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Passaste depois a outro tipo de drogas, ilegais. Como foi essa transição e quem te
influenciou principalmente?
Essa transição foi muito rápida. A partir do tabaco rapidamente comecei a fumar as
“minhas ganzas”, comecei a ir a festas e a ingerir pastilhas, esse tipo de drogas. Apesar disso,
nunca me meti noutras drogas “mais pesadas”.
Mas quem te influenciou foram pessoas da tua idade ou mais velhas… do bairro?
Pessoas da minha geração, do bairro.
Falando agora pelos jovens do bairro que seguem por este caminho, o que pensas
que os motiva a fazerem-no?
Sinceramente pelo que eu vejo hoje em dia, os jovens são motivados a fazê-lo mais
pela “cena” de não serem recriminadas, porque pensam que o que os outros fazem é
“bacano”. Começam a fumar, se for preciso nem gostam de fumar mas fazem-no, só mesmo
para dar “aquela paleta” e essas coisas.
Há uma pressão por parte das pessoas mais velhas lá do bairro para os mais novos
fumarem?
Sim, há uma pressão mas ninguém obriga ninguém a fumar. Claro que há sempre
aquela “cena”, és jovem, és curioso e queres descobrir o mundo muito rápido. Depois quando
ganhares consciência se calhar vais ver que o descobriste rápido demais e quando deres por ti
“estás na merda”.
Achas que existe algum tipo de desinteresse por parte da população do bairro nos
seus jovens, e por isso se justifica o elevado número de jovens traficantes?
Acho que não. Pelo que eu vejo no bairro, montes de pessoas moram lá mas no
entanto não têm esse tipo de actividades. Acho que o elevado número de traficantes se
justifica pela falta de dinheiro de algumas famílias ou por falta de estudos e falta de vontade
em os completar. Ou então és uma pessoa que teve uma infância difícil, ou mente fraca.
Então achas que estes jovens não têm/tiveram oportunidades suficientes para ter
uma vida “saudável”?
Não digo que não tenham/tiveram oportunidades, mas não as procuram, ou se calhar
não as aproveitam. Preferem entrar por um mundo onde seja mais fácil arranjar dinheiro.
É verdade que grande parte dos jovens que se dedicam a este negócio abandona a
escola?
É verdade.
Isso define certamente o seu futuro, e limita desde logo as hipóteses de estes serem
bem-sucedidos na vida e de optar por outro caminho que não o da droga...
Não, depende das drogas. Há drogas mais pesadas que se calhar já são mais
complicadas conciliar com o estatuto que tens numa sociedade, mas por exemplo, as drogas
leves como o haxixe não acho que possam interferir tanto quanto isso. É claro que é uma droga
e faz mal como todas as outras, como todos os vícios, mas penso que cada um tem o direito de
saber o que quer da sua vida.
Mas quem se mete nessas drogas mais leves pode ir evoluindo para outras mais
pesadas ou não?
Depende da consciência de cada um e claro, também das companhias. Se por exemplo
“parasses” com companhias que “dessem na branca”, provavelmente irias ter mais curiosidade
em experimentar “branca” no que se calhar experimentar um “charro”.
E sentes que jovens do bairro estão a consumir drogas mais leves ou mais pesadas?
Leves. Eu acho que o pessoal de hoje em dia já começa a ter uma maior percepção do
que são as drogas pois há uma maior divulgação por parte da sociedade.
Então o pessoal mais velho é que foi pelo caminho das drogas pesadas?
Quer dizer, não digo que o pessoal mais novo também não as consuma, como é óbvio,
mas acho que actualmente há uma maior consciência por parte da população acerca de todos
os riscos que a droga acarreta.
Deixando de lado esses temas mais controversos que certamente dariam muito que
falar, achas que deve haver uma maior atenção por parte dos pais a imporem os seus
educandos para a escola, investir na sua educação?
Falando a partir da minha experiência pessoal, não acho. Vocês já me conhecem desde
“puto”, desde a escola primária e como podiam ver, eu era “bué” certinho, sempre preocupado
com as “cenas” da escola e tudo isso. No entanto, agora está tudo diferente e entrei neste
mundo vivido à margem da lei. Acho que nunca me faltou o apoio e educação por parte dos
meus pais e não acho que seja essa a razão.
Então achas que devia haver mais empenho na escola, ou talvez outras alternativas
para o futuro nesta, por exemplo?
Talvez, acho que isso parte um pouco por aí. A motivação começa pela escola, e acho
que esta devia incluir mais oportunidades e um maior número de escolhas. Só assim é que eu
vejo alguns dos jovens a ganharem um certo tipo de interesse pela escola.