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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS


DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL
CURSO DE SERVIÇO SOCIAL

PORNOGRAFIA E MORAL SEXUAL NO BRASIL: UM ESTUDO A PARTIR


DO FENÔMENO DO “CAIU NA NET”.

LUANNY DO NASCIMENTO MEIRELES

NATAL/RN

2014
LUANNY DO NASCIMENTO MEIRELES

PORNOGRAFIA E MORAL SEXUAL NO BRASIL: UM ESTUDO A PARTIR


DO FENÔMENO DO “CAIU NA NET”.

Monografia apresentada ao curso de


Serviço Social da Universidade Federal do
Rio Grande do Norte - UFRN como
requisito para a obtenção do título de
Bacharel em Serviço Social.

Orientadora: Profª. Drª Antoinette


de Brito Madureira.

NATAL/RN

2014
FICHA DE APROVAÇÃO

LUANNY DO NASCIMENTO MEIRELES

PORNOGRAFIA E MORAL SEXUAL NO BRASIL: UM ESTUDO A PARTIR


DO FENÔMENO DO “CAIU NA NET”.

Monografia apresentada ao curso de Serviço Social da Universidade


Federal do Rio Grande do Norte para Comissão Examinadora formada
pelos professores:

Aprovado em: ____/____/______.

Banca Examinadora

__________________________________________________

Profª. ANTOINETTE DE BRITO MADUREIRA (Orientadora)

__________________________________________________

Profª. CARLA MONTEFUSCO DE OLIVEIRA (Membro)

__________________________________________________

Profª. ELIZÂNGELA CARDOSO DE ARAUJO SILVA (Membro)


Dedico esta conquista aos meus pais,
por todo o apoio.
Se esse amor
Ficar entre nós dois
Vai ser tão pobre amor
Vai se gastar

Se eu te amo e tu me amas
Um amor a dois profana
O amor de todos os mortais
Porque quem gosta de maçã
Irá gostar de todas
Porque todas são iguais

Se eu te amo e tu me amas
E outro vem quando tu chamas
Como poderei te condenar
Infinita tua beleza
Como podes ficar presa
Que nem santa num alta
[...]

Raul Seixas – A Maçã.


AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, por todas as oportunidades que colocou no


meu caminho. Tudo se encaixou perfeitamente, não poderia ser outra coisa além da
providência divina. Não sei se posso chamar essa minha constante esperança de fé, mas
o simples acreditar tomou formas incríveis.

Agradeço aos meus pais, Luciene e Amaury por me apoiarem


independentemente das dificuldades, pelo amor e paciência. Obrigada mãe! Por falar
sempre que tudo daria certo. Agradeço também aos meus tios Amanda e Enock, por
todo o carinho, meu irmão e meus primos. Nem com todas as palavras lindas
conseguirei demonstrar meus eternos agradecimentos, amo vocês!

Agradeço ao meu amado, Karlisson, por todo o carinho, paciência e o apoio de


todas as formas, por ter estado sempre ao meu lado. Obrigada por tudo me ofereceu, a
família, o lar, o conforto, os amigos e o ombro. Em tudo que conquistei nesse período
da graduação e, o que conseguirei em diante, terá um beijo seu. Agradeço a Telma e
Henrique, as pessoas mais solidárias que conheci. Trataram-me como uma filha. Sonho
em um dia retribuir na mesma medida. Todos tornaram a minha vida incrível e mais
fácil, me proporcionaram muita paz.

Agradeço aos meus amigos, alguns de longas datas, outros pelo intenso carinho,
Obrigada! Thalyta, Mariana, Thamirys, Deyriane por todas as risadas e momentos que
passamos juntas, a distância não será capaz de apagar. Lucas Bezerra, meu amigo de
todas as horas, com quem compartilho muitas emoções. Vasquez, Alexandre, sou grata
pelas alegrias, pelos momentos incríveis. Hallrison agradeço pelos momentos
divertidos, reflexivos e por ter me perguntando o que penso sobre o “caiu na net”.
Eduarda, Cecília, Ilana, Márcia, Carol, Allysson, Rogério, sem dúvida alguma vocês
marcaram a minha vida. Christiane, Gabrielli, Myrthes, obrigada pelos abraços, pelos
conselhos, por todo o carinho.

Agradeço a minha querida orientadora, Antoinette, pela enorme paciência, por


me atender sempre que precisei, por tentar compreender os parágrafos mais
indecifráveis. Esse trabalho só tomou a forma em que se encontra devido a sua
dedicação e conhecimento. Sou sua fã!

Obrigada! A todas as minhas colegas de turma, pelos momentos especiais,


engraçados e difíceis, vivenciei esse período com muita intensidade. Agradeço a todas
as professoras que me acompanharam em sala de aula. Sou muito grata a minha
supervisora de estágio Rose Marrie, e supervisora de campo Dalva Horácio, duas
profissionais que admiro muito.

Enfim, agradeço a todos que participaram direta ou indiretamente desta


conquista.
RESUMO

Monografia de conclusão de curso de graduação em Serviço Social elaborada a partir de


pesquisa observacional sobre casos do fenômeno “caiu na net”. Foi realizada no campo
virtual – ciberespaço – no período de maio a novembro de 2014. Tem como objetivo
levantar e analisar questionamentos a respeito de concepções sobre sexualidade,
casamento, misoginia, erotismo, pornografia, responsabilidade e moral, temas que
giram em torno do fenômeno em questão. Compõe-se de estudos bibliográficos que
examinam a construção das concepções de sexualidade, gênero e moral no Ocidente,
elementos estes que norteiam a construção da família nuclear patriarcal burguesa. Foi
também realizada uma pesquisa observacional no campo virtual, analisando dois casos
de "Caiu na Net": O "Caso Fran" e o "Caso Fabi", que tratam de duas jovens mulheres
vítimas da exposição indesejada de seus corpos. O trabalho argumenta que os dois casos
são atravessados por prescrições morais na qual as vítimas são culpabilizadas e
culpabilizam a si próprias. Dessa forma, dentro desse fenômeno foram encontradas
novas interpretações para as concepções de valores morais, bem como a forte atuação da
misoginia e da mercantilização dos corpos e prazeres, atuando fundamentalmente sobre
o feminino. Apresento neste trabalho, como o prazer, a liberdade e a repressão sexual
estão presentes nos mesmos instrumentos, transformados juntamente aos ideais
socioeconômicos das sociedades burguesas.

Palavras-chave: Sexualidade. Moral. Pornografia. Responsabilidade.


ABSTRACT

Final monograph for graduation degree in Social Service elaborated from observational
research on the phenomenon cases "fell into the net." Was performed in the virtual field
- cyberspace - from May to November 2014. It aims to survey and analyze questions
about concepts of sexuality, marriage, misogyny, eroticism, pornography, and moral
responsibility, issues that surround the phenomenon concerned. Composed of
bibliographic studies examining the construction of conceptions of sexuality, gender
and moral in the West, these elements that guide the construction of bourgeois
patriarchal nuclear family. An observational study was also performed in the virtual
field, analyzing two cases of "fell on the Net": The "Fran Case" and "Fabi case", dealing
with two young women victim of unwanted exposure of their bodies. The paper argues
that the two cases are crossed by moral prescriptions in which the victims are blamed
and blaming themselves. Thus, in this phenomenon were found new interpretations to
the concepts of moral values and the strong performance of misogyny and
commodification of bodies and pleasures, acting mainly on the female. I present this
work as pleasure, freedom and sexual repression are present in the same instruments,
processed together with socioeconomic ideals of bourgeois society.

Keywords: Sexuality. Morale. Pornography. Responsibility.


LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 - Fotografia entre os séculos XIX e XX


FIGURA 2 - Fotografia entre os séculos XIX e XX
FIGURA 3 – Fotografia entre os século XIX e XX
FIGURA 4 – Pintura do Barão Von Bayros no começo do século XX.
FIGURA 5 – Pintura de Balthus “La leçon de Guitare” (1934)
FIGURA 6 – Fotografias de 1906
FIGURA 7 – Samba carnavalesco “Sae Piroca” da década de 20
FIGURA 8 – Música Carnavalesca “Na Minha casa não se racha lenha” de 1920
FIGURA 9 - Revista Peteca edição n°1/76
FIGURA 10 – Revista CAPRICHO sobre fotonovelas de 1952
FIGURA 11 – Revista CAPRICHO de 1993
FIGURA 12 – Revista CAPRICHO de 2014
FIGURA 13 – Matéria sobre virginda no Site da CAPRICHO
FIGURA 14 – Revista Carícia de 1991
FIGURA 15 – Revista NOVA de 1973
FIGURA 16 – Revista NOVA de 1987
FIGURA 17 – Revista NOVA de 1989
FIGURA 18 – Revista NOVA de dezembro de 2013
FIGURA 19 – Categorias do site pornográfico Red Tube
FIGURA 20- Site pornográfico brasileiro – Pornô Carioca
FIGURA 21 - Site Pornô Carioca – Vídeos
FIGURA 22 - Site Pornô Carioca – Vídeos
FIGURA 23 – Página do Facebook “Exibicionismo de Whatsapp”
FIGURA 24 – página do Facebook para “sexting” no Brasil
FIGURA 25 – Página de “caiu na net” no Facebook
FIGURA 26 – Campanha Safernet Brasil
FIGURA 27 – Fran e o gesto
FIGURA 28 – Pessoas repetindo o gesto de Fran nas redes sociais
FIGURA 29 – Cantor Leonardo repetindo o gesto de Fran
FIGURA 30 – Piadas com o gesto Fran
FIGURA 31 – Imagem da notícia.
FIGURA 32 – Comentários caso Fabi
FIGURA 33 – Comentários caso Fabi
FIGURA 34 – Comentários caso Fabi
FIGURA 35 – Comentários caso Fabi
FIGURA 36 – Comentários caso Fabi
FIGURA 37 – Comentários caso Fabi
FIGURA 38 – Comentários caso Fabi
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 12

2 SEXUALIDADE E MORAL BURGUESA .............................................................. 14

2.1. Sexo, casamento e misoginia na Idade Média ......................................................... 14

2.2 Foucault: “nós, vitorianos” ....................................................................................... 23

3 SEXO, FAMÍLIA E MORAL SEXUAL NO BRASIL .............................................. 32

3.1 Sexualidade no Brasil contemporâneo: em torno da responsabilidade sexual ......... 40

4 PORNOGRAFIA E OCIDENTE ................................................................................ 41

4.1 Pornografia no Brasil ................................................................................................ 50

5 O FENÔMENO DO "CAIU NA NET”....................................................................... 75

5.1. O Caso Fran ............................................................................................................. 79

5.2 O Caso Fabi .............................................................................................................. 82

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 91

7 REFERÊNCIAS .......................................................................................................... 93
12

1 INTRODUÇÃO

Esse trabalho monográfico é resultado de um estudo teórico e observacional a


partir do universo da internet, que buscou apreender a relação entre a pornografia, o
sexo e o erotismo brasileiro. Tomo como ponto de partida a indagação central de como
o fenômeno do "caiu na net" fala ambivalentemente de pornografia e moral, no Brasil.

O fenômeno do “caiu na net” representa a divulgação de qualquer conteúdo


íntimo, disponibilizado na rede mundial de computadores1 ou compartilhado por meio
de celulares, com ou sem o consentimento dos envolvidos. Quando o arquivo íntimo
(foto, vídeo, texto e etc) é divulgado no campo virtual, este adentra o cibespaço, a
cibercultura, passa a ter acesso livre, devido a conduta dos indivíduos em lidarem com a
imagem do outro, do descontrole gerado na internet pela falta de segurança de alguns
instrumentos virtuais, bem como, pelo crescimento e popularização deste meio e sua
cultura própria2.

O objetivo de optar por este tema nasceu de alguns casos recentes de “caiu na
net”, devido a sua polêmica, crescimento e intensidade. A análise se fundamenta em
autores como Foucault (1988), Parker (1991), Rios (2008), DaMatta (1986), Fonseca
(2013), Winckler (1983), dentre outros.

Tomando a história da sexualidade, das concepções do gênero feminino e dos


materiais erótico-pornográficos como ponto de partida, busco compreender o fenômeno
do “caiu na net” como reflexo da construção histórica da sexualidade no Brasil.

1
Internet.
2
2 Conforme Lemos (2007), a internet é um instrumento “desterritorializante”, envolvendo aspectos:
Conforme Lemos (2007), a internet é um instrumento “desterritorializante”, envolvendo aspectos:
político (pelo acesso e ações além das fronteiras), econômico (devido a circulação financeira mundial),
cultural (consumo de bens simbólicos mundiais) e subjetivo (formação do sujeito sob influências globais).
O desenvolvimento da cibercultura (cultura do meio virtual) inicia com a micro-informática (anos 1970),
com o estabelecimento do personal computer – PC (Computador Pessoal). As décadas 1980-1990
marcam a popularização da internet e a conversão do PC em CC – Computador Coletivo. O
desenvolvimento da computação móvel, com a era dos computadores coletivos móveis (CCM), que está
em curso, envolvendo a telefonia 3G, redes wi-fi, bluetooth, dispositivos que criam os fenômenos de des-
re-territorialização, diante da interface entre espeço físico e espaço eletrônico. (LEMOS, 2007, pág.
06/10).
13

A pesquisa observacional possibilitou análises a dois casos de jovens mulheres


que tiveram seus corpos e detalhes íntimos de suas vidas publicadas na internet: o “Caso
Fran” e o "Caso Fabi", dois casos emblemáticos, se considerarmos suas consequências,
como veremos no decorrer deste trabalho. Para isto, trato de uma moral sexual que
perpassa os casos apresentados, que são frequentes nos dias atuais, situando o sexo e o
corpo feminino enquanto lugares devastadores da moral.

Nesse sentido, no primeiro capítulo intitulado “Sexualidade e Moral Burguesa”,


trago inicialmente aspectos históricos sobre “Sexo, Casamento e Misoginia na Idade
Média” na construção do papel de inferioridade da mulher, fundamentada em
concepções dos fisiologistas e da Igreja Católica ocidental. No tópico “Foucault: Nós,
vitorianos” utilizo o autor em questão para compreender as formas que a sexualidade foi
tomando ao longo da história no ocidente.

No segundo capítulo “Sexo, família e moral sexual no Brasil”, falo desde o


descobrimento do Brasil, suas impressões aos colonizadores e como o país recebeu e
adotou as mudanças trazidas pela burguesia no seu processo de consolidação. Em
“Sexualidade no Brasil contemporâneo: em torno da responsabilidade sexual”, discuto a
relação entre religião cristã ocidental e o discurso da saúde sobre as concepções de
responsabilidade social.

No terceiro capítulo que trata da “Pornografia no Ocidente” analiso como a


pornografia esteve voltada à crítica da vida social e como se transformou na forma dos
dias atuais. Este capítulo abarca o tópico “Pornografia no Brasil”, mostrando como se
configura a pornografia especificamente na nossa realidade brasileira e quais elementos
históricos carrega, expondo produtos frutos da conduta sexual idealizada no país, bem
como, materiais pornográficos valorizados socialmente sobre influências globalizadas.

No quarto capítulo intitulado “O Fenômeno do “Caiu na Net” apresento conceitos


que permeiam esse fenômeno, como também exemplos concretos de como acontece e
quais instrumentos utilizados. Mais a frente, em “Casos Analisados” discuto os dois
casos utilizados como centrais na pesquisa, o “Caso Fran” e o “Caso Fabi”.
Estabelecendo um diálogo entre Foucault e os valores atuais da sociedade ocidental
como “respeito”, “moral”, “erotismo”, trago algumas conclusões sobre o fenômeno no
qual trata este trabalho.
14

2 SEXUALIDADE E MORAL BURGUESA

2.1. Sexo, casamento e misoginia na Idade Média

A Idade Média3 foi o período de grande destaque para as ações da Igreja Católica
ocidental, que dominou os aspectos morais e espirituais dos indivíduos, influenciando
principalmente nas concepções de sexo, casamento e gênero, conforme os diversos
autores utilizados ao longo deste trabalho.

A desigualdade de gênero se manifesta principalmente sobre as mulheres, como


resultado de uma construção histórica derivada da misoginia, e presente nos dias de
atuais quando o nojo, o repúdio ao feminino se manifesta. A misoginia aparece
principalmente nos discursos religiosos da Igreja da Idade Média, um dos momentos na
história do Ocidente que representa a grande submissão das mulheres. O sexo era
negativizado pela Igreja, por ser “carnal”, contrário à espiritualidade. Diante disso,
foram instituídas certas formas de se fazer sexo, o local e, com quem poderia ser
praticado. Regras foram estabelecidas nesse período e se enraizaram ao longo da
história, e ainda que tenham mudado, compõem elementos da cultura até hoje.

Retrocedendo na história, fundamentos do pensamento da Idade Média,


principalmente a respeito da misoginia, tem-se os postulados de Aristóteles (384-322
a.C.)4, de grande importância para a ciência, repercutindo na construção da imagem
feminina, no pensamento de vários teóricos religiosos, na filosofia e literatura da época
medieval. Este filósofo clássico apresenta teorias sobre o sêmen, a menstruação, a
mulher no processo da procriação, matéria, corpo e alma.

3
A Idade Média compreende o período do século V ao XV. Percorre a queda do Império Romano do
Ocidente (476) e a ascensão do capitalismo sobre o sistema feudal, marcando a passagem para a Idade
Moderna. (NOVA ENCICLOPEDIA BARSA, 2000, pág. 515.).
4
Os postulados de Aristóteles (encontrados em De generatione animalium) trouxeram considerações a
respeito da procriação das espécies dos animais e do gênero humano. Tais estudos tiveram grande
destaque, principalmente sobre as teorias a respeito da fisiologia feminina, sendo fundamentais na
formação da misoginia, influenciando o pensamento filosófico, mais fortemente na idade média.
(FONSECA, 2013, p. 75).
15

Conforme desenvolvido por Aristóteles, o sêmen seria a propriedade formadora


da vida, fortemente nutritiva, produzida pelo macho devido à sua natureza calorífera.
Enquanto que a fêmea seria a parte passiva da produção, pois é naturalmente fria,
incapaz de produzir o nutriente essencial para a procriação, fornecendo apenas a
matéria, sem o composto da alma (existente somente nos machos). O fraco potencial da
fêmea é a causa do nascimento de machos deformados (outros descendentes do sexo
feminino). O sêmen desta seria o sangue menstrual, um fluido fraco e desprovido de
nutrientes, resultado de um processo defeituoso da formação, no qual apenas as fêmeas
poderiam gerar outras fêmeas. A menstruação representava o sujo, o impuro do corpo
feminino, para a filosofia, a religião e a moral. (FONSECA, 2013, p. 76-77).

Crenças e teorias percorriam o corpo das mulheres, apontavam que a mulher em


período menstrual poderia envenenar crianças pequenas com os olhos, ou que o sexo
faria o homem envelhecer mais cedo. Aristóteles e Galeno (131 – 201)5 definiam o
sêmen do macho como um sangue refinado, diante dessa concepção médicos e
fisiologistas medievais, supunham que a frequente atividade sexual com mulheres
poderia reduzir a vitalidade do sangue masculino, prejudicando o cérebro e os olhos. À
mulher era estabelecido um poder danoso, capaz de seduzir, corromper e danificar a
perfeição da sexualidade masculina. (FONSECA, 2013, p. 77-78).

Adentrando no período medieval, os postulados aristotélicos tiveram fundamental


influência nas produções filosóficas desse período, como bem exemplificam Santo
Anselmo (1033-1109) e São Tomás de Aquino (1225 – 1274). Este último teve grande
destaque por tratar da inserção do Pecado Original no mundo, discutindo a inferioridade
do gênero feminino. Concordava com as ideias aristotélicas de que a mulher era um
macho defeituoso, mas deveria ser reconhecida como uma criação de Deus, conforme
seus princípios cristãos o Criador não cometia erros. No entanto, devido a dita
inferioridade da mulher em relação ao homem, Aquino defendia que esta deveria ser
submissa. (FONSECA, 2013).

5
O médico Galeno (131 – 201) escreveu notáveis estudos sobre medicina e anatomia. Concordante com a
teoria da fisiologia dos sexos de Aristóteles, Galeno compreendia o reduzido calor do corpo feminino a
explicação para a internalização dos seus órgãos reprodutivos, entendendo essa causa como naturalmente
necessária para acolher o feto, uma função essencial na reprodução. (FONSECA, 2013).
16

Isso nos lembra os escritos de Ortner (1979) que discute criticamente sobre como
a cultura é representada como superior à natureza e também as mulheres são
simbolicamente associadas à natureza, enquanto os homens à cultura. Sob esta
interpretação as mulheres seriam "naturalmente" inferiores aos homens. (ORTNER,
1979, p. 101).

Ora, é dito que as mulheres estão próximas à natureza, principalmente pelos


fatores fisiológicos. Primeiramente, por possuírem um papel essencial na reprodução da
espécie, atuam na reprodução durante um período de tempo maior em relação aos
homens, seu corpo se adapta em função do feto, prejudicando muitas vezes a sua própria
saúde. Enquanto as mulheres criam seres vivos e reproduzem a espécie, os homens, por
sua vez, criam objetos duradouros, frutos da criatividade no meio externo, através dos
símbolos e das tecnologias. O que explica como a caça e a luta, por exemplo, elementos
de destruição são mais valorizados que a criação da vida (pelas mulheres), devido o fato
de a luta e a caça representarem frutos da cultura, enquanto que a procriação é simples
fruto da natureza. (ORTNER, 1979, p. 102).

As mulheres são socializadas para atuarem em papéis sociais considerados


inferiores aos dos homens. Assim, às mulheres, é dito, lhe dão dessa forma “estrutura
psíquica” diferenciada, mais direcionada ao sentimentalismo. Precisam amamentar
dedicando-se aos filhos, cuidando deles e orientando-os durante a infância até a
passagem para a sua configuração como seres culturais (fortemente no caso dos
homens), dessa forma seu lugar é destinado ao ambiente doméstico, ao lar. As crianças
são intimamente ligadas à natureza, por não serem seres sociais completos, e as
mulheres são ligadas as crianças, assim mantém o seu elo com a natureza. Devido aos
homens não estarem presos ao lar, ao estrito campo da família, auxiliam na criação de
outros processos da cultura, como a religião e a politica. Os homens são identificados à
cultura pelo pensamento humano, elevado as leis, a religião, e as artes. (ORTNER,
1979, p. 107-109).

Conforme Ortner, a mulher é socializada para ter um padrão comportamental mais


rigoroso e conservador do que os homens, e diante das limitações na sua vida adulta
isso será intensificado. O conservadorismo do pensamento feminino, criado pela
sociedade, é o pior modo de restrição social, destinado a sua importante participação na
função de gerir e formar seres bem socializados. (ORTNER, 1979, p. 115).
17

Em síntese, Ortner traz a crítica de que a mulher não está mais próxima ou mais
distante da natureza do que o homem, pois ambos raciocinam e ambos são mortais,
carnais. Os aspectos físicos, sociais e psicológicos, da situação em que se encontra o
feminino, contribuem para que o seu lugar de proximidade à natureza seja incorporada
em formas institucionais, lembrando sua situação culturalmente estabelecida. Para
mudar esse quadro, tanto homens quanto mulheres devem ser envolvidas igualmente em
processos de “criatividade” e “transcendência”, assim as mulheres serão associadas à
cultura no progresso da cultura com a natureza. (ORTNER, 1979, p. 118).

Retomando ao período medieval, o pensamento misógino filosófico religioso,


passa para o literário, no qual destacam-se as Etymologiae (século VII) de Santo Isidoro
de Sevilha (560 – 636), o estudo enciclopedista mais completo da Idade Média.
Trazendo para o campo da linguagem, as mesmas concepções que Aristóteles,
disseminando as ideias de inferioridade feminina, principalmente, sobre o sangue
menstrual. Os postulados de Aristóteles e Santo Isidoro deixam claro, como o
pensamento da Idade Média, concebeu os ideais fisiologistas (fundamentos biológicos),
para os fundamentos da moral. (FONSECA, 2013).

Para os teólogos cristãos, as mulheres eram consideradas a tentação dos homens,


estas eram determinadas como fracas e pecadoras, levando os homens ao desvio da
conduta religiosa, por tais características consideradas inferiores a eles. Alguns
pensadores argumentavam com base na Bíblia, apresentando o livro do “Génesis”, no
qual, Eva aparece como a incitadora do pecado de Adão6. Na Idade Média a
inferioridade da mulher era normalmente aceita, os teólogos da igreja desenvolveram
teorias sobre essa condição da mulher, sendo ela herdeira de Eva, o centro do Pecado
Original, objeto do diabo. A inferioridade era demostrada pelos pensadores da igreja, os
médicos, e cientistas, naturalizando esta posição da mulher na sociedade. (RICHARDS,
1993, p. 36).

6
Em Gênesis, Eva tentada pela serpente levou Adão a cometer o pecado, sendo assim castigada pela
maldição de Jeová “Darás a luz a teus filhos na dor” – conforme (DUBY, Georges; PERROT, Michelle,
1990 – Citado em Insaurriaga e Jardim, 2011). No século III, o repúdio cristão ao sexo feminino também
aparece nas palavras de Tertuliano “tu és a porta do diabo, tu consentiste na sua árvore, fostes a primeira a
desertar da lei divina” – Conforme (RIVAIR, 2002. Em INSAURRIADA E JARDIM, 2011).
18

Tal visão sobre as mulheres tem base nos moldes em que o saber da idade média7
se construiu, no qual o conhecimento intelectual sobre a sociedade era posto nas mãos
dos Clérigos, Monges e Sacerdotes, estes pensavam e explicavam a vida social pelos
fundamentos religiosos. Vivendo enclausurados, para o celibato, eram os responsáveis
pelos escritos sobre as mulheres, mesmo sem ter convívio com elas. Os clérigos, no
início da idade média, podiam ter relações sexuais com as mulheres, mas aconselhados
a manterem-se longe delas. Apenas com as reformas gregorianas 8, o casamento foi
proibido para os religiosos.

Foram atribuídos, pela igreja, vários dogmas em relação ao corpo, ao sexo, como
uma forma de controle aos indivíduos considerados culpados, tentadores e influentes a
prática do pecado. Com base nas determinações da Igreja Católica na Idade Média, o ato
sexual era exclusivo para fins de reprodução, no qual, a mulher era proibida de
manifestar desejo, sendo delimitada inclusive, a posição sexual correta para a copulação
(de bruços) e os dias em que não poderia ser praticada (dias santos e aos domingos),
alertando que não era permitido no período menstrual. (INSAURRIAGA E JARDIM,
2011).

A posição sexual de bruços impedia a visualização do rosto, o lugar da identidade,


da expressão do desejo. Conforme Georg Simmel (1991), o rosto é símbolo da mente,
da espiritualidade, bem como, da própria individualidade. O olhar é essencial para todas
as expressões faciais, interpreta a espiritualidade, como um reflexo da alma.

A visão sobre as mulheres só foi amenizada, com a comparação a imagem da


Virgem Maria9, pois esta se manteve pura, mesmo após dar a luz. As virgens eram as
mais aceitas e respeitadas pelo meio religioso. No entanto, a mulher sempre

7
A misoginia medieval pode ter como primeiras fontes a lei hebraica na antiguidade e, na cultura grega
em Hesíodo (c. 750 a.C.) no qual a introdução do mal no mundo apontam a mulher como responsável,
(ALLEN, 1985 em FONSECA, 2013).
8
As reformas gregorianas foram criadas pelo Papa Gregório VII (1073 a 1085) na metade do século XI.
Com essas novas normas da igreja, o matrimônio para padres e bispos foi proibido, passando a viverem o
celibato, assim como os monges. Para os demais cristãos, os casamentos monogâmicos foram
estabelecidos, na tentativa de acabar com as práticas do concubinato e incesto. (INSAURRIADA E
JARDIM, 2011).
9
A promoção da imagem da Virgem Maria, a partir dos séculos XI e XII, enfatizou a virgindade e a
maternidade como os dois modelos exemplares as mulheres. (RICHARDS, 1993, p.36).
19

representava o perigo do pecado, pois enfeitiçava o homem com seu alto poder de
tentação. (INSAURRIAGA E JARDIM, 2011).

Conforme Ronaldo Vainfas (1992), no início do cristianismo as primeiras


atenções morais voltavam-se ao ascetismo, possuindo como valores a virgindade e a
continência. Destinado a homens e mulheres o ascetismo propunha a castidade como
essência na busca por salvação. Os séculos III e IV tiveram uma ampla literatura sobre a
virgindade, sendo associada aos discursos da verdade, liberdade e vida. (VAINFAS,
1992, p. 7-8).

No período da antiguidade tardia, as mulheres, o principal público ao incentivo à


virgindade, eram orientadas a não se casarem, num discurso que partia dos homens, no
momento em que o casamento se tornava corrente e estável. O discurso contra o
casamento apontava os perigos e dificuldades da relação conjugal, da submissão carnal
ao homem, ao mesmo tempo que exaltavam a virgindade. O textos sobre a virgindade se
destinavam essencialmente as mulheres, dando pouca atenção aos homens. Adotavam
uma pregação misógina, incentivando o celibato. Em 451, a virgindade passou a ser
considerada como o “verdadeiro” casamento entre Deus e os homens, pelo Concílio de
Calcedônia. (VAINFAS, 1992, p. 9-10).

O Apóstolo Paulo10 pregava que o ideal seria que os indivíduos se mantivessem


castos, mas se não conseguissem era melhor casar, pois o casamento mesmo sendo
considerado um mal era um o mal menor se comparado a livre fornicação. O casamento
era compreendido como uma suavização do pecado da carne. Enquanto que a
virgindade era associada à verdade, o casamento era assemelhado a mentira, a
escravidão, a morte. Santo Agostinho compreendia o casamento de forma mais amena.
Como espaço a busca do desejo, o casamento era o mal, mas como fonte de procriação
era um bem. Apontando a criança, a fidelidade e o sacramento como pontos positivos da
relação conjugal. (VAINFAS, 1992, p. 11-13).

Agostinho classifica o Pecado Original com o desejo sexual, não apenas o sexo.
Mas o que entrou na consciência popular foi que o pecado original se igualava ao sexo.
A sexualidade, conforme os ideais cristãos, é compreendida como algo exclusivo da

10
(I Cor., VII, 8).
20

reprodução, que não deve ser usada apenas para o prazer. O sexo fora e dentro do
casamento era considerado pecado e, dentro da relação matrimonial deveria ser usado
para fins de reprodução. (RICHARDS, 1993, p. 35).

O casamento foi conquistando uma melhor aceitação no meio religioso se


seguisse algumas condições como a monogamia e a indissolubilidade. Mas continuava
sendo inferior a virgindade. Recomendava-se a continência dentro da própria relação
conjugal. Nesse período, mesmo aceitando parcialmente o casamento, orientava-se os
indivíduos a se conterem diante de qualquer forma de prazer carnal, permeava no tempo
da Patrística uma “moral hesitante”. Hostilizava o casamento, valorizava a virgindade e
a castidade. (VAINFAS, 1992, p. 13-24).

No final do Império Romano11 (século V), o casamento era mais frequente e


estável. A monogamia estava sendo mais aceita pelos maridos. Após este século, os
costumes germânicos se mesclavam no ocidente e nas práticas romanas. Nesse contexto,
entre a nobreza (reis e cavaleiros), o casamento estabelecia o sistema de linhagens e
heranças, não se destinando a todos os filhos da família. Também não acontecia sempre
de forma pacífica, pois haviam os raptos de mulheres, também forjados pelos maridos
para se livrarem de suas esposas. O casamento dos servos, conforme defendem alguns
autores, era decidido pelos senhores, favorecendo os interesses destes na reprodução da
população camponesa. No século IX, a Igreja tentaria dominar a nobreza ao seu poder,
bem como nas relações conjugais. Nesse momento o poder da Igreja “oscilava” com
poder da nobreza. (VAINFAS, 1992, p. 25-29).

A Igreja, ao controlar a sexualidade, especificava a atividade sexual para dentro


do casamento, transformando-o num sacramento. Na França, século IX, a Igreja deu
início a um longo processo de sacralização do casamento, que passava a receber um
controle sacerdotal à cerimônia. Objetivava-se a estabilidade da relação com as
determinações da monogamia, exaltava a indissolubilidade do casamento, a proibição
deste para parentes consanguíneos (até sétimo grau de parentesco), o “desincentivo” do

11
O Império Romano foi formado inicialmente pela cidade de Roma, depois se estendeu pelo
Mediterrâneo e Oriente. O Império Romano foi dividido entre Oriente e Ocidente em 395 d.C., este
último chega ao fim em 476 d.C., enquanto que o Império no Oriente termina em 1453 d.C. (TEMÁTICA
BARSA, 2006, pág. 57/63).
21

segundo casamento, e o incentivo a ideia de “consentimento” entre o casal.


(RICHARDS, 1993, p. 35).

No século XII, a igreja possuía o controle legal e moral do casamento, a cerimonia


deste passou a ser realizada na igreja, documentada e registrada oficialmente. Foram
estabelecidos dias da semana específicos para o casamento e, limites mínimos de idade
para casar (12 anos meninas, 14 meninos). Os teólogos passaram a apresentar o sexo
como uma obrigação, fundamentados numa ideia que decorre a São Paulo, em que entre
o casal um pertencia ao outro, seus corpos não era mais propriedades de si, a mulher era
a passiva da relação, submissa ao seu marido. Conforme a lei canônica era permitido o
espancamento da esposa, esta não poderia assumir cargo publico ou ser comandante
militar, advogado ou juiz. Fundamentando-se em características dadas as mulheres,
apresentadas como naturalmente “frívolas, ardilosas, avarentas e de inteligência
limitada”. (RICHARDS, 1993, p. 35-36).

O casamento era o destino da maioria das mulheres, e este não era precedido ou
acompanhando pelo amor, era concebido sobre a forma de contrato entre as famílias.
Nas camadas mais baixas, livres de negociações políticas e heranças, o casal se fundava
no sexo e no companheirismo, as pessoas não casavam oficialmente. O “consentimento”
no casamento daria espaço para o amor, mas as questões politicas e econômicas
dominavam. (RICHARDS, 1993, p. 37).

No século XIII, a Igreja aceita uma forma de casamento com fundamento no


companheirismo amoroso. Santo Tomás de Aquino defendia que deve haver amor entre
marido e mulher. São Bernardino de Siena (1380-1444) argumentava que deveria existir
o companheirismo entre o casal, o marido deveria mostrar compaixão pela esposa, e
ama-la assim como foi amada pela família. Marido e esposa eram iguais
espiritualmente, mas em carne ele sempre seria superior, pois a mulher deriva da costela
de Adão. No século XII, Graciano sistematizou a lei canônica, sendo oficial durante
toda a Idade Média, mantendo os ideais da Igreja em que o casamento seria destinado a
reprodução e ao combate da tentação sexual. Para que o casamento fosse efetivado era
necessária a confirmação, por meio espiritual (o consentimento) e físico (a consumação/
relação sexual). (RICHARDS, 1993, p. 38).
22

A reforma gregoriana (séculos XI-XIII), focava sobre o matrimônio, sendo para os


leigos uma benção e para os padres uma proibição. Na moral cristã valores contrários
se complementavam como “espiritual-temporal, virgindade-casamento, homem-mulher
etc.”. (VAINFAS, 1992, p. 34).

A moral dos padres e dos nobres se conflitava, a contrariedade entre sacerdotes e


cavaleiros ficou mais decisiva no processo de “feudalização da Igreja” e a consolidação
das propriedades leigas nos século XI e XII. O casamento como sacramento,
monogâmico e indissolúvel triunfou no ocidente entre os séculos XII e XIII. A Igreja
tornou-se a detentora do poder. (VAINFAS, 1992, p. 35-36).

A partir deste período o desejo carnal foi objeto de contestação e normatização


das condutas, por parte da Igreja, com foco na relação conjugal que deveria ser
ordenada através da confissão. Recomendava-se o ato sexual, dentro do matrimônio,
mas sem excesso. (VAINFAS, 1992, p. 37/41).

A confissão e a penitencia eram centrais na igreja, em seus primórdios eram atos


públicos, bem como a reconciliação. Mas a partir do século XI e o XIII, mudou. A
confissão passa a ser privada e a penitência segue de acordo com o entendimento dos
padres, que contavam com livros para norteá-los sobre a gravidade dos pecados. A
masturbação foi um dos pecados que passaram pelo processo de desenvolvimento, em
relação a sua gravidade. No inicio da Idade Média era considerado como pecado
razoável, posterior ao período medieval foi estabelecido como mais grave. Jean Gerson
(teólogo importante no século XV) escreveu um tratado a respeito de confissões de
masturbação, definia esta prática como um pecado “pavoroso”, sendo um mal frequente
aos jovens. Ele sugeria como tratamento a prática de banhos frios, flagelações,
sobriedade, preces e companhias positivas. Santo Tomás de Aquino também
considerava a masturbação um grave pecado, pois era contrária a natureza da
procriação. No final da Idade Média, houve um aumento com a preocupação dos
métodos contraceptivos e abortos12. O controle da natalidade ocupava o lugar dos

12
A redução em grande escala da população, em decorrência de peste negra, aumentava as preocupações
da igreja sobre as práticas sexuais não reprodutivas, e as apontava inclusive como a causa da própria
peste. (RICHARDS, 1993, p.44).
23

graves pecados, daqueles que iriam contra a procriação, que desperdiçavam o sêmen.
(RICHARDS, 1993, p.43).

Em síntese, a partir de importantes influências fisiologistas, a misoginia se


propagou no pensamento religioso, científico, filosófico e literário, repercutindo na
inferioridade atribuída a mulher na sociedade medieval. A Igreja Cristã Ocidental
representou a instituição de maior controle dos indivíduos nesse período, sendo esta a
principal produtora do conhecimento na Idade Média, por meio dos filósofos cristãos.
As questões políticas e econômicas permaneceram diretamente ligadas a lógica das
ordenações religiosas. Entrando nesse contexto a confissão e a penitencia como
instrumentos essenciais na propagação da dominação da Igreja.

2.2 Foucault: “nós, vitorianos”

Neste ponto utilizo o autor em questão para tratar sobre as transformações


ocorridas na lógica da sexualidade no ocidente. Apontando como as sociedades
burguesas reformularam a sua moral sexual de acordo com os princípios
socioeconômicos. Estabelecendo, dentro desse contexto, os agentes de controle do
poder que auxiliaram na construção da moral burguesa e como manipularam os
instrumentos de dominação, sendo a confissão o principal elemento.

Com base em Foucault (1988, p. 9), a era vitoriana13 foi intensiva para a
reformulação do diálogo e comportamento sobre o sexo e seu processo de adequação a
uma nova moral. Conforme o autor, hipóteses apontavam que nesse período iniciou uma
forte repressão sexual, no qual o sexo foi silenciado, o discurso foi banido do meio
social. Foucault chama essa teoria de “hipótese repressiva” discordando desta. Para o
autor, o fenômeno aconteceu ao inverso, o sexo não foi calado, ao contrário, fez-se falar
dele, incitou-se os discursos. No século XVII, nas sociedades burguesas, para
construção de uma dominação, reformou o livre discurso. Ao sexo atribui-se a forma de
falar (as palavras adequadas), onde falar e em que momento; restringindo o diálogo

13
Era vitoriana (meados do século XIX -1837 a 1901), conhecida pelo reinado da rainha Vitória, cuja
tinha como característica o incentivo ao puritanismo, destacando-se por suas posturas exageradas em
relação ao comportamento sexual. A sociedade desse período era marcada pelo moralismo. A Inglaterra
nesse período tinha como virtudes a disciplina, a limpeza, o trabalho, autoconfiança, patriotismo, fé,
castidade e fidelidade conjugal. (DEVANEIOS LITERÁRIOS, 2009).
24

entre alguns grupos (família, escola, trabalho). A partir desse século, o discurso se
prolifera no campo do exercício do poder, acelerando ao século XVIII. (FOUCAULT,
1988, p. 21).

A Contra-reforma14 nos países católicos acelera a confissão anual, é atribuída


grande importância à penitência para a punição dos pecados. A nova pastoral católica
exige que tudo deve ser dito15, as práticas, os pensamentos, os sentidos, pois dos
“desejos da carne” derivam todos os pecados. O sexo era expresso em discurso, que
seria julgado pelos outros e por si mesmo, sobre a noção de pecado. A pastoral exaltava
a confissão do desejo, por proporcionar um mergulho da espiritualidade, para a
resistência do proibido, modificando o próprio desejo. O discurso sexual é incitado
também de forma política, servindo aos mecanismos de poder, policiando e
transformando o sexo, por meios de discursos para não submetê-lo a explícita proibição.
(FOUCAULT, 1988, p. 23-24).

A “população” do século XVIII constituía um problema político e econômico, no


sentido da taxa de natalidade, casamentos, nascimentos legítimos ou não. Dessa forma o
sexo se tornava alvo de intervenções do poder, sobre a conduta sexual das pessoas,
utilizando-se da moral, da religião e da medicina. Falava-se cada vez mais do sexo,
sobre outras formas, por outras pessoas, com outros objetivos. Conforme Foucault, no
século XVIII atuavam sobre o sexo quatro conjuntos estratégicos de saber e poder, são:
a histerização do corpo da mulher, a pedagogização do sexo das crianças, socialização
das condutas de procriação e psiquiatrização do prazer “perverso”, dentre os quatro

14
A Contra-Reforma da Igreja Católica refere-se as medidas tomadas por esta instituição diante das
preocupações com o avanço do protestantismo e a perda de fiéis. Assim, a Igreja Católica reúne-se entre
padres e teólogos (Concílio de Trento) para estabelecer os planos para enfrentar estes problemas. O
Concílio de Trento iniciou a reforma interna da Igreja Católica, objetivando definir dogmas católicos.
(LOURENÇO. A Contra-Reforma. Disponível em
<neh.no.sapo.pt/documentos/a%20contra%20reforma.htm>. Acesso em 06 dez. 2014).

15
A evolução da pastoral católica e do sacramento da confissão encobriram e reformularam a forma dos
manuais de confissão da idade média, em que para que a confissão fosse completa as pessoas precisassem
falar a posição, os gestos, os toques, o momento do prazer das suas relações sexuais. A Contra-Reforma,
preocupa-se ainda mais com a penitência, para todos os pecados da carne, inclusive os pensamentos e
desejos. Os homens são orientados a se vigiarem, observar seus desejos, pensamentos e sentidos para não
cair nas tentações dos pecados da carne. No ocidente moderno adentra o ato de dizer a si mesmo e aos
outros, o tempo inteiro tudo que se relaciona com o sexo, na concretude do corpo e no ideário dos
pensamentos, tudo deve ser dito. (FOUCAULT, 1988, p. 22/23).
25

perfis de conduta “a mulher histérica, a criança masturbadora, o casal malthusiano, o


adulto perverso” (FOUCAULT, 1988, p. 99-100).

Entre os séculos XVIII e XIX, conforme aponta Foucault (1976), o sexo invade
também o campo da racionalidade, para a filosofia, a medicina e a justiça penal. Todas
as instituições incitaram o discurso para fazer falar, escutar, registar e adequar, rotular.
Assim fez a política, a economia, a medicina a pedagogia e a justiça. As sociedades
modernas não calaram o sexo, ao contrário, fizeram falar intensamente sobre ele.

As práticas sexuais que fugiam dos padrões foram consideradas “perversões”,


igualadas as doenças mentais. O judiciário atuava sobre elas de forma punitiva. Ás
crianças e idosos foram instituídas diversas restrições e regras, a partir das fugas dessas
condutas os “desvios” foram estabelecidos. Até final do século XVIII, as normas
estabelecidas centravam-se no matrimônio, impondo regras ao sexo do casal, que
deveria ser confessado, falado em todos os seus detalhes.

Para a religião, trair as leis do matrimônio e buscar prazeres “estranhos” ou


inadequados, merecia a condenação por serem considerados pecados graves16. A
sociedade civil compactuava com a as regras da religião, o condenável era a “contra-
natureza”. No campo do jurídico a homossexualidade, a infidelidade e o casamento sem
consentimento dos pais eram condenáveis. Nós séculos XVIII e XIX, diante da
normalidade heterossexual monogâmica (o casal legítimo), se investigava
principalmente a sexualidade infantil, dos “loucos” e “criminosos”, e dos
homossexuais17.

Conforme Foucault (1988), articulando os mecanismos do poder, se produzia um


duplo efeito, entre prazer e poder. O poder extrai, questiona, investiga - exercitando um
modo do prazer que estaria em fugir, disfarçar, enganar a norma18. A sociedade

16
“figuravam o estupro (relações fora do casamento), o adultério, o rapto, o incesto espiritual ou carnal, e
também a sodomia ou a „carícia‟ recíproca.” (FOUCAULT, 1988, p.39).
17
Vale lembrar que Foucault utilizava o termo "homossexualidade" e "homossexual".
18
“Crianças demasiado espertar, meninas precoces, colegiais ambíguos, serviçais e educadores
duvidosos, maridos cruéis ou maníacos, colecionadores solitários, transeuntes com estranhos impulsos:
eles povoam os conselhos de disciplina, as casas de correção, as colônias penitenciárias, os tribunais e
asilos; levam aos médicos suas infâmias e aos juízes suas doenças.” (FOUCAULT, 1988, p. 41).
26

burguesa do século XIX e XX, ainda passou pela explosão das perversões. As
sexualidades múltiplas correspondem a interferência do poder nos seus corpos e
prazeres, poder que extraiu dos homens tais comportamentos, isolando-os e
intensificando-os. A “implantação” dessas perversões múltiplas é efeito da ramificação
da relação poder, prazer e sexo; que isolou, intensificou e consolidou as “sexualidades
periféricas”, pela interferência da medicina, da psiquiatria, da prostituição e pornografia,
complexificando e unindo o prazer e o poder. Do sexo, tanto se falava, investigava,
classificava, objetivando mascará-lo, controla-lo. A ciência era posta aos mesmos
fundamentos da moral sobre a roupagem da medicina. A lógica médica no século XIX
proclamava os princípios da higiene, da assepsia.

Foucault (1988, p. 100-105), apresenta dois dispositivos do poder o “dispositivo


da sexualidade” e o “dispositivo da aliança”. Ambos se relacionam aos parceiros
sexuais, mas possuem características bem particulares, mas que se entrelaçam. O
dispositivo da aliança representado pelos laços de sangue e pelo matrimônio, que cria os
parentescos, e o sistema de heranças objetivando a transmissão dos nomes e bens
materiais. Constitui-se sobre um sistema de regras que estabelecem o “permitido e o
proibido”, o certo e o errado. Fundamenta-se na “reprodução” dos indivíduos. No
dispositivo da sexualidade as estratégias do poder e do saber se expressam sobre a
incitação dos discursos, a estimulação dos corpos e dos prazeres. Ou seja, o dispositivo
da aliança se constitui sobre o sangue, enquanto que o dispositivo da sexualidade se
fundamenta nos corpos.

Nas sociedades ocidentais modernas, surge o dispositivo da sexualidade, para


suprir a decadência em que entrava o dispositivo da aliança, devido novos processos
econômicos e políticos. Esse novo dispositivo adentra na lógica das sensações, dos
prazeres, dos sentidos. Articula-se com a economia pelo “corpo”, reproduzindo suas
formas de domínio globalmente para as populações. Foucault aponta que o dispositivo
da sexualidade não substituiu o da aliança, mas se instalou a partir deste ultimo. A
formação do dispositivo da sexualidade centraliza-se na prática da penitencia, em
seguida no exame de consciência e na direção espiritual. Pois no período da penitência o
sexo era compreendido como o pilar das relações (nos casos dos adultérios, por
exemplo) com a nova pastoral católica o foco passou das “relações” para o “corpo” (a
“carne”), a sensação, o prazer. No núcleo da família atuavam os dois dispositivos.
27

Desde o século XVII, o dispositivo da sexualidade (que se desenvolveu


inicialmente nas instituições familiares - conforme Foucault, sobre a direção espiritual e
a pedagogia), configura os pais como os principais agentes de controle deste dispositivo
que se apoia (exteriormente) nos médicos e pedagogos, e mais adiante nos psiquiatras.
Na família (o interior) esse dispositivo vem “duplicar” e “psicologizar” as relações de
aliança, trazendo-as para o campo do comportamento, da psicologia. Por tal fato são
estabelecidas as “perversões” da sexualidade, por serem as representações da "aliança
desviada e da sexualidade anormal”. Fazendo com que o sistema da aliança adentre e se
imponha na ordem da sexualidade. (FOUCAULT, 1988, p. 104-105).

Conforme Foucault (1988, p. 69), na verdade sobre o sexo atuavam duas lógicas
distintas. Por um lado, as sociedades orientais, fundamentadas por uma “ars erotica”- na
arte erótica a verdade é extraída da experiência e da prática sexual19. Configurando um
saber secreto, mantido em sigilo para garantir o repasse correto das informações, feito
por um mestre eleito como o detentor dos segredos. Enquanto que nas sociedades
ocidentais a verdade sobre o sexo partia da “scientia sexualis”, regrada inicialmente
pelos médicos, cientistas, que extraia a sua essência sobre a confissão. Desde a Idade
Média que a confissão está entre os poderes civis e religiosos, como elemento central na
obtenção da verdade do indivíduo sobre si mesmo. A confissão se disseminou pela
justiça, medicina, pedagogia, relações familiares e amorosas – nos tornamos uma
sociedade que tudo confessa – crimes, pecados, desejos e sentimentos, em público ou
particular, por vontade própria ou pela força.

A busca da verdade em si, com o ato da confissão, fica inerente a nós, ao ponto
de não notarmos o poder que nos coage. Parece-nos que a verdade necessita ser revelada
a todo momento, como se houvesse um poder sobre ela, como se precisássemos de
libertação. No entanto, a dominação pela confissão, está em quem escuta e cala o
indivíduo que fala é o dominado. Dessa forma, na nossa sociedade ocidental, o sexo
perseguiu o caminho da confidência, da revelação, da crítica de si mesmo. A scientia
sexualis mantinha a confissão como norma obrigatória. (FOUCAULT, 1988).

Concordando com Norbert Elias (1994) no ponto em que trata de como a


sociedade burguesa, criou padrões de comportamentos, de nojo, medo e vergonha para

19
Como por exemplo, o manual milenar de técnicas sexuais chamado “Kama Sutra”.
28

adequar-se ao que sua lógica econômica exigia e, possuírem o fator “nobre”, a essência
de corte, que os separa das classes inferiores. E, com fundamento em Foucault,
compreendo que a burguesia por meio do discurso “mascarado” sobre um ideal de
pudor e silêncio, encontrou caminho fértil para construir a sua lógica moral, assumindo
o lugar de “elite” que um dia pertenceu a nobreza. Traz assim a individualização do
corpo, a segregação dos sexos e da sexualidade para dentro da ótica do poder, das
consciências individuais.

Conforme Norbert Elias (1994), as classes altas ao longo da história procuraram


por mais refinamentos na medida em que seus padrões de comportamento chegam às
classes baixas. Dessa forma, para manterem seu status de superioridade, vão adotando
outros valores, outros comportamentos. Assim comportou-se a burguesia ao objetivar
padrões de nobreza, refinamentos da sociedade de corte, no momento que a classe
burguesa toma o posto da nova elite econômica. No século XVIII, com o aumento das
riquezas as classes médias progridem, adentrando no circulo da corte uma maior
quantidade de burgueses, ao lado de elementos aristocráticos, mas sem misturar as
diferenças sociais. Ao proceder da Revolução Francesa20 a aristocracia entra em
declínio, mesclando os elementos aristocráticos e burgueses, formando a “elite”
econômica. Os clérigos, nesse processo em que serão estabelecidas normas rumo a
“civilização”, tornam-se os divulgadores sobre os padrões seguidos pela elite às classes
mais baixas. (ELIAS, 1994. p. 109).

A transmissão dos comportamentos de um grupo social a outro deve ser


considerado, dentro do processo civilizador, como um importante movimento
individual. O refinamento e a conduta estabelecida ditam a forma de se portar na mesa,
utilizando os utensílios adequados, a higiene; a forma de falar adequada à elite, sendo
esta a forma correta, enquanto que a fala utilizada pela classe socialmente inferior é
incorreta. (ELIAS, 1994. p. 109-143).

20
A Revolução Francesa representou um movimento social ocorrido na França de 1789 a 1815, gerada
pela ascendente burguesia, diante do objetivo de retirar do poder a aristocracia e a monarquia absolutista.
A revolução tinha ideais de “Liberdade, Igualdade, Fraternidade” (Liberté, Egalité, Fraternité). (NOVA
ENCICLOPEDIA BARSA, 2000, pág. 420).
29

Nesse processo de “desanimalização” do homem, diante do controle dos impulsos


naturais, a burguesia busca os ditos ideais da nobreza e, em seguida, a sociedade coloca
para todas as outras classes a necessidade de se adequar as normas de higiene, de
comportamento, de falar, para serem considerados no mínimo “decentes”. A pressão da
vida social é forte, dando aos jovens apenas o caminho da “decência” da “educação” e,
se não o seguir, o caminho da exclusão. Assim, a burguesia cria seus padrões de
vergonha, nojo, educação, tornando um comportamento automático, desejável,
mostrando-se ao individuo como constituinte de seu livre arbítrio, de sua própria saúde
ou dignidade. (ELIAS, 1994. p. 146).

A despreocupação sobre mostrar o corpo nu, deu lugar a uma conduta de cobri-lo.
O ato de dormir, antes junto a outras pessoas vai se individualizando cada vez mais, se
tornando intimo e privado. As pessoas passam para suas camas individuais, quartos
individuais, diante dessa nova moral cada vez mais o corpo e a cama se isolam se
tornam “zonas de perigo psicológicas” diante da consciência gerada na sociedade.
(ELIAS, 1994. p. 169).

É fundamental entender a relação do discurso religioso cristão e as ações do poder


político (o Estado), no campo da moral sexual ocidental. Tais instituições de dominação
encontraram na sexualidade o instrumento essencial de controle das populações.

“Corpo e Espírito” são centrais no discurso religioso cristão, relacionados a


vertente teleológica da “salvação”. Diante das implicações sobre as concepções e ações
do “corpo”, tal discurso objetiva levar os indivíduos ao patamar da “santidade”, a partir
da transformação e controle de si próprio, com as chamadas “técnicas de si” (Foucault,
2006), tendo a Bíblia como o manual cristão, na qual sexo/sexualidade eram definidos
como a “carne”. (Em RIOS et al., 2008, p. 675).

Foucault (2006) discute o cristianismo através da concepção do “pastorado”, em


que “a perdição de uma só ovelha repercute na salvação do pastor e de todo o rebanho.”
(RIOS, 2008, p. 675-676). Assim, para que o pastor/representante da “palavra sagrada”
conheça seus seguidores e os guie à “salvação”, o cristianismo se apoiará no “exame de
consciência” para direcioná-la. Implicando para os cristãos a “obediência total” e o
30

“conhecimento de si”, extraído na confissão21. Dessa forma, o “dispositivo cristão de


sexualidade” tinha como foco os pecados22 da “carne”, seguindo o pastorado extraiam o
“saber” (pelo testemunho e confissão), tornando os indivíduos responsáveis por si e
pelos demais. Para Foucault, duas vertentes atuaram sobre o “biopoder”23, a religiosa
(comprometida com a salvação de si e dos outros) e a estatal (objetivando a “educação”
dos “corpos”). Cf. Rios et al. (2008, p. 676).

Em síntese, no século XVII a burguesia inicia a reformulação do discurso sobre o


sexo, se utiliza da confissão para a adequação sexual da sociedade, voltando-se a
construção de uma moral ligada aos seus interesses socioeconômicos. Dessa forma, os
instrumentos do poder (política e religião) se tornam os responsáveis por controlar,
adequar, manter a nova moral sexual. Ao longo dos séculos XVIII e XIX a
racionalidade, a filosofia, a medicina e a justiça atuam como agentes de controle,
incitando o discurso sobre o sexo para adequá-lo. Toda sexualidade que fugisse da regra
moral era estabelecida como “perversão”. No duplo efeito gerado entre o prazer e o
poder, as sociedades do século XIX e XX passam pela explosão das perversões.

21
A confissão não é exclusiva do catolicismo, existe também no protestantismo com o chamado
“testemunho”, em que as pessoas declaram publicamente seus “pecados” e como Deus as “transformou”,
levando-as ao caminho da “salvação”.

Foucault (2006), aponta que antes do “dispositivo da confissão” (relação direta pastor/ovelha), o pecado
era analisado sobre o “testemunho público”. A penitência seria o elemento de relação para si/consigo,
renunciando a si para buscar a “salvação” em “outro mundo”. (RIOS et al. 2008, p. 676).
22
Paulo traz considerações importantes para os fundamentos do pensamento ocidental religioso cristão.
Nos textos (I cor. 6, 9-10, I Tim. 1, 9-10), os pecados são divididos em cinco categorias, são elas: “os
pecados contra Deus, contra a vida do homem, contra seu corpo, contra os bens e as coisas, e finalmente,
os da palavra.” (ARIÈS, 1985, p. 50). Pecam contra Deus (os idólatras, os opositores a justiça, os
rebeldes, os que desobedecem aos mandamentos e o sagrado, os sacrilégios, os profanadores, os ímpios),
pecam contra os homens (assassinos, parricidas, matricidas, homicidas), pecam contra o corpo (os
pecadores da carne se dividem em quatro subgrupos: os prostituídos; adúlteros – que cobiçam a mulher
do outro e as mulheres que cedem ao desejo; os molles/ mollities – masturbação ou práticas que retardam
o gozo, destinava-se exclusivamente ao prazer; e os homens que dormem juntos – masculorum
concubitores), pecam contra os bens e as coisas (os que vendem homens livres, os ladrões, os que
cobiçam exageradamente as coisas do mundo, os brutos, os bêbados), por fim, os pecadores da palavra
(os maledicentes/blasfemadores, mentirosos e os perjuros). Nesses textos Paulo não fala das mulheres,
como se os pecadores fossem os homens por serem os detentores do poder, o que se contradiz com a ideia
que se tinha na igreja de que a mulher é o instrumento do mal. Em outro texto, Paulo pauta a mulher
como a culpada pela inserção do pecado ao mundo. Talvez o machismo/misoginia da idade media tenha
relação com a atitude de defesa dos homens, pela mulher ter ganhado mais importância (ARIÈS, 1985, p.
52).
23
O responsável pela articulação entre “tecnologias disciplinares” e “biopolíticas”, generalizando
socialmente. (RIOS et al., 2008, p. 674).
31

No seio da família, os objetivos morais do poder se expressavam no “dispositivo


da aliança” e no “dispositivo da sexualidade”. Ou seja, através desses dispositivos o
econômico se fundamentava nos corpos e prazeres. Assim, os pais, inicialmente
instrumentos controlados, passam a ser instrumentos controladores.

Enquanto que nas Sociedades Orientais o saber e a verdade sobre o sexo era
extraído da prática, no Ocidente se extraía da confissão. Essa confissão se disseminou
por todos os instrumentos do poder constituído o ocidente como a sociedade que tudo
confessa (crimes, pecados e desejos). Assim, a busca da verdade pelo ato da confissão,
se torna inerente a nós como a forma da busca da verdade em nós mesmos (verdade em
si). Dessa forma, sentimos a necessidade de revelar, falar, confessar a todo o momento,
como um ato de libertação.

Apoiados no dispositivo da sexualidade e da aliança, a burguesia dita a moral


sexual adequada a cada classe e aos seus próprios filhos, estabelece o comportamento de
acordo com a sua condição econômica, se impõe no patamar da elite para se separar das
classes inferiores. Assim, na sua reformulação moral e, na construção do seu lugar de
classe dominante, a burguesia, em seu processo civilizador, controla seus impulsos
naturais, cobre, individualiza e isola os corpos e prazeres, dos outros e de si próprios.
No processo de conhecimento de si, consciência individual gerada pelo poder, o
indivíduo passa a controlar a si próprio, a vigiar-se, para um comportamento
moralmente adequado, contra os perigos da carne, impulsos sexuais e as perversões.
32

3 SEXO, FAMÍLIA E MORAL SEXUAL NO


BRASIL

Conforme Parker (1991), na carta de Pero Vaz de Caminha, sobre o


descobrimento do Brasil, o fascínio ao novo mundo foi apresentado. O que mais
encantou Caminha nesse percurso foram os nativos, ela retrata a nudez encontrada nos
costumes do Brasil, como a combinação de “beleza” e “inocência”, distinguindo-os do
seu povo europeu. Nas mulheres, a junção da nudez e da beleza era entusiasmantemente
descrito por Caminha. Acreditando que devido a inocência desses indivíduos, poderiam
ser intelectualizados e espiritualmente “salvos”. (PARKER, 1991, p. 26-27).

A visão de Caminha alimentava os ideais de alguns observadores, como Américo


Vespúcio, em que retratava o lado mais alarmante do comportamento dos nativos,
diante das suas práticas sexuais perversas, seus corpos distorcidos e a prática da
ingestão de carne humana, tudo isso era contrário aos costumes e tabus da Europa. Em
Caminha, o universo cultural dos nativos era retratado sob uma visão mais curiosa e
sutil, destacando a inocência dos índios. Enquanto que em Vespúcio, são apresentados
como selvagens e grotescos. Vespúcio descreve o Brasil sobre uma visão de inferno na
terra, pelas práticas selvagens, pelas aberrações dos corpos, pelo incesto. Dessa forma, a
imagem sobre os nativos se constrói na Europa, sob noções de “bom selvagem” ou de
“mau selvagem”. Tais apontamentos definiram os escritos sobre o “novo mundo” nos
séculos XVI e XVII. (PARKER, 1991, p. 28-31).

Conforme Laplantine (1994), os europeus, classificaram os índios diante de suas


concepções de religião e sociedade. Pertencentes a figura do mau selvagem, os índios,
ditos “selvagens”, “primitivos”, eram categorizados de acordo com a aparência física
(vestimenta), os comportamentos alimentares e a linguagem, por se vestirem com peles
de animais ou pelados, por comerem carne crua e pelo canibalismo, e por terem uma
linguagem apontada como ininteligível. Classificados como sem moral, religião, leis,
escrita, estado, consciência, razão, objetivo, arte, passado e futuro. (LAPLANTINE,
1994, p. 40-41).

A figura do bom selvagem aparece inicialmente na visão dos primeiros viajantes a


América, são eles Américo Vespúcio e Cristóvão Colombo, no qual apontavam os
nativos como ingênuos e belos. Por outros pensadores, apareciam como afáveis,
33

tranquilos, destacavam a “doçura” dos selvagens. No entanto, essas duas concepções


pairam sobre a construção da imagem dos selvagens, alternando entre o bom e o mau.
São classificados tendo como referência o lugar de quem vê, não de onde o selvagem
está. Olham o outro através de si. (LAPLANTINE, 1994, p. 46 – 52).

A visão ambivalente dos europeus exerceu forte influência sobre os brasileiros no


campo da identidade nacional. Isso ficou evidente no começo do século XIX, quando se
intensificou a preocupação com a identidade brasileira, a respeito da miscigenação de
seu povo com as três raças (índio, europeu e africano). Assim, devido à interação sexual
entre as raças, a sexualidade recebeu grande importância no pensamento brasileiro.
Alvo de vários estudos no século XIX, contrastados com a cultura estrangeira e com os
próprios costumes, à luz da presença da moral judeu-cristã e do recente racismo
científico. (PARKER, 1991, p.33).

As concepções sobre a atividade sexual nos moldes na cultura brasileira e a


mistura racial, juntamente com o racismo, dominaram o campo das letras, no final do
século XIX e começo do século XX. O movimento modernista marcou a cultura
brasileira, nas letras e nas artes, debateram a adesão de modelos europeus na cultura
brasileira. Recriaram o passado para reformular o futuro.24 (PARKER, 1991, p. 35).

No Brasil, o ponto crucial para os jovens exploradores europeus, era o encanto da


liberdade sexual, contrária a moral da Europa. Ao adentrar no “novo mundo”, os
exploradores se “despiam” das vergonhas, dos constrangimentos que a sua sociedade
estabeleceu. As mulheres nativas, com toda a sua sensualidade, seriam a fonte de prazer
e procriação. Os moldes da escravatura, dentro da ordem patriarcal, toma o campo das
“liberdades” sexuais existentes no período da descoberta colonial, trazendo outras
formas de manipulação da sexualidade. A mulher negra passa a ocupar o lugar da
indígena. Dentro da ordem patriarcal, a ligação entre as raças se concretizava pelo sexo,
no processo de miscigenação da sociedade. A sensualidade tanto do índio, como do
europeu e do africano, permeará a construção da história brasileira. (PARKER, 1991).

24
Como exemplo da recriação e “mitologização” da história brasileira, têm-se os escritos de Oswald de
Andrade a respeito do canibalismo, apontando que os modelos europeus deveriam ser “incorporados” e
“digeridos” para a criação de uma nova cultura brasileira. Ainda sugeriu uma nova cronologia nacional,
contando a partir de 1556, quando os índios do Rio Grande do Norte comeram o primeiro bispo do Brasil
– o Antonio Sardinha. (PARKER, 1991).
34

A sífilis25, trazida pelos europeus, teve destaque nos século XVII e XVIII, durante
as plantações de cana-de-açúcar no nordeste, período de intensidade para o sexo e a
sífilis, envolvidos diretamente no processo de miscigenação das raças, muito presente
no pensamento do século XIX e início do século XX. Diante desses fatores, à
sexualidade “desenfreada” foi atribuída certa negatividade. A sexualidade na escravidão
foi acompanhada pelas diferenças de poder, “sadismo” e “masoquismo”26,
“passividade” e “atividade”27 dando forma a depravação sexual, aos prazeres dos donos
da “casa-grande”. (PARKER, 1991, p. 47-49).

Para entender o legado do patriarcado nas questões de gênero e sexo é preciso


retomar ao núcleo desse modelo, à família clássica patriarcal do período colonial28.
Conforme Parker, vários escritores apontaram uma dualidade nesse modelo de família,
em que de um lado, na casa-grande, a família se constituía pelo patriarca, sua esposa e
filhos legítimos, todos morando no mesmo local. Por outro lado, à margem da família
clássica estava outro grupo, ligado essencialmente ao patriarca (suas amantes,
concubinas, filhos ilegítimos, escravos, amigos, clientes). O patriarca era o centro de
todas essas relações, ele detinha todo o poder sobre os demais, estando no topo da
hierarquia familiar, demarcando o lugar de cada indivíduo dentro desse grupo familiar e
em toda a sociedade. (PARKER, 1991, p. 56-57).

25
A Sífilis (ou Lues) é uma doença infectocontagiosa, transmissível sexualmente ou também, da mãe para
o feto, transfusão de sangue e contanto direto com o sangue contaminado. Atinge inicialmente órgãos
genitais, boca e evolui atingindo olhos, pele, ossos, coração, cérebro e sistema nervoso. (Dr. Drauzio
Varella. Disponível em <drauziovarella.com.br/sexualidade/sifilis/>. Acesso em 08/12/2014). No Brasil
colonial, a Sífilis fazia parte do que se compreendia como doenças venéreas, sendo esta, uma doença
associada aos pecados da carne, estigmatizada como um castigo aos pecadores. No Brasil colonial, o
contato entre os colonizadores e os nativos não foi apenas cultural, mas fundamentalmente sexual, no
processo que envolve a miscigenação das raças. (GRIEBELER, 2009, p. 22-23).
26
Ambas as práticas se relacionam ao sentimento de prazer em praticar ou sofrer algum tipo de violência
como instrumento de excitação sexual. O masoquismo configura a obtenção de prazer ao ser agredido de
forma física ou verbal. Enquanto que o sadismo representa o prazer em cometer essas agressões contra
alguém. (Disponível em <www.manualmerck.net/? id=113&cn=978>. Acesso em 11 dez. 2014).
27
Práticas ou termos relacionados a quem prática e quem recebe o ato sexual. Quem impõe e quem aceita,
o dominador e o dominado. Termo presente nas concepções homoafetivas, em definir o homem que se
entrega a outro homem (passivo) e o homem que domina e pratica o ato sexual (o ativo). Também
presente nas relações hierárquicas.
28
O Brasil Colonial representa o período entre 1500 (descobrimento do Brasil pelos portugueses) a 1822
(Proclamação da Independência). A primeira vila colonial foi fundada em 1532. (TEMÁTICA BARSA,
2006, pág. 116/118/122).
35

Em primeiro lugar estava o pai, os filhos ficavam em segundo, com privilégios


para o filho primogênito o que herdaria a herança. O modelo de família senhorial
patriarcal, do período colonial, foi reforçado pelos ideais da Igreja sendo comparada a
“Sagrada Família”, mantinha o monopólio das relações, dificultando as outras formas de
relacionamento e de estrutura familiar. (WINCKLER, 1983, P. 37).

A estrutura hierárquica permitia ao patriarca a autoridade máxima, principalmente


sobre o poder da força, podendo utilizar a violência para “ordenar” e matar além de seus
escravos, os seus próprios filhos. A violência é o fundamento da constituição dos papéis
da família, dos homens, mulheres, exercendo influência até os dias de hoje. Os
conceitos masculino e feminino eram antagônicos, ele como sendo o detentor do poder,
era caracterizado como forte, viril, determinado, enquanto que a mulher recebeu o lugar
da fraca, delicada, bela, inferior em força e inteligência. A esposa deveria estar sempre
pronta para saciar os desejos sexuais do marido, da mesma forma que as escravas (suas
concubinas), seguindo a ordem de submissão das mulheres aos homens. (PARKER,
1991, p. 58).

Essa moralidade sexual delimitava os outros momentos da vida em sociedade para


cada gênero, o lugar dos homens era na economia, na política, no controle da família,
enquanto que a mulher limitava-se ao campo domestico. Eles possuíam liberdade para
as relações sexuais, mas sem tocar na estrutura central que determinava os filhos
legítimos, para que estes recebessem a herança e continuassem o legado dominador do
pai. As filhas eram controladas com rigidez, enclausuradas em casa ou sob os olhos
vigilantes da família ou da mucama de confiança, para resguardar a sua virgindade (a
honra), e garantir-lhes o casamento. Quando casavam o controle do pai passava para o
marido. Enquanto que os filhos (homens) tinham mais liberdade, principalmente da
sexualidade, incentivados a iniciar a vida sexual muito cedo, como prova de sua
masculinidade. (PARKER, 1991, p. 61).

Às mulheres (brancas) restava o casamento e a submissão ao marido, ou a


dedicação à vida religiosa, enclausuradas nos conventos, sendo estes as únicas fontes de
educação. Essas não tinham acesso a leitura ou a escrita, a educação era exclusiva aos
filhos homens. Toda sexualidade que não tivesse a procriação como propósito era
36

condenável pela Igreja Católica, que defendia as relações estáveis. A igreja objetivava
disciplinar os homens pobres livres e os índios29. (WINCKLER, 1983, P. 37).

As definições sobre as mulheres eram diversificadas, existiam divisões entre


esposas e mães legítimas e concubinas. Relacionando e diferenciando tais definições,
proporcionando um modelo ideológico que exerceu influência sobre as formas de
conceituação das mulheres brasileiras. (PARKER, 1991, p. 62).

A partir do final do século XVIII ocorrem alterações na estrutura patriarcal. Com


a queda do monopólio comercial, devido a abertura dos portos para as nações amigas,
com a transferência da família real para o Brasil (1808), juntamente com representantes
burgueses europeus, o capital mercantil nacional entra na lógica da produção, formando
a economia mercantil escravista cafeeira. (WINCKLER, 1983, P. 40).

Conforme se alteravam alguns dispositivos dessa estrutura social, os senhores


rurais adentravam no novo cenário político e urbano. No decorrer do século XIX
médicos ideólogos da higiene publica, organizaram-se para alterar o padrão de
organização familiar patriarcal, para adequar as famílias as transformações
socioeconômicas do Estado Nacional, desenvolvendo uma nova moral de vida e corpo.
Foram alteradas as noções de amor, feminino e masculino, papeis do pai, mãe e filhos,
noções sobre a infância, a adolescência e a velhice, sempre valorizando a educação e a
higiene. As ações médicas destinavam-se as famílias de classe dominante, aos homens
livres, e aos escravos, sendo estes considerados uma ameaça à higiene, causadores de
doenças físicas e morais. Ensinava-se a maneira higiênica de organizar a casa, as
vestimentas, a alimentação, como limpar e padronizar tudo. (WINCKLER, 1983, P. 41).

Para as mulheres surgem novas relações, em meio às negociações do marido, a


esposa se insere no papel de receber os convidados, os casamentos passam a exigir
riqueza, educação, requinte e sedução. Assim, a educação da mulher se torna necessária.
Nas novas relações entre pais e filhos, os cuidados com a educação destes torna-se
responsabilidade da mãe, ao pai não cabe mais o papel de punir os filhos com os
castigos físicos. As crianças passam a frequentar as escolas, local de forte repressão à

29
Os jesuítas adotaram como missão, levar a palavra de Deus para combater a “promiscuidade”, a
“nudez”, o “adultério” e as “relações pré-matrimoniais”. (WINCKLER, 1983).
37

sexualidade. O amor conjugal e a monogamia são valorizados, bem como a


heterossexualidade. Ao homem destina-se o espaço do trabalho, à mulher o lar e os
filhos. A família diminui, dando a cada indivíduo as responsabilidades de acordo com a
idade e o gênero, assim vai se formando a família nuclear burguesa. Ao final do século
XIX, os indivíduos se disciplinam a esse modelo. A sexualidade passa a ser permitida
de acordo com a concepção genital, motivada dentro do casamento, objetivando a
procriação. Assim, formam-se os perfis do homem “macho”, sedutor, conquistador, do
amante do marido traído, da mulher frágil, fácil, nervosa, delicada. (WINCKLER, 1983,
P. 43).

O processo de mercantilização da sociedade capitalista exigia que os burgueses


renunciassem seus prazeres e instintos para se adequar ao lugar refinado da nobreza, ao
comportamento digno da corte e, ao princípio da acumulação no capital, levando para o
campo da sexualidade as contradições das relações sociais desse sistema. Até final do
século XIX, nos países capitalistas, a burguesia não poderia ceder plenamente aos reais
desejos sexuais, a sensualidade e os sentimentos eram mal vistos nas relações sexuais,
estes pertenciam ao comportamento das classes baixas. O casamento se dava sobre a
forma de contrato, no qual os papéis sociais dos gêneros eram rigorosamente
determinados. (WINCKLER, 1983, P. 29).

Nó decorrer do século XX, o controle ideológico da burguesia passa das mãos da


família para os aparelhos coletivos, como o Estado, a escola, meios de comunicação e a
indústria cultural. A burguesia adapta a sexualidade ao mundo do consumo, utiliza-se
dos aparelhos massificados de informação para a fundamentação de uma nova cultura.
Permitindo um espaço para outras formas de relacionamento, afrouxando um pouco a
sexualidade. Atualmente, as relações monogâmicas permanecem como o ideal, no
entanto o swing30, a homossexualidade e uma maior liberdade à sexualidade dos jovens
são de alguma maneira tolerados. As “liberdades” são permitidas, desde que não
impliquem no desempenho capitalista. Diante dessa “concedida” liberdade sexual, a
sociedade apresenta indícios de uma nova sexualidade, dando espaço para as fantasias.
A burguesia tenta manter o controle moral, através da indústria cultural pornográfica,

30
Troca de parceiros entre os casais para prática de ato sexual.
38

que padroniza as formas de relacionamento, os comportamentos, gestos e posturas


sexuais. (WINCKLER, 1983, P. 32).

A consolidação da família nuclear burguesa e da sua respectiva moral sexual


situa-se fortemente após 1930, quando a burguesia cria uma moral, para adequar seus
próprios filhos aos moldes dos novos caminhos da sexualidade. Objetivando disseminar
seu modo de organização sócio-sexual na sociedade civil e no Estado, no período em
que a economia agrária cafeeira é substituída pela burguesia industrial, no Brasil.
(WINCKLER, 1983, P. 51).

A hegemonia burguesa ao longo dos anos foi incorporada a legislação, a política e


a educação. Nos anos 1930/40 o modelo da família burguesa atingiu também as classes
populares. A Igreja Católica adaptou suas concepções sobre relações amorosas às da
hegemonia dominante, objetivando recuperar os laços com o Estado Burguês. Assim
fundamenta-se a Constituição de 1934, em que o casamento religioso é reconhecido
pela lei civil, o divórcio se torna proibido, ocorre inserção da educação religiosa em
escolas públicas, o financiamento de escolas, seminários e os hospitais da Igreja
Católica. A Igreja, dentro dos princípios da produção, incentiva a individualidade, o
casamento, as famílias duradouras e para a mulher exigia a posição de mãe.
(WINCKLER, 1983, P. 51).

Para a educação sexual, os impulsos sexuais deveriam ser reprimidos. O corpo


como “templo do espírito santo” não pode ser usado como instrumento de prazer sexual.
Os religiosos compreendiam o sexo como o impulso que deve ser controlado, a
educação das crianças deve ser feita principalmente pelos pais, dando relevância ao
aspecto moral. Os médicos e professores apenas auxiliariam os pais nesse processo
educativo. A masturbação era considerada um perigo para a saúde, por isso seria
tratada31. A castidade era o símbolo da vitória sobre os desejos da carne, por isso tão
exaltada. (WINCKLER, 1983, P. 53).

31
Os tratamentos eram feitos com banhos frios e alimentação adequada, devendo dormir cedo e de lado,
em uma cama dura para que a maciez não levasse a incitação do prazer. (WINCKLER, 1983).
39

As ações médicas nos anos 1930/1940 mantiveram a moral sexual, o indivíduo


deveria ser sempre orientado para controlar a sua sexualidade. As crianças e os idosos32
eram os principais focos da educação sexual. Os médicos, falando em nome da higiene
pública, esclareciam aos jovens rapazes as existentes doenças venéreas e seus perigos
contraídos com as praticas da sexualidade. Os religiosos orientavam fundamentados na
natureza determinada por Deus. As mulheres recebiam recomendações higiênicas e
religiosas, sobre a importância de se manterem virgens, pois poderiam ser ludibriadas
por um homem e caírem no caminho da prostituição. Os médicos e religiosos cuidavam
da educação sexual da hegemônica moral burguesa, adequando as relações familiares ao
sistema dominante33. Os princípios morais vitorianos da família nuclear burguesa, ao
longo do processo de acumulação capitalista, entraram em colapso com essa nova
realidade socioeconômica. (WINCKLER, 1983, P. 54-55).

A partir dos anos 1950, a economia brasileira adentra no processo de


internacionalização do mercado interno, com a economia de caráter monopolista. Os
ideólogos católicos expressaram forte resistência, instaurando nesse período uma
“ditadura filosófica”, para recuperar sua influência. Entre final de 60 e inicio da década
de 1970, período do chamado milagre brasileiro (1969 – 1974), a área “psico-social” era
direcionada pela repressão direta e, indireta através do controle ideológico na imprensa,
escola, sindicato e demais instituições, na defesa de uma moral publica, uma moral
burguesa. Avançam-se as forças produtivas, favorecendo a burguesia e as classes
médias, cresce o mercado de consumo. Há o ingresso da mulher no processo da
produção, nas universidades, chegando a ocupar cargos de decisão, entrando no
contexto de produtora e consumidora. Essas são as condições para a reformulação da
moral burguesa e suas relações familiares. (WINCKLER, 1983, P. 58-61).

No pós 1964, surge a necessidade de uma nova sexualidade, ajustada aos moldes
do consumo, processando a reformulação da moral sexual repressiva, submetendo a

32
O sexo desses é fortemente reprimido, pois como indivíduos improdutivos, sua sexualidade se torna
desnecessária. (WINCKLER, 1983).
33
Na sociedade brasileira, a burguesia também tentou disciplinar as classes populares ao seu modelo
moral, utilizando-se inicialmente da violência. Em outro momento, a partir dos anos 20, criam
mecanismos fundamentados na racionalidade do capital, presentes na escola, nas fábricas, na higiene
pública e etc. (WINCKLER, 1983).
40

hegemonia sócio-sexual burguesa à inserção dos psicólogos, psicanalistas e da indústria


cultural. (WINCKLER, 1983, P. 11-12).

Na década de 1970, as regras do campo da sexualidade se tornam mais maleáveis,


em concepções sobre infidelidade conjugal, separação do casal, estereótipos de gênero,
papéis de pais e filhos, noções sobre virgindade e parceiros amorosos. Pois a moral
sexual foi reformulada para a criação de um novo público consumidor, mantendo a sua
essência repressiva. Pela indústria e meios de comunicação em massa no Brasil, se
alterou o padrão das relações familiares e a socialização do indivíduo. (WINCKLER,
1983, P. 62).

Os novos consumidores eram crianças, jovens, adultos, e um público feminino


adolescente com mais liberdade para tratar de temas como sexualidade, masturbação,
virgindade e etc. No campo da sexualidade, há uma forte predominância da genitália
masculina, o prazer se dissociou da procriação, surgindo os manuais e técnicas sexuais,
dirigidos às classes medias. A liberação dessa nova sexualidade, estava voltada para o
consumo, os princípios da moral repressiva clássica permanecem, os idosos e crianças
ainda são discriminados sexualmente, as relações apenas por prazer não são bem vistas,
bem como a homoafetividade e os relacionamentos não-monogâmicos encarados apenas
como aventuras. (WINCKLER, 1983, P. 63).

3.1 Sexualidade no Brasil contemporâneo: em torno da


responsabilidade sexual

A respeito da sexualidade no campo contemporâneo brasileiro, Rios (2008),


aponta como nas noções de “segurança”, dentro do discurso da saúde e da religião que
se relacionam, centralizando a categoria da “responsabilidade” tão importante no meio
religioso, que reconhece os perigos da sexualidade, principalmente nos jovens,
estabelecendo a necessidade do indivíduo vigiar e responsabilizar a si próprio para não
ceder aos perigos da carne. (RIOS et al., 2008, p. 680).

A religião reconhece os métodos preventivos definidos pela ciência, no entanto,


defende que a maior prevenção está nas ações do próprio individuo. Juntamente com o
Estado, diante das concepções de certo e errado, estabelecem os “comportamentos
desviantes” dos indivíduos, aqueles que não seguem a norma religiosa ou se expõem
41

aos perigos alertados pela ciência, sendo estigmatizados, fundamentando as estratégias


de controle da população. Na confissão e no testemunho, os seus “desvios” são ditos,
demonstrando através do arrependimento, o sofrimento resultante do “erro”, sendo
utilizado de exemplo para os demais. (RIOS et al., 2008, p. 680).

Assim como na configuração do dispositivo da sexualidade tratado em Foucault


(1988) que recebe influência do controle dos médicos, cientistas, do governo, da
religião, na construção da moral sexual. Dessa forma, as noções de certo e errado se
enraízam nas consciências dos indivíduos, passando a serem partes das concepções
coletivas e individuais, de uma forma tão naturalizada que ninguém dirá mais o que é
permitido ou não, todos nós iremos carregar na nossa essência.

Rios (2008) aponta que para este discurso, se uma pessoa contrai HIV ou
engravida muito jovem, foi consequência de sua “falta” de responsabilidade,
primeiramente por ter feito sexo, segundo por não ter se prevenido. Podemos relacionar
esse mesmo discurso quando uma jovem usa uma roupa curta e é polemizada34, ou
quando uma adolescente tem um vídeo ou foto íntima publicada na internet. E as
“culpadas” do “erro” culpabilizam a si próprias, como veremos a frente.

4 PORNOGRAFIA E OCIDENTE

Os fundamentos do que hoje se entende por pornografia estão presentes a muitos


séculos atrás. Registros históricos datam a cinco mil anos, as primeiras representações
de órgãos e práticas sexuais. No Egito antigo foram encontrados desenhos de práticas
sexuais entre homens; em estampas japonesas ancestrais jogos eróticos; na América pré-
colombiana, figuras antropomórficas; o templo de Lakshamana (Índia), decorado com
cenas de orgias; escavações na Pompéia (século XVII) mostram imagens eróticas. Na
Idade Média, no ocidente, as imagens eróticas eram representadas por figuras
demoníacas juntamente a freiras e monges. (Conforme PRADA, 2010 – Em SANTANA
E RUBIM, 2012, p. 637).

34
Reproduções do machismo.
42

A pornografia, no Ocidente, em princípio, tinha como propósito a crítica às


autoridades políticas e religiosas (rei, clero e demais autoridades). Como um produto
fruto da cultura, se molda de acordo com cada período histórico. (SANTANA E
RUBIM, 2012, P.636-637).

Conforme Lynn Hunt (1999), a pornografia foi ao longo da história do Ocidente


permeada por diferentes conflitos e sujeitos: de um lado estavam frequentemente
escritores, pintores e gravadores35, e de outro, espiões, polícia, padres e funcionários
públicos. O controle dos materiais pornográficos da Europa medieval até o século XVII
era feito em nome da religião e da política e não em nome de uma decência. Ora, a
pornografia e a Revolução Francesa (1789-1799) estiveram intimamente ligadas, sendo
a pornografia um instrumento de contestação política que ajudou a Revolução. Em
1789, a pornografia cresceu sob o aspecto de embate político, destinando seus ataques
principalmente à rainha Maria Antonieta, na França. A pornografia relacionada a
excitação do prazer, começou a ser publicada em 1790. (HUNT, 1999, p. 330).

Assim, a pornografia não configurava uma categoria literária distinta antes do


século XIX, mas a forte regulação moral do início do século XIX marca uma
preocupação antiga com o controle dos conteúdos pornográficos.

A concepção de pornografia é variável de acordo com os contextos históricos, os


interesses políticos e religiosos, passando por censuras da igreja ocidental (como
produto da imoralidade) e proibições políticas (por ser visto como incitador de revolta).
O questionamento moral se inicia quando as classes populares tem acesso aos produtos
da pornografia, em meados do século XIX, deixam de serem restritos as elites. A
negatividade atribuída à pornografia tem fundamentos no contexto de dominação sobre
determinados interesses seja da religião, da moral, do status, do poder e da política36.
(SANTANA E RUBIM, 2012).

35
Conforme Lynn Hunt, “Os autores e gravadores pornográficos surgiram entre os hereges, livres-
pensadores e libertinos de reputação duvidosa, que ocupam uma posição inferior entre os promotores do
progresso no Ocidente.”. (HUNT, 1999, p. 10).
36
Os primeiros textos, da década de 1740 na França, refletem a pornografia no formato filosófico,
literário e libertino, para criticar o rei, o clero e a corte. No final dessa década a produção pornografia já
tinha objetivos voltados para a comercialização, destinada a incitação do prazer sexual. (SANTANA E
RUBIM, 2012, p. 638).
43

A pornografia política alcançou o seu auge no fim do século XVIII, e em seu


lugar cresceu uma pornografia que continuava questionando a moral e a sociedade, mas
de uma forma sutil, sem atingir figuras políticas. A Revolução Francesa com seu
espectro de mobilização das massas implicou na regulamentação da pornografia na
Europa ocidental durante a década de 1830; nesta época, a pornografia se tornou um
gênero distinto: pode-se dizer que os romances pornográficos posteriores a 1795
buscavam apresentar novos prazeres sexuais, abandonando a pornografia política, mas
sem deixar de questionar a realidade social. A pornografia tornava-se um gênero
distinto, ainda que de “lugar inferior” na vida “doméstica e burguesa” (século XIX e
XX). (HUNT, 1999, p. 330-370).

Ora, o termo “pornografia” como se conhece hoje, foi definido ao final do século
XVIII. A partir do advento da imprensa (popularizado no século XVI) e do crescimento
das tecnologias de impressão, as produções pornográficas são inseridas no campo
comercial, como objeto destinado ao prazer sexual. O público leitor, antes restrito as
classes mais altas, expande-se para as camadas populares urbanas. (SANTANA E
RUBIM, 2012, P.636-637).

Com a Revolução Francesa, e outras mudanças nos séculos XVIII e XIX, devido
os novos padrões morais e ideais políticos desse período, a diferenciação entre os sexos
se torna necessário na vida social e política, moldando também o ideário pornográfico 37.
Como instrumento cultural, inserido em uma lógica de mercado meio a interesses
políticos, a pornografia, destinada a um público masculino urbano (fundamentado nos
princípios patriarcais, no poder do “macho”), consumida e produzida por eles, a
indústria pornográfica passa a delimitar os estereótipos sexuais femininos (submisso,
vulgar) e masculinos (dominador, forte e viril) 38. (SANTANA E RUBIM, 2012).

37
(KAMPF, 2008. Em SANTANA E RUBIM, 2012, p. 639).
38
Desde sua função como objeto de contestação, a pornografia se destinava a elite masculina e urbana.
Decorre deste fato, do controle masculino na cultura pornográfica, um grande debate entre correntes
feministas (com destaque para as décadas 1970 e 1980) nos Estados Unidos, onde houve a divisão entre
dois grupos do feminismo lésbico – as que defendiam a pornografia como instrumento para a
emancipação da sexualidade feminista (as pró-sexo/anti-censura) compreendendo que o problema não
estava na pornografia, mas na forma como estava sendo utilizada. Defendiam a livre sexualidade,
reconhecendo que o uso revolucionário da pornografia pode ser instrumento de libertação do patriarcado.
Wendy McElroy concorda com essa posição, e acredita que a pornografia pode beneficiar as mulheres a
partir da quebra de estereótipos. Já as feministas (anti-pornografia) a entendiam como a expressão do
patriarcado, que objetificava e degrinia a imagem da mulher, incitando a violência sexual. Nos Estados
44

Dessa forma, conteúdos estritamente "pornográficos" são frequentes no Ocidente


moderno; é neste que a noção de pornografia como se compreende hoje aparece. Como
exemplos de conteúdos relacionados ao nu erótico pornográfico a partir do final do
século XIX temos:

Unidos, início dos anos 1970, entrava em ascensão a cultura hippie, a pílula contraceptiva, e os
movimentos pelo amor livre. Simultaneamente, a sexualidade enfrentava um momento de forte repressão
– por grupos religiosos e políticos de extrema direita, incentivando as mulheres a retornarem
exclusivamente aos cuidados do lar, as leis contra o aborto e restrição aos direitos dos homoafetivos.
Diante dessas problemáticas, surge o movimento New Right, defendido por parte do movimento feminista
lésbico. (SANTANA E RUBIM, 2012, P. 639). Conforme SANTANA E RUBIM (2012), Carole Vance
acreditava que a pornografia é campo de repressões, violência, como também lugar dos prazeres.
Apontava que a saída das feministas do século XIX foi restringir os seus próprios desejos desencorajando
os desejos dos homens. Beatriz Preciado rompe com as antigas demandas do feminismo e cria uma nova
teoria a respeito da sexualidade, repensando as tecnologias do corpo, as práticas sexuais e as
performances; defendendo que a solução estaria em uma reformulação na cultura do sexo. Fundamentada
em Foucault, aponta que a pornografia constrói um tipo de normalização heterossexual do corpo e do
sexo, a partir da exclusão dos que fogem dos padrões estabelecidos. Ela diverge das feministas anti-
pornográficas, quando aponta que a solução não está na censura, mas em uma nova pornografia, baseada
no diverso, construída pelas vozes dos travestis, transexuais, profissionais do sexo, homoafetivos, lésbicas
– todos que foram excluídos dos padrões de normatização. (SANTANA E RUBIM, 2012).
45

Figura 1 – Fotografia entre os séculos XIX e XX

Fonte: print screen do álbum virtual “Dziewczyny Mojego Dziadka”39.

Figura 2 - Fotografia entre os séculos XIX e XX

Fonte: print screen do álbum virtual “Dziewczyny Mojego Dziadka” 40.

39
Álbum virtual intitulado “Dziewczyny Mojego Dziadka” em Polonês, com a tradução “Menina do Meu
Avô”, no qual são apresentadas fotografias do século XIX e XX de caráter artístico, sensual.
(Dziewczyny Mojego Dziadka. Acesso em 16 ago. 2014).
40
(Ibidem.).
46

Figura 3 – Fotografia entre os séculos XIX e XX

Fonte: SOUSA, 200541.

41
(Acesso em 16 ago. 2014.). Imagem erótico-pornográfica, sem data exata, situada por volta dos séculos
XIX e XX. Retratando a masturbação feminina em uma relação lésbica.
47

Figura 4 – Pintura do Barão Von Bayros no começo do século XX

Fonte: VILLA, 200942.

42
(Acesso em 16 ago. 2014). Pintura expressando nudez e erotismo, por volta do início do século XX.
48

Figura 5 – Pintura de Balthus “La leçon de Guitare” (1934)

Fonte: VILLA, 200943.

43
(Acesso em 16 ago. 2014). Traduzindo para o português o título seria “A Lição da Guitarra”. Pintura
expressando nudez e erotismo. Aparece-me como uma mulher mais velha, em uma cena de “castigo”
erótico a uma mulher jovem.
49

Figura 6 – Fotografias de 1906

Fonte: SOUSA, 200544.

44
(Acesso em 16 ago. 2014.). Fotografias erótico-pornográficas, com utilização de instrumentos para
excitação sexual e demonstração explícita dos órgãos sexuais.
50

4.1 Pornografia no Brasil

Trazendo a moderna concepção de pornografia, de conotação sexual para a


modernidade brasileira, encontramos o sexual, e o erótico, também presente nas
músicas, principalmente nas marchinhas carnavalescas45 de duplo sentido, como
exemplo, o samba carnavalesco “Sae Piroca” de Astério Menezes, em 1921. Na música
todos cantavam “Sai piroca/Sai piroca/Sai, não faça azar, Piroca/Sai, vou namorar” e as
mulheres “Já começa a me bulir/Você é mesmo bulidor/ Por favor, seu Piroca está
perto/Não me fale em amor/Seu Piroca não que isto/Você é mesmo bulidor”46.

Figura 7 – Samba carnavalesco “Sae Piroca” da década de 20

Fonte: CADENA, 2013.

45
No Brasil, o carnaval é para DaMatta (1986) a festa mais importante, livre e criativa de todas. É o
momento de fuga da rotina diária, do “extraordinário”. O carnaval é a possibilidade de “liberdade”, da
riqueza, da fantasia, da alegria, e do prazer ao alcance de todos. É o momento esperado, desejado e
necessário, no qual cantamos e dançamos, o importante é a musica, a dança, a alegria, o prazer.
(DAMATTA, 1986, p. 67-78). Em Parker (1991) o carnaval, a malandragem e a sacanagem parecem
surgir como partes do mundo de “prazeres e paixões”, o carnaval configura o momento de conversão das
regras.
46
CADENA, 2013.
51

Figura 8 – Marcha Carnavalesca “Na Minha casa não se racha lenha” de 1920.

Fonte: NEVES, 2012.


52

Alguns forrós também apresentavam letras de duplo sentido na década de


1970/1980 como as letras de forró do pernambucano de Zenilton47:

Meu Casamento – Zenilton


Seu moço eu inventei de me casar
E fui morar numa casinha bem singela
Minha mobília era uma cama quebrada
Duas panelas furadas, três pratos e uma tigela
A minha noiva ela também é pobrezinha
Ela só tinha uma cabacinha
Eu fui buscar água nela
Veja seu moço, tinha um toco no caminho
Eu tropecei no danadinho
E quebrei a cabaça dela…
Quebrei, quebrei, quebrei a cabaça dela
Quebrei, quebrei, quebrei a cabaça dela.

Mudança Das Capitais – Zenilton

A capital do Equador é Quito


Nunca mudou, é sempre Quito
Ouro Preto mudou pra Belo Horizonte
Teve mudança em diversas capitais
Rio de janeiro mudou para Brasília
Brasília é no Estado de Goiás
Alagoas mudou pra Maceió
e Maceió é terra dos marechais
A capital do Equador é Quito
Nunca mudou, é sempre Quito
Oeiras mudou pra Teresina
Paraíba se mudou pra João Pessoa

47
Letras.mus.br (acesso em 21 ago. 2014).
53

São Cristóvão se mudou pra Aracaju


Até Coimbra se mudou para Lisboa
Sais e Menfis mudaram para o Cairo
Eu fui ao Cairo e achei a cidade boa
A capital do Equador é Quito
Nunca mudou, é sempre Quito
A capital do Equador é Quito
Nunca mudou, é sempre Quito

Da mesma época, também temos como exemplo, o forró “Radinho de Pilha”


conhecido na voz de Genival Lacerda48:

RADINHO DE PILHA

Fui Pra cidade do Rio De Janeiro,

Trabalhei o ano inteiro e fiz até Serão,

A vida do Paraíba não foi brincadeira,

De servente, de Pedreiro

Pra ganhar o pão

Fiz economia,

Deixei de fumar,

Comprei um Radio De Pilha e mandei Pro meu bem

Fiquei muito revoltado quando Regressei,

O Radio que eu dei pra ela, ela doou Pra alguém

Mas ela deu o radio,

Ela deu o radio e nem me disse nada, Ela deu o radio

Ela deu sim, foi pra fazer pirraça, mas Ela deu de graça,

O radio que eu comprei, e lhe Presenteei

Eu sou honesto, sou trabalhador,

48
Vagalume (acesso em 21 ago. 2014).
54

Mas não gosto de deboche com a minha cara

Não vou enfeitar boneca pros outros Brincar

Ninguém vai pintar o sete com esse pau De arara

Eu não tolero tanto desaforo,

Tem mulher que só aprende quando o coro desce

Pra gente ficar de pazes vou lhe dar Uma foba,

Pois o radio que eu comprei, todo Mundo já conhece.

Tais conteúdos desconstroem o discurso frequente nos dias atuais, que


“antigamente” as pessoas eram “comportadas”, diante de uma compreensão de que há
décadas ou séculos atrás, os indivíduos não sentiam a necessidade do erótico, do
sensual, pois eram classificados como seguidores da moral. A ideia de um passado
intimamente moral dá força aos discursos de que as mulheres hoje em dia perderam o
“respeito”, “não se valorizam”, por isso tanto se autoexpõem quanto “se deixam” serem
vítimas da exposição indesejada, do estupro, da violência. Acusadas de não obedecerem
às antigas regras morais "do tempo dos avós", do período dito de “fé”, “ética”, “valor a
si”, “responsabilidade”, época em que todos supostamente as seguiam rigorosamente,
com toda a empolgação do “respeito”.

Outro instrumento cultural que compõe a cultura erótico-pornográfica brasileira é


o gênero musical “funk”, entrando no Brasil em 1970, por influência dos Estados
Unidos (1960), cresce desde então (VIANA 2010). Estigmatizado pela mídia, porém
adotado pelas massas populares. Mesmo carregando os elementos de duplo sentido, de
conotação sexual, encontrados nas machinhas de carnaval e nos forrós, foi alvo de
intenso preconceito.

O “Funk Proibidão” enfrentou muita polêmica, por expor nas músicas as


explícitas práticas sexuais. Como ícones desse estilo musical nos dias atuais temos
55

Valesca Popozuda e Mr. Catra. Como exemplo, citamos a música “Me Ama – Mama”,
cantada pelos dois artistas49:

ME AMA- MAMA

Valesca:
Muita polêmica, muita confusão
Resolvi parar de cantar palavrão
Por isso, negão, vou cantar essa canção
Quando eu te vi de patrão, de cordão, de R1 e camisa azul
Logo encharcou minha xota e ali percebi que piscou o meu cu
Eu sei que você já é casado, mas me diz o que fazer
Porque quando a piroca tem dona é que vem a vontade de fuder

Então mama, pega no meu grelo e mama


Me chama de piranha na cama
Minha xota quer gozar, quero dar, quero te dar [...]

E, aí Catra, o meu grelo já tá latejando


Qual vai ser? Manda o papo, negão

Catra:
Quando eu te vi no portão, de trancinha, tamanco e vestido azul
Logo latejou o meu pau e ali logo vi que piscou o seu cu
Puxei sua calcinha de lado e dei três cuspidas pro meu pau entrar
Então eu fiquei assustado, porque você só queria mamar

Então mama, pega minha vara e mama


Vem deitar na minha cama
Aah... Maravilha
Mama, olha bem pra mim e mama
Mama o meu saco
Ah, eu vou me apaixonar [...].

49
KBOING (acesso em 21 ago. 2014).
56

Winckler (1983) traz a discussão de modelos da pornografia no Brasil


contemporâneo: a “pornografia branda”, a “pornografia forte” e a “pornografia das
classes populares”.

A pornografia branda é o espaço da reintegração da moral sexual burguesa


patriarcal, que estava no processo de reformulação. Este modelo de pornografia se
adequa a normalidade da realidade social, sem trazer nenhum elemento inovador.
Permite alguma liberdade, para certas classes, mas mantendo os valores do
patriarcalismo. (WINCKLER, 1983, p. 76).

As características dessa pornografia são: concepção da mulher como “boneca


sexual”, abstração da sexualidade, com o uso do “olhar” no incentivo ao consumo por
aflorar as fantasias sexuais. De outro lado a masculinização do desejo feminino, não
menstruam, não se reproduzem, estão sempre sobre o olhar masculino no gozo e nas
relações lésbicas. Há revistas destinadas ao homoerotismo, contendo fotos e frases do
nu masculino erótico. Nas fantasias pedófilas, as “ninfetas” se destacam mescladas por
uma sensualidade de mulheres adultas experientes e aspectos físicos com traços infantis.
Na reprodução do racismo, os “não-brancos” são caracterizados pela animalidade
(grandes órgãos genitais), a alta sensualidade e com destaque para a potência sexual.
Nas relações entre patrões e empregados, supõe-se uma hierarquia, mas ambos
desfrutam das relações sexuais, dentro dos padrões do mundo pornográfico. Há a
valorização dos aspectos pré-genitais, como na analidade e oralidade, elementos
excitantes no processo de fantasia. Ao casal monogâmico burguês, se permite as
relações extraconjugais (aventuras) e ménage a tróis, sempre sobre desejo e controle do
marido, sem questionar a forma do casamento burguês monogâmico. (WINCKLER,
1983, p. 73-76).

A pornografia forte apresenta consideráveis desafios a moral repressiva burguesa,


analisada pelo autor sobre dois aspectos: “relações incestuosas” e as “sado-
masoquistas”. Nas relações incestuosas, o campo da fantasia alimenta a crítica ao núcleo
da família burguesa, a destruição das relações hierárquicas familiares (entre pais e
filhos, entre irmãos ou tios e sobrinhos) o incesto e relações homoafetivas entre mãe e
filha. Tais relações envolvem precocemente a sexualidade das crianças, principalmente
as meninas, que iniciam sutilmente as práticas e tornam-se insaciáveis ao longo do ato.
57

Enquanto que os meninos são apresentados como “prodígios eróticos”. (WINCKLER,


1983, p. 77).

A pornografia sado-masoquista reflete a violência contra a mulher, aparece


geralmente nas fantasias como a “virgem disponível” para o ato sexual, excitando os
princípios de dominação no desejo do homem. Nesse modelo de pornografia, as
mulheres apreciavam serem estupradas, machucadas e acorrentadas, a violência nesse
modelo é o elemento principal de excitação. Criando dessa forma outras formas de
repressão. (WINCKLER, 1983, p. 79).

A pornografia branda é mais reproduzida em escala industrial, por se relacionar a


sexualidade burguesa. Enquanto que a pornografia forte revela o descontrole da
sexualidade, chegando a assumir ditas formas “patológicas”. No entanto, toda expressão
da cultura pornográfica centraliza-se no “Falo” (denominado como cetro, espeto, anzol,
maçarico, chicote, pênis-clitóris), apresentado como o símbolo do poder. (WINCKLER,
1983, p. 80-81).

Na pornografia das classes populares, diante da grande curiosidade dos homens


das classes populares, sobre os materiais eróticos que a burguesia possuía, o editor
Faruk El Khatib lançou, no Brasil, a revista Peteca em 1976 (da Editora Grapifar),
destinada ao acesso popular. A revista permitia uma interlocução entre a pornografia
branda e a educação sexual, respondendo nas suas publicações as cartas com as dúvidas
dos leitores. Apresentava fotos de mulheres nuas, palavras cruzadas e informações sobre
sexo, dentro dos limites da censura da época. Segundo o editor da revista, esta era
“erótico-educativa” e não pornográfica. A busca de informações da população exigia
cada vez mais, as revistas foram se adequando a essa ansiedade por conhecimento.
(WINCKLER, 1983, p. 86-87).

No campo cultural pornográfico do Brasil contemporâneo, após suas


transformações no campo socioeconômico, surgem materiais para mulheres, e
principalmente, produtos para o público masculino (como as revistas no final da década
de 60). No entanto, esses conteúdos tinham uma relativa liberdade, pois seus limites
eram controlados pelo governo. Em 1969 todos os conteúdos culturais passavam por um
rígido controle (com o decreto 477) e em 1970 (o decreto-lei 1077), para a manutenção
“da moral e dos bons costumes”, todo material que fugisse dos limites estabelecidos
58

seria censurado previamente ou apreendido. Apenas no final de 1973 que começa uma
leve abertura da censura, possibilitando o surgimento de materiais eróticos para o
publico hetero e homoafetivo. (WINCKLER, 1983, P. 66-72).

Uma matéria intitulada “Duro, só o regime”, da Editora TRIP (em 2010) aponta
que no período da ditadura militar (1964-1985) o Brasil encobriu as “bundas e peitos”
das revistas, em nome da moral e contra a ameaça do comunismo. A indústria do sexo
(as revistas, filmes, livros, contos) era para a ditadura uma ameaça à família cristã e
propiciava o avanço do comunismo. Enquanto que os comunistas utilizavam o mesmo
discurso contra o capitalismo. As revistas passaram por uma rigorosa censura, bundas
só poderiam aparecer de perfil, os seios deveriam ser encobertos e a vagina não poderia
ser mostrada de forma alguma. A revista Edrél teve grande repercussão, mas encerrou
as produções em 1975. A Peteca entrava em cena, conhecida como a “playboy dos
pobres”. Com o governo de Ernesto Geisel (1974-1979), houve a chamada “abertura
política”, período em que a censura sobre os materiais pornográficos é reduzida,
surgindo os “retratos ginecológicos”. Assim, as revistas, filmes e livros pornográficos
invadem o comércio50.

50
(Disponível em: <revistatrip.uol.com.br/print.php?cont_id=31055>. Acesso em 18 ago. 2014).
59

Figura 9 - Revista Peteca edição n°1/76.

Fonte: KAISER, 201051.

A pornografia é um instrumento crucial na construção do sexo enquanto


performance, em relação aos gestos, poses e práticas sensuais, a população se espelhava
e continua se espelhando nos conteúdos pornográficos para “aprender” o sexo. As
revistas, filmes e contos “educaram”, “ensinaram” as formas aceitáveis de se fazer sexo,
normalizando nos prazeres as formas de se consumir o sexo na nossa sociedade.

51
(Acesso em 18 ago. 2014.). Revista contendo jogos com temáticas eróticas, matérias sobre dicas
sexuais, dento do formato aceito pela moral.
60

Foucault (1976) nos fala da existência dos chamados "manuais sexuais", como
aqueles que percorriam as sociedades orientais para passar a todas as gerações o segredo
sobre o sexo, para que esse não se perdesse em qualidade, em perfeição. Os manuais
possuíam um caráter educativo como, por exemplo, o Kama Sutra. Na nossa sociedade
ocidental os manuais sexuais se instituíram sobre um caráter pedagógico, mas
juntamente a moralismos, desde os primeiros manuais de confissão que ditaram o certo
e o errado. Outros manuais surgiram com traços de uma “modernidade”, mas sem
perder as características do permitido e do proibido, aceitável ou não na sociedade.
Como exemplos de manuais de caráter pedagógico, relacionados diretamente aos
comportamentos sexuais, apresento duas revistas da Editora Abril que dominou o
mercado brasileiro, uma destinada ao público adolescente – a revista CAPRICHO, e
outra para mulheres adultas – a revista NOVA. Educando sobre os comportamentos
aceitáveis nos determinados momentos, locais e envolvidos.
A revista Capricho, destinada a garotas adolescentes de classe média/alta. Criada
em 1952 por Victor Civita, sendo, segundo o site da própria CAPRICHO, a primeira
revista feminina brasileira. Durante trinta anos destinava-se a fotonovelas, passando
depois de algum tempo a tratar de moda e comportamento. Em 1985, se torna uma
revista para adolescentes, em 2006 é reformada, em relação a estrutura gráfica, e passa a
ser relacionada com o site que auxilia na interlocução com as leitoras. Hoje em dia, a
CAPRICHO está voltada para um público feminino adolescente entre 13 e 17 anos52.
Abordam temas como moda, festas, famosos, baile de quinze anos, questões familiares,
como se comportar em um primeiro encontro, garotos, namoro, virgindade e camisinha.

52
(Disponível em: <capricho.abril.com.br/revista/historia.shtml>. Acesso em 25 ago. 2014).
61

Figura 10 – Revista CAPRICHO de 1952

Fonte: CAMARGO, 201153.

53
(Acesso em 25 ago. 2014.). Revista contendo fotonovela romântica.
62

Figura 11 – Revista CAPRICHO de 1993

Fonte: HUMBERTO, 201154.

54
(Acesso em 25 ago. 2014.). Revista da década de 90, tratando sobre o uso camisinha. Ainda trazia
matérias sobre romantismo, garotos e os testes sobre relacionamentos. Lembrando que a CAPRICHO era
voltada para um público feminino adolescente de classe média.
63

Figura 12 – Revista CAPRICHO de 2014

Fonte: RAQUEL ESPÍRITO SANTO PHOTOGRAPHY55.

55
Anitta (nome artístico), cantora do estilo musical “funk melody”. Capa da Revista CAPRICHO
disponível em Raquel Espírito Santo Photography (Acesso em 25/08/2014). Dando continuidade a
campanha que iniciou na década de 90, mostrando a importância do tema 22 anos depois da primeira
revista.
64

Figura 13 – Matéria sobre virgindade no Site da CAPRICHO

Fonte: print screen do site oficial da CAPRICHO56.

Com o objetivo de dialogar com o publico feminino sobre temas mais sexuais
mais abertamente, diante da necessidade que surgia nos questionamentos das leitoras, a
Editora Abril lança a revista Carícia em 1975, uma pocket (revista pequena, de bolsa)
destinada a um público adolescente, no mesmo perfil da CAPRICHO. Contendo
fotonovelas e temas sobre sexualidade. (OLIVEIRA, 2011, p. 23). Capa da revista
Carícia:

56
(CAPRICHO. 5 Verdades Sobre a Primeira Vez, 2014. Acesso em 25 ago. 2014).
65

Figura 14 – Revista Carícia de 1991

Fonte: É DA SUA ÉPOCA 57.

57
(Acesso em 25 ago. 2014.). Revista tratando de sexualidade para mulheres adolescentes. Como um
manual sexual, as revistas auxiliam no processo de orientação moral sobre o que é socialmente aceitável
em relação ao corpo, o sexo, os relacionamentos.
66

A revista NOVA, em 1973, abriu ainda mais o discurso sobre o sexo para as
mulheres adultas. Abordando temas sobre sexo, comportamento, moda, beleza.
Inspirada na revista Cosmopolitan americana, trazia o que se debatia internacionalmente
para dentro das publicações brasileiras. Voltada a mulheres adultas com certo poder de
consumo, incentivando o consumo de cosméticos, roupas, e diversos outros produtos
ligados à indústria da beleza, bem como educava as mulheres sobre as formas de se
fazer sexo. Trazia também matérias sobre mercado de trabalho para as mulheres. Em
1978, inclui uma coluna sobre negócios e economia e, em 1985, uma coluna sobre
política. Mesmo assim, trazendo elementos mais inovadores para as mulheres, não
perdia a sua essência voltada para o consumismo e erotização da mulher destinada para
agradar o homem, para satisfazê-lo. (OLIVEIRA, 2011, p. 23-24). A revista traz dicas
para ajudar as mulheres a atingirem o orgasmo, mas junto ao homem, sobre o olhar
dele, para aproveitar com ele, como veremos em algumas capas. A revista NOVA
contém um detalhe muito estratégico, na sessão exclusiva sobre sexo possui um lacre,
para aumentar o “suspense” e o “segredo” sobre os preciosos conteúdos. Estas são
algumas capas da revista ao longo da história:
67

Figura 15 – Revista NOVA de 1973

Fonte: CAMARGO, 201158.

58
(Acesso em 25 ago. 2014). “Toda mulher pode sentir prazer no amor. Você também. 101 maneiras de
um homem agradar a você (é só sugerir a ele).”. (CAMARGO, 2011). Revista destinada a mulheres
adultas, tratando de dicas de sexo, como agradar o homem, como cuidar do corpo, mercado de trabalho,
dicas de saúde e beleza, cirurgias plásticas e incentivo ao consumo.
68

Figura 16 – Revista NOVA de 1987

Fonte: FOTOLOG XUXA MENEGHEL 59.

59
(Acesso em 25 ago. 2014 ). A modelo da capa é a apresentadora, cantora infantil e modelo Xuxa
Meneghel. Dicas de como ser boa no sexo, no trabalho e ser bonita. A construção da “super mulher”,
aquela que a mídia mostra trabalhando, cuidado do lar, dos filhos, do marido e permanecendo linda e
magra.
69

Figura 17 – Revista NOVA de 1989

Fonte: XUXA CAPAS, 201260.

60
(Acesso em 26 ago. 2014). A sociedade dita o ideal de mulher, como ser linda, perfeita, com poder de
consumo e feliz.
70

Figura 18 – Revista NOVA de janeiro de 2013

Fonte: PURE PEOPLE, 201461.

61
“Os hábitos das mulheres bem sucedidas.”. (Pure People, 2014). Como ser uma mulher de “sucesso” e
a liberdade sexual estabelecida moralmente.
71

Adentrando no campo erótico-pornográfico, nas revistas, filmes e fotografias


pornográficas os corpos “sarados”, moldados nas academias são a maioria atualmente,
os órgãos genitais sempre bem depilados62. A penetração aparece como o ato supremo,
o momento de maior prazer, inclusive nas relações lésbicas; ao pênis é exigido tamanho.
No Brasil, a bunda e seios “fartos” são bastante valorizados. Os sites pornográficos
apresentados em diante, por exemplo, apresentam diversas categorias de práticas
sexuais, mas dentro dessas características, sob o perfil globalizado.

Atualmente, uma categoria de destaque no campo erótico pornográfico são os


vídeos e fotos “amadores”, gravações caseiras, divulgadas pelos próprios envolvidos ou
contra a vontade destes ou sem o seu conhecimento, como nos casos de “caiu na net”.
Mas que continuam reproduzindo os mesmos padrões industriais. A internet ampliou a
indústria pornográfica e a publicação dos conteúdos “amadores” devido a grande
liberdade que esse campo proporciona.

Esses são alguns exemplos de “categorias” sexuais em sites internacionais:

Figura 19 – Categorias do site pornográfico Red Tube

Fonte: recorte do print screen do site RED TUBE63.

62
De acordo com os padrões capitalistas machistas.
63
Tradução das categorias: amador, anal, asiático, peitos grandes, loiras, sexo oral, “torta de creme”,
ejaculação, dupla penetração, ébano, faciais, fetiche, sexo grupal com um gênero em destaque (um
homem com várias mulheres ou uma mulher com vários homens), homoafetivo, grupal, alta definição
(dentro de qualquer categoria), desenho japonês pornográfico, entre raças (inter-racial), japonês, Latino,
lésbico, roupa íntima (lingerie), masturbação, madura, “Mãe que eu gostaria de comer” (Mother I Would
72

Essas abaixo são imagens de um site pornográfico nacional chamado “Pornô


Carioca”, no qual são publicados vários vídeos amadores, categorizados com traços da
pornografia forte, inserida na pornografia branda (WINCKLER, 1983), todos dentro de
um perfil erótico normalizado64:

Figura 20- Site pornográfico brasileiro – Pornô Carioca

Fonte: print screen do site PORNÔ CARIOCA.

Like to Fuk), “ponto de vista” (Point Of View), público, ruivas, transexual, esguichando, jovens
(ninfetas), antigo (retrô), “selvagem e louco”. (RED TUBE. Acesso em 18 ago. 2014).
64
Ou seja, reproduzindo o mesmo perfil sexual aceito e construído na sociedade capitalista, a respeito dos
corpos e prazeres desejados.
73

Figura 21 - Site Pornô Carioca – Vídeos

Fonte: print screen do site PORNÔ CARIOCA65.

65
Desfoque da autora. As imagens dos vídeos foram cobertas por serem frutos do “caiu na net”, podem
ter sido gravadas para divulgar, ou são vítimas da divulgação indesejada e até mesmo desconhecida. Os
títulos dos vídeos expressam incesto, com traços de pedofilia, no forte desejo por mulheres muito jovens.
A idade, o tipo de relação entre s envolvidos é destacada, bem como o local de gravação do vídeo ou de
residência das pessoas. Tenta-se expor o máximo da vida íntima dos participantes das imagens.
74

Figura 22 - Site Pornô Carioca – Vídeos

Fonte: print screen do site PORNÔ CARIOCA66.

66
Vídeos amadores, com descrição detalhada nos títulos. Aparecem imagens de “swing”, “suruba” (sexo
grupal) e incesto.
75

5 O FENÔMENO DO "CAIU NA NET”

O fenômeno do “caiu na net67” está muito relacionado com práticas como o


“sexting” e o “nude selfie”, frequentes no campo virtual, praticada por adultos e,
principalmente, por adolescentes (usuários mais assíduos da internet e tecnologias). A
expressão “caiu na net” representa a liberação de qualquer conteúdo íntimo,
sentimentos, momentos registrados em vídeos ou fotos, com ou sem o consentimento
dos envolvidos, disponibilizados na internet com o livre acesso e conhecimento de
vários indivíduos.

O “sexting”– termo referente a divulgação de conteúdos eróticos e sensuais de si


próprio, como vídeos e fotos nus, seminus ou em ato sexual. (ARRUDA, 2011, p. 6).
Começou a partir do compartilhamento dos conteúdos por celulares, devido a facilidade
de capturar e compartilhar essas imagens. Hoje o termo já engloba a divulgação dos
conteúdos sexuais através de qualquer meio eletrônico, e que os disponibilizem na rede
mundial de computadores.

O “nude selfie68” consiste em retirar fotografias de si mesmo, em poses sensuais,


utilizando roupas íntimas, seminu ou nu completo, para apreciação própria ou
divulgação (sexting). O “nude selfie” e o “sexting” através do compartilhamento de
imagens pelas redes sociais virtuais69 em geral, e principalmente através do Whatsapp70
(um instrumento que facilitou ainda mais o “sexting”), aumentam o número de vítimas

67
Abreviação do termo “internet”, usada principalmente no campo virtual.
68
Selfie é uma palavra em inglês, derivada de termo self-portrait – um neologismo que representa o
autorretrato. O termo Selfie nos moldes de hoje, significa a captura da própria imagem com objetivo de
compartilha-la na internet. A foto pode ser tirada com apenas uma pessoa ou em grupo. “Em 2013, os
responsáveis pelos dicionários da Oxford escolheram selfie como a palavra do ano. Um dos motivos para
esta escolha foi o fato de esta palavra ter crescido 17000% em 2013, o que confirma o seu estatuto de uma
das palavras mais procuradas em um ano.”. (Significado de Selfie, acesso em 07 jul. 2014).
69
Redes Sociais virtuais representam um serviço disponibilizado na internet (gratuito ou pago), utilizado
para estabelecer relações sociais entre pessoas através do campo virtual. As rede sociais virtuais mais
conhecidas são o Orkut, Facebook, Google+, Badoo, MySpace, Formspring, Twitter, entre outros.
70
WhatsApp Messenger é um serviço (os chamados “aplicativos”) para celulares, utilizado para trocar
mensagens gratuitas, fotos, vídeos e áudio. Os arquivos podem ser enviados para uma pessoa em
exclusivo, uma lista ou grupo de amigos. O aplicativo é disponível para diversos modelos de celular.
(WhatsApp, acesso em 18 ago. 2014).
76

do Cyberbullying71 – caracterizado pela agressão psicológica, como apelidos pejorativos


e diversos comentários constrangedores, realizados através de instrumentos como a
internet e os celulares. O cyberbullying tem maior repercussão que o bullying
presencial, pois os agressores podem atuar de forma anônima, através da liberdade que
as pessoas encontram na internet para criar páginas online, sem precisar de uma real
identificação. Exemplos de páginas online utilizadas para exibição e compartilhamentos
de “caiu na net”:

Figura 23 – Página do Facebook “Exibicionismo de Whatsapp”

Fonte: print screen da página online “Exibicionismo WhatsApp”72.

71
Termo formada pela junção de duas palavras – “Cyber” que representa os meios comunicação virtual,
como a internet; e a palavra “bullying” associada ao ato de agredir uma pessoa de forma física e verbal.
(SANTOMAURO, 2010).
72
“Essa página tem o intuito de demostrar fotos de quem gosta de exibir suas formas no whatsapp, seja
homem, seja mulher. Aceitamos todos, se mostrem.”. (Exibicionismo WhatsApp, criada em jul. 2014).
77

Figura 24 – página do Facebook para “sexting” no Brasil

Fonte: print screen de um grupo fechado no Facebook para sexting73.

Figura 25 – Página de “caiu na net” no Facebook

Fonte: grupo do Facebook para divulgação de “caiu na net” 74.

73
“As meninas postam, os cuecas comentam”. Censuras nas imagens feitas pela autora para preservar a
identidade dos envolvidos.
78

Uma matéria publicada no site G1 da Globo em abril de 201475, mostra uma pesquisa
realizada Pela Organização Não-Governamental (ONG) Safernet Brasil76 e a operadora
de telecomunicações - Global Village Telecom (GVT), em 2013, apontou que 20% de
2.834 jovens brasileiros afirmaram receber conteúdos de “nude selfie” e “sexting” e 6%
confirmam ter compartilhado esses arquivos com outras pessoas. Em outra pesquisa
realizada pela ONG juntamente com a Polícia Federal e o Ministério Público, apontam
que em 2013, a ONG atendeu 101 casos de pessoas que tiveram sua intimidade exposta
na internet, o dobro dos casos atendidos em 2012. Esses dados são de atendimentos
psicológicos feitos virtualmente pelos serviços gratuitos Helpline Brasil 77 da Safernet.

A pesquisa ainda revela que as vítimas da prática do “nude selfie” e “sexting” são
77,14% do sexo feminino e 22,86% do sexo masculino. Foi constatado que na faixa
etária de 10 a 12 anos estão 7,14%; de 13 a 15 anos 35,71%; 16 a 17 anos 17,86%; 18 a
25 anos 32,14% e; acima de 25 anos 7, 15%. As meninas entre 13 e 15 anos configuram
o principal perfil das vítimas. A Safernet Brasil lançou uma campanha mundial em abril
de 2014, destinada a alertar os jovens sobre o riscos da exposição. A campanha
consistia em compartilhar imagens produzidas pela ONG contendo como frases “A
78
internet não guarda segredos” e “Mantenha sua intimidade off-line” . Os manuais

74
As imagens foram censuradas para preservar a identidade das vítimas. Veja como a vida pessoal é
bastante destacada, como no caso do emprego da moça.
75
TOMAZ, 2014.
76
Conforme a página online da ONG “A Safernet Brasil é uma associação civil de direito privado, com
atuação nacional, sem fins lucrativos ou econômicos, sem vinculação político partidária, religiosa ou
racial. Fundada em 20 de dezembro de 2005 por um grupo de cientistas da computação, professores,
pesquisadores e bacharéis em Direito, a organização surgiu para materializar ações concebidas ao longo
de 2004 e 2005, quando os fundadores desenvolveram pesquisas e projetos sociais voltados para o
combate à pornografia infantil na Internet brasileira.” É uma entidade especializada em monitorar as
violações aos diretos humanos na internet. A ONG também auxilia as vítimas com acompanhamento
psicológico. (Safernet Brasil, acesso em 13 jun. 2014).
77
Os atendimentos psicológicos da Safernet Brasil são feitos online, pelo CANAL HELPLINE Brasil que
se denominam como “um canal gratuito que oferece orientação de forma pontual e informativa para
esclarecer dúvidas, ensinar formas seguras de uso da Internet e também orientar crianças e adolescentes
e/ou seus próximos que vivenciaram situações de violência on-line como humilhações, intimidações,
chantagem, tentativa de violência sexual ou exposição forçada em fotos ou filmes sensuais. Somos uma
equipe de Psicologia que faz orientação online. A orientação não é uma psicoterapia e não substitui o
atendimento psicológico presencial. A orientação é dada de maneira breve, pontual e sobre um assunto
específico. Caso seja necessário aprofundar o acompanhamento por mais tempo faremos o
encaminhamento para um serviço especializado presencial, de acordo com cada caso.”. (CANAL
HELPLINE, acesso em 18 ago. 2014).
78
TOMAZ, 2014.
79

valorizam e ensinam como ter o “corpo sexy”, mas guarde-o apenas ao seu amado, não
filme, não fotografe – esta é a “solução” apontada.

Figura 26 – Campanha Safernet Brasil

Fonte: TOMAZ, 2014.

5.1. O Caso Fran

O “caso Fran” em 2013 ganhou destaque na mídia nacional e internacional diante


da repercussão do cyberbullying, causado pela divulgação de um vídeo de uma garota
de 19 anos, natural de Goiás. Nas imagens, Fran (como ficou conhecida), aparecia nua
fazendo um gesto de “OK” e perguntando se o seu parceiro gostaria de fazer sexo anal,
estando ele presente na gravação, mas sem mostrar o rosto. O vídeo, juntamente com o
nome da vítima, sua rede social e numero do telefone foram divulgados no whatsapp, o
principal suspeito é o seu parceiro no vídeo com quem Fran tinha uma relação
extraconjugal. Após o compartilhamento das imagens, espalhadas no meio virtual
rapidamente principalmente através do aplicativo de celulares Whatsapp, o gesto de
Fran foi repetido por milhões de pessoas nas redes sociais, como uma “engraçada”
brincadeira, inclusive por famosos como o cantor Leonardo, como nas seguintes
imagens:
80

Figura 27 – Fran e o gesto

Fonte: SEMPRE TOPS, 201379.

Figura 28 – Pessoas repetindo o gesto de Fran nas redes sociais

Fonte: PORTAL 180°, 201380.

79
A imagem da jovem foi desfocada pela autora. A imagem de Fran foi divulgada intensamente na
internet e alvo de muitas montagens.
81

Figura 29 – Cantor Leonardo repetindo o gesto de Fran

Fonte: FSQ.

Figura 30 – Piadas com o gesto Fran

Fonte: GERADOR MEMES, 201381.

Fran foi fortemente criticada e culpabilizada por ter permitido a gravação ou até
mesmo, por ter praticado o ato. As imagens eram compartilhadas diante da beleza da
garota, depois eram criticadas e se tornavam motivo de piada, como se o ato ou o pedido

80
As pessoas repetiam o gesto Fran como uma “moda” criada no meio virtual, como um reforço a piada
repercutida sobre a atitude da jovem. Fazer o gesto Fran e tira um “selfie” (foto de si) aparecia como um
ato “moderno”, “legal”, “divertido”.
81
“Força Fran o „cacete‟, vai lavar essa louça”. (GERADOR MEMES, 2013).
82

de Fran fosse algo incomum, nunca praticado entre os demais indivíduos. As


culpabilizações se intensificaram quando se espalhou que o homem junto a Fran no
vídeo era casado.

5.2 O Caso Fabi

Outro caso assustador, em termos de consequências, foi o “caso Fabi” de uma


garota de 16 anos. Após ter foto intima (seminua) publicada na internet, cometeu
suicídio. Segundo o delegado responsável pela investigação do caso, o motivo do
suicídio teria sido uma imagem compartilhada por um amigo da vitima, na qual a garota
aparecia com os seios à mostra82.

Figura 31 – Imagem da notícia.

Fonte: print screen do Site FATOS POLÍTICOS, 2013.

82
FATOS POLÍTICOS, 2013.
83

Outro fato alarmante nessa notícia são os comentários das pessoas sobre a atitude
da garota, como expõe as seguintes imagens com o print sreen dos comentários83:

Figura 32 – Comentários caso Fabi

Figura 33 - Comentários caso Fabi

83
Grifos e desfoque da autora.
84

Figura 34 - Comentários caso Fabi


85

Figura 35 - Comentários caso Fabi

Figura 36 - Comentários caso Fabi


86

Figura 37 - Comentários caso Fabi

Figura 38 - Comentários caso Fabi


87

Após cometer o “erro” a garota passa a pertencer ao caminho obscuro, temido e


julgado socialmente da pornografia, da prostituição. O dito caminho do “sujo”, do
errado. Por uma simples foto seu “destino” seria apontado como este, visto que agora
ela já é “suja” e não teria outro caminho mais adequado. Assim, os “limpos”, “corretos”
cidadãos fazem o alerta: não faça, não mostre, não se exponha jamais. As pessoas não
são confiáveis, as pessoas são “terríveis”, mas a culpada é você, quem tem que se privar
de algo é você.

Diz-se que a falta de respeito é coisa da modernidade, da juventude, antigamente


ninguém fazia isso (remetendo-se a décadas atrás), mas também, antigamente não se
tinha internet, não se tinha Smartfone, onde estão esses registro de uma época moral
exemplar e socialmente positiva?84.

A jovem é condenada por ter cometido um grave erro, uma terrível atitude. Como
é abominável o ato de exibir o corpo, quanta “pena” sentem dessa errante. Mas precisam
ver, desejar e sentir essa “terrível” prova do crime.

O repúdio a fotografia sensual, a culpabilização da jovem, a ideia de


“antigamente” não se tinha isso, antigamente se tinha “respeito”, a desqualificação do
crime, a inferiorização da morte da garota, o alerta “parem de se fotografar”, “não
façam”, e finalmente, “cadê as fotos?”. Esses são os “conselhos” deixados a real vítima
do problema, causado pela forma que esse tipo de exibição é encarada socialmente.
Fala-se que a “falta de respeito” partiu dela, não de quem divulgou a imagem. Eles
falam de inversão de valores, mas que real valor é atribuído a esse “respeito”? . Este
“respeito” tratado nos comentário é sobre uma conduta sexual moral estabelecida na
nossa sociedade, propondo que não se mostre, mas desejando ver.

Além das imagens publicadas por prazer ou por vingança, também existem as
postas na internet devido o roubo ou perda de aparelhos celulares, como também a
invasão aos computadores das vítimas. Para tais crimes virtuais, foi aprovada

84
O “boca-a-boca” fazia a divulgação local, os registros verbais não alcançavam públicos mundialmente.
Enquanto que a internet alcança públicos globais, expande-se e registra ao longo da história, a partir da
concretude das imagens.
88

recentemente a Lei 12.73785 de 30 de novembro de 2012, apelidada de “Lei Carolina


Dieckmann” devido à problemática que envolveu a atriz em questão, tendo seu
computador invadido e suas fotos íntimas divulgadas na internet. A lei estabelece pena
de multa e reclusão para quem violar conteúdos privados, comerciais e industriais, como
também a segurança de aparelhos de informática.

No entanto, a maior penalização é destinada as vítimas condenadas pela


sociedade. A grande fama se dissolve na mesma rapidez que começa. As imagens se
tornam um produto qualquer, consumido e descartado rapidamente no ciberespaço86,
como indissociáveis do mundo real, a não ser as marcas causadas nas vítimas. Restam a
estas, ridicularizadas pela cultura vigente na sociedade, os problemas familiares, a
vergonha, as dificuldades no mercado de trabalho, a reclusão e o suicídio.

A face do exibicionismo é intensa no ciberespaço, onde as pessoas tem a liberdade


de ser protagonistas, ter seus momentos de fama, de popularidade, podendo optar por
mostrar ou não sua identidade do mundo real/físico. Os jovens lideram o acesso à
internet, mas não é um mundo exclusivo a eles, os adultos também estão fortemente
inseridos. Utilizam esse instrumento para exibir suas vidas, seus sentimentos e seus
corpos, para serem incluídos nessa nova cultura que exige das pessoas a conexão com o
mundo globalizado, com a rápida informação. Dispõe dos diversos instrumentos
disponíveis na internet, como as redes sociais e dos aplicativos para celulares. Se
conectam nesse universo, como uma necessidade que surge diante dessa ampliação da
cultura de massa. Quem não possui nenhum desses instrumentos de comunicação é visto
como antigo, desatualizado, sem informação, o “homem das cavernas” do século digital.

Fotografam todos os seus momentos, as viagens, a refeição do dia, a roupa que


está vestindo, como algo natural, necessário, libertador e moderno. Vemos a expressão
de algumas dessas práticas, nas músicas, nas novelas, em todos os outros espaços,

85
“Dispõe sobre a tipificação criminal de delitos informáticos; altera o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 - Código Penal; e dá outras providências.”. (Disponível em <
www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12737.htm>. Acesso em 27 ago. 2014).
86
Ciberespaço consiste no espaço virtual, onde não há presença física. Definido como o mundo virtual,
pois existe fora do território físico. Não é palpável, mas possui suas próprias características e
peculiaridades. (MONTEIRO, 2007).
89

midiáticos, como por exemplo, na música “Ela é top”87 do MC Bola, em que ele fala
sobre o ato de se fotografar e exibir nas redes sociais, com o refrão “Ela não anda, ela
desfila, é top, capa de revista. É a mais mais, ela arrasa no look. Tira foto no espelho pra
postar no Facebook".

A sociedade que criou o “selfie”, o “nude selfie”, o “sexting” é a mesma que


condena essas práticas, que ridiculariza os envolvidos. Para além das vítimas do
descontrole que a internet proporciona, tendo suas imagens íntimas divulgadas e
criticadas; existem as pessoas que se expõe, divulgando sua imagem por vontade
própria, para serem vistas, elogiadas, desejadas, inseridas nessa “modernidade”. Não
afirmando que o ato de se exibir seja fruto da modernidade, do mundo virtual, como
mostramos anteriormente, a exibição, a erotização, a apreciação do corpo e do sexo não
é algo novo, mas a liberdade que a internet proporciona, amplia o espaço de
protagonismo dos indivíduos.

A cibercultura exercida no ciberespaço, por algum momento parece ser


indissociável do mundo real, pelas fantasias, pela liberdade. Essa cultura adota o
exibicionismo, a popularidade, as fotos sensuais, as identidades fantasiosas. Mas
quando as reais identidades aparecem o mundo real adentra nesse universo.

A partir de Foucault (1976) podemos examinar como a cibercultura não foge da


nossa sociedade que tanto se falou e fala em sexo, exige que seja dito, ensinado,
conhecido, mas desde que se fale e se faça da forma “correta”, da forma aceitável.
Deve-se falar de sexo de forma erótica, em casa com o marido ou com o namorado
(como apontam as revistas femininas, já mencionadas neste trabalho). De forma
científica, saudável e preventiva com a ginecologista e sob os ensinamentos da escola.
De forma educativa e “cuidadosa” deve-se vigiar os instintos das crianças.

As pessoas se tornam vítimas no momento que a sociedade da exibição as


condenam, por fazerem as práticas “erradas”, por mostrarem a todos o que todos fazem
ou desejam fazer, por cederem as tentações e prazeres do ato de se fotografar, de se
sentir sensual, contar sentimentos, serem filmadas, vistas e desejadas.

87
Vagalume. (Acesso em 16 jun. 2014).
90

Por um lado, é libertário, tentador, artístico; principalmente o falar88. Como se


necessitamos nos sentir libertos e como se o ato de falar89 e se expor fossem objetos de
libertação. De tanto se incitar o discurso, quando ele não está presente nos sentimos
presos. Por outro lado é condenável, socialmente errado. São vítimas em diversos
aspectos, quando se mostram por vontade própria e são declaradas “ridículas”, “sujas”,
“erradas”, e quando são exibidas sem seu consentimento, sendo mesmo assim,
“culpadas”, responsáveis por terem cedido a esse desejo, por se arriscarem a exposição
desejada e odiada pela mesma sociedade. Isto é essencialmente forte quando os
envolvidos são mulheres, como nos casos apresentados, em que carregam toda a
construção histórica de inferioridade dada ao feminino.

Nos conteúdos expostos aparecem concepções que falam de amor e cuidado por si
próprio. Mas demonstra ódio, repressão dos instintos e vergonha, quando se fala nesse
“respeito”, “valor”, “responsabilidade” moralmente estabelecidos. Nos reprimimos a
todo momento, para nos considerarmos “normais”, “aceitos”, mesmo quando
praticamos o que entendemos por erótico, mas aquele erótico moralmente permitido. É
sensual, libertador, o ato de se fotografar, mas é “estranho” mostrar a outros, “errado”
aos os olhos dos outros e culpabilizante aos nossos.

O erótico, o sensual estiveram presentes ao longo da história como parte das


necessidades humanas, porém reprimidos, normatizados, padronizados, estigmatizados.
Os manuais sexuais nos ditam o moralmente aceitável e o condenável, para cada idade e
classe social. A moral vigente permanece aliada aos ideais da Era Vitoriana de que trata
Foucault (1976), escondendo o sexo (existente) sobre o discurso (puritano). Falando
para adequar, ouvindo objetivando silenciar.

88
Freud discute sobre o “falar”, como um instrumento de cura, de libertação.
89
Seja falando com palavras, imagens, dança entre outras formas de transmitir, de expressar.
91

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho tratou do fenômeno do "caiu na net" no Brasil, fenômeno que fala de
pornografia e moral sob diferentes discursos. O trabalho salienta elementos a
perpassarem a história da família no Ocidente e do sexo dentro e fora desta instituição.
Salienta ainda o fenômeno da misoginia e de seu repúdio ao feminino. Traz uma
discussão sobre o cristianismo e seus instrumentos de dominação, assim analisa a
existência da pornografia e dos diferentes manuais sexuais como reguladores da moral
sexual. Tomando estes elementos como ponto de partida, o trabalho busca efetuar uma
análise do fenômeno do “caiu na net”, enfocando o seu crescimento e repercussão,
mais especificamente no Brasil.

É perceptível, diante das leituras efetuadas, como a família se transformou ao


longo da história do Ocidente, e como atuou, juntamente com um conjunto de outras
instituições moldando a sexualidade; controlando adequando-a a padrões necessários a
lógica que a sociedade foi exigindo. A família foi, primeiramente, objeto controlado,
para depois, por estratégias do poder, tornar-se instrumento controlador, sob o aval da
Igreja, da ciência e da justiça institucional.

Diante das prescrições restritivas ao lado das incitações aos discursos desta
sociedade, o erótico, o sensual, o prazer sexual permanecem histórica e
ambivalentemente desejados e condenados pela moral que exigia a fala para silenciar as
práticas. Na verdade, prazer e o erotismo dentro da esfera da sexualidade não é fruto da
modernidade, já que expressões destes elementos são encontrados muito antes das
novas aceitações sexuais e da popularização da pornografia. O erótico está presente,
inclusive em épocas tidas como mais recatadas; basta olharmos as pinturas, as
fotografias desses períodos. Aqui trato de uma moral presente nas mesmas estratégias,
com os mesmos objetivos: de um lado os indivíduos estão sedentos de sexo, erotismo,
prazer e de outro lado, são orientados a controlar seus instintos, adotarem os padrões de
moral e refinamento que os “bons”, “normais”, indivíduos teoricamente possuiriam.

Vimos como a misoginia determinou as ramificações sobre as formas de violência


de gênero, quando um arquivo fruto do “caiu na net” é extremamente polemizado por
envolver mulheres. O “feminino” é atingido por quem vê e condena e por quem faz e se
92

culpabiliza, diante da consciência moralmente construída, dentro do discurso de


responsabilidade.

É notável como os manuais sexuais, fruto de todas as regulações morais,


educaram e educam os indivíduos sobre o que é desejável, sensual e, dessa forma, os
conteúdos “amadores”, “não industriais”, “caseiros”, são aparentemente libertadores por
dar a sensação de descobrir o novo (mesmo repetindo o desejo comercial), ou de fato,
exercendo o desejo real, humano. Aqui, se faz do ato de filmar e de fotografar a si
próprio a realização de um desejo erótico. Mesmo diante disso, estas expressões
permanecem como objetos de dominação moral no momento em que o discurso
condenável atua sobre as práticas da exposição dos corpos.

Concepções do corpo, sexo, nudez, performance sensual, erotismo, pornografia


globalizada, machismo, misoginia, discurso do ódio e exibição da vingança, respeito
entre outras que permeiam este trabalho, não podem ser compreendidas com os mesmos
olhos. Compreender esse fenômeno exige tempo e dedicação, além do que a graduação
permite. O “caiu na net” parece crescer a cada dia, na mesma proporção que as críticas a
quem se expõe. Dessa forma, a ampliação deste trabalho é fundamental para tentarmos
acompanhar os valores e concepções que a dinâmica da realidade vai deixando ao
campo do conhecimento. A teoria procura compreender os fenômenos concretos, mas
sabemos como isto não ocorre na mesma velocidade dos próprios fenômenos.
93

7 REFERÊNCIAS

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o caso Felipe Neto. Biblioteca online de Ciências da Comunicação (BOCC), 2011.
Disponível em: <www.bocc.ubi.pt/pag/arruda-et-al-a-exposicao-do-jovem-na-
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de delitos informáticos; altera o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 -
Código Penal; e dá outras providências. Presidência da república: Brasília, 2012.
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