipular a periodicidade do imposto de renda é tarefa que cabe ao legislador ordinário. Uma
vez que a lei estipula periodicidade mensal para aferir esta renda, não há nada errado nela.371
Nota-se, portanto, que os defensores da incidência e cobrança do imposto de
renda de forma autônoma, como ocorre com os ganhos líquidos em renda variável, apoiam-se
na tese de que a tributação, tal como é realizada, não agride o conceito de renda. Desta forma,
indiretamente, se está respeitado os princípios constitucionais informadores do imposto de
renda. Destaca-se, ainda, como recém referido, que os tribunais, nos parcos julgados sobre o
tema, têm defendido a sua constitucionalidade, não vendo ofensas aos princípios informadores
do imposto de renda.
Por outro lado, vê-se que são contundentes os argumentos daqueles que
defendem a inconstitucionalidade da forma de incidência de tal tributo da forma com que é
exigido. A fundamentação principal, conforme visto, reside no fato de que a tributação sobre
rendimentos isolados desrespeitaria a generalidade e a universalidade ao não tratar a renda de
forma global; junto a isso, como tal tributo tem alíquota fixa, a progressividade restaria
desrespeitada. Com isso, atinge-se, ainda, a capacidade contributiva do indivíduo, que não é
levada em conta neste caso.
Também é interessante destacar que muito embora a doutrina majoritária
entenda que a tributação do imposto de renda incidente sobre rendimentos isolados, os
tribunais entendem, nos parcos julgados sobre o tema, que não há ofensa aos princípios
informadores do imposto de renda.
Por fim, pode-se dizer que ambas as correntes apresentam argumentos
interessantes, no entanto a doutrina majoritária parece apresentar argumentos mais sólidos a
respeito da questão, conquanto a corrente minoritária fica presa quase que somente à
periodicidade da renda ou ao conceito da própria renda, que também não é pacífico, como foi
possível estudar anteriormente.
370
Princípios fundamentais do imposto de renda apud Curso de especialização em direito tributário: estudos
analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho, 1ª Ed., Rio de Janeiro : Forense, 2005, nota 23, p. 778.
371
SAKAKIHARA, ibid., p. 152-153.
98
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
primeira questão a ser pontuada é saber se a tributação isolada respeita o conceito de renda
adotado.
Assim, vale lembrar que, para fins desta pesquisa, entende-se que o conceito de
renda está contido na Constituição Federal. Isto porque, embora este conceito não esteja
expressamente definido, por força da interpretação do Texto Constitucional e seus princípios
chega-se a uma definição para tal conceito. Então, conforme o conceito constitucional, tem-se
que a renda é o efetivo acréscimo patrimonial incorporado ao patrimônio do contribuinte, ou
seja, é a diferença entre a riqueza preexistente e a riqueza nova obtida, deduzidos os gastos
com a manutenção das necessidades básicas do indivíduo, despesas necessárias para a
obtenção dessa riqueza e deduções legais. Vale dizer, pela Constituição Federal a base de
cálculo do imposto de renda, no caso da pessoa física, será a renda líquida.
Com efeito, fácil observar que a tributação pelo imposto de renda realizada da
forma mensal, isolada e definitiva, tal como ocorre com os ganhos líquidos auferidos em
renda variável, não considera o acréscimo patrimonial efetivo do contribuinte, com seus
eventuais prejuízos, despesas necessárias para subsistência e deduções legais. Por este ângulo,
pode-se inferir que, ao tributar somente o rendimento isolado, sem considerar se houve
acréscimo patrimonial ao final do ano fiscal, o imposto de renda dos ganhos líquidos em
renda variável não respeita o próprio conceito de renda estipulado pela Constituição Federal.
Inconstitucional, portanto, o imposto em estudo, vez que afronta claramente o conceito
constitucional de renda.
Resta oportuno lembrar que a ideia de renda está vinculada ao tempo. Sendo
esta um excedente patrimonial, só se poderá aferi-las comparando-se a riqueza do passado
com a do presente. Assim, a renda dever ser aferida dentro de um intervalo de tempo extenso
o suficiente para que se possibilite a correta avaliação dos ingressos patrimoniais e
desembolsos suportados pelo contribuinte. Neste diapasão, embora alguns juristas entendam
que o legislador infraconstitucional tem poder para atribuir o período de apuração da renda,
não há como concordar com esta afirmação.
Novamente, adotando um entendimento sistemático do ordenamento jurídico,
tendo a Constituição Federal como balizadora, pode-se afirmar que essa periodicidade deve
ser anual. Afinal, ao que parece, a utilização do período de um ano tem uma lógica simples:
toda a organização estatal está baseada no período anual. Nisto, tem-se que todas as questões
estatais de cunho financeiro, como o orçamento, gastos, investimentos, etc., previstos na
Constituição Federal baseiam-se no período de doze meses. Logo, a observância de um
intervalo de um ano para aferir a renda do contribuinte é necessária para que o imposto de
100
renda dos ganhos em renda variável fique em harmonia com as demais normas constitucionais
que tratam a questão.
Ainda, ao adotar um período anual, se possibilita uma aferição mais precisa da
renda. Afinal, considerando um período anual de apuração pode-se, por exemplo, compensar
os ganhos de certos meses com as perdas havidas em outro. Assim, vê-se que a aferição em
intervalos anuais também se alinha com o conceito constitucional de renda. Desta forma, uma
vez que o imposto de renda das operações em renda variável incide mensalmente sobre os
ganhos líquidos, pelo exposto, pode-se inferir que tal tributo resta inconstitucional.
Outrossim, a tributação isolada, realizada de forma definitiva, e ainda por cima,
mensal, acaba gravando o patrimônio do contribuinte, e não a sua renda. Ocorre que, ao
gravar o patrimônio do contribuinte, pela tributação isolada de rendimentos, acaba-se por ferir
princípios constitucionais tributários, tais como: a capacidade contributiva, a progressividade,
a universalidade e pode, até mesmo, gerar efeitos confiscatórios, ferindo, então, o princípio da
vedação dos efeitos do confisco.
Neste sentido, a pesquisa demonstrou que um dos mais importantes princípios
tributários vem a ser o da capacidade contributiva. Afinal, o princípio da capacidade
contributiva busca a concretização da justiça fiscal; é o princípio da igualdade aplicado ao
Direito Tributário. Neste diapasão, garante o referido princípio que cada cidadão contribua
com a manutenção do Estado apenas na medida de sua riqueza.
A capacidade contributiva divide-se em capacidade contributiva absoluta e
relativa. A primeira refere-se aos fatos que constituem manifestação de riqueza, em que esta
capacidade seria medida pela renda auferida pelo contribuinte, deduzidos os gastos à sua
aquisição e manutenção, sem considerar as condições individuais do contribuinte. Já a
segunda seria a renda líquida, isto é, a soma de todos os rendimentos auferidos pelo
contribuinte no período de apuração, descontada as despesas pessoais necessárias à existência
digna do contribuinte e sua família. Noutras palavras, é o montante livre para o consumo, é a
parcela de riqueza disponível. Neste caso, individualiza-se o contribuinte.
A par disso, pode-se dizer que ambos os aspectos devem ser observados
quando da instituição, fiscalização e recolhimento do imposto de renda, pois, para apresentar
capacidade econômica para contribuir, é necessário não só a manifestação de riqueza, mas,
sim, que sobrevenham “sobras” dessa riqueza, após os gastos necessários à subsistência do
contribuinte e sua família.
Entretanto, nota-se claramente que o imposto de renda incidente sobre os
ganhos líquidos em renda variável não respeita o princípio da capacidade contributiva. Ao
101
tributar estes ganhos de forma definitiva e isolada, não esta se considerando os gastos do
indivíduo para com sua sobrevivência e de sua família, ou seja, não se individualiza a pessoa,
conforme manda o princípio da capacidade contributiva. Vale dizer, a inobservância desse
princípio, como ocorre com o tributo em estudo, pode fazer com que o contribuinte tenha que
recolher imposto de renda, ainda que este contribuinte apresente redução patrimonial quando
da apuração do imposto a ser pago em função de sua renda global.
Destaca-se que a capacidade contributiva só surgirá depois de satisfeito o
mínimo vital. Então, ao desconsiderar o princípio da capacidade contributiva, este tributo
também poderá incidir sobre o mínimo vital, isto é, o mínimo necessário para o contribuinte e
sua família se manterem. Tal fato, além de ser vedado pela Constituição Federal, deve ser
combatido.
Nota-se, ainda, que ao exigir o tributo mesmo quando o contribuinte não
apresenta renda ao final da apuração, o imposto de renda em estudo apresentará efeitos
confiscatórios, violando, também, o princípio do não-confisco. Isto porque, ao incidir sobre o
patrimônio do contribuinte, e não sobre sua renda, este imposto apresenta efeito confiscatório.
Os efeitos de confisco surgirão no momento em que a capacidade que uma pessoa possui de
entregar parte de sua riqueza sem comprometer sua subsistência for ignorada, vale dizer,
quando se desconsidera a capacidade contributiva da pessoa. Neste sentido, ainda que alguns
juristas entendam que o princípio do não-confisco deve ser visto em face da carga tributária
resultante dos tributos em conjunto, pensa-se que tal princípio não deve ser considerado desta
forma.
De fato, a interpretação sistêmica do tal princípio talvez fosse a mais adequada.
Ou até mesmo combinar a análise do sistema como um todo e o tributo em isolado, com suas
particularidades. Todavia, em face aos diversos tributos existentes no nosso país, de
competências distintas (União, Estados, Municípios e Distrito Federal), se tornaria inviável
saber a partir de quando esta carga passou a ser confiscatória. Então, entende-se que o
princípio do não-confisco deve ser analisado individualmente, inclusive para possibilitar que
as peculiaridades de um dado tributo sejam levadas em consideração no caso concreto.
Nesta pesquisa também foram estudados os princípio constitucionais
informadores do imposto de renda, definidos pela Constituição Federal.
Um dos princípios informadores do imposto de renda, segundo a Constituição
Federal, é o princípio da generalidade. Na pesquisa realizada, ficou entendido que a
generalidade busca evitar que se criem classes de contribuintes. De acordo com este princípio,
qualquer indivíduo que realizar o fato gerador, independente das características inerentes da
102
pessoa (cor, religião, classe social, etc.), deverá contribuir ao Fisco. Com efeito, é importante
dizer, qualquer indivíduo que obtiver ganhos líquidos em operações de renda variável terá que
recolher o imposto de renda, independentemente de outros fatores, notadamente, as
características pessoais.
Neste sentido, pode-se dizer que o imposto de renda nos ganhos em renda
variável obedece ao princípio da generalidade, pois tributa todos aqueles que realizarem seu
fato gerador. No entanto, para que tal tributo seja considerado constitucional, não basta que
respeite um único princípio constitucional informador do imposto de renda. Ademais, também
o princípio da generalidade não deve ser interpretado de forma isolada, devendo ser
interpretado em conjunto com os demais princípios constitucionais tributários abordados nesta
pesquisa.
Outro princípio informador do imposto de renda, conforme a Constituição
Federal, é a universalidade. De acordo com o estudo levantado, pela universalidade, o imposto
de renda deve incidir sobre a globalidade dos rendimentos obtidos pelo contribuinte,
independente de sua denominação ou fonte. Frisa-se, por oportuno, que, por este princípio,
também não é permitido variação de alíquota com base na origem o nome dado ao
rendimento.
Sendo assim, é lógico concluir ser uma afronta à universalidade segregar
rendimentos, tributando-os com alíquotas ou bases de cálculo diferentes daquela aplicada à
riqueza nova obtida. Por conseguinte, levar à tributação pelo imposto de renda somente parte
dos rendimentos, a uma alíquota fixa, como ocorre com os ganhos obtidos em renda variável,
viola flagrantemente o princípio da universalidade.
Não é difícil observar a violação de outro princípio constitucional informador
do imposto de renda, qual seja, o princípio da progressividade. Por este princípio, a alíquota
do imposto de renda deve aumentar conforme o crescimento da base de cálculo do referido
imposto. Importante salientar que a progressividade também é muito importante para
imprimir o caráter pessoal exigido pela Constituição Federal ao imposto de renda. Isto porque,
pela progressividade, gradua-se o imposto de acordo com a capacidade econômica do
contribuinte.
Entretanto, nos ganhos líquidos obtidos em operações em renda variável, a
alíquota aplicada é fixa. Além de afrontar diretamente um mandamento constitucional, o
grande problema em olvidar o princípio da progressividade, aplicando uma alíquota fixa ao
imposto de renda, é que isso o torna proporcional, isto é, acaba por despersonalizá-lo.
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