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A TESE DO DIÁLOGO DAS


FONTES

Direito Civil
O contrato exerce um papel importantíssimo, com vistas à circulação de
riquezas, pois confere segurança às relações jurídicas. Porém, não é esse o seu
papel principal.
O seu fundamento é a perpetuação da vida humana, ou seja, o atendimento
das necessidades da pessoa. A real função do contrato não é atender aos
interesses do mercado, mas sim da pessoa humana. Por isso é que o contrato
deve ser analisado sob o prisma da personalização do Direito Privado e do Direito
Civil Constitucional, a fim de atender o mínimo para que a pessoa viva com
dignidade. O foco principal do contrato não é o patrimônio, mas sim o indivíduo
que contrata.
Aliás, talvez seja por esse motivo que Luiz Díez-Picazo e Antonio Gulón
afirmam que não é correto utilizar a expressão autonomia da vontade, mas sim
autonomia privada, eis que a autonomia não é da vontade, mas da pessoa
(Sistema…, 2003, p. 379).

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Diante da valorização da pessoa e dos três princípios do Direito Civil
Constitucional (dignidade da pessoa humana, solidariedade social e igualdade em
sentido amplo), não se pode olvidar que houve uma forte aproximação entre dois
sistemas legislativos importantes para os contratos, sendo certo que tanto o
Código Civil de 2002 quanto o Código de Defesa do Consumidor consagram uma
principiologia social do contrato.
Nesse contexto, muitos doutrinadores propõem hoje um diálogo necessário
entre as duas leis e não mais um distanciamento, como antes era pregado.
Por uma questão lógica, o Código de Defesa do Consumidor estava distante
do Código Civil de 1916, que era individualista e apegado a um tecnicismo
exagerado. Isso não ocorre em relação ao Código Civil de 2002.
Por muito tempo, afirmou-se que, em havendo relação jurídica de
consumo, não seria possível a aplicação concomitante do Código Civil e do
Código de Defesa do Consumidor.
Isso, na vigência da codificação privada anterior, eminentemente
patrimonialista e muito afastado da proteção do vulnerável prevista na Lei
Consumerista.
Entretanto, tem-se defendido atualmente um diálogo das fontes entre o
Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor.
Por meio desse diálogo, deve- se entender que os dois sistemas não se
excluem, mas, muitas vezes, se complementam, o diálogo de complementaridade.
A tese foi trazida para o Brasil por Cláudia Lima Marques, a partir dos
ensinamentos que lhe foram transmitidos por Erik Jayme, professor da
Universidade de Heidelberg, Alemanha. A renomada professora gaúcha
demonstra as razões filosóficas e sociais da tese do diálogo das fontes da seguinte
forma: “Segundo Erik Jayme, as características da cultura pós-moderna no
direito seriam o pluralismo, a comunicação, a narração, o que Jayme denomina
de ‘le retour des sentiments’, sendo o Leitmotiv da pós-modernidade a
valorização dos direitos humanos. Para Jayme, o direito como parte da cultura

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dos povos muda com a crise da pós-modernidade. O pluralismo manifesta-se na
multiplicidade de fontes legislativas a regular o mesmo fato, com a
descodificação ou a implosão dos sistemas genéricos normativos
(‘Zersplieterung’), manifesta-se no pluralismo de sujeitos a proteger, por vezes
difusos, como o grupo de consumidores ou os que se beneficiam da proteção do
meio ambiente, na pluralidade de agentes ativos de uma mesma relação, como
os fornecedores que se organizam em cadeia e em relações extremamente
despersonalizadas. Pluralismo também na filosofia aceita atualmente, onde o
diálogo é que legitima o consenso, onde os valores e princípios têm sempre uma
dupla função, o ‘double coding’, e onde os valores são muitas vezes antinômicos.
Pluralismo nos direitos assegurados, nos direitos à diferença e ao tratamento
diferenciado aos privilégios dos ‘espaços de excelência’ (Jayme, Erik. Identité…,
p. 36 e ss.)” (MARQUES, Cláudia Lima. Comentários, 2004, p. 24).

Direito Civil. Teoria Geral dos Contratos e Contratos em Espécie - Volume 3


(Flavio Tartuce)

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