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XXXI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO

Inovação Tecnológica e Propriedade Intelectual: Desafios da Engenharia de Produção na Consolidação do Brasil no


Cenário Econômico Mundial
Belo Horizonte, MG, Brasil, 04 a 07 de outubro de 2011.

PSICOLOGIA DO TRABALHO E
EMPREENDEDORISMO: UMA ANÁLISE
DE SUAS RELAÇÕES
Alex Eckert (UCS)
alex.eckert@bol.com.br
MARLEI SALETE MECCA (UCS)
msmecca@terra.com.br
Roberto Biasio (UCS)
rbiasio@commcenter-rs.com.br
JOSE ALBERTO CORAIOLA (UTFPR)
coraiola@utfpr.edu.br

A criação de negócios impulsiona o desenvolvimento de um país e de


sua população, porem é necessário que esses negócios prosperem e
para isso as competências do empreendedor, que estão presentes em
todas as organizações, auxiliam significaativamente na sua evolução.
A psicologia do trabalho também está presente em todas as fases do
ciclo de vida das organizações, ao descrever e interpretar a natureza e
a dimensão dos fenômenos psicológicos presentes na situação de
trabalho proporciona ambientes profícuos ao desenvolvimento das
competências. Assim, o objetivo do artigo é descrever a contribuição
da psicologia do trabalho no desenvolvimento das competências do
empreendedor. O artigo configura-se em um estudo descritivo com
abordagem conceitual. As exigências e condições estabelecidas pelo
ambiente interferem no desenvolvimento das competências do
empreendedor e são abordadas pela psicologia do trabalho, daí vem a
sua contribuição. Através do diagnóstico do ambiente de trabalho e
dos fenômenos psicológicos incidentes neste ambiente pode-se elaborar
e desenvolver atividades que propiciem transformar conhecimento em
ações. Estas ações por sua vez desenvolvem nos indivíduos habilidades
que somadas ao conhecimento levam a atitude, por exemplo, de
criação de um novo negócio ou organização.

Palavras-chaves: psicologia do trabalho; competência; empreendedor


XXXI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO
Inovação Tecnológica e Propriedade Intelectual: Desafios da Engenharia de Produção na Consolidação do Brasil no
Cenário Econômico Mundial
Belo Horizonte, MG, Brasil, 04 a 07 de outubro de 2011.

1. Introdução
O empreendedorismo tem sido abordado por vários pesquisadores. Entretanto, algumas
abordagens são fragmentadas com diversas unidades de análises e com pressupostos
epistemológicos distintos. Alguns dos estudos concentram-se no empreendedor em si, outros
nas organizações, outros no contexto, e outros no processo. Devido a sua complexidade,
alguns pesquisadores vêm se preocupando em analisar o empreendedorismo em sua
totalidade. Seguindo esta abordagem pretende-se no artigo progredir no entendimento da
psicologia do trabalho como disciplina influenciando nas decisões e competências do
empreendedor, legitimando seu envolvimento com o empreendimento.
A psicologia do trabalho nasceu da necessidade de atender as demandas dos administradores
de empresas que buscavam estabelecer um controle sobre o comportamento humano no
trabalho. Desde os primeiros estudos voltados à fadiga dos trabalhadores até o seu auge com
a aplicação dos testes psicológicos em seleção de pessoal essa preocupação permeava os
trabalhos dos psicólogos.
O objetivo do artigo é apresentar os elementos de contribuição da psicologia do trabalho para
o desenvolvimento das competências do empreendedor. Para tanto, inicialmente apresenta-se
a revisão sobre o campo do empreendedorismo e na seqüência abordam-se as competências
do empreendedor e conceitos da psicologia do trabalho relacionados ao empreendedorismo.
Por fim apresentam-se algumas considerações relacionadas à importância da psicologia do
trabalho no contexto das competências do empreendedor.
2. Competências do empreendedor
A existência de indivíduos dispostos aos riscos de empreender é um dos pilares do
desenvolvimento econômico (GEM, 2006). Diversos conceitos são encontrados na revisão
da literatura para os termos empreendedor e empreendedorismo. Empreendedor, conforme
Hisrich e Peters (2004, p. 26) é o indivíduo que se arrisca e dá início a algo novo. A palavra
entrepeneur é francesa e literalmente traduzida significa “aquele que esta entre” ou
“intermediário”. No Quadro 1 apresenta-se o desenvolvimento da teoria do
empreendedorismo e do termo empreendedor.

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Origina-se do francês: significa aquele que está entre ou estar entre.


Idade média:participante e pessoa encarregada de projetos de produção em grande escala.
Século XVII:pessoa que assumia riscos de lucro (ou prejuízo) em um contrato de valor fixo com o governo.
1725Richard Cantillon – pessoa que assume riscos é diferente da que fornece capital.
1803Jean Baptiste Say – lucros do empreendedor separados dos lucros de capital.
1876Fancis Walker – distinguiu entre os que forneciam fundos e recebiam juros e aqueles que obtenham
lucro com habilidades administrativas.
1934Joseph Schumpeter – o empreendedor é um inovador e desenvolve tecnologia que ainda não foi testada.
1961David McClelland – o empreendedor é alguém dinâmico que corre riscos moderados.
1964Peter Druckeer – o empreendedor maximiza oportunidades.
1975Albert Shapero – o empreendedor toma iniciativa, organiza alguns mecanismos sociais e econômicos, e
aceita riscos de fracasso.
1980Kari Vésper – o empreendedor é visto de modo diferente por economistas, psicólogos, negociantes e
políticos.
1983Girfford Pinchot – o intra-empreendedorismo é um empreendedor que atua dentro de uma organização
já estabelecida.
1985Robert Hisrich – o empreendedor é o processo de criar algo diferente e com valor, dedicando o tempo e
o esforço necessários, assumindo os riscos financeiros, psicológicos e sociais correspondentes e recebendo
recompensas da satisfação econômica e pessoal.

Quadro 1: Desenvolvimento da teoria do empreendedorismo e do termo empreendedor


Fonte: HISRICH, Robert “Entrepreneuship and Intrapreneurship: Methods for Creating New Companies That Have an
Impact on the Economic Renaissance of an Area”. In Entrepreneurship, and Venture Capital. Ed. Robert D. Hisrich
(Lexington, MA: Lexington Books, 1986), p.96

Outros conceitos de empreendedor e empreendedorismo surgiram após a definição de


Hisrich em 1985. Empreender, segundo Dolabela (1999) não significa apenas criar novas
propostas, inventar novos produtos ou processos, produzir novas teorias, engendrar melhores
concepções de representação da realidade ou tecnologias sociais. Empreender significa
modificar a realidade para dela obter a auto-realização e oferecer valores positivos para a
coletividade. Significa engendrar formas de gerar e distribuir riquezas materiais e imateriais
por meio de idéias, conhecimentos, teorias, artes, filosofia.
Empreendedores são, para Dornelas (2001, p. 19), pessoas diferenciadas, que possuem
motivação singular, apaixonados pelo que fazem, não se contentam em ser mais um na
multidão, querem ser reconhecidos e admirados, referenciadas e imitadas, querem deixar um
legado. Para Lezana e Tonelli (2004), empreendedores são pessoas que perseguem o
benefício, trabalham individual e coletivamente. Podem ser definidos como indivíduos que
inovam, identificam e criam oportunidades de negócios, montam e coordenam novas
combinações de recursos, para extrair os melhores benefícios de suas inovações num meio
incerto.
Filion (2001) define o empreendedor como uma pessoa que imagina, desenvolve e realiza
visões. Para ele, visão é “uma imagem projetada no futuro, do lugar que se quer ver ocupado
pelos seus produtos no mercado, assim como a imagem projetada do tipo de organização
necessária para consegui-lo”. Para tal, o desenvolvimento das competências pessoal do
empreendedor são fundamentais.

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Diferentes autores conceituam o empreendedorismo e o empreendedor, cabe ressaltar que


através do empreendedorismo criam-se inúmeras novas organizações que de forma direta e
indireta movimentam a economia seja ela local, nacional ou o mercado externo. Devido a
grande concorrência existente e as características dos consumidores e clientes, faz-se
necessário que o empreendedor apresente competências que proporcionem o
desenvolvimento da sua organização.
Toda e qualquer organização, desde a sua criação, enfrenta mudanças que a fazem de forma
geral, evoluir. Vários são os ciclos de vida das organizações, é importante que o
empreendedor possa sobreviver a todas essas fases e prosperar em seu empreendimento.
Dessa forma estará promovendo o desenvolvimento do mercado a onde está inserido e da
economia de formal geral. As competências do empreendedor são necessárias e estão
presentes em todas as fases do ciclo de vida das organizações, inclusive no momento da
decisão de criação do empreendimento.
Ao descrever os atributos do empreendedor, os pesquisadores o fazem em termos de
atitudes, competências, e características. Referindo-se às atitudes, Salim (2004), observa que
há um consenso entre os estudiosos do empreendedorismo de que existe um conjunto de
atitudes presentes no sujeito empreendedor: assumir riscos, identificar oportunidades,
conhecimento, organização, tomar decisões, liderança, dinamismo, independência, otimismo
e tino empresarial. Dornelas (2001) acrescenta dedicação, busca de riqueza, planejamento,
valor para a sociedade, networking e visão de futuro.
No que se refere às competências, vários autores procuram estruturar o desenvolvimento do
conceito de competência. Dentre eles, cabe destacar os seguintes: Le Boterf (1998),
Perrenoud (2000), Zarifian (2001), Quinn (2003), Fleury (2004), Dutra (2004) e Miranda
(2006). O Quadro 2 apresenta o conceito de competência na ótica dos autores citados.
1998 Le Boterf Competência é uma construção, a partir de uma combinação de recursos
(conhecimentos, saber fazer, qualidades e atitudes) e do ambiente
(relacionamentos, documentos, informações e outros) que são mobilizados para
alcançar um desempenho.
2000 Perrenoud Competência é a faculdade de mobilizar um conjunto de recursos cognitivos
(saberes, capacidades, informações etc) para solucionar com pertinência e eficácia
uma série de situações.
2001 Zarifian Competência é tomar iniciativa e responsabilizar-se com êxito, tanto a nível
individual como em grupo, diante de uma situação profissional
2003 Quinn et al Uma competência implica a detenção tanto de um conhecimento quanto do
comportamento de agir de maneira adequada. Segundo o autor, “... para
desenvolver determinadas competências é preciso não só ser apresentado ao
conhecimento teórico como ter a oportunidade de praticá-las”.
2004 Fleury “... é saber agir responsável e reconhecido, que implica mobilizar, integrar,
transferir conhecimentos, recursos, habilidades, que agreguem valor econômico à
organização e valor social ao indivíduo”
2004 Dutra A agregação de valor das pessoas é sua contribuição efetiva ao patrimônio de
conhecimentos da organização, permitindo-lhe manter suas vantagens competitivas
no tempo.
2006 Miranda A lógica da competência significa uma mudança radical com respeito ao modelo de
posto de trabalho vigente na sociedade industrial. Competência refere-se a recursos
possuídos e/ou adquiridos e colocados em ação numa situação prática, significando
a iniciativa, sob condições de autonomia, que pressupõe a mobilização dos
recursos internos pessoais e coletivos (trazidos e colocados à disposição pelas

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organizações).
Quadro 2: Desenvolvimento do Conceito de Competências
Fonte: Autores
Como a competência precisa da atividade prática para se manifestar, Fleury (2004, p. 55) diz
que competência é “um saber agir responsável e reconhecido que implica mobilizar, integrar,
transferir conhecimentos, recursos, habilidades, que agregue valor econômico à organização
e valor social ao indivíduo”. A figura 1 evidencia as competências como fonte de valor para
o individuo e para a organização.
Saber agir
Saber mobilizar
Saber transferir
Indivíduo
Saber aprender
Saber se engajar
Visão estratégica
Conhecimentos Assumir responsabilidade
Habilidades Organização
Atitudes

Social Econômico

Agregar Valor

Figura 1: Competências como fonte de valor para o indivíduo e para a organização.


Fonte: Fleury, 2004, p. 55.

Na abordagem do empreendedorismo, Lezana e Tonelli (2004) apresentam as competências


do empreendedor em três dimensões: conhecimentos, habilidades e atitudes, conforme
apresentado na figura 2. O conhecimento na perspectiva do empreendedor indica que para
operar uma empresa com sucesso, o mesmo deve possuir alguns conhecimentos que são
diferenciados em cada etapa na qual a empresa se encontra.
Apesar dessa diferenciação, é possível fazer uma descrição dos conhecimentos gerais
necessários para o empreendedor. Os autores situam os seguintes: aspectos técnicos
relacionados com o negócio; experiência na área comercial, escolaridade, experiência em
empresas, formação complementar e vivências com situações novas.
A habilidade é a capacidade, de acordo com Chiavenato (1999), de transformar
conhecimento em ação e que resulta em um desempenho desejado. Para Lezana e Toneli
(2004) as habilidades necessárias para a operação de uma empresa de pequena dimensão,
são: identificação de novas oportunidades, valoração de oportunidades e pensamento
criativo, comunicação persuasiva, negociação, aquisição de informações e resolução de
problemas.
As atitudes formam, segundo Maximiano (1995), os quadros de referências, isto é, as
“molduras” valorativas dentro das quais as pessoas, fatos, idéias e objetivos são vistos,
interpretados e avaliados.
De forma geral, o conhecimento resulta do processo de aprendizagem que ocorrem através
do tempo. As habilidades se manifestam a partir do conhecimento de cada indivíduo e as

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atitudes estão ligadas à percepção, personalidade, aprendizagem e motivação. Na união de


conhecimentos, habilidades e atitudes encontra-se a competência, conforme figura 2.

Conhecimento
Conhecimento Habilidade
Habilidade
Competência
Competência

Hatitude
Atitude

Figua 2: Competências
Fonte: Autores

Adotando também a perspectiva baseada em competências, Farrel (1993) elaborara um


modelo intitulado “esquema integrativo das competências do empreendedor”. Para isto
realizaram uma pesquisa de caráter exploratório que, por intermédio de entrevistas em
profundidade focada nas trajetórias profissionais de empreendedores bem sucedidos,
procurou compreender as competências que eles apresentaram e que foram, na visão deles,
importantes para vencer barreiras e prosperar no mundo dos negócios. Na pesquisa foram
identificadas duas grandes dimensões: a afetiva e a cognitiva. Além disso, algumas respostas
dos entrevistados faziam referência a variáveis que não puderam ser classificadas em uma
dimensão de competência específica, mas que as influenciam fortemente. Essas variáveis
foram identificadas como influências do ambiente e dos valores do indivíduo.
No dia a dia o indivíduo percebe a necessidade de aperfeiçoamento para empreender com
sucesso suas funções. Empreendedores não são apenas os indivíduos que abrem seu próprio
negócio, existem os intra-empreendedores que aplicam em suas profissões os conhecimentos
e as habilidades que desenvolveram, trazendo inovações e melhorias garantindo o sucesso de
sua profissão e do empreendimento. Assim, é importante para o empreendedor ter
consciência de seu potencial e limitações, pois sempre existe a opção de desenvolver suas
potencialidades ou se associar a alguém que possua as características necessárias ao sucesso
do empreendimento.
O sistema psicológico vai se modificando e se estruturando sempre que um novo dado é
inserido no espaço vital da pessoa, ou quando há uma reestruturação desse sistema. Desta
maneira o desenvolvimento de habilidades acaba alterando o comportamento humano, é uma
parte re-configurando o todo, isso é possível, pois de acordo com a Psicologia da Gestalt.
3. Psicologia do Trabalho
A psicologia do trabalho aplicada às organizações passou por várias etapas desde o seu
surgimento como instrumento das indústrias que seguiam os pressupostos Taylorista. A
psicologia industrial, classificada por Sampaio (1998) como a primeira face da psicologia no
campo, tinha como função realizar seleção e colocação profissional, ou seja, se integrava ao
princípio Taylorista de colocar o sujeito na função que melhor se adequasse às suas

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características. Além disso, fazia orientação profissional e avaliava as condições de trabalho


com o objetivo de aumentar a produtividade.
O mesmo autor classifica a segunda face da psicologia aplicada ao trabalho como psicologia
organizacional, argumenta que essa face não foi uma ruptura com a primeira, mas sim a
incorporação de novas atividades como treinamento, classificação de pessoal e avaliação de
desempenho, além de passarem a discutir as estruturas das organizações de trabalho. Nesse
período foram incorporadas as novidades do estruturalismo e da teoria sistêmica da
administração. Fica claro que essa passagem não representou mudanças nos objetivos da
psicologia, pautados no aumento da produtividade nas empresas.
Sampaio (1998) critica o caráter instrumental da disciplina, mesmo quando da introdução de
novas teorias, como a teoria contingencialista. Esta teoria, introduzida pela Administração
nos anos 70, buscava compreender os fenômenos produtivos a partir dos condicionantes
externos, mas mantinha o foco no aumento da lucratividade.
O questionamento dos objetivos da psicologia organizacional originou a terceira face da
psicologia do trabalho, que busca compreender o trabalho humano nos seus significados e
em todas as suas manifestações. Diferencia-se das faces anteriores por se voltar para a saúde
e bem-estar dos trabalhadores, não priorizando o lucro e a produtividade.
A psicologia do trabalho, para Cruz (2007), se apresenta como uma disciplina que consiste
em descrever e interpretar a natureza e a dimensão dos fenômenos psicológicos incidentes na
situação de trabalho, tendo em vista as exigências e condições estabelecidas pelo meio
técnico e social, contingentes à organização e processos de trabalho. Ainda, segundo Cruz et
al. (2000), a psicologia do trabalho se constitui como um campo de estudos sobre os
determinantes da atividade do trabalho sobre a conduta das pessoas, seja em seus aspectos
individuais ou coletivos.
Do ponto de vista epistemológico, segundo Leplat & Cuni (1983), tanto a psicologia do
trabalho quanto a ergonomia se definiram inicialmente a partir dos objetivos de suas
aplicações: a situação do trabalho.
O trabalho, segundo Teiger (1992, p. 113), é uma atividade finalística, realizada de modo
individual ou coletiva numa temporalidade dada, por um homem ou uma mulher singular,
situada num contexto particular que estabelece as exigências imediatas da situação. Esta
atividade não é neutra, ela engaja e transforma, em contrapartida, aquele ou aquela que a
executa”. Para Dejours & Molinier (1994, p.61), o trabalho é uma atividade coordenada de
homens e mulheres para responder ao que não está posto, desde o início, pela organização
prescrita do trabalho.
Do ponto de vista de Terssac (1995, p.8) o trabalho é uma ação coletiva finalística. É uma
ação „organizada‟ porque ela se situa num contexto estruturado por regras, convenções,
culturas. É também uma ação „organizadora‟ porque ela visa, não somente preencher as
lacunas provenientes das imprecisões da prescrição, mas produzir um acordo, um espaço de
ações pertinentes. É pela ação que se define, de forma interativa, o problema e a solução. É
na ação que se operam as trocas de informações e que se constroem as formas de agir.
A variabilidade de aspectos mencionados pelos autores (por exemplo, contexto, objetivo,
organização) não aparece marcada pela contradição, mas pela ênfase em dimensões que se
complementam e se enriquecem mutuamente. Esta constatação suscita uma primeira pista
com vocação de hipótese geral: a construção do conceito de trabalho em ergonomia é, pelos
menos por ora, de natureza interdisciplinar. Quer dizer, a delimitação do conceito implica em
considerar os conhecimentos de disciplinas vizinhas (sociologia, psicologia, filosofia...) e,

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especialmente, com as quais a ergonomia mantém uma estreita colaboração (caso da


psicodinâmica, por exemplo).
Contudo, se, de um lado, as definições reforçam o caráter do trabalho como um objeto
multidimensional e polissêmico, de outro, elas permitem identificar um fio condutor que
parece costurar as diferentes abordagens. Neste sentido, a "atividade real" do sujeito aparece
como categoria central tendo um papel estruturador dos conceitos. Em torno do fator
atividade real, gravitam os elementos constitutivos das formulações dos autores. Tais
elementos fazem da atividade uma casa de múltiplas portas permitindo o acesso ao seu
interior pelas portas da linguagem, da cooperação e da competência dentre outros.
4. Competências do Empreendedor e a Contribuição da Psicologia do Trabalho
As competências do empreendedor conforme apresentado por Lezana e Tonelli (2004)
abordam conhecimento, habilidades e atitudes. Alguns aspectos técnicos relacionados ao
negócio e a transformação do conhecimento em ação são citados pelos autores. O
conhecimento surge do processo de aprendizagem que se desenvolve com o tempo e a
manifestação do conhecimento de cada indivíduo, bem como suas atitudes estão intimamente
ligadas à percepção, personalidade, aprendizagem e motivação.
O conhecimento, bem como as habilidades, são adquiridos com o passar do tempo e em sua
maioria no ambiente de trabalho. A psicologia do trabalho pode contribuir para o
desenvolvimento de um ambiente que propicie, por exemplo, o intra-empreendedorismo
através de ações desenvolvidas pelos indivíduos em seu próprio ambiente de trabalho. Pode
ainda, desenvolver nestes mesmos indivíduos habilidades que somadas ao conhecimento
levam a atitude, por exemplo, de criação de um novo negócio ou organização.
A transformação do conhecimento em ação talvez seja o desejo de muitas organizações,
logo, a contribuição dos estudos em psicologia do trabalho passa a ser de interesse para os
empreendedores. Através do diagnóstico do ambiente de trabalho e dos fenômenos
psicológicos incidentes neste ambiente pode-se elaborar e desenvolver atividades que
propiciem esta transformação. Para o indivíduo empreendedor aplica-se o mesmo
entendimento, pois sem ambiente e condições propícias a geração e criação de novos
negócios diminuem.
As habilidades, que fazem parte das competências do empreendedor, e que envolvem, dentre
outros, a comunicação persuasiva, aquisição de informações e resoluções de problemas
também são desenvolvidas com o decorrer do tempo e tem grande participação da psicologia
do trabalho. Essas habilidades são importantes para a operação das empresas, seja micro,
pequeno, médio ou grande porte e muitas delas são desenvolvidas a partir do ambiente de
trabalho.
5. Conclusão
O empreendedorismo impulsiona o desenvolvimento econômico de todo e qualquer país. É
importante ressaltar a necessidade não apenas de criação de novas empresas, mas a
permanência e o desenvolvimento destas organizações. As competências do empreendedor
que estão presentes em todas as fases do ciclo de vida da organização, desde o seu
surgimento, interferem significativamente no desenvolvimento das organizações, daí a
importância da contribuição da psicologia do trabalho.
O presente trabalho nos remete a compreensão e a conclusão de que a psicologia do trabalho
enquanto busca descrever e interpretar a natureza e a dimensão dos fenômenos psicológicos
incidentes na situação do trabalho contribui significativamente no desenvolvimento das

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competências do empreendedor. Percebe-se assim de forma clara, que o indivíduo ao se


deparar com a realidade, evidencia fenômenos psicológicos que variam em função de
conceitos e fundamentos teóricos desenvolvidos por ele e que aprimoram a sua competência.

Referências

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Empreendedorismo: ciência, técnica e arte. Brasília: CNI – IEL Nacional, 2001.
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