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Alvaro do Carvalhal CONTOS fixagio do texto e posficio de GIANLUCA MIRAGLIA ASSIRIO & ALVIM 2M fiveai oe Cateatng, smo. Mas jd que vim coxeando sé aqui, coxeate! un poco mais. Permite, leiror. No meio da repentina escuridéo 0 tertr no poupow nine guém, Havia ali foragidos da Sierza Morera; mas, quem lhes divi sasse 0 rosto, veria que estavam descoradas, Tornava-seitregular 2 tespirayan; os comagies batiam opressos; e cada qual se cosia com a parece para que algum ferro mal dirigido Ihe nfo enteasse sas catnes, A luta andava cravada. De quando em quando um cugide de dor, um mével quebrado, 0 baque dum corpo, uma juta, ume raga. Dos pés d cabega dos conchegssios grupos, subiam conttac- $e, como correntes magnétieas, provocadas pelo seceio, pela impecitncia, pela incertera do que ia sucedet. O ouvido estava atento, os ofhos sequiosos de luz, Duraram segundos as asfixiantes apecturas, Depois sentiuse surdo rumor e um grito rouco Ninguém respira, Abre-se de mansinho a porta, e sai tranquilamente um vuleo. Sobre ele cairam os mortigos revérberos dium cindeeito, que es cfarecia a rua (Os ébrios, que de tropel haviam cortido & porta, solram uma exclamagio de espanto, Era Lorenso del Giocondo, — Everard! Everard! LEmbalde 0 chamam. Caira de beugos sobre a mesa da taver- na com o punhal de Rosaura atravessado na garganta, Coimbra, 2 de Margo ce 1866 y OS CANIBAIS I Dissea critica pela boca de Boileau: Rien rest beaw que le vai, endo tardou que as fabulas, arabescas exéticos e exageros, oriundos principalmence dos tempos herdicos, perdessem toda a soberania antes exercida na ampla esfera das boas-leteas, Os Prometeus, 05 Hercules, 0s Tescus © as Esfinges, se no desapareceram em pé, langados aos quatto ventos, € porque era necessario que se conser- vassem os padives que deviam guiar o filésofo através dos labirin- tos do passado, Por isso li estio fitmes ainda em seus pedlestais de pedraras, mas ofuscads pela uz brilhante que sé vem da verdade Todavia ndo deixarei eu de confessar 0 amor, que sempre tive por contes de fadas, par que se nfo estranhers algunas murtnu- rages, acaso fugtivas, no acto de me sacrificar 3s exigéncias desta sgeragio preteosiosa Sacrifico-me, Mas, como néo sou dado a transeendéncias, pois, abomino tanto a incégaita dos mateméticos, como a Duleineia dos Quixotes, abro sobre os joelhos wma crénica, que casualmente Ime weio & mio, ¢, aptoveitando os cabedais da minha excolha, dei- ‘xarei deste modo de ser constrangido a inventas, no que itia grande perigo de volver costas 4 verdade. ‘O meu conto ¢ amador do sangue azul; adora a aristocracia. Eo leitor hi-de petegrinar comigo pela alta sociedade; hei-de levi-loa um ou dois bails, e despertarlhe o interesse com misté- m8 Aone on Comsenn sigs, amotes ¢ times dos que se ormazenam por esses romances de armar 20 eftito. Ora ousa, que eu ptincipie motdando-me pela velha costumeira: A abobada azul do céu alumiava com milhies de estas 0§ ccoruchéus, obeliscos ¢ arcadas da dectépita arquitecturs da cida- dde. Escava serenissima a noite, Porém a atmosfera Guia tembear os gelos da Sibétia, Para coneraste brotava na sala do baile uma primavera aberta © esplendente. A vertiger das valsas despargia alentos que se iam ransformando em insinias de febve. Quem néo sabe o que € unm baile? E rodavia sineo-me tentar do a descrexé-lo, sem desconhecer que nisse ind falta de modéstia, € tiabalho verdadciramente ocioso. Mil poets, no exagero de aprimorados versos, tém sabido pinsi-lo, sem omissfo de algum dos matizes, que o abrilhantam. Melhor seri, portanto, que 0 eitot veja a descrigio do meu baile em qualquer poema artisticariente fantasioso, pozque nisto de descrighes ndo ha sair do mesme tere 1no. Seno, aqui the dou os teagos de um aligcitado esboso! Flores das mais odorantes em gigantescos artes de esmalte- da porcelana; a arte a revelar-se por toda a pastc, na moldura dos expethos, nos paingis, nos ectos douradas; emanagées balsimicas az exalarem-se por esses recintos encantados; ao longe uma méisica volupruos, ni sei de que macs inspixados ¢, sobrestaindo a tudo, pares animados de muita vida © muito amor, abandonando- se i cfervescéncia das danas, correndo agors numa iriada mis- tara de cores, para ligeivas se separatem logo debaixo dos olhos casriosos dos que se contentam em ver, esteiadas com certo ate tudado ao mirmore das colunaeas, ou recostaces nas voluptuosas romana. O sol majestoso dum formoso dia de veri ndo se projecta mnais radiante sobre as asas ¢ sobre as petalas,ricamente varizgadlas de mil borboletas ¢ de mil flores. do que aqueles centenares de 7 anus 219 bis arificlais, dandejados dos cristais reluzentes, sobre as vestes sumpriosas, que 2s damas arastavam pelos avcludados tapets. Como nas libagées em honza do esperto Buco, ean gus set doves © saverdoti depois, 20 empunlrarem a vigésima taga do licor feryente, deixar em tebrilhar os oltos e desgrenha 0s cabelos no «vob» do encu- slasmo, assim no baile tinha a ebriedade dos praceres despertado is encram momos, ou mesmo arrefecidos, para adormecidos sentimentos. Avultava concudo ali uma vista dessocegada e inquiera, que, sobcerud, feria alguns odsecvadores, que ncm cucavam de ocule tar o frenesi, que as assoberbava, Histdrias do coragio por certo. Margarida & uma das mulheres fats, que atrace itresicivel- mente, Soleeira, homem, que por desgraga a frou, quet ser um Romeu; casada, nfo faltariam Werrhers, que rebentassem 0 cré- nio para lhe merecer uma saudade. No cortejo brilhante nia faleava descle o prizmeiro titulas, 20 brasileiro sem tirulos, coisa rata em sublunares regides. Ela cra o {dolo acatado de todos os cxentes, ‘Mas para que estaré no baile cio triste e disraida? Pousa me- lancolicamence a cabega no ombro do pas, € nem Ihe percebe as palavras amorosas, naquela réerie feminil, que é para o homem, que ama, um inferno de tortutss. Soam onze horas. Ela treme, ¢ relanceia pela dltima ver 05 olhos para a porta da entrada. Depois, desfalecida, desprende um suspiro, ¢ deiza-se arastar como inscnsfvel no cevohutcar das mazucas Por este tempo, numa sala apartada, fumavara dois cavalnei- ros, Um apoiava-se com exquisite daadiom no fiso de um Fogo, rematado em florées caprichasos; » outro, prostrado numa cadet 220 cane Oe Iii, © com as premas Yomucaraunte ctucadias em fence das brasas viva, Abigiencavam diilogo medido © monétore. ~Terho espera . dizia com certo orgulle o que se cone servava de pe. pusando dos nascenres guias do bigot — Vaidade, 1 Joan! reronqia « euteo, Sou veterano nesses campanhas. Glorio-me de ter raygado com esta mao veus do mais sagsado pudor: econtude Margarida — Margarida é muther, Pois sim, mas quem ae assogura a viebria? Tudo: responde 0 denominade D. Joao, um rant ofea- ido peia divida do interlocutor. Pequenos favores concedidis. tum volver de olhos. = llusoes do amor-pripria. Olbia, podes dar-me crédito, a ‘aga da umbrdsia, que apaga sedes de amor, aio hécde da levar-ca 203 labios. Margarida é das poucas mulheres, que tém 36 aan €o- ago, para ser dade uma vez 96. — Donde ce vern tanta sabedoria acerea da mulher? — Quando me ndo sobrasse expetiéncia propria, tinha af Balzac. — Ab! ¢ sortiu desdenhoso, Ainds assim, continuous posso eu obter.. =O que é doutro, decerco que no, — inti Margarida... Amma, — Ati, bario? ~ Nao, por minha miséria. — Poisa quem? — Ao sisconde de, Inrerrompen-e usia vos, que amunciava — O senhor visconde de Aveledat aceeamn ¢ precipieunam-se pana pots A danga inteitwmperass, Os cavalheitos agrupevamese a unten: do sal3o, As camas fiewearn curbads € indecisas. Margarida vito o resto jubilosn para sum espethy, ¢, concense de si. alundonouese sobre as almofades duma otomans, oeondendo por detris do lequs 0 roste purpureado, Que seri? Contidi, um repostsiro, viuese desponsar na limiar da ports tun homem eseranho. Eza desses homens que se aii dlescrevem & aque deveen de ser o desespero dos Van Dyck e dos Ticians. Tanto poderfamos darby erica, como quacenta anos de ida Subia na cestatura acima do regular: ¢ no rosto pilido, raais simpétien pela barba negra, curta¢ fina, que o moldurava, deixava adivinhar uma longa peregrinagio de amarguras. Gra a pereita realizagio dum tipo ideale misterioso, camo os concebia Byron, E misteriosa era a historia da sua vida. (Dos mil exteavagantes boatos, que corsiam como para lhe aurnentar 0 prestigic, se sabia 20 certo que viera da América, ¢ que eta benquista dos doutos ¢ dos sensatos, ‘Avangou pausado ¢ grave pelo meio da multidio fascinada Mas naquele movimento notava-se um esforgo dissimalado; pare ca um movimento mecinico, automstico. E. seus passos soavam, no pavimenta, a despeite dos finos upetes, com exivaondinirio tuido, O impewose D. Joie, » mage apsixonado, que o leitor acaba de conhever fixava-o de olhar ardente. Tinha diante de si o hhomem que soubera arrancar-the a mais querida das suay espe- rangas. Passoucthe na mente wm lampejo de exiva: avencurou-se 2 rover por ee, indisctew ¢ temeritio, Mas naqueles membros pa receurlhe encontrar, pelo eacto, a inércia do granite, Fixow-e tas, «¢ recucit repassado de um inesistivel pinicn Julgaca ver « tla sin do comendadon iN Una historia quaiques; que se wxttai dums exénica, deve cer decessariamente uM Visca, UL A propagasio de avontecinentos memocfveis perdides aa variedade de muitos factos, ou 3 mani- fisuygie ci ums poxe mums epca mar cada, Colvcar o fact no local, que He & proprio, € som duvida e primeira obrigasd, que em ambos us casos compete ito narrae dor. Nao o desconitego. Porém de melhor gadis me sujeitara ex ao rabujer da erica, do que a fixar a acgiv do mes conte nesce ou naquele pais, visto ignorat a qual pertenga, por unis omisso dksgragada no importanie manuscrito gue tenko 20 lado, ‘Amo a fidelidade, E nessas simples palavtas deixo a cxplica «fo da minha abstingncia no emprego de cores locas, Conmido, tornava-se preciso que a cena se passasse ony algu- ma paste. Reffecti, com a madureza, que 0 caso pedia, ¢ por fim, venci- do da mecessidadle, quase me resolv a levar os meus kerdis pare 0 Japio, onde qualquer sombra do extraonindrio seria menos note 4a por sobtenatural; pois, quanto mais uo Jonge se vem as coisas, tanto mais clis avullam, medidas pela imaginagao, prédiga oxd- nariamente em ouropéis egaerdices de todos os fetios, Desai, 0 abuso que por esse lado fizesse da bos-fi ci leitor, nfo conseguiria cempalidccer 0 merecimento & obra, porgue sem ser patente nela o cunho dos estudus cahathados, que abress as portss das academi- a Ihe ficass a parte moral digna de se pertnanat a esses cons, oxo da infincia, justamente denominacdes ~- cesoure de sneninos, Oseilava neste plano quando me veio desviar do inteiio 4 lembranga desastrada de que vivewsos cm tempos ctvilizados, tempos umm que Anténio José cede lugar a ala comédia 0 perio do durco da circunspecta casacs ¢ de chaps ako, Mal wie serviria yonuae & fap. Flas de gpoca, ret con da Fors do velho Portugal, quanto mais etroceder 4 ponte de me valer cles roupagens cfimicas ds japoneses. Enfins, que'sro 0 fio as divagagties para me devotar 2 hist mesmo ateotado buscar modelo os grotescis desasidos ga 9 mete. dat lavo ex minhes mes, contante que se oie auseote do pais em que sejam Jidos Dumas ¢ Kock, ¢ onde ahunden seminsrios, cscindalos ¢ sotainas Suponba o baile -— w Ihe aprae, mesmo por comodidade ou propriedade — suponha-o em Lisboa, na faustosa habitago uma Nixon de Lenclos contemporinea, Li deiximos 0 vulto simpitico do visconde de Aveeda, pernurbando a harmonia da festa com a surpresa da sua aparigdo. Agora vamos encontré-lo no. meio do lusuosa bulicio. eprimido de profiunda melancoliay me- lancolia esa qute patecia teflectir.se em todos os semblantes, como se 0 dele fosse um espelho animado, ‘lal era 2 vaga expressio das nobsres feigées do viseonde, que deixava perceber o quer que fosse de semethance as forcus acractivas e repulsivas da magnetismo, As amas sentiamvsc fascinadas, os cleganses reccosos & agascados, desse agastamento — antes mau humor — que provém da hunsi- Ihagio: porque os humithava a simples presenga daguele homera, que no dizer deles mais cra am mito que ourra coiss. Pouvo se lhe dava ao visconde do efeite gue produxia. Nao se eryuera ainda da cadeira em que se havia deixade cain, calor algumas palavtas delicadas, om gestns a que 0 obrigava a eortesia, diloviams insensivel estén Fadustelbe? perguntava Margarid com vis sina a gn. a imeresse, de siguiudlort x una sui amigas a que — Agora mesmo, — Uintae? 24 Ausrko 0 Coreen — Ai, menina! Nao sei dizer-te © que sinto, Nunea encon. tcei homem assim, Se soubesses como 2 expressio cortia suaye daquees labios, como © seu sorriso eta triste... Nio me eaganas. te: seio de mulher nao pode sem estremecer.. Corvou-the a palavea um belo afectueso, Margarida s20 pus ddera ouvic mais. Estava palida, tremiam-lhe os Ibias, ¢ 70 seio ofegance sentia que the rebencavam paixBes desconihecidas. Deve de escar assim a mulher que, sem hesizar, desfolha as flores res- ccendentes da vitgindade aos pés do cleito do seu coragie. Caira ‘em langoroso desfalecimento, pregando os olhos negros, apaivo- nades, com que a natutera faz perigosas as mulheres do meio-dia, num ponto incerto, que ela nao divisava, porque andava longe, 1na morada das formosas quimeras, ‘A orquestra comegava uma valsa, Margarida, a ardente ama- dora das valkas, ecusava desta ver cinrura delicada a0 contacto libidinaso de mio masculina. E como néo? Junto ao viscende de Aveleda vira um lugar sem dono, O seu dinico pensamento fora apossar-se dele, esquecendo — ela 10 cautelosa! — que fran- queava passagem & eterna maledicéncia. Do pensamento & reaizagio nio decorteu um momento, Foram breves as palavras, que trocou com o visconde; porém, tais coisas disseram, que ficaram momentos — ele enlevado, ela comovida — Sabe, visconde, diz ela afinal para quebrar o siléndo, que se rommava embaragaso, sabe que sos magoa a todos 2 sus tiste- vat Porque est to iste? ~~ Nao é minha a culpa, minha senhora, Dera muito 4 quem me ensinasse a fingic alegrias que nao teak. — Respeico os seus pesares, Mas creia que me sinto magoa- dase 08 considero, — E podeted saber porqué? Gs Hes uate 235 —Vorgue, vendo-o cercada de quan & capa de flicidade... — Um pouce de luxe aparente serve as veres para ocular a iniséria, Adsina-se de que haja risis, que eseondam ligrimas: Pois ha. — Punge-me essa desgraca que pressinto. — Nao me lastimo, Se D. Margarida, — Nem exo lastime. Mas sofie, ndo é verdade? Eu no som indiferente asoftimencos abheios, Duvida? — Decerto, Pos para que me df veneno nessa mo formosa e branca como a inocéncia? — Lut — V. Ba, Vejo-the 0 mel nos labios ¢ 0 travor do absinco, consinta-me que o diga, na vor angélica, no gesto, na forrosura — Havers lisonjas nas suas palavras, haverd, mas no sem snuitaironia. Seta tal a minkia infelicidade, que até com a prépria presenga Ihe agrave essa eristea, esas dores? — Faz mais que ageavar. — Mais ainda... — Se fia! Imagine V. Ex: um viajante sufocado pelo calor, morrendo enfraquecido 4 sede junto & margem duma torrente, que ele nio pode tocer,¢ diga-me, se avalia a ago do desgraga- do, como hei-de ou fitila, ouvislhe a Tinguagem celeste, sem que se me desfaga o coragio cm Kigrimas, sem que compare o que sou com 0 que fui e com 0 que podia ser? — Ni o compreéndi ralvez. Mas, meu amigo, o viajante do seu enigma ado seria téo desgracado que perdesse todas as espe- cangas no lance dificil em que o coloca. F. qstanda hd esperanga, ainda néo € completa a. — Faperagat Eu supunha-o perdido num desecto. — Ainda assim podia valer-the a f& A torrente poderia dei var a antigo devo pare Ihe dar fircura de dgua. — Cameo? — Por um milagre da Providencia. — V, Ex etd na Provicléncia? Por mim cansel tanto a vista 2 procuri-la, que uma vez acordei cego. Como hiei-de vé- 2... — Cego! diz Margarida, aproveitando-se graciosamente do equivoco, cego com os seus lho. — Antes 0 néo tivesse: porque sem a ver, Margarida, nig veria como 0 edu € longe da tera, o impassivel entie nis ambos, ‘Compreende-me agora? ‘Margarida, vermelha de surpreendida, no vences a perturba. «fo. Estava pilida e ansiada, Depois que recuperou alento, maurmu- rou com aquele acento melociioso ¢ trémulo, expresso ce verdade ¢ inocéncia, s6 sabido da mulher apaixonada: — Pais ainda nio adivinhou? E preciso que os labios digam tudo 0 que se sente? ‘Um sortiso amargy, doloroso, pungente, encrespor os labios, descorados do visconde, Margarida arquejava — De que servem, continua ela, de que servem certos enig- mas, que inventa quando me fala, como se quisesse maririzar-me? Depeude de mim a sua felicidade? Venha recebé-la, que ¢ toda sua. ‘Nio imagine entio distincias, nem dificuldades, que eu tenbo co- sagem para one mosttar ao claro dessas Iuves, em frente de quan {os af tém libios para o satcasmo, ainda que o rubor haja de me qucimaras faces, para dizer — aqui me tem, pestengo-the. —Impossivel. —Impossivelt — 0 cego adivinha as maravilhas da natureza ¢ ador-as, mas sem poder contempli-las. Eu sou como o cego, Margarida: adoro-a, sem poder mais nada. — Quer matar-me? — Queto-the muito para a deixar numa vida de quimeras, — Entio quc quimezassi0?.. Fale, Nio v2 que estou ai? — Resumesse ude numa palavra, que teria a gravidade da simuagio, se nao fosse consagrada pelo abuso ao desenace de coli ses zomanescas. ssa palavaa€... Di Mino. nL Eu bem sei que um dislogo puramente dramstico, semeado de interjeigdes e palaveas grandes, mal se pode coadumar com a reatidade da comédia humana. Nao foi sem grande dor de alma ue coloquei o siblino visconde em frente de Margatida, exposto a0 te palerma dos que nio sabem nada do coragio e da sua lingua- gem, linguagem fantasioss, que muicas veres desdenha 0 presente para ir eolorit-se nas eras aventurosas em que a casteld aparecia, Visio aérea, por entre os tufos floridos, que Ihe enfeitavam o bal- io, para ouvir luz das estelas as cangées plangemtes do cova- dor enamorado; ctas, 28 mais sublimemente potticas, que ém vind. Serio, que © digam as mil novelas que por al tresvatiam a mocidade, Nao sei realmente 2 pena em que incorreram os ptota~ ggonistas desta veridica histéria, como cada um chama as suas imaginagses, por irem, entre os pravetes celestais dum baile, alargar asas a convetsagées das que s6 se alimentam declamando. Nio sei. Pode ser que fiquem para sempre afogactos xa alvar gat~ gilhada piblica, Go inconsciente de onlindrio como injuciosa. Se isto suceder & sobre um Facto sucedide que deve cair 0 andtema. Por mira sou simples narrador. “Tal calor e vivacidade desenvolvera o didlogo em Margarida < no visconde, que, esquecidas de quantos as cercavam, perderam 228 Sivido 0 xara de-vista o mundo dos morcas. Ji em excesso agusavana a curios. dade geral, Nao foi sem perturbagéo que Margarida 0 teconhe- eu, Mas, em lances destes, que inocente mulher ago sabe um subeerfigio? Foi com simulada alegria que ela estendeu a mao delicada a uma bela senhora, que se the avisinhara casualmente, Bra.a dona da casa, — Suplico-the, minha sethora, exclama Margarida, verme- Iha como uma roma, suplico-he que me ajude a convencer este ccwalhciro. Ha muito que estou a teimas com ele pata que nos re- cite alguma daquelas adoréveis poesias, gue ads Ihe conhecemes. AAos rogos de V. Ex. sei eu que nao hide resist ~~ Oh minha senhoral... acode o visconde, suepreeadido da lembranca providente de Margarida, Quis valerse de modesta esquivanca, mas neste tempo eram varias as vores que o instigavam a recitar. Curvou a cakega ven- cide. Formou-se repentino siléncio, ‘As damas ¢ os elegantes tinham-se confundido em mostras de profunde interesse, ‘Todavia por detrés dum reposteiro, podia um observador atento divisar um rosto de mancebo, cujos olhos exgazeados pare- cam a espagos fuvilar refimpagos. Era D. Joao, Se isto, ue para aqui esctevo, fosse um romance, havia de ele (D, Jodo} apertar com a dextes febrl 0 cabo de ouro dum luzente puntal, Poréim iio enodoemos a histOria, Mandemos o puthal para 0 vlho tea «ro ou para.a foresta erma, Baa vistos0 0 quadro, Q jorrar luminoso dos candelabros, = Alectido nos espelhos; nos paindis herdldicos; nas cabegas toucadas de rosas jd emurchecidas; na carmadlura rosada dos scios desvela- dos, ofegantes de cansago; o rosto nobre do visconde itundado os cms 228 de luz; 08 grupos: as posigées; tudo ism apresentava um aspecto muito 20 paladar do deseo, Eavordo visconde ergueu-se do meio daquele sinc, como 02 de inspitudo. Tinha 99s olhos 0 seero fulgoc da sbila, e suas ppalavias eram devotamenre escutacas como se fossen um oréewlo Feo! era 0 ticulo de poesia. Partilhava do vigor da ade, do lic tismo temo do ido, e da funda stisteza da elegia: porém, com tal arte, tal hatmonia, que néo passava uma nota, que nfo Fosse cesteita a0 coragéo. Todo 0 pensamento da poesia era tirado da metamociose da desventurada ninfa, Elaa ver ea sentir que as formas delicadas the vo ganhando pouco a pouco as curva broneas dim rochedo informe; ¢ a sentir ainda o coracio inflamado a pular-the li dentro no seio de grani- to, com todas ts paixBes ¢ ardores do seu viver de anelos, fervente de luxaria; ¢ © rochedo 2 engrossar, a engrossar... Eis © pensar mento, Ouro mais fino, mais de lei, nunca 0 extraiu poeta dos scios explorados. Quando acabou a pemtltima estrofe, que pase- cia arrastar-the de envolta parte da prépria alma, nto havia faces, aque nao estivescem molhadas de ligrimas. ‘Aqucla voz impregnada de melancoléa tera, aqueles formo- 408 versos — que 0 eram — caavam, em cada peito, comogocs indefinidas, suavissimos venenos. Dir-se-ia que 0 visconde peanteava 2s proprias desgragas. Os versos taziam, como que o selo da teemenda experiencia, Margarida estava pélida como as camélias, que lhe desmaia- vam ao contacto do seio virginal, Escutou até ao fim sem res- pitat, Depois desapareceu por entre os grupos assombrados, € apenas longe do bulicio, desatou em solugos, escondendo 0 sosto nas mos. 230 fave eo Cartas A minha miopia burguess nio Ihe vé rario pata iis extre ‘mos; mas, enfim, a verdade é lei duma s6 interpretagio. Tenho aqui a crénica que é de reconhecida autenticidade. Quando a donzela (como the chamatia qualquer cavaieiro- so tomancista) voleou 20 salzo, jf ndo estava o visconde. Constetnada, nGo hesitou em inteerogar uma sta amiga acerca de to inesperada auséncia, Se porém foi breve a fergunta, refo Ihe deveu nada a resposta,traduzide num riso cheio de mali- ia, mum gesto, que designava a safda para os jardin Vinh podximo o alvor da madrugada. Estavam ji abertas as janelss Margarida vagueava no jardim de canteiro em canteiro, de spruta em gruca, Poderiam vé-ia passar por encre » arvorsdo e de- saparecer na sombra como um lindo fantasma, mas @ que nin- guém decerto conseguiria er2 ouvir-the © suspirar comptimido, Lstava na hora funesta, em que 2 mulher mais pure inveja 0 tla- smo das Messalinas. Bem via o precipicio através das loves, que 0 encobriam, mas adorava-o, Na sombra, que uma das muita vores formava com 08 es galhos espessos © descamades, onde esvoacavam algunas aves saudosas da alvorada, foi deparar com pensitivo visconde, B, sentada sem receio a0 lado dele no ermo daquee lugar, jturou consigo, crente no subido prego de suas seducées, que hhavia de ler na alma daquele homem os segredos, que ele com tanto rebugo ocultava. — Eu umbém amo, dizela, este erepisculo vago, que prece- dca mani. A imaginagio arrouba-se mais viva, e vé em cada ob jecto uma forma agigamtada e indefinida, E este indefinido néo sei que alvorogos me desperta, com que suave aspiragie me enle- va oespirito... Diga: nao sente isto mesmo? — Bem conheso esse enlevo de que me fala, rainha ssahora — Nem podia deixar de ser. Algumna vor finsima me die bal sxinho que toda a alma tert uma iema, uma jem gémea no semtc, tno pensar... Seri certo? — Que sei eu? Estou longe da abjeceto do céprica,¢, conts- do, duvide. — Na desgrags... ce — Essa vejo-a, apalpo-a cin cada membro do mew corpo —Também duvida de mim?... — V. Ex! Pobre menina! Tem vigosas todas 2s ilusdes, En- contra atractivas neste mundo, porque sé ¢ viu por uma face, pela unica prazenceira face. Julga V. Ex.t que se corteja af a virsu- de, a grandeza da alma, a clevagio do espirita? Engena-se. O em- buste, « simples aparéncia é rudos € a suprema desgrags da minha vida esté nessas palavras. Tenho um coragio ardente para o amor, ‘© uma cabeca para o compreendee; mas nei uma maulhet, nem tama s6, poder encontrar em meus bragos catinhos de esposo, porte sio de baero quebradigo on v4 doce, que facilmente se enquadra em tados os moles. = Quando acabari essa linguagem de enigmas? Disse que tinha coracio para o amot. E entio certo que ama? — Do funda da alma, — E haverd mulher #30 forte, ou tio abatida, que possa te sistir-lhe? Defxe-me duvias. — E porque V. Exs nao prevé que esta fidalguia, que me en- comtca talvez no aspecto, pode abrigar um Hibusteio indigno, Quero mesmo deixar-me cegar pela vaidade pata cter que sou amaclo. Nio podia abrigar-se debaixo deste trajo © corpo corrot- do dum leproso? Nio poderiam lavrar af canctos, gangiena « peste? Suponhas e veja que noite ado noivado pata uma menina, -vendadeira sensiciva ern flor Termincu com uma gargalhiads alvar. Margarida tere medo. 232 Kites oo Canvanen Donde concluo, aqui entre paréntesis, que o sistema nervaso das senhoras € mais melindraso do que o do leitor, que, certa- ‘mente, nio vé motivos de susco. Passa a descobetta ser de provei- to Aciéncia, — Nio julgue pela aparéncia, minha senhora, comtimuow visconde com afabilidade. ~~ Ohi! Pressinto, niio duvide, pressinte que nao sou uma mulher vulgar, diz Margarida com orguiho. — Adivinhei-o, E como me consola ouvir-lho! Pais bem, consinta-me uma perpunta estranha, ¢ mesmo otiginal: se et fowse um cadiver Frio inerte, animado par qualquer ergenhoso mecenismo, embora me pulsasse no corpo motte um coragio com vida, podcria V. Ex.t abragar-me sem repughiincia? Queretia descansat a fionte no seio de um cadaver? — Que extravagdnciat Pois olhe, Aveleda, & escranheza da pergunta vou cu dar uma resposta, que vale pelo menos outs tanto; e Deus sabe que no minto. Margarida animava-se prosse- guindo: seja o leito nupciat no cemitério, que lé mesmo 9 aceito, li mesmo 0 apetego. Repare que néo corei. Se me treme a vor é a0 peso da verdade, Eu ndo exagero, Quem sabe o que é 0 amor, sahe que nfo exagero. O rosto do visconde iluminow-se de irradiance alegria. Bal- buciando, pade exclamar apenas: — Margarida, minha Margarida! E pousou os ldbios reiuzences no scio seminu da donzela, ‘que, s6frege, pagou a ousadia com ouse beijo, em que se Lhe foi esmorecida parte da existéncia, Depois,o feliz visconde embrenhou-se por entre as drvores om aqucle caminhar medio do esqueleto das kndas populares Margarida ficou como que destalecidas com o toucado des feivo, trangas desatadas e a cabega pendence para as espaiduas hue medecidas pelo orvalino da manha. Di-b-iam sonho feiticeito de imaginagiv oriental. DD. Joao crgucu-se entdo em frente dala como obedecendo + evocagio satanica dum mago! Vv Eu Ihe digo, keitor: Acostado cragicamente a0 resgharde dum tanque, que estava all perto de Margarida, rinha surgida de repente um vuleo de ‘mancebo, como obedecendo a evocagao satinica dum mage, Digo stinhar porque o caso passaracse no pino do inverno, «agora, jf as amendoeiras comegavam 2 toucar-se das flores da primavera elo trajo do mancebo, ¢ pela postura pretensiosa ¢ frivola, xa ficilreconhever D. Joao. — Perdao, minha senhora, havia ele exclamado numa into- nagio fital, perdio por ousar importuns-la. Nao pude resist & centagio de vir eu mesmo lavrar 0 diploma da minha infamia, declarando-the que assist, escondido, a tudo 0 que aqui se pas- sou; e s6 para me deliiar agora na sua vergonha. O seu amante, senhora D, Marga: —St.D. Joi... — Descanse. Sou muito generoso para sacudir injeirias sobre uum rival ausente. Para eu ser disercto bastavacme « esperangade que ao menos V, Px.2 wansmiticd a0 visconde de Aveleda esse mau pensamento em que ando, Digzthe, minha senbora, que ‘me consomem desejos de experimentar se uma bala sabe absir assagern através dum ctinio. peti ec em cena tera id tbc da eatesc ada Margarida cmudecee aterrada 234 Brewny 20 Cassar (Os primeiros raios de sol, frowxamente purputeados, cairamn reste momento na face da mancebo, voltada ao oriemte. Avs coltios dela, coldados por tantas comogées juntas, pazecera:n livos de sangue. Fugiu espavorida. Como € pois que 19. Joao vai encontrar aeolhimente no fes- tim do nosso visconde? E, de mais a mais, no esplendido festim do noivado? A‘esté 0 que admira 20 leicorsisudo, e. mim conjuntumente. © caricter do visconde explica o facto, Conhecia a mocida- de, que nasceu no Fausto embalada por altas radigaes de famitia para, 20 despontar da adolescéncia, comegar de corver avencuras por borequins ¢ lupanates até caiz adormecida de cansico sobre payinas de perigosss novelas, ¢ supunhava para tio pouco que, in- diferente & ameaga, receber D. Joao, como dante, com as manci= ras siepdticas em que era prddigo. Quem sabe se fez mal O certo & que o festim corria esplendazos, Margarida, como nfo estaria ea! Tinha ena toda de si isso aque se di — a gema da melhor sociedade; a suas maelhores ami- as; seu velho e vencuroso pais e seus dois irmios: um, que se hhavia langado nos escabrosos cuminhos da magisttatuta; outro, nas viizeas paludosas do peraltismo; e sobretudo tinha junto de £0 esposo querido da sua alma, Que mais longe podem ir as ambigSes nvundanas? Parece todavia mais desmaiada e pensativa, Dove cismar deve ser o dela. Cismar interprotado 56 — euido eu — on: véspe- ra de bodas pelas flizes meninas a quem a sorte depatou um noive de formas vigorosamente atrecondadas, boca vermelha, lentes brancos ¢ olhos sensuais, Nos, 0s homens, somos impios em excesso para nos ser dado requentar a imaginativa ao fogo sacrossanto, nutride por aquelas eastssimas vestais. Se cane 235 (Oca o que se netaya ali ena coma que wm periuume do oie te, rescendendo de todo aquele lnxo, ¢ menos europe possvel. Avultava também nio sei que desalinho, que facia recordar con fusamente « efeminada Roma, a escrrva kuxurios das imperado- ces, Petrénio nunca imaginara camilhas ou poltronas que mais provacassem paixdes da came; nem Volare serviu no Eklorado tio deliciosos acepipes. Baixela daquele preco, digo-o desafionta- do, néo circulou ainda em mesa de rei, nem mesmo talves. em orgia de pontifice (O gosto ca apuléncia de Liiculo perderam-se naquela imen- sidade de mitolégicas ostentagées Em dues grandes umas de mecal precioso andiam gomas arométicas trazidas da Aribia, que tornavam embriagante a morna atmestera. Cada civilizasio viera depor 0 seu tribuco. Pelas imimeras portas, abertas de par em par, que davata para os jardins, viam os alegres convivas alguma coisa de surpre- cendente, Monsttos colossais de bronze, colocados em pedestals de méc- more, fansavam das fargas Fauces golfadas de gua pura numa vast represa, toldada de muitas aves aguaticas. E, por cima da coma vigosa das laranjeitas ¢ das acicias florentes divisava-se ao longe, no ocidente, mar imenso de labaredas, que, ceflectidas, tingiam ao de leve a superficie Kapida das éguas com a tia cor do sol poente Chegaca 0 festim go ponto em que o amor do tom familias, pam o qual tendemos tanto nés, os portagueses, atcopelando 0 codigo das eriquetas mais fivokss,tinha agrupado, ¢, por asim dizer, germanado as diferentes jerarquias que estavamn ali repre- sentadlis por homens e mulheres, entaladas em expactilhos, veluc dos, cavemitas, seas e gazes — Porque seri perguuntava ama sephora i sia vieinka, por yur serd que o viseoice de Aveleda ests boje, nam dia como o de hoje, mais racine inde do que nus outios dis? Queria que me dissessera, ~~ Ji reparei, respondia a intecrogada. O que eu desejava saber, sobreruda 6 i escrndidas nas lavas. — Div-se que nunca fora visco sem luvas — E um homer bem extravaganire — F hem simpitico, nao & ese com as an ‘=~ Sem duyida, Ainds assim, havia de terlhe medo se sere ditasse em nigromantes, Nio sei gue ar de eveantamenta se ree pra em sua casa. Sto distraidas por cleyantes brindes 20s noivos, ‘Tambén D. Jozo se levantou com o cope de ouro na mio, Calou-se tudo, Ninguém desconhecia 9 génio estouvado do maneebo. nem o amor a Margarida ¢ o dio 20 visconde, senti- mmentos que ele alardeava por toda a parte. Daf vcio a surprest geval. seyuidta do temor de alguma imprudéncia, acaso provocada pelos anos ¢ pelo vinlio. O harfo, aquele bario que o leitor ev ssheveuno baile, eobalde se Eatigoe para o constranger a ficar queda no sew lugar. Fru ade. D. Jodo exclama com vor ligciramente tegmula — Chegou-me a vee de qaeimer também unt grév de incen- so 0 turibulo singe da amizade. Considero-ite feliz.) muito mais porque, esyorando © men copo, esquega a costumeira de fazer vous pela perpétua Felicidade do divose pst, que aqui tes jamos, pars ir mais Jonge; para the profetizar uina longa série de iNbilos alegrias, iguais as minhasalcprias de hoje. Savido-oy com 1 signage com que nos cncos ea ens Cisar 6 cristo votade as feras, squencada Roma saudi Somourse, acolbide de trio sRnsin. Si desposudas se nel foarams agnileccnda, xen quea ita thes passasse desapesexbidr =~ Afestio palavras que me parecer) de mau agouro, mur muravatn algarnas vozes, ao fempo que 1D. Jon, pousade sabre a mess © cope vazio, dria ae ouvide do baci: Eneoacrei-the o raver do absinte. — Nan se deswariecet ainda esse formal... pergunta 0 harko. — Adovo-a como nunca — Desgrayade, — Fliede filar-se de mim amanha, O meu amor é como alos figncs, qs, is vezes, se #8 fome, devoram. © bara mio conreve wona gargalhada com gue inrerrom- peo amigo. — Oh, Baco! entoa ele na forea da hilaridade Meia hora mais tide abriam-se as portas do saléo. fa come- aro brie D. Jodo, viram-no sair paca o jandim, mas niaguém © via voter, Alguin projecte medicava, Néo qucirans porém devasar 19 que se passa no fittimo dos outros, Nada temos com isso, e7 que pos, conforme ditia wen bem-falanse, 208 Terquernadas mo- alexnos, que ainda ns ha em multiplicadas ¢fusiosas carers O baile nio se descreve. Em cempos menes cultos seria tido. ina conta de milagres eo visconde nem com siguz henta alcangatia esconjurar a sabidz canonizacéo A meiu-noite estava o sala descrto, Margarida, derraman, do Kigrimas de pudica,.. de ineliivel doguca, abraguu sew velo pai © seus irmios, que Tego se retizaram aus apesentos, gue hes estavam destinados Ao transpor o limiar do sew encantado aposento, Margaride estremeceu, dando com as olhos rfmides nos branes cuttinados: cde tina sed com grandes bordalaras de curs purissim, que vlo- 238 fram 00 Cansanay vatn 0 misterioso tilamo. Acravés das janelas abertas vit a lta no a, infalivel em tas casos, e via também a folbagem compacta do lucanjal,rescendente ao sopro Ligeio da embalsamaca virasSo, Cocagéo de virgem, na primeira noite de amor, enlanguesce or orga, preso de encantadoras vertigens, em presenga devas se- dugdes, aumentadas pela vaga hatmonia das esferas, que até essa se percebe entao, seja dito em prosa, Mas onde esté o esposo idolatrado, que ndo vem cait-the aos pés? Caso estranho! O visconde, no fundo da cima, inclinado no tecosto duma politona, permanece imovel a curta discineia dum enorme fogio de estrutura particular, firmadw num plano tum pouco infetior ao pavimento. © fogio contém um brisido imenso, que Ihe esparge no rosco sinisteo um claréo avermelhado, Quem o visse a esa horn ¢ em tal posicto julgaria ver ressuscita- o algum dos alquimistas da Idade Média, para continue 50- sshando na cransmutagae dos metas, ou no elixir da nia, Margarida adianta-se com timider, —Henrique? muremura ela, O visconde fica imével, — Henrique, meu Henrique? continua, Porque me nio res pondes? — Estava a pensar, Margatida — Pode saber-se em qué, st pensaco:? torna ela um tanto fetida no seu orgulho de mulher formosa — Conheces a histéria de Hero ¢ Leandro? — Li-aem pequena, Bem me lembro, Mas, que pergtatal — F que eu estava a encontrar paridade entre agiela histéria infeliz e a nossa histdria, Margarida, Setiamente? Onde esté entio a tempestade que nos hi-de deseruir num instance todas as nossas venturae... Oh, Henrique!... OF Cannes ae — A difezenga escé em termpos ence nés uma sepuleta aber ta.em vez dum simples exreize. Feliz en. se tivese 56 a Iutar com as cempescades do Helesponco! Pobre inocente, que as nao vés mais coléricas a estalarem-es sobre a cabesa — Jesus! Assustas-me, Que eaisa no mundo pode opor-se a. nosso amor, pode vir separar-nos? o> Olhia, diz 0 visconde designando sobre um hufese uma tartafa de cristal, cheia de Acido pnissicn, uma s6 eolher daquele veneno mata em menos de trés minutos, v 5 vinhos extraidos das uvas sazonadas nos luxuriosus vi- ahedos ce Quios e das margens pitorescas do Reno, a par dos de- liciosos vinhos do Porto, Xerez e Madeira, deslizanco nos copest 4s pedratias serpejando nos sefos alabastrinas das mulheres; as tnuyens olorosas detramadas pelos recortados tectus; as sedes de amor inflamadas por olhos humedecidos ao volitar pecaminosos e tuitbidos desejos; a alegria da formosa donzela, que, eémula de ansiedade, espera 0 momento em que possa revolver-se delirante ‘pos bragos do homem que soube venci-la; coda essa harménica vatiedade, que poderia teaizar as celestzis espiragdes dura bom maometano, 2teou no espirito conturbado de D. Jodo quanto de extravagante pode conter um pesudelo em noites de febre, Correndo de taga em caga em bosborwes de espuma, fera- -the 0 vinho espumante a vista incerta, como se fora espadanar de sangue, bebia, bebia sifrego, incansivel, Mas quanto mais bebia, mais cress a sede, 240 Aan 39 Cansei Margarida! era © nome que de continuo the perpassav na mene enferma, era. name que the contraia os lébios © que a gieganta enzouquecida nio ousava desprendet, [Negros e repetidos pensamentos nasciam, atropelavern-se, Iutavam no interior daquele crinio, por debaixo os compridos cabelos loitos, que, fiousos, he pendiam sobre os ombres como abundantesflocos de sed, Foi nesse tempestuoso delisamento que ee deixou a mesa do banguete para, cambaleante, is mitigar a febre nas flcidas raoitas dos jatdins Ja receoso da multidao. Cuidava que todos 9s olhos the sole- tuavam nos dele os ligubres pensamentos de sua alma, Quetia verse s6, que the nio envenenassem viboras mundanas as lgri- mas repress Era um excelente rapaz este D. Jodo. Generoso ¢ amante no o havia mais, Tisnara-lhe porén o hilivo quente da sociedade as iis belas flores de sua leal narureza, E nao se tome isto como fastidioso mondlogo de macudo smoraizadot.A socicdade, sim, senhores, foi a sociedade, que estio- Jou com suas evaporacées cilidas a delicads eflorescencia dequela bela alma. Viu-o rico, galhardo, franco e perdulirio, e abriu-the ‘8 seios Fétidos, ¢ prostituiu-se &s paixdes do mogo miliondrio. O dinheizo escorzepavaclhe por entre 0s dedos sobre as mesas aleoolizadas dos cafés, sobre © leita enxovalhiado das perlidas, sobre o empocirado labisinto do dissérbiog e os folhetinistas ga- lances, os fiiteis da moda, alguns homens de estudo mesmo, aplaudiam edipides, lisonjeando-the os vicias, prostibulo, voragem que a lei sanciona, foi a arena borri- fada com o vinho de suas primeitas proezas. Cansado enfim de s¢ cstorcer na cripuls, no hiimido chao do lupanas, volveu os des- ppertados apeites para a recatada burguesia 2 Canin 2 Se the tesstia & inocéneda, 2 palavre dinke'so, pronunciada com vor anelante por ldbios carpes, abandonava 0 pudor avs sof- tos capriches do mancebo. E muitas foram as envergonhadas pe- aquenas, que the venderam a viegindade em beijos ftios, em dilkvios de sentidas higrimas, No entanto D. Jodie aumentava em audicia. Os filados viun- fos sopravam-lhe © deménio da vaidade. Bea 2 elepdncia de seu porte, segundo ele, era 8 dogura de suas filas,€ nfo 20 oto dertar ‘mado, que devia as bethantes conquistas. Assim parecia s vezes, com efeito, porque, ents a fin holanda ¢ preciosa tela de bran- dos e custos0s letos, de frequéncia 0 esperavam também beijos aristocréticos, corpos em que a provocadora nudee ostentava & Juz da esrnaltada limpada, sautdas veias encumecidas de genero- so sangue de gética raga. Nio eta por cert, ele © dizia, nao era o dinheito, que lhe abria os portbes dos opulentos palécios. ‘Tudo devia & grag de seus requebros, 3 lougania de seus donaires. Enganava-se. Mentia-lhe © amor-préprio, Nas classes superiores, como em todas as classes, ¢ utn € 0 mesmo 0 avo a que se fiz calculada pontaria; € uma a ideia cul rminante. © homem, que se rcfastela em encarquilhados teulos e fidilgo e capitalista, sambém no tem duvida em dizer 2 con- sorte, nas expresses da sua conveniénia, como o homem do povo nna aberta linguagem das privagies, no tem dkivida em dizer-he, dleitando olhar obliquo sobre 2 descuidada filha: D. Jodo € mogo de subido merecimento, A par de colossal riqueza, tem um dos mais fidalgos bras6es. Bom casamento, na verdade, bom case mento pata uma menina honestal... B em seguida apresenta 0 mogo ’s senhoras. A menina cora D, Jodo deseja. O pai indigiathe, marreito, 0 casainento da 22 ‘heat wo Canrannay filha, ¢ sai cm cata do primo marqués com o cheiro numa sabo= rose partida de xadres. Mal acostumado, como estava, supunha o mancebo wopia a padica resisténcia numa mulhers supurha-a flexivel a seus cati- hos como a junga ondulante a0 sopro morno dos ventos, Mar- gatida, porém, incumbiu-se de vingar 0 afzontado sexo; Com 0 dleslém asaanhare a vaidade do manecbo, ¢ infitarethe no peito, vatio de creneas, 0 mais perigoso das sentimentos — o amor ca- pricho, que, & mancira da cbuligéo, poe em alvorogu as feres adormecidas no fundo esteryuilinio das humanas paixdes. A in- veja, 0 Sdio, 0 desespero, a insinia, a vangléia, precipitamn-se cm redemoinho como satlites dagecle nefando ¢ frivolo amor, Dai loucura & escortegadia a estrada, D, Jodo, depois de absorvidas vorrentes de vinho, recordava como um sonko baralhado, para cle, kcerante triptdio no faba loso banquere. Repousara a cabeca num feixe de crepadeiras que se atiravam cm festdes vigorosos aos enfeitados ramos duma ola, ¢ deixata perder o compo sobre a areia fina tapizada de esfolhadas pétalis, Os olhos entteabertos demorava-os, absorto, no clatio irradiado dos sales ilumninados. E as sombras voltejantes, que se desenhavum a0 longe, em ondas de gaze, no cristal dos epelhos, dal pereebidos no fir. clas salas,julgava-as exéreas e silfidicas visoes, As ondas sonoro- sas das ufastadas misicas reboavam-lhe no impaao come lanrenté- seis ¢ prolongados suspicos. Por outro lado embalavam-no os trinos do rouxinol, fluruantes no cerrado laranjal. Mas tudo isto no Faria senao avivar a dor daqucla pobre alma em penas. ‘Ter vinte anos sem conhever apetice irrealizivel: er orgulho- 0 ¢ volivel, e ver-se condenado ao suplicio de Tavealo; sentir alma manchada no viver de alvorogados desvarios, exaltada de re- pente num sentimento puro; amar encio, ¢ set repeliios ¢ amar ese 20 com imais forya ainda, de raiva, de vergonha, por caprichos ¢ que- rer afogar esse amos agora impossivel, querer afogi-lo em vine, écompreender a angistia por que passava D. Joao. Margarida era ventutoss, quanto 0 pode ser uma formoss fila de Eva, Bem o sentia ele, que a concemplata corn a volupeuo~ sidade da pantera, que espreita a apetitosa 16s; ele que lhe medira os movimentos, a intensa morbider ds olhos, a emrumeseéncia das seios brancos, o descorar dos Libis, Quisera, mas néo podia duvidar: o visconde de Aveleda era nado com todo o faminto impulse dur peito virgem, enquan- (0 ele, 0 herdeito infamado dum celebrado nome, ali Ho pesto, contava na efervescéncia da imaginasio, na febte de seu delitio, & pressuroso arfar dos coragdes amantes sem poder quebsat us lagos, que os uniam para sempre! que 0s quebrasse? Nao Ihe coubera, em partlha, o despreza? D. Joio chorava, chorava de humithado. Na falta de cémo- das bacbas, artepelava os eabelos como um tirano de dramalho, medindo a supetioridade que lhe levava o visconde. Falvathe a crstera do costo, « dignidade do gesto, a suave rmelancolia da palavra, ¢, sobeetude, aquela misteriosa sombra, em que se envolvia o visconde, que € para o sexo curiso uma tentagio irtesistivel. Que ex ele, Di, Joso? Um maco afeminado, doido, leviano, de labios frescos ¢ olhos bonitos, amante de vinhos ¢ de mulhe- res, aventuteiro, sonbador; era © que sio muitos rapaaes, © que todos podem ser. Que mumo era o seu? qual 0 seu destino? Abismon os elhos pelos erevas do futuro julgou ver, como surn espetho aigromén- tieo, as horas, os dias, anos, lstros,caindo plidcidas uns sobre os ‘outros, mondtonos, sempre os mesmes. Encontzou-se ao fin, quando menos o cuidava, no despertar de imundas sensualida- Dee fusing ou Gatsaunas des, cncanccido, velho. Fitava triste © passado ¢ admiravaese de rer vivido. Era um trisce sonhar aquele, Nio via uma pegada na areia mével do camino, que marcasse sua passagem. E pergunta- ¥a, supondo-se com eftico desperce na decrepitude, perguntava —— para que vivi? Pensava no snicidio, — Sea minha vida fueura hide assemelhar-se & que levo passada, suspirava o mogo, vivi de mais. Expetimentci 0 goz0, compulsei as amarguras. Estou saciado, Aspiragoes de gléria, as- piragdes genezosas, em que ougo filar canto, no me prendem a0 mundo, nada me prende, morseec, Mas um sopro da esperanca vinha entio, ao de leve, refies- car-the o espitito, e aspiragoes nunca sentidas douravam-the por instances a requentada imaginativa, E que o iludiam passageiras crengas, que, se fossem duradou- tas, operetiam um milagre de reabilitagso. O que pode a mauler! Assaltavaco esse borbulhar de ideias, enquanto se contorcia, ‘numa agonia mortal, no fro leiso, que o acolhera, Era tarde e bem tarde quando se ergucu vacikanre, Tinka sede, Gemiam em torno snultiplicadas fontes. A represa parecia urna grande limina de estar rho calda no regago de panpanosas verduris. Descia a lua perpen- dicular sobre as Sguas, Aquela formosisima sofidio tinka contudo rao sei que pilida fricza de cemitéri coava nas veis alguma coisa de pavoroso, Sentia-o D. Joao quando, curvando-se, bebia. ‘Mas porque estremece como tamado de sibito terror? O des- sragado era vitima de algum pesadelo infernal, Do fundo do li- quido cristal notou que se destacavam imagens monstruosas & ihorrendas, que ndo despregavam dele os olhes iméveis, inettes, brihantes como de reluzente meral, e quase ao mesmo tempo vi- browthe aos ouvidos argentina gargalhada. Quis fugis, mas pren- dio como que um poderoso magnet, Ox Casvanns 285 Breve, porém, reconbeceu envergonhado a fraqueza supersti ciosa, que o dominata, As imagens nao cram mais que esticuas do jardim, qué se retratavarn tra face limpids das dguas. Quando em nosso espirto acalenramos porventura um segr0 pensamento, negros e feios vemos os objectas, que nos circundam, Um espitito cladido em tudo descobre ross € perfismess fantas- mas e perseguigSes o que se rojou nos cuidados do crime. Averdade dessas palavzas sopevura D. Jodo. Mas a gargalhada, aquela gargalhada que Ihe soar aos ouvi- dos como solea do ciciar das brisas, ou dos kibins de cetim de a sguma fada invisivel, donde vitia cla? ‘Talvee das salas do baile, Pata [é voltou o mogo a escandeci- da fronve. Quebrara-se 0 encanto, Como um tempio em que, depois da festa ¢ das harmonias misticas do drgio ¢ dos siiplices cintices, se estende pelas naves imensas melancético ¢ funéreo siléncio, assim nos dourados saloes, kd pouco banhados de luz, agora, fechadas as escutas janelas, des- cera sepuleral silencio. D, Jofo despediu um guincho de espanto como 0 do cerdo a0 senticse nas gartas do lobo, e pulou desnortcado, pelo teor ¢ forma por que Dinis, no Hissope, fv. pulas, em certo picaresco transe, 0 dedo de Elvas, clamando — vingangat E que tinha seriamente meditado uma histéria de sangue. Medisa 0 esforgo de sua alma ¢ sentira que Ihe quedava bem © nome de assassino, Qual seré a vitima escolhida para o eruendo holocausto? Chegara o terrivel momento. ‘Coroada de braneas flores, semelhance adormecidas pombas, cnguia os valentes ramos para uma janela do pabicia uma odorosa 246 ivan ne Cravens magnélia, A seu ronco estava arsimado um homem com olhos cchamejances, mergulhados, através dessa janela ainda aberca, na scutidio interior. Bra D, Jodo. Estava ali como um fragmento de granito, firme, sem respi- za mas febrile ardente. Soara a hora fatal em que, ndo longe dee, iam uni: sabstanciar-se num corpo 6, dois sees, que 0 int separados pela incomensurivel distincia dum cimulos dois ven- turosos, que entre suspiros, caricias, contorgées ¢ beijos, iam, nus de trajos ¢ de maguas, celebrar celestiais mistérios do naivado, Pobre D. Joo! Que assanhada lepra te lavrava o peito! De repente jorraram lé dentro saios de luz brilhance, ¢ sus- surraram pass indistineos O maneebo apertou a desvairada cabega nas mos uéaulas Pulavarlhe o eoragio na fawia febril Recalcada um tanto a desesperagio endircieou-se ameasados Lampejaredhe na mente wma ideia atroz, As janclas, que agora resplandeciam abercas, podiam ser trancades em pouco tempo, ¢ cencio a esperada vinganca teria de se represar ainda ume noice nas lavas do seu crinio, Mas nao. Era impossfvel, Numa noite perfu- ‘mada como aquela, em que a natureza se desprende em harmonias, em que as auras sussurram, heijando as folhas dos arvoredos, em que as fontes suspiram e as aves cantam; numa noite de amores, noize como aquels, ¢ estreito 0 recinto duma cimara para duss almas, que, fundidas, vo erguer sensuais oblatas 0s pés da amo- rosa deusa, Nao, as janelas permaneceriam abertas Assim pensava'o mancebo, quando & leve sombra duma mu ther se esbogou transparente no marmore de um rruro frontciro. Bra cectamente a ingrata, que afanosa corr aos fervenics beijos do cobigado esporo. — Eeu, desgragado, murmurou 1, Jodo, s6, sem luz, sem experangas, 6, cercad de trevas ¢ de abismas... 0 Consdats 2ar Deslizou-the a aligio num riso. Recaleou novarnente a dor, ©, com mio segura, apegourse 40 wonco da magndlia, acrepando por ela com movimento azrastdo ¢ ligeizo, como de serpente, Aperton contra o peizo 0 cano de suas piscolas, sacudiu os orva- Ihados cabelos, e sumiu-se na falhagem. Enrio mil aves, acondadas na verde guarida, esroagaram assus- tadas, cfugitam soltando pias, até se perder no desmaiado do luar. VI Agora, que a minha autoridade de verdadero contracrepra de teattinho aldeio chamou convenientemente a postos os esqui- sitos personagens, que hao-de figarar no preseate capitulo, volte: mos a0 ponto em gue deixei os suspirosos noivos na critica posigéa de codas os noivos, Avalia-se, nfo se descreve, 0 alvoroga de Margarida em face de baralhadas suspeitas, mais e mais condensadas pela fatais pa- Iavras do visconde. Que horrivel linguagem era aquela, com que a acolhia o es oso, no momento em que toda se absorvia na mosbides de um, requintado afecto? Se acotdasse dum sonhado paraiso, encre 2s ensanguentadas indos de enraivecido carrasco, que a arrastasse sem dé pelos igno- rminosos degraus de um pattbulo, por cero ngo sentra 2 donzela mais pavorosa surpresa Para qué negeos pensamentos, pensamentos de morte, quan do ela, esqueciéa, como nunca, da fragilidade da matéia, e ar- roubava ditosa no antegosto de incdgnites praveres? Voavam-Ihe nos aiquebrados membros repetidos calaftios de susto, Como magnetizada prenders aténitos os ofhos ne visconde, 248 Ava ug Chnvacnae ¢, entdo, naguel frieza de esta, embalde procurava 0 acactive, que a tinha eativado. Nao sei o que The vin nas mudadas feigdes. E certo porém que, apavoraia, longe de se avizinhas, como ainda hi pouco, se alistou oprimida de supersticiosos ecrores — Foges-me, Margarida! diz cle com dolorido acento, Amar- guras-te de me vera ceu lado! Devia ser asim. Como eu te quero, rio o sabes tu, Nio sabes como @ moribundo ama o dlimo dia daexisténcia que lhe foge. — Ama-met Nio me dizer o contrério tuas palavtas, tex hilito gelado, a gelada atmosfere que te circunda? Eu mesma sinto-me repassada de fio, ¢ de. — Ede medo. — F de medo, sim; ede medo, que aio sei expli — Quebrou-se beim depresse 0 encantado prisma, que me rmostrava a teus olhos sem os tragas carregados, que a cesgraga sulca na fionte de sews escolhidos. FE. todavia ainda nao se rasgou © espesso véu, que me salva do escienio, do ren escimio, — Henrique, Henrique! Sino que se di entte nés alguma coisa de muito extraordinitio. Perde-se-me a cabega em mil

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