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A reforma eleitoral deve incluir cota de gênero nas

cadeiras do Congresso? Não.

Desigualdade na representação política só revela a


desigualdade da competição

Adriana Ventura
Deputada federal (Novo-SP)
O Brasil é um dos piores países do mundo em termos de representação feminina na
política. Apesar de as mulheres serem 51,8% da população, elas detêm, em média,
apenas 15% das cadeiras dos Parlamentos. Uma corrente tem defendido a
implementação de cotas de gênero para as cadeiras do Legislativo. Acredito, porém, que
esse tipo de ação afirmativa seria uma resposta equivocada para a questão.

Reservar cadeiras para mulheres por lei seria negar o princípio básico da democracia: o
poder emana do povo. É a escolha dos cidadãos que legitima o exercício do poder. Em
outras palavras, o voto é soberano. Apenas o voto qualifica o representante a exercer um
mandato eletivo.

No Brasil, o sistema eleitoral é o proporcional de listas abertas. Os mais bem votados


em cada partido assumem o mandato —não importando a cor, a idade, a classe social ou
o sexo. A representação, portanto, não espelha a demografia.

Não deve ser papel do Estado interferir nas escolhas da sociedade para aumentar
a representatividade feminina. Reservar cadeiras para alguém que não obteve o voto
popular seria interferir no resultado da eleição e tirar a legitimidade do eleito, ferindo os
princípios democráticos. Antes de definir cotas, precisamos entender por que as
mulheres não têm tanto sucesso quanto os homens na política. Por que homens e
mulheres votam menos em mulheres do que em homens?

Se todos são iguais perante a lei, todos os candidatos devem ter as mesmas condições.
Para uma disputa eleitoral ser justa, nenhum grupo demográfico deve ter prevalência
sobre o outro. A regra do jogo deve ser a mesma para todos. Isso inclui acesso igual à
disputa, aos meios de financiamento e à divulgação.

Esse é o problema central.

A estrutura partidária pode atrapalhar a eleição de mulheres. Cabe aos partidos definir


quais mulheres estão aptas a participar do pleito. Para mudar o resultado das eleições é
preciso uma mudança nos partidos. Os filiados devem lutar por regras que garantam que
as candidatas não sejam laranjas e tenham o mesmo apoio que os homens.

O financiamento de campanha desigual é outro empecilho à participação na política e ao


sucesso na disputa. Levantamento feito pela Câmara dos Deputados mostrou que,
quando as mulheres recebem mais fundo eleitoral do que os homens, elas têm mais
sucesso. O fundo eleitoral é dividido como os dirigentes partidários definirem, ainda
que respeitados os 30% de destinação obrigatória para as mulheres.
Um partido, por exemplo, pode destinar o valor máximo para um grupo seleto de
candidatos homens e dividir a cota feminina de maneira igual para as mulheres — e
nenhuma terá desempenho melhor que os seus “preferidos”. A desigualdade do
resultado só revela a desigualdade da competição, que não é justa.

O Novo, partido que não usa fundo eleitoral nem apoia cotas, teve o maior índice de
mulheres eleitas em 2020: 38%. Enquanto nas outras legendas, em média, as mulheres
eleitas são menos de 20%.

O terceiro ponto é a cultura. É preciso educar as meninas para que tenham autonomia e
segurança de que qualquer posição — de dirigente partidária a presidente da República
— é para elas.

Complementarmente, educar meninos para que as respeitem e admirem e tenham a


mesma certeza de que são capazes em qualquer função. Devemos educar os cidadãos
para que procurem representantes para as suas ideias e não para o seu gênero.

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