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- CAPÍTULO IV - Apresentação e análise interpretativa dos dados

Introdução
Descritos os procedimentos metodológicos seguidos para o desenvolvimento
deste estudo, passarei, no presente capítulo, a apresentar de forma interpretativa a
análise dos dados obtidos ao longo do processo de pesquisa, tendo por referência o
quadro conceptual que o suporta, bem como os objetivos e as questões de pesquisa
orientadoras do mesmo. De acordo com Bogdan e Biklen (1994, p. 205) a análise e a
recolha de dados corresponde ao:
«processo de busca e de organização sistemático de transcrições de
entrevistas, de notas de campo e de outros materiais que foram sendo
acumulados, com o objectivo de aumentar a sua própria compreensão
desses mesmos materiais e de lhe permitir apresentar aos outros aquilo
que encontrou».

Considerado o instrumento de recolha de dados adotado, procederei à análise


dos dados das entrevistas semiestruturadas realizadas às três educadoras de infância,
protagonistas do estudo, tendo sido anteriormente tratada e sistematizada a sua
informação em quadros de síntese, que se constituem como elementos facilitadores da
interpretação, que em seguida será conseguida.
Por forma a facilitar a compreensão da análise interpretativa a que procederei,
evidencio as diferentes categorias que emergiram da análise ao corpus informativo das
entrevistas realizadas, a saber:

1. Dimensão pessoal e profissional;


2. Representações sobre a educação pré-escolar;
3. A família na educação;
4. Representações sobre a identidade;
5. Adequação do currículo;
6. Representações sobre a gestão do ambiente educativo (enfoque sobre a
construção da identidade na criança);
7. Desenvolvimento global da criança (enfoque sobre o desenvolvimento da
personalidade e do comportamento social).

No decorrer da análise interpretativa debruçar-me-ei, detalhadamente, sobre as


subcategorias que emergiram em cada uma das categorias que acima apresentei,

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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

procurando entender o problema inicial deste estudo à luz dos resultados obtidos na
sequência das entrevistas realizadas.

A. Análise interpretativa das entrevistas


1. Dimensão pessoal e profissional
A primeira categoria que emergiu da análise de conteúdo ao corpus de
informação das entrevistas realizadas às educadoras foi a que se reporta à “Dimensão
pessoal e profissional”.
De um modo geral, pode afirmar-se que esta primeira categoria diz respeito ao
conhecimento sobre os dados gerais relativos às dimensões pessoal e profissional das
educadoras, especificamente no que às suas características pessoais e ao seu percurso
profissional concerne.
Esta categoria compreende as subcategorias ꞌCaracterísticas pessoaisꞌ, ꞌInfluência
das características pessoais no desempenho profissionalꞌ e ꞌPercurso profissionalꞌ, as
quais passo a analisar interpretativamente, uma a uma, para uma melhor compreensão
das mesmas.

1.1. Características pessoais


Os dados referentes às características pessoais das educadoras de infância
encontram-se sistematizados no quadro abaixo, o Quadro 6.
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 Extrovertida 1 1
 Responsável/honesta/franca/sincera 1 1 2
 Passear, dançar, de desporto no geral 1 1
 As artes também fazem parte dos meus interesses 1 1
 Dificuldade em fingir que gosto quando não gosto/transparente 1 1
 Gosto que as pessoas saibam o papel delas 1 1
 Dificuldades nas minhas relações humanas 1 1
TOTAL 3 3 2 8
Quadro 6 – Características pessoais
Como pode verificar-se pela leitura do Quadro 6, o maior número de
ocorrências, (2), no discurso das educadoras expressa a representação
“responsável/honesta/franca/sincera” como características pessoais que as determinam.
A este respeito, a dado momento, a Maria afirma:
(…) Acho que sou uma pessoa muito honesta, uma pessoa muito franca nas
minhas funções (…);
(…) Sou uma pessoa muito sincera (…).

Nas palavras da Maria Martins:


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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

(…) sou uma pessoa responsável (…).


Evidencia, isto, que as características pessoais das educadoras assentam em
bases de honestidade, sinceridade e franqueza, a par com a responsabilidade, que se
definem como fortes traços caracterizadores que as identificam.
Pela leitura do Quadro 6 existe, ainda, 1 ocorrência relativa ao indicador
“Dificuldade em fingir que gosto quando não gosto/transparente”. Na voz da Maria:
(…) tenho alguma dificuldade em fingir que gosto quando não gosto, até porque
fica muito estampado na minha cara (…);
(…) Acho que sou muito transparente, o que às vezes faz com que as pessoas
fiquem com uma ideia errada a meu respeito (…).

Todas as restantes ocorrências foram assinaladas pelas educadoras 1 vez, o que


reflete uma diversidade de características e interesses que estas têm por base, quando
referem ser “extrovertida”, ter “dificuldades nas minhas relações humanas com as
pessoas” ou mesmo “gosto que as pessoas saibam o papel delas”.
Aspetos relacionados com o “passear, dançar, de desporto no geral” ou “as artes
também fazem parte dos meus interesses” sintetizam-se como elementos
caracterizadores das educadoras.

1.2. Influência das características pessoais no desempenho profissional


Para melhor se compreender de que forma as características pessoais
influenciam o desempenho profissional, o Quadro 7, que passarei de seguida a
interpretar, apresenta os seguintes dados:
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 tem tudo a ver com as minhas características/aquilo que eu sou como pessoa 1 1
 escolhas através dos nossos gostos pessoais/forma de estar, os nossos sonhos 1 1
 bastante 1 1
 forma cativante/de fazer com que o grupo participe nas atividades 1 1
TOTAL 2 1 1 4
Quadro 7 – Influência das características pessoais no desempenho profissional

Na verdade, não existe um maior número de indicadores que tenham emergido


do discurso destas educadoras. No entanto, sobressaem os indicadores “tem tudo a ver
com as minhas características/aquilo que eu sou como pessoa” (1), refletindo que a
pessoa da educadora é, em grande parte, responsável pela forma como se intervém
enquanto profissional. O restante conjunto de traços caracterizadores podem justificar a
influência atribuída às características pessoais no desempenho profissional, ao atribuir-

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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

se essa influência às “escolhas através dos nossos gostos pessoais/forma de estar, os


nossos sonhos” (1), ou mesmo quando se refere que a “forma cativante/de fazer com
que o grupo participe nas atividades” (1), revela muito sobre a pessoa do educador.
Parece, a meu ver, que as dimensões pessoal e profissional trabalham em paralelo,
conquanto que se ensina aquilo que se é e, naquilo que se é, encontra-se muito daquilo
que se ensina. Na mesma linha de seguimento, surge o indicador “bastante”, o que
reflete o pensamento das educadoras ao evidenciarem que o seu desempenho
profissional é, em muito, influenciado pelo conjunto de características que as determina.
Esta opinião das educadoras é congruente com as ideias de Simões (2004), onde a
dimensão pessoal do educador é para as crianças tida como um modelo a seguir,
exercendo, por conseguinte, uma influência determinante no que ao seu
desenvolvimento pessoal e social respeita. É neste sentido que a mesma autora (2004)
afirma que o currículo oculto do educador transparece aquilo que ele é: nas suas
atitudes, valores, comportamentos, na sua postura, do mesmo modo que nas suas
convicções e na perspetiva curricular que adota. Parece-me, assim, que o conhecimento
pessoal (dimensão pessoal) se encontra alicerçado ao conhecimento profissional
(formação pessoal) e que, captar o real sentido desta profissão, passa pela ação
equiparada entre estas duas dimensões, que embora possam ser vistas separadamente,
uma depende da outra.

1.3. Percurso profissional


Os dados referentes ao percurso profissional das educadoras encontram-se
esquematizados no Quadro 8, a saber:
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 ligado às artes/educação pela arte 1 1 2
 curso de educadoras 1 1 2
 fiz estágio profissional numa instituição em S. Bartolomeu de Messines 1 1
 curso de pintura 1 1
 curso de professora de danças urbanas 1 1
 jardim de infância 1 1 2
 vários tipos de formações que eu gostava/fui evoluindo 1 1
 [há] vinte e oito anos [que sou educadora] 1 1
 Coordenadora Pedagógica 1 1
 Ainda estive como auxiliar 1 1
 Funções de educadora (…) foi em 2006 1 1
 estou cá há vinte anos 1 1
 creche 1 1
TOTAL 5 7 4 16
Quadro 8 – Percurso profissional

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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

Como se pode verificar pela análise feita ao Quadro 8, a subcategoria ꞌPercurso


profissionalꞌ foi fortemente assinalada no discurso das educadoras, com 16 ocorrências.
Depreende-se, facilmente, que o percurso profissional das educadoras encontra-se
ligado às artes, justificando-o com 2 ocorrências. A este respeito a educadora Ana
refere-o, ao explicitar:

(…) Bem, ele está um pouco ligado às artes. Ah… eu estudei até ao 12.º ano
num curso ligado às artes, Artes e Design (…).

A Maria acrescenta, também, que:


(…) uns anos mais tarde fiz uma especialização em educação artística,
educação pela arte, aqui na Universidade (…).

Prosseguindo a análise do quadro, como facilmente se pode deduzir, o percurso


profissional das educadoras passa pela sua intervenção em valência de jardim de
infância. Relativamente a este facto, embora se evidenciem, nesta análise, um número
de ocorrências de 2, é facilmente compreensível que todas as educadoras já passaram e
encontram-se a desenvolver a sua ação educativa em contexto de jardim de infância,
onde 1 ocorrência se reporta à valência de creche.
No percurso profissional das educadoras salienta-se a passagem pela
Universidade e pelo Magistério Primário, onde duas das entrevistadas tiraram o curso de
educadora de infância (2). É também visível a aposta numa formação constante e
consciente das particularidades desta profissão, onde, na voz da Maria:

(…) Pronto e depois fui sempre fazendo vários tipos de formações que eu
gostava, de música, de dança, de expressão dramática, fiz sempre muitas
formações nestas áreas (…);
(…) também fiz outras em computadores, também fiz algumas em educação
física e assim (…);
(…) Eu fui evoluindo em termos profissionais, fui sempre evoluindo, fui sempre
pesquisando e estudando, nunca parei (…).

A Ana refere:
(…) Depois acabei, também, por concluir um curso de pintura relativamente às
artes (…);
(…) Também tirei o curso de professora de danças urbanas, em que exerci
profissão (…).

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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

2. Representações sobre a educação pré-escolar


A segunda categoria que emergiu do corpus das entrevistas diz respeito às
“Representações sobre a educação pré-escolar” e compreende três subcategorias:
ꞌImportância atribuídaꞌ, ꞌBenefíciosꞌ e ꞌPapel do educadorꞌ.
Pode dizer-se que esta categoria, e as subcategorias que a ela se associam, se
reportam às representações das educadoras sobre a importância que atribuem à
educação pré-escolar, reconhecendo os seus benefícios e a função que estas
profissionais desempenham.

2.1. Importância atribuída


Centrando a interpretação no Quadro 9, este é respeitante da importância que as
educadoras atribuem à educação pré-escolar.
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 muita /toda a importância 1 1 1 3
 para que a criança seja estimulada 1 1
 perceber que há novos contextos, outras áreas 1 1
 desenvolver as suas próprias capacidades 1 1
 atenção 1 1
TOTAL 3 2 2 7
Quadro 9 – Importância atribuída

Pela análise do Quadro 9, torna-se evidente que as educadoras atribuem grande


importância à educação pré-escolar, ao numerar as suas afirmações com 3 ocorrências.
Nas suas palavras:
(…) muita e cada vez mais (…) (Maria Martins);
(…) acho que é muito importante (…) (Ana);
(…) [tem] toda a importância do mundo (…) (Maria).
A Ana acrescenta, ainda, que a sua importância se relaciona com o facto da
educação pré-escolar estimular (1) a criança e proporcionar o contacto com novos
contextos e áreas (1).
A este respeito as OCEPE (Ministério da Educação, 1997) referem como
importante que o educador estimule a criança para aprendizagens desafiadoras e
interessantes, de forma a permitir-lhe chegar a níveis de realização que não conseguiria
por si só.
Evidencia-se a atenção para com as crianças (1) como um traço caracterizador
em que a educação prima, por forma a colmatar, em grande parte, uma lacuna que
muitas vezes é recorrente no núcleo familiar.

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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

(…) os pais (…) [que] chegam a casa cansados e um bocadinho saturados (…)
já não [lhes] dão tanta atenção como deveriam (…) (Maria Martins).

Neste sentido, Parramón Ediciones (2002a) evidencia que a escola deve ser
colaboradora na deteção das necessidades familiares e sociais da criança, não devendo,
no entanto, substituir a família. Nesta perspetiva, as funções da educação pré-escolar
devem ser complementares das da família.
Prosseguindo a análise do respetivo quadro, as educadoras atribuem importância
à educação pré-escolar por promover o desenvolvimento das capacidades nas crianças
(1).

2.2. Benefícios
Por forma a possibilitar uma melhor compreensão dos benefícios trazidos pela
educação pré-escolar, o Quadro 10 apresenta os seguintes dados, que passarei de
seguida a interpretar:
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 muitos 1 1
 depende muito da educadora 1 1
 facilitar (…) novas aprendizagens 1 1
 percebam que nem tudo no mundo é fácil e há dificuldades 1 1
 autonomia, para a sua relação com os outros 1 1
TOTAL 1 2 2 5
Quadro10 - Benefícios

O alerta que a educação pré-escolar pode proporcionar às crianças no sentido de


ajudá-las (1) para as condicionantes da vida pode ser, em muito, benéfico.
Nas palavras da Maria Martins:
(…) Talvez o sermos, por vezes, rígidas vá ajudar a que eles um dia mais tarde
percebam que nem tudo no mundo é fácil e que há dificuldades (…);
(…) cabe-nos a nós, também, alertar para a existência de dificuldades e que
nem sempre tudo é fácil, e ao longo da vida surgem problemas, que eles devem
ter a capacidade de contorná-los (…).

Embora os benefícios sejam tidos como muitos (1) por uma das educadoras, esta
tendência é refutada quando a Maria Martins afirma que:
(…) Penso que isso depende muito da educadora… do papel da educadora e da
sua personalidade, pois há educadoras e educadoras (…).

Parece-me, então, que os benefícios que à educação pré-escolar se relacionam


estão dependentes, em algum sentido, da pessoa da educadora, tornando evidente a

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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

forma como se propicia a sua intervenção educativa e se determina o seu papel, a par
com traços característicos da sua personalidade. A este respeito Sil (2006, p. 201)
realçou a importância das atitudes e dos comportamentos do profissional no que se
refere à natureza e à qualidade da relação pedagógica.
A Maria Martins refere:
(…) vá ajudar a que eles um dia mais tarde percebam que nem tudo no mundo é
fácil e há dificuldades (…);
(…) alertar para a existência de dificuldades e que nem sempre tudo é fácil e
[que] ao longo da vida surgem problemas, que eles devem ter a capacidade de
contorná-los (…).

As OCEPE (Ministério da Educação, 1997) referem, neste sentido, que a


educação pré-escolar trabalha também no sentido de capacitar as crianças para a
resolução de problemas ou dificuldades da vida, sendo muitas vezes este trabalho feito
entre grupos, por meio de realização de tarefas e nas mais variadas situações que este
nível de ensino possibilita.
A Ana aponta, também como benéfico, a promoção da autonomia e a relação
com os outros (1), que de acordo com Parramón Ediciones (2002a) é importante
entender a socialização das crianças como um passo à frente no caminho para a
autonomia, pois é através das primeiras relações que estabelecem no jardim de infância
que a criança vai começando, além de sentir-se parte integrante da sociedade, a
descobrir o seu valor como membro desse grupo.
Prosseguindo a análise do respetivo quadro, a Maria atribui importância à
educação pré-escolar por esta propiciar e facilitar novas aprendizagens (1). Tendo a
consciência de que é, efetivamente, por meio das relações e de ambientes estimulantes
que a criança se desenvolve e aprende (vertentes indissociáveis), a educação pré-escolar
dita, a este respeito, os seus contributos, por proporcionar condições favoráveis para o
sucesso das aprendizagens (Ministério da Educação, 1997).

2.3. O papel do educador


Pela análise do Quadro 11 evidenciam-se os dados relativos ao papel do
educador no que à educação pré-escolar concerne.
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 estar atento 1 1
 educá-los e transmitir alguns valores que lhes vão ser úteis 1 1
TOTAL 1 0 1 2
Quadro 11 – O papel do educador
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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

Pode facilmente constatar-se pela interpretação feita do Quadro 11, que o papel
do educador na educação pré-escolar se cinge, na voz de duas das educadoras, ao que à
atenção (1), à educação e à transmissão de valores (1) se reporta.
Na voz da Ana:
(…) a criança, embora seja um ser único, com diferentes características, faz
com que cada criança tenha um gosto, uma preferência por qualquer coisa e o
educador tem de estar atento, ver que a criança não é, no fundo, algo igual às
outras, mas é um ser único e, por isso, fazer com que agrade a um, agrade a
outro e agrade a todos (…).

A Maria Martins acrescenta:


(…) cabe-nos muito a nós o papel de educá-los e transmitir alguns valores que
lhes vão ser úteis (…).

A este respeito corrobora-se que «(…) a educação escolar deve intervir


sistemática e intencionalmente no processo de formação dos valores (…)
nomeadamente dos valores morais (…) não (…) apenas ao domínio cognitivo e
afectivo, mas alargar-se-ia também ao comportamental» (Campos, 1991, p. 14). É,
assim, na interrelação da criança com os outros (e em específico com o educador) que a
criança vai aprender, por viver na ação, a atribuir valores a determinados
comportamentos e atitudes suas e de terceiros. As OCEPE (Ministério da Educação,
1997) ditam, neste âmbito, que são os valores subentendidos à prática do educador e a
forma como este faz uso destes, que permite que a educação pré-escolar seja um
contexto facilitador da educação para os valores.
Parece-me, então, que o papel do educador condiz com o que a uma atitude de
atenção constante para com a criança e com as suas reais características e necessidades
diz respeito, tentando, portanto, ter em consideração cada criança, individualmente, e o
grupo, de uma forma geral. A par disto, inevitavelmente, a questão da educação para os
valores aparece como um alicerce no papel que o educador representa na educação pré-
escolar, tornando-se evidente que há uma intenção em refletir sobre esses valores, que
podem revelar-se linhas orientadoras da ação em sociedade.

3. A família na educação
A terceira categoria que emergiu do corpus das entrevistas realizadas às
educadoras relaciona-se com “A Família na educação” e compreende três subcategorias:
ꞌO papel dos paisꞌ, ꞌParticipação dos pais na vida do jardim de infânciaꞌ e ꞌConsequências
da falta de trabalho colaborativoꞌ.
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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

De uma forma geral, este assunto está diretamente relacionado com a


participação dos pais na vida do jardim de infância, reconhecendo formas de
participação e as consequências que advêm em função das falhas existentes na
articulação entre estes dois núcleos, no que ao trabalho respeita.

3.1. O papel dos pais


A subcategoria ꞌO papel dos paisꞌ refere-se, sobretudo, à forma como os pais
veem o jardim de infância e as suas funções, do mesmo modo que evidencia o seu
verdadeiro papel. Os dados sintetizados no Quadro 12 referem-se a este domínio.
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins

 com a família (…) é sempre diferente 1 1


 faz com que já não seja necessário a educação em casa 1 1
 passam as responsabilidades para a educadora, para as auxiliares 1 1
 educar em conjunto com a escola 1 1
TOTAL 4 0 0 4
Quadro 12 – O papel dos pais
Pela análise do Quadro 12 é facilmente observável que apenas uma das
educadoras referiu, segundo a minha interpretação, que a família desempenha um papel
importante na educação. Contudo, considerou-se necessário unir forças, entre os pais e
as instituições (1), em prol de um conhecimento e adequado desempenho de cada uma
das partes, como forma de beneficiar o desenvolvimento educativo da criança.
As palavras da Ana expressam este aspeto:
(…) eles [pais] têm de perceber que o papel dos pais é, também, educar em
conjunto com a escola e esse papel é muitas vezes negligenciado pelos pais (…).

Constata-se, também, que os papéis a desempenhar por cada uma das partes muitas
vezes confundem-se, resultando, como consequência, uma lacuna nas formas e nas áreas
de intervenção, bem como no grau de participação e compromisso/responsabilidade.
Este aspeto toma sentido nas palavras da Ana, ao referir:
(…) hoje em dia (…) os pais veem o jardim de infância como um lugar que serve
para educar a criança e tudo o que acontece no jardim de infância faz com que
já não seja necessário a educação em casa (…);
(…) muitas vezes eles [pais] passam as responsabilidades para a educadora,
para as auxiliares (…).

Questionando-me do porquê, a Ana encontra uma justificação na dimensão


atribuída aos próprios intervenientes no processo educativo, destacando que:
(…) com a família (…) é sempre diferente (…);
(…) é diferente ser mãe do que ser educadora ou ser avó e ser educadora (…) é
diferente porque eles [crianças] sentem-se mais protegidos e nós com aquela
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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

inexperiência, e ter medo de errar, pensamos que estamos a fazer tudo bem, o
melhor que sabemos, e no fundo não (…).
Parece-me, então, que as instituições e, primordialmente, o jardim de infância,
têm o dever de promover o desenvolvimento da criança, com base em interações
positivas entre os demais intervenientes no processo educativo. Destes intervenientes,
destaca-se, indubitavelmente, a família e os pais como determinantes no
desenvolvimento da criança. Parramón Ediciones (2002a) aponta que é, em princípio, a
família que deve ter a responsabilidade principal no desenvolvimento da criança.
Contudo, não descarta o papel dos profissionais da educação, pois julga que a ação de
ambos os mediadores deve ser feita em conjunto, por permitir a construção do
conhecimento necessário para o desenvolvimento integral do educando.
Neste sentido, as OCEPE (Ministério da Educação, 1997) enumeram algumas
estratégias, facilitadoras da relação entre os pais e o jardim de infância, que procurarei
analisar de seguida, em função das inferências das educadoras.

3.2. Participação dos pais na vida do jardim de infância


Para modo a compreender de que forma os pais participam e podem participar na
vida do jardim de infância, o Quadro 13 apresenta os seguintes dados, que passarei de
seguida a interpretar:
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 o material está sempre a ser renovado 1 1
 terem materiais também em casa para que a criança possa fazer 1 1
 influenciamos também os pais a fazer 1 1
TOTAL 3 0 0 3
Quadro 13 – Participação dos pais na vida do jardim de infância
Tal como foi referido anteriormente, também a esta subcategoria, apenas uma
das educadoras teceu referências, na minha perspetiva interpretativa.
A gestão do material, no que toca à sua renovação (1) surge, aqui, como um
aspeto facilitador da participação dos pais na vida do jardim de infância, referindo a
Ana:
(…) o material está sempre a ser renovado [e] são os próprios pais que muitas
vezes [têm esse cuidado] (…);
(…) fazer com que as crianças tragam mais material e assim também, de uma
forma, fazer com que os pais participem na vida do jardim de infância (…).

Aproveitando as palavras da Ana, torna-se evidente que os pais têm a


preocupação de colaborar com o jardim de infância, encontrando na renovação do
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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

material um forte incentivo a essa participação. Neste âmbito, as OCEPE (Ministério da


Educação, 1997) ditam que a relação com os pais e outros parceiros educativos surge
como um dos diferentes níveis de interação que comporta o ambiente educativo,
podendo estes participar em situações educativas planeadas pelo educador; colaborar em
passeios e visitas; contribuir com os seus saberes e competências; estabelecer trocas de
informações num clima de comunicação.
No entanto, é primeiramente necessário que a família se sinta acolhida,
valorizada e, inevitavelmente, que confie nas orientações que recebe da instituição
(Parramón Ediciones, 2002a).

3.3. Consequências da falta de trabalho colaborativo


Os dados referentes às consequências sentidas pela falta de trabalho colaborativo
entre o jardim de infância e os pais encontram-se esquematizados no Quadro 14.
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 acabam por deixar de ser pais 1 1
 não tenham autoridade sobre as crianças 1 1
 confundir[-se] um pouco o espaço e as regras de casa com as da escola 1 1
 o jardim de infância, está um bocado mal entendido pelos pais 1 1
TOTAL 4 0 0 4
Quadro 14 – Consequências da falta de trabalho colaborativo
Pela leitura dos dados, depreende-se que existe, por parte de uma das educadoras
(4), uma efetiva preocupação com as consequências sentidas pela ausência de trabalho
colaborativo entre o jardim de infância e os pais, sobretudo pela ausência de autoridade
que surge (1), onde refere:
(…) acho que (…) neste momento, o jardim de infância, está um bocado mal
entendido pelos pais (…);
(…) eles [pais] acabam por deixar de ser pais (…) deixam o papel dos pais para
outras pessoas (…);
(…) isto faz com que (…) os pais não tenham autoridade sobre as crianças (…);
(…) já chegou também a um ponto [de] confundir[-se] um pouco o espaço e as
regras de casa com as da escola (…).

A rigor Campos (1991, p. 32) defende que «a ideia de que a educação não ocorre
apenas nas escolas e que a política educativa não tem a ver somente com estas está a
fazer o seu caminho ainda muito lentamente».

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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

4. Representações sobre a identidade


A quarta categoria que surgiu da análise de conteúdo do corpus de informação
das entrevistas foi a que respeita às “Representações sobre a identidade”.
Esta categoria está diretamente relacionada com as conceções das educadoras no
que à temática da identidade diz respeito, tentando compreender a importância que lhe
atribuem. A respetiva categoria integra as subcategorias ꞌConceitoꞌ, ꞌA identidade do
educadorꞌ, ꞌO papel do educadorꞌ e, por último, ꞌA identidade da criançaꞌ.

4.1. Conceito
O Quadro 15 pretende sistematizar os dados referentes ao conceito de identidade:
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins

 a personalidade de cada pessoa 1 1


 é o todo 1 1
 são essas características 1 1 2
 forma como cada pessoa reage face às situações 1 1
 está em constante alteração 1 1
TOTAL 3 1 2 6
Quadro 15 – Conceito
Como pode verificar-se, existem traços caracterizadores que expressam em
maior número a representação das educadoras no que respeita ao seu conceito de
identidade. No entanto, verifica-se que todas elas expõem traços caracterizadores que,
de algum modo, se refletem na perspetiva das outras. Neste âmbito, a Maria Martins vê
a identidade à luz de um todo (1).
A opinião da Maria vai, por um lado, ao encontro da visão da Maria Martins ao
proferirem que a identidade possa ser vista à luz das características do indivíduo (2),
evidenciando-se os seus gostos e a importância que atribuem a determinados aspetos.
Nesta perspetiva, salienta-se:
(…) o que eu gosto, o que eu não gosto, a importância que eu dou a
determinadas coisas, quais são as coisas menos importantes e as mais
importantes (…) (Maria);
(…) O facto de que quando a criança nasce já tem características (…) (Maria
Martins).

No entanto, é importante realçar que os seus gostos e as preferências, além de


trazerem consigo uma carga peculiar, são fruto das influências e das relações que já se
estabeleceram.

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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

A Ana, no seu entendimento, começa por expressar que vê a identidade à luz da


personalidade da pessoa (1), onde a forma como se reage às diferentes situações (1) dita
muito sobre o eu identitário de cada um. Nas suas palavras, a identidade:
(…) tem a ver um pouco com a personalidade de cada pessoa (…);
(…) a forma como cada pessoa reage face às situações (…) a sua maneira de
estar (…) a sua maneira de motivar (…) a história de vida da pessoa (…) o
ambiente (…) as dificuldades (…) todos esses aspetos fazem com que a pessoa
seja o que é hoje (…).

No seguimento da ideia acima apresentada, sobressai o parecer da Maria


Martins, que vê a identidade como um reflexo daquilo que tanto a família, como os
educadores e o próprio meio transmitem. Nas suas palavras:
(…) é aquilo que os pais, os educadores e as pessoas em volta tentam transmitir
e que os ajuda a agir e comportar de determinada forma, a serem mais ou
menos responsáveis, mais ou menos autónomos (…).

A perspetiva desta educadora vai, deste modo, ao encontro das influências que
as primeiras relações com a família e, ulteriormente, com os educadores no seio do
jardim de infância (outros significativos), e as manifestações do próprio meio, num
contexto mais alargado, tecem sobre o indivíduo. Desta situação recai a ideia de que é
com base em constituintes como o bem-estar emocional e social, resultado de ambientes
de estimulação securizantes, que a criança desenvolve sentimentos de confiança,
autonomia, iniciativa, empatia e autoconfiança, tidos como alicerces das relações
humanas para a transição para a vida adulta (Hohmann & Weikart, 1997).
A perspetiva da Ana corrobora com a definição de identidade no que ao mais
singular da pessoa diz respeito, revogando, tal como Costa (1991) a ideia de estrutura
estática (1). Realça-se, ainda, que a experiência, o meio ambiente, a história pessoal, a
maneira de agir e de estar são alguns dos elementos que dão forma e continuidade ao
indivíduo.

4.2. A identidade do educador


A subcategoria ꞌa identidade do educadorꞌ refere-se, sobretudo, à forma como
cada pessoa pode dar um cunho pessoal em cada situação, tecendo a pessoa do educador
influências sobre as pessoas e as situações no seu meio ambiente próximo. Os dados
sintetizados no Quadro 16 referem-se a este domínio.

79
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 forma de organizar a sala 1 1
 influencia muito o grupo/atividades/pessoas 1 1 2
 tem a ver com o gosto pessoal 1 1
 forma como cada educadora vai reagir 1 1
TOTAL 4 1 0 5
Quadro 16 – A identidade do educador
Pela leitura dos dados, é observável que as educadoras assinalaram esta
subcategoria com 5 ocorrências. Depreende-se, também com facilidade, que as
educadoras consideram que a identidade do educador exerce influência sobre o grupo,
as pessoas e as próprias atividades (2), do mesmo modo que evidenciam a relação que
existe com o gosto que manifesta por determinados aspetos (1).
Na voz das educadoras:
(…) a identidade do educador influencia muito o grupo mas também a forma
como as atividades são feitas (…);
(…) este grupo é um grupo que gosta muito de cantar, está estimulado nesse
sentido e, mais uma vez, porque a outra educadora também gostava muito de
cantar com eles e [isso] influencia (…) (Ana);
(…) à medida que fui aprendendo novas coisas (…) fui aplicando na prática, fui
experimentando, fui gostando da experiência e, essa mesma experiência, fui
passando para as outras pessoas que trabalham comigo (…) (Maria).
Tais repostas permitem inferir, tal como Simões (2004) nos indica, que o
educador é um modelo que influencia o desenvolvimento da personalidade da criança,
através do estilo de ensino que assume, dos seus comportamentos, dos gostos, das
atitudes, das crenças e dos valores que tem como premissas para si. Por isso, torna-se
necessário ter especial atenção à presença de atitudes discriminatórias, agressivas e
conflituosas que, por mais inconscientes que possam ser, exercem influências negativas
sobre as crianças (Simões, 2004).
Evidencia-se, também, que a identidade do educador reflete o que ele é enquanto
profissional: na sua forma de reagir às situações (1) e na forma como organiza a sala
(1), aspetos que são também influenciados pelo que o educador apresenta de mais
particular.

4.3. O papel do educador


Pela análise do Quadro 17 evidenciam-se os dados relativos às representações
das educadoras de infância sobre o seu papel no desenvolvimento da identidade das
crianças.

80
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 ter em atenção as características/interesses das crianças 1 1 2
TOTAL 1 0 1 2
Quadro 17 – O papel do educador

Parece-nos, tendo em vista os dados do respetivo quadro, que a atenção pelas


características e pelos interesses de cada um (2) devem ser ponderadas no momento de
planificação, bem como aquando do seu desenvolvimento, uma vez que as crianças não
são todas iguais, podendo umas ser mais ou menos sensíveis. Como elucidam as
OCEPE (Ministério da Educação, 1997) a estimulação da criança pelo respeito das suas
características individuais e das suas reais necessidades é um elemento facilitador de
aprendizagens pertinentes e diversificadas, que contribuem para construir o
desenvolvimento e aprendizagem da criança. Acresce, ainda, que o apoio constante e
atento por parte do adulto significativo, bem como atitudes de segurança, confiança e
credibilidade para com a criança sejam decisivas na aquisição das várias potencialidades
por parte desta, de forma a dar-lhe o suporte necessário para aprender a construir um
conhecimento do mundo físico e social (Hohmann & Weikart, 1997; Simões, 2004).

4.4. A identidade da criança


Os dados referentes às conceções das educadoras acerca da identidade da criança
encontram-se sistematizados no quadro abaixo, o Quadro 18.
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 lugar de destaque 1 1
 atividades novas que até são atividades engraçadas para partilhar 1 1
 saímos do jardim de infância e vamos desenhar 1 1
 uma forma de um influenciar o outro 1 1
 já se dá mais valor a cada trabalho individualmente 1 1
TOTAL 4 1 0 5
Quadro 18 – A identidade da criança

Pela sua leitura, surgem as ideias de que tanto o educador como as crianças
exercem influência um sobre o outro (1), do mesmo modo que as ideias, os interesses e
gostos das crianças são tidos em consideração nas atividades (1), evidenciando o
cuidado pela sua identidade.
Prosseguindo a análise do quadro, surge a ideia de que a identidade da criança
ocupa um lugar de destaque na educação pré-escolar (1), sendo esta o ponto central
deste nível de ensino, pois como decorre das OCEPE (Ministério da Educação, 1997) a

81
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

criança é o sujeito do processo educativo, tendo um papel ativo na construção do seu


desenvolvimento. Na sua voz:
(…) Portanto, ela é o ponto máximo ou o ponto fulcral, digamos assim, da
educação pré-escolar. Pronto, é ela que está lá, é ela que é o meio, é ela que é o
veículo (…) (Maria).

Por seu turno, a valorização de trabalho individual (1) e o desenho ao ar livre (1)
são aspetos tidos em conta por forma de promover a identidade na criança.

5. Adequação do currículo
A quinta categoria que emergiu da análise de conteúdo ao corpus de informação
das entrevistas realizadas às educadoras foi a que se reporta à “Adequação do
currículo”. Pode afirmar-se, numa panorâmica geral, que esta categoria se relaciona com
a forma como as educadoras adequam o currículo ao grupo de crianças.
A respetiva categoria compreende as subcategorias: ꞌPerspetiva curricularꞌ, ꞌO
documento Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar tido como uma
referênciaꞌ e ꞌAdequação das atividadesꞌ, as quais passo a analisar interpretativamente,
uma a uma, para uma melhor compreensão das mesmas.

5.1. Perspetiva curricular


Os dados referentes à metodologia de trabalho adotada pelas educadoras,
encontram-se abaixo sistematizados, no Quadro 19.

Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 projeto 1 1 1 3
 acho que se consegue trabalhar em todas as áreas de conteúdo 1 1
 temos um tema e a partir desse tema vão surgindo outros trabalhos 1 1 2
 seguindo uma linha é mais fácil tanto para eles como para nós 1 1
 fica ao critério de cada uma saber como fazer 1 1
TOTAL 2 3 3 8
Quadro 19 – Perspetiva curricular
A metodologia de trabalho de projeto revelou-se como um dos pontos de vista
predominantes no discurso das educadoras (3). Deste modelo curricular sobressai o
facto de que o mais importante é atender as necessidades e os interesses das crianças,
com um papel ativo no seu próprio processo de desenvolvimento, prevendo, além da
evolução intelectual da criança, melhorar a sua compreensão em relação ao mundo que
a rodeia (Katz & Chard, 1997).

82
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

A justificação pela qual as educadoras utilizam esta metodologia de trabalho


relaciona-se com o facto de considerarem que é um tema central que dá mote para
surgirem os restantes trabalhos (2), sendo, nesse âmbito, cada educadora gestora dessa
intervenção (1). A este respeito, verifica-se nos excertos das educadoras:
(…) nesta instituição (…) há um projeto que é um todo e a partir daí as várias
salas vão seguindo aquele projeto (…) (Maria Martins);
(…) nós aqui trabalhamos por projetos (…);
(…) temos um tema e a partir desse tema vão surgindo outros trabalhos (…);
(…) neste jardim de infância (…) nós juntamo-nos para discutir ideias (…) mas
fica ao critério de cada uma saber como fazer (…) (Ana).

Pela leitura do Quadro 19, verifica-se ainda que a Maria considera que a
possibilidade de se poder trabalhar e articular as diferentes áreas de conteúdo (1) é uma
mais-valia; vendo a Maria Martins, nesta metodologia de trabalho, uma linha
orientadora de trabalho (1).

5.2. O documento Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar


tido como uma referência
Centrando a interpretação no Quadro 20, este pretende ilustrar a forma como as
educadoras têm em consideração o documento Orientações Curriculares para a
Educação Pré-Escolar.
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 sim 1 1 2
 é um suporte para nos apoiar 1 1
 também a nível da psicologia 1 1
TOTAL 2 0 2 4
Quadro 20 – O documento Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar tido como
uma referência

Pela análise do Quadro 20, surge a ideia de que as OCEPE são vistas como uma
referência (2), sendo nesse sentido destacada a ideia de suporte/ajuda (1), também ao
nível da psicologia (1), como o expresso nas palavras das educadoras:
(…) temos esse documento que nos ajuda (…) é um suporte para nos apoiar
nesse sentido (…) (Maria Martins);
(…) não só ao nível dessas orientações mas também a nível da psicologia (…).
(Ana).

A perspetiva das educadoras encontra fundamento quando se discriminam as


OCEPE como pontos de apoio para a intervenção educativa, que espelham a coerência
profissional de uma educação que se desenvolve ao longo da vida (Ministério da
Educação, 1997).
83
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

5.3. Adequação das atividades


Considerada a forma como se adequam as atividades, as entrevistadas
expressaram as suas inferências que se encontram sistematizadas no quadro abaixo, o
Quadro 21.
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 adaptar as outras atividades para aí/àquela criança 1 1 2
 que eles tenham esse sentido de não descurar nenhuma área 1 1
TOTAL 2 1 0 3
Quadro 21 – Adequação das atividades

Relativamente à adequação das atividades, facilmente se constata que existe um


traço caracterizador que maioritariamente foi expresso pelas educadoras. Estas referiram
que para se conseguir adequar as atividades é necessário um conhecimento prévio (2),
por parte do educador, sobre cada criança em si, sobre a sua idade real e cronológica, as
suas capacidades, necessidades e características (sobre o que cada criança é), ao ver que
o conhecimento sobre o desenvolvimento da criança (a nível afetivo, social, cognitivo,
motor e linguístico) oferece uma melhor possibilidade de se adequar as propostas
educativas (Parramón Ediciones, 2002a).
A este propósito, a Maria salienta:

(…) os adultos que a acompanham têm que saber as capacidades que aquela
criança tem, em que fase etária está para poder (…) adaptar todas as atividades
àquela criança (…).

No mesmo seguimento, é ainda acrescido pela Ana:

(…) agora, até para o desenvolvimento da fala, estamos com as lengalengas, e


que essa lengalenga seja dita a cantar, e a dizer em alto, em tons fortes e fracos
(…);
(…) é muito pela música porque como é um grupo que gosta muito de cantar,
então nós tentamos adaptar as outras atividades para aí (…).
Por outro a lado, a adequação das atividades pode ser entendida sob a forma de
não descurar nenhuma atividade (1) e, a este respeito, a avaliação surge como um forte
aliado por facilitar uma gestão adequada das diferentes áreas. Na mesma linha de
pensamento, Simões (2004) revela que a avaliação pode ser feita por meio de
instrumentos, do mesmo modo que evidencia a necessidade de fazê-la com a criança,
apostando em momentos de reflexão sobre os dados recolhidos para uma posterior
estruturação da intervenção com fim a aprendizagens eficazes. Na voz da Ana:

84
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

(…) ao final da semana eu vejo com eles [crianças] a avaliação e faço com que
(…) para a próxima semana trabalhem mais [determinada área] para que eles
tenham esse sentido de não descurar nenhuma área (…).

6. Representações sobre a gestão do ambiente educativo (enfoque sobre a


construção da identidade da criança)
A sexta categoria que emergiu da análise de conteúdo ao corpus de informação
das entrevistas às educadoras diz respeito às suas “Representações sobre a gestão do
ambiente educativo”.
Numa perspetiva geral, pode dizer-se que esta categoria corresponde ao
conhecimento sobre a forma como as educadoras organizam o material, o espaço e o
tempo, estando o seu enfoque direcionado para a construção da identidade na criança.
A referida categoria compreende, assim, as seguintes subcategorias: ꞌGestão dos
materiaisꞌ, ꞌGestão dos espaçosꞌ e ꞌGestão do tempoꞌ, que passarei a analisar,
interpretativamente, em seguida.

6.1. Gestão dos materiais


Interessa, de momento, conhecer a intencionalidade educativa subjacente à
prática das educadoras no que respeita à gestão dos materiais, explícitas no Quadro 22.
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 o material encontra-se sempre à disposição das crianças 1 1 1 3
 tentei organizar a sala de maneira a que eles [crianças] sejam autónomos 1 1 2
 como forma de reutilização dos materiais 1 1
 para experimentarem novas técnicas, novos suportes 1 1
 diversificados 1 1
 para poderem realizar essas mesmas brincadeiras 1 1 2
TOTAL 3 3 4 10
Quadro 22 – Gestão dos materiais
Pela análise das 10 ocorrências totais, destacam-se as expressivas 3, referentes
ao indicador “o material encontra-se sempre à disposição das crianças” deixando
antever, rapidamente, que existe uma notória preocupação para com a gestão dos
materiais, entendendo o facto de torná-los acessíveis/disponíveis às crianças como um
importante aspeto, enquanto dispositivo de gestão curricular. A este respeito, na voz das
três educadoras:
(…) o material encontra-se sempre à disposição das crianças, para que se
sintam livres e (…) escolham os materiais que pretendem (…) (Ana);
(…) elas [crianças] têm tudo à mão (…) (Maria);
(…) que consigam chegar às coisas, que consigam ir buscar as coisas quando
precisam (…) (Maria Martins).
85
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

Relativamente à sua importância enquanto facilitador da realização de


brincadeiras (2), as educadoras referiram que:
(…) se lhes apetece brincar na casinha das bonecas eles têm os materiais
também à mão, para poderem realizar essas mesmas brincadeiras (…) (Maria);
(…) há crianças que gostam de chegar e fazer desenhos, há outros que gostam
mais de chegar e brincar um bocadinho (…) (Maria Martins).

Na verdade, tais respostas das educadoras parecem corresponder à ideia


apresentada nas OCEPE (Ministério da Educação, 1997, p. 57) ao referir que
«contactando com diferentes materiais que poderá, explorar e transformar de forma a
tomar consciência de si próprio na relação com os objectos».
Continuando a análise interpretativa do quadro foi, ainda, possível encontrar
diferentes focagens que se agrupam: como forma de propiciar a sua autonomia; como
forma de reutilização de materiais; como promotor de novas técnicas e de suportes;
como promotor da diversidade de materiais.
No que respeita à gestão dos materiais como forma de propiciar a sua autonomia
(2), afirmaram as entrevistadas:
(…) tentei organizar a sala de maneira a que eles [crianças] sejam autónomos
(…) (Maria Martins);
(…) para lhes criar também alguma autonomia, porque eles vão aprendendo a
ser mais autónomos (…) (Maria).

Estes aspetos deixam transparecer a consciência das educadoras em reconhecer


que a autonomia é um aspeto indispensável no processo de construção da identidade. A
este respeito as OCEPE (Ministério da Educação, 1997) referem que o conhecimento
dos materiais é, também, uma condição de autonomia da criança e do grupo que se vai
adquirindo através de um conhecimento, da consciencialização e da responsabilização
da forma de organização dos materiais, bem como da forma como podem ser utilizados
e partilhados por todos.
Quando se fala em gestão dos materiais, incidindo a abordagem na sua
reutilização (1), as OCEPE (Ministério da Educação, 1997) proferem que o
aproveitamento do material é um elemento a prever na organização do material escolar.
A educadora refere:
(…) Incentivamos também a trazerem livros, revistas velhas e materiais (…)
como forma de reutilização dos materiais (…) (Ana).
Por sua vez, fazer uso dos materiais para experimentar novas técnicas e suportes,
(1) aponta para uma nova reestruturação das suas potencialidades, de forma a promover
86
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

situações desafiadoras, atendendo às necessidades das crianças (Ministério da


Educação, 1997).
No que respeita a gestão dos materiais tendo em consideração a sua variedade
(1), este é um critério de qualidade tido em consideração, de acordo com as
necessidades da criança (Ministério da Educação, 1997). Nas palavras da educadora:
(…) tento que os materiais estejam acessíveis a todos eles e diversificados (…)
(Maria Martins).

6.2. Gestão dos espaços


Com o intuito de conhecer as representações das educadoras sobre a forma como
se gerem os espaços, incidindo o seu enfoque sobre o domínio da identidade pessoal, o
Quadro 23 apresenta os dados respeitantes a esta subcategoria.
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins

 os gostos do educador influenciam muito a sala 1 1


 estamos constantemente a mudar 1 1 2
 o espaço nas mesas também seja flexível 1 1
 levá-los a ser responsáveis 1 1
 tenho a sala dividida em espaços 1 1
 conforme formos conhecendo os interesses/necessidades das crianças 1 1 2
TOTAL 4 3 1 8
Quadro 23 – Gestão dos espaços
Decorrente do discurso das educadoras sobressai, em primeira instância, o
cuidado para com os interesses e necessidades da criança (2) como um elemento
importante a considerar na gestão curricular, pois coerente com as ideias de Parramón
Ediciones (2002b) uma boa organização do ambiente educativo deve respeitar aquilo
que as crianças são, sabem e desejam. Afirmam as educadoras:
(…) depois, ao longo do tempo, conforme formos conhecendo os interesses das
crianças, a gestão da sala vai mudando (…) (Ana);
(…) todo o espaço foi pensado nestas faixas etárias, na criança em si e nas
necessidades que elas têm (…) (Maria).

Pela análise do quadro constata-se a visão das educadoras em considerar o


espaço como um elemento flexível do ambiente educativo (2), referindo que este não é
estanque. Do mesmo modo é notória a preocupação em organizar a sala por diferentes
espaços (1), apostando na flexibilidade de disposição entre as próprias mesas (1). A este
respeito Parramón Ediciones (2002b) dita os seus contributos ao proferir que as crianças
necessitam de espaços amplos e flexíveis, por estes permitirem que se responda mais

87
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

facilmente às suas necessidades, pelas diversificadas ações e funções que permitem,


bem como por facilitarem a interação e socialização entre os pares.
No entanto, parece-nos, pela análise do quadro, que as educadoras veem na
arrumação dos espaços um motivo para incutir nas crianças uma atitude responsável (1).
Do mesmo modo, as educadoras afirmam que os gostos do educador influenciam a sala
(1), pois de acordo com Ministério da Educação (1997), o indivíduo é influenciado pelo
meio, mas também o influencia.

6.3. Gestão do tempo


Considerada a forma como se gere o tempo em função da identidade da criança,
as entrevistadas expressaram as suas opiniões, que se encontram sistematizadas no
quadro abaixo, Quadro 24.
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 o tempo está todo dirigido (…) por fases do dia /rotina 1 1 2
 consideramos algumas atividades livres 1 1 2
 têm uma grelha (…) sobre as tarefas que eles têm de fazer 1 1
 algumas atividades dirigidas 1 1 2
TOTAL 3 3 1 7
Quadro 24 – Gestão do tempo

Pela análise do quadro, surgem quatro traços caracterizadores como sendo


aqueles que mais foram expressos pelas educadoras, no total de 7 ocorrências. Estas
consideram que o tempo deve ser pensado, encontrando na rotina um bom recurso (2).
Consideram, também, que a existência de atividades de cariz livre (2) e dirigidas (2)
sejam benéficas para a construção da identidade na criança.
Nesta perspetiva, vários autores, (Parramón Ediciones, 2002b; Zabalza, 1998a)
aferem que a existência de uma rotina, marcada por uma sucessão de atividades e,
portanto, por uma repetição diária, constituem-se pontos de referência estáveis para a
criança, possibilitando-lhes prever e antecipar situações e, deste modo, proporcionar-lhe
segurança, confiança e autonomia. São, do mesmo modo, para Parramón Ediciones
(2002b), considerados como critérios básicos para a organização temporal, a alternância
entre as atividades livres e as dirigidas, de onde se ressalva, segundo Zabalza (1998b), a
necessidade de deixar espaços e momentos em que a criança decida o que pretende
fazer, combinados com momentos de atividades dirigidas onde se possam abordar
aspetos do “currículo”.
Aferem as educadoras:
88
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

(…) tenho essa forma organizada muito para eles serem autónomos e para
escolherem no início da manhã o que querem fazer, quais os espaços em que
querem brincar ou as atividades que querem fazer (…) tenho essa rotina de
manhã (…) (Maria Martins);
(…) até às dez horas, dez e meia, são chamadas as atividades livres (…) (Ana);
(…) o tempo está todo dirigido (…) por fases do dia (…);
(…) a partir das dez horas, como já todas as crianças chegaram começam a
haver algumas atividades dirigidas, ou dentro das expressões, ou então outra
atividade dirigida (…);
(…) a parte da tarde são sempre tardes livres de brincadeira (…) (Maria).

As educadoras referem, ainda, a existência de uma grelha (1) que facilita a


criança a saber a sequência de tarefas que se seguem.

7. Desenvolvimento global da criança (enfoque sobre o desenvolvimento da


personalidade e do comportamento social)
A sétima categoria que emergiu da análise de conteúdo ao corpus de informação
das entrevistas às educadoras reporta ao “Desenvolvimento global da criança” estando o
seu enfoque direcionado para a personalidade e o comportamento, componentes
integrantes do desenvolvimento global na criança.
Numa análise geral, esta categoria diz respeito ao conhecimento sobre as
atividades e as estratégias desenvolvidas pelas educadoras, bem como o conhecimento
do seu papel enquanto promotoras do desenvolvimento global na criança
A referida categoria compreende, assim, as seguintes subcategorias: ꞌO papel do
educadorꞌ, ꞌO meio familiarꞌ, ꞌEstratégias e atividades desenvolvidasꞌ e ꞌObjetivos
educativosꞌ.

7.1. O papel do educador


A presente subcategoria reporta às representações das educadoras sobre o seu
papel no desenvolvimento global da criança, incidindo o seu foco no desenvolvimento
da personalidade e do comportamento social. Os respetivos dados encontram-se
sintetizados no Quadro 25, conforme abaixo.

89
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 há valores 1 1
 transmitir regras 1 1 1 3
 incentivamos sempre a que sejam autónomos 1 1
 muito importante 1 1
 é importante que as crianças saibam agir/comportar-se corretamente 1 1
 conseguirmos mudar comportamentos 1 1 2
 tenhamos alguma influência [no desenvolvimento da personalidade] 1 1
 no desenvolvimento da personalidade não 1 1
 depende um bocado da nossa postura/daquilo que lhes passamos 1 1
 é a tal semente que nós podemos semear nas crianças 1 1
 dar-lhe determinadas razões para que ela entenda 1 1
TOTAL 3 7 4 14
Quadro 25 – O papel do educador
Constatável pela observação do Quadro 25, as educadoras em muito se
expressaram para definir de que forma o educador desempenha um papel importante no
desenvolvimento da criança (14). Ressalta o facto de que a transmissão de regras (3) é
um aspeto que prima na intervenção destas educadoras, sendo estas fundamentais para
conseguir mudar comportamentos mais tarde (2).
Nos seus discursos:
(…) as regras (…) acabam por ser todas influenciadas (…) o mais descontraído,
o menos descontraído, o ambiente pacífico, menos pacífico, formas de aprender
diferentes (…) (Ana);
(…) desenvolver nelas [crianças] o saber estar com o outro, o saber respeitar, o
saber esperar (…) são tudo regras que são muito trabalhadas no jardim de
infância, porque se trabalha em grande grupo (…) (Maria);
(…) Penso que o chamar a atenção, o estabelecimento de regras, o saber
comportar-se à mesa, o saber comportar-se com os colegas, o pedir desculpa, o
dizer obrigado… fazem parte do dia-a-dia de uma sala e depois na sociedade é
importante que as crianças saibam agir corretamente, saibam comportar-se
dessa forma, porque cada vez mais nós vemos jovens rebeldes (…) (Maria
Martins).
As educadoras veem na autonomia das crianças um forte aspeto a ser
incentivado nas suas práticas (1), sendo na perspetiva de Bárrios et al., (s/d) a
autonomia pessoal um valor patente nos objetivos educativos deste nível de ensino.
É neste sentido que as mesmas referem, ainda, que é importante transmitir às
crianças o porquê de ser agir de determinada forma (1), para mais tarde toda essa
preocupação dar frutos e a criança crescer no seu verdadeiro entendimento (1). Na voz
das educadoras:
(…) se é o nosso papel e se estamos com aquele grupo de crianças achamos que
[se] para nós é correto agir de determinada maneira (…) é importante que
transmitamos isso para depois conseguirmos mudar comportamentos àquelas
crianças que se comportavam menos bem (…) (Maria Martins);
90
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

(…) dar-lhe determinadas razões de forma a que ela entenda e que ela vá
crescendo com essas mesmas regras que são importantes para quando ela for
adulta saber viver em sociedade (…) (Maria).

Embora uma das educadoras tenha referido inicialmente que o educador não
desempenha um papel importante no desenvolvimento da personalidade da criança (1),
esta indica nas observações ulteriores que, de facto, o educador tem influência nesse
sentido (1), dependendo da sua postura e dos princípios morais que tem para si como
referências (1).
Na voz da Maria:
(…) no desenvolvimento da personalidade não (…);
(…) eu acredito que nós [educadoras] tenhamos alguma influência [no
desenvolvimento da personalidade] e que (…) consigamos semear algo de bom
ou algo de mau (…);
(…) nós também podemos semear coisas más nas crianças, depende um bocado
da nossa postura e daquilo que lhes passamos, dos princípios morais, de uma
série de princípios que fazem parte da educação (…).

Revelam-se também determinantes a passagem de valores para as crianças (1),


valores, esses, que são maioritariamente defendidos ou trabalhados pelo educador e que,
por influência, acabam por ser mais trabalhados pelas crianças.
A este respeito, a Ana salienta:
(…) há valores (…);
(…) valores que o educador pode apreciar mais (…) esses valores são
discutidos ou trabalhados mais pelas crianças (…);
(…) há coisas que (…) para um educador não são tão relevantes e para outro é
e as crianças acabam por [ser influenciadas por isso] (…).
Parece-nos, por conseguinte, que os valores e as regras têm um papel importante
na vida da criança. Os primeiros porque atuam como referências na orientação de ações,
na tomada de decisões, do mesmo modo que fazem referências quando se pretende
atingir algum estado (Bárrios et al., s/d). As OCEPE (Ministério da Educação, 1997)
referem, neste âmbito, que a educação pré-escolar ao promover a interação com
diferentes valores e perspetivas, constitui-se como um contexto favorável a que a
criança se vá consciencializando de si e dos outros.
As segundas, por seu turno, encontram o seu valor na regulamentação do
comportamento do indivíduo, tornando assim o comportamento previsível.
Constata-se nesta perspetiva, e de acordo com Bárrios et al. (s/d), que as atitudes
que os indivíduos apresentam refletem os valores e os comportamentos assumidos pelos

91
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

mesmos, desempenhando o educador um papel muito importante, neste âmbito, pois os


valores não se ensinam, mas vivem-se na ação direta do dia a dia, num processo pessoal
e social (Ministério da Educação, 1997).
Concebem-se, deste modo, as atitudes, os valores e as regras como elementos
que se relacionam entre si formando um todo funcional do processo de
desenvolvimento, o qual se encontra suscetível à influência de terceiros (Bárrios et al.,
s/d).

7.2. O meio familiar


A subcategoria ꞌO meio familiarꞌ surge com o intuito de melhor se compreender
a influência deste no desenvolvimento da criança, especificando a vertente da
personalidade e do comportamento social da criança. O Quadro 26 sintetiza os dados:

Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 o meio familiar (…) é o que tem maior força 1 1
 a criança já vem, de certa forma, formatada 1 1
TOTAL 0 2 0 2
Quadro 26 – O meio familiar

Pelo discurso proferido, somente uma das educadoras teceu as suas observações
a este respeito, revelando que é o meio familiar aquele tem maior força na formação da
criança (1), uma vez que esta quando ingressa na educação pré-escolar já vem
formatada desse meio (1).
Pires (2007, p. 7) refere, neste mesmo seguimento, que são «as vinculações mais
precoces que vão permitir o desenvolvimento de personalidades equilibradas», pois em
função dos primeiros tempos de vida que ficam registados no subconsciente do
indivíduo, a forma de agir e comportar-se é influenciada. Assim sendo, a qualidade da
primeira vinculação é a responsável por determinar a segurança básica que permite à
criança crescer e desenvolver-se em plenitude, contributos que determinarão a
construção de uma personalidade rica e equilibrada. Do mesmo modo, vai permitir que
a criança construa uma autoestima positiva, consequência do sentimento de ser amado
advindo das primeiras relações com a figura materna. Por fim, a criança aprende a amar,
uma capacidade que vai permanecer ao longo da sua vida, se as primeiras vinculações
da criança forem positivas.

92
CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

7.3. Estratégias e atividades desenvolvidas


Com o intuito de conhecer que tipo de estratégias e de atividade eram
desenvolvidas pelas educadoras, por forma a contribuírem para o desenvolvimento da
criança, no que se especifica ao desenvolvimento da sua personalidade e do
comportamento social, os dados a esta categoria correspondentes encontram-se no
Quadro 27, a saber:
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 ao conhecer o grupo já se faz tão naturalmente 1 1
 ver a dificuldade, esse lado mais fraco, também como uma coisa normal 1 1
 através do estimulo /positivismo 1 1 2
 as estratégias, às vezes, é que mudam de criança para criança 1 1
 as atividades artísticas 1 1 1 3
 adaptar à idade/grupo de crianças 1 1
 exigência/firmeza 1 1
 tento sempre que sejam eles a refletir 1 1 2
 saberem partilhar/emprestar 1 1
 explicar / definir e relembrar bem as regras 1 1
 a motricidade 1 1 2
 jogos 1 1 1 3
 o serem alinhados em comboio 1 1

TOTAL 5 9 6 20
Quadro 27 – Estratégias e atividades desenvolvidas
Debruçando-nos sobre os dados do respetivo quadro, destacam-se 20 ocorrências
como sendo as respostas assinaladas das educadoras. Sobressai a realização de jogos (3)
como uma das estratégias e das atividades potenciadoras do desenvolvimento da
criança, pois nas suas palavras:
(…) Jogos… gosto muito de fazer jogos. Jogos em grupo (…) (Maria Martins);
(…) os jogos de autoconhecimento, nós acabamos por conhecer a outra pessoa e
ficar muito mais perto dela e (…) estas atividades estimulam isso (…) (Ana);
(…) fazem-se perfeitamente jogos sociais, onde são submetidas regras que eles
têm de respeitar (…) (Maria).

Parramón Ediciones (2002b) afirma que através dos jogos, nos seus momentos
implícitos de brincadeira, intervêm um conjunto de fatores de ordens várias, que
contribuem para a construção de si próprio e do meio ambiente. Os jogos em grupo
ganham aqui especial ênfase pelas regras que têm implícitas. Ou seja, de acordo com
Kamii e De Vries (1991), para o desenvolvimento equilibrado do jogo ambos os
participantes têm de aceitar, cooperar e seguir as regras, ressalvando Martins (2008, p.
32) que «deverá ser um acto aprazível para a criança, a fim de que esta a volte a cumprir
e esse cumprimento entre na sua rotina».

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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

A ocorrência expressa por uma das educadoras evidencia a sua real preocupação
com a importância de saber partilhar por todas as crianças (1). A consciência de que a
partilha deve ser fomentada entre o grupo, do mesmo modo que deve ser vista como
algo natural e importante para a vida em sociedade recai na voz da Maria:
(…) o saberem (…) que há uma caixa de marcadores e de lápis de cera, e essa
caixa tem de andar de um lado para o outro, tem de ser partilhada por todos(…);
(…) eles têm de se habituar a partilhar (…);
(…) são estratégias (…) que se aplicam, ao seu desenvolvimento social de forma a
que eles saibam o que é a partilha (…);
(…) trazem (…) bolos de casa, bolachas, saberem que chegam mas que também têm
de dar bolachas aos amigos (…);
(…) saberem partilhar também aquilo que trazem de casa (…);
(…) saberem emprestar (…);
(…) tudo isto é-lhes passado diariamente (…) a importância de partilhar, do
emprestar, hoje empresto eu e amanhã emprestas tu (…).

Prosseguindo a análise do quadro, as educadoras referem o estímulo/positivismo


(2) e a reflexão (2) como boas estratégias.
Nos seus discursos:
(…) incentivar cada criança a fazer e a saber… [e] através do positivismo, de ser
positivo, incentivá-la a fazer (…) (Ana);
(…) há outras crianças que a sua agressividade é mais esporádica, não é frequente
(…) aqui nós não temos de ser tão firmes, ou podemos ser firmes mas deixando uma
porta aberta (…) deixando que a criança fique a pensar nesse assunto sem ter a
necessidade de sermos tão firmes ou tão rígidas (…) (Maria).
Esteves (2006) afere que o elogio é um gesto vital para o ser humano, pois além
de fazer com que o indivíduo se sinta amado, reconfortado e valorizado pelo outro, este
gesto é fundamental para o ego, que precisa sentir-se alimentado e, consequentemente,
para a construção de uma autoimagem positiva.
Do mesmo modo, as educadoras veem a motricidade (2) e as atividades artísticas
(3) como fortes atividades potenciadoras do desenvolvimento da personalidade e do
comportamento social, especificando a dança educativa, a expressão dramática e a
música.
Nas suas palavras:
(…) Os jogos na motricidade desenvolvem muito (…);
(…) a dança educativa também é uma atividade onde se trabalha muito, porque
exigem muitas regras, exige muita atenção, e aquelas crianças menos atentas,
normalmente, também apresentam comportamentos menos adequados dentro destas
atividades (…);
(…) a expressão dramática (…) é um jogo, é uma atividade onde se trabalha muito
todas essas características da personalidade na criança (…) (Maria).

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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

Ainda, na ótica da Ana:


(…) em relação às nossas atividades, como são atividades artísticas (…)
estimulamos muito as crianças nesse sentido (…) faz com que os grupos fiquem
muito mais unidos, pois todas as atividades artísticas fomentam isso, a unidade, o
sentido de grupo (…);
(…) o facto de muitas vezes o toque, o abraçar, o tocar, o rebolar, o estarem juntos,
o estarem afastados, faz com que as ligações entre eles sejam muito mais próximas
do que se fosse de outra atividade (…).

Santos (1975) defende a importância das artes na formação do indivíduo,


essencialmente por estas contribuírem para a formação equilibrada da sua
personalidade. Numa mesma perspetiva, Coleto (2010) vê nas artes o desabrochar da
sensibilidade, da criatividade, da capacidade crítica e, essencialmente, da capacidade de
expressão, o que possibilita à criança exteriorizar os seus sentimentos e emoções,
mostrando o que tem de si.
Na mesma linha de raciocínio, vê-se nas ideias de Sousa (2003) um forte
incentivo à utilização da expressão dramática para próprio benefício da criança, na
medida em que o principal objetivo desta atividade é a estimulação da criança – a
expressão. Este autor (2003) certifica esta atividade educativa ao mais alto nível, ao
considerar que estimula a criança no seu desenvolvimento bio-psico-sócio-motor,
podendo esta expressar livremente os seus sentimentos e desejos, as suas tensões, a sua
criatividade, do mesmo modo que se trabalha a sua consciência de valores.
No que se reporta à dança educativa, Sousa (2003) refere que o objetivo desta é
efetivamente o desenvolvimento da personalidade na criança, sendo portanto necessário
que a atitude do educador seja a de atuar em conformidade com os interesses, as
características e as capacidades, do mesmo modo que a prevalência de atitudes de
atenção, incentivo, paciência e disponibilidade são tidas como fulcrais.
Da análise do quadro destacam-se, ainda, as regras (1), o serem alinhados em
comboio (1), o respeito pela dificuldade (1), a firmeza (1) e o conhecimento do grupo
(1) como bons recursos, pois em função do que afirmam as entrevistadas:

(…) quando as crianças falam, quando são mais agressivas no seu


comportamento social para com a outra (…) com estas crianças temos que ser
mais firmes (…) (Maria);
(…) tendo em conta a identidade de cada criança já se faz autonomamente, já se
sabe como são as características de cada criança e (…) instintivamente já estás
a direcionar aquela atividade para aquela criança (…) (Ana).

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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

7.4. Objetivos educativos


A última subcategoria ꞌObjetivos educativosꞌ surge com o propósito de
compreender de que forma a personalidade e o comportamento social da criança eram
tidos em consideração no delineamento dos objetivos educativos, a saber no Quadro 28.
Maria
INDICADORES/OCORRÊNCIAS Ana Maria TOTAL
Martins
 tem a ver com a criança em si 1 1
TOTAL 0 1 0 1
Quadro 28 – Objetivos educativos
É com algum descontentamento que afirmo que apenas uma das educadoras
teceu os seus argumentos neste âmbito, referindo que os objetivos educativos não são
definidos em função da personalidade e do comportamento social, mas sim em função
do desenvolvimento da criança em si. Nas suas palavras:
(…) não tem a ver com a personalidade da criança (…);
(…) tem a ver com a faixa etária (…);
(…) tem a ver com o desenvolvimento da criança (…);
(…) no comportamento social tem a ver com a criança em si (…) (Maria).
Parece-me, então, que existe uma ambiguidade a este respeito: por uma lado é-
nos dito que os objetivos educativos não contemplam a personalidade e o
comportamento social e, por outro, que estes se relacionam com o desenvolvimento da
criança em si. As OCEPE (Ministério da Educação, 1997, p. 15) ditam, a este respeito,
que um dos objetivos pedagógicos que decorre da Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar
(1997) visa exatamente «estimular o desenvolvimento global da criança no respeito
pelas suas características individuais, incutindo comportamentos que favoreçam
aprendizagens significativas e diferenciadas». Assim sendo, parece-me, no meu
entender, que a educadora ao referir estas duas perspetivas acaba por se contrapor.
Encontram-se também respostas a estes aspetos quando Zabalza (1998a, p. 107)
refere que um dos objetivos da educação pré-escolar assenta na facilitação e conquista
de uma personalidade sã, quando nas suas palavras a descreve como o «eixo básico de
orientação de toda a acção escolar, sobretudo nesta etapa infantil em que se assentam as
bases dessa personalidade sã». Parece-me, então, que a procura de uma personalidade sã
surge no sentido de estruturar, integrar e adequar as estruturas egodinâmicas ao invés de
reprimir as suas manifestações. Do mesmo modo, o mesmo autor (1998a) salienta a
crescente procura de unicidade dos indivíduos, que pressupõe uma conceção positiva da
individualidade, incluindo as ideias de autonomia, iniciativa, capacidade crítica e de
tomada de decisões.
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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

Em jeito de súmula, Zabalza (1998b) acrescenta que a educação pré-escolar está


destinada, essencialmente, a potencializar o desenvolvimento global da criança.

B. Síntese interpretativa dos dados


No decurso do processo de análise das entrevistas às educadoras, foi-se tornando
evidente um conjunto de aspetos, a saber:
Partindo da premissa de que é o educador o elemento que permanece maior
tempo junto das crianças, em ambiente de jardim de infância, torna-se importante
considerar que a figura deste é tida pelas crianças como um modelo a seguir, um
exemplo a reproduzir. Na verdade, numa profissão que se desenvolve comummente
numa díade entre a dimensão pessoal e profissional, é esta última que se concebe como
um reflexo do que nos constitui e dá continuidade. É, por conseguinte, o conjunto
daquilo que se é - nos princípios, no sistema de valores, nas atitudes, nas opções, nas
características e nos interesses – que transparece nas vivências diárias e que,
indubitavelmente, exerce influência sobre aquilo que nos rodeia, não fugindo a
intervenção profissional a essa influência.
Curioso é o facto de que, uma profissão que aparentemente transparece (à luz
dos leigos) uma enorme facilidade é, ao mesmo tempo, portadora de tamanha
responsabilidade. Responsabilidade, essa, que deveria estar patente na intervenção
educativa deste profissional, ao considerar que a criança nestas faixas etárias, além de
alguma dependência, carece de estímulos, segurança, confiança, ambientes securizantes
e de autonomia, que se constituem como prometedores para a sua formação equilibrada.
Inegável é, também, o papel da família como mediador do processo evolutivo da
criança. As suas intervenções conjugadas com os esforços dos demais agentes
educativos constituem-se como ferramentas essenciais para o desenvolvimento da
criança. Na verdade, considerar a troca de informações, a ação participada e as riquezas
que cada contexto pode proporcionar são, além de enriquecedores para a própria
criança, motivantes para os profissionais educativos que se amparam mutuamente num
trabalho colaborativo.
A perspetiva curricular considerada pelas educadoras incide na abordagem de
projeto, onde além de considerar-se os interesses e necessidades das crianças, concebe-
se a evolução da mesma numa melhor compreensão do mundo. São ainda consideradas
as OCEPE (Ministério da Educação, 1997) como importantes referências na ação
educativa das educadoras por, nas palavras das mesmas, serem um suporte e apoio.
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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

A intencionalidade que está na base da ação educativa constitui-se, ela só, como
um requisito fundamental para atender tanto cada criança em particular, como o grupo
no seu todo. Neste sentido, proporcionar-lhes momentos agradáveis, estimulantes e
significantes, ao invés de demonstrar atitudes negativas e pessimistas constituem-se
como determinantes para a construção de um autoconceito e autoimagem positivas na
criança. Não nos podemos esquecer, neste âmbito, que as avaliações e opiniões tecidas
sobre a criança são determinantes para a construção das representações sobre si própria.
Considera-se também a gestão dos materiais, dos espaços e do tempo como
referências que contribuem para a construção da identidade na criança. Quer isto dizer
que possibilitar à criança o acesso aos materiais, deixando-a optar e utilizar o que
pretende são aspetos que promovem a sua autonomia, um objetivo que a este nível de
ensino respeita. Do mesmo modo, o facto de se incentivar a reutilização de materiais e
de se procurar utilizar novas técnicas e suportes constituem-se como aspetos que
apontam para uma visão conscienciosa de que os materiais podem ser reestruturados, as
suas potencialidades desdobradas e, assim, possibilitam-se novas situações desafiadoras,
atentas às necessidades da criança.
Perspetivar o ambiente educativo sem considerar as acrescidas potencialidades
que o espaço nos oferece não faz sentido algum, no âmbito deste estudo. O espaço, por
si só, traz inúmeras oportunidades educativas e de crescimento para a criança. No
entanto, repensá-lo sob o ponto de vista dos interesses e das necessidades da criança é
repensá-lo enquanto contributo para o seu desenvolvimento. Surge, nesta linha de
pensamento, a visão do espaço enquanto elemento flexível do ambiente educativo, que
se vai moldando e redesenhando consoante se forem conhecendo as necessidades e os
interesses da criança. No entanto, e considerando o espaço como um elemento que é
pensado, este é concebido por forma a levar as crianças a ser responsáveis pela
arrumação do mesmo.
Por seu turno, a organização temporal ganha aqui sentido quando se considera a
existência de referências temporais estáveis que servem de guia para as crianças,
possibilitando-lhes, pelo ritmo, antever o que se sucede, um passo rumo à autonomia, à
segurança e à confiança. Considerando, do mesmo modo, a gestão equilibrada entre as
atividades de cariz livre e orientadas, estas são perspetivadas como critérios básicos
para a organização temporal, que promovem por um lado a autonomia da criança que
decide o que pretende fazer e, por outro lado, dá asas para se abordarem aspetos do
currículo.
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CAPÍTULO IV APRESENTAÇÃO E ANÁLISE INTERPRETATIVA DOS DADOS

As estratégias e as atividades concebidas em torno do desenvolvimento da


personalidade e do comportamento social mostraram-se promitentes. Os jogos, pela sua
vertente lúdica, mostraram-se determinantes para a cooperação em grupo e para a
compreensão, aceitação e cumprimento de regras, importantes marcos para a vida em
sociedade. Por outro lado, a exploração de atividades artísticas tenciona, quer ao nível
da expressão dramática quer da dança educativa - a expressão da criança - nas suas
manifestações mais peculiares, sejam elas desejos, tensões ou alegrias.
Mostrou-se também, como uma estratégia, a este nível fundamental, o recurso à
reflexão com as crianças, possibilitando-lhes pensar nas suas ações e nos porquês que as
desencadearam. Noutra perspetiva, a estimulação e o positivismo que advém da figura
do educador têm-se como importantes no processo de formação da criança,
considerados os níveis de bem-estar e reconhecimento que podem surgir.
A importância da partilha assenta na consciencialização das educadoras em
fomentarem este aspeto no grupo, para hodiernamente as crianças o conceberem como
uma referência para a ação em sociedade.
Por fim, não podemos deixar de considerar a ambiguidade que se reveste no
discurso das educadoras ao não relacionar a personalidade e o comportamento social no
delineamento dos objetivos educativos. Na verdade, além de ser um dos objetivos
patentes na Lei-Quadro da Educação-Pré-Escolar (1997), bem como nas OCEPE
(Ministério da Educação, 1997), constitui-se como eixo básico da ação educativa.

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