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051 - SP (2020/0176244-9)
RELATOR : MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ
IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO
ADVOGADOS : FERNANDA CORRÊA DA COSTA BENJAMIM -
SP265935
DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
PACIENTE : RODRIGO DE OLIVEIRA FERNANDES
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
RELATÓRIO
EMENTA
I. Contextualização
Informam os autos que o paciente foi condenado à pena de 1 ano
e 8 meses de reclusão, em regime inicial aberto, mais multa, com a substituição
da reprimenda por duas restritivas de direitos, pela prática do crime previsto no
art. 33, caput e § 4º, da Lei n. 11.343/2006.
O Ministério Público assim narrou os fatos em sua inicial
acusatória, in verbis (fls. 15-16, destaquei):
XIV. Conclusões
As considerações e os argumentos expostos neste voto facilitam
responder aos questionamentos feitos de início, de modo a concluir que:
1. Na hipótese de suspeita de crime em flagrante, exige-se, em
termos de standard probatório para ingresso no domicílio do suspeito sem
mandado judicial, a existência de fundadas razões (justa causa), aferidas de
modo objetivo e devidamente justificadas, de maneira a indicar que dentro da casa
ocorre situação de flagrante delito.
2. O tráfico ilícito de entorpecentes, em que pese ser classificado
como crime de natureza permanente, nem sempre autoriza a entrada sem mandado
no domicílio onde supostamente se encontra a droga. Apenas será permitido o
ingresso em situações de urgência, quando se concluir que do atraso decorrente
da obtenção de mandado judicial se possa objetiva e concretamente inferir que
a prova do crime (ou a própria droga) será destruída ou ocultada.
3. O consentimento do morador, para validar o ingresso de
agentes estatais em sua casa e a busca e apreensão de objetos relacionados ao
crime, precisa ser voluntário e livre de qualquer tipo de constrangimento ou
coação.
4. A prova da legalidade e da voluntariedade do consentimento
para o ingresso na residência do suspeito incumbe, em caso de dúvida, ao
Estado, e deve ser feita com declaração assinada pela pessoa que autorizou o
ingresso domiciliar, indicando-se, sempre que possível, testemunhas do ato. Em
todo caso, a operação deve ser registrada em áudio-vídeo e preservada tal
prova enquanto durar o processo.
5. A violação a essas regras e condições legais e constitucionais
para o ingresso no domicílio alheio resulta na ilicitude das provas obtidas em
decorrência da medida, bem como das demais provas que dela decorrerem em
relação de causalidade, sem prejuízo de eventual responsabilização penal do(s)
agente(s) público(s) que tenha(m) realizado a diligência.
XV. Dispositivo
À vista de todo o exposto, considerando que não houve
comprovação de consentimento válido para o ingresso no domicílio do
paciente, voto pela concessão da ordem de Habeas Corpus, de sorte a reconhecer
a ilicitude das provas por tal meio obtidas, bem como de todas as que delas
decorreram, e, por conseguinte, absolver o paciente.
Dê-se ciência desta decisão aos Presidentes dos Tribunais de
Justiça dos Estados e aos Presidentes dos Tribunais Regionais Federais, bem
como às Defensorias Públicas dos Estados e da União, ao Procurador-Geral da
República e aos Procuradores-Gerais dos Estados, aos Conselhos Nacionais da
Justiça e do Ministério Público, à Ordem dos Advogados do Brasil, ao Conselho
Nacional de Direitos Humanos, ao Ministro da Justiça e Segurança Pública e aos
Governadores dos Estados e do Distrito Federal, encarecendo a estes últimos que
deem conhecimento do teor do julgado a todos os órgãos e agentes da segurança
pública federal, estadual e distrital.
Proponho se fixe o prazo de 1 (um) ano para permitir o
aparelhamento das polícias, treinamento e demais providências necessárias para
a adaptação às diretrizes da presente decisão, de modo a evitar situações de
ilicitude, que, entre outros efeitos, poderá implicar responsabilidade
administrativa, civil e/ou penal do agente estatal, à luz da legislação vigente (art.
22 da Lei 13.869/2019), sem prejuízo do eventual reconhecimento, no exame de
casos a serem julgados, da ilegalidade de diligências pretéritas.
É o voto.