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Capítulo 4 – Seguro-Desemprego

4.1. Aspectos Gerais

N
as palavras do jurista Miguel Horvath Júnior, o
desemprego é a maior tragédia mundial, porque
atinge diretamente o indivíduo, destruindo a au-
toestima do trabalhador, induzindo-o ao crime,
provocando destruição da família e constituindo um ele-
mento desagregador da vida em sociedade.
Segundo a Convenção n.º 102, da Organização In-
ternacional do Trabalho, o desemprego é a impossibilidade
de obtenção de um emprego conveniente, no caso de uma
pessoa protegida pelo sistema previdenciário que seja apta
para trabalhar e esteja disponível para o trabalho.
Senão vejamos o que dispõe a Parte IV do referido
instrumento:

Parte IV. Prestações de Desemprego.


Artigo 19. O Membro para o qual a presente Parte
da Convenção estiver em vigor, deve assegurar às pessoas

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amparadas prestações de desemprego, de acordo com os
seguintes artigos desta Parte.
Artigo 20. O evento coberto deve abranger toda
suspensão de ganhos, tal como for definida pela legisla-
ção nacional, devido à impossibilidade de obtenção de
um emprego adequado, por parte da pessoa amparada,
que seja capaz de trabalhar e esteja disponível para o
trabalho.
Artigo 21. As pessoas amparadas devem
abranger:
a) Quer determinadas categorias de assalariados,
perfazendo, no mínimo, cinquenta por cento da totali-
dade dos assalariados;
b) Querem todos os residentes, cujos recursos du-
rante o evento não excederem determinados limites, de
acordo com o disposto no artigo 67;
c) Quer, no caso de ter sido feita uma declara-
ção nos termos do artigo 3.º, determinadas categorias
de assalariados, perfazendo, no mínimo, cinquenta por
cento da totalidade dos assalariados que trabalham em
empresas industriais, que empreguem vinte pessoas
pelo menos.
Artigo 22.
1. Quando forem amparadas categorias de assa-
lariados, a prestação consistirá em um pagamento pe-
riódico calculado segundo as disposições do artigo 65
ou do artigo 66.
2. Quando forem amparados todos os residen-

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tes, cujos recursos durante o evento não excederem
determinados limites, a prestação consistirá em um pa-
gamento periódico calculado de acordo com os dispo-
sitivos do artigo 67.
Artigo 23. A prestação mencionada no artigo 22,
no evento coberto, deve ser assegurada, no mínimo, às
pessoas amparadas que completarem período de carên-
cia considerado suficiente para evitar abusos.
Artigo 24.
1. A prestação mencionada no artigo 22 deve ser
concedida durante todo o evento, com a exceção de
que a duração da prestação pode ser limitada:
a) Quando são amparadas categorias de assa-
lariados, treze semanas no decurso de um período de
doze meses;
b) Quando são amparados todos os residentes,
cujos recursos durante o evento não excederem determi-
nados limites, a vinte e seis semanas no decurso de um
período de doze meses.
2. Quando a duração da prestação for esca-
lonada, em virtude da legislação nacional, segundo a
duração da contribuição ou segundo as prestações an-
teriormente recebidas no decurso de um período de-
terminado, os dispositivos da alínea A do parágrafo
01 considerar-se-ão cumpridos se a duração média da
prestação abranger, no mínimo, treze semanas no de-
curso de um período de doze meses.
3. A prestação pode deixar de ser efetuada du-

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rante um período de carência limitado aos sete primei-
ros dias em cada caso de suspensão dos ganhos, com-
putando-se os dias de desemprego antes e depois de
um emprego temporário que não passe de uma dura-
ção determinada, como fazendo parte do mesmo caso
de suspensão de ganhos.
4. Tratando-se de operários cuja ocupação depen-
der das estações do ano (trabalhadores sazonais), a dura-
ção da prestação e o prazo de carência podem ser ampara-
dos às condições do emprego.

Daí, afirmar-se que os requisitos para a concessão


desta prestação previdenciária são:

a) Ser o requerente integrante do sistema previ-


denciário;
b) Capacidade para o trabalho;
c) Disponibilidade para o trabalho;
d) Impossibilidade de obtenção do trabalho.

Ou seja, não basta o trabalhador integrar o sistema


previdenciário nacional para ter como garantia a prestação
previdenciária. Deve ser cidadão capaz e disponível para o
trabalho, porém dotado de dificuldades para inserir-se no
mercado. Daí, o que se denomina por “desemprego”.
O desemprego pode ser classificado em quatro
linhas, sendo: estrutural, tecnológica, de inaptidão e esta-
cional.

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O desemprego estrutural decorre de crise econô-
mica cíclica, gerando recessão, fuga de capitais de investi-
mentos internos e externos, alta inflacionária e déficit or-
çamentário.
O desemprego tecnológico, por sua vez, atualmente
decorre da reestruturação das formas de produção nas em-
presas, que primam pela adoção de novas tecnologias que
venha a requerer menor intervenção de mão de obra hu-
mana no processo de trabalho. É o denominado “processo
de maquinação” ou a substituição do homem pela máquina.
Já, o desemprego pela inaptidão decorre da falta de
mobilidade geográfica e da falta de qualificação necessária,
por parte dos empregados existentes, de onde se verifica a
relevância fundamental de implementar-se projetos contínuos
de requalificação profissional.
Por fim, o desemprego estacional surge em decor-
rência da chegada de certas épocas do ano ou, ainda, de
estações do ano que forçam regularmente a paralisação
das atividades empreendedoras. Porém, em se tratando do
Brasil, face ao clima temperado, as atividades industriais
não são afetadas por essa modalidade, mas sim os métodos
de trabalho mais rudimentares, ou que dependem da inter-
venção direta na natureza para que sejam concretizados,
tais como a pesca em período de defeso.
Os países ao redor do mundo vêm buscando, ain-
da que de modo paliativo, soluções e alternativas para que
a problemática do desemprego seja mitigada, visto que
não se pode considerá-la extinta. Uma delas é a redução

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da jornada de trabalho, para que mais trabalhadores te-
nham condições de exercer sua profissão em um mesmo
ambiente. Outra, ainda culminando em severas discussões,
é a redução da idade para admissão de menores no am-
biente de trabalho, com projetos tutelados pelos órgãos
competentes, como o de aprendiz, amplamente instituído
em empresas de pequeno, grande e médio porte, além dos
serviços públicos.
Também podem ser consideradas alternativas para
que haja um melhor acolhimento do mercado a todos os
trabalhadores, o oferecimento de subsídios a determinadas
classes funcionais, principalmente em obras públicas, quan-
do na ocorrência de situações de calamidade e flagelo social,
como inundações, enchentes, seca, nevasca, dentre outras,
além dos cursos de aperfeiçoamento para qualificação de
mão de obra, que termina por ser um diferencial quando da
contratação de trabalhadores que, por algum motivo, não
detém condições socioeconômicas para ingressar em uma
universidade privada ou em um curso técnico pago.
É cristalino, porém, que o objetivo principal da
Seguridade Social é a manutenção do pleno emprego aos
cidadãos, sendo que é fundamental distinguir a “desocupa-
ção” do “desemprego”. Enquanto, a desocupação consiste
numa situação de caráter individual ou coletivo, motivada
pelo desejo de não exercer função que possa denominar-
-se trabalho devido a algum tipo de conflito ou motiva-
ção de caráter diverso (social, educacional, familiar), o de-
semprego é uma situação estritamente individual e, muito

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importante, de caráter involuntário. Não existe desocupa-
ção involuntária, da mesma forma que não se pode nomi-
nar situação como desemprego voluntário.

4.2. Evolução Histórica do Seguro-


Desemprego

O Brasil, de longe, não foi pioneiro na instituição


de um sistema legal de seguro-desemprego aos seus cida-
dãos. A Inglaterra, em 16 de dezembro de 1911, deu esse
grande passo rumo à instituição da ordem social, econô-
mica e mercantil.
Data do ano de 1.946, a primeira proteção de ca-
ráter constitucional no Brasil ao cidadão desempregado. O
artigo 157 da Carta Magna, promulgada naquele ano, em
seu inciso XV enquadrava a proteção ao desempregado na
fórmula da assistência social, como se verifica:

"Artigo 157. A legislação do trabalho e da Previ-


dência Social obedecerão aos seguintes preceitos, além
de outros que visem à melhoria da condição dos traba-
lhadores:
(...)
XV – Assistência aos desempregados."

Analisando o inciso XVI do mesmo artigo, pode-se


referir que a ideia do legislador constitucional foi, de certa

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forma, excludente, visto que equiparou a condição de de-
semprego de um cidadão a questões como a pobreza e a
penúria quando, na verdade, o correto seria enquadrar a as-
sistência aos demais esquemas previdenciários trazidos na
Carta Magna.
A inclusão de qualquer cidadão nos direitos previ-
denciários deveria ser ampla, e não restritiva àqueles que tra-
balham e contribuem, porém não foi a linha de entendimento
adotada, quando da promulgação da Constituição Federal de
1946, como se pode aferir:

"Artigo 157.
(...)
XVI – Previdência, mediante contribuição da
União, do empregador e do empregado, em favor da
maternidade e contra as consequências da doença, da
velhice e da morte."

Já em 1.960, foi promulgada a Lei n.º 3.807/60,


denominada Lei Orgânica da Previdência Social, que em
seu bojo veio a unificar matéria previdenciária, reduzin-
do o esquema protetivo contra o desemprego no limite
anteriormente imposto pela Constituição de 1946, como
se pode verificar pelo que dispõe o artigo 167 da referi-
da norma, o qual traduz preocupação do legislador com
a perturbação social que pode culminar o desemprego, e
não com a situação atípica e inesperada que lhe deu causa:

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“Artigo 167. Para atender a situação excepcional
decorrente de crise ou calamidade pública que ocasione
desemprego em massa, poderá ser instituído o seguro-de-
semprego, custeado pela União e pelos empregadores.”

O seguro-desemprego, portanto, é instituto pre-


videnciário declarado, posto que proveja, mediante con-
tribuição periódica, o empregado que se vê privado, por
alguma razão, de sua fonte de renda. Porém, entre a Lei
n.º 3.807/60 verificam-se inconstitucionalidades, quando a
comparamos com a Carta Magna de 1946, por exemplo, o
fato de não haver sido utilizado o modelo de contribuição
que envolve União, empregador e empregado.
Em 1965, promulgou-se a Lei n.º 4.923 em 23 de
dezembro, a qual autorizava o Poder Executivo a instituir,
entre outras medidas, a assistência aos desempregados, na
forma de seu artigo 5.º, a verificar:

“Artigo 5º. Fica o Poder Executivo autorizado a


instituir, de acordo com o disposto nos artigos seguin-
tes e na forma que for estabelecida em regulamento,
plano de assistência aos trabalhadores que, após 120
(cento e vinte) dias consecutivos de serviço na mesma
empresa, encontrem-se desempregados ou venham a
desempregar-se, pela dispensa sem justa causa ou por
fechamento total ou parcial da empresa.
§ 1º. A assistência a que se refere este artigo será

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prestada através do sistema de Previdência Social e
consistirá num auxílio em dinheiro, não excedente de
80% (oitenta por cento) do salário mínimo local, devi-
do, até o prazo máximo de 06 (seis) meses computados
no cálculo da indenização paga na forma da legislação
trabalhista, observadas as bases que forem estabeleci-
das no regulamento, dentro das possibilidades do Fun-
do de que trata o artigo 6.º.
§ 2º. Será motivo de cancelamento do pagamen-
to do auxílio com a recusa, por parte do desemprega-
do, de outro emprego apropriado ou de readmissão, na
hipótese prevista no artigo 3.º na empresa de que tiver
sido dispensado.
§ 3º. O auxílio a que se refere o § 1.º não é acu-
mulável com o salário nem com quaisquer benefícios
concedidos pela Previdência Social, não sendo, outros-
sim, devido quando o trabalhador tiver renda própria
de qualquer natureza que lhe assegure a subsistência.
§ 4º. É condição essencial à percepção do auxílio
a que se refere o § 1.º o registro de desempregado no
órgão competente, conforme estabelecer o regulamen-
to desta lei.

Adequado verificar que o parágrafo quarto do


mencionado artigo demonstrava a imprescindibilidade de
regulamentação da Lei em questão, o que ocorreu com a
edição do Decreto n.º 58.155/66, pelo qual se instituiu o

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Fundo de Assistência aos Desempregados, disciplinando
sua aplicação.
Ato contínuo promoveu-se a edição do Decreto
n.º 58.684, também de 1966, pelo qual se instituía o plano
de assistência, bem como determinava sua forma de cus-
teio, sendo, portanto, a primeira regulamentação que inau-
gurou a discussão séria sobre o tema, até aqui pautado em
desentendimentos, quanto à caracterização do desempre-
go como caso fortuito ou de força maior, e não de situação
a qual o empregado tenha dado causa.
A Constituição Federal promulgada em 1967, em
seu artigo 158, inciso XVI, corrigia o equívoco técnico e,
sobretudo, moral da Constituição de 1946 ao tratar ao vin-
cular o seguro-desemprego à previdência do trabalhador,
como se vê:

Artigo 158. A Constituição assegura aos traba-


lhadores os seguintes direitos, além de outros que, nos
termos da lei, visem à melhoria de sua condição social:
(...)
XVI – Previdência social, mediante contribuição
da União, do empregador e do empregado, para segu-
ro-desemprego, proteção da maternidade e, nos casos
de doença, velhice, invalidez e morte.

Demorou, praticamente, vinte anos até que fosse


editada norma legal posterior à Constituição Federal de

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1967, a qual desafortunadamente veio ao mundo jurídico
repleta de vícios. O Decreto-Lei n.º 2.284/86 pretendia
custear o seguro-desemprego com as verbas do Fundo de
Assistência ao Desempregado, esse instituído no ano de
1.966, como visto.
Sua inconstitucionalidade, portanto, era latente e
notória, pois em 1967 o benefício fora incorporado ao sis-
tema previdenciário e não como instrumento de múnus
assistencial. Tal situação, somada ao fato de que não mo-
dificou na base de financiamento em vigor no país desde
1934, ou seja, a questão do que se denomina contribuição
tríplice (União, empregadores e empregados), confrontava
o texto da Lei Maior Brasileira.
No ano de 1988, com a promulgação da Consti-
tuição Federal vigente até a presente data, ou seja, aplicada
em seus moldes atuais em todo o território nacional acerca
das matérias às quais lhe são afetas, fundamentou-se, já não
sem tempo, o seguro-desemprego, com base no que dispu-
nham os artigos 7.º, inciso II, e 201, inciso III, in verbis:

Artigo 7º. São direitos dos trabalhadores urba-


nos e rurais, além de outros que visem à melhoria de
sua condição social:
(...)
II – Seguro-desemprego, em caso de desempre-
go involuntário.
(...)
Artigo 201. A Previdência Social será organizada

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sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e
de filiação obrigatória, observados critérios que preser-
vem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá nos
termos da lei, à:
(...)
III – Proteção ao trabalhador em situação de de-
semprego involuntário.

A Carta Magna de 1988 proveu ao seguro-de-


semprego condição, a nosso ver, determinante para
sua concessão, que é a involuntariedade, que vem a ser
índice limitador de extremo bom senso, posto que traz
à baila o direito do trabalhador desempregado, e não
desocupado, em gozar do benefício, vinculando-o ao
esquema de seguridade social, tornando cristalino por
onde será prestigiado o trabalho.
Como todo texto constitucional que institui um be-
nefício, há que se buscar promulgação de norma infraconsti-
tucional a regulamentá-lo, discipliná-lo e efetivá-lo. Por con-
ta disso, editou-se a Lei n.º 7.998/90, que regula o Programa
do Seguro-Desemprego e do Abono Salarial, instituindo,
por conseguinte o Fundo de Amparo ao Trabalhador.
Dentro desta evolução histórica, após a existên-
cia de várias medidas provisórias, especialmente a MPV
n.º 665, de 30/12/2014, editou-se a Lei n.º 13.134, de
16/06/2015, que revoga dispositivos e promove impor-
tantes alterações na Lei n.º 7.998/90.

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