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A FAIANÇA FINA E A CONSTRUÇÃO

DA IDENTIDADE FRONTEIRIÇA NA
URUGUAIANA DO SÉCULO XIX

Jeremyas Machado Silva*


Ronaldo Bernardino Colvero**
Viviane Pouey Vidal***

Resumo: Este artigo é resultado da análise do


consumo da faiança fina europeia na fronteira oeste
do Rio Grande do Sul, a partir do final do século
XIX até a segunda década do século XX. Neste
estudo, os produtos de cerâmica são percebidos
como signos que carregam uma definição social
sendo capazes de expressar identidades e valores. O
consumo da faiança fina em Uruguaiana neste
período inclui-se ao movimento portuário, ao
comércio e ao contrabando que envolve o próprio
imaginário social da fronteira do Brasil com a
Argentina e Uruguai, além disso, a região
encontrava-se em desenvolvimento político, social e
econômico. Assim, buscou-se relacionar ao estudo
da cultura material a análise de documentos,
fotografias e anúncios nos jornais locais
pertencentes ao período histórico pesquisado. Foi
possível estabelecer uma profunda relação
interdisciplinar, analisando as fontes arqueológicas
e históricas e compreendendo através delas, os
hábitos e as representações simbólicas da sociedade
uruguaianense na transição do século XIX para o
século XX.
Palavras-chave: Comércio. Faiança. Fronteira.
Identidade.
* Mestre em História das Sociedades Ibéricas e Americanas,
com orientação em Arqueologia - PUCRS. Abstract: The objective of this research is to
Professor nas Faculdades Integradas Machado de Assis e no understand the consumption of fine earthenware
Colégio Salesiano Dom Bosco, Santa Rosa - RS. European on the western border of Rio Grande do
E-mail: jeremyass@gmail.com Sul, from the end of the nineteenth century until the
second decade of the twentieth century considering
** Doutor em História das Sociedades Ibéricas e Americanas, the values approach and meanings that these
pelo Programa de Pós- Graduação em História - PUCRS. products had integrated to its materiality. The
Pesquisador em Arqueologia e professor adjunto do curso de ceramic products studied did not have only one
Ciência Política da UNIPAMPA, Campus de São Borja. functional trend and were not empty of meanings. In
E-mail: ronaldocolvero@unipampa.edu.br this dissertation, the ceramic products are regarded
as symbols that carry a social definition being able
*** Mestre em História, com orientação em arqueologia pré- to express the values and identities of fashion. The
colonial e Doutoranda em Arqueologia pela Universidad consumption of fine faience in Uruguaiana in this
Nacional da Província de Buenos Aires – UNICEN. period includes port movement, trade and smuggling
Professora substituta no Curso de Licenciatura em Ciências that involves the social imaginary of Brazil's border
Humanas da UNIPAMPA, Campus de São Borja. with Argentina and Uruguay, in addition, the region
E-mail: vivianepouey@unipampa.edu.br

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is experiencing a moment of political, social and
economic development. Thereby, we attempted to
relate to the study of material culture analysis of
documents, photographs and advertisements in local
newspapers belonging to the historical period
researched. Thus, it was possible to establish a deep
interdisciplinary relationship, analyzing the
archaeological/historical sources and understanding
through them, of the habits and the symbolic
representations of society in Uruguaiana.
Keywords: Trade. Faience. Borders. Identity.

1. Introdução

Este estudo aborda, principalmente, o comportamento dos atores sociais e o uso


por parte dos mesmos da cultura material como linguagem e expressão simbólica,
ligadas a um modelo de comportamento elitista e uma amplitude de hábitos sustentados
pelo comércio e pelo consumo das mercadorias e dos valores europeus em Uruguaiana –
RS no final do século XIX. A principal fonte de pesquisa deste trabalho é a faiança fina,
cerâmica de origem europeia muito popular no Brasil oitocentista.
A história revela que desde a antiguidade as práticas comerciais sempre
constituíram sólidas relações sociais. Sendo assim, diversos grupos conviveram
trocando experiências, hábitos e culturas através do comércio. Os diferentes idiomas
nunca impossibilitaram que houvesse entendimento entre povos de costumes distintos,
isto porque, os objetos ou mercadorias sempre funcionaram como linguagens. As coisas
comunicam como palavras.
De acordo com Hilbert “os arqueólogos transformam cultura material em
palavras, linguagens” (HILBERT, 2009, P. 12) isso torna a arqueologia mais verdadeira
e conveniente, pois a linguagem é uma importante particularidade humana, assim como
a capacidade de transformar as coisas e criar cultura material. Assim, nesta pesquisa
buscou-se compreender a cultura material como um modo linguagem e apresentar os
resultados obtidos por meio do estudo e observação das fontes arqueológicas, dos
documentos e jornais encontrados em arquivos históricos e também em consultas
realizadas em torno de importantes publicações que abordam o estudo do consumo, da
arqueologia histórica e do comércio na fronteira oeste do Rio Grande do Sul.
Como referencial teórico utilizou-se autores como: Douglas e Isherwood (1979),
Bourdieu (1984), Appadurai (1986), Miller (1987), McCracken (1988), Glassie (1999),

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Veblen (1983) e como a cultura material pode comunicar: Preucel (2006), Hilbert
(2009) e Bars (2010).
Realiza-se também uma breve narrativa sobre o povoamento e a história de
Uruguaiana onde se contextualiza o estudo em espaço e tempo. Do mesmo modo,
disserta-se sobre o histórico da produção da faiança na Europa e sobre duas pesquisas
arqueológicas realizadas em Uruguaiana nos espaços urbano e rural e pesquisas nos
jornais “A Notícia” e “A Nação” pertencentes ao acervo do arquivo histórico de
Uruguaiana e produzidos entre os anos de 1899 e 1912.
Durante este processo buscou-se entender a conjuntura econômica de
Uruguaiana no período estudado. Os sítios arqueológicos pesquisados diferenciam-se
em contexto paisagístico (cidade e campo), mas ambos combinam elementos
econômicos. Ao compreender-se o consumo incluso ao contexto da fronteira notou-se
que os hábitos rurais e urbanos achavam-se conectados. As amostras retiradas dos dois
sítios consistem em fragmentos de louças, cerâmicas, vidros, telhas e metais
demonstrando tal conexão. O principal objetivo da pesquisa foi compreender, a partir
dos dados arqueológicos, como o consumo da faiança fina era simbólico e estava
associado a um grande contexto histórico estimulado pelo comércio e pelos valores
europeus.

2. Consumo e significado

Na História percebe-se a existência de rituais de consumo e elevados fluxos


ideológicos que professam ritos, valores e significados vinculados aos objetos. As
coisas possuem valores sociais e não somente valores econômicos, assim, são
mediadores de relações sociais. De acordo com Symanski estes objetos são chamados
“Commodities” (SYMANSKI, 2008, p. 83). Segundo Appadurai “o valor das
Commodities é criado através do comércio, de modo que o foco da análise deve ser
direcionado para as coisas que são comercializadas, antes do que para o processo de
comercialização” (APPADURAI, 1986, p. 56).
Considerando um universo de possibilidades na investigação histórica e na
escolha das fontes, diversos autores dedicaram-se a pesquisas que revelassem o quanto

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o estudo do consumo esclarece dúvidas sobre o comportamento social, delineando as
relações sociais, os hábitos e princípios éticos dos indivíduos.
Para Mary Douglas e Isherwood, o consumo é estudado por meio de inferências
antropológicas e entendido como um fenômeno cultural que aclara a sociedade. Além
disso, é abandonada a compreensão dos objetos essencialmente por atribuições de
ordens funcionais ou práticas. Desse modo, é ingênuo e não se ajusta a esta situação
imaginar, por exemplo, que um Romanée-Conti servido em um cálice de cristal fino
não carregue em sua materialidade nenhum denodo simbólico. O mesmo objeto ou
substância, não pode ser esgotado de valores, pois carrega significados, sendo que estes
são intrínsecos a sua própria origem que remonta ao século III, como também, ao seu
apurado sabor ou ainda o seu valor no mercado internacional. De qualquer forma, de
acordo com este pensamento, torna-se possível a leitura das substâncias ou dos objetos
como se estes comunicassem como textos e expressassem múltiplas relações ou
significados sociais. Conforme Miller:

Influenciado pela ascensão do estruturalismo (Lévi-Straus 1972) e pela


aplicação da semiótica às mercadorias (Barthes, 1973), o estudo do consumo
foi revolucionado por dois livros publicados em 1979. Douglas (Douglas e
Isherwood, 1979) advogou uma abordagem dos bens como um sistema de
comunicação numa analogia com a linguagem (mas em aspectos críticos
também distintos dela). Uma vez que os bens de consumo são pensados como
um sistema simbólico, isso abre a possibilidade para de algumas formas “ler”
a própria sociedade através do padrão formado entre os bens. (MILLER,
2007, p. 44).

No trabalho de Mary Douglas o consumo e a cultura material são percebidos


como sistemas de comunicação. Suas pesquisas revolucionaram estes campos de estudo
e contribuíram à arqueologia desenvolvendo metodologias que alcançassem uma melhor
compreensão dos simbolismos presentes nos objetos. Analisando as evidências
arqueológicas e buscando compreender o que estas representavam aos grupos sociais as
quais pertenciam é possível perceber uma linguagem envolvendo objetos.
A linguagem era empregada às mercadorias que circulavam no comércio de
Uruguaiana e o consumo de produtos importados da Europa oferecia àquela sociedade a
qualidade do modo de vida europeu, ou melhor, a possibilidade de imitá-lo
(Zimmerman, 1907). A cultura material é uma linguagem simbólica, conforme Hilbert,
“pesquisas recentes sobre cultura material valorizam os significados das coisas e partem

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da ideia de que podem ser vistos como signos que auxiliam seus donos e usuários na
comunicação entre pessoas, além de expressar suas identidades” (HILBERT, 2009,
p.16).
Segundo os estudos de Bourdieu (1984), também se entende, que existe uma
possibilidade de compreensão das classes ou grupos sociais por meio dos objetos. No
pensamento do autor, os objetos são compreendidos como bens simbólicos, através dos
quais, a sociedade pode comunicar os seus valores e ideias. É ainda provável a
concepção de um “espaço de relações” perfazendo e multiplicando os valores ou ideais
próprios pertencentes a uma sociedade. É importante para a interpretação da cultura
material e dos signos que os objetos carregam compreender-se também o espaço que
estes ocupam. Não simplesmente um espaço físico qualquer, mas um espaço social
constituído por pessoas distintas, por diferentes classes, e por fim, com diferentes
costumes e crenças como na fronteira.
De acordo com Lefebvre (1974), igualmente fica claro, que um espaço é
percebido como resultado das relações contidas na sociedade. Este espaço interatua com
a mesma, oportunizando e concebendo o relacionamento social. Por isso, toma-se neste
trabalho, o conceito já mencionado anteriormente, dado por Bourdieu sobre o “espaço
de relações” para que se possa atingir uma proximidade de compreensão sobre as
interações sociais advindas do consumo das importações na fronteira oeste do Rio
Grande do Sul. Segundo Bourdieu:

O que existe, é um “espaço de relações” o qual é tão real como um espaço


geográfico, no qual as mudanças de lugar se pagam em trabalho, em esforços
e, sobretudo em tempo (ir de baixo para cima é guindar-se, trepar e trazer as
marcas, ou estigmas desse esforço). Também as distâncias medem nele em
tempo (de ascensão ou de reconversão, por exemplo). É a probabilidade da
mobilização em movimentos organizados, dotados de um aparelho e de
porta-voz (precisamente aquilo que leva a falar de classe) será inversamente
proporcional ao afastamento nesse espaço. (BOURDIEU, 1992, p. 137).

Na antropologia social Appadurai estuda os significados culturais dos objetos e


estes, encontram-se presentes nas esferas de produção e consumo das mercadorias.
Desse modo, a aplicação da técnica na indústria também visa atender as necessidades
simbólicas ou ritualísticas da sociedade consumidora, pois a aplicação da técnica nos
bens de consumo está amarrada nas tendências da moda ou no uso figurado dos objetos.

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Em sua obra, Appadurai faz referência aos estudos do antropólogo Brian Spooner, sobre
a representação simbólica dos objetos. Conforme Appadurai:

Com isso em mente, é possível colocar o lado do consumo do processo que


Spooner observou no contexto que Baudrillard viu como a emergência do
objeto, isto é, uma coisa que já não é apenas um produto ou uma mercadoria,
mas essencialmente um signo em um sistema de signos de status. Objetos, na
visão de Baudrillard, emergem inteiramente somente neste século no
Ocidente moderno, no contexto das formulações teóricas de Bauhaus
(Baudrillard, 1981:185), embora tenha sido recentemente demonstrado que o
surgimento de objetos na cultura europeia pode ser rastreado pelo menos ao
Renascimento (Mukerji, 1983). A moda é o meio cultural em que os objetos,
no sentido de Baudrillard, se movimentam. (APPADURAI, 1986, p. 6).

O consumo deve ser percebido como um meio de exibição social. Nem sempre o
consumo de um produto suprirá somente necessidades práticas, mas, além disso, ele
poderá estar preenchendo lacunas nas formas de relacionamentos sociais e servir como
meio de comunicação e afirmação de identidade. Quando entendemos este processo
percebe-se que, quando a sociedade consome um determinado objeto ela está também
consumindo valores. Assim, a humanidade se inventa através dos objetos e do consumo,
pois estes estão carregados de múltiplos valores que estabelecem e compõem a vida
social. Segundo Veblen:

Para o homem ocioso, o consumo conspícuo de bens valiosos é um


instrumento de respeitabilidade. À medida que acumula riqueza, ele é
incapaz, sozinho, de demonstrar a própria opulência. Recorre, por isso, ao
auxílio de amigos e rivais, dando-lhes presentes valiosos e convidando-os
para festas e divertimentos dispendiosos. É verdade que as festas e os
divertimentos se originaram, provavelmente, no simples sentimento ingênuo
de ostentação, bem cedo, todavia, adquiriram aquela utilidade de consumo
conspícuo, retendo até hoje esse caráter, assim, essa utilidade há muito é o
fundamento substancial do seu uso. (VEBLEN, 1983, p. 38).

As relações que as pessoas mantêm com os objetos, e de que modo estes, de


certa forma, induzem o comportamento humano, é também, uma questão examinada
pela arqueologia e pela antropologia. Conforme o diagnóstico de Duarte (2002), da
Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Portugal, Daniel Miller entende o
consumo como uma construção cultural dos indivíduos e não, exclusivamente, como
uma implicação do sistema capitalista. Assim, antes de qualquer análise, adota-se como
nosso suporte inicial, o fato de que o ser humano não existe e não pode ser
compreendido fora da cultura. Daniel Miller pensa a construção de um sentido para o

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consumo e a significação das coisas materiais, deste modo, procura em Hegel entender
como a sociedade se organiza através dos objetos. Conforme Duarte:

Do esquema progressivo de Hegel, Miller abstrai o seu conceito de


objetificação, entendido como um processo dinâmico pelo qual um dado
sujeito se desenvolve através da sua projeção num mundo externo e da
subsequente reapropriação dessa projeção. O sujeito em questão pode ser
entendido como uma sociedade que é concebida como progredindo através da
criação de formas externas diversas. Estas podem incluir a linguagem, a
cultura material, os sonhos individuais, as grandes instituições ou conceitos,
como nação, estado ou religião. São formas geradas na história e dentro de
um determinado contexto no qual a sociedade opera. Temos, então, que a
cultura material contemporânea, na sua panóplia diversificada de itens,
constitui uma forma particular de externalização da sociedade industrial.
Importa agora que o processo de objetificação não fique pela metade, ou seja,
que o mundo de objetos criados pela sociedade não se transforme em algo
abstrato e separado dela, mas que pelo contrário, a sociedade consiga
reapropriar-se da cultura que produziu e, assim, se possa desenvolver. O
consumo de massa é o meio pelo qual a sociedade industrial pode realizar
essa reapropriação da cultura material que é uma parte significativa da sua
cultura. (DUARTE, 2002, p. 368).

A cultura material é entendida como uma projeção do imaterial, ou seja, dos


valores, das crenças, das aspirações e das representações. Quando um objeto é
significado, ocorre então, o surgimento da experiência humana, o que podemos chamar
de cultura. É por isso, que o ser humano não existe fora da cultura, pois as pessoas
atribuem sentidos e significados a uma amplidão de objetos, substâncias, sons, lugares
ou acontecimentos. Se apropriar, significar e valer-se de um objeto, por exemplo,
encontra-se na parte de um todo, o consumo.
Para Miller, “consumir algo é usar algo, na realidade, destruir a própria cultura
material” (MILLER 2007, p. 34). O importante é nos darmos conta, que é através do
consumo, que os indivíduos estabelecem as relações sociais. Os bens de consumo
formam ligaduras que conectam a sociedade por meio de diversos signos, expressam os
valores, a moda, a tecnologia, e múltiplas formas que são todas postas como diferentes
linguagens que montam uma grande rede de comunicações simbólicas, e tudo isso
envolve os objetos. De acordo com Hilbert “fica evidente, pela experiência em sala de
aula, que arqueólogos transformam coisas em palavras, dão nomes às coisas, usando
palavras e, por meio dessas palavras, fazem arqueologia” (HILBERT, 2009, p. 15).
Conforme com o pensamento de Lévi-Strauss (1987) é possível compreender
que um grupo não pode propriamente ser definido, e que talvez por este motivo, o autor

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compara o estudo destes elementos formadores da estrutura das sociedades a linguística,
onde cada sílaba é formadora de uma palavra, uma estrutura. Por meio desta reflexão,
relaciona-se o caso ao estudo da cerâmica europeia, onde a combinação dos objetos
pode obter diversas representações dentro de um contexto, como a combinação de
sílabas forma uma palavra, ou seja, um signo.
A cultura material transporta mensagens, torna-se comunicação e pode ser
percebida como um índice de relações sociais. Conforme Grant McCraken que estuda o
marketing e o consumo e o distingue como um agente transformador da sociedade
ocidental no final do século dezesseis houve um grande aumento na produção e
demanda de novos produtos para o mercado. Isto fez com que, no século dezenove, a
sociedade passasse ainda por distintas mudanças de hábitos culturais que possuíam
fortes relações com a industrialização. Segundo McCraken:

Por volta do século XIX, consumo e sociedade, estavam inextricavelmente


ligados em um contínuo processo de mudanças. Não houve, portanto,
nenhum “boom de consumo” no século XIX, porque havia agora uma relação
dinâmica, contínua e permanente entre mudanças no consumo e as sociais, as
quais, juntas, conduziam a perpétua transformação do ocidente. Algumas das
mudanças deste período são essenciais para o nosso entendimento do
moderno caráter do consumo. Tais mudanças incluem a emergência da loja
de departamento, que contribuiu de modo fundamental para a natureza da
informação e da influência às quais estava submetido o consumidor. O século
XIX viu também o surgimento de “novos estilos de vida de consumo” e de
seus respectivos novos padrões de interação entre pessoas e coisas. Surgiram
novas técnicas de marketing, tais como o emprego de novas estéticas e de
motivos culturais e sexuais arquitetados para adicionar valor aos produtos.
(McCRAKEN, 2003, p. 43).

Observa-se, portanto, não somente uma direção para os significados atribuídos


às coisas, e sim, vários. Estes mesmos significados, também são observados na arte,
constituída e manifesta pela cultura material. Segundo Ralph Waldo Emerson, citado
por Glassie, “a arte pode ser definida como: a mistura da natureza e da vontade. A arte
de Emerson é exatamente cultura material, a união das coisas da mente e da matéria”
(GLASSIE, 1999, p. 41). Percebe-se nos estudos de Henry Glassie sobre cultura
material que muito se pode refletir sobre as manifestações e aspirações humanas
transferidas aos objetos. Um dos exemplos citados pelo autor é o significado cultural do
pote de chá japonês. De acordo com Glassie.

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Considere a maravilha do pote de chá japonês. É um objeto de argila, retirado
da terra e ainda não significado. As impressões dos dedos do seu fabricante
correm na espiral lenta da sua criação. No momento da umidade, quando
estava na incerteza flexível, ainda permanece pouco firme na borda. As
queimaduras relembram seu tempo no fogo quando veio a tornar-se firme. O
esmalte que derreteu na flama parece destilado, empolado e fluido. As
trações, finas paredes, e as formas eretas falam do esquema da mente do
mestre. As rachaduras enchidas com ouro líquido sugerem a continuidade do
trabalho e o cuidado. O vaso foi preenchido com líquido quente e passado de
mão em mão, enchendo a palma, aquecendo as amizades, juntando as pessoas
no convívio cerimonial. O pote de chá personifica uma relação com a
natureza. Arranca um instante e o cristaliza numa experiência transitória.
Materializa o desejo do seu fabricante por beleza, e guarda o uso, como uma
ferramenta que desenvolve a afinidade social1. (GLASSIE, 1999, p. 42).

Os estudos da cultura material e da arte estão estreitamente ligados, pois ambas


as categorias, expressam, de certo modo, um imaginário que fora constituído, de forma
particular ou coletiva. Este imaginário carrega em si próprio, por exemplo, lirismos,
tendências de moda, crenças, hábitos, valores ou diferentes visões de mundo. Todas
estas formas podem estar ligadas a um determinado grupo social e serem representadas
em sua cultura material. Assim, quando outro grupo fizer uso destes mesmos objetos,
seja por meio de trocas ou importações, poderá este outro grupo, apresentar variações
em sua cultura. Isto ilustra o que ocorreu na sociedade Ibero-Americana do século XIX
devido ao aumento das cidades portuárias, desenvolvimento das relações comercias e
novas práticas de consumo, incluindo abundantemente os produtos derivados da
Europa. A cultura material pode ser um elemento demonstrativo do imaginário de uma
sociedade, segundo Silva:

Imaginário significa o conjunto de imagens guardadas no inconsciente


coletivo de uma sociedade ou de um grupo social; é o depósito de imagens de
memória e imaginação. Ele abarca todas as representações de uma sociedade,
toda a experiência humana, coletiva ou individual: as ideias sobre a morte,
sobre o futuro, sobre o corpo. Para Gilbert Durant, é um museu mental no
qual estão todas as imagens passadas, presentes e as que ainda serão
produzidas por dada sociedade. O imaginário é parte do mundo real, do
cotidiano, não é algo independente. Na verdade ele diz respeito às formas de
viver e de pensar de uma sociedade. As imagens que o constituem não são
iconográficas, ou seja, não são fotos, filmes, imagens concretas, mas sim
figuras de memória, imagens mentais que representam as coisas que temos
em nosso cotidiano. (SILVA, 2009, p. 213).

No mesmo contexto das mudanças culturais na América, a burguesia europeia


passava a consumir mais. Na Europa do século XIX, quando para os ingleses era
1
Tradução independente: Tatiana Pedrosa.

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considerada importante a cerimônia do chá, a cerâmica conhecida como faiança-fina,
por exemplo, foi muito utilizada no continente europeu e estava perfeitamente
harmonizada com o cenário burguês. Durante os seus diversos períodos de fabricação,
partindo do final do século XVIII ao início do século XX, a faiança fina europeia passou
por diversas transformações em seu modo de produção. Neste processo, ganhou o
emprego de diferentes tecnologias na constituição da sua pasta e seu esmalte, e obteve
variadas técnicas na aplicação de estilos e padrões de decoração.

Figura 1: Fragmentos de faiança fina com padrão decorativo floral. Uruguaiana - RS.

Fonte: Arquivo pessoal.

Sobre a cerâmica foi possível aplicar formas decorativas e artísticas, pinturas,


transferências de imagens, relevos e carimbos, processos que, ao longo dos anos foram
ganhando características singulares conforme o aperfeiçoamento da indústria. Desta
forma, com o emprego e a valorização da arte nas peças, esta louça tomou o cenário
burguês ganhando além da sua posição prática e funcional, uma conotação simbólica de
status.2 Devido às relações de exportações e importações destes produtos a cerâmica

2
A questão da significação conduz de imediato a uma abordagem dos fenômenos de denotação e
conotação do signo. De um signo denotativo pode-se dizer que ele veicula o primeiro significado
derivado do relacionamento entre um signo e seu objeto. Já o signo conotativo põe em evidência
significados segundos que vêm agregar-se ao primeiro naquela mesma relação signo / objeto. Em / o tutu
estava espalhado sobre a mesa /, o signo / tutu / pode atribuir à mensagem duas diferentes significações,
conforme o entrono maior que a envolve: denotativamente pode-se entender que sobre a mesa /, fora
espalhado o prato à base de feijão; conotativamente, que sobre a mesa havia dinheiro espalhado. Em otras
inquisiciones, Jorge Luis Borges fornece um exemplo literário, mais rico que o anterior. “Ao falar das
alegorias, trata dos dois conteúdos abrangidos por uma forma: um, o imediato ou literal (denotativo,

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obteve também conotações simbólicas em diversas cidades em desenvolvimento
urbano, como por exemplo, Uruguaiana no século XIX.
É importante deixar claro que, no presente estudo, o consumo foi observado por
meio de uma análise cultural. Sendo assim, foi possível compreender a sua prática
orientada por fatores simbólicos, desprendidos de análises genuinamente econômicas
que possam percebê-lo somente como um advento do capitalismo, insustentável e
prejudicial.

3. Histórico do início da produção da Faiança Fina na Europa

Foi modelando e queimando o barro que o ser humano deu forma aos seus
deuses e a sua natureza mística em distintos tempos e espaços no transcurso da história.
Durante séculos os artefatos cerâmicos em suas mais variáveis formas, tamanhos ou
motivos de representação artística têm sido utilizados por diferentes grupos sociais que
foram aprimorando essencialmente as suas formas de produção. Estas sociedades os têm
usado para estocarem ou manusearem diversas coisas ou alimentos, ou ainda, em
cerimoniais religiosos, ritos de passagem, rituais fúnebres, reuniões e outros modos de
celebração com a finalidade de reter substâncias ou compartilhar significados inclusive
ainda em nossa época.
A cerâmica vidrada, por exemplo, já era produzida no período clássico greco-
romano. As relações comerciais alocadas entre distintos grupos sociais foram
continuamente categóricas no desenvolvimento da produção cerâmica. Um caso
específico e importante neste estudo é a produção iniciada na Europa pela majólica ou
maiólica que recebe este nome devido a sua origem advinda de um comércio de grande
influência árabe formado na ilha espanhola de Maiorca no Mar Mediterrâneo. A
terminologia faiança, cominada a esta cerâmica, tem a sua origem relacionada à cidade
de Faenza na Itália, um importante núcleo de produção cerâmica no século XVI, mas
tem a sua pronúncia empregada inicialmente e popularizada no francês, “faiance”. De
acordo com Guarisse, “no século XVI os comerciantes italianos levaram as majólicas

diríamos), de que é exemplo: Dante, guiado por Virgílio, chega a Beatriz”. O outro figurativo (em nossa
terminologia, conotativo): “o homem enfim chega à fé, guiado pela razão”. NETTO, J. Teixeira Coelho.
Semiótica, Informação e Comunicação. Coleção debates: Semiótica. São Paulo - SP. 1990. Editora
Perspectiva S.A. p.24.

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vindas da Itália (muitas dessas vindas da cidade de Faenza) para a França. Essas eram
recebidas como louça de Faenza, e logo passaram a chamar toda a majólica da Itália de
Faiança” (GUARISSE, 2002, p. 14). Embora a Europa possuísse importantes centros
cerâmicos durante o Renascimento, estes não superavam em qualidade a porcelana
fabricada na China.
Durante o século XVIII, o Iluminismo3 trouxe o despertar da ciência e do
conhecimento ao ocidente, unindo ao novo pensamento filosófico e científico da
humanidade, o moderno crescimento econômico e o veloz desenvolvimento da indústria
capitalista na Europa. Nos anos seguintes deste período, chamado de século das luzes4,
o crescente consumo de bens inaugurou um novo cenário para a humanidade. Neste
cenário, mesclado por modernos hábitos sociais, inovações no pensamento e na moda e
anúncios de valores novos, a fábrica passou a gerar e compor as alegorias para os
incididos atores sociais do Iluminismo. Embora todo o processo de industrialização nos
séculos XVIIII e XIX apresentem extensas jornadas de trabalho e péssimas condições
de vida aos operários das fábricas, este acontecimento provocou uma profunda mudança
social, transformando as relações sociais daquele período, às quais passaram a ser
conduzidas principalmente pelo valor das mercadorias.
Neste processo, com os avanços econômicos e tecnológicos a cerâmica passou
por mudanças em sua forma de fabricação e transformou-se em um produto que
revolucionaria a indústria na Europa no final do século XVIII. Segundo Tânia A. de
Lima, “quando a Inglaterra começou a produzir louça imitando a porcelana chinesa em
larga escala e, por um baixo custo, provocou-se uma revolução no consumo deste item
doméstico” (LIMA, apud SENA, 2007, p. 65). Nos meios ceramistas foram
desenvolvidas pesquisas para se produzir uma cerâmica tão boa quanto à porcelana
Oriental que possuía excelentes propriedades como beleza e impermeabilidade. De tal

3
O iluminismo é um dos temas mais importantes na História das ideias, influenciando toda a estrutura
mental do Ocidente contemporâneo. Como conceito, foi criado pelo filósofo alemão Imannuel Kant, em
1784, para definir a filosofia dominante na Europa ocidental no século XVIII. A palavra iluminismo vem
de esclarecimento (Aufklärung no original alemão), usada para designar a condição para que o homem, a
humanidade, fosse autônomo. Isso só seria possível, afirma o iluminismo, se cada indivíduo pensasse por
si próprio, utilizando a razão. O iluminismo abarcou tanto a filosofia quanto as ciências sociais e naturais,
a educação e a tecnologia, desde a frança até a Itália, a Escócia e mesmo a Polônia e a América do Norte.
Os pensadores e escritores de diversas áreas que aderiram a esse movimento de crítica às ideias
estabelecidas pelo antigo regime eram chamados comumente philosophes, filósofos em francês, mas entre
eles havia também economistas, como Adam Smith, e historiadores como Vico e Gibbons. Ver mais em:
SILVA, Kalina Vanderlei, Dicionário de Conceitos Históricos. São Paulo, Editora Contexto, 2009.
4
Ainda durante o século XVIII.

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modo, na cidade de Delft situada nos Países Baixos, foi iniciada uma produção de
faianças inicialmente inspirada nos modelos das louças chinesas. De acordo com
Schávelzon, “o acréscimo de caulim em grandes quantidades possibilitou a produção de
uma cerâmica com pasta branca e resistente, de baixo custo, podendo ser cozida a
1.400° de temperatura, como em Meissen, onde havia surgido outra das grandes fábricas
europeias” (SCHÁVELZON, 1991, p. 39).
Na França, a manufatura de Sévres durante o século XVIII,
concomitantemente, desenvolveu novos métodos para a produção da faiança. A nobreza
francesa originava as tendências da moda para a maior parte da Europa e a Real
Manufatura de Sèvres era um símbolo de modernidade e refinamento que exibia todo o
luxo e distinção da corte de Luís XV em suas peças de cerâmica. Sabe-se, além disso,
que o rei Luis XV da França e sua amante Madame de Pompadour presenteavam com
peças de Sèvres as famílias reais estrangeiras e a seus mais importantes embaixadores.
Conforme Guarisse, “tudo isso fez com que fosse estabelecida a moda da porcelana na
Europa” (GUARISSE, 2002, p. 22).
Por volta de 1720 ocorreu uma importante variação na fabricação da faiança.
No condado inglês de Staffordshire, de acordo com Schávelzon, “foi usada uma argila
branca de qualidade e com adição de sílex calcinado, desse modo, foi alcançada, pela
primeira vez, uma faiança com baixo custo de produção” (SCHÁVELZON, 1991, p.38).
A faiança fina que ornamentou a mesa das famílias europeias em seu cotidiano possuía
uma pasta composta por diferentes conteúdos, que não necessariamente, ficavam
sobrepostos, como por exemplo: sílex calcinado, ossos calcinados, caulim, argila, cal,
giz e feldspato.
No ano de 1759, também em Staffordshire, o avô materno de Charles Darwin,
o ceramista Josiah Wedgwood aperfeiçoou os métodos de fabricação da faiança.
Segundo Hüme, “o resultado foi uma louça de pasta creme com esmalte de coloração
esverdeada advinda da aplicação de óxido de chumbo, conhecida como creamware,
Queen’s Ware” (HÜME, Apud TOCCHETTO, 2001, p. 23). A louça usada pela rainha
da Inglaterra.
No início do século XIX, isso por volta da primeira década a cerâmica com a
pasta de coloração creme passou a ser substituída no mercado por uma cerâmica pérola
conhecida por pearlware. Conforme Tocchetto, “a coloração do esmalte típica das

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louças designadas como pearlware apresenta-se em tons levemente azulados
observados, principalmente, nos pontos de acúmulo, ou seja, bordas e bases, devido ao
acréscimo de óxido de cobalto” (TOCCHETTO, 2001, p. 24). A sucessora da louça
pearlware tomou o seu lugar por volta de 1840 possuindo um esmalte demasiadamente
branco, e conhecido como whiteware, mas recebeu a sua popularidade somente na
segunda metade do século XIX, embora sendo comercializada ainda recentemente.
Conforme Schávelzon, “por volta de 1750, a produção das peças de faiança no
torno foi abandonada passando a utilizar-se a fabricação em moldes. Em 1770 foi
descoberta a possibilidade de imprimir imagens às louças e produzir cerâmicas
decoradas sem a necessidade de pintar as peças a mão” (SCHÁVELZON, 1991, p.38),.
Isso incentivou a produção em massa e impulsionou a importação, inclusive para a
América. É importante mencionar que a arte vinculada à manufatura foi uma das
principais características da revolução do consumo permitindo a ampliação dos
conceitos da moda e da identidade dos grupos sociais.

4. Evidências arqueológicas na propriedade rural da família Simonetti

O desenvolvimento tecnológico no processo de produção da faiança fina


permitiu que houvesse um aumento na produção, no consumo e na sua distribuição por
diferentes lugares do mundo veiculando os hábitos e os valores europeus que foram
associados à cultura material. Conforme Rede (1996) não se trata, entretanto, apenas de
um fator de propensão exclusivamente tecnológico: a tecnologia é definida claramente
como fenômeno cultural, como incorporação física da ordem social. Isto ocorreu
inclusive na fronteira do Brasil com Argentina e Uruguai como indicam os dados
arqueológicos estudados e descritos neste capítulo provocando o consumo em massa e a
mundialização. Desse modo, será realizada na sequência, uma explanação sobre a coleta
dos dados arqueológicos e trabalho de campo realizado na Estância São Roque em
Uruguaiana no outono de 2007.
Esta propriedade que outrora pertenceu ao General Bento Martins de Meneses5
conhecido como Barão de Ijuí foi, a um passado não muito distante, parte de uma

5
Bento Martins de Meneses (1818 – 1881).

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sesmaria situada na fronteira oeste da província. Esta se achava contornada pelos rios
Touro Passo, Imbaá e Uruguai espaço que em nossa época ainda é sustentado pelas
práticas agrícolas e pastoris, principais fatores econômicos da região. O referido local,
atualmente desmembrado em estâncias, nas quais se situam duas propriedades de
pertencimento da família Simonetti foi sobrevindo às gerações do mencionado General
Bento Martins que, além disso, foi um dos principais agentes do exército do império
brasileiro durante a Guerra do Paraguai, um marco na história regional da fronteira oeste
com sólidos episódios marcados na história de Uruguaiana.
Em depoimento dado por Quintino José Simonetti atual proprietário da Estância
Florão em Uruguaiana, cita-se que, antigamente o local onde se encontra a estância era
composto por dezoito quadras de sesmarias, ou seja, cerca de 118.800 m² de terras
usadas na criação do gado vacum antes mesmo de ter pertencido ao General Bento
Martins de Meneses.
Além disso, de acordo com o senhor Simonetti, as referidas terras teriam sido
adquiridas tornando-se propriedade de sua família no ano de 1982, após mudar-se para a
fronteira oeste migrando da região central do Estado, mais precisamente, da cidade de
Dona Francisca. Atualmente, a dimensão da propriedade está composta por 394 hectares
de terras próprias e mais um arrendamento de 300 hectares perfazendo uma área com o
total de 6,94 km² utilizados na prática da pecuária e da agricultura.
Próximo à Estância Florão está situada a Estância São Roque de propriedade de
Elio João Simonetti. Estas terras também eram parte da antiga posse do General Bento
Martins de Menezes inteirando uma única propriedade. Conforme o relato do senhor
Elio Simonetti a atual dimensão da sua propriedade é de 287 hectares, ou seja, 2,87 km²
onde também são desenvolvidas as práticas agrícolas e pastoris.
Observando o contexto histórico e arqueológico do local é possível afirmar que
no passado existiram sofisticadas relações comerciais e, estas envolveram de algum
modo, os grupos que ali coexistiram combinados ao modelo econômico do século XIX.
Em local muito próximo à estância era localizada outrora a Estação Férrea Touro Passo,
sendo que esta, no passado, significou um marco espacial compondo um trecho de
trilhos que interligava municípios e distintas localidades da fronteira oeste.
A estrada de ferro foi implantada pela BGS (The Brazil Great Southern Railway
Co.) e passando próximo ao local estudado estendia-se uma linha que havia sido

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fundada no ano de 1887 e ligava Uruguaiana a Barra do Quarai. No ano de 1888 foi
inaugurada a linha que ligava Uruguaiana a Itaqui e, posteriormente, no ano de 1913 foi
concluído o trecho que ligava Uruguaiana a São Borja. Toda a extensão da estrada de
ferro estava muito próxima à fronteira desenhada pelo Rio Uruguai e mantinha
assegurada toda uma conjuntura de expansão capitalista, progresso econômico e
comércio desenvolvidos, especialmente por europeus ou seus descendentes que se
achavam presentes na região no século XIX.
Contudo, fica muito evidente que este contexto espacial, “a estância”, está
perpetrado de sucessivos povoamentos que deixaram significativas marcas
socioculturais atualmente achadas tanto nos vestígios arqueológicos, como também,
estampadas ainda em alguns traços etnológicos da sociedade da fronteira. Os
remanescentes arqueológicos localizados e estudados nesta pesquisa, principalmente a
faiança, foram coletados durante um processo de escavação desenvolvido na Estância
São Roque propriedade de Elio João Simonetti.
O sítio arqueológico apresentava características estruturais comuns a uma
ocupação do período final do século XIX ou início do século XX incluindo-se a um
contexto de comércio e contrabando estabelecido em Uruguaiana e próximo aos rios
Uruguai e Touro Passo. A dimensão total da estrutura encontrada no local, visivelmente
uma residência, permanecia de difícil compreensão, pois o local já havia sofrido
diversas intervenções de ocupação, estas advindas principalmente, à prática da criação
de gado e da agricultura. Inclusive, o que havia sobrado da estrutura foi achado quando
o proprietário da Estância São Roque preparava uma porção de terras para mais uma
prática de cultivo, determinando assim, a futura identificação do sítio arqueológico
pelos pesquisadores.
Supõe-se que a estrutura encontrada era semelhante à outra ainda conservada e
situada a poucos metros do local. Considera-se importante mencionar que havia também
muito próximo do local uma antiga cerca de pedras evidenciando assim, um grande
contexto de ocupação para a interpretação da arqueologia histórica.
Durante a pesquisa arqueológica foram coletados no entorno da estrutura
escavada, além de fragmentos de telhas, grés e cravos de metal, alguns fragmentos de
vidros, principalmente gargalos de garrafas. Alguns destes fragmentos possuindo
colorações escuras e apresentando bolhas de ar formadas durante o processo de

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fabricação o que evidencia uma datação mais antiga para os vidros cabendo à transição
do século XIX para o século XX, outros pedaços, em menor número, eram mais
recentes. Um fragmento de vidro apresenta a inscrição: Fratelli Branca Milano,
reportando-se a uma garrafa de bebida destilada advinda da Itália provavelmente da
última década do XIX ou da primeira década do século XX. Esta bebida era
amplamente comercializada na época em grandes centros de comércio sul-americanos,
como por exemplo, as cidades de Buenos Aires e Montevidéu as quais Uruguaiana
manteve afinidades comerciais concretas durante todo o período analisado.
Foram encontrados, além disso, múltiplos fragmentos de faiança fina com
esmalte quase homogeneamente whiteware, alguns, embora muito poucos, possuindo o
selo do fabricante com a inscrição Royal Ironstone China na parte superior do brasão e
Alfred Meakin. Ltd. England na parte inferior. Outros fragmentos tinham indícios da
inscrição Royal Patent Ironstone na parte superior do brasão e George Jones & Sons.
England na parte inferior. Esta indústria teve o início da sua produção, a partir do ano
de 1873 na Inglaterra.
Acharam-se também no sítio, evidências materiais de louças mais recentes,
apontando uma sobreposição de ocupações no mesmo local. Entre os padrões
decorativos das faianças encontradas no sítio arqueológico é razoável destacar os
seguintes modelos: superfície modificada como trigal e pintada sobre superfície
modificada, como por exemplo, o padrão Shell Edged com início de produção a partir
de 1780. Além disso, outros modelos como, por exemplo: faixas e frisos, motivos
florais pintados à mão, transfer printing e estilo chinoiserie inspirado em cenas orientais
com o início de sua produção aproximadamente em 1816.

5. Vestígios arqueológicos no centro de Uruguaiana

Como já mencionado, Uruguaiana foi inclusa a dois contextos que se


completavam e estabeleciam relações: a cidade e a estância. Isto possibilitou que
houvesse um interessante processo de movimento e trocas nos hábitos e significados
culturais durante o desenvolvimento urbano no final do século XIX e início do século
XX. Estes contextos compuseram grande parte da identidade social e permitiram um

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crescimento econômico que, além de ser combinado e alcançado nas casas de comércio
da cidade era ainda obtido pela elite estancieira com a produtividade rural.
De tal modo, buscou-se a relação histórica entre cidade e estância perfazendo,
portanto, a ligação de dois contextos arqueológicos, dois sítios escavados, um no espaço
rural e outro no espaço urbano. Assim, apresenta-se uma paisagem sociocultural
combinada e peculiar, ainda muito característica da Fronteira Oeste do Rio Grande do
Sul.
A cultura material encontra-se inserida em um contexto repleto de relações
humanas formadas pela cidade. De acordo com Tocchetto:

Além de cenário coletivo, a cidade é também personagem, pois as pessoas,


além de nela viverem, se relacionam e vivem através dela (VERÍSSIMO et
al., 2001), intervindo no desenvolvimento de fenômenos sociais e para onde
convergem processos de diferentes ordens (OLIVEN,1985). É uma entidade
dinâmica e complexa, que se revela na diversidade das formas e relações
socioculturais, configurando-se enquanto lugar e veículo das expressões e
representações dos diferentes grupos humanos que nela vivem.
(TOCCHETTO, 2010, p. 16).

Portanto, para tornar possível a realização do estudo arqueológico no centro da


cidade de Uruguaiana e encontrar vestígios do consumo de faianças pela sociedade de
outrora, assim como no sítio localizado na estância, foi necessário primeiro delimitar
uma área a ser pesquisada. Para isso, definiu-se o centro de Uruguaiana por,
historicamente, possuir um conjunto de habitações antigas e havendo neste caso,
estruturas que possuíam padrões arquitetônicos característicos ao período estudado, a
transição do século XIX para o século XX, momento de importante expansão urbana.
No modelo arquitetônico dessas residências foi oportuna a clara presença da cultura
europeia, tanto nos padrões de decoração e, além disso, nos lineamentos físicos como,
por exemplo, as grandes aberturas frontais, os tipos de telhas e, consequentemente, o
posicionamento das habitações no alinhamento dos passeios públicos da cidade.
Atualmente há um grande número de estruturas arquitetônicas no centro de
Uruguaiana que possuem tais características, embora muitas dessas estruturas tenham
recebido modificações relacionadas às reformas para a moradia ou para o atual
comércio. Este último tem sido o principal agente motivador na transformação das
fachadas das antigas residências em Uruguaiana. Alguns prédios também são

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demolidos, o que inevitavelmente resoluta na perda e no esquecimento do patrimônio
histórico da cidade.
Este, a despeito da modernidade, ainda carrega quaisquer resíduos de uma época
possuidora de arquitetura bela e nobre, embora esta seja de tal modo, herança de uma
visível dependência cultural advinda da Europa. Segundo Weimer:

Desde sua constituição como países independentes, as nações latino-


americanas vêm apresentando grandes dificuldades em se libertar da
condição colonial. Mesmo que a maioria destes países já esteja se
aproximando do segundo centenário de sua administração autônoma, a
condição de países periféricos aos grandes centros econômicos mundiais
fomentou o desenvolvimento também dependente destes mesmos centros.
Isso vale para a cultura em geral e para a arquitetura em particular.
(WEIMER, 2002, p. 13).

Por combinarem-se corretamente aos citados padrões estabelecidos pelo modelo


arquitetônico e pelo contexto histórico a que pertenciam alguns dos remanescentes
materiais observados, a pesquisa arqueológica foi desenvolvida na área urbana e
realizada em uma habitação privada. O terreno onde esta se encontra possui a medição
de 22 metros de frente e 76 metros de comprimento. Este imóvel foi encontrado no
registro municipal de Uruguaiana no nome de Leopoldina Ranquetat Schmidt
6
(sucessores) localizado na Rua João Manoel, 2611, centro de Uruguaiana.
Portanto, percebe-se um contexto arqueológico onde foi corretamente plausível
relacionar a habitação com outros diversos aspectos materiais encontrados dispersos no
mesmo local estudado como, por exemplo, fragmentos de faianças, vidros, grés e telhas
que se encontravam dispersos pela extensão do terreno. Também foi possível perceber
que algumas das telhas da habitação teriam sido substituídas de modo recente por
modelos com fabricações contemporâneas por já estarem bem danificadas por exposição
ao tempo fazendo com que as antigas fossem depositadas no mesmo local achando-se
dispersas nos limites da área pesquisada. Desse modo, foi possível evidenciar-se o
contexto arqueológico do local.
De acordo com Schiffer, “com o descarte os itens materiais deixam de fazer
parte do contexto sistêmico, relacionado ao seu ciclo de vida dentro de um sistema
cultural e passam para o contexto arqueológico, tornando-se objetos de investigação do
arqueólogo” (SCHIFFER, Apud, SYMANSKI, 1998, p. 125). Assim, realizou-se a
6
O estudo do espaço residencial foi permitido pela Sra. Nara, atual moradora da casa.

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primeira intervenção no local estudado, incidindo apenas em uma coleta superficial do
material. Este material versava os fragmentos dispersos por toda extensão do pátio da
residência localizado na parte de trás da estrutura arquitetônica onde se realizou a coleta
das evidências arqueológicas.
Levaram-se em consideração as condições adversas em que se encontrava o
solo. A ausência de níveis estratigráficos foi evidente, pois a perturbação do solo foi
constantemente repetida devido às práticas de jardinagem e cultivo de hortaliças,
acúmulo de vegetações e recente depósito aleatório de objetos ou descarte de lixo.
Considera-se que, até o século passado, havia ali uma lixeira de uso doméstico e
particular para o descarte de materiais não mais úteis, mas a mesma havia sofrido
intervenções posteriores devido às problemáticas citadas acima. Isto causou ainda a
dispersão dos indícios arqueológicos pelo terreno, reduzindo-se assim, as possibilidades
de uma melhor análise comparativa do mesmo com relação ao grupo familiar que o
fizera uso e, logo após, o descartou como lixo doméstico, pois assim, foram causados
danos no contexto do sítio.
No desenvolvimento do trabalho arqueológico realizou-se a abertura de um poço
teste com a medição de 2m². Deste local foram retirados alguns fragmentos de faiança
fina, vidros e metais em decomposição. Contudo, durante a pesquisa de campo coletou-
se na residência um importante conjunto de fragmentos de louças com os seguintes
padrões decorativos: Faixas e frisos, Willow, azul borrão, Cut Sponge entre frisos
coloridos e Spatter. Além disso, recolheram-se fragmentos de faianças com o padrão
trigal de superfície modificada.
Seguindo o mesmo modo de análise das faianças adaptado e apresentado por
Tocchetto (2001), desenvolveu-se esta pesquisa estudando e catalogando inicialmente,
os fragmentos de cerâmica coletados em ambos os sítios arqueológicos pesquisados na
cidade de Uruguaiana. Conforme a metodologia, os materiais foram analisados de
acordo com: cor, padrão decorativo, modelo, selo do fabricante se impresso na peça,
motivo decorativo, cena ou paisagem posta na cerâmica, variações decorativas em uma
única peça e estilo.
Estes fragmentos são evidências materiais que resistiram as desventuras e
mistérios do tempo sob os curiosos, às vezes, confusos, mas quase sempre seguros
arquivos do solo, sendo hoje, reveladores da vida social de pessoas e coisas.

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Ao realizar o cruzamento dos dados arqueológicos obtidos nos processos de
escavação dos sítios de Uruguaiana ficou evidente que em ambos os contextos “cidade”
e “estância” o consumo da louça era idêntico. Os mesmos padrões de definição das
mercadorias como, por exemplo, tipo de pasta, esmalte e decoração estavam mantidos
nos dois sítios estudados. Existem talvez dois motivos que possam esclarecer a relação
dos contextos arqueológicos.
O primeiro deles é que a louça, caracterizando-se como uma mercadoria foi
inserida em um processo de comercialização na fronteira e este abrangeu tanto a cidade
como o campo, pois estes dois elementos foram economicamente amarrados um ao
outro. No entanto, os novos hábitos sociais da fronteira não extinguiram os costumes do
cotidiano rural, ao contrário disso, as práticas urbanas e rurais coexistiram e a faiança
esteve disponível em ambos os lados. Em segundo, este processo quando observado
antropologicamente deixa evidente que houve não somente um consumo usual de coisas
materiais e vazias de significados, mas bem mais que isso, houve um consumo de
importâncias sociais. Estas estavam configuradas em moldes culturais europeus e
estabelecidas em um amplo espaço social, a fronteira.
É importante registrar que a faiança e os demais objetos que adentraram esta
zona comercial são entendidos neste trabalho como mercadorias, e atendem desse
modo, a uma definição marxista para o termo. Sob a análise de Appadurai, “mercadorias
são, em geral, vistas como típicas representações materiais do modo de produção
capitalista, mesmo quando classificadas como triviais, e seu contexto capitalista como
incipiente” (APPADURAI, 2010, p. 20). Aliás, não haveria de ser somente uma
indústria que iria agenciar o modelo social vigente na fronteira, como por exemplo, o
caso dos saladeiros, pois a sociedade também foi influenciada pelos aspectos capitalistas
contidos nos produtos importados que circulassem na região.
O antropólogo Arjun Appadurai em seu livro A vida social das coisas: as
mercadorias sob uma perspectiva cultural ainda faz referência ao desenvolvimento do
pensamento de Karl Marx a respeito do que se entende por mercadorias. Este
pensamento de Marx se faz importante neste contexto e requer ser citado logo abaixo na
íntegra. De acordo com Appadurai:

Contudo, nos textos do próprio Marx, pode-se encontrar a base para uma
abordagem das mercadorias muito mais abrangente e profícua de um ponto

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de vista intercultural e histórico, cujo espírito se vai atenuando, à medida que
ele passa a estar envolvido nos detalhes de sua análise do capitalismo
industrial do século XIX. De acordo com esta primeira formulação, para
produzir mercadorias, em vez de meros produtos, um homem tem de produzir
valores de uso para outros, valores de uso sociais. (APPADURAI, 2010, p.
21).

Assim, é possível compreender que os fragmentos achados nos contextos


arqueológicos fizeram parte de um singular processo que alentou os hábitos de consumo
da sociedade na fronteira. Uruguaiana nascida às margens do Rio Uruguai foi marcada,
desde o início da sua trajetória, pela forte presença do comércio o qual forneceu
subsídios econômicos, políticos e sociais ao Rio Grande do Sul e ao Brasil em
diferentes períodos da história.

6. O comércio

O Rio Grande do Sul permaneceu durante todo o período histórico estudado


entre os estados brasileiros que mais realizou importações. Conforme o relatório
apresentado à presidência do Rio Grande do Sul em 03 de setembro de 1909 em Porto
Alegre nota-se que entre os anos de 1906 e 1908 o Rio Grande do Sul ocupava o
terceiro lugar no índice de importações seguindo atrás do Rio de Janeiro e São Paulo.
No Rio Grande do Sul a principal movimentação portuária sucedeu-se em Porto Alegre,
Rio Grande e Uruguaiana.
A chegada e a saída de produtos via porto estabelecido no rio Uruguai no final
do século dezenove possibilitou o desenvolvimento social e econômico de Uruguaiana e
a proximidade com as cidades de Buenos Aires na Argentina e Montevidéu no Uruguai
que estabeleceram relações comerciais bem diversificadas. Mercadorias europeias
entravam no Rio Grande do Sul pelo porto do rio Uruguai em Uruguaiana, e este, por
ser amplo e localizado em um local privilegiado era considerado um ponto de ligação
com a Europa. A imagem abaixo mostra a localização do porto de Uruguaiana e demais
portos localizados na fronteira.
Uruguaiana nascida às margens do Rio Uruguai foi marcada desde o início da
sua trajetória pela forte presença do comércio o qual forneceu subsídios econômicos,
políticos e sociais ao Rio Grande do Sul e ao Brasil em diferentes períodos da história.
Por meio do comércio, múltiplos objetos sempre carregados de valores e significados

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foram expandidos mundo a fora ou foram trazidos à cidade. Através do consumo estes
produtos receberam novas representações e passaram a compor também a identidade, a
cultura e os relacionamentos daquela sociedade.
O desenvolvimento do comércio, das importações e do contrabando (o qual faz
parte também do imaginário da fronteira) sob os moldes do alargamento capitalista
dirigido por viajantes e comerciantes europeus e por aqueles que estabeleceram no
espaço fronteiriço a estrada de ferro, os saladeiros, as casas importadoras, as livrarias,
os jornais, os teatros, os bares e a movimentação comercial dos portos do Rio Uruguai
foram importantes agentes que promoveram o desenvolvimento urbano e a sociocultural
em Uruguaiana e nas demais cidades da fronteira.
A chegada e a saída de produtos via porto para várias partes do mundo favoreceu
e impulsionou o crescimento econômico da cidade de Uruguaiana a partir do final do
século XIX. O comércio era cada vez mais adiantado e a cidade que foi desenvolvida
muito próxima ao porto do rio Uruguai de frente para a vizinha cidade argentina de Paso
de Los Libres começou a crescer também aos arredores da sua praça central marcando a
presença dos estancieiros que passaram a comprar ou construir bens imóveis no centro
da cidade. Segundo o historiador Urbano Lago Villela, entre 1890 e 1900, Uruguaiana
possuía uma importante relação comercial com a Europa via Buenos Aires e
Montevideo (VILLELA, 1971).
Conforme Colvero, a navegabilidade do rio Uruguai se confirma nas análises
dos relatórios presidenciais do Rio Grande do Sul apresentados pelo autor em sua obra
Negócios na Madrugada: o comércio ilícito na fronteira do Rio Grande do Sul. Estes
documentos mostram as quantidades de produtos importados e exportados através dos
principais portos da fronteira oeste do Rio Grande do Sul no período que vai de 1850 a
1881. Destaque para o movimento do porto de Uruguaiana (COLVERO, 2004).
De acordo com as tabelas publicadas pelo autor entre os anos de 1851 e 1852
atracaram no porto de Uruguaiana 90 navios carregados de 296 toneladas de
mercadorias e partiram do porto 70 navios carregados de 326 toneladas. Entre os anos
de 1854 e 1855 o número de navios que atracaram no porto subiu para 188 e estes
estavam carregados com 826 toneladas de produtos (COLVERO, 2004).
Entre os anos de 1855 e 1856 o número de navios que atracaram em Uruguaiana
subiu ainda mais chegando ao número de 320 embarcações que continham 2.200

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toneladas de mercadorias. Entre os anos de 1857 e 1858 o porto de Uruguaiana alcança
o número de 401 navios atracados e carregados com mais de 2.381 toneladas de
produtos sendo que entre estes mesmos anos partiram de Uruguaiana 401 navios que
carregavam mais de 2.936 toneladas de mercadorias.
Conforme a tabela de valores apresentada por Colvero, com informações sobre
os relatórios apresentados pelos presidentes da província do Rio Grande do Sul à
Assembleia Provincial no período que vai de 1850 a 1881 as importações realizadas
pela alfândega de Uruguaiana com procedência do Rio da Prata somaram um total de
5:118:938$000 fazendo do porto de Uruguaiana o que mais recebeu importações dentre
os portos da fronteira no período. Sabe-se que estas importações continham uma enorme
quantidade de produtos europeus que eram antes destinados a Buenos Aires ou
Montevidéu (COLVERO, 2004).
No início do século XX a movimentação do porto de Uruguaiana não superava a
dos portos de Porto Alegre e Rio Grande, mas permanecia sendo a maior entre os portos
da fronteira. De acordo com o relatório apresentado à presidência do Rio Grande do Sul
no ano de 1909 registrou-se no porto de Uruguaiana a chegada de 100 embarcações a
vapor e a entrada de 13.029 toneladas de mercadorias importadas. No mesmo ano
registrou-se no porto a chegada de 528 embarcações a vela e a entrada de 3.329
toneladas de mercadorias importadas. Uruguaiana destacou-se também nas exportações
e arrecadação de impostos. Segundo relatório apresentado à presidência do Rio Grande
do Sul no ano de 1902 o imposto sobre o gado exportado alcançou a importância de
52:671$000.
A importação e contrabando de mercadorias europeias entre as quais estão os
produtos em faiança fina que aparecem em destaque nos sítios arqueológicos estudados,
assim como, bebidas ou artigos para o vestuário foram objetos que não só ilustraram o
cotidiano de Uruguaiana, mas também foram signos de status social e representaram
grupos sociais que buscavam alcançar um modo de vida “europeizado”. Isso não está
presente somente no ato de consumir cultura material, mas também na mudança de
hábitos como o estudo da música e do idioma francês.
No final do século XIX e início do século XX as casas importadoras foram
muito frequentadas pelos uruguaianenses. Estes estabelecimentos vendiam produtos
importados da Europa e outros artigos importados da Argentina e também do Uruguai.

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Entre as mercadorias comercializadas estava uma variedade de: produtos farmacêuticos,
vinhos, licores, champagne, fernet, vermouth, Bitter Secrestat, queijos, azeitonas,
conservas, picles, azeites, frutas secas, fumos, cigarros, tecidos, metais e vários tipos
louças. O contrabando facilitava o acesso aos produtos importados, pois tornava o seu
preço mais acessível aos consumidores brasileiros. Anúncios de importados e
estabelecimentos comerciais eram feitos nos jornais que circulavam em Uruguaiana
naquela época, como por exemplo, os jornais “A Notícia” e “A Nação”. Alguns
exemplares destes jornais foram pesquisados e fotografados no arquivo histórico de
Uruguaiana, os mesmos pertencentes aos anos de 1899 a 1912. A seguir, alguns dos
anúncios feitos pelas casas importadoras, referências comerciais em Uruguaiana no final
do século XIX e início do século XX.

Figura 2: Anúncio da casa importadora Teixeira e Macchiavello no jornal “A Nação”.


Uruguaiana, 1° de janeiro de 1912.

Fonte: Arquivo municipal de Uruguaiana.

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Figura 3: Anúncio da casa importadora Anthero A. de Vasconcellos no jornal “A
Notícia”. Este anúncio menciona que a importação é realizada direta da Europa.
Uruguaiana, 22 de outubro de 1902.

Fonte: Arquivo municipal de Uruguaiana.

A faiança escavada nos sítios arqueológicos estudados está combinada também


ao tipo de alimentação que pode ser percebido nos anúncios feitos nos jornais da época
em Uruguaiana. Associado ao consumo da cultura material está muito claro o consumo
de diversas substâncias, alimentos líquidos, sólidos ou pastosos. Tudo isto compõe um
universo de rituais realizados pela sociedade onde os objetos estão perfeitamente
associados aos hábitos, à alimentação, à moda e às estruturas que se encontram em um
determinado espaço.
Alguns dos fragmentos de faiança correspondem a pratos e xícaras e outros a
malgas ou tigelas. Fragmentos de xícaras encontrados nos sítios arqueológicos indicam
o consumo de bebidas quentes como, por exemplo, o café, já que este recebia também
anúncios nos jornais da cidade no início do século XX. Malgas ou tigelas indicam que
havia um tipo de alimentação baseada em alimentos pastosos ou líquidos como mingaus
ou ensopados muito característicos na região da fronteira, principalmente, no inverno
por serem consumidos a uma temperatura mais elevada “ajudando a aquecer o gaúcho
do pampa”. É importante perceber que alguns produtos importados não somente irão
desencadear hábitos novos na alimentação, além disso, vão ser adaptados aos costumes

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regionais permitindo assim a adequação de novos significados. Isso foi muito frequente
em Uruguaiana, pois como já relatado, coexistem em um mesmo espaço práticas
urbanas e rurais. A imagem a seguir mostra um anúncio de café em Uruguaiana no ano
de 1912. Segundo Souza:

O consumo do café e o hábito de tomá-lo nas e entre as refeições está


associado, fulcralmente, à expansão ultramarina europeia, uma vez que a
prática data do século XV islâmico. O café se propagou do Oriente ao
Ocidente prestando-se às demandas mercantilistas do capitalismo e
acompanhando revoluções científicas e financeiras que presidiram a
sociedade moderna, figurando como um de seus motores (SOUZA, 2010, p.
309).

Mas não foi somente o consumo do café que pertenceu aos hábitos modernos da
Uruguaiana. Outros elementos ou produtos eram relacionados e também constituíram a
moda daquela sociedade. Conforme McCracken, “a moda transforma de tal maneira os
gostos e as preferências nos dias modernos que é difícil imaginar uma economia na qual
ela não desfrutasse de total preponderância” (McCRACKEN, 2003, p. 39). Outras
bebidas também eram consumidas na Uruguaiana do final do século XIX e início do
século XX. Além, é claro, do consumo da erva mate no chimarrão de origem nativa e do
café.
O chá era também uma bebida habitual, pois carregava elementos da cultura
inglesa. Ainda mais que foram os ingleses responsáveis por muitas das obras que
valeram a estruturação da economia na fronteira, um exemplo disso são os saladeiros. O
hábito de tomar chá nasceu entre os ingleses somente no século XVIII, passando então,
a compor a cultura da Inglaterra. O consumo do chá no mundo ocidental é reflexo do
fascínio pela cultura do extremo oriente. A bebida servia para manter despertos os
monges budistas durante longos períodos de meditação. De acordo com Watts:

Há uma horrível lenda a respeito da origem do chá. Segundo ela,


Bodhidharma, certa vez, adormeceu durante suas meditações e ficou tão
furioso que cortou as pálpebras, as quais, ao caírem no chão, transformaram-
se nas primeiras plantas do chá. Desde então, a bebida feita com suas folhas
espanta o sono e purifica a alma. (WATTS, 2009, p. 115).

Além destas bebidas, algumas casas de comércio em Uruguaiana faziam também


a venda de cervejas produzidas na Província do Rio Grande do Sul, como é o caso da
cerveja Ritter Brau fabricada por Carlos Ritter e irmãos na cidade de Pelotas e vendida

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no estabelecimento comercial de Barbará e filhos. Cria-se também, na cidade, a
Cervejaria do Sol premiada pela diversidade e qualidade das bebidas, propriedade de
Antonio Mascia e fundada no ano de 1886.
Uruguaiana foi também grande produtora de vinhos. De acordo com o Catálogo
da Exposição Estadual de 1901 no Rio Grade do Sul foram expostos no evento diversos
vinhos produzidos em Uruguaiana no final do século dezenove. O fabricante Domingos
Tellechea estabelecido com fábrica de vinhos em 1886, conforme as informações do
catálogo obteve no ano de 1898 uma produção que chegou a 19.000 litros de vinho,
sendo as suas videiras importadas do Uruguai. O mesmo fabricante expôs naquela
ocasião três garrafas de vinho tinto de 1895, duas garrafas de vinho branco de 1898 e
três garrafas de vinho produzidos com a uva Lord Arriague pertencente à colheita de
1900.
Também foram expostos os vinhos dos fabricantes Luiz Bettinelle e Prates
produtores desde 1895 em Uruguaiana. Os mesmos apresentaram onze garrafas de
vinho tinto chamado “A favorita Imbahá” do ano de 1900. O expositor José Tellechea
fabricante de vinhos em 1887 obteve em 1898 uma produção de 20.000 litros de vinho e
levou a exposição doze garrafas de vinho tinto de 1900 com o nome de “Granja
Astigarraga” e doze garrafas de aguardente de uva com o nome de “Grapa” também
produzida em 1900.
Ainda segundo dados contidos no Catálogo da Exposição Estadual de 1901
verifica-se o fabricante Francisco Guglielmone, este dando início a sua produção de
vinho em 1892 e alcançando em 1898 a média de 30.000 litros de vinho produzidos. O
mesmo expôs, naquela ocasião, vinte e duas garrafas de vinho nacional tinto de 1899. O
vinho tinto produzido por Francisco Guglielmone e Domingos Tellechea foi premiado
de acordo com a sua qualidade e recebeu, portanto a medalha de ouro na Exposição
Estadual de 1901.
Além dos vinhos também fizeram parte da exposição outros artigos produzidos
em Uruguaiana como cervejas e licores, a exemplo da fábrica de Antonio Mascia citada
anteriormente e premiado com menção honrosa na Exposição Estadual de 1901 pela
qualidade da sua cerveja. Estas bebidas compuseram os hábitos da sociedade no final do
século XIX e também transportavam significados. Segundo Veblen, “a embriaguez e o
consumo de bebidas alcoólicas podem ser honoríficas entre os homens, pois também

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simbolizam status e provam a capacidade econômica de consumi-las” (VEBLEN, 1983,
p.36).
É importante pensar que, por advento das importações feitas especialmente
devido ao porto do Rio Uruguai e também do contrabando existente na época, que o
comércio no centro de Uruguaiana sempre influenciado pela moda europeia passou a se
desenvolver cada vez mais conquistando uma clientela disposta a pagar caro pelas suas
mercadorias. Isto porque as tais mercadorias somavam diversos valores que iam além
do custo econômico dos produtos. O mais importante eram os valores sociais das
mercadorias, até mesmo, a vida social das mesmas (Appadurai, 2010), o valor simbólico
dos bens (Bourdieu, 1984), de modo que o consumo seja percebido como parte de um
fenômeno cultural agindo sobre aquela sociedade (Douglas, 1979).
O consumo permitiu a combinação de objetos, roupas e acessórios e isso
provocou o aparecimento de mais casas especializadas na moda em Uruguaiana. Além
de estabelecimentos comerciais voltados ao público masculino houve, principalmente,
aqueles que buscavam atender a expectativa feminina como lojas de roupas, sapatos,
chapéus e também as farmácias que vendiam além dos medicamentos e elixires os mais
diversos produtos que prometiam mocidade e beleza às mulheres da época. Além disso,
algumas farmácias anunciavam possuir farmacêutico com experiência na América e na
Europa. Estes anúncios colocados nos jornais da época mostram a grande influência
recebida da Europa.
De fato, é importante salientar também o aumento das livrarias e o
desenvolvimento da imprensa, os jornais que circulavam na cidade, além de informarem
sobre fatos locais, regionais e nacionais noticiavam os acontecimentos do mundo,
principalmente de países como: Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile, Estados Unidos,
Inglaterra, França, Alemanha, Itália, Espanha e Portugal. Assim, os estrangeiros que
viviam em Uruguaiana poderiam também manter-se informados sobre os seus países de
origem.
No início do século XX Uruguaiana possuía um bom número de comerciantes,
engenheiros, médicos, farmacêuticos, dentistas, advogados, professores e artistas. A
música e a arte em geral foram muito valorizadas e companhias teatrais tinham peças
em cartaz no teatro Carlos Gomes. A educação estava sendo valorizada e muito
desejada, sobretudo pela elite local. Chegavam à cidade, às vezes estrangeiros,

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professores de línguas, música e pintura, assim como foram inauguradas na cidade
importantes instituições de ensino.

7. Considerações finais

Ao escrever sobre Uruguaiana aspirou-se uma investigação histórica e a


ampliação dos estudos que interpretam a identidade social e o patrimônio cultural da
fronteira oeste. Compreender o passado histórico de Uruguaiana associado a cultura
material e seus significados foi importante, pois, elucidou sobre o comportamento da
sociedade uruguaianense a partir do final do século XIX. Portanto, acredita-se que
foram reveladas através deste estudo importantes informações históricas sobre
Uruguaiana e sobre a Fronteira Oeste. Não se expõem aqui sentimentos de
pertencimento a lugar algum, apenas ressalta-se a sensação do dever cumprido, pois o
conhecimento nos faz responsáveis e o conhecimento histórico nos faz responsáveis
pela preservação do patrimônio cultural e pela educação nas salas de aula.
Compreender a identidade da sociedade contemporânea envolve a percepção e
estudo de todo um contexto de relações sociais que podem ser criadas por meio de
conjunturas políticas ou econômicas como, por exemplo, o caso do contrabando de
mercadorias na fronteira oeste ou o consumo da faiança fina em Uruguaiana no final do
século XIX e início do século XX. A construção da identidade atravessa os estágios do
pensamento e incorpora meios materiais tornando-os importantes representações
sociais.
O consumo pode ser além de prático e indispensável, uma ação simbólica que
divulga a identidade de um grupo social. Conforme Silva, “tanto para a antropologia
quanto para a psicologia, a identidade é um sistema de representações que permite a
construção do “eu”, ou seja, que permite que o indivíduo se torne semelhante a si
mesmo e diferente dos outros” (SILVA, 2009, p. 202).
Assim, conclui-se que a identidade dos grupos sociais está associada ao
consumo. A cultura material não apenas representa, mas, além disso, intervém na
formação social e cultural dos indivíduos.

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