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Elizabeth Oldfield – Too far,too fast

Renascer em Hong-Kong
Elizabeth Oldfield
Sabrina 363

Impossível esquecer Hogan. Com ele Leilah havia


conhecido o paraíso.
Um papel que Leilah não desempenharia mais: o de
amante de Hogan Whitney.
Hong-Kong, palco de aventuras e cenários
deslumbrantes, onde os sonhos podem se tornar realidade.
Nessa cidade bela e misteriosa Leilah reencontrou o homem
que havia amado tanto no passado e com quem vivera dias de
encantamento e noites de paixão intensa.
Hogan Whitney a havia subjugado com seu mágico poder
de atração, conquistando seu corpo e seu coração
irremediavelmente. Mas agora Leilah não o queria mais. O
caso entre ambos estava encerrado. Para sempre!

Copyright: Elizabeth Oldfield


Título original: "Too Far, Too Fast"
Publicado originalmente em 1984 pela Mills & Boon Ltd.,
Londres, Inglaterra
Tradução: Rilda Machado Lorch
Copyright para a língua portuguesa: 1985 Abril S.A.
Digitalização e revisão: Márcia Goto

Sabrina 363
Elizabeth Oldfield – Too far,too fast

Capítulo I

— Hogan é uma verdadeira mina de ouro — berrou Saul


ao telefone, e Leilah estremeceu com a voz possante e
estridente de seu chefe. — E, quando eu digo mina, é mina
mesmo!
Leilah suspirou, tentando permanecer calma. Cada
telefonema internacional de Saul era um verdadeiro tumulto.
Sempre entusiasmadíssimo, ele berrava sem parar. Sua voz
saía de Nova York e chegava a Hong-Kong alguns decibéis
mais alta do que seria desejável para os ouvidos sensíveis de
Leilah, que esperava pacientemente sua vez de falar.
— Sei que Hogan tem feito sucesso comercializando
produtos — comentou ela com uma ponta de ironia. Mas, como
sensibilidade não fosse o forte de Saul, ele tomou p comentário
a sério.
— Enfatizar o fascínio de playboy que ele exerce foi um
golpe de mestre da nossa parte, não acha? As mulheres vivem
atrás de Hogan!
— Eu diria que você não precisou "enfatizar" demais. —
Desta vez a ironia era evidente. — Ele sempre foi um belo tipo:
alto, forte, moreno e com um olhar morno, melancólico, de
garotão abandonado, que atrai qualquer mulher. Aliás, pelo
que sei, sua vida amorosa é bastante movimentada. Os jornais
não deixam escapar um só caso.
Surdo ao sarcasmo, Saul trovejou, do outro lado da linha:
— Estamos lidando muito bem com a imagem. As vendas
têm subido bastante graças à competência da Spencer
Associates!
Leilah sorriu. Aquilo era próprio de Saul: ele sempre
queria deixar muito clara sua participação em qualquer
empreendimento de sucesso. E o caso Hogan era, sem dúvida,
o seu preferido.
Ela afastou do rosto uma mecha dos cabelos castanhos, e
pensou, com um certo alívio, que não tinha nada a ver com
aquilo. Como chefe da filial do Sudoeste Asiático da Saul
Spencer Associates, uma firma de relações públicas, Leilah não
pertencia ao mundo de Hogan Whitney, cujas preferências
recaíam sobre a Europa e os Estados Unidos. Infelizmente o
destino, pelas mãos de Saul, tinha decretado que Hogan
visitasse Hong-Kong. Leilah não estava nada animada com a

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perspectiva. Recepcionar playboys internacionais não era o
seu forte. Aborrecida, franziu a testa, inclinando-se sobre a
escrivaninha e examinando alguns papéis.
— Parece que ele tem uma lista infindável de
patrocinadores. De relógios esportivos a carros de corrida. É
uma loucura, não?
— Só em anúncios o cara ganha meio milhão de dólares
por ano! Ele já foi o ás do tênis, mas hoje em dia ganha a vida
em jogos promocionais, e isso o está transformando num
milionário! E não se esqueça de que ganhamos uma boa fatia
de tudo o que ele consegue!
Leilah imaginou que os olhos de Saul deviam estar
brilhando. Sempre ficavam assim quando ele falava em
dinheiro, o deus de Saul, sua razão de viver. E pelo jeito Hogan
estava trilhando o mesmo caminho.
— Hogan ficará com você durante uma semana, Leilah.
Portanto, faça com que ele apareça em público o máximo
possível. Hogan tem um bom relacionamento com as pessoas e
em pouco tempo vai conquistar toda Hong-Kong, tenho
certeza.
— Não se preocupe com isso, Saul. Já comecei a tomar
todas as providências.
— Marque entrevistas na televisão e convoque a
imprensa — Saul continuava a falar, agitado. — Ele se dá
muito bem com os jornalistas. Ah! E não se esqueça do livro
dele sobre tênis para principiantes, que precisa de uma boa
promoção, e de um vídeo...
— Já sei, já sei. — Leilah não agüentava mais aquela
conversa. Além disso, tudo já estava explicado nas instruções
que Saul lhe enviara por escrito.
O forte dele era a organização e, embora a companhia
tivesse filiais em todo o mundo, com pessoas competentes na
direção, Saul vivia dando palpites em tudo. Leilah sabia que,
se lhe desse alguma chance, ele dirigiria sozinho todo o
espetáculo. Ansiosa, ela ajeitou a gola da blusa de tafetá lilás.
Vinha sentindo que os métodos de Saul não se afinavam com
os seus e isso a preocupava. Ele tinha um caráter ousado e
apreciava o lado espetacular da profissão. Tratava os clientes
não como seres humanos e sim como peças publicitárias cujo
único papel era render dólares. Esse tipo de atitude deixava
Leilah aflita: ela preferia lidar com produtos e salientar-lhes
as vantagens comerciais. Achava isso mais honesto.
— Desculpe, beleza, acho que andei metendo o nariz onde
não devia — disse Saul, soltando uma de suas terríveis

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gargalhadas. — Como vão as coisas por aí com aquele sujeito,
o Sr. Tan?
— Ótimas! — Leilah agora podia se acalmar, pois pisava
em terreno firme. — A coleção de roupas esportivas fez um
grande sucesso e as primeiras encomendas já chegaram.
Tenho uma entrevista com o Sr. Tan ainda hoje. Vamos tratar
da coleção de primavera, que deverá ser exibida numa feira de
moda muito badalada: todos os monstros sagrados da alta-
costura estarão presentes. — Fez uma pequena pausa e
continuou, um pouco preocupada: — Mas o Sr. Tan está tão
encantado com os resultados de nosso trabalho na promoção
de seus produtos que agora quer tentar pôr a filha na jogada.
Jasmine é cantora de night-club e o pai a acha maravilhosa.
Mas eu tenho as minhas dúvidas. Para dizer a verdade, ela
canta fora do tom!
Saul riu, divertido.
— O Sr. Tan vale uma fortuna para nós, boneca.
Portanto, mantenha-o satisfeito e faça o que ele pede.
— Jasmine não tem nada a ver com o nosso trabalho,
Saul! — resmungou ela, tamborilando os dedos delicados no
tampo da mesa, num gesto de irritação. — Tentei explicar isso
ao Sr. Tan, mas ele insiste em que poderemos ajudá-la a fazer
carreira. Tenho pensado numa forma de fugir disso sem fazer
com que pai e filha se magoem.
— Vá levando, belezinha, vá levando. Não é assim tão
difícil, não é mesmo? Principalmente para uma profissional
correta como você. Sei que anda fazendo um belo trabalho por
aí, Leilah. Estive conversando com o gerente geral do grupo
Dinasty, e ele está maravilhado com a promoção que você fez
do Hong-Kong Dinasty Hotel. Parabéns!
Ela exultou com o elogio e pela janela apreciou a vista.
Além do Victoria Harbour ficava o continente, e em meio aos
arranha-céus de Kowloon pôde ver as torres do Dinasty Hotel
brilhando, muito brancas, contra o céu de inverno.
Automaticamente os dedos de Leilah tocaram os delicados
brincos de jade e seu pensamento voou para Glenn, o gerente
australiano do hotel. Ela suspeitara de que o jogo de anel e
brincos que recebera dele no Natal era demasiadamente caro e
se perguntava sobre o que viria em seguida. Diamantes?
Afastou Glenn da cabeça e voltou a prestar atenção em Saul,
respondendo à saraivada de perguntas sobre projetos em
andamento.
— Hogan está se esforçando para voltar às quadras,
graças a Deus — estava dizendo o chefe. — Ele é bastante

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sensato para perceber que é mais fácil promover um esportista
em plena forma do que um ex-campeão.
— Mas você não acabou de dizer que ele é uma mina de
ouro?
— Claro! Mas, se ele não voltar depressinha às quadras,
logo, ' logo vai valer pouco como apelo publicitário. Hogan
está afastado a dezoito meses da profissão e seus
patrocinadores só não o abandonam porque há uma grande
probabilidade de ele disputar o título. Todos estão ansiosos
por descobrir se ele terá condições de vencer em Wimbledon,
na próxima temporada. Se não existisse essa possibilidade,
eles já teriam pulado fora. Hogan começa a disputar o título
na primavera. Quanto mais cedo melhor, pois os
patrocinadores estão pressionando.
— E se ele não obtiver sucesso?
— Tudo que quero é que ele se coloque entre os vinte
melhores, e sei que isso é possível. Para a Spencer Associates
não interessa se ele vai ganhar o título ou não. Para mim não
faz diferença.
— Mas para Hogan deve fazer, não acha?
— Beleza, quando Wimbledon chegar nós já teremos um
belo lucro. Por que querer mais?
Leilah balançou a cabeça, desgostosa. Saul não tinha
mesmo o menor escrúpulo.
— Hogan ainda está em evidência por causa do desastre.
Aquilo foi a melhor coisa que aconteceu na vida dele.
Ela escutou pasmada essas últimas palavras. Será que
Hogan pensaria da mesma forma? O desastre de automóvel,
ocorrido há dezoito meses, deixara sérias lesões numa das
pernas do ex-campeão.
— Acho que a melhor coisa que aconteceu a ele foi poder
continuar a jogar depois do acidente. A perna foi presa por
pinos de metal, não foi?
— Isso mesmo. Ele agora é um homem biônico! — A frase
foi seguida de uma estrondosa gargalhada. Saul adorava
piadas, especialmente as que inventava. — Mas você conhece
Hogan, não é? Ele não resiste a um desafio e tem feito uma
série de jogos de exibição onde mostra que a perna não
constitui nenhum problema, beleza.
Leilah sentiu uma ponta de preocupação. Considerando
que os ossos da coxa tinham sido recuperados através de uma
cirurgia muito séria, era surpreendente a melhora de Hogan.
Leilah se perdeu tanto nesses pensamentos que mal
percebeu quando Saul desligou. Continuou sentada, mordendo

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o polegar. Era irritante perceber que depois de dezoito meses
nada havia mudado. Ela acreditara que o tempo e a distância
a tivessem ensinado a resistir ao charme devastador de
Hogan, mas se enganara. Bastou ver os cabelos negros nos
pôsteres que acompanhavam os materiais de promoção para
que seu coração batesse feito louco. Só agora Leilah percebia
que muito pouco havia mudado com sua fuga para Hong-
Kong. Na verdade, tinha a impressão de que seus sentimentos
eram exatamente os mesmos de um ano e meio atrás.
Irritada, pôs a volumosa pasta de lado. A visita de Hogan
estava programada para meados de março, dali a dois meses,
e a firma já começava a receber consultas. Ela havia sido
obrigada a se esquivar de convites de várias hostess, que
sabiam que brilhariam socialmente se tivessem o belo
campeão num de seus jantares. Era irônico, mas no momento
em que o avião de Hogan tocasse o solo de Hong-Kong, a
cidade inteira ficaria histérica, ou pelo menos sua população
européia ficaria. Muitos dos chineses nem se interessariam em
saber que um famoso tenista estava entre eles, mas Leilah já
percebera que alguns, mais ocidentalizados, eram fãs do tênis.
E certamente compareceriam às apresentações de Hogan,
comprariam seus livros, seguiriam suas recomendações
técnicas em saques e backs e pagariam um bom dinheiro para
terem o prazer de apreciar toda a sua técnica nos jogos de
exibição.
Leilah abriu a pasta e olhou para a foto de Hogan, cujos
olhos cinzentos pareciam fitá-la friamente. "Veja um campeão
em ação", dizia o anúncio. Os lábios cheios e bem-feitos dela se
apertaram; não tinha nenhuma intenção de ser seduzida de
novo. Mas. . . como escapar?
Nesse instante a porta se abriu e Violet, a secretária,
entrou carregando uma pilha de livros. Leilah olhou
desconfiada para a foto da capa: lá estava a figura atlética de
Hogan numa pose, como se fosse rebater uma bola.
— Que é isso? — perguntou.
A chinesinha colocou a pilha sobre a mesa, ajeitando-a
antes de responder:
— Livros de Hogan Whitney. Acabou de chegar um
montão deles, de Nova York, além de vídeos, pôsteres, fotos em
tamanho natural, camisetas...
— Guarde tudo no depósito. Mais tarde eu vou examinar.
Leilah sabia que evitava encarar a realidade, mas naquele
momento o fato de se ver cercada pelas imagens de Hogan a
impedia de pensar com clareza.

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— Posso experimentar uma destas? — perguntou Violet,
os olhos negros fascinados por uma camiseta acondicionada
em celofane, com a estampa de Hogan.
— Não! — Confusa e arrependida pela veemente
negativa, Leilah acrescentou: — Obrigada por tudo.
Não tinha a menor vontade de ver os olhos ternos de
Hogan, com aquela expressão irresistível, no corpo da
secretária.
— Roger me contou que você e o Sr. Whitney foram
"muito" amigos — disse a moça, olhando-a atentamente. — Ele
tem mesmo esses olhos sensuais ou é só pose?
Dessa vez Leilah não se divertiu com o inglês atrapalhado
de Violet e deu uma resposta irritada.
— Não sei!
Estava furiosa com a indiscrição de Roger, seu assistente.
Violet era uma fofoqueira terrível e espalhava as novidades
sobre os "diabos estrangeiros" por toda Hong-Kong. Sempre
que acontecia alguma coisa inusitada, Violet agarrava o
telefone e espalhava a nova, informando Pauline, a
recepcionista que ficava na entrada, e inúmeras outras
amigas.
O que mais Roger teria dito? Ele estava em férias, mas
quando chegasse seria advertido. Afinal, a vida particular dos
outros não lhe interessava. Ainda irritada, Leilah foi até o
armário pegar o casaquinho do tailleur cinzento, pensando
que mesmo as poucas notícias sobre Hogan que lhe chegavam
mostravam que ele continuava na carreira de conquistador.
Talvez estivesse se dedicando com afinco ao retorno às
quadras, e Leilah sabia da disciplina férrea a que era
submetido. Mas, por mais rigor que exigissem dele nos treinos,
ela estava certa de que as mulheres não tinham sido
eliminadas de sua vida. Hogan tinha um vigor sexual
incomum, e Leilah sabia disso melhor do que ninguém. Ele
desejava as mulheres... no plural, lembrou a si mesma,
amargurada. E as mulheres desejavam Hogan.
— Choveu a semana inteira, mas hoje está fazendo um sol
digno do Mediterrâneo, não acha? — ela comentou, chegando
até a imensa janela.
— Mas está muito frio — foi a resposta de Violet, surpresa
com a brusca mudança de assunto.
A chinesa usava um suéter grosso de tricô e ajeitou-o
enquanto se aproximava de Leilah. A vista ali da janela era
espetacular. A Spencer Associates ocupava todo o décimo
quinto andar de um dos prédios mais elegantes do litoral sul

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de Hong-Kong. O escritório de Leilah, a exemplo de vários
outros espalhados pelo mundo, era ultra-moderno. Os móveis
de desenho sueco, de metal e couro negro, o tapete felpudo
branco, as paredes claras decoradas com quadros abstratos de
cores berrantes davam ao ambiente um ar de sofisticação.
No mais, a vista dali era única. Hong-Kong era um dos
raros lugares no mundo onde o homem unira com felicidade
suas forças às da natureza, criando um quadro de
impressionante beleza. Aves marinhas atravessavam os canais
de águas azuis, sobre os juncos e campanas, e mais ao longe se
via a silhueta serrilhada dos edifícios de Kowloon; ali perto o
comércio fervilhava com suas lojas abarrotadas e com as
feiras nas ruas, cheias de vida. Bem ao longe ficavam os Novos
Territórios, onde havia montes verdes e tranqüilos, e além
deles a China misteriosa.
Leilah dividia seu tempo entre a Ilha de Hong-Kong e
Kowloon, o coração da Colônia. Ela nunca mudara de opinião
quanto à primeira impressão que tivera: aquele era um lugar
de sonhos efêmeros, onde qualquer coisa poderia acontecer.
Mendigos sonhavam em se transformar em milionários, e
milionários em bilionários, com títulos de nobreza. Fortunas
eram feitas e perdidas em dias, como num jogo, e prédios
enormes de aço e vidro eram erguidos em semanas, para
serem demolidos e darem lugar a outros, mais luxuosos, com a
mesma velocidade. Gente chegava, gente saía; preços de ações
subiam e caíam. Sempre havia alguma crise, e mesmo o tempo
oscilava entre extremos: de tufões assustadores a dias idílicos
de ar morno e agradável. Leilah sorriu ao ver o brilho do sol
na água.
— Não vai vestir o casacão? — perguntou a secretária ao
vê-la pegar apenas a bolsa e as luvas. — Muito frio!
— Você não sabe o que é frio mesmo. Não posso imaginar
o que aconteceria se de repente nevasse em Hong-Kong. —
Caminhou para a porta. — Quer por favor telefonar ao Sr. Tan
e avistar que estou a caminho?
Os cabelos castanho-claros e muito brilhantes de Leilah
sempre causavam impacto, e ela estava ciente disso ao sentar-
se no banco de madeira no convés superior do Star Ferry. Os
homens frequentemente tentavam flertar com ela, mas os
chineses mais idosos a olhavam com desconfiança.
Quando a barcaça encostou no cais de Kowloon e a
multidão desembarcou, Leilah se encontrava no meio. Logo
acenou para um táxi e se acomodou no banco de trás,
conformada com a viagem lenta que teria pela frente. O

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tráfego de Hong-Kong era louco: tinha longas paradas e
corridas repentinas, o barulho ensurdecedor das buzinas,
gritos, veículos colados uns aos outros nas ruas
congestionadas.
Como enfrentaria a visita de Hogan? Uma sensação de
inquietude dominava seu coração e Leilah se sentia mais uma
vez encurralada. Se seus nervos ficavam à flor da pele à mera
visão da foto de Hogan, ou com uma conversa superficial
sobre suas atividades, o que aconteceria quando ele estivesse
diante dela? Cruzando os braços numa atitude de
exasperação, criticou-se intimamente. Afinal de contas tinha
vinte e cinco anos, era uma executiva de sucesso, dirigindo a
filial de uma firma internacional de relações públicas, e não
tinha sentido entrar em pânico só ao pensar em reencontrar
Hogan! Sorriu amargurada. Talvez fosse esperta quando
lidava com o mundo dos negócios, mas desabava diante de um
tenista de um metro e noventa, moreno e charmoso.
Tomou uma decisão repentina: no dia em que Hogan
desembarcasse em Hong-Kong, voaria para outro lugar
qualquer. Afinal, mantinha contatos em todo o Extremo
Oriente e poderia ir até Tóquio ou Manilha. Organizaria
meticulosamente o programa da visita: as partidas de tênis,
as entrevistas, tudo. Mas, logo que Roger voltasse das férias,
passaria a ele a responsabilidade da estadia de Hogan.
Leilah mordeu o lábio inferior, lutando com sua
consciência. Embora Roger fosse somente um ano mais jovem
do que ela, podia ser incrivelmente ingênuo. Fora uma prova
insofismável de sua irresponsabilidade comentar com Violet
sobre ela e Hogan. Afinal de contas Hogan ficaria somente
uma semana ali, e q que poderia acontecer em tão pouco
tempo? Leilah sabia que ele era um perfeccionista e não
aceitaria ser entregue a um quase amador. E não levaria
muito tempo para que percebesse que Roger era um amador.
Maldito Hogan! Por que ele precisava aparecer agora,
atrapalhando a vida e as emoções de Leilah? Uma coisa era
certa: ele não devia estar nem um pouco preocupado com a
perspectiva de encontrá-la depois de dezoito meses. Para
Hogan ela não passara de mais um caso, um caso sério, talvez,
mas ainda assim um caso.
Ela pensava nisso quando percebeu que já se encontrava
nos subúrbios onde estava situada a fábrica do Sr. Tan. Com
determinação, Leilah aprovou a idéia de deixar Roger
responsável pela visita de Hogan. Ele daria um jeito, tinha que
dar um jeito! Quando o táxi estacionou, seus planos estavam

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feitos. Em caráter irrevogável.
O Sr. Tan não parecia um milionário. Era pequeno e rijo,
com cabelos negros e lisos. Invariavelmente usava uma
camisa branca de náilon, colete e calças folgadas, cinzentas.
Só calçava tênis e a única demonstração de riqueza eram os
dentes de ouro. Durante anos sua fábrica produzira roupas
esportivas para etiquetas famosas, mas agora a aspiração
dele era entrar no mercado com sua própria grife. Um belo
dia, no verão anterior, telefonara a Leilah, perguntando se a
Spencer Associates poderia ajudá-lo, e com o correr do tempo
uma relação comercial tinha se desenvolvido com muito
sucesso.
Leilah imaginou, para as roupas muito bem
confeccionadas, uma promoção de estrondoso sucesso. A
confecção, que se chamava Jasmine Modes em homenagem à
filha do Sr. Tan, mudara para Fast-Lane Fashions. Leilah
descobriu uma moça de Hong-kong que estudara desenho de
moda em Paris e confiou a ela a primeira coleção. As roupas
tinham sido fotografadas e anunciadas em revistas e jornais;
foram convocados jornalistas e distribuídos belos catálogos.
Uma campanha pela televisão já havia sido programada para
o mês seguinte e estavam em andamento planos de expansão
para a Malásia e Cingapura.
Depois de discutirem os últimos detalhes do negócio, o Sr.
Tan se reclinou na poltrona.
— Agora conversemos sobre Jasmine — disse, os dentes
de ouro brilhando.
Leilah não demonstrou o desagrado que sentiu.
— Ela deveria procurar um produtor artístico —
respondeu com cuidado. — Ele conhece melhor o ramo do que
eu.
— Pois os produtores de Hong-Kong são péssimos.
Jasmine seria uma grande estrela se eles fossem bons.
Senhorita ajuda, senhorita moça inteligente. Senhorita
orienta, ela fica famosa.
— Jasmine é uma linda moça — comentou Leilah,
tentando ganhar tempo e sem saber como sair daquela
enrascada.
— Muito linda. Também boa cantora.
— Suponho que haja uma pequena chance de eu arranjar
um lugar para ela no Dinasty Hotel...
Leilah tinha certeza de que poderia convencer Glenn a
deixar Jasmine cantar alguns números durante a hora do
jantar. Afinal, a moça era mesmo linda: pequena, de olhos

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amendoados, ar misterioso. Os turistas não saberiam nunca se
a música chinesa estava no tom ou fora dele.
O Sr. Tan segurou a mão de Leilah e a apertou com
gratidão.
— Obrigado, obrigado. Mandarei filha minha para
senhorita quando tudo estiver combinado. Senhorita diz a ela
o que vestir e o que cantar, certo?
O coração de Leilah batia fortemente. Os sonhos do Sr.
Tan estavam refletidos em seus olhos. Ele acreditava piamente
que a filha estava destinada a ser, no mínimo, outra Barbra
Streisand!
Os problemas povoavam a mente de Leilah enquanto ela
andava pelas ruas apinhadas em direção ao Dinasty Hotel.
Primeiro Hogan, agora Jasmine! Estava caminhando no fio de
uma navalha; só lhe faltava que Roger quebrasse uma perna e
Glenn não cooperasse.
— Oi, loirinha! — exclamou Glenn com seu forte sotaque
australiano quando ela pôs a cabeça pela porta entreaberta do
escritório. — Espere só um minutinho. — Terminou
rapidamente a conversa com um dos seus assistentes e seus
olhos castanhos brilharam quando ele deu a volta na
escrivaninha, os braços abertos para recebê-la.
— Estou aqui a negócios — protestou Leilah quando
Glenn tentou beijá-la. Ele era alto e magro, com cabelos
castanhos ondulados, alegre e amável. Ela permitiu um leve
beijo, mas libertou-se antes que outros carinhos fossem feitos.
— Negócios, Glenn — repetiu.
— O que há? Algum problema?
— Será que você poderia me fazer um favor? — Leilah se
arrependeu no instante em que pronunciou aquelas palavras.
Glenn nunca recusaria um pedido seu. Os olhos azuis se
toldaram, confusos, e ela sentiu vergonha; estava-o usando
sem escrúpulos. Saul costumava abusar das pessoas para ter
lucros e prestígio, mas ela nunca aprovara esses métodos. —
Esqueça — disse, mudando de idéia.
— Vamos, loirinha, conte o que a preocupa.
— Pensei em pedir a você que permitisse que uma moça
chinesa cantasse aqui no hotel, mas acho que não estou agindo
honestamente. Eu a escutei uma vez e ela é um desastre!
Glenn sorriu.
— Para mim, todas as cantoras chinesas são um desastre.
Já assistiu à ópera deles? — perguntou, voltando à
escrivaninha e verificando algumas anotações. — Na verdade
acho que posso ajudar. Não podemos contratar ninguém

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permanentemente, mas vamos precisar de cantoras durante
os feriados do Ano Novo chinês. As cantoras da casa querem
folga, portanto vai haver uma ou duas vagas. Que tal? — Ele
sorriu ao perceber a indecisão de Leilah. — Francamente, é tal
a confusão durante os jantares do fim de ano chinês que
duvido que alguém a escute. Mande-a uns dois dias antes das
festividades e ela poderá ensaiar com a orquestra.
— Obrigada, uma apresentação já seria ótimo. Eu estou
muito agradecida; Jasmine é uma moça muito bonita, apesar
de cantar pessimamente.
— Aposto que não tão bonita quanto você. — Ele chegou
mais perto e a teria abraçado se o telefone não tivesse tocado.
Levantou o fone e pediu: — Não vá embora ainda.
— Glenn, nós dois estamos trabalhando — contestou ela, e
Glenn suspirou, conformado.
— Está bem, loirinha. Então me dê um beijo antes de ir —
pediu, sorrindo, e ela aquiesceu. — Hoje à noite eu telefono.
Estou de trabalho até os olhos, mas no fim da semana vou dar
um jeito de ver você. Até mais.
Leilah pediu que um dos boys lhe comprasse um lanche e
frutas para o almoço. E, enquanto comia, estudava os dados
sobre Hogan. Se alguém imaginou que ele fosse ficar liquidado
depois do grave acidente, que interromperia a série de
brilhantes vitórias nas quartas de final em Wimbledon, estava
enganado. Pelas informações que continha a pasta, nem bem
Hogan se levantara da cama e já começara a reconstruir a
carreira. Não devia ter sido fácil mas, se havia alguém que
com vinte e nove anos tinha chances de voltar a ser um dos
melhores tenistas do mundo, esse alguém se chamava Hogan
Whitney. Ele possuía agressividade, autoconfiança, dedicação.
Vencer era sua meta, e no passado vencera inúmeras vezes.
Leilah tomava notas. Seria preciso reservar uma suíte
para ele no Dinasty. Com isso estaria matando dois coelhos de
uma só vez: a estadia de Hogan traria prestígio para o hotel e
ela poderia usar as quadras dos jardins do Dinasty para os
jogos de exibição. Glenn havia se disposto a ajudar no que
fosse necessário.
Ela fazia planos quando uma risada juvenil interrompeu
seus pensamentos. Violet estava parada no meio da sala.
— Bom? — ela perguntou, abrindo seu casaco e revelando
uma camiseta.
O olhar de Hogan pegou Leilah desprevenida.
— Muito excitante. Mas você não estava com frio?
Aquele tom de voz irritado não combinava com Leilah e

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Violet a olhou, espantada. Deu um risinho nervoso e se sentiu
aliviada quando o telefone tocou. Correu para atender e
segundos depois avisava Leilah de que ó telefonema era para
ela.
— Nova York na linha, srta. Morrison.
— Obrigada.
Ela já estava arrependida de sua irritação para com a
secretária, que não tinha culpa de nada. Mas sentia-se tão
abalada com a idéia da vinda de Hogan que a simples visão do
rosto dele numa camiseta a desnorteava.
— Aqui é Saui, beleza — berrou o chefe. — Estamos com
problemas com nosso astro do tênis.
— Ele não pode vir? — perguntou ela, tentando esconder
o alívio.
— Ele vai, sim — soou a voz trovejante. — Ele irá a Hong-
Kong nem que eu tenha que carregá-lo!
— Hogan não quer vir? — Leilah quis saber. A idéia de
que talvez Hogan tivesse restrições quanto a encontrá-la a
deixou ressentida e furiosa. Como ele ousava?
— Nosso astro insiste em que tem direito a um pouco de
descanso. Só Deus sabe por quê!
Leilah lembrou-se da longa lista de cidades que Hogan
visitara ultimamente.
— Pode ser que as viagens o estejam deixando cansado.
— Coisa nenhuma! Ele faz isso desde adolescente,
competindo nos vários campeonatos de tênis. Então por que
alguns jogos de exibição e entrevistas podem aborrecê-lo?
— Você mesmo me disse que eram estafantes.
— Mas Hogan agüenta tudo isso sorrindo, beleza. Ele está
só criando caso. Quem sabe levantou da cama hoje com o pé
esquerdo.
Leilah resistiu à tentação de perguntar da cama de quem.
— Ele tem viajado sem parar nos últimos meses. Pode ser
que esteja cansado mesmo.
— Não acredito.
— Talvez ele se canse mais facilmente depois do acidente
— arriscou ela. — Tenho certeza de que a perna. . .
— Ele faz ginástica todos os dias, beleza. E ginástica
pesada. Anda de bicicleta, o diabo. O sujeito é esforçado.
— Mas ainda assim é humano. Por que não tira Hong-
Kong do roteiro dele e lhe dá umas férias?
— Não! Hong-Kong dá muito lucro. Estou pensando em
tirar a Nova Zelândia. Assim economizaremos muitas horas
de viagem e ele poderá estar aí antes da data prevista. — Saul

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parou de falar enquanto fazia cálculos. — Bem. . . ele vai
chegar a Hong-Kong no começo de fevereiro.
Leilah sentiu-se atordoada. Roger ainda estaria em férias
nessa época.
— Ele não pode vir! — protestou, aflita. Se Hogan
chegasse em fevereiro, ela teria que recebê-lo! — É o Ano Novo
Chinês — explicou, tentando manter-se calma. — As pessoas
vão visitar amigos, parentes. E os de fora. . . bem, eles também
viajam. O lugar fica deserto! Além disso, costuma chover nessa
época. Sempre chove no Ano Novo Chinês. As exibições seriam
prejudicadas.
— Então marque-as em quadras cobertas — revidou Saul,
inabalável. — Hogan poderá fazer os jogos em cinco ou seis
dias e tirar a segunda semana para descansar. Daí nosso
astro segue para o Havaí e lá eu preciso dele em plena forma.
Leilah estremeceu. Então teria que passar duas semanas
com Hogan?
— As férias dele não podem ser no Havaí?
— Lá Hogan é conhecido demais e não teria sossego.
— Pode haver problemas, com tão pouco tempo para
preparar tudo.
— Você dará um jeito. Eu a contratei para cuidar de casos
difíceis. — Era o chefe.deixando claro quem mandava. — A
propósito, Hogan não quer ficar em hotel; diz que está farto
deles. Como lembrei que Roger está viajando, Hogan poderá
usar o apartamento dele.
— Acho que ele não vai gostar. É pequeno demais.
— Vai sim.
Era evidente que Saul estava perdendo a paciência. Não
havia alternativa senão desligar, mansinha, e foi o que Leilah
fez. Depois ficou pensativa, o punho apertado contra a testa,
um peso no coração. Estava mesmo encurralada. Dentro de
três semanas deveria desempenhar o papel de amável anfitriã,
de babá, de criada, do que quer que Hogan inventasse. E, para
piorar tudo, havia a atração devastadora que a subjugava
àquele homem.
Subjugava? Isso mesmo: subjugava. O verbo no passado,
não no presente. Porque, com toda certeza, havia um papel
que ela não desempenharia nunca mais: o de amante de
Hogan Whitney.

Capítulo II

Sabrina 363
Elizabeth Oldfield – Too far,too fast

Durante as três semanas que precederam o Ano Novo


Chinês, o ritmo de Leilah, assim como o de toda Hong-Kong,
tornou-se febril. Em contrapartida, o Natal foi tranqüilo, com
as lojas enfeitadas com guirlandas e as chinezinhas
fantasiadas de adoráveis "santarinas", versões femininas de
Papai Noel. Era uma festa típica para estrangeiros. Porque,
na verdade, os chineses comemoravam sua própria festa.
Faixas vermelhas desejando sorte e prosperidade estavam
espalhadas por toda parte. Milhares de lanternas de papel
enfeitavam a cidade e comidas especiais eram vendidas a
preços exorbitantes. Papéis cor de sangue eram pendurados
nas portas para afastar os maus espíritos, e as casas eram
limpas de alto a baixo. Leilah deu a seus funcionários o
tradicional ang pows, embrulhos vermelhos com o décimo
terceiro salário dentro.
De certo modo ela até gostava daquela agitação, isso a
fazia pensar menos em Hogan. Passava boa parte do dia
organizando a visita dele, mas procurava encará-lo como a
uma "mercadoria" que precisava ser promovida e nada mais.
Tudo correu satisfatoriamente. Os contatos com a
imprensa foram ótimos: todos ficaram encantados com a idéia
de ter alguém como Hogan Whitney em Hong-Kong. A
cobertura prometia ser de primeira. Glenn, como Leilah
esperava, ajudou muito e colocou o hotel à disposição. Os jogos
iam se realizar nas dependências esportivas do Dinasty e, se
chovesse, seriam transferidos para as quadras cobertas.
— Nesse caso, poderemos desmontar os aparelhos de
ginástica e abrir as divisões que separam as quadras de tênis,
de squash e de basquete. Vai caber todo mundo. Não se
preocupe, querida.
O apoio de Glenn, homem sempre otimista, ajudou Leilah
a conservar o sangue-frio. Se na época do Natal ela havia se
preocupado com o rumo que o relacionamento entre ambos
estava tomando, agora estava agradecida. Glenn transmitia
segurança e ela necessitava exatamente disso. Contou a ele
sobre o caso que tivera com Hogan e recebeu mais do que
apoio: recebeu carinho e compreensão.
Leilah consultou sua lista pela milésima vez, embora já a
soubesse de cor. Hogan deveria chegar no dia seguinte, à
tarde. Depois de uma coletiva à imprensa, na sala VIP do
aeroporto, seria levado ao apartamento de Roger, que ficava
em frente ao dela, e descansaria da longa viagem. As sete,
uma limousine alugada levaria os dois até o Dinasty Hotel,

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onde jantariam com uma das mais famosas colunistas de
Hong-Kong. Em seguida Hogan deveria examinar e aprovar
as quadras. Isso deixava Leilah intranqiiila. Ele era um
perfeccionista e qualquer probleminha poderia atrasar os
jogos de exibição, programados para o dia seguinte. O
restante da semana estava reservado para o lançamento do
livro: uma sessão de autógrafos, entrevistas para rádio e
televisão, visitas a vários lugares.
Leilah checava esses lugares quando o intercomunicador
chamou.
— Srta. Tan veio vê-la — disse a secretária, com seu
risinho costumeiro.
A porta se abriu e uma figurinha vivaz, de short de couro
branco, jaqueta prateada e botas de cano alto combinando
entrou na sala. Os grandes olhos de Leilah se arregalaram.
Ela vira Jasmine somente uma vez, cantando num nightclub
da cidade, e na ocasião a moça era a suavidade chinesa
personificada. Seu cheongsam de seda azul-noite tinha gola
alta, os cabelos estavam arrumados num coque clássico e a
pele muito clara contrastava cornos lábios pintados de
vermelho. Muito diferente daquele visual new wave que
Leilah, perplexa, examinava agora.
— Oi, tudo bem? — exclamou Jasmine num tom
desinibido, jogando a jaqueta numa cadeira e revelando um
top prateado. Depois se escarrapachou numa poltrona,
afofando os cachos.
Leilah teve que se esforçar para conservar uma expressão
impassível no rosto. Imaginara que Jasmine fosse recatada e
tímida, não uma moça esfuziante, cuja maneira de se vestir e
de ser era uma clara imitação dos modismos ocidentais.
— Y.C. está animadíssimo com a chance de jogar contra
Hogan Whitney. Ele acha que é a chance da vida dele — contou
a jovem, sorrindo. Depois tirou um cigarro de um rico estojo
de prata. — Fuma?
— Não, obrigada — Leilah tentava se recuperar da
surpresa.
— Y.C. e eu estamos firmes, sabia?
— Está falando de Y.C. Wong?
Agora Leilah estava entendendo melhor a conversa de
Jasmine. Wong era o melhor jogador de Hong-Kong: amador,
mas dos bons. Aperfeiçoara seu estilo nos Estados Unidos,
onde estudara, e era um dos adversários de Hogan nos jogos
de exibição.
— Y.C. acha que Hogan não tem a menor possibilidade de

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voltar a ser campeão. Está velho demais.
Leilah procurou mudar de assunto. Não queria ficar
falando sobre Hogan: tudo que queria dele era que viesse e
fosse embora o mais depressa possível.
— Quanto à sua estréia, srta. Jasmine...
— Y.C. acha um absurdo essa história de eu ir cantar no
Dinasty. Minha voz não é nada boa, você sabe.
Leilah olhou a moça sem saber o que dizer.
— Mas seu pai...
— Meu pai não entende nada. Eu só canto para agradá-
lo. O que gosto mesmo é de dançar. — Fez uma expressão
determinada com os lábios pintados de vermelho. — Dessa vez
vou modernizar minha imagem. Meu pai me prefere vestida de
maneira tradicional? mas eu pretendo mudar tudo. Escolhi um
repertório onde só entra rock e mandei fazer uma roupa
envenenadíssima de camurça e couro preto, você entende?
Bem chocante.
— Oh, não faça isso! — Leilah ficou aflita. Era imperativo
que Jasmine não chamasse atenção. Mas, se surgisse no
Dinasty parecendo uma adepta do heavy metal, todos
reparariam nela. — A direção do hotel me pediu uma jovem
vestida num cheong-sam para cantar melodias cantonesas —
explicou, tentando fazer a moça mudar de idéia. — O estilo
oriental é essencial. Os turistas podem escutar rock em seus
países, mas quando visitam Hong-Kong esperam algo típico
daqui. Estão ansiosos por conhecer algo da cultura oriental. —
E pensou, com ironia, que os agudos desafinados de Jasmine
não poderiam de maneira alguma ser classificados como
"cultura".
— Mas eu quero estar na onda! — protestou a moça,
começando a se amuar.
— Sim, mas... — O intercomunicador tocou novamente e
Leilah apertou o botão, impaciente. — O que é?
— Hogan Whitney.
Ela teve a sensação de estar vivendo um pesadelo. Por que
Hogan lhe telefonaria? Até aquele momento era Saul quem
tinha tratado tudo com ele. ■
— Ponha-o na linha, Violet.
— Acho que a senhorita não entendeu, ele não está ao
telefone. Está aqui.
— Aqui onde? Em Hong-Kong?
— Sim. Para ser mais precisa, está aqui à minha frente.
Leilah largou o botão, atordoada, sem querer acreditar no
que estava acontecendo. Virou a cabeça quando a porta se

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abriu e um homem sorridente, de ombros largos, vestido num
terno bege, entrou na sala. Uma morena espalhafatosa o
seguia.
— Leilah! — exclamou ele naquela voz macia e
envolvente, a mão estendida. — Há quanto tempo!
"Antes fosse mais tempo ainda", pensou ela ao se levantar
para devolver o cumprimento.
Hogan segurou as mãos dela somente por um segundo e
isso foi o bastante para deixar Leilah profundamente abalada.
Ela teve a impressão de que seus joelhos tinham virado geléia.
Sentou-se depressa, procurando entre os papéis na mesa o
itinerário de Hogan. Afinal, precisava fazer alguma coisa
para disfarçar o nervosismo.
— Você deveria chegar amanhã à tarde. Há uma coletiva
programada para o aeroporto — comunicou, a voz tensa. — O
apartamento de Roger ainda necessita de uma vistoria final
e. . . você arruinou os meus planos! — acrescentou, furiosa,
principalmente porque percebeu um traço de zombaria nos
olhos cinzentos. Sabia que eles ficavam brilhantes quando
Hogan achava graça em alguma coisa. — Tudo estava
organizado nos mínimos, detalhes e. . . — Parou de falar e
olhou melhor para ele. — Você está de bigode!
Hogan passou a ponta do polegar nos pêlos negros.
— Você aprova, gatinha? — provocou com um sorriso, os
olhos semicerrados.
Gatinha! Francamente! Gatinha era uma palavra que
pertencia ao passado, pois somente Hogan a chamava assim.
Gatinha significava dias felizes, cheios de amor e de alegria;
significava beijos ardentes, sussurros noturnos, corpos
entrelaçados em chamas. . .
— Ê da aprovação do público que você precisa, não da
minha. O que todos irão pensar? — reagiu Leilah, exasperada
com aquele bigode. — E se não o reconhecerem?
Ele deu um sorriso zombeteiro.
— Não creio que haja problema. Por baixo do bigode eu
continuo o mesmo Hogan que você conhece, ama e admira.
Leilah ia dar uma resposta malcriada quando se lembrou
de Jasmine e da morena voluptuosa, ambas acompanhando
aquela discussão com evidente interesse.
— Quer se sentar, por favor? — convidou.
Apressadamente se afastou da mesa e ajeitou as
poltronas, pediu café, apresentou Jasmine. Conseguiu até
manter uma conversa amena sobre o tempo. Descobriu que a
morena se chamava Terri e era de Nova York. Percebeu os

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olhares ternos que a moça lançava a Hogan e soube que ela
estava apaixonada. Perdidamente apaixonada. Como ela,
Leilah, estivera um dia.
Depois de alguns minutos de conversa, Jasmine esmagou
o cigarro no cinzeiro e se levantou.
— Preciso ir.
Leilah acompanhou-a até a porta enquanto Hogan e
Terri, acomodados nas poltronas, tomavam o café que Violet
providenciara.
— Apresente-se ao maestro do Disnasty amanhã às dez,
mas cante música cantonesa, por favor. Guarde as roupas
novas para outra ocasião. Pode acreditar: você fica
sensacional num cheongsam.
— Posso usar lantejoulas?
— Por que não?
A moça se animou e saiu, sorrindo. Respirando fundo,
Leilah voltou à sua poltrona atrás da escrivaninha,
procurando manter um ar eficiente e profissional.
— Muito bem, Hogan, já que você e a senhorita. . .
— Pode me chamar de Terri! —- exclamou a morena, com
um sorriso de comercial de pasta de dentes.
— Pois bem, já que você e Terri estão aqui — Leilah
começou, remexendo os papéis em cima da mesa —, explicarei
o que foi organizado.
Hogan massageou a nuca e os cabelos negros, cortados
rente.
— Terri não tem nada a ver com isso — disse com
firmeza. — Ela está aqui como minha. . . — Fez uma pausa
longa demais e completou: — . . .enfermeira.
Leilah sorriu, irônica, enquanto olhava dentro dos olhos
cinzentos. Enfermeira é? Raramente enfermeiras se vestiam
com calças justas e casacos de pele.
— Não exatamente enfermeira — corrigiu Terri. — Sou
fisioterapeuta. Cuido para que Hogan mantenha a forma.
— Você cuida é do meu corpo — disse ele, sorrindo como
um anjinho.
— Só uma coisa — comentou Leilah, procurando mudar o
rumo da conversa. — É mesmo uma pena que você não tenha
me avisado com antecedência de que eu deveria acomodar
duas pessoas. Receio que o apartamento de Roger seja
pequeno demais. — E sorriu, maliciosa. Roger usava cama de
solteiro e Hogan não gostava de camas estreitas. — Mas sem
dúvida vocês darão um jeito, não é? — disse, com falsa doçura.
— Claro que sim — concordou Hogan com a fleuma de um

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homem que sabe perfeitamente o que quer. — Eu fico no
apartamento e Terri no hotel. Ela poderá vir todos os dias e
me aplicar os exercícios.
Leilah sorriu ao perceber que ele se divertia às suas
custas. Que tipo de jogo Hogan estava fazendo agora? Afinal,
Terri era mesmo fisioterapeuta ou mais uma namorada? Se,
como Saul garantira, ele estava em plena forma, por que uma
fisioterapeuta?
Fingindo tomar café, Leilah olhou disfarçadamente para
Hogan. Ele parecia ótimo. A pele bronzeada tinha aquele
brilho que só um corpo saudável possui. Sem dúvida, ainda
tomava litros de leite e iogurte. Nos velhos tempos, Hogan,
com seu físico perfeito, era uma fábrica de energia, e, pela
aparência, nada parecia ter mudado.
— Será que você consegue um hotel para Terri, Leilah?
Tenho certeza de que ela adoraria poder ir descansar e
desfazer as malas.
— Sim senhor!
Leilah começou a ficar irritada. Hogan dera a entender
que Terri era sua amante mas agora se tornara impossível ter
certeza disso. Tentando se controlar, ela pegou o telefone e
ligou para o Disnasty, conseguindo imediatamente um quarto.
Terri pareceu impressionada com tanta eficiência, mas Leilah
teve a impressão de ver uma momentânea irritação no rosto
de Hogan. Chamou um dos empregados para auxiliar Terri e
lhe arranjar um táxi.
— Até logo, Terri — despediu-se Hogan com um sorriso,
voltando-se para Leilah quando a moça saiu. — Mas que
mente desconfiada você tem! Por acaso pensa que Terri e eu
temos um caso?
Furiosa, ela olhou para a xícara de café durante algum
tempo e depois ergueu a cabeça.
— Seus jogos estão programados para depois de amanhã,
bem na época do Ano Novo Chinês. Mas você gostará de saber
que a repercussão da notícia da sua vinda foi enorme. Todas
as entradas para os jogos da tarde e da noite foram vendidas.
Só estão sobrando alguns lugares para o das onze da manhã.
— Três jogos num mesmo dia? Mas que loucura é essa?
— Pensei que o melhor fosse acabar logo com os jogos
para depois deixá-lo livre para entrevistas, essas coisas.
Hogan se levantou e pôs a xícara na mesa, impaciente.
— Pensa que sou um robô? Não posso disputar três jogos
num mesmo dia, especialmente com gente da categoria de
Wong! Pelo que Jasmine disse, ele é ótimo. E, se jogou contra

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todos os grandes nomes dos Estados Unidos, não deve dar
moleza!
— Hogan começou a andar de um lado para outro. —
Você sabe que estou vivendo uma fase cheia de tensões, não
sabe? O que está tentando fazer comigo? Me matar?
— Só peço que jogue.
— Mas o caso é que eu tenho que vencer! Não posso me
dar ao luxo de perder, porque se isso acontecer a notícia logo
se espalhará e meus negócios entrarão em baixa. Ninguém
quer um perdedor. — Ele agora a olhava com verdadeira
fúria. — Ouça, não há possibilidade de eu jogar três vezes num
mesmo dia.
— Mas precisa. — Agora era Leilah quem estava
assustada.
— Eu já programei tudo.
— Pois não tenho obrigação de dançar segundo a sua
música. Por isso, minha querida, desprograme.
Com o rosto corado de indignação, Leilah começou a
reclamar:
— Escute aqui, eu estou ajudando você a...
— Você está me ajudando? — Ele não lhe deu tempo nem
de terminar a frase. — Sei muito bem que sua lealdade é para
com a Spencer Associates, que não liga a mínima para mim.
Para você, eu não passo de uma mercadoria a ser
contabilizada. Você não promove, você explora! Você e Saul!
Leilah se agarrou na mesa com a ponta dos dedos,
procurando manter a calma.
— Ninguém o obriga a permitir que a Spencer Associates
cuide de seus negócios, o que aliás lhe dá muito lucro.
Portanto, não se queixe. Os incomodados que se mudem.
— Se as coisas fossem assim tão simples...
— Muito bem, então como sugere que eu desmarque os
jogos?
Hogan passava os dedos pelo cabelo escuro, num gesto
desalentado.
— Pouco me importa como, mas não quero jogar três
vezes num dia. — A raiva parecia ter passado e ele a olhou,
preocupado. — Tenha coração. Não é somente uma questão de
vencer. Eu preciso arrasar meus adversários, e com classe.
Aposto como deixou Wong para a partida da noite.
Ela fez que sim, sentindo-se culpada. Hogan era um
profissional responsável e nunca se recusaria a jogar se não
tivesse razões sérias. Fora submetido a uma agenda muito
dura durante o inverno e quem sabe a programação estivesse

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mesmo exagerada.
— Parece que começamos com o pé esquerdo — ela
comentou, conciliadora.
— Você sim; eu não.
— Sente-se, Hogan. Vamos conversar sobre tudo isso com
calma.
— Como dois adultos sensatos? — caçoou ele, sorrindo
ligeiramente, mas logo ficando sério outra vez.
Relutante, sentou-se.
— Que tal se eu passasse Y.C. Wong para a manhã?
Talvez alguns fãs fiquem aborrecidos, mas isso poderá ser
ajeitado. O adversário da tarde é fraco, portanto o jogo deverá
ser rápido.
— Está bem, eu topo.
— Tudo vai dar certo. Você fez uma longa viagem, deve
estar cansado. As coisas parecerão diferentes pela manhã e
sua perna. . .
— O que há com minha perna?
Lá estava ele na defensiva outra vez, a agressividade
transformando o rosto atraente. Então Leilah resolveu
brincar, para aliviar a tensão do ambiente.
— Imaginei que um homem biônico poderia precisar de
uma reprogramação. . .
Ele pareceu perceber a estratégia e respondeu, no mesmo
tom:
— Só estou um pouco enferrujado.
Mas o olhar que trocaram indicava que ambos sabiam
que havia muita coisa além daquelas simples palavras.
Começaram a preparar as entrevistas, os outros
compromissos, e Leilah foi-se acalmando. Não se sentia
propriamente à vontade porque as vibrações entre ambos
eram fortes demais, mas sua autoconfiança voltou. Agora
percebia que era infundado o medo que sentira daquele
encontro. Tudo corria normalmente e ela se congratulava por
ter conseguido manter a conversa num clima impessoal
quando Hogan se recostou na poltrona e observou-a com
atenção.
— Quando fez amor pela última vez, gatinha?
O coração dela começou a bater violentamente e sua pose
de mulher de negócios, fria e impassível, caiu por terra.
— Isso é pergunta que se faça, Hogan?
Nas três últimas semanas ela imaginara como seria
aquele maldito encontro e sua intenção era manter um ar
sofisticado e distante. Mas a surpresa da chegada dele em

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companhia de Terri, depois a reação violenta de Hogan por
causa dos jogos e agora aquela transbordante sensualidade
masculina a tinham tirado do sério.
— É uma pergunta direta, só isso. Temos dezoito meses de
atraso, por isso achei que poderíamos dispensar os detalhes
preliminares.
— Você sempre fez isso.
Hogan se ajeitou na cadeira, com ar despreocupado, e
cruzou as pernas. A atração irresistível que exercia sobre
Leilah a deixava quase sem fôlego. A lembrança que tinha dele,
como o homem que amara tanto, o homem com quem fizera
amor, tinha um impacto devastador sobre seu corpo indefeso.
— Tudo bem, vamos agir à sua maneira. — Ele sorriu
quando percebeu que Leilah não tinha condições de responder.
— Tem um namorado, srta. Morrison? Há quanto tempo sai
com ele? É algo sério? Estão muito apaixonados?
— Isso não é da sua conta.
— Está respondendo à minha primeira, segunda ou
terceira pergunta?
— A todas.
— Deve haver alguém, não é mesmo? Você é bonita
demais para ser deixada em paz. — Os olhos cinzentos
brilhavam. Droga! — Vamos ver se eu adivinho. Um
milionário chinês. . . um diplomata... ou quem sabe um
executivo inglês, dirigindo alguma das enormes firmas que
existem por aqui?
Leilah sabia que Hogan se encontraria com Glenn e achou
melhor contar a verdade.
— Estou saindo com um australiano que dirige o Dinasty
Hotel. Isso o satisfaz?
— Será que ele vai se importar com o fato de que nestas
duas semanas você fique comigo e atenda a cada desejo meu?
Aquilo era demais!
— Como você já disse, para mim Hogan Whitney não
passa de uma mercadoria que tenho que promover. E, como
responsável pela Spencer Associates em Hong-Kong, farei o
máximo para tornar sua vida agradável enquanto estiver
aqui. Isso significa que o levarei e o buscarei, como é minha
obrigação. Quanto a atender a cada desejo seu. . . — ela não
conseguia enfrentar o olhar dele — . . .sem dúvida a
apaixonada Terri ficará feliz em fazer isso.
Hogan começou a rir. Depois espreguiçou-se e o paletó se
abriu revelando a musculatura rija do peito.
— Me conte como é esse australiano.

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— Bondoso, sensível, competente em seu trabalho,
culto. . .
Hogan ria, cada vez mais descontraído.
— Ele sabe mexer as orelhas?
— Ele é maduro e acredita em fidelidade.
— É uma indireta? Você quer dizer que eu não acredito?
— Você tem tendência para. . . para ser volúvel. — Leilah
ergueu a cabeça, recusando-se a se deixar intimidar pelo olhar
intenso de Hogan. Era a retomada das hostilidades.
— Puxa, mas que topete! — exclamou ele, novamente
furioso. Num segundo tinha-se levantado da poltrona e se
aproximara dela. — Se alguém é volúvel, esse alguém é você!
Num minuto estava jurando amor eterno e no outro partiu
para esta maldita Hong-Kong! Durante todos os meses em que
estive no hospital não recebi uma carta, um cartão seu, nada!
Ele se afastou depois do desabafo e Leilah julgou ver dor
nos olhos cinzentos.
— Não é verdade! Eu mandei flores!
— Mandou nada!
Ela se lembrava muito bem das rosas vermelhas que
pedira para Saul enviar em seu nome. Hogan devia tê-las
recebido, pois Saul transmitira os agradecimentos dele, o que
tinha alimentado suas tolas esperanças de uma reconciliação.
Mas as esperanças morreram aos poucos, porque Hogan
nunca mais a procurara.
— Imagino que seu quarto devesse estar cheio de flores
de suas. . . admiradoras, e as minhas se perderam no meio
delas — argumentou Leilah, e percebeu que Hogan vacilava. —
Àquela altura nosso caso estava praticamente terminado.
Portanto, que importa isso? Cada um de nós seguiu seu
caminho e para mim Hong-Kong significou muito,
profissionalmente.
Ela fazia tudo para falar de maneira casual. Hogan tinha
os olhos frios como aço.
— Você é uma mulher muito interesseira!
— Não acontece o mesmo com você? Afinal, só está aqui
para ganhar mais dinheiro.
Hogan foi até a janela, as mãos nos bolsos, os olhos
fitando o horizonte.
— Eu preciso pensar no futuro. O tênis não dá a menor
segurança, não dá aposentadoria. Se por alguma razão eu não
mantiver minha forma física estarei acabado, e sei muito bem
o que acontece quando os aplausos cessam. Atualmente, a
única maneira que tenho de conseguir uma vida decente é

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promover meu nome, mesmo que não seja esse meu caminho
preferido. — Interrompeu-se de repente, como se estivesse
falando mais do que devia. — Mas eu não fiz toda esta viagem
para justificar as minhas ações ou discutir. — Tem razão.
Vamos voltar aos negócios. O que pretende fazer em sua
segunda semana aqui? Consegui permissão para que usasse o
Health Club, no Dinasty; há uma piscina e vários
instrumentos de ginástica.
Leilah percebia que ele estava muito tenso. Só não atinava
por quê.
— Obrigado, mas se fosse possível eu gostaria de jogar
golfe.
— Nunca soube que você gostasse de golfe. E Saul não me
disse nada a esse respeito.
— Ao contrário do que pensa, gatinha, Saul não possui
meu corpo e minha alma. Prefiro manter a privacidade em
algumas áreas de minha vida.
— Você costuma jogar golfe sempre? — Ele fez que sim
com a cabeça e Leilah continuou: — E joga bem?
— Sim. — A resposta era seca e positiva, sem sombra de
vaidade. — Eu comecei a jogar depois do desastre porque o
programa de reabilitação incluía longas caminhadas. O golfe
foi a solução perfeita. — Olhou para as longas pernas. — Aos
poucos os músculos foram se fortalecendo e agora. . . Bem, se
me conseguir um ou dois jogos eu lhe agradecerei.
— Não há problema. O pai de Jasmine, Sr. Tan, adora
golfe. Você deverá fazer uma palestra no clube dele ainda esta
semana. Poderemos falar sobre isso na ocasião. Vou transferir
a coletiva com a imprensa para o Dinasty, certo? Que tal às
dez da manhã?
— Mais tarde.
A inesperada rispidez a tomou de surpresa.
— Por que mais tarde?
— Eu prefiro descansar. — Ele olhava novamente para o
horizonte.
— Mas dez horas não é tão cedo, e você poderá descansar
o resto do dia. Os repórteres têm pautas para cumprir e na
certa vão preferir. . .
— Onze! Não mais cedo!
Aquela teimosia a surpreendeu. Mas, como não quisesse
mais problemas, Leilah acabou concordando sem discutir.
Hogan segurou-lhe a mão e a fez levantar.
— Tente entender, gatinha — disse com doçura.
Recostado contra o vidro, ele era uma enorme silhueta que a

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luz do sol delineava.
Ela fechou os olhos por causa da claridade, sem entender
muito bem o que estava acontecendo, e levou um momento
para perceber que ele a puxara para muito perto, segurando
com firmeza seus braços. O aroma da loção após-barba, uma
mistura de almíscar e patchuli, entrou por suas narinas e a
deixou zonza. Ela sentiu uma profunda nostalgia.
— Mas eu entendo, Hogan. Sei que a máquina
publicitária cria pressões terríveis.
Quando Hogan se moveu, o halo do sol desapareceu.
Agora ele estava com a cabeça baixa, olhando-a, e Leilah
entendeu que precisava continuar a falar, pois seu corpo
estava amolecendo de uma maneira muito familiar.
-— Sei que as pessoas estão sempre perseguindo você e
farei o possível para tornar sua estada em Hong-Kong mais
fácil. Sou paga para cuidar de seu bem-estar, afinal.
Ainda olhando para ela, Hogan deslizou as mãos dos
braços para a cintura. Os dedos abertos pressionaram as
costas, para fazer com que ela ficasse mais perto.
— Por que acabou, gatinha? — Ele a puxou. O olhar
intenso dominou o dela. Ao sentir aquele corpo másculo, Leilah
percebeu que o antigo desejo renascia com violência, exigindo
ser saciado. — Por que você quis que terminássemos?
— Não banque o inocente — respondeu ela, tentando lutar
contra a verdade que seu corpo não deixava esquecer.
As pálpebras semicerradas, que sempre tornavam tão
perturbador o olhar cinzento, deixavam passar um brilho que
acariciava o rosto dela, os lábios cheios, as faces em fogo.
Leilah ainda tentou se libertar, mas com pouca convicção, e ele
apertou mais o abraço.
— Gatinha!
Era uma súplica, uma carícia. Hogan inclinou a cabeça
morena e o mundo inteiro rodou. Sua boca se uniu à dela, o
bigode áspero arranhando-lhe a pele. Leilah fechou os olhos e
uma onda de prazer invadiu seu corpo. Um calor gostoso se
espalhou até os dedos dos pés. Os lábios de Hogan eram
ardentes e fizeram-na enteabrir os dela até conseguir que
correspondessem. O beijo tornou-se apaixonado e íntimo.
Presa no círculo de aço dos braços fortes, Leilah não sabia se
estava dando ou tomando, enquanto o beijo a atordoava cada
vez mais.
Finamente encontrou forças para se libertar e protestou:
Ele sorriu, triunfante

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Capítulo III

Desesperada, Leilah foi se deitar naquela noite desejando


que a visita de Hogan a Hong-Kong já tivesse terminado. Não
imaginava que sua ligação com ele ainda fosse tão forte.
Depois das palavras provocadoras, libertara-se dele,
furiosa com a própria ingenuidade. Hogan era esperto demais
e se valia da atração que sabia exercer sobre ela. Leilah se
perguntou por que não aprendera com os erros do passado.
Hogan era um conquistador, e permitir que ele a beijasse fora
um erro imperdoável. O caso entre ambos fazia parte do
passado, estava acabado... e ponto final.
Quanto ao que ela realmente sentia. . . bem, tinha que
tomar cuidado, pois aquele beijo provara que a velha magia
ainda existia.
Leilah olhou a escuridão do quarto, maldizendo sua
vulnerabilidade.
"Pelo amor de Deus!", pensou exasperada, "quando nos
separamos ele estava a ponto de esmagar meu coração! Não
posso deixá-lo chegar muito perto!"
Virava e revirava na cama e aos poucos foi chegando à
conclusão de que aquele beijo não significara nada. Afinal,
depois dele Hogan voltara a adotar um comportamento
formal e, enquanto esperava que ela fizesse vários telefonemas
para alterar a hora da entrevista coletiva, permanecera
calado. O mesmo aconteceu no resto da tarde: ele pareceu
distante e até um pouco preocupado. Ainda estava assim
quando Leilah o levou ao apartamento de Roger.
— O meu fica do outro lado do corredor — ela explicou.
Hogan jogou a mala na cama.
— Quer dizer que se eu precisar de você é só assobiar?
— Sou treinada para vir correndo. — A resposta
pretendia, ser descuidada, mas saiu um pouco tensa.
— Que outras surpresas preparou para mim, gatinha?
Apesar do "gatinha", Leilah conseguiu manter a calma.
— Devo fazer com que se divirta.
— Você dança em cima das mesas ou sai por aí nua, com
enfeites pregados em lugares estratégicos?
— Nenhuma das duas coisas. Mas eu gostaria de convidá-
lo para jantar esta noite. Cortesia da Spencer Associates. —
Era vital que ela acentuasse o caráter profissional daquele
convite.
— Não esta noite, srta. Morrison. Eu a vejo amanhã de

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manhã.
Leilah esteve a ponto de sugerir que jantassem juntos em
seu apartamento, para evitar sair, pois isso fatalmente
envolveria caçadores de autógrafos e conversas com
estranhos, mas se conteve. Talvez Hogan estivesse esperando
Terri. . . Leilah ficou irritada com a própria estupidez.
Enfermeira ou não, Terri era uma moça muito sensual. Talvez
não vivesse com Hogan, mas isso não queria dizer muita coisa.
— Ponha o despertador para as dez, Hogan. Não quero
que cheguemos atrasados. — Depois mudou de assunto: — Na
cozinha você vai encontrar frutas, leite e cereais. Vou bem cedo
até o escritório providenciar algumas coisas; quando passar
por aqui para pegá-lo trarei alguns de seus livros e dados
promocionais. De táxi levaremos uns vinte minutos para
chegar ao Dinasty.
— Posso entender por que Saul diz que você é uma garota
eficiente. Não deixa nada ao acaso, deixa?
— Não, não deixo. Bem, até amanhã.
Leilah assistiu televisão a noite toda, decidida a não
tomar conhecimento de Hogan. O que ele fazia era problema
dele!' Quando foi para o escritório na manhã seguinte, olhou,
exasperada, para a porta do apartamento que o hospedava.
Sem dúvida Hogan dormia, provavelmente se refazendo de
uma noite de amor. . . Bem, ele que fizesse o que bem
entendesse, refletiu Leilah, irritada, enquanto esperava o
elevador. Mas foi ainda irritada que chegou aos escritórios da
Spencer.
Depois de ler a correspondência e dar alguns telefonemas,
consultou o relógio. Passava um pouco das dez.
— Por favor, faça uma ligação para o apartamento de
Roger — pediu a Violet, enquanto guardava numa sacola
alguns livros de Hogan.
Depois vestiu o blazer verde-escuro e se olhou ao espelho.
Os cabelos castanho-claros estavam em ordem. Quando os
soltava, eles caíam como uma cortina brilhante até o meio das
costas, mas para trabalhar era melhor mantê-los presos.
Como agora: uma grossa trança enfeitada com fitas de cetim
lhe dava um ar de menina.
Leilah arrumou-se com capricho e apertou o, botão do
intercomunicador.
— Violet? Não ligou ainda? -— Ninguém responde.
— Tem certeza de que ligou o número correto?
Leilah começava a se impacientar. Consultou o relógio de
prata. Estavam perdendo minutos preciosos!

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A essa hora Hogan já deveria estar vestido. Aquela
chamada era somente uma confirmação, um aviso para que a
esperasse na portaria. Será que ele tinha acordado tarde e
ainda estava no chuveiro?
— Diga a um dos rapazes para ir até lá embaixo segurar
um táxi para mim — disse à secretária, discando o número de
Roger e ficando à espera, impaciente.
O que estaria acontecendo com Hogan? O telefone
chamava sem parar. Leilah já ia desistir quando atenderam.
— Bom dia, Hogan.
— Alô? — A voz era arrastada, sonolenta.
— Hogan, sou eu. Você ainda estava na cama? Houve um
longo silêncio.
— Acho que não escutei o despertador. Sinto muito.
— Deve sentir mesmo! Vai ter que ficar sem café. Vou
pegar um táxi agora. Me espere na portaria dentro de dez
minutos. — E bateu o telefone.
Hogan devia estar agindo assim de propósito, imaginou
ela enquanto corria até o táxi e o via abrir caminho pelas ruas
congestionadas. Ele fizera isso para deixar bem claro quem
mandava. O atraso era uma espécie de vingança.
Leilah recordou a acusação que Hogan lhe fizera, de que
ela nem se importara com o acidente. Aquilo era uma
injustiça! Não tinha culpa se ele não prestara atenção às flores
que enviara. Afinal, tantas mulheres apaixonadas deviam ter
mandado flores. . .
— Pode esperar, por favor? Não vou demorar — pediu ela
ao motorista quando percebeu que não havia ninguém à
espera. Foi diretamente ao porteiro:.— Esteve aqui um homem
alto, europeu?
— Não homem, moça — respondeu ele num inglês
atrapalhado.
Resmungando, Leilah chamou o elevador, cada vez mais
nervosa. Apertou o botão do sexto andar. Passava de dez e
quarenta e cinco. Se Hogan estivesse pronto, e o tráfego
ajudasse, chegariam exatamente na hora da coletiva.
Apressada, voou pelos corredores de mármore até o
apartamento dele.
— O que aconteceu? Por que você ainda não está vestido?
Hogan devia ter saído do chuveiro naquele momento,
pois os cabelos ainda estavam úmidos e algumas gotas
escorriam pelo pescoço até o peito. Enrolado numa toalha
azul-marinho, ele sorria.
— Sabe que horas são? — perguntou ela, exasperada.

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— Deixe de fazer drama, gatinha. Não comece a gritar
comigo. Eu perdi a hora, só isso. Vou me vestir, e não precisa
me apressar. Tudo bem?
— Antigamente você era pontual! — reclamou ela,
andando atrás dele pelo apartamento.
Hogan foi para o quarto bocejando.
"Meu Deus, ele ainda nem acordou direito!", pensou ela,
desanimada. "A noite deve ter sido movimentada!"
— Sabe, gatinha, as coisas mudam. Minha vida mudou
muito nesses dezoito meses.
Leilah caminhou aflita até a janela. Sentiu, através das
palavras dele, que existia alguma coisa estranha. Mas não
sabia definir o quê.
Ela já trabalhava para a Spencer Associates quando
ambos se conheceram, mas tinha um cargo sem importância.
Para que adquirisse experiência, tinham-na designado para
acompanhar Hogan no circuito de tênis. Ele estava entre os
vinte melhores do mundo e Saul, com sua esperteza,
selecionara Hogan como um "investimento promissor".
Quando a Spencer Associates lhe ofereceu um contrato, Hogan
o assinou, mas fez questão de uma cláusula: que o tênis viesse
antes de tudo e que ele tivesse o poder de escolher os produtos
que iria promover. Àquela altura já tinha vários
patrocinadores, mas Saul rapidamente dobrou o número.
Hogan tinha um gênio calmo e alegre; era o tipo de
pessoa de quem todos gostavam. Seu belo físico também
ajudava. Leilah ainda se lembrava da primeira vez que o vira,
caminhando em volta da quadra, a jaqueta jogada
displicentemente nas costas, algumas raquetes debaixo do
braço.
— Minhas ordens são para cuidar de suas viagens e
reservas de hotel — explicara ela ao se apresentar, notando
que Hogan examinava-lhe os cabelos castanhos e o corpo bem-
feito.
— Devo dar os parabéns a Saul Spencer — comentara
ele. —Colocar um anjo para me proteger é bom demais!
— E, se precisar de ajuda durante as entrevistas ou em
relação a seus patrocinadores, estarei à disposição.
— Vai se esforçar para transformar minha vida num
paraíso?
— Tentarei — prometeu ela, no mesmo tom brincalhão.
Os olhos dele não a deixaram um só instante, e as
mensagens que transmitiam foram claras. O primeiro passo
em direção ao paraíso tinha sido dado e nas semanas

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seguintes, dias maravilhosos em Monte Cario, Johannesburg,
Los Angeles e Houston, os dois tinham feito a caminhada
juntos. Entre beijos apaixonados, danças sob céus estrelados,
momentos divinos em que permaneciam abraçados, até a
noite em que conheceram o paraíso; na cama de hotel de
Hogan, nos Estados Unidos, tudo parecera um sonho. Ele fora
um amante delicado mas viril. Leilah percebeu que lidava com
um homem experiente e ficou grata por aquela noite ter sido
tão maravilhosa.
— Eu te amo, gatinha — Hogan murmurou quando se
deitou ao lado dela, depois de terem feito amor.
— Eu também te amo, Hogan.
Mas ele jamais pertenceria a mulher alguma; só o tênis
era sua paixão, e o dominava por completo. Leilah e as outras
que a sucederam vinham em segundo plano. Durante algum
tempo o amor ofuscou-lhe essa verdade e ela voltou a Londres
num estado de euforia. Seu amor era recente mas muito
especial, e a envolvia numa nuvem cor-de-rosa de felicidade.
Nas semanas seguintes ela quase não o viu, por causa dos
torneios, mas no reencontro o mundo se transformou e ganhou
beleza, paz. Leilah sentia-se viva quando perto de Hogan: o sol
brilhava vinte e quatro horas por dia, as flores
desabrochavam, todos sorriam e ela flutuava.
— Você é meu delírio — brincou ele um dia. — Depois de
um fim de semana em seus braços eu fico arrasado.
Ela riu, deliciada.
— Mas você fica a maior parte do tempo na cama!
— Não conte ao meu treinador, hein?
— Isso o prejudica? — quis saber ela, preocupada. —
Atrapalha seu jogo?
— De que espécie de jogo você está falando? Acho que sou
bom em ambos.
— Então me convença...
A vida era cheia de alegria e paixão: os dois gozavam
cada minuto do tempo roubado entre os jogos. Nada mais
importava naqueles dias senão o louco amor que os unia.
Hogan estava numa fase ótima e conseguia vitórias
importantes. Os jornais comentavam, o público aplaudia.
Tudo parecia perfeito, mas nuvens escuras estavam se
acumulando em volta deles.
O primeiro sinal de que a vida com Hogan não seria
tranqüila surgiu quando, irritado, Saul a chamou para uma
conversa particular.
— Quando foi a última vez que você e Hogan estiveram

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juntos? — perguntou, cruzando as mãos gorduchas sobre a
barriga.
Sentindo a crítica, Leilah se pôs na defensiva.
— No último fim de semana. Por quê?
— Ele viajou para ver você?
— Não. Eu é que voei até Paris para vê-lo.
— Sabe que ele perdeu alguns games esta semana?
— Sim, ele me contou. Mas ainda assim conseguiu ganhar
os jogos.
— Não acha que já é tempo de vocês dois se acalmarem
um pouco, moça? Se Hogan pretende ganhar prestígio e
chegar a Wimbledon, precisa de vitórias indiscutíveis!
— Ele me disse que já voltou à antiga forma.
— Pois eu acho que ele vai ter problemas, isso sim. Estive
conversando com o treinador è ele me garantiu que Hogan
vem mudando muito. Uma mudança sutil, reconheço, mas ele
não anda mais tão determinado como costumava ser. E nós
dois sabemos por quê, não sabemos?
— Isso é injusto, Saul! Ele já teve outras namoradas e
nada demais aconteceu!
— Acontece que ele nunca se "apaixonou", mocinha. Você
é uma moça inteligente e deve olhar objetivamente para isso.
Ele tem vinte e seis anos e, embora se mantenha entre os
melhores tenistas nos dois últimos anos, e embora tenha
vencido vários torneios importantes, nunca conseguiu chegar
a Wimbledon. Talvez este seja o momento decisivo. Se ele
vencer, seu futuro estará assegurado, seu nome valerá
milhões. Mas. . . — fez uma pausa dramática antes de
prosseguir — se Hogan falhar agora, fará parte da legião dos
tenistas de segunda categoria. Até admito que ele poderia
ganhar um bom dinheiro assim mesmo, mas não durante
muito tempo. É isso que quer para ele?
Leilah sabia que fora encostada contra a parede.
— Não.
— Então deixe o garotão em paz.
Leilah sentia-se completamente abalada.
— Vou ter uma conversa com ele, pode ficar tranqüilo.
— Não faça isso, beleza. Só vai aborrecê-lo. Hogan é
teimoso quando acha que está sendo manipulado. Tudo que
quero é fazer com que ele não se exalte. Use seus dotes
femininos e mantenha-o um pouco a distância. Dê ao rapaz
mais tempo para se concentrar em coisas que realmente
interessam.
— O tênis, por exemplo.

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— Exatamente.
Relutante, Leilah começou a se afastar de Hogan. Nas
semanas seguintes inventou uma série de desculpas para não o
encontrar: uma gripe terrível, obrigações familiares, trabalho
acumulado. Queria o bem de Hogan e faria qualquer sacrifício
por ele. Mas às vezes se perguntava se não estava se afastando
demais, e começou a sentir medo. Se estava protegendo a
carreira de Hogan, não estaria também prejudicando o
relacionamento entre ambos? Havia momentos em que
questionava a opinião de Saul e se achava uma ingênua por
aceitá-la. Ele era um homem sem coração, que só se
preocupava com dinheiro, e muito provavelmente nunca
pensara na felicidade de Hogan. Mas por que estaria
interessado em fazer aquele amor morrer? Afinal de contas,
outros tenistas tinham namoradas, esposas, e ninguém as
acusava de atrapalhar nada. Por outro lado, Leilah tinha que
reconhecer que seu relacionamento com Hogan era exigente e
intenso. Nem poderia ser de outro modo: cada minuto era
conquistado a duras penas.
Hogan, no entanto, não parecia perceber o
distanciamento dela e isso era o que mais doía. Será que ele
realmente a amava? Por que ignorava o que estava
acontecendo? Na certa começava a se cansar dela, pois do
contrário não se acomodaria tão facilmente às constantes
ausências de Leilah. Ela ficava angustiada por ver o homem
que amava continuar a agir como se tudo estivesse
caminhando bem. Não havia outra alternativa senão manter
as coisas no mesmo pé e, porque Saul não tocara mais no
assunto, Leilah achou que o chefe estava satisfeito. Mas não
era esse o caso. . .
Sem aviso, o ritmo de trabalho dela mudou. Em vez de
continuar em Londres, Leilah recebeu ordens para tratar de
negócios nos Estados Unidos e visitar seguidamente várias
capitais européias, substituindo os executivos que estivessem
doentes ou em férias. Ela sabia que tinha sorte por ser a
escolhida, pois a experiência adquirida era inestimável, e a
princípio sentia-se envaidecida pela confiança que Saul
depositava em seu trabalho.
— Você está predestinada a chegar ao topo, beleza — ele
dizia enquanto lhe comunicava a nova missão. — Logo, logo
estará dirigindo uma filial.
Quando ela descobriu que Hogan não se sentia à vontade
com aquela escalada no mundo dos negócios, Leilah sentiu um
grande alívio. Então, apesar de tudo, ele ainda se importava!

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— Essa história de. ser mulher de carreira significa que
eu mal consigo ver você! — ele se queixou um dia, e Leilah se
aconchegou nos braços morenos, encantada.
— Você não tem o seu tênis?
— É muito diferente.
— Machista!
— É normal que os homens lutem por uma carreira —
retrucou ele abraçando-a com mais força —, mas morro de
medo de garotas baixinhas metidas a gente grande.
— Já percebi.
— É uma forma de falar. Desculpe.
— Também já percebi.
— O problema é que sou louco por garotas que tenham
esse corpinho bonito e essa cabecinha inteligente.
— Oh, Hogan...
— E o problema é que também não agüento ficar longe
dessa garota.
Leilah mordeu os lábios, indecisa. Naquele momento
percebeu que seu rosário de viagens não fora coincidência.
Saul não se satisfizera com um simples distanciamento; agora
tentava erguer uma barreira entre os dois. Pensou se deveria
contar a Hogan o que estava acontecendo, como fora forçada
a agir daquele modo. Ousaria criar problemas? Hogan ia
muito bem no tênis e, se ela contasse que Saul resolvera
interferir em suas vidas, ficaria furioso. Ele já encarava o
velho com certa desconfiança, chamando-o muitas vezes de
vigarista, e provavelmente sua reação seria a pior possível. A
temporada de Wimbledon estava se aproximando e não era
aconselhável aborrecê-lo. Se nas quadras ele mantinha o
sangue-frio, fora delas as coisas eram muito diferentes. Não,
uma discussão a essa altura era impensável. Leilah mudara de
assunto, mas, quando, um pouco mais tarde, Hogan lhe
contara que tinha uma entrevista marcada com Saul para o
dia seguinte, sentiu uma fria apreensão.
— Por que ele quer falar com você?
— Parece que pretende me dar os parabéns pelas últimas
atuações — ele respondeu, meio brincando, mas Leilah sabia
que se sentia orgulhoso.
E era justo; para se chegar ao topo todo sacrifício era
pouco. Mas, na manhã seguinte, descobriu que também seria
sacrificada. . .
O som de uma porta batendo a trouxe de volta à
realidade. Hogan entrou na sala, o blusão de couro marrom
jogado displicentemente nos ombros. Vestia calça cor de areia

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e suéter de gola alta, no mesmo tom.
Leilah consultou o relógio. Não havia a menor dúvida de
que chegariam atrasados. Provavelmente o motorista se
cansara de esperar e fora embora, e ela teria que arranjar um
outro táxi. Começou a se aproximar dele, irritada.
— Esfrie, gatinha — pediu Hogan, sorrindo, e vestiu a
jaqueta.
— O nome do fabricante está aparecendo — avisou Leilah,
levantando a mão para arrumar a etiqueta. Mas parou logo
em seguida. — Ou isso faz parte de alguma campanha?
— O logotipo está no meu peito. — Ele abriu um pouco o
casaco e mostrou uma pequena insígnia.
— Desconfio que, se tirasse todas as marcas que estão nas
suas roupas, você ficaria completamente nu.
— Está me imaginando assim? — perguntou ele, rindo. —
Sabe que é uma boa idéia? — O olhar que a percorreu de alto a
baixo a fez sentir-se despida. Ficou escarlate!
— Está pronto? — perguntou, furiosa pelo poder que ele
tinha de perturbá-la.
Hogan apanhou uma enorme sacola e várias raquetes. .—
Esta tarde pretendo treinar um pouco. Será que poderia me
arranjar um parceiro?
— Vou tentar. Agora vamos.
Leilah teve que reconhecer que Hogan tinha um fascínio
especial para lidar com as pessoas. Ela temera que a demora
provocasse má vontade e caras emburradas, mas esquecera
do carisma de Hogan. Ele entrou na sala da coletiva como um
conquistador, sorrindo e retribuindo os cumprimentos, e em
minutos, como Saul profetizara, todos estavam
indiscutivelmente em suas mãos. Hogan controlava a
situação, detalhando os ferimentos recebidos no desastre de
automóvel e explicitando os exercícios que era obrigado a
fazer todos os dias. Leilah sabia que ele tinha repetido até a
exaustão tudo aquilo, nos vários países que visitou, mas ainda
assim conseguia manter uma aparência entusiasmada.
— Primeiro faço uma hora de exercícios. Depois levanto
pesos. Depois corrida e tênis, tênis, tênis.
— O que faz nas horas de folga? — um repórter chinês
quis saber.
— Faço exercícios na cama — respondeu Hogan, com
-uma piscadela.
O fato de olhar e sorrir para Leilah ao dar a resposta fez o
sangue dela ferver. Muito bem, aquelas palavras dúbias
provocaram uma gargalhada geral, como era a intenção dele,

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mas para tudo havia limites! Leilah o olhou, furiosa. Sabia
muito bem que os homens o invejavam e que as mulheres
estavam loucas para chamar-lhe a atenção. Ele reforçava
muito bem sua imagem, só que não era mais uma imagem
somente. Sob a inconseqüência havia mais inconseqüência,
porque Hogan parecia mesmo ter-se transformado no playboy
esportista que Saul desejava. Por isso Leilah se surpreendeu
quando o viu mudar de atitude ao falar do futuro.
— Não tenho bola de cristal nem planos detalhados. Por
enquanto minha maior preocupação é voltar a competir.
Houve uma série de perguntas. Os jornalistas tentavam
fazê-lo dizer alguma coisa quanto ao futuro, mas Hogan se
recusou a previsões.
— Esta volta às quadras é para valer ou é somente uma
promoção?
— Eu nunca me queixo por ganhar dinheiro — respondeu
Hogan, sem sorrir. — Gosto de viver bem, como qualquer um.
Mas minha volta é mesmo para valer; tudo isso não é feito
somente para conseguir dinheiro e fama. Sou um profissional
e tênis é o meu negócio. Quando estou na quadra não ligo para
os aplausos da torcida nem para o crescimento apreciável de
minha conta bancária; estou lá para fazer o melhor que
conseguir. Para mim o tênis é a arte e sinto uma grande
satisfação sabendo que a desempenho bem. Minha finalidade é
sempre vencer.
A coletiva terminou quando Hogan se levantou,
declarando que estava na hora de parar de falar em tênis para
começar a jogá-lo. Depois de alegres despedidas, os jornalistas
se foram.
— Vou encontrar Terri para uma sessão de fisioterapia.
Telefonei a ela e sei que está me esperando.
— Bem que você podia ter me avisado — protestou Leilah,
aborrecida por ele ter ousado fazer planos sozinho.
— Estou avisando agora.
Hogan estava decidido a agir a seu modo, e Leilah
percebeu isso enquanto o acompanhava, pelo corredor
acarpetado, em direção aos elevadores. E como um bom
trabalho poderia ser feito se ele ignorava o que ela
programava?
Hogan parou para dar um autógrafo a uma adolescente
enquanto Leilah continuava a andar, o sangue fervendo de
raiva. Ela era tão delicado com as pessoas que a vontade dela
era bater com uma das raquetes em sua cabeça e acabar com
aquela postura altiva.

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— E quanto ao almoço? — perguntou ela quando Hogan a
alcançou. Tentara falar com despreocupação mas não
conseguira.
— Vou pedir que mandem qualquer coisa para o quarto
de Terri. Se eu comer em público as pessoas são capazes de
não me deixar em paz. Esta tarde vou treinar. — Ajeitou as
raquetes embaixo do braço. — Ajudaria muito se você
conseguisse que Y.C. Wong viesse treinar comigo.
— Mas hoje é véspera do Ano Novo Chinês e ele na certa
estará ocupado!
— Sei que pode fazer isso por mim, gatinha. E faça, por
favor. — Encarava-a sem sorrir. — Ajude-me, Leilah. — Ela o
olhou, assustada, ao notar aflição em sua voz. Os dedos fortes
puxaram-na para mais perto. — Você foi a melhor coisa que
me aconteceu e. . . e. . .
O que Hogan pretendia dizer, ela nunca soube, porque as
raquetes começaram a escorregar e ambos tentaram evitar
que caíssem, mas sem resultado. Leilah viu-se agarrada à
manga do casaco de couro, enquanto a outra mão, espalmada
sobre o peito largo, sentia os músculos tensos sob o suéter.
Juntos, eles se endireitaram.
— Do chão não vão passar — ele gracejou, os olhos
brilhando.
Ela devolveu o sorriso e um clima de magia os envolveu.
Era como nos velhos tempos: só os dois, sem mais nada que
importasse no mundo. Ela riu, tocando levemente com a ponta
das botas as raquetes espalhadas pelo tapete.
— Afinal, quem liga para umas raquetes bobas?
— Quem liga, não é? — A voz dele era grave e profunda.
Devagar, Hogan esticou a mão e seus dedos tocaram
levemente o queixo de Leilah. Uma mecha castanha se soltou
da trança e ele a tomou entre os dedos, olhando o cabelo macio
com ar solene e colocando-o atrás da orelha. Leilah sentiu
tensão nos músculos dele e a hesitação que o dominava.
Percebia que Hogan queria dizer alguma coisa, alguma coisa
muito importante, mas no último instante desistiu.
— Leilah!
Ela virou a cabeça ao ouvir a voz de Glenn. Ele se
aproximava, sorrindo.
— O que aconteceu aqui? — perguntou, ao ver as raquetes
espalhadas. Depois, sorrindo para Hogan, estendeu a mão. —
Em nome do Dinasty Hotel e no meu, dou-lhe as boas-vindas a
Hong-Kong.
Hogan retribuiu o cumprimento com a mesma

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amabilidade, mas, quando Glenn beijou Leilah no rosto, não
conteve uma expressão preocupada. Ainda abalada pela
violenta atração que os dominava, ela se sentia sem ação.
Felizmente Glenn nada percebeu e fez uma série de perguntas,
perguntas que ela escutara Hogan responder há menos de
meia hora, mas que foram respondidas com a mesma
paciência.
— Eu gostaria de dar uma olhada nas quadras — sugeriu
Hogan quando o australiano lhe assegurou que o Dinasty
Hotel estava inteiramente à sua disposição.
— Então vamos lá! — Glenn sorriu.
Leilah escapou para telefonar para Y.C. Wong. O tenista
sentiu-se extremamente honrado com a idéia de treinar com
Hogan, prometendo estar no hotel dentro de uma hora. Aquela
presteza toda á irritou. Por que todo mundo bajulava Hogan?
Glenn, por exemplo, não escondera o entusiasmo. Ela
caminhou até as quadras e ficou ainda mais irritada quando
percebeu que o australiano continuava com os elogios.
Depois de cuidadosa inspeção, Hogan aprovou a quadra,
o que causou verdadeiro alívio a Leilah. Mas sua satisfação
durou pouco, pois, quando chegaram ao Health Club, que
deveria ser usado em caso de chuvas, Hogan ficou sério.
— Apertado demais — sentenciou, o olhar inspecionando
tudo em volta.
— Joga-se tênis aqui regularmente — protestou Leilah. —
Veja, o chão está marcado.
— Com espectadores?
— Não, mas vamos tirar as divisórias — Glenn apressou-
se em explicar, estalando os dedos para chamar um
empregado e indicando que devia remover as paredes
divisórias.
— Mesmo assim não há muito espaço. E a distância é
vital. Glenn se afastou até o outro extremo e gritou de lá:
— Há uma boa distância sim!
— Sinto, mas não há — Hogan falava baixo e Leilah
conhecia aquela atitude: ele estava ficando irritado e logo
explodiria.
— Quem sabe damos um jeito. . . — insistiu Glenn.
— Não há jeito — resmungou Hogan. — Sabe a velocidade
de uma bola de tênis? Se alguma ricochetear e atingir um
espectador, haverá um acidente sério. O hotel poderá ser
processado e eu também.
Glenn voltou para o centro do ginásio, onde estavam
Leilah e Hogan.

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— Não pode suavizar os saques? Hogan o olhou,
incrédulo.
— Eu jogo tênis para vencer. Como poderei jogar se ficar
preocupado com a segurança dos espectadores?
Leilah se irritou quando Glenn deu uma risada; pelo jeito
era o único a achar graça.
— Então o que faremos, se chover? — perguntou
desalentada.
— Cancelamos. — A resposta de Hogan foi definitiva.
— Cancelar? — Os olhos azuis de Leilah mostraram
espanto.
— Você vai ter que rezar bastante, doçura — disse Glenn
sorrindo —, para que os deuses nos mandem sol.
Ela cerrou os dentes. Glenn sempre lhe dava apoio mas
agora, influenciado por Hogan, parecia despreocupado. Como
se podia falar em cancelamento se isso significava uma série
de problemas? Ela perdera dias e dias na organização,
centenas de entradas tinham sido vendidas e Glenn comentava
o cancelamento como se nada significasse! Era culpa de
Hogan, só podia ser. Ele estava interessado em atrapalhar sua
vida. Ainda com raiva, ela comentou, quando saíam do
ginásio:
— Marquei um jantar esta noite com uma das mais
importantes jornalistas da cidade.
— Vá sozinha, se quiser, gatinha. Eu não vou. Se esperam
que eu vença três partidas de tênis amanhã, têm que me dar
condições de dormir bem esta noite. Vou fazer uma sessão de
terapia com Terri e, depois, direto para a cama.
Leilah teve vontade de perguntar com quem, mas se
conteve. Não lhe dizia respeito se Terri era ou não
fisioterapeuta!
— Marque o jantar para outro dia da semana —
recomendou ele, conciliador. — Você é muito respeitada por
aqui, e com seu sorriso bonito tenho certeza de que vai
conseguir. Mas se prefere que eu fale com a tal jornalista. . .
— Não, obrigada!
— Gostaria de convidá-lo para jantar na véspera do Ano
Novo — convidou Glenn, para serenar os ânimos.
Leilah o olhou, furiosa. Por que incluir Hogan numa festa
íntima?
— Eu gostaria muito — respondeu Hogan, olhando para
ela com bom humor. — Mas antes tenho que pedir permissão
para a minha babá. — Virou-se para Leilah: — Por favor, srta.
Morrison. . .

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— É um prazer para nós — disse Leilah, um sorriso
contrafeito nos lábios. — Devemos incluir sua. . . sua
acompanhante?
— Estou viajando em companhia de uma fisioterapeuta —
Hogan explicou a Glenn.
— Então traga-a também. Que tal incluirmos Y.C. Wong
no grupo? Jasmine estará no show e ele gostará de vê-la.
— E poderemos embrulhá-la num cobertor se os hóspedes
começarem a atirar coisas — resmungou Leilah.
— Eu a vi ensaiando e não a achei tão ruim — disse
Glenn, despreocupado. O bom humor dele era enfurecedor.
— A voz de Jasmine é patética! — insistiu ela.
— Na verdade, ela é melhor de se ver do que de ouvir. —
Glenn estava decididamente de bom humor.
Os três se separaram. Hogan tomou o elevador para ir ao
encontro de Terri; Leilah e Glenn foram verificar a venda das
entradas.
— Todos os ingressos foram vendidos — informou a
recepcionista do hotel.
— Imagine só a irritação dessa gente se chover! — Leilah
estava alarmada. — O que vamos fazer?
— Marcar para outro dia.
— E se chover novamente?
— Não fique assim preocupada — aconselhou Glenn,
dando-lhe um abraço de despedida.
"Como não me preocupar?", pensava Leilah ao voltar
para o escritório.
O trabalho de uma relações públicas dependia de um
planejamento perfeito. Mas também de flexibilidade. Resolveu
cruzar a ponte quando chegasse a ela.
Violet estava agitadíssima, rindo mais que o normal, feliz
por causa do Ano Novo que chegava. Bateu rapidamente as
cartas que Leilah lhe ditou, endereçou-as e minutos depois
voltou com uma enorme caixa, com um bolo.
— Especial para o Ano Novo — anunciou. — Prove, prove.
Logo a sala de Leilah se encheu de gente dos escritórios
vizinhos, para a comemoração. Todos falavam e riam ao
mesmo tempo, enquanto comiam massas leves e deliciosas
acompanhadas de conhaque.
Leilah voltou ao seu apartamento completamente zonza.
Uma amiga telefonou convidando-a para sair, mas ela deu
uma desculpa e recusou o convite. Cochilou um pouco no sofá e
depois, quando o efeito do álcool diminuiu, comeu uma maçã e
ligou a televisão. Os programas falavam sobre os quatro dias

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de festividade, mas uma das notícias comentava as exibições
de Hogan no Dinasty.
Leilah cruzou os dedos. Pretendia acordar de madrugada
para ver se o tempo estava bom e se Hogan tinha se levantado.
Se dependesse dela, ele nunca mais se atrasaria.
Ficou atenta aos ruídos no corredor, para verificar se
Hogan voltara, mas não escutou nada. Deveria telefonar a
Terri para saber a que horas ele saíra? Seu pulso se acelerou.
Apesar dos comentários dele, ela não era babá de ninguém e,
além disso, não tinha nenhuma vontade de ser informada de
que Hogan Whitney resolvera passar a noite em companhia
da outra.
Leilah pulou da cama muito cedo e abriu as cortinas. O
céu estava azul, sem uma única nuvem, e o sol parecia ter
vindo para ficar. Ela sentiu um alívio imenso. Estava tão bem-
humorada que, depois de tomar banho e se vestir, decidiu
acordar Hogan e convidá-lo para o café da manhã. Mal
passava das oito e meia quando bateu levemente à porta do
apartamento dele. Estava convencida de que Hogan ainda
dormia e se espantou quando o viu abrir a porta.
— Bom dia, gatinha — cumprimentou, ofegante.
Ele na certa fazia seus exercícios, pois vestia um short de
cetim amarelo e tinha uma toalha em volta do pescoço. Os
braços musculosos e bronzeados estavam cobertos de suor, e o
coração de Leilah começou a bater forte ao perceber a
respiração ritmada que fazia o peito largo se mover.
— Vim ver se você quer comer alguma coisa — Leilah
conseguiu dizer, olhando com determinação para o rosto dele.
Hogan parecia muito feliz, pois começou a se movimentar
simulando corrida enquanto examinava o jeans e a camiseta
de Leilah.
— Tenho que reconhecer que o lugar certo para mim é em
cima de você — comentou, respirando com vigor.
Ela olhou de relance a camiseta com o rosto de Hogan
estampado e o slogan: "Admire um campeão em ação".
— Gosta?
— Gosto sim. . . deles... — respondeu Hogan, o olhar
maroto nos seios firmes. — Este efeito em terceira dimensão é
estupendo e tenho certeza de que funciona mais do que os
anúncios nos ônibus. Nunca pensou em vender espaço para
propaganda? Eu cobriria qualquer oferta.
— Pare com isso, Hogan! Ele sorriu.
— Bem, então agradeço seu convite, mas já tomei café.
O bom humor de Hogan contagiava: Leilah viu-se rindo

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também.
— A que horas levantou?
— Às sete.
— Tão cedo?
— Estive me exercitando. Logo que eu tomar banho e você
comer, vamos para o hotel fazer um pouco de exercício,
está bem?
— Seu desejo é uma ordem!
O profissionalismo de Hogan era impressionante. Leilah
tivera uma leve desconfiança sobre se as disputas em que ele
tomava parte eram simuladas ou não. Sabia que nas viagens
de exibição era comum os jogadores se descuidarem e as
partidas, por conseguinte, se tornarem desinteressantes. Mas
com Hogan era diferente. No instante em que ele pisou na
quadra Leilah pôde perceber que o público teria um espetáculo
de primeira. Ela conhecia a fantástica determinação que
Hogan tinha de vencer e notou que não era um sonho vão a
retomada da posição entre os vinte melhores do mundo.
Sentada no meio da multidão, ela lembrou-se de outras
vezes em que o vira jogar. Nada parecia ter mudado. Aquele
estilo seguro, bonito, era inconfundível. Com os cotovelos
apoiados nas pernas, o queixo nas mãos, Leilah o admirava.
Como conhecia bem aquela pose, aqueles gestos todos. . .
Terminada a primeira partida, ela tratou de levá-lo para
longe da quadra, a fim de evitar que ele fosse importunado,
mas foi forçada a esperar a fila interminável de gente pedindo
autógrafos, fazendo perguntas curiosas e tirando fotos.
— Não sei como você agüenta! — ela comentou, quando
conseguiu levá-lo até um quarto no hotel, reservado
especialmente. — Deve estar exausto e ainda sorri para todos!
— É o meu ofício, gatinha. — E desabou numa poltrona, o
suor escorrendo.
— Dia após dia você responde às mesmas perguntas. As
pessoas costumavam fazer confusão antes. . . antes do
acidente. Mas aqui em Hong-Kong as coisas estão beirando a
histeria.
— Não se esqueça de que isso passa. As massas mudam de
opinião com muita rapidez. Um dia o veneram, no outro
querem linchar você.
— Mas seu caso é diferente. Existe um exército de
mulheres que viria em seu socorro.
— Por falar em mulheres, onde está Terri?
— Vou buscá-la.
Leilah não conseguiu disfarçar o gelo da voz. Hogan

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parecia ser tão apegado àquela moça quanto fora um dia a
ela. Podia ser irracional, mas pensar que a bela morena
estaria com Hogan entre as exibições a aborrecia muito. Afinal
de contas, ele nunca precisara de uma fisioterapeuta!
Ela resolveu não assistir ao jogo noturno. Quando Hogan
surgiu na quadra iluminada, Leilah saiu à procura de Glenn e
de um pouco de conforto. O Ano Novo Chinês trazia um
intenso movimento ao hotel e Glenn assistira somente a alguns
minutos da partida da manhã. Desde então tivera que resolver
vários problemas e estava examinando uma lista de reservas
quando ela entrou no escritório. Glenn bocejou e espreguiçou-
se, pôs os papéis para um lado, levantou-se e foi recebê-la.
— Tudo bem na quadra, querida? Leilah encostou a
cabeça no peito largo.
— Muito bem. O jogo desta noite vai ser fácil. Esta manhã
Y.C. Wong foi derrotado sem apelação; portanto imagino que
o adversário da noite seja liquidado na metade do tempo.
— Espero que Hogan não acabe logo com o jogo. As
pessoas preferem espetáculos longos.
Leilah se afastou e foi até a janela. Bem lá embaixo, a
quadra era um retângulo luminoso.
— Ele só joga para ganhar. Não cede ponto algum.
Quando vence, é com estilo. Sempre deixa os fãs satisfeitos.
Glenn mandou vir café e os dois conversaram sobre o dia,
concordando que os jogos de tênis foram vantajosos para
todos. Leilah olhou para o relógio na parede.
— Acho que já vou descer. O jogo deve estar terminando.
— Vou com você.
Desceram e viram que somente quatro dos cinco sets
tinham sido jogados.
— Hogan está demorando muito — protestou ela ao se
sentar ao lado de Glenn no banco de madeira.
— Parece que o adversário não é tão fraco quanto
parecia. Olhe o placar.
— Hogan deve estar protelando de propósito, isso sim.
O placar mostrava um ponto de vantagem para o
adversário chinês. Leilah o observava, desconfiada, e foi com
pesar que viu Hogan perder o game seguinte. Seus olhos agora
o examinavam com atenção: ela pôde notar que Hogan não
mostrava a desenvoltura de antes. Seus movimentos eram
lentos, forçados.
Leilah franziu a testa e o sangue lhe gelou nas veias.
Hogan estava com problemas. Com sérios problemas.

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Capítulo IV

Leilah sentia-se agoniada enquanto seus olhos


focalizavam a figura atlética sob os holofotes. Apoiado nos
calcanhares, Hogan se inclinou para a frente. Sob a camiseta
molhada de suor, os poderosos músculos estavam retesados. A
atitude era de intensa concentração. Mas seria só isso? Será
que ela não estava detectando um brilho desesperado no olhar
dele? Hogan não estaria lutando para conseguir novamente a
vantagem?
— Alguma coisa está errada, Glenn.
Ele riu dos temores dela, tranqüilizando-a.
— Hogan está ótimo.
Hogan ganhou o ponto seguinte, enviando uma bola
violenta.
— Está vendo? Ele estava somente dando corda para o
sujeito — comentou o australiano, sorrindo, quando o
placar apontou a virada.
Mas, apesar de outras tantas jogadas magistrais, que
deixavam o adversário sem ação, Leilah continuou aflita. Será
que Glenn não via que Hogan não estava cobrindo todos os
ângulos como deveria? Começou a externar seus temores e ele
riu.
— Você se esquece de que ele jogou tênis o dia todo. Que
mais quer? Um super-homem?
Hogan venceu o game e Leilah começou a se acalmar. Não
o via jogar há quase dois anos, e talvez o estilo tivesse
mudado. Acalmou-se ainda mais quando ele pareceu
transformar os últimos minutos numa demonstração de
virtuosismo, com forehands tão precisas que chegavam ao
limite da linha de base, bolas com efeito, respostas ousadas. O
público vibrava e, quando o jogo finalmente terminou, todos se
levantaram para aplaudir delirantemente.
— Game, set e partida: Hogan Whitney. Não há nada
errado com ele — declarou Glenn. — Como você mesma disse,
nosso herói estava querendo oferecer um espetáculo
inesquecível.
Mas Leilah não estava convencida disso. Depois que
Glenn voltou à sua sala, ela abriu caminho em direção à
quadra. Alcançou Hogan, que dava autógrafos em todo tipo de
papel, em viseiras, até mesmo no gesso de um braço quebrado.

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A excitação era tangível à sua volta: todos queriam vê-lo,
tocá-lo.
O olhar dele mostrou alívio quando a viu. Estendeu um
braço.
— Vamos, Leilah.
Era difícil abrir caminho no meio da multidão. Mais e
mais cadernos de autógrafos surgiam, mais fãs para aclamá-
lo. Os dois caminhavam lentamente e Leilah notou que ele
estava pálido. Tinham posto uma toalha em seu pescoço, e de
tempos em tempos Hogan enxugava o suor que escorria por
seu rosto. Leilah via nitidamente as linhas de exaustão em
volta dos olhos.
— Preciso sair daqui — ele murmurou, e continuou a
avançar em direção a seu quarto no hotel, dando autógrafos
sem parar.
Leilah sentiu-se grata pela guarda de segurança que
Glenn sensatamente colocara na porta do apartamento
reservado para Hogan, pois grupos de adolescentes o
seguiram, dispostos a não deixá-lo em paz. Hogan entrou no
quarto e desabou numa poltrona, segurando a cabeça entre as
mãos. Estava lívido. Olhando-o assim, Leilah não pôde deixar
de se sentir culpada: afinal, fora ela quem organizara um
programa tão massacrante.
Depois de alguns momentos ele a encarou e sua expressão
traía ansiedade.
— Eu não me livrei dos fãs com muita pressa, não foi? O
cansaço pode ser interpretado como desdém, e isso é a última
coisa que quero que pensem. Mas eu tinha que sair dali.
— Você se comportou muito bem — ela assegurou,
servindo-o de suco de laranja.
Hogan tomou tudo de uma só vez. Secando o bigode com
as costas da mão, ele sorriu, sombrio.
— Obrigado. — Depois começou a massagear a coxa,
preocupado.
Sob os pêlos negros da perna Leilah viu as cicatrizes, o
legado do acidente.
— A perna o incomoda?
— Não, claro que não!
Ela se assustou com aquela reação ríspida e inesperada.
Passara o dia todo cuidando dos interesses daquele homem e,
quando fazia uma pergunta simples e amável, ele explodia.
Que direito tinha Hogan de se irritar? Afinal, só precisava se
preocupar com o tênis, e provara sua supremacia três vezes
naquele dia. Quanto a pessoas como ela, tinham que suportar

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toda a carga: tratar de itinerário, arranjos de viagens,
dinheiro, pagamento de impostos, saúde. . . principalmente
saúde!
— Imagino que deseje que eu procure Terri — disse ela
com frieza.
Hogan passou a mão pelos cabelos grudados de suor.
— Desculpe por eu ter gritado com você.
— Sou paga para isso. Sou o saco de pancadas da Spencer
Associates. — E ergueu orgulhosamente a cabeça. — No mais,
é melhor perder a calma comigo do que estragar sua imagem
frente ao seu público adorado! — Sabia que estava sendo
injusta, mas não agüentava mais. — Vou ligar para Terri.
Pegou o telefone. Se Hogan queria passar a noite com
aquela morena com sorriso de anúncio de pasta de dentes o
problema era dele. Ela não ligava a mínima!
— Vamos para casa. Estou arrebentado.
Leilah teve vontade de mandá-lo ir sozinho, de táxi, e
correr para a companhia bem-humorada de Glenn, mas a
ética a impediu. Gostando ou não, enquanto Hogan estivesse
ali era a responsável por seu bem-estar. Irritada, deu uma
resposta seca:
— Como quiser.
Hogan agradeceu e tratou de ir tomar banho. Isso foi o
suficiente para revigorá-lo e trazer-lhe de volta o bom humor.
Ele agora parecia interessado em agradar Leilah. Usava todo
o seu charme para ganhar novamente a simpatia dela, que,
por mais que se esforçasse, não conseguia resistir. Quando
chegaram ao apartamento, ela havia cedido completamente
aos encantos de Hogan e ria como uma criança. A resposta
rude dele, sobre se a perna o estava incomodando, servira
para alertá-la de que estava sim. Ela o conhecia bem demais
para perceber quando dizia ou não a verdade. Hogan
caminhava normalmente mas, ao surpreender o olhar
disfarçado dela em suas coxas, agora metidas em calças de
veludo cotelê bege, seus olhos ficaram tão sombrios que Leilah
não teve coragem de voltar ao assunto.
Quando chegaram à porta do apartamento, ele pôs a
sacola e as raquetes no chão e começou a procurar a chave.
Remexeu tudo, revirou os bolsos. A um certo momento,
levantou a cabeça e sorriu.
— Acho que ando meio desligado, gatinha. Lembro que
fechei a porta esta manhã e estava com tanta pressa que
esqueci de trancar. A chave está na mesa da cozinha. Você por
acaso não tem uma cópia?

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— Não tenho, mas o zelador. . . — Calou-se de repente.
— Então?
Hogan, de braços cruzados, se encostara à parede.
Olheiras escuras mostravam que ele estava exausto. Parecia
ter muito mais que vinte e nove anos.
— Bem, ele não está trabalhando hoje porque é Ano Novo
— explicou ela, tentando agir profissionalmente. — Dê-me
alguns minutos e irei lá embaixo ver se posso resolver alguma
coisa. Sei que existem cópias de todas as chaves.
Hogan passava o peso do corpo de um pé para o outro.
— Posso esperar em seu apartamento? Estou a ponto de
capotar. E não se esqueça de que é graças a você que estou
rodopiando como pião desde as sete da manhã.
Leilah o fez entrar no apartamento e depois saiu. Estava
cansada também. O caso da chave a tinha aborrecido e
irritado. Hogan na verdade precisava mesmo de uma babá,
não de uma enfermeira. Depois de muito perguntar, descobriu
que o zelador tinha levado todas as chaves para sua casa, em
algum lugar em Kowloon. Começou a ficar nervosa. O homem
não tinha telefone e a idéia de pegar um táxi àquela hora da
noite não a atraía nem um pouco.
Voltou ao seu apartamento com várias frases na ponta da
língua, para deixar bem claro o que achava de tudo aquilo.
Cuidar de Hogan podia ser sua obrigação, mas tudo tinha
limite.
Entrou na sala de estar bastante irritada, mas encontrou-
a vazia.
— Hogan?
Sua voz ecoou na noite silenciosa; depois escutou um
murmúrio confuso. Seguindo o som, Leilah foi para seu quarto
e descobriu Hogan estendido na cama, adormecido. Olhou
para ele, soltou um gemido de desespero e sua raiva acabou.
Ele parecia mesmo exausto. Adormecido o famoso tenista não
passava de um garotinho indefeso cujas pesadas pestanas
negras sombreavam o rosto, enquanto mechas de cabelos
despenteados caíam pela testa.
Ela estremeceu. Quantas vezes o vira assim adormecido,
sentira seu hálito suave na pele, suspirara feliz ao senti-lo
aconchegar-se a ela no meio da noite? Oh, Deus, como queria
tudo outra vez! Levou a mão fechada até a boca, tentando
afastar aqueles pensamentos insensatos. Não havia futuro
com Hogan, nunca houvera. A verdadeira paixão daquele
homem era o tênis. Era verdade que ele dissera que a amava, e
possivelmente a amara à sua moda, mas seus sentimentos

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eram superficiais demais para durar.
Leilah engoliu em seco enquanto se recordava da manhã
tenebrosa em que descobrira a verdade: que Hogan estava
disposto a sacrificar qualquer coisa, até mesmo a ela, em nome
do tênis.
Saul estava em Londres para uma de suas visitas
administrativas e Hogan tinha ido ao escritório a chamado
dele. Quando chegara a hora do almoço, Leilah saíra de sua
sala, no andar de baixo, e ficara à espera do namorado.
Tinham combinado almoçar num restaurante italiano das
redondezas e ela consultava impaciente seu relógio de pulso
porque o tempo passava e sua hora de almoço era limitada.
— Aqueles dois estão aos berros há mais de uma hora —
confidenciara a recepcionista quando Leilah subira até o
escritório de Saul. — Parece que o Sr. Spencer encontrou
alguém à altura dele. Hogan não cede, não é mesmo?
Passaram a manhã inteira discutindo. Não imagino por quê,
mas a coisa parece estar preta.
Leilah teve o pressentimento sombrio de que algo estava
para acontecer. Saul Spencer não chegara até o topo do
mundo dos negócios esperando que as coisas acontecessem;
era um homem de ação e naquele momento tentava manipular
a vida de Hogan. E a dela. Pela porta Leilah escutava o som da
voz do chefe, tentando convencer Hogan.
— Vou sair para o almoço — disse a recepcionista,
pegando a bolsa e o casaco. — Se eu fosse você lia uma revista,
porque a espera vai ser grande.
Leilah sorriu e se sentou na confortável poltrona de couro
negro. Durante algum tempo observou o imenso quadro
abstrato à sua frente; depois consultou novamente o relógio. O
tempo passava e nada de a reunião terminar. Sabia que
Hogan tentaria acabar o mais depressa possível com aquilo e,
quando a maçaneta girou, ela sorriu, cheia de esperanças.
Mas Hogan apenas entreabriu a porta e continuou escutando
Saul. Nem sequer a viu ali.
— Há quanto tempo você vive, dorme, come tênis? — a
voz trovejante insistia. — Desde menino! E o que lhe falta?
Wimbledon! Isto realmente importa?
— Claro que importa! Eu preciso de Wimbledon e você
está cansado de saber disso!
— Então encare os fatos objetivamente, meu caro!
O sorriso dos lábios de Leilah desapareceu e seu rosto
tornou-se tenso. Quando Saul dissera "Então encare os fatos
objetivamente", na verdade queria dizer "encare isso a meu

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modo, deste único modo". E ela já tinha uma idéia de quem
seria a vítima.
— É somente uma questão de prioridades — continuou
ele, implacável. — Tênis ou garotas.
"Garotas"! Saul falava como se Hogan dormisse com uma
mulher a cada noite! Leilah esperou que ele protestasse, que
dissesse que só havia uma mulher em sua vida, devotada e
compreensiva, que não representava risco à sua carreira. Mas
ele não o fez.
— O tênis vem antes, como sempre — foi a resposta de
Hogan.
— Então seja inteligente — exigiu Saul, aos berros.
— Eu sei o que estou fazendo!
— Reconheço que Leilah é linda, mas tem uma carreira
pela frente. £ uma executiva e não se contentaria em ficar em
segundo plano, tricotando o resto da vida!
— Sei disso!
Leilah começou a se assustar. Sua carreira era
importante, mas Saul estava distorcendo tudo.
— Não estou pedindo que viva como um monge — o chefe
mudou de tática. — Você tem sangue quente, é macho. Alguns
casos não o irão prejudicar; na verdade até o ajudarão a
aliviar a tensão,
— Como Leilah ajuda?
Hogan estava brincando, mas aquela não era hora para
brincadeiras e ela sentiu um profundo ressentimento.
"Então isso é o que sou", pensou. "Um divertimento! Como
uma dose de uísque ou um dia na praia!"
— Essa mulher pode arruinar sua carreira. — Saul
insistiu no ponto e Leilah se sentiu arrasada com as palavras
impiedosas.
"Por favor, Hogan, me defenda!'", ela implorava
silenciosamente.
Houve um instante em que Leilah teve vontade de entrar
naquela sala e se defender. Mas estava escutando conversa
alheia e não tinha esse direito. Seu sexto sentido a aconselhou
a sair dali e ignorar o que havia sido dito, mas a curiosidade
não deixou.
Gostando ou não daquilo, era sua vida que estava em
jogo, e ela queria saber, naquele momento, o que Hogan
pensava do relacionamento entre ambos, por maior que fosse
o risco.
— Ninguém vai arruinar a minha carreira, Saul!
Ninguém mesmo!

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— Então não se comprometa demais.
— É o que pretendo. Deixe as coisas comigo. A vida é
minha e vou levar as coisas a meu modo.
— Um casamento pode esperar — o chefe continuava com
sua voz possante, sem se deixar intimidar.
— Casamento é a última coisa que tenho em mente agora.
Arrasada, Leilah fechou os olhos. Eles não tinham falado em
casamento ainda, pois, embora se conhecessem há vários
meses, haviam passado muito pouco tempo juntos. Ainda
estavam se descobrindo. Entretanto, era quase certo que
algum dia se tornariam marido e mulher. Todo
relacionamento evolui e, quando tinham feito planos para um
futuro juntos, ela presumira. . . Pelo visto presumira demais.
— Ótimo! — trovejou Saul, aliviado. Sua agressividade
diminuiu. — Dê um tempo. Entendo seu apetite, mas vá com
calma, dê uma voltinha, várias voltinhas se preferir, mas
nunca esqueça o que vem antes.
— Acha que sou idiota? — Hogan exclamou, e deu uma
risada seca.
— Não, não acho. — Saul também ria.
A porta se fechou novamente e a conversa continuou em
voz baixa. Os dois pareciam estar discutindo planos que não a
incluíam. Atordoada, Leilah ainda ficou sentada um longo
tempo. Com algumas poucas palavras, Hogan fizera seu
mundo desmoronar. Só agora ela percebia que nunca tivera a
chance de ser a mulher da vida dele, que o coração daquele
homem estava voltado para o tênis e que a ela era reservado
um papel secundário.
Sem saber o que fazia, como um autômato, ela foi até o
elevador, e depois a uma pracinha próxima, onde se sentou
num banco, olhando sem ver as crianças que brincavam por
ali. Fora uma tola sonhando com coisas que nunca
aconteceriam. O que fazer agora? Acusar Hogan de não a
amar o bastante era infantilidade; e ela era orgulhosa demais
para esse tipo de ataque. Mas, se tomasse a iniciativa de
terminar tudo, pelo menos salvaria sua dignidade.
Controlando as lágrimas, pensou no quanto o amava; mas
aquele era um amor não correspondido e patético. E ela podia
morrer de tanto sofrer, mas não seria nunca patética. Perdida,
Leilah não sabia como agir.
Voltou ao escritório e encontrou um bilhete de Hogan.
Pedia desculpas por ter se atrasado para o almoço. Não havia
podido esperá-la porque tinha hora marcada com o advogado.
Esperava vê-la à noite.

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E à noite, quando se encontraram, Leilah ainda não tinha
decidido o que fazer. Estava angustiada. Quanto a Hogan, era
o mesmo de sempre. Parecia que a reunião com Saul não o
tinha abalado nem um pouco. Ele conversava tranquilamente
enquanto ela tirava do forno as costeletas de carneiro. Leilah
sorria, embora se sentisse como uma condenada prestes a
enfrentar o pelotão de fuzilamento. Sabia que morreria por
dentro quando ele falasse sobre a conversa que tivera com
Saul e suas terríveis conseqüências. Mas não seria melhor que
tudo fosse discutido às claras? Ela não preferia uma
separação franca? Mesmo assim Leilah estava aterrorizada,
com medo que Hogan lhe dissesse que o caso deles tinha que
terminar.
Hogan não mostrava sinais de culpa, preocupação ou
dissimulação; na verdade, ele se esparramou no sofá ao lado
dela, como uma pessoa que estivesse de bem com a vida. Como
Leilah conseguira sobreviver ao jantar, nem ela mesma sabia;
era melhor atriz do que imaginara. Conseguira responder e
argumentar com inteligência e lucidez sobre vários assuntos,
até que não agüentou mais.
— O que Saul queria com você? — perguntou, sabendo
que estava dando um ultimato.
— Boas notícias. Ele tem vários planos para mim, com
algumas opções. Muita coisa dependerá de minha atuação em
Wimbledon, mas, mesmo que eu perca, ainda assim haverá
contratos publicitários, apresentações em turnês, coisas do
tipo.
Seu ar despreocupado a deixou chocada.
— E se você vencer?
— Então, além disso tudo, ainda haverá a chance de
seriados para a televisão, quadrinhos em jornais e mais, mais,
mais! — Ele riu, contente. — As oportunidades serão infinitas.
Mais uma coisa: receio que o tempo que ficamos juntos, já tão
escasso, será ainda menor nos próximos meses. Meu
treinamento será rigoroso antes de Wimbledon e vou ter
problemas se não me dedicar. Mas recuperaremos mais tarde
o tempo perdido.
— É, acho que recuperaremos.
— Você compreende?
Ela fez que sim com a cabeça, incapaz de falar. Oh, ela
compreendia! Hogan era muito bondoso, ou muito covarde,
para dizer francamente que o que havia entre eles devia
terminar de vez. Por isso estava se livrando dela de uma
forma suave.

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— Não fique assim, gatinha.
— Assim, como?
— Desolada.
Naquela noite fizeram amor selvagemente. Leilah sabia
que por causa do desespero, estava mais apaixonada do que
nunca, mas não conseguia dominar seus sentimentos. Presa
num redemoinho de emoções, amando e odiando Hogan ao
mesmo tempo, sabia que aquela seria a última vez. O desejo
nunca a dominara com tanta intensidade, e ela devolvia beijos
e carícias com sofreguidão, vibrando enquanto mãos e lábios
tocavam seu corpo inteiro. Logo ambos estavam arfantes,
carne colada à carne. Sussurrando que a amava, Hogan
tomou posse de seu corpo e da sua alma, movendo-se dentro
dela, dominando-a totalmente até Leilah se sentir vazia, um
punhado de poeira que a brisa espalha.
No dia seguinte ele foi ao encontro de seu treinador e,
quando a contagem regressiva para Wimbledon começou, os
treinos se tornaram duros. Os telefonemas que ela recebia
eram ardentes como sempre, mas agora Leilah os achava
fingidos. O orgulho ferido a impedia de ser franca; ao mesmo
tempo, ela não tinha forças para terminar tudo. Quando Saul
a mandou trabalhar nos Estados Unidos por duas semanas,
sentiu-se até grata. Agora eram somente breves chamadas
transcontinentais, nas quais Hogan repetia que a amava.
Quando Leilah voltou, ele estava vivendo num hotel retirado,
no campo, seu tempo todo dedicado ao tênis. Só treinava e
dormia. Não podia mais haver noites para os dois.
Por causa de remanejamento na companhia, a chefia em
Hong-Kong ficou vaga e Saul sugeriu que Leilah aceitasse o
cargo. Ela não viu razão para recusar.
— Não vai ficar para me ver jogar em Wimbledon? —
perguntou Hogan, aparentemente ressentido com o que
acreditava ser indiferença da parte dela.
— Virei quando você chegar às finais, está bem?
Cheia de apreensões, ela voou para Hong-Kong. Mas ficou
tão envolvida pelas tensões do novo cargo, do novo país, do
ambiente tão diferente, que Hogan chegou às quartas de final
antes que ela tivesse tempo de recuperar o fôlego. Quando
telefonou para lhe dar os parabéns, disseram-lhe que ele saíra
para comemorar, e quando lera os jornais soubera de que
maneira. Uma foto enorme o mostrava de braços dados com
uma rica herdeira brasileira, e o artigo não deixava dúvidas
de que ele seguira os conselhos de Saul e que estava dando
várias "voltinhas".

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Poucos dias depois, Hogan ocupava novamente as
manchetes. Desta vez a notícia era outra: "Astro do tênis sofre
acidente sério". Ele e a herdeira estavam correndo demais
quando um dos pneus estourou e o carro bateu contra as
colunas de uma ponte, capotando e indo cair do outro lado. Os
ossos da coxa de Hogan tinham ficado em pedaços, assim
como seu sonho de vencer em Wimbledon.
No instante em que soube do desastre, Leilah esqueceu os
próprios problemas. Seu lugar era ao lado de Hogan, ela o
amava e isso era tudo que importava. Sem hesitar, ligou para
o aeroporto desesperando-se ao saber que todos os vôos para
Londres, naquele dia, estavam lotados. Depois de muito
procurar conseguiu um bilhete para o primeiro vôo no dia
seguinte e voltou correndo para casa, a fim de jogar algumas
roupas na mala. Pensando melhor, resolveu telefonar a Saul
para explicar sua partida repentina.
— Mas Hogan não corre perigo de vida — o chefe berrou
ao telefone do outro lado do mundo. — Verdade que a perna
dele está uma desgraça, mas mesmo assim nosso herói flerta
com todas as enfermeiras do andar.
— Eu quero ir vê-lo — ela disse com determinação, sem
achar graça nos comentários do chefe nem se importar com
eles.
— Tem mesmo certeza de que Hogan quer vê-la, beleza?
— perguntou Saul, com malícia. — Ele e a beldade brasileira
estão de namorinho. Ela está internada no mesmo hospital, e
por arte do destino sofreu somente alguns arranhões. Pelo que
sei, fica o tempo todo ao lado dele.
Leilah sentiu um frio na alma.
— Eu... eu...
— Não venha por enquanto, beleza. Espere um pouco,
deixe as coisas se acalmarem. Ele não fugirá; não pode. — E
soltou uma risada macabra.
— Então mandarei flores e uma carta.
— Envie a carta para o escritório de Londres que eu a
entregarei a ele, junto com as flores.
Leilah pensou que sua viagem tinha sido adiada só por
algum tempo, mas se enganou. Hogan começou a melhorar.
Saul transmitiu a ela os agradecimentos dele e foi só. Algumas
notas esparsas nos jornais comentavam a dedicação da moça
brasileira ao jovem tenista, numa hora difícil. Hogan nunca
telefonou, nunca escreveu. Leilah cancelou o vôo.
Um movimento súbito a fez estremecer e voltar ao
presente. Ela sorriu quando percebeu que Hogan pusera o

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braço sobre a cabeça, durante o sono. O que teria acontecido à
herdeira brasileira? Porque, em pouco tempo, seu lugar tinha
sido ocupado por uma modelo, depois por uma tenista famosa,
e em seguida por uma atriz. Depois disso Leilah deixou de ler
os colunas de mexericos.
Resignada, ela tirou os sapatos de Hogan e jogou um
cobertor sobre ele, que ainda vestia calças e paletó. Leilah não
ousou despi-lo. Apagou a luz e fechou a porta com cuidado.
Depois abriu o sofá-cama da sala. Dormira ali quando seus
pais tinham ido vê-la em Hong-Kong e o fazia sempre que
hospedava alguém; portanto não seria o fim do mundo dormir
ali outra vez. Pela manhã, descobriria uma cópia da chave e
despacharia Hogan para o apartamento de Roger.
Tomou um banho o mais silenciosamente possível,
embora desconfiasse que nem mesmo uma bomba atômica o
despertaria. Já deitada, pensou nos acontecimentos daquele
dia antes de mergulhar num sono profundo.
Um ruído a despertou. Leilah logo se sentou no sofá. A luz
pálida filtrada pelas cortinas mostrava que já havia
amanhecido. Ela espreguiçou-se e afastou os últimos
resquícios de sono.
— Oh, meu Deus!
Quando ouviu os gemidos de Hogan, pulou da cama
imediatamente, vestindo o chambre sobre a camisola e
jogando para trás os longos cabelos sedosos. Abriu a porta do
quarto e viu-o caído ao chão, ao lado da cama, com as
cobertas por cima do corpo. O abajur lançava uma luz fraca
que se espalhava pelo chão.
— Gostou da viagem? — ela perguntou docemente,
tentando não rir.
Ele lutava para se libertar. Segurava o fio elétrico numa
das mãos, enquanto esfregava a cabeça com a outra.
— Não, não gostei!
— É assim que os poderosos tombam no meio da
batalha. . . — comentou Leilah, sorrindo enquanto o
observava.
— Dispenso citações bíblicas. Quer me ajudar, srta.
Morrison?
— Você pode se levantar sozinho — retrucou Leilah,
tentando esconder com os braços o corpo que a camisola e o
chambre transparentes deixavam à mostra.
Ele continuava deitado.
— Não consigo me levantar, Leilah.
— Ora, Hogan, não me venha com esta conversa de

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menininho desprotegido. Não é seu estilo.
— Eu não consigo me levantar, verdade! É por causa da
minha perna. Ela às vezes me dá trabalho. — Seus olhos
brilhavam, como se a desafiassem a demonstrar alguma
satisfação; Leilah, no entanto, sabia que aquele não era um
momento para brincadeiras.
— Então deixe que eu o ajudo — disse, dando um passo
para à frente.
O abajur foi recolocado no lugar, as cobertas jogadas de
volta na cama. Ele devia ter acordado durante a noite e tirado
a roupa para se sentir melhor, porque estava de peito nu: o
paletó e a camisa se encontravam jogados a um canto, no
chão.
— Obrigado. — Ele se apoiou nos cotovelos. — Agora,
gostaria que me desse suas mãos.
Por um segundo Leilah teve medo de que fosse somente
um truque. Sabia por experiência própria que Hogan era
brincalhão e que exercia sobre ela uma irresistível atração. Se
ele desse um puxão mais violento, ela cairia sobre aquele corpo
forte e atlético. Mas não havia nem sombra de sorriso nos
lábios apertados, o que significava que Hogan estava
realmente precisando de ajuda. Então Leilah fez o que ele
pedia; firmou-se no chão enquanto ele se levantava,
conseguindo com muito esforço sentar-se na beirada da cama,
massageando a coxa.
— Quer que eu chame um médico?
— Não! — A irritação da resposta foi tanta que Leilah
achou melhor ir embora. Mas ele não deixou, agarrando-lhe a
mão. — Desculpe, boneca, é só uma crise de mau humor. Sabe,
quando eu acordo o músculo da coxa ainda está fraco.
— Você costuma cair? — perguntou ela, sentando-se ao
lado dele.
— Não, não costumo. Sigo uma rotina de exercícios que
permitem que os músculos da coxa se fortaleçam
gradativamente, mas esta manhã, eu... eu — encolheu os
ombros — esqueci.
— O programa de ontem também não ajudou, certo? Foi
pesado demais. — Sentindo-se culpada, ela apertou as mãos
frias. — Sinto muito.
— Não se preocupe, sim? Basta eu começar a andar para
ficar ótimo. Quando vejo o que consigo fazer no ginásio, sinto
que estou tecnicamente perfeito. Bem. . . Quase perfeito.
— Mas. . . e ontem à noite?
— Eu estava cansado, só isso.

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— Qual é a opinião de Terri sobre sua coxa?
— Ela não sabe de nada. E você não deve contar —
exclamou ele, e seus dedos apertaram os dela. — Prometa que
isso ficará entre nós, Leilah.
— Mas, pelo que sei, Terri é uma fisioterapeuta! Ela não
foi contratada para ajudá-lo a manter a forma?
— Sabe quem a contratou?
— Você?
Ele sacudiu vigorosamente a cabeça.
— Foi Saul. Sabe, recentemente tentei diminuir o número
de viagens. O problema com minha perna não é grande, mas
achei que, se tivesse uma ou duas semanas de repouso, o
problema desapareceria. Então disse a Saul que queria férias.
— Mas ele não concordou. Saul só pensa em
dinheiro, Hogan.
— Isso mesmo. Tivemos uma discussão terrível. No fim
fizemos um acordo: depois que esta viagem promocional
terminar, vou tirar uma semana de férias. Para minha
surpresa, Terri entrou em cena, embora eu ainda precise
descobrir se ele a mandou porque acredita que um pouco de
fisioterapia pode ajudar ou. . .
— Saul. tem alguma suspeita sobre sua perna?
— De jeito nenhum! Ele é a última pessoa em quem eu
confiaria! — Hogan ficou pensativo por alguns segundos. —
Por isso não entendo por que ele quer que Terri viaje comigo.
Mas tenho que reconhecer que ela é competente em seu
trabalho. Mas, sabendo que Saul promove minha imagem
como a de um conquistador, suponho que a preocupação dele
seja mais com isso do que com minha saúde.
— Então ela não é sua. . . sua amante?
— Claro que não! Está bem, Saul vive atirando mulheres
em meus braços, mas ainda uso de meu direito de escolha.
— É mesmo? — foi a pergunta maldosa. — Pois não é essa
a impressão que você dá.
— Gatinha, se eu tivesse metade das mulheres que Saul
alardeia, estaria agora num laboratório, sendo objeto de
estudos.
— Mas não negue que você teve muitas mulheres —
insistiu ela, determinada a deixar claro aquele ponto.
— Não, não nego, mas isso faz parte do passado. Hoje, se
Saul me apresenta uma loira que me agrade, saio com ela.
Mas desde que você me deixou não consigo agüentar mulher
alguma por mais de uma semana. Acho que foi por isso que ele
inventou essa história com Terri.

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— E se você pedisse a ela para ser discreta? Talvez
pudesse sugerir algum tratamento que ajudasse. . .
— Não sabe quem ela é? Terri é sobrinha de Saul, e eu não
confio naquela raposa traiçoeira. Você confia?
— Não — ela teve que admitir. Por mais lealdade que
devesse a seu chefe, seu compromisso real era com a verdade.
— Não sei se há alguma ligação entre tio e sobrinha e não
tenho intenção de correr riscos. — Ele a olhou, desconfiado.!
— E você? Vai comunicar o fato a seu chefe? Ela se
sentou, tensa.
— Não, não vou. E não sabia da existência de Terri até
vê-la| a seu lado.
Ele a olhou em silêncio, como se estivesse pesando a
sinceridade daquelas palavras.
— Que o céu seja louvado! Não me venha dizer que não
está a par das maquinações diabólicas de Saul!
— Não estou de conluio com ele contra você, se é isso que
está insinuando — reagiu ela, ofendida. Ser posta no mesmo
plano que Saul a deixava muito aborrecida.
O rosto de Hogan ficou sombrio.
— Ainda bem. Achei mesmo que poderia confiar em você,
gatinha. Compreende por que tenho que manter em segredo
tudo a respeito da minha perna?
— Compreendo. Se Saul escutar algum rumor, fará
muita pressão. .
— É, ele logo descobriria uma forma de fazer publicidade
do fato. Diabo, é somente um músculo fraco, mas, se Saul
suspeitar de alguma coisa, irá logo enfatizar o aspecto
dramático da coisa. "Astro do tênis aleijado enfrenta o destino
cruel!"
— Hogan recitou, como se estivesse lendo uma manchete
de jornal. — Não preciso desse tipo de publicidade. Não quero
piedade de ninguém. Tudo que peço é que me deixem lutar
para poder disputar campeonatos novamente, sem ter a
imprensa nos calcanhares o tempo todo. Já é bastante ruim ter
que responder a perguntas intermináveis sobre o acidente e o
tempo que tive que ficar no hospital. Aquela experiência foi
terrível graças a Saul Spencer! Ele ficou no sétimo céu quando
minha perna ficou boa o suficiente para me deixar voltar às
quadras, pois tirou proveito disso para fazer publicidade. Esse
homem não presta, Leilah.
— Você precisa descansar — disse ela, ajeitando o
travesseiro. Obediente, Hogan se deitou. — O médico que o
operou não fez nenhuma recomendação a respeito da pressão

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que o músculo suportaria?
— A perna está praticamente boa. Só me pediram para
evitar golpes e batidas, o que eu faço, e é tudo.
— Mas você explicou ao médico como seus treinos são
rigorosos?
Ele ficou um instante em silêncio, como se não tivesse
escutado a pergunta, mas acabou cedendo.
— Não. — Quando ela tentou protestar, ele pôs os dedos
longos e bronzeados em seus lábios. — Só sinto fraqueza nos
músculos pela manhã, gatinha. O resto não importa.
— Já inchou alguma vez?
Ele passou os dedos por cima da calça de veludo antes de
responder.
— Um pouco.
— Não quer que eu dê uma olhada?
O braço em torno de seus ombros apertou-a mais
enquanto ele sorria.
— Gatinha, está querendo me despir? Você é igual às
outras!
— Sou, uma conversa!
— Não, você não é.
Hogan parara de rir. Os olhos cinzentos se tornaram
escuros quando suas mãos acariciaram os longos cabelos
sedosos e depois envolveram-lhe a nuca, puxando Leilah. Suas
bocas se tocaram levemente e ela segurou o fôlego, abalada
com aquela proximidade. Depois os lábios de Hogan se
moveram nos dela, quentes, sensuais, semeando beijos; Leilah
não resistiu e cedeu. Hogan a fez deitar-se a seu lado, no
mesmo travesseiro, murmurando palavras apaixonadas, sua
boca dominando tão completamente a dela que Leilah logo
sentiu o sangue circular mais depressa. Por que nunca sentira
esta mesma emoção com Glenn? Por que ele nunca conseguira
fazer com que seu mundo girasse, com que seu corpo se
tornasse fogo e desejo?
Quando as mãos grandes de Hogan deslizaram sob o
chambre, tocando os seios intumescidos, ela sentiu uma onda
de prazer percorrê-la por inteiro. Os bicos rijos revelaram a
resposta de seu corpo, enquanto as mãos fortes continuavam a
tocá-la, envolvendo-lhe os seios, fazendo com que ela se
aconchegasse, querendo mais. Leilah sabia que não devia
fazer isso e murmurou uma queixa, um protesto incoerente
que se transformou num sussurro quando, afastando o
chambre e a camisola, Hogan afundou o rosto no colo
perfumado. Os lábios ardentes se moviam pela pele sensível e

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a língua deixava um rastro de fogo.
— Você é tão gostosa, tão cheirosa. . . Sempre que sinto
perfume de verbena me lembro de você. Lembra-se daquelas
noites maravilhosas? — Hogan parou de falar para roçar os
lábios nos bicos rosados e rijos. Leilah gemeu outra vez. —
Gatinha, mulher alguma me fez gozar como você. Você é a
única que me fez. . . — a voz rouca foi sumindo quando a boca
continuou seu caminho pelo corpo claro e luminoso.
Leilah teve a impressão de que seu sangue se
transformara em fogo líquido quando, com a boca, ele lhe
envolveu os bicos dos seios. Abraçou-o com sofreguidão, os
dedos deslizando pelos ombros musculosos e bronzeados,
redescobrindo o corpo másculo de que se lembrava tão bem.
Ela respirava com dificuldade, excitada por aqueles lábios
quentes que se tinham apossado de seus seios e que agora
continuavam descendo, roçando o ventre, as coxas.. .
— Querido. . . — ela murmurou, entregue, indefesa,
balançando a cabeça no travesseiro, enquanto as mãos fortes e
a boca morna continuavam a acariciá-la.
De muito longe veio o som de uma campainha. Leilah
avisou Hogan, que não quis lhe dar atenção; preferia ignorar
qualquer coisa que o impedisse de continuar a beijá-la. Ela se
aconchegou de novo, mas a campainha continuou a tocar,
insistente. Leilah se afastou dos ombros largos e voltou à
realidade.
— Alguém está batendo à porta — disse. Hogan levantou
a cabeça e olhou para ela. — A campainha está tocando.
— Deixe que toque. — Ele se inclinou para beijá-la
novamente, mas do corredor uma voz de mulher chamou por
Leilah. — Diabo! É Terri! — ele resmungou, irritado, enquanto
ela se desvencilhava e levantava da cama. — O que será que
ela quer?
Leilah ajeitou o chambre.
— Você!

Capítulo V

Leilah teve a impressão, no resto do dia, que não passava


de uma personagem de filmes dos anos 20. Para dar tempo a
Hogan de fazer com que a perna voltasse a funcionar sem
problemas, ela recebeu Terri no apartamento, falando sem
parar, abrindo as cortinas e dobrando as roupas da cama que

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armara na sala; depois fez café e torradas. A história da chave
esquecida foi comentada como uma coisa hilariante, embora
Leilah tivesse o cuidado de deixar bem claro que Hogan
dormira no quarto enquanto ela ocupara o sofá na sala.
Perguntou-se se Terri acreditaria, sem saber muito bem se
ficava grata ou decepcionada quando viu que a outra nem se
abalou; sua versão dos fatos foi aceita sem a menor sombra de
dúvida.
Quando Hogan entrou na sala, Leilah olhou
disfarçadamente para a perna doente e sentiu alívio quando
ele lhe deu uma olhada tranqüilizadora. Então tomou banho e
se vestiu para, depois de uma refeição apressada, partir em
busca da chave, deixando a sessão matutina de fisioterapia no
começo. Resolveu tudo e voltou; Hogan já podia entrar no
apartamento de Roger de novo. Pegando a chave, ele foi se
barbear e trocar de roupa; voltou metido num terno escuro,
com uma camisa de seda azul.
— Temos que chegar a Selvam’s em vinte minutos —
avisou ela, consultando o programa de visitas e caminhando
apressada para o elevador, com Hogan e Terri atrás.
— O que é Selvam's? — perguntou Terri.
— A loja de departamentos que está promovendo o livro e
os equipamentos de Hogan.
A morena torceu o nariz.
— Como é possível que esta loja esteja aberta hoje, em
pleno feriado?
— Os proprietários da Selvam's são indianos e não se
ligam nessa história de Ano Novo Chinês. Eles têm sua própria
data para comemorar.
— Me parece ser uma oportunidade a mais para ganhar
algum dinheiro à custa dos chineses — comentou Hogan.
— Mas, por outro lado — ponderou Leilah —, no dia do
Ano Novo dos indianos, serão os chineses que ganharão.
— Então é possível que as lojas de souvenirs estejam
abertas hoje? — perguntou Terri. — Eu me inscrevi numa
excursão às onze, mas bem que gostaria de dar uma voltinha
agora.
— Você quer mesmo fazer compras ou ver se existem
alguns cavalheiros livres? — gracejou Hogan. Terri soltou
uma gargalhada.
— Já vou andando. Bye. . . — acenou ela, afastando-se.
Enquanto esperavam por um táxi, Leilah olhou desolada para
a neblina que estava se acumulando.
— O dia não está bom para excursões hoje — comentou. —

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Muito nublado.
— Não se preocupe. Terri vai adorar Hong-Kong. Ela se
anima com qualquer coisa. É muito parecida com titio Saul.
Turistas e moradores lotavam a elegante Selvam's
quando Hogan e Leilah chegaram.
— Muito impressionante — disse Hogan ao admirar a
espetacular cachoeira, que parecia vir do céu e que desaguava
numa lagoa onde boiavam lírios brancos e rosa.
Eles logo foram cercados e Leilah respirou aliviada
quando o Sr. Selvam apareceu, tomando conta de tudo.
— Por favor — gritava o homenzinho, agitando os braços
—, permitam que o Sr. Whitney entre na loja! Estou encantado
e honrado em vê-lo — dizia, enquanto acomodava Hogan
atrás de uma mesa e organizava uma fila em frente a ele.
O departamento de roupas esportivas fora arrumado
para a promoção. Posters imensos de Hogan tinham sido
colocados em pontos estratégicos.
— Vou acabar com cãibra nas mãos — queixou-se Hogan
depois de autografar dezenas de livros por mais de meia hora.
Uma hora depois, ainda murmurando elogios, o Sr.
Selvam os levou até uma sala reservada, onde havia alguns
refrigerantes.
— Assisti à partida ontem à noite — o indiano contou. —
Foi emocionante. Seu adversário já acreditava na vitória
quando o senhor virou o jogo!
— Estou satisfeito pelo senhor ter apreciado.
Com riqueza de detalhes, o Sr. Selvam reviveu a
dramática partida e, vinte minutos depois, o coração de Leilah
pesava como chumbo. Ele parecia disposto a discutir cada
lance e não parava mais de falar. O programa a cumprir,
porém, era extenso e eles precisavam ir. Mas o homem não se
calava. Numa brecha da conversa, Leilah aproveitou para
informar que estavam sendo esperados em outro local e,
depois de apressadas despedidas, escapou com Hogan.
— Estou surpreso por você não ter providenciado
patins — caçoou ele, seguindo-a pela saída lateral e acenando
para um táxi.
Ela sorriu.
— Tudo que você tem a fazer é aparecer e sorrir. Quanto
a mim, tenho que coordenar programas e, se alguma coisa
sair errada, serei responsabilizada!
O próximo compromisso era um almoço com o diretor de
uma firma internacional que patrocinava Hogan. Como
sempre, ele foi recebido de braços abertos e Leilah permaneceu

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em segundo plano, perplexa. O que pensara ser um almoço
quase íntimo foi, na verdade, transformado num barulhento
evento social. Parecia que todos os estrangeiros ilustres
tinham sido convidados e ela bendisse a hora em que vestiu o
conjunto de seda italiana azul-noite em vez da costumeira
camiseta com o rosto de Hogan impresso e calças jeans.
Apesar de ser somente um almoço, havia gente vestida até com
roupas bordadas de lantejoulas, decotadas e elegantes, muito
mais apropriadas para um coquetel.
A esposa do diretor deu o braço a Hogan e o arrastou até
um terraço coberto onde um grupo de velhotas sorridentes
estava reunido. Leilah ficou conversando com um velho tio do
diretor, antigo morador de Hong-Kong, que balançava as
pernas enquanto falava, cheirava a uísque e estava decidido a
contar com detalhes cada tufão que varrera a região desde a
época da Segunda Guerra Mundial. Lá pelo meio da tarde,
Leilah encontrou um jeito de se despedir, explicando que
Hogan deveria comparecer a um programa de rádio.
— Eu estava quase morrendo de tédio — queixou-se ela.
— Eu também — disse Hogan.
— Duvido!
Ele passara o tempo todo flertando com as mulheres que o
cercavam.
— Bem, pelo menos você tinha que se defender somente de
um admirador. Imagine se aquelas velhotas todas pulassem de
repente em cima de mim!
Ela riu, imaginando Hogan sendo assaltado pelas
ardentes fãs.
— Você se sairia bem, aposto.
— Que nada!
Chegaram à rádio e, enquanto Hogan era entrevistado,
respondendo às mesmas velhas perguntas com um sorriso nos
lábios, Leilah aceitava uma xícara de chá de Sue, a disc-jockey
da estação.
— Quando você e Glenn vão se casar? — quis saber Sue.
— Não vamos nos casar.
— Ele sabe disso? O cara está doido por você e acho que é
uma maldade enganá-lo.
— Não existe nada entre nós, a não ser uma ótima
amizade.
— Então por que não se afasta dele? Faz mais de seis
meses que vocês saem juntos. Já é mais do que tempo de tomar
alguma decisão.
— Mas ainda não decidi — a confissão foi feita em voz

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baixa e preocupada. Sue pareceu irritada, mas mudou de
assunto.
A noite caía quando eles voltaram aos apartamentos.
Leilah e Hogan trocaram de roupa rapidamente para irem ao
jantar no Dinasty. Era uma noite de gala: os homens
vestiriam dinner-jackets e as mulheres, trajes de gala. Leilah
escolheu um vestido de chiffon verde-água, um dos favoritos
de Glenn. Muito elegante, o traje tinha o decote rente ao
pescoço na frente, mas as costas ficavam inteiramente nuas.
Enquanto secava os cabelos, ela pensava na conversa com
Sue. Era evidente que a moça simpatizava com Glenn. E fazia
semanas que Leilah desconfiava que ele pretendia pedi-la em
casamento; na verdade, conseguira evitar o assunto algumas
vezes e isso a intrigava. Por que estaria fugindo daquilo?
Olhou-se ao espelho. Gostava imensamente de Glenn. Ele era
amável, boa companhia, espirituoso, mas. . .
Ela apertou os lábios carnudos, pintados de cor-de-rosa.
O que sentia por Glenn não era amor. Afinal, naquela mesma
manhã estivera a ponto de se entregar a Hogan. Apertou as
têmporas, confusa e preocupada. Parecia que Hogan era
mesmo seu primeiro e único amor. . , Nunca encontraria outro
homem capaz de fazer seu coração vibrar?
Se quisesse ser sincera, tinha que reconhecer que
comparara Glenn e Hogan desde o início; a bem da verdade,
comparava todos os homens a Hogan. Tinha se envolvido com
o australiano por causa de sua natureza alegre e amável, mas
Hogan continuava imbatível. Por quê? Ela não sabia. Ele era
um homem complicado, convencido e com um gênio explosivo.
Mas também era carinhoso, terno, sensível. Leilah suspirou,
pensando se o conhecia de verdade.
O romance entre eles fora intenso, rápido, físico. Ambos
tinham se adiantado muito, ido depressa demais. Glenn
aceitava o ritmo que ela impunha; Hogan nunca aceitara.
Leilah deu um risinho amargo. Como fora tola, como
continuava a ser tola! Tinha que confessar que sempre se
mostrara terrivelmente vulnerável aos encantos de Hogan,
que ainda era assim e que seria sempre assim. Se quisesse
sobreviver às semanas seguintes, precisava evitar qualquer
envolvimento com ele.
Acabou de pentear os cabelos, que caíam pelos ombros, e
os olhos azuis ficaram duros quando ela chegou a uma
decisão. Naquela mesma noite diria a Glenn que o
relacionamento entre ambos tinha que terminar. Seria
honesta com ele, mesmo que isso o fizesse sofrer.

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O restaurante, no trigésimo sexto andar do Dinasty Hotel,
tinha um nome engraçado, em inglês: Pie in lhe Sky.
Significava "torta do céu". Claro que de vez em quando surgia
alguma torta, mas os pratos mais pedidos eram salmão
defumado, ostras-e outras iguarias ocidentais. Mas, em
homenagem ao Ano Novo Chinês, o ambiente estava decorado
à oriental. Enormes mesas redondas substituíam as
costumeiras e aconchegantes mesinhas para dois; canudos
vermelhos e as inevitáveis lanternas de papel vermelhas e
douradas enfeitavam as paredes. O discreto murmúrio tinha
sido substituído pelas conversas em cantonês, misturadas a
várias línguas européias.
Glenn já estava à espera quando o veloz elevador deixou
Leilah e Hogan lá em cima. Instantes depois, Terri e Y.C.
Wong chegaram. Uma mesa perto da janela estava reservada
para eles. Depois de encomendarem os aperitivos, todos se
acomodaram e apreciaram a linda vista.
— Parece um conto de fadas — exclamou Terri,
maravilhada.
A neblina que cobrira a cidade durante o dia
desaparecera e a noite estava clara. Lá embaixo, as ruas
pareciam fitas coloridas, brilhantes; os barcos flutuavam nas
águas escuras.
— Hong-Kong parece um sonho — disse Terri.
— Gostou da excursão? — Leilah se interessou em saber.
Ela sorriu, alegre.
— Foi uma beleza! Conheci um rapaz de Wisconsin e
concordamos que o Extremo Oriente faz a gente enlouquecer!
Já fizemos uma lista do que queremos ver amanhã. Logo
depois da sessão de terapia de Hogan pretendemos visitar o
Ocean Park. Não deu tempo de ver hoje, mas vimos. . . — e
desfilou uma série de lugares, completamente fascinada.
Hogan quase engasgou com o coquetel.
Leilah encontrou o olhar dele mas logo baixou o seu, para
não rir. Nenhum dos dois tinha falado sobre o que acontecera
pela manhã e ela começava a se perguntar se teria significado
alguma coisa para ele. Hogan fora amável e prestativo
durante todo o dia, mas, se sentia alguma atração por ela,
disfarçava muito bem. Leilah tinha certeza que as outras
pessoas, incluindo Glenn e Terri, nunca suspeitariam de nada.
— Como foi o dia hoje? — perguntou Glenn.
— Leilah me arrastou por toda Hong-Kong — disse
Hogan, fazendo uma careta. — Teria sido mais fácil se ela
tivesse me empalhado e me pendurado em alguma vitrina,

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como um troféu; assim todos poderiam olhar-me com calma e
eu não me cansaria tanto!
Os olhos azuis dela brilharam, refletindo revolta.
— Você acha que estou me divertindo? Pois não estou.
Estou promovendo os seus interesses! E pode ficar certo de que
a idéia de empalhar e pendurar até me parece muito boa. . . —
Calou-se quando uma gargalhada geral estourou na mesa e,
embora tentasse manter a dignidade, acabou rindo também.
Glenn cobriu a mão dela com a sua e logo todos se
acalmaram.
— Espero que não se pendure nele, meu bem.
Hogan ficou em silêncio, mas o brilho intenso em seus
olhos mostrou que ele tinha se importado com o que
acontecera pela manhã. Pensativo, ele parecia mergulhado em
reminiscências; um leve sorriso dançava em seus lábios.
Leilah resolveu evitar encará-lo, ignorá-lo totalmente, pois
temia ver desejo naqueles olhos cinzentos. Se isso acontecesse,
o que restaria a ela senão desejá-lo também? Então conversou
sem parar com todos, menos com Hogan. Logo a conversa
derivou para a cozinha chinesa e Wong tomou a palavra.
Depois de vários esclarecimentos, os pratos chineses foram
pedidos, acompanhados de chá perfumado, de jasmim, servido
em tigelas. Y.C. Wong deu uma aula ligeira de como se devia
segurar os pauzinhos e logo todos riam, descontraídos.
-— A comida estava deliciosa — comentou Hogan no fim
da refeição, sorrindo para Glenn. — Você dirige um hotel de
categoria, companheiro.
O australiano recebeu o elogio com satisfação e pediu
uma rodada de licores. A esta altura, os gritos de Yam Seng
enchiam o restaurante, já envolto num clima de alegria.
— Agora é a vez de sua protegida — Glenn avisou a Leilah
quando o conjunto anunciou o novo número com um rufar da
bateria.
Todos na mesa se viraram para assistir. Ali por perto,
ninguém se interessou.
— Vocês vão ver só — exclamou Y.C. Wong, passando a
mão nos cabelos negros.
Leilah levou um susto quando Jasmine apareceu. Só com
muita boa vontade aquele vestido poderia ser classificado
como cheongsam. Todo em lantejoulas cor-de-rosa, justíssimo,
com aberturas ousadas na saia, revelando as pernas até a
altura das coxas, e um decote que deixaria ruborizada uma
corista de Las Vegas, o traje era de tirar o fôlego. Jasmine se
adiantou, respirou fundo, os seios quase saltando da roupa, e

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começou a cantar uma música cantonesa romântica com voz
aguda de soprano. Ficou imóvel durante os primeiros versos,
em frente ao microfone, mas aos poucos começou a balançar
os quadris. O ritmo agora mal lembrava uma melodia oriental
e as ondulações do corpo da moça foram se tornando mais
pronunciadas. .
— A música pode ser uma velha canção cantonesa, mas os
movimentos não têm nada a ver com ela — disse Glenn, rindo.
Jasmine girou na pequena pista de dança, remexendo os
quadris, revelando as pernas bem-feitas, estalando os dedos e
provocando um pandemônio. As pessoas começaram a se
cutucar, palitos paravam a caminho da boca, as conversas
cessavam. A esta altura o microfone e a canção tinham sido
esquecidos e Jasmine não tentou mais cantar, pois a dança
vigorava. Os membros do conjunto, percebendo que as coisas
não iam acontecer como haviam sido ensaiadas, passaram a
tocar os últimos sucessos ocidentais.
— Tire o vestido, tire! — uma voz gritou e, por um
instante, Leilah temeu que Jasmine atendesse o pedido.
Lembrou-se, aterrorizada, da ira do Sr. Tan se algum
escândalo acontecesse. Ele ficaria louco se a filha fizesse um
strip-tease em pleno Dinasty Hotel. Ela só respirou aliviada
quando Jasmine agitou um dedo, negando, e continuou a
dançar, provocante. Palmas ritmadas animavam o ambiente,
seguindo a música; assobios enchiam o ar. A chinesinha
sorria. No final, insistentes pedidos de bis foram atendidos
com energia, e por fim, corada e ofegante, Jasmine recebeu
uma ovação. Iluminada pelos holofotes, ela jogou beijos para a
platéia, até Y.C. surgir a seu lado. A pista foi invadida por
admiradores e vários rapazes ergueram suas taças num gesto
entusiasmado.
— Talvez isso não tivesse sido planejado, mas causou um
grande impacto! — exclamou Glenn, rindo.
Leilah estava em pânico.
— O que vou fazer agora?
— Exigir uma porcentagem — foi a sugestão de Hogan, e
Leilah o olhou rapidamente, irritada.
— Jasmine pode ter um futuro brilhante — afirmou
Glenn.
— Como o quê? Dançarina exótica? — perguntou Hogan.
— Ela pode ter feito sensação aqui, no Ano Novo Chinês,
quando todos estão encharcados de conhaque, mas só tem um
belo corpo e isso não falta por aí — deu uma risadinha
maliciosa.

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— Leilah, sem roupa, faria o mesmo furor. Ela o olhou,
mais furiosa ainda.
— O que será que o Sr. Tan vai achar? — perguntou. —
Ele é antiquado e teria um ataque se suspeitasse que a filha se
portou assim.
— Pois eu acho que Jasmine teria um belo futuro —
repetiu Glenn.
— Que tenha! Mas sem a minha ajuda! — declarou Leilah,
realmente zangada. Será que Glenn não percebia que Jasmine
era exatamente o que Hogan dissera, nada mais?
— Você tem um belo problema nas mãos. Agora que ela
experimentou o gostinho da glória, não se sujeitará a ser
novamente a anônima srta. Tan — comentou Hogan, o olhar
voltado para onde Jasmine estava.
Quando Glenn, o eterno otimista, começou outra vez a
elogiar a moça, Leilah afastou a cadeira.
— Vou tomar um pouco de ar puro. Aqui está muito
quente.
— Vou com você — disse Glenn, levantando-se antes que
ela pudesse protestar.
Enquanto desciam pelo elevador, Leilah pensou que tinha
nas mãos a oportunidade ideal para dizer a Glenn o que
sentia. Era agora ou nunca, decidiu, enquanto ele lhe segurava
o braço e a acompanhava pelos jardins. Tomou fôlego antes de
começar a falar.
— Glenn, preciso lhe dizer algo. . .
— Eu também preciso. Que tal ficarmos noivos na
Páscoa?
— Mas eu não amo você! — ela exclamou, o coração
doendo ao ver o sofrimento nos olhos do australiano, que
enfiou as mãos nos bolsos da calça e olhou a lua.
— Imagino que seja o fim, então.
— Sinto muito, Glenn. Acho que eu já devia ter esclarecido
tudo isso. Gosto muito de você, mas. . .
— Bem que Sue me avisou.
— Sue? — perguntou ela, espantada. Mas, pensando
melhor, compreendeu tudo. — Ah, sei... — Sue parecia disposta
a dar a ele todo o amor que ela, Leilah, negava.
— Ainda está apaixonada por Hogan Whitney, não está?
— Era mais uma afirmação do que uma pergunta. — Eu devia
ter percebido. Você estava doente de preocupação durante
aquela partida.
Leilah ergueu a cabeça, orgulhosa.
— Fiquei preocupada porque ele representa lucros para a

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Spencer Associates.
E voltaram ao restaurante, conversando. Jasmine
juntara-se ao grupo, feliz com o sucesso. Leilah pediu a Deus
que ninguém notasse que havia algo diferente entre ela e
Glenn, mas, quando seu olhar encontrou o de Hogan, viu que
ele percebera tudo.
Depois da meia-noite as mesas começavam a se esvaziar:
as pessoas iam para suas casas.
— Acho que já está na hora — sentenciou Y.C., segurando
Jasmine pelo braço.
— Quando posso ter outra oportunidade? — a moça
perguntou, sorrindo, olhando para Glenn e Leilah.
Leilah falou antes que o australiano tivesse chance de
abrir a boca.
— Eu telefonarei nas próximas semanas. — Jasmine
pareceu decepcionada, mas se acalmou quando Glenn elogiou
novamente sua atuação.
— Vá usando a tática da protelação — Y.C. cochichou
para Leilah. — Hoje foi ótimo, mas não tem sentido ela insistir
nisso. O velho Tan a deserdaria!
Trocaram um olhar de entendimento e Leilah sentiu-se
aliviada.
Todos foram para o elevador. Terri desceu em seu andar e
os outros seguiram até o térreo. Glenn despediu-se, apressado,
e Y.C. acompanhou Jasmine ao estacionamento.
— Hoje está muito frio — comentou Leilah ao subir no
táxi que Hogan tinha chamado. Depois aconchegou-se mais
no agasalho.
Hogan ergueu o braço para envolvê-la.
— Eu vou esquentar você. — Ela pareceu relutar e ele riu.
— Fique calma, gatinha. Cenas de amor no banco de trás de
táxis não são o meu forte.
— Não mesmo? — retrucou ela, lembrando-se do passado.
— Bem, não esta noite — garantiu ele. E assim, mesmo
sabendo que não devia se arriscar, mas porque estava mesmo
com frio, Leilah se aninhou nos braços dele.
— Você desconfia que Terri faz relatórios de tudo o que
está acontecendo por aqui? — ela perguntou. Estava
começando a se sentir melhor agora, aquecida pelo calor do
corpo de Hogan. Era uma sensação familiar, gostosa.
— Difícil saber. Ela dá a impressão de ser uma boa moça
e diz certas coisas, de vez em quando, que me fazem desconfiar
que sua opinião sobre o tio bate com a nossa. Mas nunca
subestimo Saul. Quem sabe ele pôs um microfone num

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daqueles belos dentes, sem que ela desconfie? — Passou os
dedos pelo bigode negro. — Por que pergunta?
— Estive pensando que ele poderia vir a saber do sucesso
de Jasmine esta noite, e eu preferiria que não soubesse. Saul
tem poucos escrúpulos e, se há dinheiro envolvido, ele se
interessará.
— £ verdade. Por cinco dólares ele é capaz até de vender
a mãe. Mas não acredito que Jasmine tenha chance de fazer
carreira. Seria capaz de acabar numa boate de segunda
categoria.
— Então é melhor que eu acabe com as ilusões dela antes
que seja tarde.
— Sabe que às vezes penso que você e seu chefe têm mais
em comum do que gostaria de admitir? — A voz de Hogan era
um pouco dura. — Você tem o poder de fazer ou destruir
Jasmine, e escolheu a segunda alternativa.
— Mas é o melhor para ela!
— Sim, concordo, mas você nunca pensou que Saul lida
com as pessoas como se fossem peões num jogo?
— Como acontece com você?
— Não, eu não estou em perigo. Cuido de mim mesmo.
Sou capaz de enfrentar Saul, mas já o vi lidando com pessoas
mais fracas e sei que ele usa qualquer expediente para atingir
seus objetivos.
— Você se esquece de que não sou Saul! Meu trabalho
promove produtos, não pessoas!
Hogan sorriu, irônico.
— Até agora, talvez. Mas... o que vai acontecer quando
você. . . chegar mais alto?
— Não sei se vou subir mais na Spencer Associates —-
protestou ela, mas o táxi já estacionava em frente ao edifício e
a conversa foi interrompida. Hogan voltou a ela quando
subiam pelo elevador.
— Vai chegar ao topo, sim, a menos que desista de fazer
carreira e se case, o que não parece muito provável.
— Você acha que eu sou uma solteirona assumida? Os
olhos cinzentos observaram o belo rosto de Leilah.
— Sim, eu acho. Que diabo você quer de um homem,
Leilah? Você me deu o fora e esta noite mandou o pobre Glenn
passear. Ele parece um tipo decente, perfeito chefe de família.
— O que aconteceu entre Glenn e mim é assunto nosso,
não tem nada a ver com você! — Ela desceu irritada do
elevador e seguiu para seu apartamento.
— Tem tudo a ver comigo — ele afirmou, caminhando ao

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lado dela e começando a se enfurecer. — Você deixou o coitado
se iludir! Senti pena porque sei exatamente o que ele está
sofrendo! Não se esqueça de que fez a mesma coisa comigo!
Leilah virou-se, furiosa.
— Não me venha com essa, Hogan! Eu dei o fora em você
pela simples razão de jamais ter sido pedida em casamento! —
Pôs a chave na fechadura e abriu a porta. — Boa noite!
— Oh, sim, eu pedi sim! — A voz dele agora soava mais
controlada, firme.
Ela deu meia-volta.
— Sonhos sobre uma casinha no sul da França não têm
nada a ver com pedido de casamento!
— Concordo. Mas você recebeu por escrito, preto no
branco. O que mais queria?
Ela afastou uma mecha de cabelo da testa.
— Você teve um dia cansativo, Hogan. Ambos tivemos. O
que estamos falando agora não tem sentido. Acho melhor
esquecermos esta conversa.
— Pois eu não acho! — A voz dele, vibrante, ressoava alta
no corredor de mármore. — Este foi nosso grande problema,
gatinha: nós nunca conversamos para valer. Mas eu quero
falar, e quero falar agora! Quero saber o que saiu errado e por
que você nunca teve a delicadeza de responder à minha carta!
— Não sei de carta nenhuma!
A resposta foi irritada. Leilah imaginou por um instante
se aquele não seria um pretexto para enfraquecer suas
defesas, que na verdade nem estavam fracas; simplesmente
não existiam! Sentada ao lado dele no táxi, ela precisou usar
todo o autocontrole para não apoiar a cabeça nos ombros
largos e se aconchegar ao corpo querido. Seus dedos tinham
ansiado tocar nos lábios dele.
— Pois então tem uma memória muito curta, srta.
Morrison — ele exclamou, passando por ela para acender as
luzes do living.
— Podemos conversar amanhã — Leilah sugeriu, mas seu
tom não mostrou convicção. A menção da carta era intrigante.
Ele a segurou pelos ombros e a fez entrar.
— Vamos conversar agora, gatinha. E, para começar,
pode me explicar por que não teve a decência de responder ao
menos com um simples "não"? — Ele a olhava enquanto se
movimentava como um robô, puxando as pesadas cortinas e
acendendo a lareira. — Tem alguma idéia do tormento que
passei?
Leilah virou-se para ele, as mãos nos quadris.

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— Tormento nada! Por acaso foi um tormento passear
com aquela beldade brasileira?
— Não fuja do assunto! Em primeiro lugar, a moça era
filha de um patrocinador. Quando visitei o Brasil eles me
receberam com muita amabilidade; portanto achei que tinha a
obrigação de retribuir a gentileza. Se você não estivesse fora,
cuidando de seus interesses, teria ficado conosco todo o tempo.
Como eu estava só, levei-a para conhecer alguns lugares.
— Inclusive sua coleção de selos?
Ele ignorou a provocação e prosseguiu:
— Em segundo lugar, ela era uma boa moça e
gostávamos de estar juntos, mas não passou disso. Não houve
nada entre nós. Não esqueça que àquela altura eu estava
loucamente apaixonado por você. Naquela época!
Leilah não sabia o que dizer nem para onde olhar. Em
algum lugar escondido em seu coração havia uma louca
esperança de que Hogan ainda sentisse alguma coisa por ela,
mas agora a esperança morrera. Ele deixara bem claro,
usando o verbo no passado.
— Em terceiro lugar, gatinha, eu estava esperando que
você voltasse quando o destino decidiu de outra maneira. O
acidente cancelou Wimbledon, você nunca voltou. Tive muito
tempo para pensar, no hospital, e logo que saí da cama lhe
escrevi, pedindo que se casasse comigo.
Leilah o olhava, perplexa.
— Algo não está certo — disse ela, pensando em voz alta.
— Nunca recebi essa carta.
— Mas Saul a enviou. . .
A voz dele foi sumindo e seus olhares se encontraram, em
sinal de compreensão. O envolvimento de Saul no caso das
flores que Leilah enviara, e agora no da carta, era mais que
mera coincidência. Hogan afundou no sofá, xingando. —
Aquele maldito!
— Você. . . quer tomar alguma coisa? — perguntou Leilah
enquanto se esforçava para assimilar o que acontecera.
— Boa idéia. Aceito um conhaque. Depois me conte o seu
lado da história. — Ele esperou até que ela estivesse sentada a
seu lado para começar a falar. — Acho que tudo gira em torno
do meu acidente. Quando minha perna ficou moída, apesar
das palavras de conforto, todos achavam mesmo que eu estava
acabado.
Ele sacudiu a cabeça, depois passou os dedos pelos cabelos
negros.
— Meu pai veio com conversas animadas de como eu logo

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estaria andando por aí; minha mãe me trouxe livros
tenebrosos sobre aleijados que tinham vencido a adversidade;
companheiros do tênis vinham me dizer das partidas que
disputaríamos. Na verdade todos, inclusive eu,
desacreditavam daquela conversa. Fiquei deprimido, sentia-
me um traste inútil. Estava no fundo do poço quando Saul
surgiu. Ele era positivo e acreditava que eu tinha futuro.
— É. . . Ele sabe enganar bem.
— Tem razão. Mas, quando ele começou a berrar que eu
tinha mais era que sair daquela cama e voltar ao tênis, onde
era o meu lugar, toda a sensação de derrota sumiu e eu senti
uma nova onda de energia me invadindo. A vida era algo que
valia a pena, graças a Saul.
— Então foi ele quem o convenceu a voltar?
Hogan tomou um gole de conhaque.
— Sim. Sei que ele não presta, mas pelo menos isso eu lhe
devo.
Leilah estava começando a entender.
— É por isso que continua na Spencer Associates, mesmo
discordando de seus métodos?
Ele confirmou com um movimento de cabeça.
— Agora suspeito que ele me queria em ação porque via
em minha volta uma ótima história, que lhe traria belos
lucros. — Hogan encolheu os ombros num gesto de
indiferença. — Quaisquer que tenham sido seus motivos, ele
me deu o estímulo de que eu necessitava, e na hora certa. Me
fez ver que havia uma luz no fim do túnel; me fez andar, fazer
exercícios na piscina, tudo isso. Quando os patrocinadores
insinuaram que queriam desistir, Saul os convenceu a
continuar. Ele parecia sinceramente interessado em mim e
confiei nele. Inclusive com relação à carta.
Ela o olhou, desconfiada.
— Por que não me telefonou ou escreveu novamente,
quando não recebeu resposta?
— Porque pensei melhor. Disse a você que tive tempo
para pensar e talvez tenha tido tempo demais. Não esqueça
que você nunca se interessou em me procurar.
—. Mas eu procurei! Enviei duas dúzias de rosas
vermelhas e uma carta dizendo que. . . que o amava! A mesma
carta onde eu declarei que iria a seu encontro no instante em
que você me pedisse.
— Lembro das rosas. Mas não havia nenhuma carta, nem
indicação de quem as mandara. Quando perguntei, Saul disse
que haviam sido deixadas por uma admiradora anônima. Oh,

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Leilah. . . tenho vontade de matá-lo!
— Ele estava protegendo seu investimento — foi a
conclusão objetiva dela. — Não esqueça que você é bem mais
vendável como conquistador incorrigível. Qualquer
compromisso prejudicaria essa imagem. — Havia sarcasmo
na voz dela. — E a imagem é feita sob metida!
— Você acredita mesmo nisso?
Ela jogou os belos cabelos para trás.
— Não importa no que eu acredito.
Hogan segurou-lhe a mão, entrelaçando os dedos nos
dela.
— Importa sim, gatinha.
— Por que não abandona Saul e não arranja outra firma
que cuide de seus interesses? Por mais que deva a ele, esta
dívida não pode durar para sempre. — Ela olhava para as
mãos grandes e bronzeadas que seguravam as suas, claras e
delicadas.
— De que lado você está? Não esqueça que mesmo
indiretamente contribuo para o seu salário e para a
manutenção de seu elegante escritório.
— Isso não é importante. Seja realista, Hogan.
— Eu sou. Sei muito bem que se eu tivesse falhado, Saul
me deixaria, tirando o último níquel que conseguisse arrancar.
— Pois então deixe-o!
— Mas também não esqueça que no momento Saul está
fazendo com que eu ganhe um bom dinheiro. Ele trabalha para
mim, não o oposto. Ele é um bom relações-públicas, embora
seja um sujeito desprezível. Se eu tentasse mudar de firma, ele
daria um jeito de convencer os outros de que Hogan Whitney
estava acabado. Não tenho condições de enfrentar uma coisa
dessas agora. — Hogan a olhou. Parecia arrependido por ter
falado demais. — Você acha mesmo que ele destruiu o nosso
caso de propósito?
— Na verdade não havia muito mais para destruir,
havia? Ele apenas deu um empurrão para apressar —
respondeu ela, com uma ousadia que estava longe de sentir.
— Pois acho que nosso caso tinha raízes profundas e que
um simples empurrão não o derrubaria. Tudo bem, as últimas
semanas antes de Wimbledon foram... — Hogan se calou um
instante procurando a palavra certa e prosseguiu: —
complicadas, mas...
— Era o começo do fim. Nosso caso já estava acabando.
— Engano seu, gatinha, hoje de manhã tivemos a prova
de que ainda existe muito fogo entre nós.

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Ele tirou o cálice da mão dela, colocando-o de lado. Depois
abriu os botões do dinner-jacket negro e, em seguida,
envolveu-lhe a cintura, puxando-a para si. Leilah sentia o
mundo inteiro girar quando a cabeça morena se aproximou da
dela e os lábios tocaram-lhe o pescoço, beijando-o levemente.
— Não, Hogan — protestou, tentando afastá-lo, mas ele a
ignorou. Levou as mãos dela até os lábios, beijando-lhe as
palmas, fazendo círculos com a língua e revelando com isso a
intenção erótica de fazer amor. Leilah quase enlouqueceu. —
Não — ela escutou sua voz repetir, mas era um protesto frágil.
Quando Hogan uniu a boca à dela, com doçura e paixão,
Leilah se viu abraçada a ele, o corpo procurando a satisfação
completa.
Então a respiração de Hogan tornou-se mais pesada,
mais rápida, e seus músculos rijos revelaram todo o seu
desejo. Mas ele ia sem pressa, dando tempo ao tempo,
procurando decifrar a mensagem dos lábios cheios que
esmagava, buscando a vibração daquele corpo frágil em
rendição incondicional. Com suavidade começou a beijar os
ombros nus de Leilah, fazendo com que ela recordasse o
passado de sonhos que tinham vivido juntos. Os olhos
cinzentos, escurecidos pelo desejo, admiraram os bicos róseos
dos seios, que surgiram depois que ele soltou a tira que
prendia o vestido.
— Você é tão linda!
Os dedos longos e musculosos tocavam com infinito
cuidado aquela pele acetinada, depois os bicos rijos, até Leilah
gemer de prazer. A cabeça morena se inclinou e a boca
entreaberta parecia desejar devorar o seio intumescido. Os
lábios quentes e molhados excitavam-na mais e mais, a ponto
de Leilah começar a abrir a camisa dele, ansiosa por sentir a
pele quente e macia. Hogan se afastou um pouco para jogar o
paletó e a camisa no chão.
— Juro que nenhuma outra me fez sentir assim tão. . . tão
completo.
Nesse instante o encanto se quebrou. O fato de ele
mencionar "outras" fez Leilah voltar à realidade com ciúme e
raiva.
— Está ficando tarde e você precisa ir — pediu, sabendo
que, se não impedisse, as coisas iriam longe e ela cairia outra
vez no encanto dele. Como tantas outras.
Com a ponta de um dedo Hogan fez um círculo em volta
do bico de um dos seios redondos, provocando um gemido de
desejo. Ele sempre soubera como lidar com ela.

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— Vamos nos amar, gatinha. É o que ambos desejamos.
Leilah lembrou-se de quando Saul aconselhou Hogan a ter
relações sexuais como forma de descarregar as tensões e de
como ela fora colocada nesta categoria. Violentamente,
libertou-se dos braços dele e prendeu a alça do vestido.
— Fazer amor não está entre meus deveres, Sr. Whitney.
— Ela sentiu que a voz traía sua emoção. — Estou aqui para
atender às suas necessidades profissionais, não às do instinto.
Hogan a olhou, espantado; depois recuperou o controle.
— Leilah, deixe de pose.
— Acho que preciso ser clara. Sou representante da
Spencer Associates e não tenho obrigação de me sujeitar a seus
caprichos.
Ela ia continuar, mas Hogan ficou em pé, e as palavras
lhe morreram na garganta ao perceber o ódio nos olhos dele.
— Sempre me esqueço do quanto você é ligada a Saul,
gatinha. Qual é a sua, hein? Me manter feliz mas nunca se
esquecer do seu alto salário? Fazer tudo desde que haja lucros?
Ele se abaixou e apanhou o paletó; depois pôs a mão num
bolso, tirou uma carteira de couro e começou a tirar notas,
olhando para Leilah enquanto as contava.
— Garotas lindas custam muito; tudo tem seu preço. Seu
amado chefe deve ter lhe ensinado isso também.
— Fora daqui! — ela gritou, enquanto ele puxava um bolo
de notas. — Fora!
— Com o maior prazer — respondeu Hogan, pondo o
dinheiro sobre a mesinha e inclinando-se ligeiramente antes
de ir embora.

Capítulo VI

A manhã transformou a mágoa de Leilah em vontade de


vingança. Ela não tinha escolha: precisava continuar a
supervisionar as atividades promocionais de Hogan. Mas
podia manter essa supervisão a um nível mínimo. Ele insistira
em pagar por seus favores e isso lhe doera; agora, teria que
pagar por seus sorrisos. E no instante em que a parte
profissional da viagem terminasse, ela o deixaria sozinho. Não
lhe dizia respeito o fato de ele estar num apartamento
estranho, numa cidade estranha, num país estranho.
O sangue de Leilah fervia quando ela se lembrava da
ofensa que Hogan lhe fizera. Ligá-la ao ávido Saul era injusto

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e ele sabia disso. Mesmo assim tinha torcido os fatos,
acusando-a de ser um monstro interessado somente em
dinheiro. E ainda por cima se colocara no papel de vítima! A
verdade, no entanto, era outra: ele mesmo confessara que
estava completamente arrasado quando resolvera escrever a
ela, pedindo-a em casamento.
Naquela manhã, um manto cinzento envolvia Hong-Kong,
escondendo as ilhas e o mar. Com a umidade veio o frio, e até
mesmo Leilah sentiu-se gelada. Vestiu um suéter preto de gola
alta, calças de veludo combinando e um casaco pesado por
cima. Depois trançou os longos cabelos e escondeu a palidez
com um pouco de blush. Maquilou levemente os olhos, e a boca
polpuda recebeu uma leve camada de batom rosado. Agora
podia enfrentar o mundo, inclusive Hogan.
O programa daquele dia era menos agitado. O primeiro
compromisso era um almoço no clube de golfe do Sr. Tan, que
prometia ser muito agradável e descontraído. Os nervos
tensos de Leilah estavam à flor da pele. Ela se esforçou para
conferir cuidadosamente todo o esquema. Tinha que levar
Hogan a tempo até os estúdios de televisão, para a entrevista
do fim da tarde. Depois de uma xícara de café, pois ela não
tinha a menor vontade de comer, Leilah enfiou as botas
negras, puxando o zíper, e, com determinação, bateu à porta
do apartamento de Hogan.
— Pronto? — perguntou, desafiando-o a dizer que não.
— Quase.
Ele vestia o blusão de couro marrom, uma camisa de seda
bege, calças de veludo também bege. A barba acabara de ser
feita c os cabelos negros estavam penteados.
— Então vamos.
A hostilidade era evidente. Se antes houvera alguma
camaradagem, esta agora estava destruída. E, quando Leilah
percebeu que ele mancava levemente, não sentiu nenhuma
simpatia. Se Hogan quisesse praticar os exercícios, já devia tê-
lo feito.
— Terri não veio para a sessão de fisioterapia? — ela
perguntou com falsa doçura, não escondendo que o vira
mancar.
.— Você sabe muito bem que não — foi a resposta
impaciente. — Talvez eu devesse ter-me levantado mais cedo,
mas estava cansado. Você disse que há uma boa distância
daqui até o clube, não é? Pois bem, terei tempo de fazer os
exercícios no táxi.
— Não vamos de táxi. Roger deixou o carro dele comigo e,

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como o clube fica nos Territórios Novos, achei melhor eu
mesma ir guiando.
Ao chegarem à garagem, Leilah saiu do elevador e se
dirigiu para um carrinho mal conservado. — É este — disse,
destrancando a porta. Percebeu o olhar horrorizado de
Hogan. — Pode não ser tão sofisticado como o seu Porsche,
mas anda e pode nos levar.
— Trazer também?
Leilah não se deu ao trabalho de responder. Entrou e
abriu a porta para ele.
— Entre.
— Não. Não há bastante espaço. Como pensa que vou
poder fazer os exercícios que preciso?
Leilah estava muito zangada, achando que ele queria
sabotar outra vez seus esforços.
— Toda essa bajulação lhe subiu à cabeça, Hogan! —
exclamou ela, saltando do carro. — Tudo bem, você é um galã
e não pode andar num carrinho, não é? Pois olhe aqui, você
pode ser o ídolo de todas as mulheres, mas meu é que não é!
Para mim não passa de um cara que joga bolas sobre redes e
não tem sido nada mais do que uma boa dor de cabeça desde
que chegou! — Bateu violentamente a porta do carro. —
Vamos. Vou ver se consigo uma limousine que lhe agrade,
senhor!
Ela o olhava como se achasse que ele era o tipo da pessoa
que pisava nos outros. Depois tentou trancar a porta, mas
estava tão nervosa que não conseguiu. Subitamente Hogan
soltou uma gargalhada.
— Oh, gatinha! — exclamou, alegremente. — Sabe que faz
séculos que ninguém tem coragem de me dizer estas coisas na
cara? Geralmente é "sim, Hogan; não, Hogan". Mesmo
quando sei que estão furiosos, mantêm um sorriso nos lábios.
E você não precisa arranjar uma limousine: eu viajo nesse
calhambeque se puder me sentar no banco de trás. — Ele
examinou o banco pelo vidro. — Ali vou poder estender a
perna e mexer os dedos.
Leilah perdera a pose, mas sentia-se bem melhor depois
daquele desabafo. Ao saírem da garagem pela rampa, um sol
fraco tentava furar as nuvens e a manhã não parecia tão
desagradável.
— Mais contente agora? — provocou Hogan, e ela
permitiu-se sorrir levemente.
— Já vou me desculpar dos solavancos — disse ela,
quando teve dificuldade em trocar a marcha. — Este carro não

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é usado desde que Roger foi viajar, e tem lá seus truques.
Aos poucos Leilah foi se familiarizando com o carrinho e
ficando mais à vontade. Os Novos Territórios eram menos
povoados e ela gostava daquela escapada para os campos,
longe dos ruídos e do congestionamento da cidade. O sol
apareceu e as nuvens mostraram nesgas de um céu azul.
Hogan estava encantado com os nomes exóticos das
povoações por onde passavam; o falso mundo ocidental fora
deixado para trás. Agora só se viam velhas chinesas vestidas
de pijamas pretos, escondidas nos chapéus cônicos, ao lado da
estrada. Os campos estavam sendo trabalhados por
camponeses.
Leilah gostou de mostrar seus conhecimentos sobre o
lugar. Explicou a Hogan tudo que ele quis saber e, ao olhar
pelo espelho retrovisor, viu-o de olhos fechados e expressão
sombria. Sentiu remorsos e percebeu que ele levara adiante a
conversa sobre os Novos Territórios mais para disfarçar a
dor.
Leilah passou a vigiá-lo, ansiosa. Estava tão distraída
que, quando uma criança apareceu de repente na frente do
carro, seguida de um bando de patos, ela, tomada de surpresa,
freou abruptamente. O garoto pulou para o lado: houve o
ruído de um baque seguido de grasnados frenéticos. Hogan foi
atirado, caindo entre o banco da frente e o de trás.
— Mas que bagunça! O que pensa que está fazendo? —
perguntou ele, a voz traindo a dor que sentia. Com imenso
esforço sentou-se novamente, segurando a coxa com as duas
mãos. — Você sabe que preciso evitar choques violentos e me
presenteia com uma freada!
Com o coração aos pulos, Leilah desligou o motor.
— Eu tive que frear, não tinha outra opção. Sinto muito.
— É o mínimo que espero de você!
— Está bem agora? — perguntou ela, a voz traindo a
emoção que a dominava.
Ele resmungou alguma coisa baixinho e continuou
segurando a coxa.
Leilah não sabia o que fazer. A criança, metida num
pijama folgado, continuava ao lado da estrada, chupando o
dedo e olhando para eles. O grasnado dos patos continuava e,
quando um deles veio pousar no capo, Leilah se desesperou.
Estava com os nervos em frangalhos.
— Hogan — disse com voz trêmula —, desconfio que matei
um pato.
— Fique aqui. Eu vou dar uma olhada — disse ele,

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saltando com dificuldade.
Ela permaneceu imóvel, as mãos agarrando o volante
com tanta força que os nós dos dedos ficaram lívidos. Será que
havia algum sob as rodas, ainda vivo? E o que Hogan faria?
Seria o caso de matar o bichinho para que a agonia
terminasse? Mas Hogan simplesmente espantou o pato que
estava no capo e depois se aproximou da janela de Leilah.
— Não houve mortes. Todos eles poderão continuar
tranquilamente seu caminho rumo à panela.
— Que sorte!
Hogan deu a volta, flexionando a perna enquanto andava.
Abriu a porta da frente e sentou-se ao lado dela.
— Gatinha, não fique assim. Não aconteceu nada. —
Tocou-lhe o rosto com a ponta dos dedos, sorrindo ao ver os
olhos azuis brilhantes de lágrimas. — Foi um acidente, e eu sei
melhor do que ninguém que acidentes acontecem.
— Oh, Hogan! — Leilah soluçava contra o peito dele.
— Calma, calma, não foi nada — ele murmurou,
enquanto lhe acariciava os cabelos e lhe beijava os olhos.
Leilah apoiou-se nele, em sua força, sua calma.
— Pensei que tivesse matado um pato e sei que machuquei
você — ela disse aos soluços, procurando um lenço na bolsa
para enxugar as lágrimas. — Tem certeza de que não
aconteceu nada grave com sua perna?
— Ela está ótima — ele garantiu, esperando que ela se
recuperasse.
Finalmente Leilah se acalmou e consultou o relógio.
— Não temos razão para pressa. Vou bem devagar —
prometeu ela. — Quer sentar atrás?
— Não, obrigado, acho que estou mais seguro na frente,
como co-piloto. — Sorriu. — Como já disse a você, a perna
volta ao normal depois que começo a me movimentar. Não
terei mais problemas durante todo o dia.
Leilah girou a chave para dar a partida.
— Não acredito — disse, de olho na estrada. Fez as
mudanças de marcha e, quando seguiam, acrescentou: — Diga
a verdade, Hogan, acha mesmo que vai conseguir voltar a
competir?
Hogan deu um suspiro profundo.
— Não sei.
— Sua perna está cada vez pior, não é mesmo?
— Sim, é verdade.
— Então, se estes exercícios pesados continuarem, fora as
corridas e os jogos, você corre o risco de. . . perder os

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movimentos?
— Possivelmente. — Ele se calou por alguns instantes
antes de continuar: — Possivelmente não; com toda certeza! —
corrigiu, e ela sentiu que as palavras estavam carregadas de
revolta. Hogan passou as mãos nos cabelos. — Quando
recomecei os treinamentos, o músculo estava emperrado e tive
espasmos, mas duravam pouco tempo. De um mês para cá
percebi que, em vez da rigidez habitual da manhã, também
havia fraqueza. Eu menti para você; caí outras vezes. — Cada
frase era dita com imenso esforço. — Agora preciso de pelo
menos meia hora de exercícios antes que o músculo fique forte
o bastante para agüentar meu peso.
— Não seria melhor se você procurasse seu cirurgião e
conversasse com ele?
— Não! — ele respondeu depressa. Ficou calado alguns
instantes e acrescentou: — Eu sei o que ele vai dizer.
— Que você deve abandonar o tênis.
— Isso mesmo. E como posso parar agora? Há milhões
de dólares investidos em mim. Além disso, pode ser que minha
perna fique forte o bastante para permitir que eu dispute e
vença alguns torneios.
— E aquela noite? O que houve?
— Eu estava cansado.
— Só cansado? As outras pessoas estavam convencidas de
que você procurava tornar o jogo interessante, mas não foi
isso, foi Hogan? Eu já o vi jogar cansado, mas não com um
estilo tão dura. Você teve sorte por aquela partida ter se
realizado em Hong-Kong. Se tivesse jogado assim na Europa
ou nos Estados Unidos, haveria perguntas embaraçosas.
Ele a olhou, irritado.
— Mas eu venci! Se eu mantiver o controle, estarei ótimo!
Ainda tenho capacidade para vencer!
— Você tem é capacidade de arruinar essa sua perna
para sempre — ela revidou zangada, fazendo a curva para
entrarem no caminho de paralelepípedos que levava à sede do
clube de golfe. — Por que está fazendo isso? Me ataca, dizendo
que só vejo dinheiro na frente, mas está pondo o dinheiro antes
da saúde, e para mim isso não tem sentido!
— Perdoe-me por ontem à noite. Você me deixou tão louco
que precisei ser cruel. Tenho andado tão amargurado com
minha perna que me descontrolo e digo coisas absurdas.
— Desculpas aceitas — ela respondeu, séria, indicando
que, embora estivesse pronta para desculpar, não estava
disposta a esquecer. — Veja bem, você despreza Saul porque

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ele adora dinheiro. Mas pelo menos o velho não está disposto a
se aleijar por isso.
— Eu não dou a mínima para o dinheiro. Já tenho o
suficiente.
— Então está com medo de aborrecer seus
patrocinadores! — exclamou ela, espantada. — Mas todos nós
sabemos que os patrocinadores pulam fora quando
pressentem algum risco! Você poderia consultar seus
advogados e chegar a algum acordo.
Hogan ficou olhando os extensos gramados, sem ver
nada.
— Tudo bem; tudo bem, os patrocinadores poderiam
entrar em acordo, mas o que seria de mim! — exclamou,
batendo com a mão no peito. Leilah percebeu que ela o forçara
a admitir seu dilema real. — A única coisa que conheço é a
vida de tenista. Desde que saí da faculdade não larguei as
raquetes. Elas têm sido minha bagagem, meu passaporte para
o sucesso, para a alegria. O tênis tem sido a razão da minha
vida!
Leilah estacionou o carro ao lado da casa da sede,
desligou o motor e virou-se para Hogan.
— Duvido que alguém no mundo saiba disso melhor do
que eu — disse friamente, e saiu para cumprimentar o Sr. Tan.
O almoço no clube de golfe foi um sucesso. Hogan
esbanjou seu costumeiro charme, e depois fez uma explanação
bem-humorada e inteligente sobre o que é a vida nos altos
escalões do tênis. Leilah achava difícil acreditar que à sua
frente se encontrava um homem que chegara a uma
encruzilhada na vida. Mas a imagem era tudo, pensou
sombriamente, e onde estaria Hogan se não fosse o tênis? Ou
melhor: o que Hogan seria sem o tênis?
Mais tarde, a convite do Sr. Tan, ele foi conhecer o campo
de golfe. Leilah ficou na sede, onde esperava descansar um
pouco, mas foi cercada por dois empresários, que lhe pediram
informações sobre seu trabalho, pois tinham ouvido
maravilhas a seu respeito através do Sr. Tan.
Hogan voltou do passeio com várias partidas combinadas
para os próximos dias.
— Você tem cartaz com o Sr. Tan — comentou ele, quando
voltavam. — Ele não se cansou de elogiar sua competência.
— Ele comentou a apresentação de Jasmine?
— Só soube que ela fez muito sucesso. — Hogan deu uma
risadinha. — Parece que pensa que a filha venceu por sua bela
voz. Mas, segundo ele, a carreira de cantora não é um bom

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investimento, porque o vestido com que Jasmine se apresentou
custou dez vezes o cachê pago pelo Dinasty Hotel. E agora ela
espera que o "papai" financie um segundo vestido.
Leilah riu.
— Então o Sr. Tan começou a fazer cálculos e a duvidar
que a carreira valha a pena, hein?
— Ele se assustou quando comentei que, se a carreira da
filha deslanchasse, ela teria necessidade de muitas roupas,
além das contas do cabeleireiro, passagens aéreas, estadias
em hotéis e. . .
— Uma porcentagem para a Spencer Associates.
— Você fala como uma profissional competente.
Hogan a olhou com amargura e Leilah sentiu que o clima
entre eles começava a mudar. Tentou reavivar a
camaradagem anterior.
— Obrigada por ter-me ajudado nessa história toda.
— Quando eu for jogar golfe com o Sr. Tan, vou enumerar
mais algumas desvantagens da carreira de cantora.
— Eu apreciaria o esforço. Ei, Hogan, o que acha de ser
modelo da linha de roupas esportivas do Sr. Tan?
— Puxa vida, você não perde uma chance, perde?
— A Fast-Lane vende blusões, abrigos, camisas esporte.
Tem uma linha completa.
— Não vou precisar usar maquilagem, vou? — Hogan
perguntou, desconfiado. — Eu não agüento aquele lixo no
rosto.
— Você me surpreende! Pois eu seria capaz de jurar que
uma sombra roxa e um toque de blush terracota fariam o seu
gênero! — Hogan ria. — Além, é claro, de uma bolsinha
amarrada a esse punho desmunhecado. . .
— Eu não tenho nada desmunhecado — protestou Hogan,
agarrando a mão dela. — Vamos, sinta.
Rindo, Leilah se soltou.
— Eu acredito! Agora me deixe sossegada. Não sabe que é
perigoso distrair o motorista?
A entrevista na televisão não foi diferente das outras.
Choveram perguntas sobre como era a vida nos bastidores do
esporte, as tensões, o dia-a-dia, os treinos, fatos pitorescos, o
futuro.
Com o queixo apoiado nas mãos, Leilah, sentada no
anonimato do auditório em penumbra, o observava. Na última
década, ele passara quarenta semanas por ano viajando e
competindo nos circuitos de tênis. A maioria dos momentos
felizes tinham vindo por intermédio do tênis, e também os

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piores. Tinha enfrentado amargas rivalidades, superstições,
dramas, maledicências. Tinha conhecido uma alegria intensa
nas vitórias e o amargor na derrota. Estivera mergulhado no
mundo absorvente do tênis durante a maior parte da sua vida,
e era capaz de conversar de maneira interessante e informada
sobre vários outros assuntos. Hogan era um ser humano
completo. E a imaginação de Leilah começou a funcionar. . .
— Quer entrar um pouco e tomar um drinque? — ela
convidou, quando voltaram aos apartamentos.
Ele a olhou, desconfiado.
— O que está planejando?
— Estive pensando em seu dilema e gostaria de dar
algumas sugestões sinceras.
— Ainda está na pele da funcionária da Spencer
Associates?
— Isso não tem nada a ver com negócios — ela assegurou,
enquanto destrancava a porta. — Ao contrário do que você
pensa, não sou marionete de Saul. Eu o trato com prudência,
como você também faz, mas obviamente, como ele é meu chefe,
devo-lhe certa lealdade.
Hogan a olhou longamente.
— Já pedi desculpas pelas ofensas. Sou explosivo e tudo o
que eu disse foi no calor do momento. — Deu um sorriso
constrangido. — Pode acreditar: eu nunca falaria francamente
sobre a minha perna se desconfiasse que você iria contar a
Saul.
— Então estamos entendidos? Muito bom! — Ela sorriu e
ele concordou, também sorrindo. Entraram no apartamento.
— Você topa transformar aquele drinque num café e
arranjar alguma coisa para comer? Aqueles vol-au-vent que
serviram nos estúdios de televisão eram muito pequenos.
Engoli seis, um depois do outro, e não adiantou nada.
— Que tal ovos com bacon? E, se você continua viciado
em iogurte, tenho na geladeira algumas variedades orientais.
— Maravilha!
Enquanto Leilah fritava o bacon e preparava os ovos,
Hogan colocou xícaras e pires na mesa da cozinha.
— Tenho a sensação do déjà-vu, gatinha — disse ele,
chegando por trás dela, no fogão. Depois passou-lhe o braço
pela cintura, roçando o rosto nos cabelos dourados. — Tivemos
noites maravilhosas em seu apartamento, em Londres. O único
defeito é que não foram suficientes. — Beijou-lhe levemente a
nuca com lábios mornos e sensuais. — Depois do jantar, nós
nos sentávamos perto da lareira para escutar música.

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Fazíamos amor, tomávamos banho juntos e. . . cama! Puxa! —
Ele se encostou mais e ela sentiu que os corpos se colavam. —
Era tão bom!
Ela respirou fundo e se afastou um pouco, sob o pretexto
de cuidar dos ovos.
— Mas era principalmente atração física. Nada mais.
Um relacionamento precisa de mais do que isso. Eu pelo
menos penso assim. Porque a parte física era tão. . . tão forte,
nós confundimos com amor, mas não era. Foi um. . . um
engano. — Ela estava usando '"nós" mas na realidade queria
dizer "você". O amor dela fora real mas o de Hogan não
passara de ilusão. Deu meia-volta e o encarou. — Vamos
aprender com os nossos erros e manter as coisas como estão.
Quero que nosso relacionamento seja platônico. Nada de beijos
nem carícias. Vamos ser bons amigos.
— Se é isso o que quer. . . Mas. . .
— Nada de "mas''. Você vai ficar aqui por poucos dias,
tanto. . .
— Portanto devo me controlar e dar uma olhada na
geladeira para procurar o tal iogurte oriental.
Leilah teve a impressão de que, apesar da atitude
amigável, ele estava ferido. Ou somente desapontado? Ela não
sabia. Talvez fosse somente amor-próprio ferido de alguém
que se julgava irresistível. Mas ele pareceu se recuperar logo e,
depois de comerem o bacon com ovos, ambos relaxaram.
Hogan foi abrir um copo de iogurte com mais força que
habilidade e o conteúdo espirrou em seu rosto.
Leilah apanhou um guardanapo.
— Você está coberto de iogurte! — comentou, rindo e
limpando-o. E, antes que se afastasse, ele a agarrou pelo
pulso.
— Por que você não lambe o que ficou no meu bigode? —
disse com malícia, os olhos cinzentos brilhando.
— Algumas vezes você é insuportável, sabe? — revidou
Leilah, tentando se libertar enquanto uma onda de desejo a
invadia. Quando Hogan soltou-lhe a mão, ela o olhou,
irritada. — Nós concordamos que daqui para a frente nossa
amizade seria platônica!
Ele atirou-lhe um beijo irreverente.
— Você sabe como as coisas acontecem conosco, gatinha.
Acredita que podemos manter um relacionamento platônico?
— Acredito! — ela exclamou sem convicção, percebendo
que se continuasse ali sentada Hogan iria se aproveitar de sua
fraqueza. Levantou-se e começou a tirar os pratos.

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— Peço desculpas — ele disse, enquanto levava à boca a
última colherada de iogurte e observava com indisfarçável
divertimento a agitação dela na minúscula cozinha. Fez cara
de santo: — Vou ser um bom menino.
— É melhor mesmo, porque estou falando sério. Vou
mandar você embora se não se comportar.
— Sim senhora.
Ele a ajudou a lavar a louça, conversando sobre
generalidades, aparentemente decidido a não provocá-la.
Depois, levaram o café para a sala. Evitando o sofá, Leilah
sentou-se numa poltrona e cruzou as pernas. Achava que não
teria mais problemas com Hogan, mas preferia não correr
riscos.
— Por que não muda do tênis para outro esporte? —
perguntou depois de um gole de café. — Algo que não exija
tanto de sua perna. . .
Ele a olhou como se ela tivesse dito um absurdo.
— O que sugere? Dominó?
— Golfe.
— Você só pode estar brincando! Acha mesmo que seria
fácil mudar para o golfe? Eu lhe asseguro, meu amor, as
coisas não são assim!
Leilah estremeceu quando ele disse "meu amor". Mas não
havia de ser nada: hábitos antigos demoram a morrer.
— E acha que será fácil continuar no tênis?
— Não, mas pelo menos esse terreno eu conheço. O golfe
seria um passo no escuro e, para ser franco, isso me
aterroriza.
— Você disse que era bom no golfe.
— Mas não a esse ponto! É somente um hobby.
— Exatamente! O jogo não passa de um hobby, mas você
é bom. Se abandonasse o tênis e se concentrasse no golfe, será
que não descobriria que poderia ser "muito" bom?
Hogan tomou um gole de café.
— Duvido.
— Você é decidido. Tem equilíbrio, reflexos rápidos,
capacidade tática, cabeça fria. Certo?
— O que não significa que possa ser profissional do golfe.
— E também não significa que não possa ao menos fazer
uma tentativa! — Leilah arregaçou as mangas do suéter,
animada. — O que tem a perder? Você não é tolo, Hogan, e
pelo pouco que me contou, mesmo que não esteja querendo
admitir, o tênis é uma opção duvidosa.
— Mas não tenho certeza ainda — ele teimou, e respirou

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fundo. — Mesmo que o pior aconteça, será que a solução é
mesmo me dedicar a outro esporte?
— Mas você sempre afirmou que gosta de competir, que
precisa de desafios!
— Reconheço que pensava assim antigamente. Agora já
não estou mais tão certo. Somente nestas últimas semanas
percebi que minha coxa poderá me impedir de chegar até o
topo no mundo do tênis, mas ainda não tive tempo ou coragem
de pensar no caso seriamente. Estou falando sobre o assunto
pela primeira vez. — Passou os dedos nos cabelos
despenteados. — Não tenho idéia do que vou fazer. Meu Deus,
passei por depressões e alegrias até ficar cheio! Alguns dias
sinto um frio na boca do estômago e acho que sem o tênis não
sou ninguém: um zero, um nada. Mas em outros eu me lembro
que sempre tive noção da vida fora do esporte e que vou
conseguir sobreviver.
— É por esta razão que você sempre se entendeu tão bem
com os patrocinadores. Eles preferem alguém com
personalidade.
— E mesmo assim você sempre achou que eu me dedicava
| demais ao tênis!
— Está me perguntando ou afirmando?
— Estou afirmando. Mas você sempre esteve enganada,
Leilah. O mundo do tênis profissional não é um emprego de
escritório, com horário das nove às cinco. Abrir caminho até o
topo é infernal. Disputei partidas que duraram sete, oito
horas. Imagine sete horas numa quadra, com milhares de
olhos sobre você, observando cada gesto! Não existem muitos
outros esportes que exigem tanta concentração, tanto esforço
físico seguido. — Ele sorriu, desanimado. — Houve ocasiões em
que a minha vontade era atirar a raquete para o alto e ir me
esconder em algum buraco.
— Sei que é uma vida dura. Para mim aquilo tudo era
novidade e talvez eu tenha tido ciúmes, sentindo quanto você
era dedicado à profissão — admitiu ela. Mas o que interessava
agora não era o passado e sim o futuro; o futuro de Hogan. —
Você também poderia entrar numa universidade.
— Que tal abrir uma confeitaria?
— Que tal uma escola de tênis?
— Que tal me transformar em modelo? Com bolsinha e
tudo?
Ele sorria agora, mais animado.
— Falo sério. Existem dezenas de carreiras. Não há
necessidade de abandonar definitivamente o tênis; apenas o

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bastante para não prejudicar sua perna. .
— O futuro me dá medo, se quer saber.
— Mas, cedo ou tarde, você será forçado a tomar uma
decisão.
Hogan fez uma careta.
— É verdade. Fingir que meu problema não existe não é
muito inteligente, certo? Enquanto estiver em Hong-Kong vou
pensar sobre o assunto e tomar uma decisão. Eu ficaria grato
se pudéssemos conversar mais sobre o assunto. Você é uma
moça esperta e acho que juntos poderemos pensar em alguma
coisa.
— Vou gostar de ajudar você.
— Obrigado. Devo ter tudo resolvido quando for falar
com Saul. Se ele suspeitar que estou pensando em mudar, vai
começar a imaginar algum horrendo esquema publicitário.
— E acha que não fará isso de qualquer jeito?
— Não se eu cancelar o contrato. Se usar a cláusula de
desistência perderei dinheiro, mas valerá a pena escapar das
garras de Saul. Sei que vou me sentir bem melhor se levar
minha vida com mais dignidade e não sob as luzes do circo
armado por ele
— Vai ter que fazer um bom trabalho se pretende mesmo
vencê-lo.
Mais tarde eles se lembrariam bem daquelas palavras.

Capítulo VII

Depois de ter decidido que não faria o menor gesto para


ajudar Hogan durante suas férias, Leilah mudou de opinião.
Afinal de contas, pensou ela, ele tinha sido ótimo. A impressão
que causara em Hong-Kong fora das melhores e isso
beneficiara muito a Spencer Associates, fazendo com que o
nome da firma subisse no conceito geral.
Agora, via-se satisfeita em arranjar um carro para ele ir
até o clube de golfe, falar com um agente de viagens para
providenciar uma excursão à China, acompanhá-lo até lojas
com produtos do mundo inteiro, as célebres dutyfree shops,
explicar onde poderiam ser alugados barcos de passeio. Terri e
seu amigo de Wisconsin o acompanharam várias vezes em
cruzeiros pelas ilhas próximas.
— Você não pode deixar o escritório e vir com a gente? —
perguntou Hogan a Leilah, com seu sorriso charmoso.

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— Sinto muito, mas não posso. Agora que as festividades
do Ano Novo Chinês já passaram, meu ritmo de trabalho está
voltando ao normal.
Mas, embora ela passasse os dias no escritório enquanto
Hogan passeava e jogava golfe, à noite eles conversavam
muito. Quando um deles tinha alguma idéia, os dois a
discutiam juntos. Algumas vezes discordavam; muitas vezes
aquela idéia levava a outra. De repente eles tinham se tornado
grandes amigos, partilhando uma afinidade grande como
jamais Leilah teria imaginado, e que a encantava. Ela mal
podia esperar que as noites chegassem para vê-lo.
Não demorou muito è o fato de Hogan respeitar seu
desejo de uma amizade platônica começou a incomodá-la.
Verdade que ele ainda a chamava de "gatinha" e "meu amor",
mas isso parecia uma coisa automática, sem importância. Não
tentava beijá-la ao se despedir, contentando-se em acenar ou,
no máximo, dar-lhe uma palmada carinhosa no traseiro, como
faria um irmão mais velho. Ela reconheceu que estava sendo
incoerente; era o caso típico de "depois que consegue o que
quer, você não quer mais assim'". Mas o que, na verdade, ela
queria? Leilah temia descobrir a resposta.
A idéia de que ele iria embora dentro de poucos dias era
doce e amarga. Hogan parecia decidido quanto ao futuro. Ele
guiaria sua vida, não seria guiado por ela, e o pensamento de
uma vida sem o tênis não mais lhe parecia assustador. Leilah
sabia que aquele homem seria capaz de entrar numa nova
vida sem sua ajuda. Mas, quando mais cedo ele partisse,
melhor ela poderia reorganizar sua vida, e o primeiro passo
seria não pensar mais em Hogan Withney. . .
Leilah olhava pela janela do escritório, batendo as unhas
no vidro, distraída. A manhã estava chuvosa e o mar agitado.
Hogan tinha optado por atividades que classificava de
tranqüilas: duas horas de ginástica no Dinasty, uma excursão
pelos museus depois do almoço e mais tarde encontrar Leilah
para um mergulho na piscina do hotel. O programa de
treinamento fora modificado para evitar qualquer esforço do
músculo da coxa, mas ele continuava a se exercitar, para que
todos se convencessem de que as coisas continuavam bem. Os
compromissos no Havaí teriam que ser respeitados, e por isso
Hogan procurava se manter em forma.
Ela sorriu ao pensar que, depois de nadarem, voltariam
ao apartamento e conversariam enquanto preparavam o
jantar. Sabia que Hogan estava estruturando algum plano, e
embora ainda não o tivesse contado. Quando o

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intercomunicador tocou, ela teve um sobressalto.
— Srta. Tan na linha outra vez.
— Pode ligar.
Jasmine telefonava diariamente desde a estréia, para
saber se havia alguma coisa para ela. Na esperança de que as
conversas entre Hogan e o Sr. Tan ajudassem, e sabendo que
Y.C. Wong concordava com ela, Leilah ia levando. Mas os
telefonemas estavam se tornando insistentes, e embora as
dúvidas do pai de Jasmine quanto às vantagens econômicas
da carreira da filha estivessem aumentando, nada ainda
estava resolvido.
— Estou pensando em cantar no Jardim do Crepúsculo —
anunciou a chinesinha. — Você não pode entrar em contato
com eles?
— O Jardim. . . — Leilah não conseguiu terminar a frase.
— Jasmine, você não pode estar falando sério!
— Pois estou. Talvez não seja tão sofisticado como os
hotéis, mas seria um começo.
Leilah ficou atordoada. O Jardim do Crepúsculo era um
cabaré de segunda categoria e, embora nunca tivesse posto os
pés lá, tinha escutado histórias terríveis sobre ele.
— Um péssimo começo, Jasmine. Não tome atitude
alguma antes de falar comigo outra vez. E repito: não tente
nenhuma entrevista. Se quer mesmo que eu cuide de sua
carreira, deixe tudo comigo.
Houve uma pausa.
— Mas no Jardim vão turistas do mundo inteiro! Quem
sabe um caçador de talentos vai estar na platéia, uma noite
qualquer. Estou tomando aulas de canto e de dança; quero ser
versátil. Nunca se sabe. . . algum dia eu talvez estrele um
musical.
— Quem sabe, não é? — Leilah tentou não se mostrar
muito cética. Segurou o punho enfeitado de seu tailleur Chanel
cor de café. — Quem está pagando todas essas aulas?
— Meu pai, embora eu ainda não tenha dito a ele. —
Jasmine deu um suspiro. — Por favor, providencie uma
apresentação o mais depressa possível.
— Essas coisas demoram. Os hotéis organizam seus
programas com muita antecedência. Pode demorar até a
primavera antes que. . . — Do outro lado do fio a moça deu um
gemido angustiado. — Tenha calma. Farei tudo o que puder.
Leilah respirou aliviada quando desligou. Hogan tinha
combinado jogar tênis com o Sr. Tan no dia seguinte, se não
chovesse, e sua única esperança era a de que ele a ajudasse a

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desiludir o velho industrial quanto às vantagens financeiras
da carreira da filha.
— Nova York na linha — avisou Violet pelo
intercomunicador.
— Aqui Saul, beleza. — Tinha que ser Saul. Ninguém
berrava tanto! Leilah segurou o fone longe do ouvido. — Boas
e más notícias para o nosso astro. As boas são que os jornais
provavelmente falarão dele diariamente nos próximos meses.
Hogan tem um sexto sentido maravilhoso para isso! — E deu
uma gargalhada.
O que teria acontecido? Saul devia estar exagerando,
como sempre.
— Você não prefere falar diretamente com Hogan? Ele
está no Dinasty e posso dar o número.
Sua intuição pedia que se mantivesse longe da vida
particular de Hogan. As conversas à noite eram cada vez mais
intensas e francas, mas ela temia estar fazendo o papel de
confidente e nada mais. Hogan tomaria sozinho as decisões
finais e, quando partisse de Hong-Kong, estaria também
partindo da vida de Leilah. Insistindo em manter um
relacionamento platônico, ela agora percebia que garantira
também que não haveria um futuro para os dois.
— Você pode passar a informação para ele — continuou
Saul, com a mesma animação. — Puxa, como eu gostaria de
ver a cara dele quando souber!
— Souber o quê? — Leilah desconfiava que não devia ser
nada de bom, pelo tom de voz de Saul.
— As más novas. Pelo menos penso que Hogan achará
que são más.
— O que é?
— A razão de toda a confusão.
— Que confusão?
— Ele está sendo citado num processo de paternidade.
— Oh!
— Uma garota na Noruega diz que deu à luz um filho
dele. É uma beleza de loira — disse Saul com sua grossura
característica, e Leilah estremeceu. — Ela e Hogan tiveram um
caso quentíssimo. Que cara! Não há nada melhor do que uma
pitada de escândalo para. . .
— Se me der os detalhes, pedirei a ele para telefonar —
Leilah ainda conseguiu dizer, mas mal conseguia segurar a
caneta, de tanto que tremia.
— Diga-lhe para telefonar o mais depressa possível.
Estou para soltar um comunicado à imprensa.

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— Não acha que deveria consultá-lo antes? Pode ser que
ele não deseja tornar público o fato. Depois, a coisa pode ser
falsa; é comum garotas acusarem homens famosos de casos
assim. — Leilah estava sangrando por dentro e a única
maneira de se proteger era recusar-se a acreditar na história
de Saul.
— Deixe disso, menina. Um processo de paternidade é a
melhor coisa que já aconteceu a ele. Todos gostam de um
pouco de fofoca e nós precisamos capitalizar essa história,
meu bem.
— "Você" precisa porque, uma vez que ele parta de Hong-
Kong, sai da minha alçada.
Quanto mais cedo Hogan partisse, melhor seria. Leilah
estava a ponto de chorar e só respondeu com monossílabos até
Saul desligar. Depois escondeu o rosto nos braços até se
acalmar um pouco e concluir que só havia uma coisa a fazer.
— Violet — chamou pelo intercomunicador —, ligue para
ó Dinasty e chame o Sr. Whitney. Preciso falar com ele, é
urgente. Ele deve estar no ginásio.
Enquanto esperava, brincou com uma mecha que tinha
escapado do coque, acabando por desmanchá-lo todo. Logo
Hogan estava na linha.
— Saul telefonou e deixou um recado para você.
Encontro-o em meu apartamento dentro de meia hora. — E
desligou, como se o aparelho estivesse queimando seus dedos.
Saiu e ensaiou durante todo o trajeto o que diria. Como
Hogan reagiria? Poderia ficar surpreso, divertido, orgulhoso,
impertinente. Quando chegou, e foi colocar o café na máquina,
suas mãos tremiam sensivelmente. Quando a campainha soou,
ela chegou até a porta como um robô.
— O que aconteceu? — perguntou Hogan, percebendo
imediatamente a palidez dela e os olhos azuis angustiados,
febris.
— Más notícias?
— Não. Sim. Não. — Ela desabou no sofá.
— Gatinha, diga o que aconteceu — pediu Hogan,
sentando ao lado dela e segurando-lhe as mãos.
Leilah desviou o olhar; não queria chorar, queria
permanecer indiferente.
— Você está sendo citado num processo de paternidade.
Uma moça norueguesa deu à luz o seu... — ela engoliu em seco
antes de prosseguir — ... seu filho. — Puxou a mão e pegou um
bloco na mesinha à sua frente. — Aqui está o nome e o
endereço e mais alguns detalhes. — Rasgou a folha com as

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anotações e entregou a ele. Não conseguiu disfarçar a
amargura na voz quando acrescentou: — Ganha-se algumas,
perde-se outras. Parece que desta vez você perdeu, Hogan.
Ele leu e releu o papel, intrigado.
— Não conheço a moça e faz três anos que não vou à
Noruega.
— E daí? Pode ser alguém que você encontrou uma noite
qualquer em Paris, St. Tropez ou Londres. — Leilah deu uma
risadinha, tentando parecer indiferente. — Eu diria que uma
loira é semelhante a qualquer outra loira!
— Que diabo você sabe de tudo isso! — exclamou ele,
zangado, os olhos cinzentos brilhando. — Tudo bem, não vou
dizer que fui um monge todo esse tempo, mas não ando me
deitando com todas as mulheres que encontro, como você
parece acreditar! É irônico que acredite em cada vírgula do
que um cara tão desclassificado como Saul diz! Eu não sou um
maníaco, Leilah. Na verdade, me mantive fiel a você durante
três meses e teria continuado assim pelo resto da vida se
tivesse tido essa chance. — Com sarcasmo, ele sacudiu o papel.
— Por mais que não acreditem, tenho princípios. Nunca passei
uma noite com uma estranha, me arriscando a ter um filho
não desejado. Este play-boy aqui é bastante antiquado para
acreditar em coisas como amor e casamento.
— Acredito em você. — Leilah não conseguia evitar que
sua voz tremesse. — Eu disse a Saul que deveria haver algum
engano.
— Então estou em mãos confiáveis, não? — ele exclamou,
sarcástico. Estava lívido, o rosto era uma máscara sombria.
Levantou-se e dirigiu-se para o telefone. — Como ligo para
Nova York? — Ela se adiantou e tentou se manter fria
enquanto discava. Quando o telefone tocou, entregou o
aparelho a ele, mas Hogan a segurou pelo braço. — Você vai
ficar e escutar tudo direito! Enquanto eu permanecer em
Hong-Kong meus interesses estarão em suas mãos. Portanto é
bom que tome nota do que vou ordenar. Qualquer deslize seu
ou daquele seu chefe diabólico e os dois poderão sofrer um
processo por calúnia e difamação!
Leilah fitou-o com olhos arregalados.
— Isso não é justo! — protestou, indignada. — Desde seu
acidente você tem concordado com o tipo de promoção que
enfatiza sua. . . sua virilidade, e agora não pode agir como
uma virgem ultrajada! Não pode ter as duas coisas!
— Posso sim, lógico que posso! — Hogan deu um sorriso
ameaçador. — Admito que nunca me queixei da imagem de

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conquistador, mas era uma coisa suave. Não feria ninguém.
As moças com quem eu saía sabiam o que estava acontecendo
e também se beneficiavam da publicidade.
— E será que esta norueguesa não quer a mesma coisa?
— Chame Saul Spencer! — ele berrou logo que Nova York
respondeu. Depois tampou o bocal com a mão. — A moça
provavelmente é uma doida que vive no mundo da lua. Precisa
de ajuda psiquiátrica, não de um bando de jornalistas à sua
porta para espalhar mentiras. Deve haver um jeito de obrigá-
la a dizer a verdade e depois enfrentá-la, e a melhor maneira é
manter a coisa em segredo, concorda?
Antes de ela ter tempo de responder, a voz trovejante de
Saul soou e Hogan puxou-a para mais perto,
— Sobre essa história idiota de paternidade, eu exijo
sigilo absoluto — Hogan afirmou, ignorando a conversa mole
de Saul. — Isto é uma ordem! Já sai bastante lixo nos jornais;
não há necessidade deste agora.
Leilah escutou seu chefe protestar.
— A história é uma mentira deslavada! — Hogan o
interrompeu. — Não se esqueça disso! Não conheço a moça,
nunca ouvi falar nela e pretendo provar que o caso é falso.
Como é provável que ela tenha problemas mentais, e como não
tenho intenções de que esta disputa ridícula seja travada sob a
vista dos jornais, nenhuma palavra sobre isso deverá ser
publicada. Vou entrar em contato com meus advogados e, se
qualquer boato surgir, a fonte será processada nos tribunais.
E isso quer dizer: você!
Houve silêncio do outro lado da linha. Saul estava
inseguro e sem saber o que dizer, o que era novo nele.
— Quero que contrate um investigador particular para
obter uma declaração da moça. Se ela continuar a me acusar,
quero que ele consiga detalhes do lugar e de quando a criança
foi concebida- Depois disso, se ela insistir na fábula, ponha a
polícia no caso, mas sempre confidencialmente. Vou fazer uma
pesquisa em minha agenda e farei uma declaração de onde
estive, no tempo apontado. Sou capaz de apostar que no dia a
moça e eu estávamos a milhares de quilômetros um do outro.
— Ouça, Hogan... — Saul estava começando a se
recuperar, mas Hogan o ignorou e continuou a falar.
— Faça um exame de sangue na criança e eu enviarei
uma amostra do meu por avião, para Nova York. Creio que a
história toda ficará esclarecida antes de eu partir para o
Havaí. Se não ficar, eu não embarco.
— Repita! — pediu Saul atônito.

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— Não saio daqui até que essa história seja resolvida, ou
pela moça, retirando a acusação, ou pelo teste de sangue, que
vai provar a minha inocência.
— Mas isso não é tão simples; pode levar tempo! Diabo,
Hogan, você sabe que o Havaí é muito importante. Nossa
gente lá já programou jogos, entrevistas, e há ainda um
coquetel importante!
Em poucas palavras Hogan explicou a Saul o que podia
fazer com o coquetel. Mais silêncio. Leilah nunca vira seu chefe
tão confuso. Quando finalmente conseguiu dizer algumas
palavras foi para bater em retirada como um servo assustado
diante de um senhor impiedoso.
— Você tem toda razão, temos que resolver este caso. Sua
reputação está em jogo e concordo que esta história não deva
chegar aos jornais. Eu sabia desde o começo que devia ser uma
brincadeira.
— E que tipo de brincadeira!
— A investigação será feita sigilosamente, não se
preocupe.
— Não estou preocupado. Você é quem deve se
preocupar, porque pode ser levado aos tribunais. Um processo
destes com certeza não fará bem a sua empresa e, se eu o
processar por danos, vou pedir alto!
— Vamos manter o bom senso, sim?
— Está bem. Então largue este telefone e comece a agir!
— Fique descansado.
Quando desligou, Hogan soltou Leilah e ficou pensativo.
— Quero fazer uma declaração. Depois consultarei
minha agenda. Por enquanto vamos deixar em branco as
datas e os lugares, mas já sei mais ou menos o que vou dizer.
Ei, não fique aí parada! Mexa-se!
Esfregando o braço no lugar onde ele a segurara, Leilah
olhou-o, intrigada. Tudo acontecera depressa demais, mas de
uma coisa estava certa: o resto do dia teria que ser dedicado a
ele. Escutou a máquina de café fervendo, na cozinha.
— Café fresco saindo! Que tal tomarmos uma xícara? —
Olhou sua roupa sofisticada. — Acho melhor me trocar, já que
não devo voltar ao escritório hoje. Preciso ligar para Violet e
avisar que estarei ausente.
Ele a olhou, exasperado.
— Muito bom! Minha reputação está indo para o esgoto e
você quer tomar café! Está bem, mas que seja rápido; quero
preto, sem açúcar. Depois que fizermos uma declaração,
iremos ao seu médico para que ele tire uma amostra do meu

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sangue. Quero que seja enviado para Nova York ainda esta
noite. Depois vamos nadar, como combinamos.
— Acho que merecemos!
Cinco horas depois Leilah ainda não conseguira fazê-lo
sorrir, embora a raiva estivesse passando aos poucos, dando
lugar a uma indiferença fria, o que era ainda pior. Hogan
sentia-se revoltado por ela ter acreditado naquela história
ridícula.
Levaram um bom tempo até darem a versão final à
declaração. Hogan estava resolvido a ser conciso mas
compreensível, e trocou tantas vezes palavras e frases inteiras
que, no fim, Leilah ficou tonta. Depois perderam mais de uma
hora no consultório do médico, até a amostra do sangue estar
pronta e embalada. No fim da tarde chegaram ao aeroporto e
descobriram que enviar um pequeno embrulho não era coisa
fácil.
Havia dúvidas técnicas absurdas, como por exemplo se
sangue podia ser rotulado de "carga" ou na categoria de
"produto animal". O último poderia criar problemas ao ser
desembarcado.
Quando esse problema foi finalmente resolvido, foi a vez
do preenchimento de folhas amarelas, cor-de-rosa, duplicatas,
e no embrulho o endereçamento em inglês e chinês.
— Todos, desde o FBI até o presidente dos Estados Unidos
e o governador de Hong-Kong, devem estar sabendo que uma
amostra do meu sangue seguiu viagem — resmungou ele.
Leilah olhou-o de relance; que resmungasse à vontade!
Ela estava exausta. Descobrir o caminho no meio de tanta
burocracia já era um horror, e pior ainda em companhia de
um homem irritado, rabugento e carrancudo! E mais:
suspeitava que metade daquelas reclamações a tinham como
alvo.
— Quem sabe seria aconselhável ter amostras de seu
sangue em cada uma das filiais da Spencer Associates
espalhadas pelo mundo? — comentou ela sarcástica. — Assim
você estará preparado para quando isso acontecer de novo.
Ele a ignorou. Limitou-se a chamar um táxi.
— Dinasty Hotel, por favor.
— Não me diga que vamos nadar agora! — Leilah o fitava
com olhos arregalados.
— Eu já me enchi bastante nesse maldito aeroporto.
Vamos dar um mergulho e relaxar. Quem sabe você se
acalma um pouco.
— Eu?

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Já a caminho, Hogan a olhou com desconfiança.
— Não me diga que está preocupada em encontrar Glenn
por lá!
— Não — respondeu ela, olhando pela janela. — Já
falamos pelo telefone duas ou três vezes, sobre negócios, e ele
não se desmanchou em lágrimas. Não podemos evitar entrar
em contato, mesmo que quiséssemos. Além disso, ele fez
questão de me informar que tem saído com Sue, e desconfio
que ela o está consolando.
— Então, quanto a você, Glenn não passou de mais um
posto a nocaute?
Com os olhos azuis brilhando, irritada, ela o encarou.
— Isso é uma coisa maldosa de se dizer! Eu gostava muito
de Glenn e ainda gosto! Nunca pensei em feri-lo!
— Você nunca pensa, meu amor. Nunca pensa.
Leilah percebeu que o motorista estava interessado na
conversa mas nem assim se segurou. Explodiu:
— E pensar que eu acreditei que nós podíamos ser
amigos!
O maio de Leilah era de Lycra cor de bronze, com decote
alto, bem cavado nas pernas, grudado ao corpo como uma
segunda pele. Depois de pronta, ela examinou-se ao espelho,
recriminando a sim mesma por ter cedido quanto a ir nadar.
Hogan estivera insuportável o dia todo e ela estava farta. Saiu
do vestiário de mau humor e o encontrou sentado à beira da
piscina. Como se não o conhecesse, mergulhou e nadou até
ficar sem fôlego. Depois segurou-se na borda e ficou olhando
os ladrilhos. Hogan estava no lado raso e ela não quis olhar
para Ia, para não parecer interessada no que ele fazia. Estava
se preparando para nadar mais um pouco quando duas mãos
firmes lhe agarraram a cintura.
— Ainda louca da vida comigo? — a voz grave e profunda
perguntou. Ela não respondeu e as mãos subiram até
envolverem seus seios. Ela se desvencilhou.
— Não é mútuo? — perguntou, enquanto, ainda
segurando na borda, pôs uma distância segura entre ambos.
— Você me ofendeu — disse Hogan, afastando uma
mecha de cabelos da testa. Nadou para mais perto dela. — Não
fez bem ao meu ego descobrir que o meu cartaz com você é
zero.
— Saul me contou a história como um fato verdadeiro —
reagiu Leilah, virando-se para encará-lo. — Nem tive tempo
para pensar. Fiquei arrasada.
— Por quê? — Ele a aprisionou com os braços e as pernas.

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— Por que ficou assim, gatinha? Nunca a vi tão infeliz. Que
diferença faria para você se eu fosse processado? Faz quase
dois anos que terminamos tudo, não é? Não foi isso que você
tentou provar tão firmemente nesta última semana?
— Não tentei provar nada! — Leilah imaginava se
haveria alguma maneira de escapar daqueles braços de aço. —
Fiquei arrasada porque. . . porque. . .
— Porque ainda me ama — ele completou
tranquilamente, curvando os braços enquanto a água escorria
pelos músculos bronzeados ao chegar mais perto. Agora,
poucos centímetros os separavam.
— Não!
Ele se moveu outra vez e, apoiando-se nas barras,
aproximou o corpo do dela. Leilah o sentia dos ombros até as
coxas. Gotas de água pendiam das sobrancelhas escuras,
tornando-as mais brilhantes; o bigode também estava
pontilhado de gotículas. Se ela abrisse a boca e pusesse a
língua para fora tocaria nele, sentiria seu gosto.
Aflita, começou a falar:
— Nós nos damos melhor platonicamente. Foi bom
trocarmos idéias; mas fisicamente... nosso caso... foi bem,
mas... assim. . . é. . .
— ... melhor?
— Sim. Eu gosto de você e espero que também goste de
mim. Você vai embora dentro de poucos dias e é melhor
deixarmos as coisas como estão.
Ela sabia que estava dizendo bobagens e Hogan também.
Ele começou a se esfregar levemente no corpo feminino.
— Será que não sente o que faz comigo? Não há nada de
platônico nisso. — Sua mão envolveu outra vez um seio dela,
tocando no bico. — Nisso também não! Nós experimentamos
dos dois modos e nenhum deles foi completo. Vamos tentar
uma terceira forma.
Embora imersa na água, Leilah estava ardendo. Uma
chama bem familiar começava a consumi-la, confundindo sua
mente e destruindo suas resistências. A mão dele abandonou o
seio e foi até o queixo, fazendo-a levantar a cabeça e encará-lo.
— Hoje vamos dormir juntos. Hoje e todas as
outras noites. . .
— ... até você ir embora de Hong-Kong?
— Até eu ir embora de Hong-Kong — ele concordou,
desanimado.

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Capítulo VIII

Leilah enxugou-se com a pressa frenética de alguém que


estivesse deixando um prédio em chamas. Enfiou o suéter cor
de violeta e as calças compridas pretas; quando puxou o zíper
das botas, parou atordoada. Tudo bem, então amava Hogan.
Mas e ele, a amava? E se amasse, seria um amor sólido? O
bom senso dizia que ela estava andando numa corda bamba.
Será que agüentaria sair sem ser destruída? Não sabia. Tudo
que sabia era que Hogan seria seu durante poucos e preciosos
dias, e estava decidida a agarrar essa felicidade fugaz. Se
nada mais havia do passado, teria ao menos as recordações.
"Viva este momento e ao diabo com as conseqüências!"
disse a si mesma enquanto secava os cabelos e os prendia num
coque.
— Alô, gatinha — murmurou Hogan quando se
encontraram, e a voz carinhosa fez bem a ela, que sorriu mais
largamente.
Ele passou-lhe o braço pela cintura e esse contato a fez
derreter por dentro. Apoiou a cabeça no ombro forte. Estar
com Hogan parecia o paraíso. Seu lugar era ao lado daquele
homem.
— Vamos comer alguma coisa? — sugeriu ele. Leilah
demorou um pouco para baixar o olhar e ele riu, percebendo
seu desapontamento. — Seja sensata. Não vamos estragar
nossa noite apressando as coisas. Faz horas que não comemos.
Vamos ter uma refeição tranqüila. De que adianta corrermos
para o seu apartamento e você começar a cozinhar? Temos
que ir com calma. Não há pressa, há?
— Tem razão — disse ela, fazendo beicinho, os olhos azuis
brilhando intensamente. — E não é nossa primeira vez, afinal.
— Mas está parecendo. As minhas pernas estão bambas!
Quando chegaram à lanchonete, sentaram-se de mãos
dadas, sorrindo. Havia pouca gente nas mesas e ninguém
pareceu reconhecer Hogan. Naquele instante ela não tinha
nenhuma vontade de dividi-lo com os fãs.
— O que desejam? — perguntou a garçonete.
Hogan pediu uma garrafa de vinho e disse à moça para
voltar depois, para alívio de Leilah.
— Ainda preciso saber de uma coisa — disse ele, quando
ficaram sozinhos. Ela o percebeu mais sério e soltou-lhe a mão.
Ele se recostou na cadeira e cruzou os braços. — Uma vez
comentei que as últimas semanas foram estranhas, mas a

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culpa não foi só minha. Algo morreu entre nós e foi você quem
fez morrer.
— Você percebeu!
Ele soltou uma exclamação irritada.
— Acha que sou bobo? Você começou a se distanciar de
mim. Uma retirada lenta mas firme. Mas só de sua parte.
Ela não sabia se ria ou se chorava.
— Estou tão contente!
— Contente por que eu sei que algo estava errado?
— Sim. Não pode imaginar como sofri, pensando que
você não tinha percebido. Você agia como se tudo estivesse
ótimo, enquanto eu me roía de dor. Ficava imaginando como
você podia me amar e ser tão insensível com o que estava
acontecendo. Era uma tortura.
Hogan ficou atônito.
— Espere um pouco! Será que estou entendendo bem?
Você construiu uma barreira entre nós de propósito?
— Não exatamente. Você entende... — Leilah mordeu os
lábios. Tantas emoções a dominavam que ela achava difícil se
explicar. — Eu não queria me afastar de você, mas Saul
sugeriu ...
— Saul!
— Desejam fazer os pedidos agora? -— A entediada
garçonete voltara.
Hogan a olhou, zangado, e Leilah achou melhor resolver o
assunto antes de qualquer cena.
— Filé e salada.
— Para dois — acrescentou Hogan, sem tentar disfarçar a
irritação.
A moça tomou nota em caracteres chineses e se afastou.
— Vamos esclarecer tudo isso, Leilah. Por sugestão de
Saul você começou a esfriar nosso relacionamento?
— Ele sugeriu que eu me afastasse um pouco de você, a
fim de deixá-lo se concentrar mais no tênis e foi... foi o que fiz.
— Sem uma palavra de explicação!
— Mas era exatamente isso que estava errado, Hogan!
Por alguma razão louca, embora eu dormisse com você, não
tinha a sua confiança! Não estou culpando nenhum de nós;
simplesmente não havia compreensão mútua. Eu me sentia tão
insegura quanto a tudo. . . Estava desesperada, queria manter
tudo em calma para não atormentar você antes de
Wimbledon. Não contei o que Saul sugeriu porque sabia que
isso o deixaria furioso.
— Acertou, mocinha. Mas e depois?

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— Bem, na ocasião fiquei calada e me afastei porque
acreditava ser a melhor coisa a fazer.
Ele deu um suspiro exasperado antes de falar.
— Eu devia ter seguido o meu instinto e posto você em
xeque no minuto em que suspeitei de alguma coisa errada!
— Por que não fez isso?
Ele hesitou, servindo-se de mais vinho antes de responder:
— Acho que estava tão inseguro quanto você. Duvidava
que naquela ocasião nosso relacionamento fosse tão firme que
agüentasse um ultimato. Para ser honesto, eu não gostava de
sua carreira porque ela nos mantinha separados, mas ao
mesmo tempo tinha consciência de que o tênis também
contribuía para isso. Achei que bancar o machista e sugerir
que você não se dedicasse ao trabalho pareceria egoísmo,
embora eu deva confessar que fiquei muito tentado a fazer
exatamente isso. Mas depois me convenci de que estávamos
somente passando por um momento difícil. Naturalmente Saul
não perdia ocasião de comentar sobre sua capacidade e
dedicação às relações públicas!
— Outra vez Saul! — resmungou Leilah, tomando um
grande gole de vinho.
— Você se lembra de uma conversa que tive com ele, no
escritório, algumas semanas antes do acidente?
— Oh sim, perfeitamente. Continue.
— Saul falou durante horas. Disse que sua carreira era
muito importante, enfatizando quanto você era inteligente e
que eu não devia ser egoísta e boicotar seu progresso. Era a
velha conversa dele. O caso é que alguns dos argumentos
tinham lógica e, enquanto ele falava sem parar, minha cabeça
funcionava a mil. Cheguei à conclusão de que você não queria
aprofundar nosso relacionamento porque sua carreira
representava mais do que eu. Fiquei muito abalado.
— Eu. . . escutei uma parte daquela conversa.
— Como assim?
— Eu tinha ido esperar por você quando a porta do
escritório de Saul foi aberta. Exatamente no instante em que
você disse, com todas as palavras, que o que mais lhe
importava na vida era o tênis.
Hogan afastou com os dedos os cabelos que lhe caíam na
testa.
— Meu Deus! Foi na hora em que eu disse que não tinha a
intenção de me casar e fingi aceitar o conselho dele, no sentido
de ter alguns casos?
— Não foi fingimento. Você teve outros casos.

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— Somente depois que você partiu! Quando Saul deu a
idéia, fingi concordar para que ele não me aborrecesse mais.
Estava mesmo com a cabeça em Wimbledon, precisava
passar pelo campeonato antes de tomar alguma decisão sobre
o meu futuro, o nosso futuro. — Hogan ficou calado enquanto
a garçonete colocava os pratos diante deles e depois
continuou: — Não pode me culpar por procurar me distrair
quando você me deixou. Além disso, tive esperança de que, se
você soubesse sobre as outras mulheres, teria ciúmes e voltaria
correndo. — Ele fez uma pausa e olhou um momento para ela,
antes de prosseguir. — Mas não foi o que aconteceu. Era
lógico. Você tinha me magoado e as outras mulheres
alimentavam o meu machismo.
Os vários casos não eram mais importantes, e Leilah não
pôde deixar de sorrir.
— Por que não voltou quando soube do acidente? Amor
não termina de uma hora para outra, gatinha.
— A verdade é que eu reservei uma passagem no instante
em que recebi a notícia, mas quando telefonei a Saul, para
avisá-lo de que ia para Londres, ele deu a entender que você e
a brasileira tinham um caso. Assim eu...
Hogan bateu com a faca e o garfo no prato.
— Ele devia ser enforcado e esquartejado! Pelo que estou
vendo, aquele sem-vergonha arruinou dezoito meses de nossas
vidas!
— Mas nós nos conhecemos por causa dele.
— Não, não é verdade. Tudo bem, você era funcionária
dele, mas foi por minha escolha que veio trabalhar comigo.
— Sua escolha? Como assim? Fui designada para dar
assistência a você como parte de um programa de
treinamento!
— Verdade, mas uma outra moça ocuparia seu lugar se
eu não a tivesse visto uma vez no escritório e gostado do que
vi. Assim, dei um jeito para que trabalhasse comigo.
— E depois tem a audácia de se queixar de que Saul usa
as pessoas!
Para acalmá-la, Hogan beijou um dedo e apoiou-o na
ponta do nariz dela.
— Você agora já sabe que, além de um machista
reprimido, sou também animal predatório.
— E também um manipulador!
— Eu não podia deixar que as coisas fossem somente
como Saul queria.
— Ainda bem. — Ela tomou mais um gole de vinho. —

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Mas então por que ele o mandou para Hong-Kong logo agora?
Que haverá por trás disso? — Hogan começou a rir e o riso se
transformou em gargalhada. — Não me diga que foi você
outra vez!
— Gatinha, eu passei esse tempo todo imaginando o que
teria acontecido conosco. Tentei sentir as mesmas coisas, a
mesma alegria, mas não havia meio. Eu procurava você em
cada garota com quem saía. Cheguei a um ponto em que
ficava abalado cada vez que via, na televisão ou na rua,
garotas que tivessem uma vaga semelhança com você. Fiquei
obcecado, querendo saber o que estaria fazendo, se tinha um
novo amor, se tinha saudades de mim, se ainda me amava um
pouco.
A garçonete apareceu para tirar os pratos.
— Querem sobremesa? — perguntou. Ficou por perto
enquanto Hogan olhava a longa lista de sundaes e cremes
tropicais.
— Que tal Beijo de Namorado? — ele perguntou a Leilah,
dando uma piscadinha. — Aqui diz que é uma deliciosa salada
de morangos frescos, mangas, uma pitada de cointreau e por
cima sorvete de creme. — Leilah sacudiu a cabeça, negando.
— Nada de sobremesa; somente dois cafés — disse ele
para a garçonete, que de mau humor enfiou o bloco e o lápis
no bolso.
— Aposto que ela vai reclamar na cozinha de dois
estrangeiros que estão tão apaixonados que nem conseguem
pensar direito!
— Estamos apaixonados? Você está apaixonado? —
perguntou ela, sem ter coragem de encará-lo.
— Estou.
— Como da última vez? — a pergunta era tão importante
que ela reteve o fôlego. Da última vez ele a amara, mas não o
suficiente.
— Não. As coisas aconteceram muito depressa para
nós. Eram idas e vindas delirantes. Naquele tempo eu me
preocupava somente com o futuro próximo, nunca planejei
além do campeonato seguinte. Eu estava muito apaixonado
por você, mas a imaginava sempre por perto; pensava que as
coisas aconteciam naturalmente, não sabia que é preciso lutar
pelo que vale a pena. — Ele sorriu, contrafeito. — Nossa
relação se desenvolveu tão depressa que não tivemos tempo de
lançar raízes. Eu empurrava para o lado uma parte do tempo
que dedicava ao tênis e punha você no espaço vazio,
assumindo arrogantemente que devia ser assim mesmo. —

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Apertou levemente os dedos dela. — Mas agora estou mais
maduro. Não tenho intenção de perder você.
— O que teria feito se eu tivesse outro homem?
— Não sei. Estava desesperado para ver você. Cheguei à
conclusão de que precisava me livrar daquela obsessão, mas
no instante em que a vi outra vez, sabia que não havia a
menor chance de isso acontecer. Foi só ver esses incríveis olhos
azuis, para perceber que nada tinha mudado.
— Saul me disse que você não queria mais vir. . .
— Eu estava tendo problemas com a perna e me sentia o
homem mais miserável do mundo. Naquele momento não via
nenhum futuro para mim, quanto mais para nós dois! E tenho
que ser bastante sincero para confessar que era o que eu
secretamente desejava. Era patética a idéia de arrebatar você
de sua vida quando a minha estava um caos. Que diabo eu
tinha para lhe oferecer como tenista fracassado? Nada!
— Eu nunca amei você porque jogava tênis. Eu o amo
porque você. . . é você.
— Eu sei. Mas naquele momento eu estava cheio de
dúvidas, de inseguranças. Entretanto, tinha convencido Saul
com tanto sucesso das vantagens econômicas de visitar Hong-
Kong que ele não me deu chance de recuar e me forçou a vir. —
Hogan deu uma risada, e sua alegria contagiou Leilah, que riu
também. Quando a garçonete veio entregar a conta, encontrou
ambos rindo. — Quanto mais cedo eu cancelar o meu contrato
com a Spencer Associates, melhor. Logo que este maldito
processo de paternidade for liquidado, Saul me verá pelas
costas.
— Ótimo. Eu também me sentirei bem melhor sem ele.
— Você compreende que isso pode ter sérias
repercussões? Saul vai ler nas entrelinhas e descobrirá que
tomei esta decisão enquanto estava em Hong-Kong. Ele saberá
que você se envolveu. Sei que se trata de sua carreira, gatinha,
reconheço que Saul paga bem, que a firma dele tem prestígio
etc. etc. etc, mas. . .
— Mas gostaria que eu me demitisse, certo? Hogan deu
aquele seu sorriso maravilhoso.
— Eu estava me controlando para não bancar o macho
chauvinista, mas tenho que reconhecer que gostaria muito.
Agora posso contar a você todo o meu plano. Durante a
semana eu ficava pensando em como podia colocá-la nele, pois
você andava muito arredia. Mas nunca acreditou realmente
que a atração física que existe entre nós pudesse ser ignorada,
acreditou?

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— Não renegue a semana passada. Ela funcionou. Se
nosso relacionamento não tivesse se mantido platônico, nunca
teríamos tido todas aquelas idéias.
— Mas, agora que isso acabou, posso ditar algumas
regras?
— ele provocou. — Acabe logo com este vinho para irmos
depressa ao apartamento. Então vou explicar direitinho quais
são essas regras.
— Não pode ir me dizendo qual é o seu plano? —
perguntou Leilah, quando andavam à procura de um táxi.
— Primeiro vamos nos casar.
— Não acha que deveria antes me pedir? Ou já tem
certeza da resposta?
— Gatinha — exclamou ele, segurando-a pelos ombros —,
você e eu devíamos ter-nos casado há dezoito meses atrás.
Leilah tinha suas dúvidas, mas a confiança dele era tão
grande que a contagiou.
— Será um alívio pedir demissão da Spencer Associates —
confessou ela. — Faz tempo que estou desgostosa com os
métodos de Saul.
— Espere um pouco até conhecer os "meus" métodos —
ameaçou Hogan, fazendo uma careta que provocou risos.
A careta podia ser cômica, mas o brilho em seus olhos não
era. Ignorar o desejo que os consumia era impossível e,
quando ele a beijou na penumbra do táxi, Leilah sentiu um
calor percorrer seu corpo. Estavam abraçados e ele a tocava
sob a roupa, fazendo com que sua cabeça girasse ao ouvir as
promessas sussurradas do que faria a ela, com ela, para ela. . .
— Pare com isso, Hogan — pediu Leilah, embora não
houvesse nada que quisesse mais. Mas o olhar curioso do
motorista pelo espelho a inibia.
— Vou me comportar — Hogan garantiu, recostando-se
no banco e ajeitando a gravata; depois passou os dedos nos
cabelos, mas seus olhos não estavam bem comportados e
brilhavam como fogo.
— Você resolveu se eu vou ou não continuar a trabalhar?
— perguntou ela, com ar profissional.
Hogan tinha outras prioridades. Pegou uma mecha dos
cabelos de Leilah e começou a enrolá-la nos dedos.
— Vai depender.
— De quê?
Enquanto ia enrolando o cabelo dela, chegava cada vez
mais perto.
— De nossas relações particulares, eu e os quatro garotos.

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— Quatro!
— Eles fazem parte do meu plano.
— Não acha melhor me dar todos os detalhes? Posso ter
alguma sugestão... — Leilah sorriu. Ele a estava beijando
outra vez.
— Amanhã.
Ela não se importava mais.
— Está certo. Amanhã.
No instante em que a porta do apartamento de Leilah se
fechou, Hogan a tomou silenciosamente nos braços. O efeito
dos lábios dele nos dela foi o mesmo de um fósforo aceso
jogado um balde de gasolina. Os dois estavam excitadíssimos.
Abraçavam-se, beijavam-se, acariciavam-se, mergulhados em
delírios de desejo.
— Vamos para a cama — murmurou ele.
Jogando as roupas para os lados, os dois acabaram
chegando ao quarto e finalmente encontraram-se nus, sob os
lençóis. O sangue corria mais depressa nas veias de Leilah
enquanto Hogan beijava e tocava. Havia um clima de magia
envolvendo os dois; ele era tão forte, tão profundamente
seguro, os lábios firmes procurando tão apaixonadamente os
dela, que Leilah sentia que a sede de amor nunca morrera.
— Leilah. . . — ele sussurrou. Toda a angústia da
separação e todo o prazer do reencontro estavam na maneira
como ele pronunciava aquele nome: Leilah!
Os longos dedos a acariciavam, seguindo as curvas, as
reentrâncias, as fendas que ele conhecia tão bem. Quantas
noites ele ansiara por isso! Cobriu os seios com as mãos
grandes, murmurando seu encantamento; depois segurou
entre dois dedos os sensíveis bicos cor-de-rosa enquanto ela
respirava ofegante. Em seguida foi baixando a cabeça,
enquanto repetia o nome dela. Leilah estava com o corpo
inteiro ardendo, desejando senti-lo por dentro para completá-
la, amá-la. Hogan beijava um seio e depois outro, mordiscava,
passava a língua úmida, excitando-a cada vez mais. Leilah
estremeceu de prazer, reagindo às carícias, mas ele queria
outro tipo de resposta e então se colou a ela, que desejava
possuir e ser possuída.
— Gostoso. . . — murmurou Hogan, quando finalmente a
penetrou.
Ficaram um instante imóveis, abraçados. Senti-lo assim
era tão bom! Leilah tinha a impressão de que uma enorme
onda estava se formando, uma onda que estouraria sem
clemência e que levaria ambos num mar de amor.

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— Abra os olhos, gatinha.
Como poderia, se estava imersa em sensações, no cheiro
de Hogan, nos braços de Hogan? Mas ela conseguiu voltar à
realidade em vez de se entregar, naquele momento, à onda de
êxtase O peito largo e moreno, como um escudo de bronze,
estava sobre ela.
— Eu te amo. Nunca amei ninguém a não ser você.
Sempre a amarei.
— Eu também te amo.
Ela deu um gemido e a onda então desabou sobre ambos,
que não podiam lutar mais contra ela. Leilah puxou-o para si,
as unhas ferindo os ombros fortes, e Hogan carregou-a com
ele naquele impetuoso gozo final, quando, ofegantes, felizes, os
dois se entregaram um ao outro. Era tudo que Leilah sempre
desejara, sempre sonhara, o que queria sentir!
— Não vá hoje ao escritório — ele implorou na manhã
seguinte. Tinham acordado no meio da noite para fazer amor
e depois se amaram mais uma vez, quando a luz pálida da
madrugada se filtrava pelas cortinas. Agora estavam deitados
lado a lado, num langor feliz.
— Não posso, meu amor. E, depois, você combinou jogar
golfe com o Sr. Tan.
Hogan mergulhou o rosto nos cabelos perfumados.
— Eu posso desmarcar. Quero fazer amor com você
outra vez. .
— Agora? — ela provocou. — Tem certeza que somente
uma perna foi recondicionada?
— Bem, talvez não agora — ele respondeu, dando uma
risada. — Daqui a pouco, mas não muito mais tarde!
Ela pôs as mãos sobre os lábios dele, para evitar que
falasse.
— Eu preciso mesmo ir ao escritório. E você vai gostar do
golfe.
— Mas gostaria bem mais de você — ele respondeu,
depois de dar uma lambida nos dedos dela.
— Vá à tarde ao escritório, para conversarmos mais
sobre o seu plano "— disse ela, os olhos azuis brilhando,
profundos. — Se deixarmos o assunto para a noite, aqui em
casa, corremos o risco de não conversar.
— Está bem. — Hogan espreguiçou-se devagar, os
músculos dos braços em evidência. Depois relaxou com um
suspiro.
Leilah saiu debaixo dos lençóis.
— Vamos. Quero ver a quantas anda sua perna.

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— Depois de uma noite de farra? — ele perguntou, rindo,
antes de sentar-se na beirada da cama, esfregar a coxa e ficar
em pé. — Não está assim tão má — constatou, surpreso,
testando a perna e pondo todo o peso sobre ela. — Ainda se
encontra um pouco fraca, mas já esteve bem pior.
— Deve ser por causa das férias — comentou ela, indo
para o banheiro.
Ele sacudiu a cabeça, com ar solene.
— É a atividade sexual, gatinha. Acho que vou precisar
deste tipo de tratamento três vezes por dia nos próximos
quarenta anos. Assim a perna ficará curada.
— A perna sim, mas eu não! — protestou ela, escapando
para dentro do box antes que ele resolvesse começar o
tratamento naquele instante.
Leilah pensou que o dia fosse se arrastar até a hora de ver
Hogan novamente, mas se enganou. Compareceu a uma
entrevista com um banqueiro e, quando ele a convidou para
almoçar, percebeu que o tempo passara sem que tivesse
percebido. Durante a refeição, ela explicou os métodos de
promoção e ofereceu subsídios para uma campanha
publicitária.
— Você me deu muitas idéias — o banqueiro afirmou
quando se separaram. — Agradeço imensamente sua ajuda.
Ela sorriu. Por mais furioso que Saul ficasse quando
soubesse que ela e Hogan o estavam abandonando, não
poderia acusá-la de prejudicar sua firma.
— A srta. Jasmine telefonou três vezes — Violet avisou
quando ela voltou para o escritório.
— Faça a ligação imediatamente — pediu Leilah. Estava
resolvida a aconselhar Jasmine a procurar outra pessoa para
cuidar de sua carreira, por mais vontade que a moça tivesse
de entrar no mundo dos espetáculos. — Boa tarde, Jasmine —
disse quando a ligação foi completada.
— Já liguei três vezes. Tenho notícias maravilhosas! O
coração de Leilah se apertou.
— Não acredito que você tenha nascido para ser cantora
ou bailarina, Jasmine — ela começou, disposta a mergulhar de
cabeça no assunto.
— Isso não me preocupa — foi a resposta desconcertante.
Leilah ainda estava desconcertada quando Hogan entrou na
sala e jogou-lhe um beijo, sentando numa poltrona. Mas,
quando percebeu com quem ela estava falando, tentou dizer-
lhe alguma coisa.
— Eu telefonei exatamente para lhe pedir que cancele

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qualquer compromisso e tire meu nome de sua lista.
Leilah ficou surpresa, mas percebeu que Hogan sorria,
como se soubesse de alguma coisa.
— Y.C. e eu vamos nos casar — explicou Jasmine. — De
agora em diante só quero ser uma boa esposa.
Leilah ainda conseguiu dar-lhe os parabéns com palavras
coerentes, embora os olhos estivessem arregalados. Depois
desligou, sorrindo para Hogan.
— Bem que eu sempre gostei de Y.C!
— Eu estava tentando contar a você que eles tinham
ficado noivos — disse Hogan, chegando mais perto dela. — O
Sr. Tan estava radiante esta manhã. Parece que ele considera
Y.C. um bom partido e espera que ele se torne seu sócio.
— Seria ótimo. Y.C. estudou administração em Harvard e
tem idéias brilhantes.
— Uma das quais é casar com a filha de um milionário! —
caçoou Hogan. Depois a fez ficar em pé. — Nós, homens, temos
idéias brilhantes. Como essa, por exemplo. — Baixou a cabeça
e beijou-a.
— E para que serve isso?
— Para você se sentir bem por fora e. . . macia por dentro.
Tenho razão?
— Tem.
— Então vamos a uma segunda dose — murmurou ele.
Nesse instante o intercomunicador tocou. Rindo, Leilah se
desvencilhou dele e respondeu.
— O Sr. Spencer na linha — avisou Violet.
Os dois se entreolharam, surpresos, e Leilah levantou o
fone.
— Tem alguma idéia de onde posso achar Hogan? —
berrou Saul.
— Ele está aqui — ela respondeu, enquanto braços
musculosos a envolviam. — É para você, Hogan.
Ele pegou o aparelho.
— Sim?
— Boas notícias sobre aquele caso de paternidade.
Ordenei que nosso escritório de Londres enviasse um
investigador até a Noruega ontem, para falar com a tal moça.
Parece que ela negou tudo o que tinha dito. Nunca saiu da
Noruega e nunca viu você em carne e osso.
— E a criança? Existe?
— Sim, mas a moça não tem marido.
— Está bem. Quero uma declaração por escrito o mais
depressa possível; e vá adiante com os exames de sangue. Não

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podemos nos dar ao luxo de deixar uma brecha, no caso de a
garota imaginar coisas outra vez.
— Vou tratar disso logo. Posso ficar descansado quanto
ao Havaí? Você vai embarcar logo?
— Sim, mas anuncie que é meu canto de cisne.
— O quê?
— Canto de cisne, fim de linha. Estou lhe dando o aviso
agora. Meu contrato com você vai expirar dentro de um mês.
— Você não pode fazer uma coisa destas!
— Posso sim. Leia outra vez os papéis. Há uma cláusula
de desistência. Vou entrar em contato com meus advogados e
eles acertarão tudo com os patrocinadores.
— Mas por que terminar uma associação tão lucrativa?
— lamentou Saul, começando a perceber que sua maior fonte
de renda estava no fim.
— Porque descobri que me arriscar permanentemente
só para ter a honra de disputar campeonatos é uma tolice e. . .
— seu braço apertou Leilah — porque vou me casar. Minha
esposa e eu pretendemos levar uma vida tranqüila.
Um berro fez Hogan estremecer.
— Aquela maldita Terri me traiu! Eu disse a ela que um
caso passageiro muito bem, mas nada de casamento! Você não
vai precisar se casar; ela se contenta com menos!
— Pode ser que ela sim, mas eu não — Hogan respondeu,
piscando para Leilah e decidido a não desfazer o mal-
entendido, pelo menos naquele momento.
— Deixe-me falar com Leilah! — pediu Saul. — Quem sabe
ela o faz ter mais juízo!
Sorrindo contrafeita, ela pegou o telefone.
— Hogan não pretende voltar a competir e tem razão. O
músculo da coxa não agüentaria a pressão constante.
— Está bem, o tênis não é assim importante — trovejou
Saul. — Posso dar uma declaração aos jornais explicando a
situação e podemos atrair um bocado de piedade e simpatia
para ele. Hogan já é famoso e não precisa mais do tênis. Ele se
deu maravilhosamente nas entrevistas e acredito que este
ângulo possa ser explorado. Ele pode ganhar uma boa soma,
desde que continue solteiro e mantenha a imagem do playboy
irresistível. Não deixe que ele se case porque, se tiver esposa,
quem vai persegui-lo? Imagine só uma foto dele regando o
jardim! Seria um desastre!
— Eu vou persegui-lo, Saul.
O chefe ficou em silêncio algum tempo, como se estivesse
pensando numa resposta.

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— Escute, beleza, sei que já teve uma queda por Hogan,
mas se ele está com certas intenções com Terri. . .
— Quem disse que eu vou me casar com Terri? — gritou
Hogan no bocal. — Vou me casar com Leilah!
— Leilah! Mas eu pensei. . .
— Nós sabemos muito bem o que você pensou que tivesse
arruinado nosso romance há dois anos. Mas calculou mal.
— Escute aqui — Saul exclamou, mas não pôde continuar
por causa da série de desaforos que Hogan começou a
despejar.
— Também quero lhe dizer que vou sair da Spencer —
disse Leilah, interrompendo a conversa entre ambos. — Como
tenho férias acumuladas, assim que Roger voltar deixarei de
trabalhar para você.
— Mas Leilah querida, poderemos entrar num acordo!
Hogan desligou o telefone nesse ponto da conversa.
— Saul se recuperará. Ele sempre se recupera.
Leilah pediu um café a Violet e depois conversaram sobre
Saul, concordando que naquele exato momento ele devia estar
entrando em contato com algum cantor ou esportista em
ascensão, oferecendo seus serviços.
— Agora me explique qual o seu plano — pediu ela depois
que Violet trouxe os cafés, olhando furtivamente para Hogan
enquanto o servia.
— A curto prazo, logo que puder passar seu serviço a
Roger, você viaja para me encontrar no Havaí. Depois disso,
iremos para Londres, participaremos o casamento às nossas
famílias e marcaremos a data o mais depressa possível.
— Não acha aconselhável conversar com seu médico
sobre a perna?
— Está bem, gatinha, farei isso, mas estou convencido de
que, se eu não forçar o músculo, ele voltará ao normal.
— E as partidas que vai disputar no Havaí?
— Se eu perder, paciência. Prometo não cometer excessos.
Sem dúvida, àquela altura, Saul deverá ter informado os
jornais sobre o músculo fraco e estarei cercado pela simpatia
dos fãs. Puxa! Isso me deixa aborrecido, mas imagino que não
interessa fazer mistério sobre as razões de ter abandonado o
tênis.
— Conhecendo Saul, ele vai explorar ao máximo o lado
dramático da situação.
— Depois que eu estiver livre da Spencer Associates,
levaremos uma vida tranqüila, gatinha. Que tal irmos morar
no campo, perto de um campo de golfe?

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— Então você vai se dedicar ao golfe?
— É uma opção. Pretendo tentar, mas sem pressa. Sei que
tenho vários caminhos e estou determinado a estudar cada um
deles antes de tomar a decisão final. — Hogan tomou um gole
de café. — Mas minha primeira prioridade é me casar com
você. Inicialmente ficarei muito ocupado com minha esposa,
amiga e amante. — Aproximou-se e tomou-a novamente nos
braços. — Que tal comprarmos uma casa antiga e a
reformarmos e mobiliarmos juntos? Você gostaria? — Ela fez
que sim. — Bom. Muitas vezes tive vontade de ver se sou bom
carpinteiro e pintor.
— Acho que será divertido. Mas nenhum de seus fãs ficará
emocionado ao vê-lo com um pincel na mão em vez da raquete.
E sabe que isso vai arrasar sua fama de conquistador
irresistível?
— Graças a Deus! Quando Saul sair das minhas costas,
pretendo conversar em particular com alguns patrocinadores.
Durante estes anos todos tive algumas idéias e agora há tempo
de me dedicar a elas. O dono de uma cadeia de hotéis uma vez
me perguntou se eu teria interesse em dirigir escolas de tênis
durante o verão. Quem sabe. . . Tudo vai depender da minha
perna — ele acrescentou, ao vê-la pensativa. — Eu gostaria de
não abandonar totalmente o tênis, por enquanto. Ele me deu
uma vida maravilhosa.
Leilah beijou-lhe o rosto.
— Concordo.
— E se você achar que temos outros caminhos,
examinarei cada um deles.
— Nós só vamos fazer isso? Conversar?
— Cinqüenta por cento conversa, cinqüenta por cento. . .
amor! — Ele a abraçou outra vez e a beijou. Depois
acrescentou: — Quarenta por cento conversa, sessenta por
cento amor.
— O beijo ficou mais intenso. — Dez por cento conversa,
noventa por cento amor.
Nesse instante a porta do escritório foi aberta. Uma
risadinha confusa, desculpas balbuciadas e a porta se fechou.
Depois eles escutaram uma conversa na sala ao lado.
— Estou desconfiado de que a sua reputação está indo
para o brejo. . .
— Acho que você tem razão. Sem dúvida Violet está
ligando para toda Hong-Kong para contar que me pegou
beijando Hogan Whitney!
— E, se demorarmos mais um pouco aqui, ela terá outras

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coisas para contar. Vamos?
— Você é muito convincente, sabe?
Ele segurou-lhe a mão e puxou-a para a porta.
— Então acho melhor irmos logo. Não podemos
desapontar Violet, não acha?
— Claro que não.
Uma Violet atônita os viu sair.
— A srta. Morrison virá amanhã, mas bem tarde —
Hogan avisou à secretária e depois deu-lhe uma piscadela.
Violet deu uma risadinha e, quando escutou o barulho do
elevador, discou um número.
— Pauline, você nem imagina! — começou ela. — Você se
lembra que eu falei sobre um homem que tinha uns olhos que
pareciam dizer "vamos ficar na cama"? Pois ele e a minha
chefe acabam de descer pelo elevador e. . . .

***Fim***

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