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Como funcionam as urnas eletrônicas e o que garante

que os votos estão seguros nelas


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Luiz Fernando Menezes, Leonardo Cazes

Adriano Ishibashi/FRAMEPHOTO/ESTADÃO CONTEÚDO


A urna eletrônica é usada em eleições no Brasil desde 1996 sem que tenham sido
registradas fraudes, mas agora está sob forte ataque do presidente Jair Bolsonaro e de
seus apoiadores, que investem em argumentos de que o equipamento não seria seguro.
Os ataques, como os vistos na live presidencial de 29 de julho, consistem em afirmações
falsas ou distorcidas já desmentidas ou em denúncias descartadas após investigações.

A ofensiva indica ter como um dos objetivos a adoção de um mecanismo que imprime os
votos digitados na urna eletrônica, previsto na PEC 135/2019, cujo relatório deve ser
votado em comissão especial na Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (5). Como
em situações similares no passado, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) é contra a medida
por ver brechas para violação do sigilo do voto e fraudes e por entender que o sistema
atual já é auditável.

A seguir, Aos Fatos responde a oito perguntas essenciais sobre as urnas eletrônicas e a
segurança do voto que é depositado nelas.

1. Como funcionam as urnas eletrônicas?

As urnas eletrônicas são uma espécie de computador desenvolvido apenas para fins
eleitorais. Elas não são – e não podem ser – conectadas à internet e têm diversas
camadas que garantem sua segurança.

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Esses equipamentos são formados por dois terminais: o do mesário e o do eleitor. O
primeiro é onde o título do eleitor é digitado (veja abaixo) e serve para confirmar que a
pessoa está inscrita na seção e que só poderá votar uma única vez naquele pleito.

Já o terminal do eleitor (veja abaixo) é aquele com uma tela e um teclado numérico no
qual o voto é digitado. O equipamento tem duas placas de memória para armazenar os
dados, duas baterias – uma interna e uma externa – e roda o sistema operacional Linux
desenvolvido pelo TSE.

Quando um voto é inserido na urna, ele é gravado no cartão de memória da máquina de


forma embaralhada. Isso é feito para que não seja possível identificar que eleitor votou
em quem e garantir o sigilo do voto.

2. Como funciona a contagem de votos das urnas eletrônicas após a eleição?

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Encerrada a votação, o presidente de cada seção eleitoral digita uma senha na urna para
impedir que o equipamento contabilize novos votos. Logo depois, cada máquina emite
várias vias do boletim de urna, que contém o resultado da eleição naquele equipamento,
incluindo votos válidos por candidato, nulos, brancos e o comparecimento à seção.

Essa etapa da impressão dos boletins garante que não haverá manipulação durante a
totalização dos votos: caso alguém duvide do resultado final, é possível comparar os
dados dos documentos impressos com os divulgados no site do TSE. Algumas vias dos
boletins, inclusive, são disponibilizadas aos fiscais das coligações partidárias para essa
conferência.

Depois da impressão, os cartões de memória de cada uma das máquinas são retirados.
Esses dispositivos criptografados, chamados de flashcards, contêm uma versão virtual
do BU (Boletim de Urna) e possuem assinaturas digitais que impedem a manipulação.

Os dados desses cartões são enviados aos TREs (Tribunais Regionais Eleitorais) por
meio de uma rede privada que só pode ser acessada em equipamentos da Justiça
Eleitoral, e, então, um sistema eletrônico realiza a somatória dos votos. Após a
totalização, os dados são enviados ao TSE, que disponibiliza os resultados no site.

3. Já houve algum registro de fraude nas urnas eletrônicas?

Não foi registrado nenhum caso de fraude eleitoral envolvendo as urnas eletrônicas
desde a implementação do sistema, de acordo com o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
As urnas eletrônicas foram usadas pela primeira vez em 1996, e atingiram 100% do
eleitorado brasileiro a partir das eleições de 2000.

Uma das denúncias mais emblemáticas de possível fraude aconteceu em 2014, quando
o PSDB pediu uma auditoria nas urnas após o então candidato Aécio Neves ser
derrotado no pleito presidencial. No relatório, divulgado em novembro de 2015 e
submetido ao plenário do TSE, o partido diz não ter identificado fraudes no pleito. O
documento, entretanto, afirma que o sistema “não foi projetado para permitir uma
auditoria externa e independente”, e recomenda a adoção de registro impresso do voto.

Em julho deste ano, o partido reviu sua posição. O presidente do PSDB, Bruno Araújo,
se posicionou contra a PEC (proposta de emenda à Constituição) que institui a
impressão do voto, ao lado dos chefes de outras dez siglas.

O presidente Jair Bolsonaro afirma, pelo menos desde 2019, que existem indícios de
fraude nas eleições, mas nunca divulgou nenhuma prova sólida. Na quinta-feira (29), ele
chegou a citar diversas denúncias antigas, algumas já investigadas e desmentidas.

Desde novembro de 2020, foram pelo menos 65 declarações desinformativas do


mandatário sobre o processo eleitoral. Os ataques levaram o ministro do STF (Supremo
Tribunal Federal) Alexandre de Moraes a incluir Bolsonaro no inquérito das "fake news".

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4. As urnas eletrônicas são vulneráveis a um ataque hacker?

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Não. As urnas eletrônicas utilizadas no Brasil não possuem conexão com a internet ou
sequer placas de rede. Segundo o TSE, os equipamentos são ligados apenas a um cabo
de energia e seu software não tem nenhum mecanismo que permita o acesso à internet.

Mesmo que uma pessoa conseguisse invadir a urna eletrônica fisicamente – dentro da
cabine, por exemplo –, as barreiras de segurança do equipamento e as assinaturas
digitais impediriam a manipulação dos dados.

“Qualquer tentativa de executar software não autorizado na urna eletrônica resulta no


bloqueio do seu funcionamento. De igual modo, tentativas de executar o software oficial
em um hardware não certificado resultam no cancelamento da execução do aplicativo”,
afirma o TSE.

5. As urnas eletrônicas só são utilizadas no Brasil?

Não. Segundo o Idea (Institute for Democracy and Electoral Assistance), uma
organização intergovernamental da qual o Brasil faz parte, pelo menos 46 países adotam
a tecnologia em algum dos seus pleitos. De acordo com levantamento do jornal Folha de
S.Paulo, só Brasil, Butão e Bangladesh usam a urna eletrônica atualmente sem
comprovante impresso.

6. As urnas eletrônicas são as mesmas desde sua adoção, em 1996?

Não. A Justiça Eleitoral realizou diversas modificações na tecnologia para aprimorar a


segurança das eleições. Em 2002, por exemplo, foi implementada a assinatura digital do
software utilizado nas urnas. Desde então, os equipamentos passaram a não permitir a
execução de nenhum programa não autorizado pela Justiça Eleitoral.

Outras mudanças importantes ocorreram em 2003, quando foi criado o Registro Digital
do Voto, e em 2008, ano em que o sistema operacional das urnas passou a ser o Linux.

No dia 30 de julho deste ano, inclusive, o TSE anunciou uma nova mudança: as urnas
passarão a utilizar uma nova certificação da ICP-Brasil (Infraestrutura de Chaves
Públicas Brasileira), com o objetivo de garantir uma maior segurança no processo de
votação.

7. É possível auditar eleições feitas com urnas eletrônicas?

Sim. Os equipamentos possuem recursos que permitem o procedimento, segundo o


TSE. Qualquer organização pode requisitar os sistemas de votação para análise e
verificação a todo momento e pelo período necessário para realizar a auditoria.

O RDV (Registro Digital do Voto) é uma espécie de boletim de urna: todos os votos são
gravados de modo aleatório para impedir a identificação dos eleitores. O RDV possui
diversos mecanismos de segurança que impedem a sua adulteração, como criptografia,
assinatura digital e hash (resumo digital), e permite a recontagem eletrônica dos votos.

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Já os códigos-fonte das urnas eletrônicas são inspecionados antes das eleições por
técnicos indicados pelos partidos políticos, pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e
pelo Ministério Público, além de entidades de classe, sociedades científicas e
organizações civis, até seis meses antes das eleições. No mês anterior ao pleito, é feita
a assinatura digital e a lacração dos sistemas. Na ocasião, são gerados os hashes,
resumos digitais que garantem que os códigos lacrados são os mesmos que foram
auditados.

No dia da eleição, ainda é realizado um teste de integridade das urnas com o objetivo de
avaliar a segurança na captação e contagem do voto. O exame consiste na realização de
uma votação paralela à oficial, com o propósito de comprovar que o voto digitado na urna
é exatamente aquele que será contabilizado.

Na véspera do pleito, a Justiça Eleitoral, em cerimônia pública, sorteia algumas seções


eleitorais de todo o país que serão submetidas às auditorias. O número de urnas a ser
analisado varia de três a cinco, dependendo do estado. Em seguida, as urnas eletrônicas
escolhidas são retiradas das seções de origem e instaladas nos TREs (Tribunais
Regionais Eleitorais), em salas monitoradas por câmeras.

No dia da eleição, representantes dos partidos políticos e das coligações preenchem


cédulas de papel, que são depositadas em urnas de lona lacradas. Após a impressão da
zerésima — documento que prova que não há nenhum voto registrado na urna —, todos
os votos das cédulas preenchidas são digitados, um por um, no equipamento e num
sistema paralelo. Ao final, os números das cédulas em papel, do boletim de urna, do
Registro Digital do Voto e do sistema auxiliar são comparados para verificar a integridade
do sistema.

8. Qual é a proposta de impressão do voto em discussão no Congresso?

A PEC 135/2019, proposta pela deputada federal Bia Kicis (PSL-DF) e que atualmente
está aguardando votação na Comissão Especial da Câmara, determina a impressão de
cédulas físicas checáveis pelo eleitor.

Segundo a proposta, as urnas eletrônicas continuariam sendo utilizadas e o processo de


votação e totalização permaneceria virtual. A diferença é que os equipamentos
expediriam comprovantes do voto que seriam depositados automaticamente em um
recipiente lacrado após a conferência do eleitor por meio de um visor.

Para os apoiadores do projeto, a impressão do comprovante seria uma garantia adicional


da integridade das eleições e permitiria uma recontagem física dos votos. O TSE, no
entanto, argumenta que a proposta, além de representar um grande custo aos cofres
públicos, abriria brechas para fraude eleitoral em uma possível recontagem manual dos
votos.

Em setembro de 2020, o STF (Supremo Tribunal Federal) declarou inconstitucional a


impressão do voto eletrônico, em decisão unânime. Segundo a corte, o sistema coloca
em risco o sigilo e a liberdade do voto. O julgamento foi feito no âmbito de uma lei

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aprovada no Congresso Nacional em 2015, que, assim como a atual PEC propõe,
obrigava o registro impresso do voto eletrônico. A norma havia sido suspensa por liminar
do STF em 2018.

Referências:

1. TSE (1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14 e 15)


2. Site do Amílcar Brunazo Filho
3. G1 (1 e 2)
4. Aos Fatos (1, 2 e 3)
5. Idea
6. Folha de S.Paulo
7. Serpro
8. Câmara dos Deputados
9. Senado
10. STF
11. Facebook (jairmessias.bolsonaro)
12. Poder360

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