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sal

Publicação destinada aos profissionais da saúde • ano 7 • nº 19 • julho 2014 • São Paulo • ISSN 2176-8463

Da relevância
histórica às
metas de saúde

Nutrição e pâncreas fisiologia e patologia

19 Saúde cardiovascular influência do café da manhã


Iodo importância e trajetória no Brasil

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editorial

Em sintonia com a sociedade


Ao lado de medidas que visam coibir o aumento mundial na incidência de sobrepeso e obesidade, o combate à
desnutrição na infância persiste como um dos mais urgentes desafios da sociedade contemporânea.

Nesta edição da Nestlé Bio podemos apreciar, por exemplo, como a ingestão adequada de vitamina A diminui a
taxa de cegueira e mortalidade infantil.

Pesquisadores da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo discutem, ainda, como
a fortificação do sal com iodo pode diminuir a prevalência de patologias associadas à ingestão deficiente deste
oligoelemento, sem que haja consumo excessivo de sódio.
Juan Carlos Marroquín
O vínculo do sal com doenças cardiovasculares e o esforço contínuo da Indústria de Alimentos para cumprir
Presidente da Nestlé Brasil
metas estabelecidas em conjunto com organismos internacionais de saúde também são objeto de reflexão.

Todas estas pautas são particularmente importantes à Nestlé. Estimular a alimentação saudável e produzir
alimentos nutritivos (com teores progressivamente menores de sal e açúcar) está no centro de gravidade da
estratégia de crescimento sustentado, com geração de valor compartilhado, de nossa Companhia.

Um exemplo disso é a qualidade singular das Papinhas Nestlé, detalhada nesta edição. E, também, os projetos
vencedores do 3º Prêmio Programa Nestlé Nutrir, Crianças Saudáveis – associados à merenda escolar conquis-
tados por escolas da Rede Pública.

Completam a presente edição um dossiê elaborado por docentes da Faculdade de Medicina da Universidade de
São Paulo, sobre nutrição e o pâncreas e um saboroso passeio gastronômico pela obra de Jorge Amado.

Uma ótima leitura a todos


nestlé

Direção Editorial: Juan Carlos Marroquín, Lilian Miranda e Célia Suzuki


Consultor Editorial: Claudio Galperin
Colaboradores: Juliana Lofrese, Mônica Neves, Roberta Portes, Fabiola Cotrim
Editor: Claudio Galperin Editora Assistente: Maria Fernanda Elias Llanos Jornalista Responsável: Flávia Benvenga (MTb 17.339)
Assistente de Redação: Betina Galperin Edição de Arte e Pré-Media: D’Lippi Comunicação Integrada — (11) 3031.2900 — Direção de Arte: Rosalina Sasaki
Arte Final: Ricardo Lugo Fotografia: Egydio Zuanazzi, Thinkstock e Shutterstock Capa: Shutterstock
Impressão: Matavelli Tiragem: 30.000 exemplares

A revista Nestlé Bio é um produto informativo da Nestlé Brasil destinado a promover pesquisas e práticas no campo da Ciência da Nutrição realizadas no país e no exterior, sob os cuidados de um criterioso processo editorial.
linhada ao histórico papel da Nestlé no apoio à difusão da informação científica, a revista abre espaço para a diversidade de opiniões, que consideramos ser essencial para o intercâmbio de ideias e conceitos inovadores.
As declarações expressas na revista não refletem necessariamente o posicionamento institucional da Companhia com relação aos temas tratados.

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nestlé
ÍNDICE
intercâmbio 04 21 31
Agradeço o envio das edições da palavra calendário dossiê bio
Lilian Miranda, Presidente da Confira os próximos encontros, Dr. André Luís Montagnini e a
Nestlé Bio. A publicação é de suma
Fundação Nestlé Brasil apresenta congressos e simpósios voltados nutricionista Tatiana Oliveira Isamu
importância para o acervo da Biblio- o Programa Nestlé Nutrir para temas ligados à nutrição. publicam a primeira parte do artigo
teca da PUC- CAMPINAS. Crianças Saudáveis. sobre Nutrição e Pâncreas.
Ana
Campinas/SP
22
Sou bibliotecária do Instituto de
nutrição e cultura
36
Ciências da Saúde da Universidade Os sabores da literatura: a cozinha resultado
Federal do Pará. Gostaria de conti- na obra de Jorge Amado. Conheça os projetos vencedores do
nuar recebendo a Nestlé Bio, visto 3º Prêmio Nestlé Nutrir Crianças
Saudáveis.
que a revista é de suma importância
para os discentes desta instituição.
Sandra 08 27
Belém/PA ponto de vista
capa
Iodo: A visão dos pesquisadores do
Sal: conheça suas características
Departamento de Clínica Médica da
Gostaria de dizer que a Nestlé Bio metabólicas e estratégias para a
FMRP-USP sobre a importância da
é uma ferramenta valiosa em meus redução do consumo.
fortificação.
estudos. Sou acadêmica de Nutri-
ção na Universidade Paulista e atuo
junto ao Conselho Regional de Nutri-
42
cionistas 3ª. Região. 28 sabor e saúde
Denise O delicado cozimento no vapor
qualidade
tem capacidade de preservar
Mogi das Cruzes/SP Com um portfólio diversificado,
nutrientes e dispensar o uso de
as Papinhas Nestlé contribuem
gorduras no preparo dos alimentos.
Sou professora de curso técnico em para a formação de hábitos
alimentares saudáveis na infância.
nutrição e utilizo periódicos como
instrumento didático. Parabéns
pela matéria sobre qualidade do 14
sono e obesidade. conhecer
Elisa Vitamina A: No centenário de
sua descoberta, pesquisas
Ituberá/BA
científicas apresentam novas
perspectivas para a saúde.

Aguardamos seus comentários e sugestões


no e-mail nestlebio@nestle.com.br, com
46
seu nome completo, registro profissional, leitura crítica
local de trabalho e cidade de origem. A relação entre o hábito de tomar
Trechos das mensagens poderão ser café da manhã e as doenças
eventualmente publicados. cardiovasculares.

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palavra

por_Flávia Benvenga

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palavra 5

Programa Nestlé Nutrir


Crianças Saudáveis adapta-se
ao cenário brasileiro
É importante ressaltar que o Nestlé Nutrir Crian-
A palavra de Lilian Miranda, ças Saudáveis nasceu a partir de ações do Programa-
Presidente da Fundação de Voluntariado da Nestlé, que, aliás, acontecem até
hoje com a implementação das folias culinárias, isto
Nestlé Brasil é, trabalhos diversos para promover hábitos alimenta-
res saudáveis e o cuidado com o meio ambiente. Essa
atuação ocorre por meio de parcerias com institui-
ções sociais em vários municípios. Nestes 15 anos,
já atingiu 621 voluntários em 21 cidades e 6.200
mantenedores, que contribuem financeiramente para
o programa.
Em 2000, o trabalho do Programa Nestlé Nutrir
O projeto, que está completando 15 anos e in- Crianças Saudáveis foi ampliado. Agregou o programa
veste na educação e no estímulo à atividade física alimentar e nutricional em escolas públicas por meio
para prevenir problemas decorrentes da má alimenta- de capacitações de educadores. Assim, impactou, in-
ção, tem como marca inovar suas práticas para atin- diretamente, 1,9 milhão de alunos, devido ao trabalho
gir as metas. de 17,2 mil educadores – incluindo professores, dire-
Prevenir a obesidade e a desnutrição de crian- tores, coordenadores pedagógicos e merendeiras –,
ças e adolescentes por meio da educação alimentar e em 6,8 mil escolas públicas de todo o Brasil.
da atividade física é o objetivo principal do Programa
Nestlé Nutrir Crianças Saudáveis, concebido há 15
anos pelos colaboradores da companhia. De 1999 até
a hoje, muitos frutos foram colhidos, graças à cons-
tante adaptação às necessidades do país.
“O conteúdo do programa sempre acompanhou
o cenário do Brasil e as principais questões nutricio-
nais da população”, conta Lilian Miranda, Presidente
da Fundação Nestlé Brasil. “Quando foi criado, havia
um sério problema relacionado à desnutrição infantil.
Hoje, o foco está na prevenção e no combate à obesi-
dade de crianças e adolescentes.”

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6 palavra

Como a inovação é uma das características do 15 anos após a criação, como o programa atua hoje
programa, em 2008, em parceria com o Instituto Fer- para estimular a alimentação saudável de crianças e
nanda Keller, em Niterói (RJ), o Nestlé Nutrir Crianças adolescentes?
Saudáveis desenvolveu o formato de prevenção qua- O Nestlé Nutrir Crianças Saudáveis promove a
lificada. Trata-se de um trabalho em que as crianças boa alimentação e a atividade física para crianças e
que frequentam a entidade passam por avaliação an- adolescentes em idade escolar. Para isso, utilizam-se
tropométrica, participam de atividades pedagógicas diferentes estratégias em cada pilar de atuação —edu-
de educação alimentar e nutricional, atividades físicas, cação, nutrição e atividade física. Nas escolas públicas,
além de receber um acompanhamento individual quan- o programa busca o envolvimento de toda a comunidade
do necessário. O projeto foi tão bem-sucedido que, em escolar na promoção da importância da alimentação nu-
2012, o modelo foi posto em prática em mais três ins- tricional e educacional e da prática regular de atividade
tituições: Casa do Zezinho, em São Paulo, Instituto Bola física. Já em ONGs, uma equipe capacitada acompanha
pra Frente, no Rio de Janeiro, e Bairro da Juventude, em a criança para garantir que ela esteja recebendo o trata-
Criciúma (SC). mento e a atenção de que necessita.
Além disso, hoje, o Nestlé Nutrir Crianças Saudá-
veis integra o programa global da companhia na pre- O que mudou no programa, do seu nascimento, para
venção da obesidade infantil. “A experiência adquirida hoje?
com a atuação no Brasil contribuiu para a criação do O conteúdo do Nestlé Nutrir Crianças Saudáveis
Nestlé Healthy Kids Global Programme, presente em sempre acompanhou o cenário do Brasil e as principais
mais de 60 países”, observa a Presidente, que, na en- questões nutricionais da população. Quando foi criado,
trevista a seguir, explica com detalhes esse trabalho havia um sério problema relacionado à desnutrição
que inspira adultos, crianças e adolescentes a adotar infantil. Com o passar do tempo, esse quadro foi mu-
uma vida saudável. dando e, atualmente, nosso foco está na prevenção e
combate à obesidade de crianças e adolescentes.
Ao longo desses anos, o programa também expan-
Atualmente, o foco do Nestlé Nutrir diu a forma como atua na sociedade e passou a agir em
três novas frentes: capacitação de educadores de es-
está na prevenção da obesidade de colas públicas, combate à obesidade e desnutrição em
crianças e adolescentes organizações não governamentais e parceria com o IAAF
(Associação Internacional de Federações de Atletismo).
Além disso, o pilar atividade física ganhou força e vem
sendo trabalhado paralelamente à educação nutricional.

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palavra 7

Na prática, o que o Nestlé Nutrir Crianças Saudáveis


faz para combater a obesidade?
Os três pilares – educação, nutrição e atividade
física – são abordados de diferentes formas em cada
uma das frentes do programa. O Nestlé Nutrir Crianças
Saudáveis, em parceria com o IAAF, por exemplo, visa
levar a prática do atletismo a todos os alunos entre 6
e 12 anos matriculados na rede pública de ensino. O
projeto orienta os educadores físicos de escolas públi-
cas de forma minuciosa sobre como deve ser a aborda- O conteúdo do Nutrir sempre acompanhou
gem com os alunos para que o atletismo seja atraente,
acessível e instrutivo. o cenário do Brasil e as principais
questões nutricionais da população
Quais as principais dificuldades do Programa Nestlé
Nutrir Crianças Saudáveis?
Promover a conscientização sobre a importância devem ser levados à sociedade não apenas em forma
de uma alimentação saudável é sempre um desafio de produtos, mas também por meio de investimento
com resultados de longo prazo, pois requer mudança de social. É por isso que tem como diretriz criar e compar-
comportamento não só da criança e do adolescente em tilhar valor em toda a sua cadeia de negócio, principal-
questão, mas de toda a família, que terá de alterar hábi- mente nas comunidades em que está presente.
tos alimentares e inserir a prática de exercícios físicos
em suas rotinas. É por isso que, nas instituições em que Como funciona o Nestlé Healthy Kids Global Programme,
está presente, o Nestlé Nutrir Crianças Saudáveis traba- do qual o Nestlé Nutrir Crianças Saudáveis faz parte?
lha tanto a teoria como a prática, a fim de sensibilizar a Trata-se de um programa global da companhia,
comunidade e promover essa mudança de hábitos. presente em 60 países, que tem como objetivo aumen-
tar o conhecimento sobre nutrição e saúde e promover
Quais as principais vitórias? a atividade física entre as crianças em idade escolar
O programa tem muitas histórias de sucesso. Nas em todo o mundo. No final de 2013, o Healthy Kids tra-
escolas, os projetos vencedores do Prêmio Nutrir são balhava ativamente com mais de 280 parceiros em 68
exemplos concretos do que é ensinado por nossos capa- países. Nesse mesmo ano, o programa alcançou 6,9
citadores aos educadores (veja a reportagem na pág. 36). milhões de crianças.
Nas organizações sociais, vemos que algumas O Nestlé Healthy Kids Global Programme foi lan-
crianças de fato passam a incorporar uma melhor ali- çado em 2009, enquanto que o Nestlé Nutrir existe no
mentação e a praticar atividade física, revertendo até país desde 1999, por meio da atuação voluntária dos
doenças em estágios iniciais, como aconteceu com colaboradores. Dessa forma, o programa no Brasil teve
um menino atendido pelo Nutrir no Instituto Fernanda a oportunidade de compartilhar sua experiência, que
Keller. foi levada em consideração para a criação do programa
global da Nestlé.
Qual a importância do Programa Nestlé Nutrir Crian-
ças Saudáveis para a Nestlé?
A Nestlé é uma empresa de nutrição, saúde e
Assista ao vídeo que mostra as atividades realizadas pelo
bem-estar. Sendo assim, acredita que esses conceitos Nestlé Nutrir Crianças Saudáveis no Instituto Fernanda Keller.

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foco

por_Maria Fernanda Elias

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Sal Sem saber que o produto poderia ser fa-


cilmente encontrado em quase todo o planeta,
nações guerrearam durante séculos pelo seu do-
mínio. De acordo com pesquisadores, é possível,
inclusive, acompanhar os avanços da humanidade,
observando-se o papel do sal ao longo da história.
Indícios sugerem que as técnicas para ex-
trair o sal da natureza pela evaporação da água
Considerado o
primeiro artigo
de comércio
internacional, o
sal já foi motivo de
verdadeira obsessão
em diferentes cantos
do mundo

Até mesmo as civilizações que estavam longe do mar foram


capazes de desenvolver técnicas para obter o valioso cristal. Os
celtas, por exemplo, adotaram a mineração ao procurar sal sob o
solo em 1.300 a.C.
Se em um primeiro momento, o sal foi enaltecido como
elemento culinário – responsável por promover novas experiên-
cias gustativas – é importante lembrar que, sem ele, não seria
possível estocar uma série de alimentos em um mundo sem refri-
do mar já eram utilizadas na Índia, 7.000 a.C. Mas, geradores. Altas concentrações salinas inibem a proliferação de
foram os chineses que, um século mais tarde, in- microorganismos, conservando o alimento em boas condições de
troduziram a produção de sal como um negócio de consumo por um tempo maior.
grandes proporções, fervendo a água do mar em Logo, a ganância de alguns governantes fez com que a ex-
vasilhas de barro para obtenção dos cristais [1]. tração do sal se tornasse monopólio estatal, onde todo o rendi-
O processo se espalhou pelo mundo ociden- mento era reservado aos cofres reais. O exemplo mais importante
tal atingindo o Império Romano, onde o sal passou é o do Império Britânico que, desde o século XVIII, dominou boa
a ser alvo da política de “pão e circo” dos Césares. parte do território ocupado hoje pela Índia. Mahatma Gandhi foi
O produto era subsidiado para que não faltasse ao responsável, em 1930, por difundir que era absurda a ideia de pa-
povo e aos legionários, que chegavam a ser remu- gar aos colonizadores por algo que a natureza fornecia de graça à
nerados em sal. Daí a origem das palavras “salário”, população. O episódio foi um dos catalisadores da independência
“soldo” e “soldado” (aquele que é pago com sal) [1]. indiana, que se confirmaria em 1949 [1].

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10 foco

A história mostra também que o dinheiro obtido nos camposde ex-


tração salina foi responsável pela origem de muitas cidades, cluindo Roma,
Veneza e Salzburgo ("castelo de sal”, em português), além de possibilitar a
construção da grande muralha da China.
No início do século XX, as técnicas de mineração subterrâneas garan-
tiram o acesso a fontes de sal ainda inexploradas, o que ampliou a oferta do
produto e minimizou as disputas entre os povos.

Aspectos metabólicos
Na atualidade, dificilmente se encontra uma mesa sem saleiro, ou
um cozinheiro que poderia viver sem uma “pitada de sal”. O sódio e o cloro absorvidos permanecem nos com-
O sal (ou sal de cozinha) é o nome popular do cloreto de sódio, partimentos extracelulares (plasma e fluido intersticial)
o composto químico formado por 40% de cátion sódio (Na+) e 60% de e uma pequena quantidade nos compartimentos intrace-
ânion cloro (Cl-). Esse íons, juntamente com o potássio, exercem papel lulares, como nos músculos, por exemplo [3].
importante na manutenção da pressão osmótica e do equilíbrio hídrico O balanço de sódio e cloro no organismo é regido,
e ácido- -básico do organismo [2]. ainda, por uma série interações hormonais que incluem
Além disso, o sódio é essencial para transmitir os impulsos nervo- o sistema renina-angiotensina-aldosterona, o peptídeo
sos, estimular a ação muscular e participar do transporte ativo de subs- atrial natriurético e o sistema calicreína-quinina, direta-
tâncias por meio das membranas celulares, como a absorção da glicose mente associados com a regulação da pressão arterial e
no intestino delgado. Ele é o cátion mais abundante no líquido extracelular do volume sanguíneo [3,4].
do corpo humano [3].
O cloro, por sua vez, é fundamental para a produção de ácido clo- Influência na saúde
rídrico (HCl), secretado no suco gástrico – fundamental para manter a O organismo humano tem demonstrado a capacidade
acidez do estômago e ativação de enzimas durante o processo digestivo. de sobreviver a extremos de ingestão de cloreto de sódio,
A absorção do sódio e do cloro (predominantemente como cloreto com evidências de populações que consomem desde 0,2
de sódio) ocorre principalmente no intestino delgado, sendo equivalente g (10 mmol) por dia, como os índios Yanomami do Brasil, a
à 98% da quantidade consumida. Amplamente encontrados nas natureza, mais de 10,3 g (450 mmol) por dia no norte do Japão [4,5].
suas principais fontes são o leite, as carnes, os frutos do mar, os ovos e Devido à insuficiência de dados de estudos dose-
vegetais como cenoura e beterrabas. O sódio também é consumido como -resposta, as EARs (Estimated Average Requirement) e
bicarbonato de sódio, glutamato monossódico, fosfato de sódio e outros as RDAs (Recommended Dietary Allowance) não pude-
ingredientes utilizados na produção dos alimentos industrializados [2,3]. ram ser estabelecidas para sódio e cloro. A AI (Adequate
A maior parte da excreção do cloreto de sódio se dá por meio da uri- Intake) foi estabelecida em 1,5 g (65 mmol) por dia de
na, quando o suor não é excessivo. Em indivíduos saudáveis, essa quanti- sódio para adultos jovens (3,8 g de cloreto de sódio),
dade é praticamente igual à ingerida, já que o rim tem capacidade de filtrar para assegurar que a dieta total possibilite uma ingestão
cerca de 25.000 mmol de sódio por dia e reabsorver 99% do filtrado [4]. adequada dos outros nutrientes, assim como, cobrir as
A excreção pela pele aumenta quando há transpiração profusa, cau- perdas de sódio. A AI para cloro foi determinada em ní-
sada por grande esforço físico e/ou altas temperaturas. O suor profuso vel equivalente aos valores molares de sódio: 2,3 g (65
pode causar perdas de mais de 350 mEq de sódio. mmol) por dia de cloro para adultos jovens [4,5].

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foco 11

Devido à insuficiência de dados, as EARs e as RDAs não puderam ser


estabelecidas para sódio e cloro

A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda uma ingestão Foi estabelecida uma relação linear significativa
diária para adultos de, no máximo, 5 g de sal. Para crianças e adoles- entre a excreção urinária de sódio e a pressão sanguínea
centes, os limites máximos de consumo de sódio e sal são ainda meno- sistólica (p<0,01) nos 52 centros. Em análises de corte
res, visto serem populações mais vulneráveis. A redução do consumo transversal, observou-se relação significativa entre sódio
nessas faixas etárias precoces representa melhoria da saúde cardíaca e valores crescentes de pressão sanguínea com a idade
na vida adulta. Nas últimas décadas, contudo, o consumo de cloreto de em todas as populações estudadas.
sódio na maioria dos países permanece excessivo, variando de 9 a 12 g Além disso, a literatura aponta uma associação en-
por pessoa por dia [6]. tre o consumo excessivo de sódio e o desenvolvimento
O maior efeito adverso da ingestão aumentada de cloreto de sódio é a de doenças crônicas, incluindo câncer e osteoporose.
elevação da pressão sanguínea, um fator de risco estabelecido para doen- Estudos mais recentes sugerem haver correlação entre
ças cardiovasculares e renais. De modo geral, a pressão sanguínea aumenta o consumo de sal, obesidade e inflamação, independente
progressivamente com o incremento do consumo de cloreto de sódio [7,8]. do teor energético da dieta [4, 13].
Diversos estudos de metanálise de pesquisas clínicas foram conduzi- Um artigo publicado no jornal Pediatrics, em
dos para analisar os efeitos da ingestão de sódio sobre a pressão arterial. 2014, avaliou 766 adolescentes saudáveis com con-
Essas metanálises foram capazes de fornecer evidências consistentes de sumo diário de sódio acima de 1.500 mg. Os resulta-
que diminuir a ingestão de sódio reduz as pressões sistólicas e diastólicas dos da pesquisa apontaram alto nível de leptina entre
em indivíduos hipertensos. A magnitude dessa redução em indivíduos nor- os adolescentes. A leptina é um hormônio produzido
motensos, no entanto, foi menos consistente. pelos adipócitos, responsável pela saciedade e quei-
Os resultados das três maiores metanálises (Cutler 1997; Graudal ma de gordura, mas em níveis cronicamente eleva-
1998; Midgley, 1996) demonstraram que as reduções médias nas pres- dos pode exercer efeitos opostos. Além disso, esses
sões sistólica/diastólica por diminuição de 100 mmol (2,3g) de sódio diário adolescentes com ingestão elevada de sódio também
excretado em indivíduos hipertensos foram de 5,8/2,5; 3,3/1,6; e 3,7/0,9 apresentaram altos níveis de fator de necrose tumoral
mm Hg, respectivamente. Por outro lado, as reduções correspondentes alfa (TNF-a), uma citocina que contribui para o proces-
nas pressões sistólicas/ diastólicas em indivíduos normotensos foram de so de inflamação crônica e doenças autoimunes como
2,3/1,4; 0,8/0,2; e 1,0/0,1 mm Hg, respectivamente [9, 10, 11]. lupus e artrite reumatóide [13].
Um dos mais relevantes estudos epidemiológicos observacionais —
que explorou a relação entre a ingestão de sódio e a pressão arterial — foi
conduzido em 52 centros de pesquisas localizados em 32 países. O sódio
urinário, a pressão sanguínea e outras variáveis potencialmente relevantes
que poderiam confundir o experimento foram medidas em 10.079 homens e
mulheres, entre 20 e 59 anos, de diversas regiões geográficas com variação
substancial na ingestão de sódio [12].
Após realizados os ajustes para idade e sexo, a excreção de sódio e a pres-
são sistólica foram positivamente associadas em 39 dos 52 centros (com sig-
nificância estatística em 15) e negativamente associadas em 15 centros (com
significância estatística em 2). A pressão diastólica foi associada positivamente
com a excreção de sódio em 33 centros (com significância estatística em 4) e
associada negativamente em 19 centros (com significância estatística em 6).

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12 foco

O Ministério da Saúde tem coordenado estratégias


nacionais visando a redução do consumo de sódio

Cenário brasileiro
As Pesquisas de Orçamentos Familiares (POF) de 2002–03 e
2008–09, estimaram uma ingestão média de cloreto de sódio de cerca
de 12 g por pessoa por dia (equivalente a 4.700 mg de sódio). Análises
do consumo alimentar pessoal mostraram que mais de 70% da popula-
ção ingeria sódio em excesso (acima de 2.000 mg ao dia) e que mais
de 90% dos adultos e adolescentes de 14 a 18 anos de idade nas áreas
urbanas ultrapassava esse limite diário [14, 15].
De acordo com as mesmas pesquisas, a aquisição domiciliar anual
de cloreto de sódio caiu de 2,98 para 2,47 kg per capita. Simultaneamente,
a participação da alimentação fora do domicílio nas despesas familiares au-
mentou para um terço do total dos gastos alimentares, e a participação dos
alimentos processados cresceu em todos os estratos de renda [14,15]. do sal); 2) realização de ações educativas e informa-
Dados do Ministério da Saúde reforçam que a hipertensão arterial tivas para profissionais de saúde, manipuladores e fa-
possui grande importância epidemiológica no Brasil, sendo que 23,3% bricantes de alimentos e população; e 3) reformulação
da população adulta residente nas capitais brasileiras referiram diag- dos alimentos processados.
nóstico médico de hipertensão arterial em 2010. Além disso, estima-se Com relação aos alimentos processados, estabe-
que aproximadamente 35% dos brasileiros com 40 anos ou mais sejam leceu- se um termo de cooperação entre o Ministério da
hipertensos. As doenças do aparelho circulatório representaram 29,4% Saúde e a Associação Brasileira das Indústrias de Ali-
dos óbitos totais no Brasil, em 2007, sendo a doença hipertensiva so- mentação (ABIA), em 2007, para com o objetivo prin-
zinha responsável por 3,7% da mortalidade geral naquele ano [16, 17]. cipal de trabalhar propostas de reformulação de produ-
O Ministério da Saúde tem coordenado estratégias nacionais visando tos. As reduções de sódio nos alimentos são discutidas
redução do consumo de sódio, com ações articuladas a planos setoriais como individualmente para cada categoria, estabelecendo-se
o Plano Nacional de Saúde 2012–2015 e o Plano de Ações Estratégicas para metas bianuais de diminuição dos limites máximos,
o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não-Transmissíveis no Brasil 2011– que são formalizadas por meio de termos de compro-
2022. Entre as principais estratégias encontram-se a redução voluntária do misso assinados entre o governo e representantes das
conteúdo de sódio de alimentos processados e a realização de campanhas indústrias de alimentos [18].
de mídia para a promoção de hábitos alimentares saudáveis, que, segundo Está prevista ainda uma redução gradual e vo-
estimativas da OMS, poderiam evitar 2,5 milhões de mortes e poupar bilhões luntária, tendo em vista aspectos que incluem o de-
de dólares aos sistemas de saúde no mundo [8,18]. senvolvimento de novas tecnologias e formulações e
A agenda é reforçada pelo envolvimento das principais agências in- a adaptação do paladar dos consumidores, permitindo
ternacionais, com destaque para a Força-Tarefa para a Redução do Consu- a avaliação de cada etapa do plano, discussão dos re-
mo de Sódio nas Américas (coordenada pela Organização Pan-Americana da sultados, avanços e dificuldades e, se necessário, com
Saúde -OPAS). Um dos principais produtos da Força-Tarefa é uma declaração base nos dados do monitoramento, revisão das metas.
política que estabelece o compromisso dos países da região com a redução Além de conferir sabor aos alimentos e preparações, o
do consumo de sal para menos de 5 g ao dia até 2020 [19]. sódio participa de processos vinculados a segurança
As ações estratégias foram definidas sobre 3 eixos: 1) promoção sanitária e, também, associados com a textura e estru-
da alimentação saudável (particularmente no que tange ao uso racional tura dos produtos.

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foco 13

O monitoramento das atividades de redução é efe- Compromisso Nestlé


tuado pelo levantamento da rotulagem nutricional dos Em linha com seu compromisso de Nutrição, Saúde e Bem-Estar,
alimentos, da evolução de utilização dos principais in- a Nestlé possui um rígido controle de qualidade e segurança de seus
gredientes com sódio (sal e aditivos) pelas indústrias produtos, acompanhado também de um sistema de análise do perfil
e por análise laboratorial dos produtos. nutricional, o Nestlé Nutritional Profiling System (NNPS). O NNPS foi de-
O primeiro produto trabalhado nessa estratégia senvolvido pelo Nestlé Research Center e é constantemente atualizado
foi o pão francês, um dos alimentos mais consumidos a fim de estar alinhado às recomendações dos principais órgãos de saú-
pela população brasileira, e, consequentemente, um de locais e globais, como a Organização Mundial da Saúde, o Institute of
dos principais contribuintes para a ingestão de sódio. Medicine e o Ministério da Saúde.
Como metas finais de redução para 2020, espera-se Todo o portfólio Nestlé é avaliado periodicamente por este siste-
que sejam alcançados níveis mínimos de sódio nos produ- ma, que baseia planos de ação para adequação e evolução nutricional
tos, tendo por referência valores iguais ou menores para as dos produtos, levando em consideração os limites mínimos e máximos
categorias em outros países (como o Reino Unido e Cana- para cada categoria e faixa etária, para os nutrientes sensíveis para a
dá), sempre que houver correspondência entre as catego- saúde pública, incluindo sódio.
rias de alimentos, ou os valores mínimos de sódio em cada O plano desenvolvido para a redução do sódio em produtos culi-
categoria de alimento na linha de base brasileira [18,19]. nários, por exemplo, obteve como resultados a redução de 149,95
Vale destacar, ainda, a parceria com setores vare- toneladas do sal em produtos como temperos, sopas, caldos e linhas
jistas (associações de supermercados) como estratégia Lámen, entre 2010 e 2011. Por meio do rebalanceamento das receitas
inovadora para a promoção da saúde, promovendo infor- e substituição de ingredientes realizados de forma gradual, obteve-se
mações diretas aos consumidores sobre os riscos do con- uma redução de 28%, 16% e 5%, de sódio, respectivamente em sopas,
sumo alimentar excessivo e escolhas mais saudáveis. Lámen e Caldos MAGGI®.
A implementação do plano em conjunto, pelos Em 2012, esse compromisso foi reforçado pela Nestlé com a
setores público e privado, reforça o compromisso do atualização da política para redução do conteúdo de sódio. Os níveis
governo e da sociedade com a redução do consumo de do mineral serão reduzidos em 10%, em média, nos produtos com alto
sódio pela população brasileira e o papel do país como conteúdo de sódio (como refeições prontas ou em porções individuais,
referência regional no tema. sopas, molhos, e misturas para receitas) ao final de 2015.

Conheça o relatório do Institute of Medicine que avalia as evidências


sobre a ingestão de sódio.

[1] Kurlansky M. Salt, a World History. London: Penguin Books, 2003. [2] Cozzolino SMF. Biodisponibilidade de nutrientes. Barueri: Manole, 2009. [3] Oh MS & Uribarri J. Electrolytes,
REFERÊNCIAS water and acid-base balance. In Shills ME et al. Modern Nutrition in Health and Disease. Wiliams and Wilkins, 2005. [4] National Research Council. Dietary Reference Intakes for Water,
Potassium, Sodium, Chloride, and Sulfate. Washington, DC: The National Academies Press, 2005.[5] National Research Council. Sodium Intake in Populations: Assessment of Evidence.
Washington, DC: The National Academies Press, 2013.[6] Brown IJ et al. Salt intakes around the world: implications for public health. Int J Epidemiol. 2009;38(3):791–813. [7] World
Health Organization (WHO). Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases. Report of a Joint WHO/FAO Expert Consultation. Genebra: World Health Organization; 2003. [8] World
Health Organization (WHO). Creating an enabling environment for populationbased salt reduction strategies: report of a Joint Technical Meeting held by WHO and FSA/UK. Genebra:
World Health Organization; 2010. [9] Cutler JA et al. Randomized trials of sodium reduction: An overview. Am J Clin Nutr 65:643S–651S; 1997. [10] Graudal NA et al. Effects of sodium
restriction on blood pressure, renin, aldosterone, catecholamines, cholesterols, and triglyceride. A meta-analysis. J Am Med Assoc 279:1383–1391; 1998. [11] Midgley JP et al. Effect of
reduced dietary sodium on blood pressure: A meta-analysis of randomized controlled trials. J Am Med Assoc 275:1590–1597; 1996. [12] Rose G et al. Intersalt: An international study
of electrolyte excretion and blood pressure. Results for 24 hour urinary sodium and potassium excretion. Br Med J 297:319–328; 1988. [13] H. Zhu et al. Dietary Sodium, Adiposity, and
Inflammation in Healthy Adolescents. PEDIATRICS, 2014. [14] Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008– 2009 – Aquisição alimentar
domiciliar per capita. IBGE; 2010. [15] Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008–2009 – Análise do consumo alimentar pessoal no Brasil.
IBGE; 2011. [16] Molina MCB et al. Hipertensão arterial e consumo de sal em população urbana. Rev Saude Publica. 37(6):743–50; 2003. [17] Brasil, Ministério da Saúde, Secretaria
de Vigilância à Saúde, Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Vigitel Brasil 2010: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico.
Brasília: Ministério da Saúde; 2011. [18] Nilson EAF et al. Iniciativas desenvolvidas no Brasil para a redução do teor de sódio em alimentos processados. Rev Panam Salud Publica.
34(4):287–92; 2012. [19] Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS). Recomendações para políticas nacionais: prevenção das doenças cardiovasculares nas Américas através da
redução do consumo de sal para toda a população. OPAS; 2010.

[1] Kurlansky M. Salt, a World History. London: Penguin Books, 2003. [2] Cozzolino SMF. Biodisponibilidade de nutrientes. Barueri: Manole, 2009. [3] Oh MS & Uribarri J. Electrolytes,
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conhecer

por_Mariana Azevedo

Vitamina A No centenário de sua descoberta,


pesquisas científicas reforçam a
importância de programas para
combater a hipovitaminose A

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conhecer 15

Ela está no pão com manteiga da padaria e no foi Intitulado “The Necessity of Certain Lipins in the
gras do restaurante francês. No alimento fortificado e Diet During Growth”, o artigo mostrava que certos com-
no creme do dermatologista. postos presentes em gorduras animais – e não apenas
Está na boca do povo, literalmente desde os pri- o lipídeo por si só – eram indispensáveis para o cresci-
mórdios da história da alimentação – não é a toa que mento normal de ratos de laboratório.
povos caçadores primitivos dão especial valor às vís- Como desdobramento da descoberta, estudos
ceras dos animais que abatem para comer –, mas só começaram a associar a deficiência de vitamina A em
ganhou nome e sobrenome há um século. crianças a atraso no crescimento, xeroftalmia, ceguei-
E que nome: vitamina é formada pelo prefixo ra e baixa imunidade.
“vida”, em latim, e a noção de que micronutrientes A importância da vitamina A para a visão foi
eram determinantes para o crescimento e a sobrevi- destrinchada pelo bioquímico americano George Wald
vência humana – em outras palavras, vitais – foi uma (1906-1997). Suas pesquisas sobre os mecanismos
revolução na ciência da nutrição. moleculares que ocorrem na retina e o papel da vitami-
A ideia de que os chamados “fatores acessórios” na centenária nesse processo lhe renderam o prêmio
eram tão necessários quanto gorduras, proteínas e Nobel de Fisiologia ou Medicina em 1967 (3).
carboidratos para a saúde só se popularizou no Oci-
dente no início do século 20 (1). Entre 1912-1914, a
ciência moderna identificou os primeiros desses fato-
res, agora considerados vitais, as vitaminas A e B1.
Os bioquímicos americanos Elmer V. McCollum
(1879-1967) e Marguerite Davis (1887-1967), da Uni- O bioquímico americano
versidade de Wisconsin-Madison, foram os responsá-
veis por isolar pela primeira vez a substância lipossolú- George Wald pesquisou os
vel que, posteriormente, foi nomeada como vitamina A.
Os pesquisadores usaram letras para identificar George Wald
mecanismos moleculares
a substância porque, na época, sua estrutura ainda
não tinha sido determinada para receber nomenclatu-
que ocorrem na retina e o
ra química. papel da vitamina A
Em 1913, McCollum e Davis publicaram o artigo
“fundador” da vitamina A no periódico “The Journal of
Biological Chemistry”, da American Society for Bioche-
mistry and Molecular Biology. (2)

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16 conhecer

Força milenar
Mas a história da vitamina remonta há muitos sé-
culos antes de sua descoberta, há 101 anos.
Em um papiro egípcio de cerca de 1.500 a.C.,
consta a recomendação de se usar fígado bovino para
a cura de uma doença da visão (4).
À luz da ciência moderna, o “tratamento” sugeri-
do é ineficaz: a indicação era colocar o bife sobre o olho
do paciente, quando hoje se sabe que a ação da vitami-
na A na visão é sistêmica.
Mas relacionar a cura de um mal da visão com
um dos alimentos mais ricos em vitamina A é altamen-
te sugestivo de que esse povo da Antiguidade tinha ao
menos uma intuição da relação entre substâncias en-
contradas nos alimentos (no caso, o micronutriente) e Estratégia A
seu efeito em um órgão específico. O combate à desnutrição infantil e, especifica-
A relação da deficiência da vitamina A com a ce- mente, a suplementação de vitamina A e zinco estão
gueira noturna (e outras doenças) também foi perce- entre as estratégias propostas pelo Consenso de Co-
bida na Antiguidade Grega. penhagen de 2008 (6) para solucionar os dez maiores
Em um dos livros da obra deixada por Hipócrates desafios mundiais.
e seus discípulos (5) encontra-se a recomendação de A organização reúne especialistas do mundo todo
se tratar crianças afetadas por cegueira noturna com para discutir os programas com melhor relação custo/
uma dieta de fígado cru. No livro também há o comen- benefício a serem adotados por governos e ONGs.
tário de que crianças com esse problema de visão são Segundo a Micronutrient Iniciative (MI), a suple-
as que sofrem de outras doenças infecciosas. mentação de vitamina A duas vezes ao ano em popula-
A relação é fácil de ser entedida hoje, quando se ções subnutridas reduz de 12% a 23% a taxa de mortali-
sabe que a deficiência de vitamina A está relacionada à dade infantil e em até 70% a cegueira em crianças (7).
desnutrição em geral o que, consequentemente, causa A MI é uma organização mundial com base no Ca-
baixa imunidade. nadá que trabalha com instituições como a OMS e a Uni-
cef para combater a deficiência de vitaminas e minerais
em populações vulneráveis.
A eficácia da suplementação semestral de vitami-
na A em crianças subnutridas foi provada em várias pes-
A relação da deficiência de vitamina A com quisas populacionais. Entre as mais importantes, estão

a cegueira noturna (e outras doenças) foi as do oftalmologista e epidemiologista Alfred Sommer,


da Universidade Johns Hopkins.
percebida na Antiguidade Grega No centenário da descoberta da vitamina A, no ano
passado, Sommer publicou um artigo no JAMA Ophtalmo-
gy, da Associação Médica Americana (1), mostrando por
que os benefícios da suplementação superam os efeitos na
redução da cegueira – que já são extraordinários – e a im-
portância de programas para combater a hipovitaminose A.

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conhecer 17

Estudos conduzidos pelo oftalmologista na Ásia,


por exemplo, mostraram que a vitamina A reduz signi-
ficativamente a mortalidade infantil em geral, além de
reduzir a letalidade do sarampo.
Em um estudo feito em Sumatra (Indonésia), as
mortes de crianças entre seis meses e cinco anos foram
reduzidas em 30%. O estudo foi controlado: crianças de
250 vilarejos receberam a suplementação e o índice de
mortalidade foi comparado ao de outros 250 vilarejos em
que a população infantil não recebeu doses de vitamina A.
Recentemente, foi encontrada a primeira
Estudos feitos na África também mostraram uma evidência direta entre a deficiência de
relação direta entre as vitamina A e a redução de mortes
por sarampo em criança. vitamina A durante a gravidez e a asma
A Fundação Cochrane revisou oito estudos contro-
lados e randomizados sobre o tratamento com vitamina
A em crianças com sarampo (8).
Foi concluído que a suplementação de 200.000 UI Em 2011, o British Medical Journal publicou um
da vitamina por dois dias consecutivos é realmente efi- trabalho feito pelo epidemiologista Evan Mayo-Wilson,
caz para reduzir a morte por sarampo de crianças com na Univerdade de Oxford (Reino Unido), Aamer Imdad, no
menos de dois anos, além de diminuir a mortalidade in- Hospital Universitário Aga Khan (Paquistão), e colegas
fantil por pneumonia e por todas as causas. que revisou e analisou 43 pesquisas incluindo 215.633
Outra meta-análise, publicada no International crianças de vários países. (10)
Journal of Epidemiology, analisou seis estudos contro- Destas, 17 pesquisas incluindo 194.483 parti-
lados e randomizados e concluiu que duas doses de cipantes mostraram a redução de 24% nas mortes por
100.000 UI em crianças até dois anos e de 200.000 UI todas as causas e de 28% nas mortes associadas à
em crianças maiores reduzem a mortalidade por saram- diarreia em crianças, além da redução significativa de
po em 62% (9). cegueira e xeroftalmia.
Na conclusão, os autores afirmam que a suple-
mentação de vitamina A deve ser dada a todas as crian-
ças em risco nutricional, especialmente em países de
baixa ou média renda. Eles acrescentam que são neces-
sários mais estudos para avaliar a eficácia de diferentes
dosagens e as melhores formas de disponibilizar a vita-
mina (como a fortificação de alimentos).
Recentemente, também foi encontrada a primeira
evidência direta entre a deficiência de vitamina A duran-
te a gravidez e a asma (11).
Uma pesquisa feita no Centro Médico da Universi-
dade Columbia mostrou que um déficit desta vitamina
na fase em que o pulmão do bebê está se formando pro-
voca alterações na musculatura lisa das vias respirató-
rias que levam ao quadro asmático no decorrer da vida.

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18 conhecer

Boas fontes
Nos alimentos, a vitamina A pode ser encontrada
de duas maneiras: pré-formada (retinol), pronta para ser
usada pelo organismo, ou em precursores, carotenoides
que são convertidos pelo corpo na vitamina (13).
Fígado, em especial, e outras vísceras animais,
gema de ovo, leite e derivados são as principais fontes
de vitamina A “pronta para o uso”.
Frutas e legumes amarelos e alaranjados (manga,
mamão, goiaba vermelha, cenoura, abóbora) e vegetais
verde-escuro (espinafre, couve, chicória) são as gran-
des fontes dos carotenoides precursores.
Alguns frutos de palmeira e seus óleos também
são muito ricos em vitamina A: dendê, buriti, pequi, pu-
Cristais de vitamina A punha, tucumã. (14).
Um bife de fígado de 85 g tem 22,175 UI de vitami-
na A. Meia xícara de espinafre cozido oferece 11,458 UI
No Brasil da vitamina e meia xícara de cenoura crua, 9,189 UI (15).
A deficiência de vitamina A é considerada um
problema de saúde pública no país (12). A Pesquisa
Nacional de Demografia e Saúde da Criança e da Mu-
Teores de vitamina A em diferentes alimentos
lher (PNDS-2006) identificou que 17,4% das crianças e
12,3% das mulheres brasileiras apresentam níveis ina-
dequados da vitamina.
As maiores prevalências da deficiência em crian-
ça foram observadas nas regiões Sudeste (21,6%) e
Nordeste (19%). Em mulheres, a maior prevalência tam-
bém está no Sudeste (14%), seguida por Centro-Oeste
(12,8%) e Nordeste (12,1%).
Desde 2005, o Ministério da Saúde realiza o Progra-
ma Nacional de Suplementação de Vitamina A, que atual-
mente cobre todas as regiões consideradas de risco do
país. O programa prevê a suplementação de megadoses
de vitamina A para crianças de 6 a 59 meses e mulheres
no pós-parto. As doses de 100.000 UI e 200.000 UI são Um bife de fígado Meia xícara de Meia xícara de
distribuídas na forma líquida (diluída em óleo de soja e de 85 g espinafre cozido cenoura crua
acrescida de vitamina E) e em cápsulas.
Também faz parte do programa incentivar o alei-
tamento materno até os seis meses (no caso de mães
22,175 UI 11,458 UI 9,189 UI
que não têm deficiência nutricional, o leite materno su-
pre todas as necessidades do bebê) e orientar sobre o
consumo de alimentos ricos em vitamina A.

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conhecer 19

Estudos também mostram que tanto o uso sistê-


mico da vitamina A como o tópico, com retinoides sinté-
ticos (isotretinoína, por exemplo), são teratogênicos na
superdosagem (17, 18).
Carotenoides precursores de vitamina A não mos-
traram efeito teratogênico. Mas pesquisas do Grupo de
Estudos sobre Alfa-tocoferol Betacaroteno na Prevenção
do Câncer alertam para a possibilidade de a suplemen-
tação ter efeito adverso na prevenção de câncer de pul-
mão em fumantes (19).

Perspectivas
Vários estudos têm examinado o papel antican-
cerígeno da vitamina A. No caso de câncer de pulmão,
como no trabalho do Grupo de Estudos sobre Alfa-tocofe-
rol Betacaroteno, os resultados são inconclusivos.
Mas, por causa do papel desta vitamina na regu-
lação do crescimento e diferenciação celular, pesquisas
continuam a ser feitas com diferentes tipos de câncer.
Recomendações diárias Um grande estudo de coorte retrospectivo (20),
A Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitá- feito por pesquisadores da Kaiser Permanent, das uni-
ria) recomenda uma ingestão diária de 600 mcg ER para versidades da Califórnia e de Washington e do Fred Hu-
adultos (16). tchinson Cancer Research Center, associou a suplemen-
É a dosagem recomendada pelo Departamento de tação de vitamina A à redução de melanoma, o tipo mais
Agricultura dos Estados Unidos para meninos e meninas fatal de câncer de pele.
entre 9 e 13 anos (15). Os pesquisadores analisaram o risco de melano-
A instituição americana recomenda doses de 900 ma de 69.635 pessoas com idade média de 62 anos, e
mcg ER para homens a partir dos 14 anos e de 700 mcg concluíram que o risco de melanoma era cerca de 40%
ER para mulheres nessa faixa etária. Para bebês e crian- menor nos participantes que tomavam suplementos de
ças as recomendações são 400 mcg ER até os seis me- vitamina A.
ses, 500 mcg ER dos 7 aos 12 meses, 300 mcg ER de 1
a 3 anos e 400 mcg ER de 4 a 8 anos.

Overdose
Em excesso, a vitamina A pré-formada pode ser tó- A vitamina A também será estudada como
xica. O quadro de hipervitaminose A raramente acontece
por ingestão de alimentos: sua causa mais comum é a tratamento coadjuvante da esclerose múltipla
superdosagem de suplementos.
O consumo excessivo crônico pode aumentar a pres-
são intracraniana, causar náusea, dor de cabeça, inflama-
ções de pele, articulações e ossos (13). E como a vitamina
A é armazenada no fígado, a overdose causa danos ao órgão.

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20 conhecer

O estudo também indicou que as mulheres são


mais beneficiadas pela vitamina no que diz respeito à
prevenção do melanoma.
Um trabalho mais recente, que será publicado na
edição de junho do “International Journal of Oncology”,
sugere que o ácido retinoico, um derivado da vitamina A,
pode fazer com que células pré-cancerígenas na mama
voltem ao estado de células saudáveis (21).
O estudo foi feito “in vitro” por pesquisador da
Thomas Jefferson University, que usaram quatro tipos
de células da mama: normais, pré-cancerígenas, can-
cerígenas e agressivamente cancerígenas. O tipo mais
agressivo não respondeu ao ácido retinoico, mas o estu-
do sugere que há a possibilidade de o derivado da vita-
mina A prevenir a progressão do câncer inicial.
Outro campo de estudo é o uso da vitamina como
A ANVISA recomenda a ingestão diária de auxiliar no tratamento da fibrose cística. Entre 15% e
40% dos pacientes com fibrose cística apresentam de-
600 mcg de vitamina A para adultos ficiência de vitamina A (22) e estão sendo feitas pes-
quisas para avaliar a eficácia da suplementação nesses
pacientes, mas os resultados são ainda inconclusivos.
A vitamina A também será estudada como trata-
Segundo as autoras do estudo, publicado no “Journal mento coadjuvante da esclerose múltipla. A fundação
of Investigative Dermatology “, os efeitos da suplementa- Conrad N. Hilton acaba de doar US$ 900.000 ao Los An-
ção foram ainda mais pronunciados nas partes do corpo geles Biomedical Research Institute para pesquisar a
mais expostas ao sol, sugerindo um importante efeito pro- possibilidade de a vitamina centenária evitar remissões
tetor contra os danos causados pela irradiação solar. ou retardar a progressão da doença.

[1] Alfred Sommer, Preventing Blindness and Saving Lives, The Centenary of Vitamin A. JAMA Ophthalmology January 2014 Volume 132, Number 1. [2] E. V. McCollum and
REFERÊNCIAS Marguerite Davis, In the diet during growth the necessity of certain lipins, J. Biol. Chem. 1913, 15:167-175. [3] Nobelprize.org, The National Academy Press. [4] John F Nunn, Ancient
Egyptian Medicine. British Museum Press, Londres. [5] Littré, E, Oeuvres Completes d’Hippocrate, Vol. IX, pp. 156-160. J. B. Ballière, Paris. [6] www.copenhagenconsensus.com/
copenhagenconsensus-2008/outcomes. [7] micronutriente.org. [8] Yang HM, Mao M, Wan C, Vitamin A for treating measles in children. Cochrane Database Syst. Rev. 2011; 2005.
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Wellington V. Cardoso, Prenatal retinoid deficiency leads to airway hyperresponsiveness in adult mice. J Clin Invest. 2014;124(2):801–811. [12] Manual de Condutas Gerais do
Programa Nacional de Suplementação de Vitamina A. Ministério da Saúde, Secretária de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica, Coordenação-geral de Alimentação
e Nutrição. [13] Institute of Medicine, Food and Nutrition Board, Dietary Reference Intakes for Vitamin A, Vitamin K, Arsenic, Boron, Chromium, Copper, Iodine, Iron, Manganese,
Molybdenum, Nickel, Silicon, Vanadium and Zinc. National Academy Press. [14] Biblioteca Virtual em Saúde. Ministério da Saúde. [15] U.S. Department of Agriculture, Agricultural
Research Service, USDA National Nutrient Database for Standart Reference. Nutrient Data Laboratory Home Page, 2011. [16] Regulamento técnico sobre ingestão diária recomendada
(idr) para proteína, vitaminas e minerais. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. [17] Véronique Azaïs-Braesco, Gérard Pascal, Vitamin A in pregnancy: requirements and safety
limits. Am J Clin Nutr May 2000vol. 71 no. 5 1325s-1333s. [18] Lammer EJ, Chen DT, Hoar RM, Agnish ND, Benke PJ, Braun JT, Curry CJ, Fernhoff PM, Grix AW Jr, Lott IT, et al. Retinoic
acid embryopathy. N Engl J Med, 1985 Oct 3;313(14):837-41. [19] The Alpha-Tocopherol, Beta Carotene Cancer Prevention Study Group , The effect of vitamin E and beta carotene on
the incidence of lung cancer and other cancers in male smokers. N Engl J Med, 1994 Apr 14;330(15):1029-35. [20] Maryam M Asgari, Theodore M Brasky, Emily White, Association of
Vitamin A and Carotenoid Intake with Melanoma Risk in a Large Prospective Cohort. Journal of Investigative Dermatology (2012) 132, 1573-1582. [21] M.F. Arisi, et al, All transretinoic
acid (ATRA) induces re-differentiation of early transformed breast epithelial cells. International Journal of Oncology, 2014 Jun;44(6):1831-42. [22] O’Neil C, Shevill E, Chang AB,
Vitamin A supplementation for cystic fibrosis. Cochrane Database Syst Rev 2010

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calendário

>> Ao patrocinar e divulgar encontros científicos na área de Nutrição, a Nestlé


espera contribuir para que os profissionais de saúde possam debater e
compartilhar suas experiências a partir da produção acadêmica mais recente.
Confira alguns dos principais eventos que vão ocorrer nos próximos meses.

set. out.
70º Curso Nestlé de Atualização em Pediatria >> 2 a 5 37º Simpósio Internacional de Ciências do Esporte
O departamento científico da Sociedade Brasileira de Organizado pelo Centro de Estudos do Laboratório de Aptidão Física de
Pediatria, juntamente com membros da Sociedade de São Caetano do Sul (CELAFISCS), o simpósio acontece em São Paulo
Pediatria do Ceará e docentes da área, preparou uma (SP), no Centro de Convenções Rebouças. A programação científica
programação científica com foco nas novas morbidades, foi desenvolvida de acordo com o tema “Lições e Sonhos no Exercício
prevenção da obesidade e alergia alimentar. O encontro e na Atividade Física”. Maiores informações estão disponíveis no site
acontece em Fortaleza (CE), no Centro de Convenções da oficial do evento: http://www.simposiocelafiscs.org.br
cidade. A programação científica preliminar está disponível
em: http://www.cnap.com.br

nov.
XXIII Congresso Brasileiro de Nutrição >> 17 a 20
Nessa edição do evento bianual, organizado pela Associação
Brasileira de Nutrição e suas filiadas, a programação científica
está voltada para a temática “Alimentação e Nutrição nos
III World Congress of Public Health Nutrition >> 9 a 12
Excessos e na Fome Oculta: onde estamos e para onde vamos?”.
Simultaneamente, acontecem o V Congresso Ibero-americano de O encontro internacional será sediado em Las Palmas de Gran
Nutrição, o III Simpósio Ibero-americano de Nutrição Esportiva, Canaria, na Espanha, juntamente com o II Latin America Congress
o II Simpósio Iberoamericano de Nutrição em Produção de of Community Nutrition e o X Congreso de la Sociedad Espñola de
Refeições e o II Simpósio Ibero-americano de Nutrição Clínica. Nutrición Comunitaria (SENC). O evento conta também com 3 dias
O Congresso será realizado em Vitória (ES) e disponibiliza de workshop pré-congresso. A programação preliminar pode ser
maiores informações no endereço: http://www.conbran.com.br acessada no endereço: http://www.nutrition2014.org

69º Congresso Brasileiro de Cardiologia >> 26 a 29 1º Congresso Brasileiro de Nutrologia Pediátrica >> 13 a 15
O tradicional encontro da Sociedade Brasileira de Cardiologia Paralelamente, acontece o 4º Simpósio Internacional de Nutrologia
acontece em Brasília, no Centro Internacional de Convenções. Pediátrica. O programa científico do evento com sede em Florianópolis (SC)
Com um desenho diferente dos anteriores, organização permitirá a discussões sobre programação metabólica, alergia alimentar,
do evento prepara uma grade científica focada em temas obesidade, nutrição, atividade física, prevenção na infância de doenças
práticos, visando proporcionar discussões positivas crônicas do adulto, transtornos alimentares, dentre outros. A submissão
e esclarecedoras aos participantes. Para inscrições e de trabalhos científicos pode ser realizada até o dia 15 de agosto.
programação preliminar, acesse: http://congresso.cardiol.br Para maiores informações, visite: http://www.nutroped2014.com.br

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Letras de pimenta, cravo e canela
As páginas do recém lançado “Fictitious Dishes” dão vida a refeições que
habitam clássicos da literatura Universal. E estimulam o apetite por outros
cheiros e sabores que habitam a rica cozinha dos livros de Jorge Amado

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nutrição e cultura

Uma toalha de um azul inocente e renda delicada,


a xícara de fina porcelana, um relógio de bolso, cartas de
baralho. Nessa mesa bem arrumada, o Chapeleiro diz à por_ Marília Cavalcanti
Alice (em “Alice no País das Maravilhas”, de Lewis Car-
roll): “sirva-se de vinho”. Mas ali só havia chá.
Nas páginas de “Moby Dick”, de Herman Melville,
Ismael e Queequeg são nutridos por um potente “clam Jorge Amado costumava dizer:
chowder”, uma sopa consistente feita de “pequenos e
suculentos mariscos, pouco maiores do que avelãs e
“personagem tem de ser vivo, de carne
com porco salgado cortado em pequenos flocos; tudo e osso. Se não comer, morre”
enriquecido com manteiga, e plenamente temperado
com pimenta e sal”.
Inspirada em passagens marcadas por comes e be- As páginas de “Fictitious Dishes”, lançado há dois
bes como essas, “refeições que são as mais vívidas me- meses nos Estados Unidos, terminam sem que acabe
mórias de livros” a design e escritora Dinah Fried recriou com elas a fome de ver em imagens os alimentos pre-
cenas de obras como “O Apanhador no Campo de Centeio”, sentes em outras obras.
de J. D. Salinger, e “Metamorfose”, de Franz Kafka, e as fo- Quem, aliás, folheia esse “álbum fotográfico das
tografou para seu “Fictitious Dishes” (Harper Design). mais memoráveis refeições da literatura” sente a boca
Nem sempre se ocupa de histórias fartas à mesa, salivar com a lembrança de outras comilanças célebres
como é a de “O Grande Gatsby”, de F. Scott Fitzgerald, re- – tão conhecidas dos brasileiros –, que estão ausentes
pleta de taças e com seus ricos canapés. Relembra tam- da compilação.
bém – com o retrato de uma cumbuca metálica e uma co- São, por exemplo, aquelas descritas por Monteiro
"Fictitious Dishes": cenas de
lher sobre um móvel de madeira gasta – os bocados pelos Lobato (1882-1948), que com tanto prazer alimenta em clássicos da literatura recriados
quais passou Oliver Twist, órfão na Inglaterra do século sua obra com içá (gorda formiga saúva, comida tosta- por Dinah Fried

19, que habita o livro homônimo de Charles Dickens. da), fubá, porco, goiabada cascão... “
Foi a partir dessa mesa crua, de refeição insi- Nasci para comer, e nesta casa os petiscos têm
piente, que Oliver, com “imprudente miséria”, resolveu qualquer coisa que bole no coração da gente. (...) Juro
avançar no refeitório do reformatório e dizer a frase “Por sobre a lança de meu amo que petisqueira como as da-
favor, senhor, eu quero mais”, que o fez ser punido e aca- qui, nem no céu”, ouve em elogio a cozinheira Tia Nastá-
bar, mais tarde, tomando rumo em direção Londres. cia, de sua obra “O Picapau Amarelo”.

Alice no País das Maravilhas Moby Dick A Metamorfose

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24 nutrição e cultura

O de comer também era fundamental para outro


autor brasileiro, o baiano nascido em Itabuna, Jorge
Amado (1912-2001), que costumava dizer que “per-
sonagem tem de ser vivo, de carne e osso. Se não co-
mer, morre”.
O escritor, que faria cem anos em 2012, trans-
corre suas narrativas com o apego à mesa baiana e
acaba por registrar em seus escritos o que se comia
naquela região – ao contrário de macaquear os cos-
tumes franceses.
Conta a filha do escritor, Paloma Jorge Amado,
que o autor começou cedo, aos 18 anos, a alimentar
seus personagens, mesmo que timidamente. “No iní-
cio não eram os grandes almoços baianos, o lugar da
comida foi bem mais modesto”.
Mas, a partir já de seu segundo romance, “Ca- Cozinha e cozinheiras
cau”, de 1933, abriu-se espaço para o que é “ao mes- Galinha à cabidela, cozido feito com o sangue da ave,
mo tempo necessidade, alegria, sonho, festa, urgên- é o primeiro prato que Gabriela serve a seu Nacib, o “turco”
cia, amor, vida: o de comer”. que a contratara para preparar os quitutes no bar Vesúvio e
Da leitura em ordem cronológica, depois de ta- cuidar de sua casa, em “Gabriela, Cravo e Canela”.
bular toda a referência à comida na obra do pai, Pa- O livro, de 1958, demarca a primeira grande cozi-
loma escreveu “A Comida Baiana de Jorge Amado – O nheira da obra de Jorge Amado. Trata-se de uma retiran-
Livro de Cozinha de Pedro Archanjo com Merendas de te, que faz a travessia do sertão a Ilhéus para cozinhar
D. Flor”, em que reconstrói as receitas com a ajuda de em casa de família. Chega coberta de pó, vestida em tra-
célebres cozinheiras baianas. pos e é contratada com receio por Nacib.
Entre elas, está Dona Canô “mãe de Bethânia, de Sua “alta qualidade de tempero”, porém, não tarda
Caetano, da poetisa Mabel, sabe todas as receitas, pode a deixar em rebuliço toda a cidade. Com “seus acarajés,
nos dizer quando uma receita exige coco ralado de cos- as fritadas envoltas em folhas de bananeira, os bolinhos
tas e quando se pode usar leite de coco em garrafa”. de carne, picantes” e os “tabuleiros de abarás, bolinhos
de bacalhau”, engordou a clientela do Vesúvio, que se
demorava mais ali com a presença da moça.
No romance "Dona Flor e seus Dois Maridos", “Quero não. Pra quê?”, respondia, com um sorriso,
a protagonista é cozinheira de mão cheia e conduz propostas de trabalhar para o bar concorrente, de ir para
a capital, Salvador, receber alto ordenado – tão longe ti-
a escola Sabor e Arte, onde dá aulas culinárias nha ido a fama de seu cozinhar.

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nutrição e cultura 25

Gabriela acha graça é de continuar trabalhando


para Nacib. E, quando dele se vê apartada, sente, além
do desejo de fazer “de seu peito travesseiro”, também
a abstinência de cozinhar para seu “moço bonito”. Na obra de Jorge Amado existem as completas
Florípedes Paiva Madureira, ou dona Flor dos
Guimarães, nunca encontrou Gabriela. Flor não divide refeições em casa de coronéis e as comidas
com ela lugar em um mesmo romance de Jorge Ama-
do – veio depois de Gabriela. das festas populares – carne-seca, farinhas,
Mas compartilha com a retirante a mesma pres-
teza na cozinha. As duas até chegam a executar algu-
pratos à base de milho, o aipim, a tapioca
mas mesmas receitas, cada uma em seu livro, como a
moqueca de peixe, o vatapá.
Mas no romance de 1966, “Dona Flor e seus O segredo da receita não é só de técnica; é pre-
Dois Maridos”, a protagonista, primeiro esposa do ciso encontrar o maturi, alerta o autor, que é a casta-
malandro Vadinho, não é só cozinheira de mão cheia nha-de-caju ainda verde, que só aparece no começo
como conduz a escola Sabor e Arte, onde dá aulas da safra.
culinárias. Essa receita é servida à agora influente Tieta,
É dessa ocupação, desse provento, que se vale que retornava à pequena cidade baiana de Sant'ana
quando o marido desaforado parte para o outro mun- do Agreste, já para as bandas de Sergipe. Ela, a pasto-
do. Um ano depois da morte, porém, não consegue ra de cabras Antonieta, havia sido enxotada de lá pelo
aplacar o apetite do qual se queixa seu corpo. pai, que a descobrira envolvida com homens nas du-
Dona Flor, viúva ansiosa para contrair novo ma- nas de um povoado na região, onde moravam.
trimônio, mistura alucinação, desejo e uma receita de A fritada de maturi é apenas parte de um ban-
vatapá de peixe, “o mais famoso de toda a culinária quete preparado a Tieta pela liberal dona Milu. Ela
da Bahia”. também prepara teiú (espécie de lagarto) ensopado,
Em seu “apelo em aula e em devaneio”, canta carne-de-sol com pirão de leite e doces de jenipapo,
a receita: “tragam duas cabeças de garoupa fresca – carambola e de banana.
pode ser outro peixe, mas não é tão bom”. Tieta, outra das grandes personagens femininas
Ensina a tirar o leite do coco fresco, ralado. “Tirado de Jorge Amado, não se furta em comer, assim como
esse primeiro leite, o grosso, não joguem a massa fora dona Flor (que confessa a preocupação com seu peso).
(...). Peguem a mesma massa e a escaldem na fervura
de um litro d'água. Depois esprema para obter o leite Cada personagem, uma mesa
ralo. O que sobrar, joguem fora, pois agora é só bagaço”. A obra de Amado também dá espaço à aqueles que
“Viúva é só bagaço, limitação e hipocrisia”, com- não têm a fartura ao alcance, como em "Suor" (1934).
pleta. E então lança o pedido, para ser espalhado: Ao livro não escapa a miséria e a fome dos seicentos mo-
quer concretizar um novo casamento. radores que divivem espaço em um cortiço instalado em
um sobrado na ladeira do Pelourinho, em Salvador.
Agreste Mas existem também (os muitos) pratos envol-
A receita do vatapá, que se alonga por diferentes ventes, com textura, cheiro e cor. São as completas
páginas, não é a única na obra de Jorge Amado. Em “Tie- refeições em casa de coronéis e a comida do traba-
ta do Agreste" (1977), também se declara um modo de lhador em casa e nas festas populares – carne-seca,
preparo, a da frigideira (ou fritada) de maturi. farinhas, pratos à base de milho, o aipim, a tapioca.

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26 nutrição e cultura

“É o que se leva do mundo, capitão. A gente vive nu-


mas brenhas danadas, derrubando mata pra plantar cacau
(...) escapando de mordida de cobra e de tiro de tocaia, se
a gente não comer bem, o que vai fazer?", questiona o co-
ronel Maneca Dantas em “Terras do Sem Fim” (1943).
Um outro tipo de comida, a comida ligada à cozinha
africana, também tem raízes fincadas na coleção do autor.
Elas aparecem, entre outros, em “Jubiabá” (1935),
“Dona Flor e seus Dois Maridos” e “Tocaia Grande” (1984)
e em “Tenda dos Milagres” (1969), filme adaptado para o
ao cinema por Nelson Pereira dos Santos.
Esse último, alguns dizem o livro preferido de Jorge com amêndoas. Chico Buarque, escritor e cantor, teria
Amado, conta no século 20 a história do mulato Pedro Ar- servido para si patê de fígado, bacalhau de broa com mi-
chanjo, emblemático defensor da cultura negra (incluin- lho, bom-bocado.
do o candomblé). Bedel da faculdade de medicina baia- Que faria Bettina para Jorge Amado? Paloma, sua
na, ele trava luta contra intelectuais locais em defesa da filha, adverte: na casa de sua família, comida tinha de ser
miscigenação. “de muito”.
“Na Tenda dos Milagres (lugar que é palco de can- Temos um palpite do que seria: carne assada malpas-
domblé e capoeira), após a dança ritual de saudação, sada, um de seus pratos preferidos, segundo conta o amigo
silenciado os atabaques, as garrafas foram abertas. (...) e também escritor João Ubaldo Ribeiro. Para sobremesa?
Havia quantidade de comida, variada e saborosa: as mo- Talvez uma fruta, outra de suas paixões, e que foi
quecas, as frigideiras, os xinxis, os abarás, os acarajés, o tema de outro livro de Paloma, “As Frutas de Jorge Amado
vatapá e o caruru (...)”. ou o Livro de Delícias de Fadul Abdala”.
Archanjo escreveu um livro sobre cozinha, chamado Mais uma vez, Paloma faz uma revista na obra do
de “A culinária baiana – Origens e preceitos”, ele próprio pai e cataloga frutas como araçás, jenipapos, graviolas,
um cozinheiro de mão cheia “não tinha rival em certos tamarindos, umbus, cacau, abacate.
pratos baianos, sua moqueca de arraia era sublime”. Onde quer que fosse, conta ela, Jorge Amado gos-
tava de descobrir uma nova e provar o gosto que tinha.
A mesa de Jorge Amado
Explore outras cenas de clássicos da literatura recriados
Para homenagear, retribuir em forma de comida, a pela artista Dinah Fried.
cozinheira Bettina Orrico desenhou banquetes imaginá-
rios em seu livro “Os Jantares que Não dei”. “Arrumadi-
nhos, lado a lado, estão aqueles que eu admiro. Este livro As frutas, outra paixão de Jorge Amado,
me salva da distância deles”, diz ela.
Para o arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012),
também aparecem em profusão em sua obra:
“homem de poucas palavras, mas de linhas que se trans- araçás, jenipapos, graviolas, tamarindos,
formam em palácios, prédios e catedrais”, faria salada de
lagostim e abacaxi, terrine de legumes e filés de frango umbus, cacau, abacate

[1] Marcia Camargos, Vladimir Sacchetta. À mesa com Monteiro Lobato. Editora Senac São Paulo. [2] Paloma Jorge Amado. A comida baiana de Jorge Amado ou o Livro de cozinha de
REFERÊNCIAS Pedro Archanjo com as merendas de Dona Flor. Editora Record. [3] Jorge Amado. Dona Flor e Seus Dois Maridos. Companhia das Letras. [4] Dinah Fried. Fictitious Dishes: An Album of
Literature's Most Memorable Meals. HarperCollins: fictitiousdishes.com [5] Jorge Amado. Gabriela, Cravo e Canela. Companhia das Letras. [6] Bettina Orrico. Os jantares que não dei.
Editora BEI. [7] Jorge Amado. Tenda dos milagres. Companhia das Letras. [8] Jorge Amado. Tieta do Agreste. Companhia das Letras.

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ponto de vista
Fortificação do iodo: sua
importância e trajetória no Brasil
O iodo é um micronutriente essencial para o quantidades excessivas de iodúria na
organismo humano tendo como função conhecida população brasileira. Alguns estudos
a síntese dos hormônios tireoidianos: triiodotiro- que avaliaram a excreção urinária de
nina (T3) e a tiroxina (T4). Quando a ingestão de iodo em lactantes e crianças mostra-
iodo é insuficiente, a tireóide pode não ser capaz ram que mais de 50% da população
de sintetizar quantidades suficientes de seus hor- analisada ainda mantinham um con-
mônios, o que resulta em cretinismo em crianças e sumo excessivo deste mineral, mes-
desenvolvimento do bócio. A adequação da inges- mo com a redução do teor de iodo no
tão do iodo é avaliada por meio da excreção uriná- sal [2, 3, 4]. Atualmente, após publi-
ria deste micronutriente. cações de uma série de dados, a AN-
Na década de 20, a deficiência de iodo apre- VISA aprovou uma nova redução da ADRIANA LELIS CARVALHO
sentava grande prevalência mundial, sendo a Suíça concentração de iodo no sal para 15 a 45 mg de Nutricionista (UFV),
Doutoranda em Ciências
o primeiro país a ter a iniciativa da fortificação de iodo/kg de sal, visando a diminuição da ingestão Médicas na área de
iodo no sal de cozinha. No Brasil, a iodação do deste micronutriente pela população [2,5]. Investigação Biomédica pelo
Programa de Pós-graduação
sal de consumo humano se tornou obrigatória na A regulação do teor de iodo no sal de con- do Departamento de Clínica
década de 50, com uma concentração de 10 mg de sumo humano é uma medida de saúde pública de Médica da FMRP-USP.

iodo/kg de sal, destinada somente para as áreas de grande importância por prevenir as consequências
LÍVIA FERNANDES DE LIMA
bócio endêmico. Posteriormente, em 1994, essa do consumo insuficiente ou excessivo deste micro-
Nutricionista (USP/RP),
quantidade passou a ser considerada insuficiente nutriente. Por outro lado, é importante salientar Mestranda em Ciências
para garantir o aporte mínimo necessário à saúde. que a ingestão aumentada de iodo está diretamen- Médicas na área de
Investigação Biomédica pelo
Assim, o Ministério da Saúde, além de aumentar te relacionada ao consumo de sal. Sabe-se que a Programa de Pós-graduação
o teor de iodo no sal para 40 a 100mg de iodo/ população brasileira apresenta uma ingestão diária do Departamento de Clínica
Médica da FMRP-USP.
kg de sal, estendeu a iodação para todo território de sal duas vezes maior do que o recomendado.
nacional [1]. Desta forma, o interessante seria a existência DR. ANDERSON
Em 2000, houve uma pesquisa nacional que de uma sintonia entre as ações em saúde públi- MARLIERE NAVARRO
evidenciou excesso do consumo deste micronu- ca que contemplem a adequação da ingestão de Professor do Curso de
Nutrição e Metabolismo do
triente. Devido a esta nova realidade, a Agência sódio e, concomitantemente, a fortificação do sal Departamento de Clínica
Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), em com iodo, em concentração adequada à população Médica da FMRP-USP.
Mestre em Alimentos
2003, reduziu os níveis de concentração de iodo no brasileira, possibilitando a prevenção de doenças e Nutrição na área de
sal de consumo humano para 20 a 60 mg de iodo/ associadas ao sódio e às condições de insuficiência concentração de Ciências
Nutricionais pela UNESP
kg de sal. Porém, esta medida continuou mantendo e/ou excesso do consumo de iodo. e Doutor em Ciências
Médicas na área de
Investigação Biomédica pelo
Programa de Pós-graduação
[1] Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição, Fundação Nacional de Saúde. Manual de combate aos distúrbios por deficiência de do Departamento de Clínica
REFERÊNCIAS iodo. Ministério da Saúde, 1996. [2] Medeiros-Neto G. Iodine nutrition in Brazil: where do we stand? Arquivo Brasileiro Endocrionologia Médica da FMRP-USP.
& Metabolismo, 2009; 53 (4): 470-474. [3] Carvalho AL, Meirelles CJ, Oliveira LA, Costa TM, Navarro AM. Excessive iodine intake in
schoolchildren. Eur J Nutr, 2012, 51(5):557-62. [4] De Lima LF, Barbosa Jr F, Navarro AM. Excess iodinuria in infants and its relation to the
iodine in maternal milk. Journal of Trace Elements in Biol. and Med., 2013; 27: 221-225. [5] Brasil. Agência Nacional de Vigilância Sanitária.
Resolução da Diretoria Colegiada nº 23, de 24 de abril de 2013. Dispões sobre o teor de iodo no sal destinado ao consumo humano e dá
outras providências. Diário Oficial da União, Brasília: Ministério da Saúde, n.75, 2013.

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qualidade

Alimentação
complementar adequada:
contribuindo para o desenvolvimento saudável
As boas práticas alimentares durante a primeira in- De modo geral, são identificados três grandes de-
fância, incluindo o aleitamento materno e a alimentação safios para o desenvolvimento do lactente [5-11]:
complementar saudável, são essenciais para o crescimen-
to, o desenvolvimento e a saúde futura da criança.
. Vulnerabilidade acentuada (0 a 6 meses): diminuição
Em 2008, uma série de publicações da revista The Lancet
demonstrou o impacto da desnutrição nos primeiros “mil dias”
da criança sobre a mortalidade infantil e seus efeitos, a maioria
1 da imunidade fornecida pela mãe, mudanças ambientais,
desenvolvimento da imunidade.

irreversíveis, em longo prazo na saúde e desenvolvimento físico e


cognitivo. Os “mil dias”, também conhecido como “janela de opor- . Desenvolvimento e crescimento acelerados (0 a 36 meses):
tunidades”, compreende o tempo da gestação a termo (280 dias)
somado aos primeiros dois anos de idade (730 dias) [1,2].
Estudos sugerem também que fatores nutricionais
2 triplica o peso e duplica a estatura e as necessidades energéticas
(ao final do primeiro ano em relação ao nascimento).

nos primeiros dois anos de vida podem modular o risco


. Alta necessidade de micronutrientes (6 a 12 meses): a
para doenças crônicas não transmissíveis, como obesida-
de, hipertensão arterial e doenças cardiovasculares, espe-
cialmente em crianças com antecedente de restrição de
3 necessidade de micronutrientes em crianças é, em média, 3 vezes
maior que do adulto (baseado na média das necessidades diárias
de ferro, selênio, zinco, folato e vitaminas B1, B12, A, B, C
crescimento intrauterino (RCIU) [3,4].
e E por kg de peso). Por outro lado, a capacidade gástrica é
Além disso, uma alimentação equilibrada e variada na
aproximadamente 80% menor que do adulto.
primeira infância é fundamental para a formação de hábitos
alimentares saudáveis que irão perdurar até a vida adulta
[5,6]. Assim, a inclusão dos diversos grupos de alimentos na O Departamento de Nutrologia da Sociedade Brasileira
il i de
d
dieta é essencial: frutas, verduras e legumes (fontes de vita- Pediatria (SBP) adota a recomendação da Organização Mundial
minas, minerais e fibras); carne, peixe, leite e ovos (proteína de Saúde (OMS), que preconiza o uso de leite materno exclusi-
animal de alta qualidade, fonte de ferro vo até os seis meses de idade. A partir deste período, passa a
biodisponível); cereais, pães e tubércu- ser indicada a introdução de alimentos comple-
los (base da alimentação e ótima fonte mentares, já que o uso exclusivo de leite mater-
de energia); óleos vegetais (ácidos no não supre todas as necessidades nutricionais da
graxos essenciais, principalmente criança. Além disso, deve-se promover a manutenção
ômega-3) [7]. da amamentação até os dois anos ou mais [7].

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qualidade 29

O Ministério da Saúde não recomenda


tos, incluindo cereais, verduras
a adição de açúcar nos alimentos e legumes [14]. A ausência de
consumidos nos primeiros anos de vida açúcar nos alimentos contribui
para redução do risco de cáries e
Vale lembrar que a introdução dos alimentos comple- obesidade [15,16].
mentares precisa ser feita de maneira gradual, com os ali- Além disso, o consumo elevado de sódio na infância pode
mentos sendo oferecidos individualmente sob a forma de pa- estar associado à maior risco para hipertensão na vida adulta.
pas e utilizando uma colher. A oferta de água potável também Da mesma forma que ocorre com os açúcares, a adição de sal
é necessária, já que os novos alimentos da dieta do lactente aos alimentos complementares pode habituar o paladar da
apresentam maior sobrecarga de solutos para os rins. A com- criança ao sabor salgado, interferindo nas preferências alimen-
posição da dieta deve ser variada e fornecer todas as classes tares e no consumo de determinados alimentos na vida adulta.
de nutrientes. É importante frisar também que, muitas vezes, De acordo com o Guia Alimentar para Crianças Menores de
a criança precisa ser exposta de 8 a 10 vezes ao mesmo ali- 2 Anos: Siga os 10 Passos, deve-se evitar açúcar, café, enlatados,
mento para que o mesmo seja completamente aceito [7]. frituras, refrigerantes, balas, salgadinhos e outras guloseimas,
Segundo a SBP, o período de introdução da alimentação nos primeiros anos de vida. E usar sal com moderação [14].
complementar é de elevado risco para a criança, tanto pela ofer- As práticas alimentares inadequadas contribuem para a
ta de alimentos inadequados, quanto pelo risco de sua contami- instalação da obesidade e das co-morbidades associadas, além
nação devido à manipulação e/ou preparo inadequados, favore- de prejudicar o desenvolvimento cognitivo, uma vez que o cére-
cendo a ocorrência de doença diarreica e desnutrição. bro cresce até o segundo ano de vida. Para que haja desenvolvi-
O Ministério da Saúde (MS) enfatiza a frequencia elevada mento satisfatório, o órgão necessita de nutrientes específicos,
de inadequações na alimentação complementar nos primeiros especialmente ferro, iodo, zinco e ácidos graxos essenciais [17].
anos de vida, ressaltando a introdução precoce do leite de vaca
integral, o acréscimo de carboidratos simples às mamadeiras, Conheça os 4 processos de qualidade nutricional e rígido
a contaminação no preparo e armazenamento, a consistência controle de qualidade na produção das Papinhas Nestlé:
inapropriada, a baixa densidade e biodisponibilidade de micro-
nutrientes (sopas muito diluídas), a inclusão de alimentos in- 1. Seleção rigorosa de fornecedores e ingredientes
dustrializados com altos teores de carboidratos simples, lipí- Assegurar características nutricionais dos ingredientes
e garantir ausência de substâncias prejudiciais à saúde.
deos, energia e sódio, consumidos com frequência pela família,
e a oferta insuficiente de frutas, verduras e legumes [12].
2. Cozimento adequado preserva os nutrientes
O Comitê de Nutrição da European Society of Paediatric
O tempo de cozimento e os processos de pasteurização e
Gastroenterology, Hepatology and Nutrition (ESPGAN) reco- esterilização eliminam os micro-organismos patogênicos
menda limitar, o máximo possível, a adição de sacarose aos com danos mínimos aos nutrientes [18].
alimentos complementares visando evitar que a criança se
habitue ao sabor doce dos alimentos, o que poderia contribuir 3. Fechamento a vácuo dispensa adição de conservantes
para a prevenção da obesidade [13]. Cada frasco recebe injeção de vapor e o ar é retirado. É a tecnologia
A orientação é reforçada pelo MS, que considera desne- do fechamento a vácuo que garante o produto em ótimas condições
cessária a adição de açúcar nos alimentos consumidos nos sem adição de conservantes. Médicos e nutricionistas podem
compartilhar esse conhecimento com os pais e cuidadores, já que a
dois primeiros anos de vida, mesmo sendo
ADO DE A
informação não é mencionada nos rótulos dos produtos [18,19].
N consenso que a criança tem preferên-
IO
IC
Ç
AD

ÚC

cia inata pelo sabor doce. A conduta


AR
NÃO

estimula a criança a se interessar por 4. Controle de qualidade


NÃO

Após o fechamento a vácuo, todos os lotes passam por um


AR

outros alimentos com sabores distin-


ÚC

AD

IC controle microbiológico e nutricional para verificação de sua


Ç

ION A
ADO DE
qualidade e integridade ao longo do tempo.

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30 qualidade

PAPINHAS NESTLÉ As Papinhas Nestlé podem auxiliar os pais a compor um cardápio va-
Pensando em tudo isso, as Papinhas Nestlé oferecem um por- riado e diversificado. Juntamente com as papas caseiras e com a amamen-
tfólio diversificado contendo ingredientes adequados para cada fase tação elas podem fazer parte da dieta do bebê, após os 6 meses de idade.
do desenvolvimento da criança: Etapa 1 (Descobrindo os alimen- Vale lembrar que, após a abertura da embalagem, a papinha que não
tos), Etapa 2 (Variando o cardápio), Etapa 3 (Estimulando a masti- teve contato com a colher que foi à boca do bebê pode ser acondicionada
gação) e Júnior (Nutrição para o crescimento). por até 24 horas em refrigerador.
As receitas das Papinhas Nestlé foram desenvolvidas com me-
nos sal, auxiliando na redução do risco para hipertensão no futuro e
evitando o estímulo a preferências alimentares [11]. Além disso:

Papinhas de frutas não são adicionadas de açúcar (a ausência


deste ingrediente contribui para não indução do lactente ao sa-
bor doce);

A tecnologia de fechamento a vácuo dispensa a adição de con-


servantes [18];

Ingredientes variados, sabor e textura adequados, contribuem para


a formação de hábitos alimentares saudáveis [5];

Presença de pedaços em tamanho e formatos adequados nas


Etapas 3 e Jr, auxiliam no processo de desenvolvimento mastiga-
tório [5].

As receitas das Papinhas Nestlé foram desenvolvidas com menos sal, auxiliando na redução
do risco para hipertensão no futuro e evitando o estímulo a preferências alimentares.

NOTA IMPORTANTE: O aleitamento materno é a melhor opção para a alimentação do lactente proporcionando não somente benefícios nutricionais e de proteção, como também afetivos. É fundamental que a
gestante e a nutriz tenham uma alimentação equilibrada durante a gestação e amamentação. O aleitamento materno deve ser exclusivo até o sexto mês e a partir desse momento deve-se iniciar a alimentação
complementar mantendo o aleitamento materno até os 2 anos de idade ou mais. O uso de mamadeiras, bicos e chupetas deve ser desencorajado, pois pode prejudicar o aleitamento materno e dificultar o retorno
à amamentação. No caso de utilização de outros alimentos ou substitutos de leite materno, devem-se seguir rigorosamente as instruções de preparo para garantir a adequada higienização de utensílios e objetos
utilizados pelo lactente, para evitar prejuízos à saúde. A mãe deve estar ciente das implicações econômicas e sociais do não aleitamento ao seio. Para uma alimentação exclusiva com mamadeira será necessária
mais de uma lata de produto por semana, aumentando os custos no orçamento familiar. Deve-se lembrar à mãe que o leite materno não é somente o melhor, mas também o mais econômico alimento para o bebê.
A saúde do lactente pode ser prejudicada quando alimentos artificiais são utilizados desnecessária ou inadequadamente. É importante que a família tenha uma alimentação equilibrada e que, no momento da intro-
dução de alimentos complementares na dieta da criança ou lactente, se respeitem os hábitos culturais e que a criança seja orientada a ter escolhas alimentares saudáveis. Em conformidade com a Lei 11.265/06;
Resolução ANVISA n° 222/02; OMS - Código Internacional de Comercialização de Substitutos do Leite Materno (Resolução WHA 34:22, maio de 1981); e Portaria M.S. n° 2.051 de 08 de novembro de 2001.

Assista ao vídeo que apresenta o processo de produção das Papinhas Nestlé


[1] Victora CG, Adair L, Fall C, Hallal PC, Martorell R, Richter L, et al. Maternal and child undernutrition: consequences for adult health and human capital. Lancet 2008;371:340-57. [2] Bhutta Z, Ahmed
REFERÊNCIAS T, Black RE, Cousens S, Dewey K, Giugliani E, et al. What works? Interventions for maternal and child undernutrition and survival. Lancet 2008;371:417-40. [3] Baird J, Fisher D, Lucas P, Kleijnen J,
Roberts H, Law C. Being big or growing fast: systematic review of size and growth in infancy and later obesity. BMJ 2005;331:929. [4] Ong KK, Loos RJF. Rapid infancy weight gain and subsequent
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Nutrição e Pâncreas
ANDRÉ LUÍS MONTAGNINI O pâncreas é um órgão parenquimatoso, lo- Tabela 1 – Células pancreáticas e produtos produzidos.
Doutor em Cirurgia do
Aparelho Digestivo pela
calizado no retroperitônio, com íntima relação com Pâncreas Endócrino
Faculdade de Medicina o duodeno aonde desembocam os ductos pancreá- Células Produto
da USP. Cirurgião do
Serviço de Cirurgia das Vias ticos. Apresenta função endócrina e exócrina.
Alfa Insulina
Biliares e Pâncreas do HC- A atividade endócrina é exercida pelas das
FMUSP. Professor Médico Beta Glucagon
Colaborador da Disciplina Ilhotas de Langerhans, dispersas pelo parênquima
de Cirurgia do Aparelho Delta Somatostatina
pancreático, onde células específicas produzem
Digestivo da FMUSP.
hormônios (tabela 1). A insulina e o glucagon tem PP Peptídeo pancreático
TATIANA OLIVEIRA ISAMU ação direta no metabolismo da glicose e influen- Pâncreas Exócrino
Coordenadora de Nutrição
do Centro de Combate ciam no catabolismo e anabolismo. Células Produto
ao Câncer em São Paulo.
Mestre em Ciências na área
O pâncreas exócrino é formado pelas células Epitélio ductal Água e bicarbonato
de Oncologia pela Fundação acinares dispostas em arranjo glandular com ácinos Centro acinares Água e bicarbonato
Antonio Prudente.
Especialista em Nutrição e ductos. As células acinares produzem as enzimas
Enzimas
Clínica em Oncologia pelo digestivas e as células do epitélio ductal secretam Tripsinogênio
A. C. Camargo Cancer
água e bicarbonato de sódio [1]. Quimotripsinogênio
Center. Especialista em
Acinares Proelastase
Nutrição Clínica pela As células acinares sintetizam, armazenam e
ASBRAN. Procarboxipeptidaase
secretam diversas enzimas digestivas. As enzimas Amilase
Lipase
digestivas são sintetizadas na sua forma inativa (pró-
-enzimas) e ficam armazenadas no citoplasma den-
tro de vacúolos denominados grãos de zimogênio. de forma que o suco pancreático, rico em enzimas
Quando as pró-enzimas entram em contato com digestivas e bicarbonato, é secretado no duodeno
as células da mucosa duodenal, a enteroquinase aí no momento das refeições. O processo de digestão
presente ativa o tripsinogênio e a tripsina ativa em pode ser dividido didaticamente em três fases: ce-
cascata as outras pró-enzimas. Amilase e lipase são fálica, gástrica e intestinal.
sintetizadas e secretadas nas formas ativas [2]. Na fase cefálica, os estímulos visuais e olfati-
O suco pancreático é composto por água, ele- vos chegam ao córtex cerebral e desencadeiam a res-
trólitos (sódio, potássio, cálcio, magnésio, bicarbo- posta colinérgica transmitida pelo nervo vago, que
nato, cloretos, sulfatos e fosfatos), proteínas (albu- estimula a secreção de enzimas. Na fase gástrica, a
mina e globulinas) e enzimas pancreáticas. distensão das paredes do estômago promove a libe-
A secreção pancreática é regulada por me- ração de gastrina que também estimula a secreção
canismos ligados às distintas fases da alimentação enzimática do pâncreas. A fase intestinal se inicia

NOTA DO EDITOR A segunda parte desse artigo será publicada na edição nº 20 da Nestlé Bio.

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com a passagem do bolo alimentar para o duode- forma crônica o tecido pancreático sadio é substituído paulatinamente por teci-
no e jejuno proximal. O ácido clorídrico aí contido do fibroso, o pâncreas sofre atrofia e adquire consistência endurecida. O com-
estimula a secreção de secretina pelas células S. A prometimento da glândula tem como resultado a perda das funções exócrina e
secretina aumenta dramaticamente a secreção de endócrina. Com o avanço da doença, o paciente pode apresentar insuficiência
água e bicarbonato pelo epitélio ductal pancreático exócrina e endócrina, ou seja, má absorção e diabetes [4].
e biliar. Além disso, a presença de polipeptídeos e Diversas são as causas que levam à pancreatite crônica conforme a tabela 1.
ácidos graxos estimula a liberação da colecistoqui- O alcoolismo é a causa mais comum em nosso meio, podendo chegar a
nina (CCK) que promove a secreção enzimática das 90% dos casos. Estima-se que a quantidade de etanol ingerida necessária para
células acinares para o ducto pancreático [2]. o desenvolvimento de pancreatite crônica seja de pelo menos 100g/dia para os
A concentração de cada uma das enzimas diges- homens e 80g/dia para as mulheres, por um período mínimo de 5 anos. A inges-
tivas no suco pancreático não é constante e nem igual tão crônica de álcool leva a alterações na composição do suco pancreático que se
em todos os indivíduos. Mecanismos de feedback torna mais viscoso. Muito provavelmente, o incremento da viscosidade do suco
controlam a síntese intracelular de enzimas. As con- pancreático é explicado pelo aumento no conteúdo proteico em paralelo à dimi-
centrações de lipase e proteases são ajustadas para o nuição da secreção de água e bicarbonato pelas células do epitélio ductal. Esta
padrão alimentar de cada pessoa em um determinado alteração na fluidez do suco pancreático faz com que haja deposição de rolhas
período de tempo. Quanto maior a quantidade de de- proteicas nos pequenos ductos secundários e posteriormente no ducto principal,
terminado substrato no bolo alimentar, maior a quan- dificultando o fluxo local. Com o tempo ocorre a deposição de cálcio nas rolhas
tidade da enzima específica no suco pancreático [3]. proteicas, que se transformam em cálculos pancreáticos. Uma proteína deno-
Como vimos, a pâncreas possui papel crucial minada litostatina pode estar envolvida na formação dos cálculos pancreáticos.
no processo digestivo e seu funcionamento depende A presença da rolha proteica ou do cálculo pancreático desencadeia res-
de mecanismos intrincados de ajustes, modulados posta inflamatória local que leva ao estreitamento do ducto. O represamento
por hormônios reguladores que respondem ao esti- segmentar do suco pancreático leva à dilatação ductal e ao aumento de pressão
mulo alimentar e à composição da refeição. hidrostática neste determinado ponto. A hipertensão canalicular e o processo
inflamatório dela decorrente levam às alterações histológicas anteriormente
PANCREATITE CRÔNICA descritas. Com o tempo, as áreas de dilatação ductal, intercaladas com áreas de
dilatação conferem a clássica característica de imagem de “colar de contas” [5].
Fisiopatologia e Etiologia Dentre os pacientes etilistas, somente cerca de 10 a 15% desenvolvem a
Nesta doença o pâncreas sofre processo in- pancreatite crônica. Este dado sugere haver algum fator genético que predispo-
flamatório persistente que resulta na destruição nha o paciente ao aparecimento da doença. Outros fatores etiológicos da pancre-
progressiva do parênquima e da arquitetura normal atite crônica, não ligados ao alcoolismo, incluem: mutações genéticas hereditá-
do órgão. Diferentemente da pancreatite aguda, na ria, metabólicas, autoimunes e idiopáticas. Condições anatômicas que causam
algum grau de obstrução ao livre fluxo do suco pancreático também podem de-
Tabela 2 – Fatores etiológicos associados à pancreatite crônica. sencadear a pancreatite crônica. Tabela 2.
Álcool

Não alcoólicos Quadro Clínico


Hereditária
O sintoma mais frequente é a dor abdominal. Está presente em até 95%
Autoimune dos pacientes. É predominantemente epigástrica, de forte intensidade e pode
Metabólica apresentar irradiação para os flancos e para a região dorsal. É desencadeada
Fibrose cística por refeições mais copiosas ou por ingestão de grande quantidade de álcool.
Idiopática Os surtos podem durar alguns dias e com frequência os pacientes procuram o
Pâncreas divisum serviço médico nestas condições. A diminuição da ingestão alimentar e o uso
Pâncreas anular de analgésicos melhoram quadro [6].

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Outro sintoma importante é o emagrecimento. A perda de peso está pre- As medidas iniciais incluem terapia de supor-
sente em mais de 90% dos pacientes e pode ser atribuída à diminuição da inges- te para o abandono definitivo do álcool, ajuste da
tão alimentar, intencionalmente para diminuir o quadro de dores abdominais ou dieta e reposição de enzimas pancreáticas.
pelo descuido com os hábitos alimentares frente à ingestão alcoólica. A má ab- Dor: Durante as crises o paciente deve ser
sorção e esteatorréia, decorrentes da insuficiência exócrina, também contribuem tratado com o uso de analgésicos, anti-inflamató-
para o emagrecimento. rios não hormonais e opioides. Nas fases iniciais,
Com a progressão da doença, os pacientes podem também apresentar diabe- o jejum ou a dieta baseada em hidratos de carbono
tes (cerca de 40% dos casos), icterícia e vômitos (por compressão do colécodo ou podem contribuir no controle da dor uma vez que
duodeno pelo processo inflamatório na cabeça do pâncreas) [6]. diminuem o estímulo secretário do pâncreas [4].
Complicações locais relacionadas à pancreatite crônica também podem Nos casos de falha do tratamento clínico da
ocorrer: pseudocistos, ascite pancreática, derrame pleural ou mediastinal e fístu- dor, a cirurgia pode estar indicada. Acredita-se que
las internas e externas. a hipertensão hidrostática intraductal e o processo
inflamatório perineural peripancreático são com-
Diagnóstico ponentes importantes na gênese e manutenção
A hipótese diagnóstica de pancreatite crônica parte do quadro clínico su- das dores. O objetivo da cirurgia é descomprimir o
gestivo, principalmente em pacientes com história de etilismo de longa data. Os ducto pancreático e/ou remover a área com maior
exames subsidiários serão pedidos com o objetivo de avaliar as alterações funcio- processo inflamatório. As cirurgias podem então
nais e morfológicas da glândula. ser de ressecção: duodenopancreatectomia, pan-
createctomia cefálica com preservação do duode-
Exames laboratoriais: no e pancreatectomias ditais (corpo e cauda do
Amilase e lipase podem estar normais em condições sem processo infla- pâncreas); ou cirurgias de descompressão e deriva-
matório agudo ou se o pâncreas já se encontra totalmente atrofiado. A eleva- ção: derivações pancreato-jejunais simples ou em
ção destas enzimas pode indicar quadro agudo ou a ocorrência de complicações combinação com ressecções de parênquima pan-
como pseudocisto ou derrames cavitários. Nos pacientes com comprometimento creático inflamado. O tratamento cirúrgico é indi-
endócrino podemos encontrar curva glicêmica alterada ou franca hiperglicemia. vidualizado e o cirurgião deve ter como objetivo a
A pesquisa de gordura nas fezes, qualitativa (Sudam III) ou quantitativa conservação do órgão ainda funcionante [7].
confirma a presença de esteatorréia e confirma a insuficiência exócrina. Insuficiência exócrina: O tratamento espe-
cífico será discutido posteriormente no suporte
Exames de imagem: nutricional (parte 2 – edição 20).
O RX simples do abdômen pode mostrar calcificações na topografia do pân- Insuficiência endócrina: O tratamento é
creas e ocasionalmente alargamento do arco duodenal e dilatação do estômago clínico e depende da intensidade do diabetes. Po-
quando há obstrução duodenal pelo processo inflamatório da cabeça do pâncreas. demos usar hipoglicemiantes orais ou insulina. O
A ultrassonografia do abdome superior pode mostrar alterações de textura e controle clínico deve ser rigoroso, pois o paciente
tamanho do pâncreas, além dos diâmetros do ducto pancreático e das vias biliares. pode apresentar períodos de grande variação na
A tomografia e a ressonância nuclear magnética de abdome mostram atrofia aceitação alimentar, correndo o risco de desenvol-
pancreática, dilatação, tortuosidade dos ductos e presença de calcificações. Estes ver crise de hipo ou hiperglicemia.
exames também podem fazer o diagnóstico de diversas complicações como pseudo- Outras complicações: A maior parte das com-
cistos, derrames cavitários, fístulas e trombose venosa do tronco mesentérico portal. plicações requer tratamento cirúrgico. A icterícia
obstrutiva é tratada definitivamente com derivação
Tratamento bilio-digestiva. Os pseudocistos e fístulas pancreáti-
Os objetivos do tratamento desta doença são alívio dos sintomas, prevenção de cas são tratados com cirurgias de derivação interna.
novos surtos, correção das insuficiências endócrina e exócrina e das complicações. A colecistite calculosa requer a colecistectomia [4].

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Evolução Tabela 3 – Principais fatores etiológicos das pancreatites agudas.


A pancreatite crônica é uma doença progressiva. Se a causa não puder ser Cálculos biliares, ascaridíase,
Obstrução da papila
controlada, o paciente evoluirá para quadro de insuficiências diversas e com- divertículo periampular,
duodenal
tumores periampulares.
plicações potencialmente fatais. O seguimento clínico rigoroso é fundamental,
pois permite a correção das insuficiências e o diagnóstico precoce das compli- Álcool

cações. Se não tratado adequadamente, o paciente terá grande limitação na sua Hipertrigliceridemia >1.000 mg/dl
qualidade de vida com alto custo pessoal, familiar e social. Colangiopancreatografia
endocópica retrógrada
PANCREATITE AGUDA Hipercalcemia

Alterações genéticas p.ex. Fibrose cística


Fisiopatologia e Etiologia Drogas
É o processo inflamatório agudo do pâncreas caracterizado por quadro
Caxumba, hepatite B,
de forte dor abdominal e elevação dos níveis plasmáticos de amilase e lipase. citomegalovírus, varicela
Os mecanismos pelos quais esta doença ocorre ainda não estão totalmente Infecções
Zooster, herpes simples,
HIV, salmonela, legionela,
esclarecidos, mas o evento inicial é a ativação do tripsinogênio em vacúolos
aspergilus, toxoplasmose e
ainda no interior das células acinares. A catepsina B (enzima lisossomal) ativa o criptosporidium.
tripsinogênio em tripsina, que então promove a ativação das outras proenzimas
(fosfolipase, quimotripsina e elastase). Estes vacúolos se rompem no citoplas-
ma e as enzimas agem sobre as células acinares. A grande quantidade de en- de líquidos,e a forma necrotizante na qual tanto
zimas ativadas que passa para o interstício começa o processo de autodigestão o parênquima pancreático como os tecidos adja-
do pâncreas. Inicia-se então um ciclo vicioso no qual as células pancreáticas centes podem estar comprometidos por necrose de
destruídas liberam mais enzimas que perpetuam o processo de autodigestão. O tecido e hemorragia.
processo inflamatório atinge toda a glândula e as enzimas liberadas no especo A avaliação da gravidade da pancreatite é
peripancreático podem levar à necrose dos tecidos peripancreáticos [8]. feita de acordo com os critérios de Atlanta. São
As enzimas liberadas agem sobre as células endoteliais, aumentando sig- classificadas como leve: nenhuma falência orgâ-
nificativamente a permeabilidade capilar e o extravazamento de fluidos para nica, ausência de repercussão sistêmica ou local
a glândula (edema pancreático) e retroperitônio. Ocorre ainda a ativação de e habitualmente a recuperação se faz em poucos
granulócitos e macrófagos, com liberação de citocinas pró-inflamatórias (IL 1, dias; moderadamente grave: ocorrência transitó-
6 e 8 e TNF) que aumentam a permeabilidade vascular e induzem trombose e ria de falência de orgânica, complicação local ou
hemorragia que levam à necrose pancreática [8]. agravamento de comorbidade; grave: ocorrência de
Nas formas graves da pancreatite, o paciente pode apresentar grandes falência orgânica por mais de 48hs [9].
repercussões sistêmicas, como a síndrome da resposta inflamatório (SRIS), de- As formas edematosas com gravidade leve e
pressão miocárdica, derrame pleural e ascite, insuficiência renal aguda, lesão moderadamente grave representam cerca de 75 a
pulmonar e diversas alterações metabólicas. Também ocorre comprometimen- 80% dos casos de pancreatite aguda, resolvem-se
to da barreira intestinal, com translocação bacteriana e desenvolvimento de espontaneamente e a mortalidade neste grupo é
infecções sistêmicas e do tecido pancreático necrosado, o que piora ainda mais menor que 1%. Nas formas necrotizantes e graves,
a gravidade do quadro clínico [8,9]. a mortalidade pode chegar a 40% dos casos.
Os principais fatores desencadeantes da pancreatite aguda são migração
de cálculos biliares pela papila duodenal e ingesta alcoólica. Outros fatores Quadro Clínico e Diagnóstico
também são descritos. Tabela 3. A manifestação mais comum é o quadro de
As pancreatites agudas podem ser divididas em 2 grupos: edematosa, dor abdominal epigástrica de aparecimento súbito.
onde o pâncreas e os tecidos adjacentes podem apresentar edema e acúmulo A dor é de forte intensidade e apresenta caráter pro-

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gressivo, podendo durar várias horas. Habitualmente Tomografia e ressonância do abdome: São exames importantes para o estabe-
é acompanhada de náuseas e vômitos. Pode haver lecimento do diagnóstico da pancreatite aguda e avaliação da gravidade da doença.
irradiação para os flancos (dor em faixa) e região Identificam a intensidade e extensão do comprometimento da glândula e dos teci-
lombar. O paciente apresenta grande desconforto e dos peripancreáticos, focos de necrose e/ou hemorragia. Podem também mostrar a
pode manisfestar agitação e ansiedade. presença de complicações como coleções, pseudocistos, ascite e derrame pleural.
Ao exame físico o paciente pode manifestar, Além do diagnóstico da pancreatite aguda, devemos tentar estabelecer a
de acordo com a repercussão sistêmica e acometi- sua causa e também a forma (edematosa ou necrotizante) e gravidade da do-
mento de outros órgãos, taquicardia, febre, hiper- ença (leve, moderadamente grave e grave) pois estes dados serão importantes
tensão, taquipnéia [10]. para o adequado planejamento terapêutico.

Exames laboratoriais: Tratamento:


As elevações dos níveis de amilase e lípase Em todas as formas da pancreatite aguda, o tratamento inicial inclui o
no sangue fazem o diagnóstico de pancreatite agu- jejum oral (para deixar o pâncreas em repouso), analgesia, hidratação vigorosa
da. Alterações no hemograma, uréia e creatinina, (para diminuir os efeitos da isquemia pancreática na progressão da lesão teci-
gasimetria arterial, eletrólitos, glicemia de jejum, dual) e correção dos distúrbios eletrolíticos e metabólicos.
proteína C reativa podem estar presentes e indicar Nas formas leves e moderadas, a recuperação do paciente ocorre entre 5
comprometimentos de outros órgão e sistemas [10]. e 7 dias. Após a melhora do quadro de dor e melhora dos níveis de amilase e
lípase, o paciente pode ser realimentado.
Exames de imagem: Nas formas graves, o tratamento também inclui a manutenção do pacien-
RX simples de abdome: pode mostrar disten- te em unidade de terapia intensiva, suporte ventilatório, hemodinâmico e renal
são gástrica e borramento do retroperitônio, mas de acordo com a evolução e progressão do comprometimento sistêmico.
não faz o diagnóstico da pancreatite. Uma complicação frequente e com grande impacto na mortalidade des-
RX simples de tórax: pode mostrar a presença tes pacientes é a ocorrência de infecção nas áreas de necrose pancreática e
de derrame pleural, comum no quadros de pancrea- peripancreática. As bactérias que aí se instalam podem se originar do tubo
tite aguda. digestivo, a partir da translocação bacteriana, ou dos cateteres endovenosos.
Ultrassonografia: pode mostrar a presença de Ainda não existe consenso se o uso profilático de antibióticos nos pacientes
cálculos biliares e a presença de edema e borra- com necrose pancreática pode prevenir esta grave complicação.
mento dos tecidos peripancreáticos. Entretanto, a Na suspeita de infecção da necrose pancreática, o paciente deve ser in-
qualidade de exame pode ser prejudicada pela pre- vestigado com punção aspirativa e exame microbiológico do material. Nos ca-
sença de acentuada distensão de alças intestinais sos de infecção o paciente deve ser tratado com antibióticos e, eventualmente,
e meteorismo. Pode mostrar a presença de ascite. cirurgia para drenagem da área afetada [9, 10].

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Saunders Elsevier, 2010, p. 985-1015.

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resultado

por_Flávia Benvenga

Merenda
Escolas públicas vencedoras do 3º Prêmio Nutrir Crianças Saudáveis
implementam projetos bem-sucedidos que podem servir de
inspiração e ser replicados por outras instituições

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resultado 37

Arroz e feijão temperado com carinho. Picadinho de carne feito com amor. Bolo
recheado de afeto. Esses não são os nomes de alguns dos pratos servidos nas me-
rendas das três escolas públicas de São Paulo vencedoras do 3º Prêmio Nestlé Nutrir
Crianças Saudáveis, mas poderiam ser, pois expressam o cuidado, a boa qualidade
de cada um deles e a importância que essas instituições dão à alimentação e à edu-
cação alimentar de seus alunos.
Dinalva Vieira de Souza, cozinheira da Escola Municipal de Ensino Fundamental
Henrique Souza Filho – Henfil, no bairro São Mateus – premiada em primeiro lugar
com o projeto “A alimentação e a interação na formação cidadã” –, explica por que a
merenda de sua escola é nota 10:

“Aqui, nós cozinhamos como se fosse para os nossos filhos, e


vários alunos são mesmo nossos filhos. Fazemos tudo bem feitinho,
bem temperadinho, até melhor que em nossas casas”.

a Escolar Premiada Como normalmente os alunos da rede pública


Um dos principais segredos desses projetos bem-sucedidos e premiados, fazem uma das refeições do dia na escola, os líderes
que são frutos dos programas de capacitação do Nestlé Nutrir Crianças Saudáveis, da EMEF Henfil sabem que não é possível somente as
talvez seja o fato de recriar, na escola, o sabor e o clima das refeições caseiras: ter famílias darem orientação; eles também têm a função
acesso a comidas gostosas e saudáveis, poder escolher o que e quanto comer, usar de oferecer educação alimentar. Para isso, o conheci-
prato de vidro, garfo e faca e, de quebra, usufruir de um ambiente acolhedor. “Antes, mento adquirido por meio do Nestlé Nutrir foi funda-
nós tínhamos uma empresa terceirizada, que entregava aos alunos o prato pronto, mental ao embasamento do projeto educacional e de
e eles comiam apenas com a colher”, lembra Aline de Faria Souza, diretora da EMEF transformação da merenda. “Trouxemos o material do
Henfil. “Quando os observávamos na hora da merenda, percebíamos que aquele Nutrir, estudamos com os professores e o pessoal da
momento era muito distante do que se vê socialmente, me parecia um retrocesso.” cozinha – porque havia também um DVD com receitas
A estudante Ana Paula Oliveira Vieira reforça a conclusão da diretora de sua escola: diferentes para preparar a merenda –; houve um en-
“Via a minha família toda comendo com garfo e faca e eu era a única que usava a volvimento de todo o pessoal”, conta a coordenadora
colher... não era bom”. pedagógica Deise Aparecida Alconchel Montanari.

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38 resultado

exemplo, que não é preciso cozinhar sempre


a mesma comida. Não é porque no cardápio
está escrito arroz e feijão que não se pode
colocar uma cenoura ralada para adicionar
nutriente”, diz a nutricionista da empresa
SHA, Danielle Vieira, que atua na EMEF Cas-
tor. A diretora Silvia acrescenta: “Nossa escola rece-
beu até uma oficina liderada por uma chef de cozinha,
que nos chamou a atenção para a boa apresentação
do prato aos alunos; afinal, primeiro comemos com os
olhos. Aprendemos também que, com os mesmos in-
Comer e brincar gredientes, podemos criar um cardápio maravilhoso”.
Na EMEF Castor, localizada também no bairro
São Mateus, as mudanças no refeitório e o trabalho Sem desperdício
de orientação alimentar feito em sala de aula foram Além da forma inadequada como as refeições
aspectos decisivos para que o projeto “Ambiente sau- eram realizadas, nessas escolas premiadas um outro
dável: primeiro passo para alimentação saudável” problema sério precisava ser solucionado: o desper-
conquistasse a segunda colocação do Prêmio Nestlé dício de alimentos. Como os alunos não podiam fazer
Nutrir. A equipe da escola promoveu uma ação abran- seus pratos e escolher o que e quanto comer, boa parte
gente e educativa, que incluiu a criação da horta, a ex- da comida ia para o lixo. “Tínhamos uma média de 30%
posição do cardápio do dia na parede do refeitório e a a 40% de desperdício por dia”, revela Aline, da EMEF
apresentação da comida em um prato, para que os alu- Henfil. “Depois, com a implementação do self service, a
nos possam apreciar enquanto aguardam na fila para perda não ultrapassou 500 g ao final de cada intervalo.
serem servidos.
“Percebia que o espaço era inadequado, pois os
estudantes se alimentavam e brincavam no mesmo lo-
cal”, observa a diretora Silvia Aparecida Silva. Por isso, a
escola fez uma remodelação simples e eficaz: construiu
uma mureta de cerca de um metro de altura para separar
os ambientes de brincar e de comer. “Agora, temos sos-
sego na hora da merenda, não há mais aquela correria”,
comemora o estudante Davi José Florêncio Ruiz.
As merendeiras da EMEF Castor também ficaram
mais motivadas, graças às informações recebidas,
como as receitas e as novas formas de trabalhar, na
capacitação do Nestlé Nutrir. “Elas descobriram, por
Merendeiras na capacitação do
Programa Nestlé Nutrir
Em 2013, mais de 100 escolas públicas
participaram do Programa

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resultado 39

O trabalho de capacitação do
Nestlé Nutrir Crianças Saudáveis
Durante o ano de 2013, profissionais de mais de 100 escolas públi-
cas de São Paulo participaram do Programa Nestlé Nutrir Crianças Saudá-
Esse processo de escolha é um grande avanço, além, é veis, que capacita diretores, professores e cozinheiras da rede pública de
claro, do fato de o refeitório ter se transformado em ex- ensino nos temas educação alimentar e nutricional, além da importância
celente espaço de convivência e aprendizado, devido da atividade física.
à instalação de jogos como pebolim e pingue-pongue.” Em São Paulo, o Programa envolveu 475 educadores (sendo
Lilian Cirne Gentil, coordenadora pedagógica da 165 cozinheiras) de 118 unidades escolares, distribuídas em qua-
EMEF Prof. Alípio Corrêa Neto, no bairro Butantã, terceira tro Diretorias Regionais da Secretaria Municipal de Educação: DRE Butantã,
colocada com o projeto “Eu posso e eu quero escolher”, DRE Campo Limpo, DRE Itaquera e DRE São Mateus.
afirma que o que despertou a escola para a criação do Essas escolas, que somam 126.885 alunos e passaram pela
autosserviço no refeitório foi justamente o desperdício capacitação, inscreveram seus projetos, colocando em prática os conceitos
da merenda. “Além disso, quisemos trabalhar tam- aprendidos no Programa, para concorrer na 3ª edição do Prêmio Nestlé Nutrir
bém a questão comportamental, pois víamos as Crianças Saudáveis em parceria com o Departamento de Alimentação Escolar
crianças comendo em pé ou sentadas nas esca- do Município de São Paulo. Ao todo, 28 projetos participaram. Desses,
das”, destaca. “Agora, a hora da refeição é, inclusi- quatro foram pré-selecionados, e uma comissão julgadora premiou três.
ve, um momento de integração e socialização. Apro-
veitamos a oportunidade para elaborar um trabalho
interdisciplinar em que o professor acompanha o aluno As oficinas
nas mesas, orienta, explica, ensina.” O Programa Nestlé Nutrir Crianças Saudáveis realiza
Da preocupação em reduzir o lixo alimentar nas- oficinas com base no contexto local e nas boas práticas de
ceu também o fortalecimento da autonomia de cada educação alimentar acumuladas desde 1999, sempre em
estudante. Ao pegar seu prato de vidro e seus talheres, parceria com Secretarias Municipais de Educação. Para
escolher o que prefere comer e ir até seu lugar à mesa, conduzir as capacitações, uma equipe da Fundação
a criança melhora a imagem de si mesma e pensa: “Sou Nestlé Brasil, formada por educadores, nutricionistas
capaz de comer com esses utensílios, a escola confia e culinaristas, aborda a educação alimentar e nutri-
em mim, não desperdiço comida”, salienta a profes- cional no ambiente escolar tendo a infância como
sora Marcela de Paolis. “O mais importante desse pro- foco. Nesse processo, o educador é estimulado a
jeto foi perceber, tanto para os alunos quanto para os discutir novas práticas e a construir caminhos
professores, que a hora da alimentação não é só para de aprimoramento da educação alimentar na es-
matar a fome; é um momento em que podem acontecer cola em que atua e com os recursos disponíveis.
muitas outras coisas boas, como, por exemplo, auxiliar
na melhora da autoestima”, reconhece.

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40 resultado

Escolas e
projetos vencedores
PROBLEMAS
■ Desperdício de alimentos devido ao sistema de distribuição da merenda ser realiza-
do em pratos feitos.

1º L

EMEF Henrique Souza


U G A R


Produção excessiva de lixo orgânico.
Falta da autonomia dos alunos.
Impossibilidade de uma intervenção mais efetiva junto aos alunos durante o mo-
mento das refeições.
Pouca reflexão sobre as questões alimentares.
Momentos ociosos e agitados nas refeições.
Filho – Henfil
R E S U LT A D O S
PROJETO ■ Implementação do autosserviço – Enquanto os alunos servem-se no balcão térmi-
A alimentação e a interação na co, os funcionários os orientam sobre a importância da alimentação balanceada e
formação cidadã os incentivam a provar legumes e verduras.
NÚMERO DE ALUNOS ■ Educação alimentar – A escola passou a lançar mão de textos diversos sobre ali-
546 (ensino fundamental) mentação (livro didático, artigos de revistas), vídeos informativos, pesquisas na
internet, filmes relacionados ao tema e atividades práticas nas aulas de ciências.
MODELO DE GESTÃO DA MERENDA ESCOLAR
terceirizada (insumos e funcionários)
■ Conscientização e interação no horário da refeição – Os alunos são orientados com
relação a como se servir, a quantidade adequada, provar novos alimentos, sentar-se
corretamente.
■ Adoção de pratos de vidro e talheres de metal (garfo, faca e colher).
■ Utilização de bandejas plásticas para facilitar o transporte dos pratos, copos e so-
bremesa.
■ Instalação de jogos no refeitório (pebolim, sinuca, minibasquete, jogo de botão, bo-
liche, pingue-pongue, entre outros), para deixar o ambiente do intervalo mais inte-
rativo e prazeroso.
■ Diminuição drástica da quantidade de alimento descartado (cerca de 500 g por dia).
■ Adesão dos alunos à merenda escolar: maioria faz a refeição na escola.
■ Todos os alunos que participam da refeição sentam-se e utilizam os talheres ade-
quadamente.
■ Os alunos menores estão “treinando” o uso de garfo e faca.

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resultado 41

PROBLEMAS


■ O espaço reservado às refeições pertencia a uma área do pátio, sem muretas ou
divisórias. Por isso, o aluno que comia sentado a mesa não tinha privacidade e
tranquilidade, pois junto a ele havia outros alunos brincando e correndo.
L U G A R ■ Uso de pratos de plástico e colheres durante as refeições representavam um
retrocesso e produziam constrangimento entre as crianças.
R E S U LT A D O S
EMEF Castor ■ Construção de uma mureta revestida com ladrilhos e finalizada com um canteiro
de plantas e flores.
PROJETO
Ambiente saudável: primeiro passo ■ Colocação de mesas forradas com toalhas plastificadas.
para alimentação saudável ■ Troca de utensílios para pratos de vidro, garfos e facas de metal.
NÚMERO DE ALUNOS ■ Refeitório transformado em espaço reservado e mais tranquilo para as refeições.
884 (ensino fundamental) ■ Realização de projetos em salas de aula relacionados à alimentação saudável,
MODELO DE GESTÃO DA MERENDA ESCOLAR como o Projeto Horta e Alimentação Saudável.
terceirizada (insumos e funcionários) ■ Diariamente, é feita a apresentação caprichada da refeição em um prato que
pode ser apreciado pelos alunos enquanto aguardam na fila para serem servidos.
■ Pessoal treinado para servir os alunos com gentileza, respeito, cuidado e capri-
cho na colocação da comida no prato de cada um.
■ Os alunos alimentam-se com mais calma.

PROBLEMAS
Incômodo da equipe gestora referente ao excesso de barulho e bagunça no intervalo.


■ Grande número de acidentes.


■ Desrespeito entre colegas e funcionários.
L U G A R ■ Grande número de alunos comendo em pé, sentados nas escadas, com os pratos na mão.
■ Desperdício de comida.

EMEF Prof. Alípio Corrêa Neto R E S U LT A D O S


■ Implementação do autosserviço.
PROJETO ■ Utilização de pratos de vidro, garfo e faca.
Eu posso e quero escolher
■ Acompanhamento de todos os professores e funcionários no momento da refeição,
NÚMERO DE ALUNOS para orientar os alunos em relação à quantidade de comida que colocam no prato,
480 (ensino fundamental) incentivando-os a provar novos alimentos e ter bom comportamento à mesa.
MODELO DE GESTÃO DA MERENDA ESCOLAR ■ Escalonamento do horário de almoço em 3 momentos de 15 minutos cada, para
mista (insumos provenientes da prefeitura organizar o autosserviço em um pátio pequeno.
e funcionários terceirizados) ■ Diminuição significativa do desperdício.
■ Retorno muito positivo dos alunos porque se sentem valorizados e, por isso, pas-
sam a valorizar o ambiente que lhes é proporcionado.
■ Ambiente do refeitório mais tranquilo.
■ Os estudantes se servem de comida mais variada e nutritiva.

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sabor e saúde

por_Luiza
Luiza de Andrad
Andrade

A todo o
vapor
Um dos métodos de cocção que
Nos primórdios do século 20, mu-
lheres faziam aulas de preparo para a vida
social da Virgínia, no sudoeste dos Estados
Unidos. Pois uma delas tinha o costume de contar à
sua filha, em casa, que havia uma colega que não conse-
guia, sequer, ferver água.
A filha era a escritora americana M.F.K Fisher que, em
seu primeiro livro, “Como Cozinhar um Lobo” (editora Com-
panhia das Letras), sobre a alimentação em tempos de

mais preservam a integridade dos guerra e escassez, revela que “poucas mulheres chegam a
perceber os limites vastos de pôr água na panela e fervê-la”.
alimentos (sabor e textura), o “E quando é que a água está fervendo? Pode-se dizer,
e poucos irão discordar, que a água ferve quando é aquecida
delicado cozimento no vapor também a 100ºC. De minha parte, diria que é quando borbulha com
bolhas grandes e enérgicas, parece prestes a saltar da cha-
tem capacidade de conservar leira, faz um barulho de pedregulho em vez de chiar e solta

nutrientes e dispensa qualquer tipo um bocado de vapor, a água está fervendo.”


Pois o vapor, “conjunto de partículas gasosas ema-
de gordura em seu processo nadas de líquidos, que se difundem ou ficam suspensas no
ar”, no dicionário, é capaz de promover um dos cozimentos
que mais preservam os componentes nutricionais de um
alimento – além de manter seu sabor e sua textura mais
próximos dos originais. “A principal vantagem desse método

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sabor e saúde 43

é a preservação de vitaminas hidros-


solúveis que, em uma cocção em água,
poderiam se dissolver no líquido, como
as vitaminas do complexo B e a vitamina
C, por exemplo”, diz a nutricionista Cynthia
Antonaccio, diretora da Equilibrium, consul- para mantê-las úmidas, sem saturá-las.”
toria de saúde e nutrição. Outra vantagem é a delicadeza do método: o
Por isso é recomendável, por exemplo, vapor é muito menos denso que a água e, ape-
aumentar a quantidade de sal utilizada para prepa- sar de não ser tão eficiente quanto ela, proporciona
rar legumes e verduras se forem cozidos diretamente em um cozimento mais brando e menos agressivo.
água fervente. É uma forma de “reduzir a perda de sabo- McGee ressalta que, para além da diferença de densi-
res e de substâncias nutritivas na água”, afirma Harold dade da água e do vapor – que faz com que ele tenha menos
Mc- Gee, estudioso da ciência dos alimentos, em seu “Di- contato com o alimento –, este compensa essa perda de efi-
cas para Cozinhar Bem – Um Guia para Aproveitar Melhor ciência com um ganho de energia. “É preciso grande quan-
Alimentos e Receitas” (editora Zahar). Para grãos secos e tidade de energia para transformar em gás a água líquida;
massas, que aborvem o sal mais facilmente, ele recomen- inversamente, a água gasosa libera a mesma quantidade de
da seu uso moderado. energia quando se condensa em um objeto mais frio.” Isso
O cozimento no vapor, trocando em miúdos, é um pro- quer dizer que as moléculas de vapor d’àgua “não transmi-
cesso de cocção indireta, no qual o ingrediente entra em tem ao alimento só sua energia cinética; transmitem tam-
contato apenas com o vapor de algum líquido em ebulição. O tempo bém a energia de evaporação”.
Trata-se, portanto, de um método úmido, no qual as proteínas O tempo de cocção varia de acordo com o alimento
e os açúcares dos alimentos não reagem intensamente uns de cocção (um brócolis é diferente de uma cenoura). O tamanho tam-
com os outros de forma a criar pigmentos escuros e novos varia de bém influencia: um corte grosso demora mais do que um
sabores, como nota-se, comumente, nos métodos secos de menor. O importante é que o alimento fique ‘al dente’, como
cocção, como grelhar ou fritar – quando o alimento é subme-
acordo com uma massa, diz a chef Tatiana Cardoso, do restaurante de
tido a temperaturas elevadas que estimulam essas reações. o alimento cozinha natural Moinho de Pedra.
Nesse processo de cocção indireta, que trata muito bem
de hortaliças, de peixes e de frutos do mar, sobretudo, a Interferência mínima
temperatura do vapor permanece constante e isso Segundo especialistas – físicos, quími-
permite alcançar um aquecimento uniforme, ex- cos, cozinheiros e nutricionistas – o cozi-
plica o físico Cláudio Furukawa, do Instituto mento no vapor é o método mais sau-
de Físca da USP. “Em uma panela comum, ao dável capaz de amaciar os alimentos,
contrário, a parte mais quente fica na base, que outrora eram deixados a descan-
que está em contato direto com o fogo, e sar sob o sol para que deterioras-
impede que o cozimento seja uniforme.” sem um pouco e, assim, ficassem
Somam-se à uniformidade do pro- comestíveis. Ou, ainda, eram colo-
cesso, outras vantagens desse cozimen- cados em contato com o sumo de
to, elencadas pelo americano Michael frutas ácidas, durante as caçadas,
Ruhlman em seu glossário gastronô- que tinha o efeito de amaciar a carne
mico, “Elementos da Culinária – de A a Z, fresca, como relata o historiador britâni-
Técnicas, Ingredientes e Utensílios” (editora co Felipe Fernández-Armesto em seu “Co-
Zahar). “É excelente para reaquecer comidas e mida, uma História” (editora Record).

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44 sabor e saúde

vapor para preservar o sabor de cada in-


grediente”, diz Hélio Takeda, do curso de
Gastronomia da Anhembi Morumbi. Outro
exemplo é o pão chinês, cozido no vapor
para ficar branquinho e úmido.

No Japão, país cujos cozinheiros buscam in- Mesmo sabor, mais temperos?
terferir o mínimo possível na integridade dos alimen- Parece um cozimento extremamente simples, se
tos (e extrair deles o máximo de sabor), o vapor é uma das o cozinheiro tiver à mão os instrumentos necessários para tal
formas mais tradicionais de cozimento – cumpre bem es- – uma panela com uma cesta ou um suporte improvisado que
sas funções e mantém a umidade dos produtos sem depen- mantenha o alimento acima da água. A chinesa Judy Lew, au-
der do acréscimo de óleos e gorduras. tora de “Culinária Chinesa – Fácil e Rápida” (editora Patrimonio
No restaurante Aizomê (São Paulo, SP), sob o comando Tokyo), ensina que também é possível improvisar uma “prate-
de Shin Koike, japonês que cresceu em meio ao agito do mer- leira” própria para o cozimento no vapor com uma lata – com
cado de peixes de Tóquio, utiliza-se a técnica em uma porção ambas as pontas removidas – que pode ser acomodada no
de preparos. Entre eles, a garoupa, quando está disponível no centro de uma panela ou de uma frigideira com água fervente.
mercado. “Trata-se de um peixe de carne meio fibrosa mas, ao Mas, atenção, há que se preocupar com o ponto de
ser aquecido no vapor, fica macio e continua úmido”, conta fervura da água. “A maioria das pessoas (...) não sabe que
sua sócia Telma Shimizu. Entre outras possibilidades está o existe um momento em que ela [a água] está au point e que
sakamushi, uma espécie de flan à base de ovos, receita pre- Deve-se no resto do tempo ela está passada demais, tanto quanto
parada no vapor, de resultado delicado. Outra dica de Telma atentar à um filé ou um crêpe suzette”, escreve M.F.K. Fisher.
é promover a cocção utilizando uma combinação de água e Pois o que Fisher registrou nos anos 40, em literatura,
saquê na mesma proporção. “Pode- -se preparar um frango
quantidade tem fundamento científico. Umas das orientações de Harold
inteiro nela”, diz. de água na McGee, que se debruça sobre as transformaçoes químicas
A forma clássica desse método teve origem no Orien- da cozinha, é atentar-se à quantidade de água na panela,
panela para que seja suficiente para não queimar. “Apenas alguns
te, onde se valia, basicamente, de estruturas de bambu
suspensas sobre uma panela com água fervente. “Por que segundos de fumaça do fundo da panela quente podem ar-
bambu? Porque ele é capaz de reter a umidade. O bambu ruinar o sabor do alimento.”
absorve a umidade e funciona como uma esponja”, expli- É preciso, ainda, driblar o estigma de “método sem
ca Marina Hernandez, professora da Escola Wilma graça”. “Deve-se ter bastante atenção ao tempero dos
Kövesi. Há registros que creditam a origem do alimentos antes do cozimento, utilizando ervas
cozimento no vapor à China. “É possivel que e especiarias para conferir-lhe melhor sabor.
o uso das vaporeiras de bambu pelos chi- Uma possibilidade interessante é perfu-
neses remonte a cinco mil anos”, conta mar a água que será utilizada no cozi-
o historiador Sandro Dias. mento no vapor também com ervas e
Na China, um exemplo emblemá- especiarias”, diz Roland Villard, chef
tico de receita que utiliza esse recurso francês do Le Pré Catelan, do hotel So-
é o guioza (ou guo tie), recheado com fitel, do Rio, autor de “A Dieta do Chef”
carne de porco, repolho, acelga, nirá (editora Senac).
e temperos. “Colocamos o recheio em Para chef Tatiana Cardoso, “quando
uma massa, fechamos e cozinhamos no você tira o alimento do vapor e lambuza

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sabor e saúde 45

com um azeite, um vinagrete, um vi-


nagre especial ele fica bem mais in-
teressante”. Ela também recomenda
servir os alimentos cozidos no vapor
na companhia de grãos, arroz e massa
sempre bem temperados, de tal sorte
que haja um equilíbrio de sabor e crie um recurso que aqueles homens adaptaram”,
contraste de textura no prato. diz Sandro Dias, professor de história da
Para a professora Marina Hernandez, o gastronomia do Senac. “Há pelo menos 10 mil
acréscimo de molhos pode dar personalidade aos anos na América, inclusive no que é o Brasil hoje,
preparos no vapor, que, diferentemente de outros méto- principalmente no litoral, populações autóctones já usa-
dos, como chapear, não agregam complexidade de sabores vam essa técnica no moquém. Elas envolviam o alimento
ao longo de sua elaboração.
O papillote em uma folha grande e faziam o cozimento em seu sumo.”
Esse método de cozimento passou a ser valorizado, infla quando Moquém, para esclarecer, trata-se do fogão indígena,
no entanto, com o movimento da nouvelle cuisine. Encabe- de formato triangular: uma grade de paus em forma de gre-
o cozimento
çado por chefs como Auguste Escoffier (1846-1935) nos lhas é disposta suspensa sobre o fogo. Moquear, portanto,
anos 70 na França, promovia justamente o oposto: a valori- está pronto significa assar carne ou peixe em um moquém de tal sorte
zação do sabor original dos alimentos, os cozimentos rápi- que não se trata de um cozimento no vapor. Dias fez refe-
dos sem adição de gordura, a preservação das texturas, as rência ao moquém, pois, sobre ele, também se acomoda-
apresentações simples. vam alimentos embalados em folhas que reproduziam, de
maneira rústica e primitiva, o que hoje chamamos de pa-
Homem primitivo pillote, recurso que também faz uso do vapor.
Muito provavelmente, essa técnica de cozimento foi O cozimento em papillote pressupõe que o alimento seja
uma das primeiras descobertas pelo homem primitivo. Ele hermeticamente embrulhado e, depois, submetido ao calor. Ele
pode ter se apropriado do vapor das águas termais – a água se vale do vapor, mas, no duro, também aproveita um pouco
quente que brota dos geiseres, de solo vulcânico, era utiliza- de gordura, pois o alimento, segundo a orientação francesa,
da, entre outros fins, para cozer os ovos perfeitos, hoje popu- deve ser embalado em papel-manteiga untado. O objetivo, se-
larizados pelo mundo. São aqueles ovos cuja gema é cremosa gundo ensina a “Enciclopédia da Gastronomia Francesa” (edi-
e a clara, macia, que, nos tempos modernos, são cozidos a tora Agir)”, é produzir uma troca aromática entre a guarnição
baixa temperatura por tempo extendido. No restaurante Maní e o ingrediente principal (embrulhados juntos) e garantir que
(São Paulo, SP), por exemplo, os ovos perfeitos são cozidos a o conjunto adquira uma consistência tenra. “Sabe-se que o
63ºC de uma hora e meia a duas horas no roner, um termosta- cozimento está pronto quando o papillote infla devido ao va-
to usado para cozinhar alimentos em baixa temperatura. por produzido pelos alimentos em seu interior.” E, para que o
“Claro que não podemos chamar isso de técnica de comensal desfrute plenamente dos vapores aromatizados, ele
cozinha [o cozimento no vapor dos geiseres], mas é um mesmo deve abrir o papillote, à mesa. No úlitmo instante.

[1] 400 g - Técnicas de Cozinha, de Betty Kövesi, Carlos Siffert, Carole Crema, Gabriela Martinoli; [2] Comida - Uma Historia, de Felipe Fernandez-Armesto; [3] Comida & Cozinha - Ciência
REFERÊNCIAS e Cultura da Culinária, de Harold McGee; [4] Como Cozinhar um Lobo, de M.F.K. Fisher; [5] Culinária Chinesa - Fácil e Rápida, de Judy Lew; [6] Dicas Para Cozinhar Bem - Um Guia Para
Aproveitar Melhor Os Alimentos e as Receitas, de Harold McGee; [7] A Dieta do Chef, de Roland Villard; [8] Elementos da Culinária de A a Z - Técnicas, Ingredientes e Utensílios, de Michael
Ruhlman; [9] Larousse Gastronomique, com assistência do comitê gastronômico presidido por Joël Robuchon; [10] Pegando Fogo - Por Que Cozinhar nos Tornou Humanos, de Richard
Wrangham; [11] A Arte Da Cozinha Brasileira, de Leonardo Arroyo e Rosa Belluzzo; [12] Enciclopédia da Gastronomia Francesa, de Vincent Boué, Hubert Delorme; [13] Alquimia dos
Alimentos, organização de Wilma M.C. Araújo, Nancy di Pilla Montebello, Raquel B.A. Botelho e Luiz Antônio Borgo.

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leitura crítica

O café da manhã e o
risco para doenças
cardiovasculares
Um café da manhã Em meados de 1900 começaram a to de Nutrição da Escola de Saúde Pública
surgir na literatura científica pequenos de Harvard, verificou prospectivamente a
equilibrado pode estudos encontrando os benefícios para a relação da presença do café da manhã e o
auxiliar na adoção de saúde relacionados a ingestão do café da aumento do risco cardiovascular. Os au-
manhã. Nos dias atuais esta refeição é co- tores monitoraram as condições de saúde
hábitos alimentares mumente citada como parte fundamental de 26.902 profissionais da área da saú-
saudáveis no de uma dieta saudável; no entanto, estima- de do gênero masculino durante 16 anos
-se que nos Estados Unidos, por exemplo, (1992 e 2008), com idades entre 45 e 82
restante do dia cerca de 8% das crianças e 20% a 30% dos anos, sem histórico de eventos cardiovas-
adolescentes não comem nada nas primei- culares. Os pesquisadores avaliaram o há-
ras horas do dia. bito alimentar, incluindo o consumo do café
De acordo com a recomendação bra- da manhã e o lanche da tarde e da noite, por
sileira, o café da manhã deve garantir em meio de um questionário de frequência ali-
média 25% do total energético consumido mentar aplicado no ano de 1996 aos parti-
durante o dia, ou seja, cerca de 500Kcal. cipantes da coorte.
Considerando a importância e as vantagens Além dos hábitos alimentares, o es-
do seu consumo adequado, o café da ma- tudo de Cahill coletou informações sobre
nhã poderia ser responsável pelo consumo hábitos de vida, tais como: assistir televi-
de algumas ou de todas as porções diárias são, praticar atividade física, qualidade do
de alguns grupos alimentares, como o dos sono e da dieta, histórico médico, índice
cereais integrais, o das frutas, e o do leite de massa corporal (IMC) e fatores sociais.
e derivados. Mesmo após a realização dos ajustes para
O estudo recentemente publicado por as variáveis de estilo de vida e IMC, não
Leah Cahill e colaboradores do Departamen- foi detectada associação entre frequência

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leitura crítica 47

alimentar diária e o risco para doença car- feição em presente ou ausente, limitando a tos) e este comportamento foi fortemente as-
diovascular. investigação qualitativa e a sua composição. sociado ao risco de síndrome metabólica (OR
Os homens que não consumiam café da Em outro trabalho desenvolvido pela 2.25; 95% CI 1.43). Dentre os componentes
manhã encontravam-se no grupo dos mais Universidade de Umeå, na Suécia, publicado da síndrome metabólica, a obesidade abdo-
jovens, fumantes, com hábito de consumir be- na Public Health Nutrition, a associação do minal e altos níveis de glicose foram os fa-
bida alcoólica, solteiros, menos ativos fisica- café da manhã e complicações metabólicas tores que mais se associaram a ausência ou
mente e que trabalhavam em horário integral foi investigada. Diferentemente da pesqui- insuficiência nutricional no café da manhã.
– apresentando um risco 27% maior de desen- sa de Cahill, esta pesquisa foi realizada em Destacamos a importância dos hábitos
volver doenças cardiovasculares. adolescentes e não considerou somente pre- alimentares na infância e na adolescência,
Há uma série de mecanismos plau- sença ou ausência de café da manhã, mas com baixa ingestão de frutas e legumes, la-
síveis que podem explicar como o café da também, a composição da refeição. ticínios, cereais integrais e consumo elevado
manhã poderia melhorar os fatores agudos Esta pesquisa começou em 1981, com de açúcares e gorduras. Isto determina a pos-
e de longo prazo relevantes para o risco 889 voluntários, quando foi realizado um sibilidade de inúmeros fatres de risco para a
cardiovascular e metabólico. A hora do dia questionário sobre o que eles consumiam no síndrome metabólica na vida adulta, como foi
e a frequência de alimentação, bem como o café da manhã. Vinte e sete anos depois, os avaliado no estudo acima.
conteúdo, têm efeitos independentes impor- mesmos pesquisados foram submetidos a A definição de hábitos de café da ma-
tantes sobre o consumo de energia, composi- exames clínicos para investigação dos com- nhã foi baseada em uma avaliação de um
ção da dieta, e a resposta hormonal que são ponentes da síndrome metabólica: obesidade único dia podendo diminuir a precisão da
fundamentais para o equilíbrio energético e, central definida como circunferência da cin- medida levando à diluição dos dados e pos-
portanto, o desenvolvimento da adiposidade. tura maior que 80 cm para mulheres e 94 cm sível subestimação. Contudo, as conclusões
Uma consideração importante é que o para homens, associado a dois ou mais dos são unânimes e podem justificar a orien-
conteúdo da refeição e a qualidade dos ali- quatro componentes a seguir: aumento dos tação de que um café da manhã saudável
mentos que a compõe desempenham um triacilgliceróis, HDL-c reduzido, aumento da pode ajudar na adesão a bons hábitos ali-
papel importante nos fatores relacionados ao pressão arterial, aumento da glicemia em je- mentares durante o resto do dia, por meio
apetite, hormônios como a glicose e insulina jum ou diabetes tipo 2. do equilíbrio da glicemia pós-prandial e in-
e no metabolismo lipídico. Porém a interpreta- O estudo mostrou que 9,9% dos jovens gestão energética equilibrada.
ção frequente do consumo do café da manhã aos 16 anos não costumavam tomar café da
é dicotomizada nas pesquisas populacionais. manhã ou tinham uma refeição insuficiente Conheça maiores detalhes sobre os estudos
abordados nesse Leitura Crítica.
Assim, a maioria dos estudos avaliam a re- (só consumiam uma bebida doce ou biscoi-

[1] Cahill LE et al. Prospective Study of Breakfast Eating and Incident Coronary Heart Disease in a Cohort of Male US Health Professionals. Circulation, 128:337-343, 2013.
[2] Wennberg M et al. Poor breakfast habits in adolescence predict the metabolic syndrome in adulthood. Public Health Nutrition, 2014.

Priscila Maximino - Nutricionista, Especialista em Atendimento Multidisciplinar do Adolescente e Mestre em Ciências. Atua como pesquisadora do centro de
dificuldades alimentares do Instituto de Pesquisa e Ensino em Saúde Infantil PENSI - Hospital Infantil Sabará e como nutricionista da Nutrociência Assessoria em
Nutrologia.
Abykeyla Tosatti - Nutricionista, Especialista emAtendimento Multidisciplinar do Adolescente e Pós- Graduada emObesidade e Emagrecimento. Atua como
pesquisadora do centro de dificuldades alimentares do Instituto de Pesquisa e Ensino em Saúde Infantil PENSI - Hospital Infantil Sabará e como nutricionista da
Nutrociência Assessoria em Nutrologia.
Mauro Fisberg - Pediatra e nutrólogo, professor associado do Setor de Medicina do Adolescente da UNIFE SP e do Centro de Nutrologia do Instituto de Pesquisa e
Ensino em Saúde Infantil do Hospital Infantil Sabará. Coordenador científico da Força Tarefa Estilos de Vida Saudável e membro da diretoria do ILSI (International
Life Science Institute) Brasil.

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