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revolução Industrial Inglesa vista por Paul Mantou

 introdução

       Na introdução de sua obra, A revolução Industrial no Século XVIII, Paul Mantoux
define o processo de formação das Grandes indústrias como lento e originário de um
longo e long?nquo processo, de causas puramente econômicas. não podendo ser
caracterizada unicamente pela grande dimensão dos mercados para os quais vão seus
produtos, a Grande indústria pode ser definida como um novo regime de produção
surgido na Inglaterra entre 1760 e 1800.

porém, algumas obras recentes apontam a existência de grandes indústrias já na França


do século XVII, no reinado de Luís XIV. Conforme os estudos de M. Germain Martin, a
grande indústria francesa do século XVII poderia se apresentar de três formas: Em
primeiro lugar estavam as manufaturas do Estado que existiam em função do rei e da
corte, não esperavam lucros e ignoravam a concorrência, funcionando exclusivamente
para produzir objetos pessoais e decorativos ao rei; Em segundo estavam as
manufaturas áreais que eram privadas e produziam para o consumo público. Estas
manufaturas recebiam o apoio do Estado e, conseq?entemente, sofriam suas
intervenções. Geralmente eram originárias de outros países, atra?das para a França pela
política de Colbert. até mesmo os industriais protestantes foram bem recebidos na
França e tiveram liberdade religiãosa mesmo Após a renovação do Edito de Nantes; Em
terceiro e último lugar, Germain Martin destaca as manufaturas privilegiadas que, ainda
mais favorecidas que as manufaturas áreais, tinham o direito exclusivo de fabricar e
vender certos produtos, isto ?, gozavam de monop?lio.

Estas grandes indústrias presentes na França do século XVII viviam exclusivamente dos
privilãgios e caso houvesse uma diminuição da proteção estatal todas ruiriam, o que foi
observado durante o governo de Luís XV. Desta forma, o crescimento das manufaturas
áreais no século XVII foi artificial, pois se baseava em uma intervenção estatal, e não
apresentou nenhuma ligação direta com o crescimento da grande indústria do século
XVIII.

       já na Inglaterra, apesar de também não encontrarmos aí grandes indústrias no


século XVII, alguns estudos apresentam nomes de mercadores que haviam se tornado
fabricantes já no início do século XVI. Entretanto estes fabricantes não tiveram o apoio
dos Tudors e seu crescimento nada teve de artificial, revelando assim um
desenvolvimento espontâneo do capitalismo industrial inglês já nesta época. Estes
embriões da grande indústria fazem parte apenas de uma primeira etapa da evolução do
capitalismo moderno: a manufatura, que submeteu a produção até meados do século
XVIII e já deixava explicita a separação entre capital e trabalho. além disso, a manufatura
foi a grande respons?vel pela divisão técnica do trabalho, aumento consider?vel da
produção e diminuição do preão final.

Conforme foi defendido por Marx, esta manufatura não era ainda a grande indústria
moderna, pois esta última caracteriza-se pela utilização de máquinas. além disso, as
máquinas levaram ao extremo a divisão do trabalho, aumentaram o capital fixo e
circulante das empresas e, conseq?entemente, aumentaram a divisão entre capital e
trabalho, determinando os quadros gerais da sociedade contempor?nea.

       Se levado em consideração o avanão e a eficácia da divisão do trabalho cada vez


mais rigorosa entre as regiões produtoras e mesmo dentro de cada of?cio, ampliando
cada vez mais a cooperação que acaba por associar todo o mundo, o maquinismo à a
penas um fenômeno de ordem secund?ria, visto apenas como a resultante de todo um
processo de desenvolvimento do capitalismo moderno.

Para iniciar este estudo sobre a revolução Industrial, o autor afirma que foi obrigado a
fixar limites, tamanha a amplitude do assunto. Estes limites direcionaram o seu trabalho
para o desenvolvimento da revolução Industrial na Inglaterra, nos primeiros anos do
século XIX, especificamente na indústria de l?, algodão e ferro. Para tanto, foi deixado de
lado o desenvolvimento de outras indústrias, dentro e fora da Inglaterra, além das
doutrinas e leis que regem a indústria.

PRIMEIRA PARTE - OS ANTECEDENTES


capítulo I - A Antiga indústria e a sua evolução

       A indústria lan?fera, desenvolvida Após as conquistas normandas, foi o tipo mais
caracterástico e mais completo da antiga indústria e respons?vel por grande parte do
enriquecimento inglês. Esta atividade, cem por cento nacional, drenou para a Inglaterra
ouro e prata, aumentando o tesouro comum. Desta forma, a indústria de l? tornou-se
para os ingleses 'a indústria por excel?ncia, a indústria fundamental, essencial do reino'
(pg. 24). Vista como um objeto sagrado, a l? tornou-se a base de toda a riqueza inglesa e
para protege-la, foi criada umasérie de leis, além de ser um dos assuntos preferidos nas
discussões da imprensa, da câmara dos Comuns e da câmara dos Lordes.

       Para demonstrar a importância desta indústria na Inglaterra, o autor descreve os


principais centros da indústria de l? no início do século XVIII, dando destaque aos
condados do centro e do norte, região principal deste fenômeno. Ao descrever a
paisagem inglesa neste período, Paul Mantoux chama a atenção para a forma como a
indústria se encontra dispersa por todo territ?rio da ilha. Outro aspecto curioso à a
forma como subsistem paralelamente as oficinas dos mestres artesãos e as
manufaturas. Após apresentar as principais características da indústria de l? nos
condados do centro e do norte, o autor descreve a produção no distrito de Yorkshire
que, baseada em um sistema domêstico, difundia seus produtos por toda Inglaterra,
além de exportar para outras regiões da Europa e mesmo para fora desta.

       Conforme se dava o desenvolvimento da indústria domêstica, foi de vital


importância para o fabricante vincular-se a um comerciante, podendo assim escoar seu
produto para o mercado nacional e no estrangeiro. Assim, Após a associação entre
fabricante e mercador, o primeiro passa a assumir alguns detalhes no processo de
fabricação, transformando gradualmente o capital comercial em capital industrial. Como
a indústria ainda era uma atividade que complementava a renda familiar, em sua maioria
oriunda da agricultura, problemas naturais que dificultassem esta atividade colocavam o
trabalhador em uma posição de depend?ncia ao mercador manufatureiro, que lhe
concedia empr?stimos em troca do penhor do tear. Assim, cada vez mais o instrumento
de trabalho deixava de pertencer ao trabalhador e passava para as mãos do capitalista.
Pior ainda seria a situação do trabalhador se este habitasse a cidade e não o campo.

       Neste período o operário ainda trabalhava em casa, não estando submetido à
disciplina fabril . Essas transformações caracterizaram a passagem do sistema
domêstico para a manufatura, ainda no que chamamos de 'Hausindustrie', que se deu
sobretudo nos condados do sudoeste e do leste, onde predominava a indústria de l? de
pente, de preão elevado, o que exigia mais capital, dando condições mais favor?veis
para o desenvolvimento da indústria capitalista. Conforme a agricultura passa a assumir
uma posição secund?ria diante da indústria, o tecelão torna-se cada vez mais
dependente do capitalista, o que causava queda cada vez maior dos n?veis salariais.
além disso, a concentração industrial e a abund?ncia de mão-de-obra também contribu?
ram para agravar este quadro.

       Com o surgimento dessas duas classes, uma que controlava o capital e outra que
vendia o trabalho, manifestou-se um antagonismo inevit?vel, abrindo espaço para o
surgimento das primeiras trade unions que, ao contrário do que pensamos, não surge
entre os mais oprimidos e sim entre aqueles que conservaram maior independência
como, por exemplo, os operários penteadores que se encontravam em número reduzido.
porém, rapidamente o Parlamento adotou en?rgicas medidas de repressão ?s coalizões
de trabalhadores e as greves passaram a ser punidas com severas penalidades. O
antagonismo era crescente: de um lado estava o capitalista que, para reduzir os gastos
com mão-de-obra, passava a recrutar crianças abandonadas para o trabalho; de outro
lado estavam as associações de trabalhadores que aumentavam a freqüência das greves
e os ataques ?s máquinas.

       Após relatar as transformações que caracterizaram a passagem da antiga indústria


para a indústria moderna, o autor se prop?e a identificar os elementos que retardaram
essa transformação. Entre eles pode ser observada a extrema regulamentação do
processo produtivo que impedia o aperfeiãoamento t?cnico, graças a uma 'legislação
medieval', que só foi sofrer seu primeiro golpe em 1776, com Adam Smith. Outro
elemento que se tornou um entrave ao desenvolvimento t?cnico foi a exacerbada
proteção dada à indústria lan?fera, afastando qualquer necessidade de inovação. O
medo da concorrência externa, os privilãgios, o conservadorismo e os preconceitos,
castravam as renovações técnicas e impediam que a revolução Industrial se iniciasse
dentro da indústria lan?fera. Isto nos deixa bem claro que estes primeiros capitalistas da
indústria de l? ainda procuravam encontrar o lucro nas atividades comerciais e não nas
atividades produtivas.

capítulo II - O Surto Comercial

       De acordo com a afirmação de Paul Mantoux, o progresso da produção e o


progresso das trocas se estimulam reciprocamente.

       graças ao seu grande poder de transformação, a grande indústria estimula a


conquista de novos mercados e o desenvolvimento dos transportes que, por sua vez,
também contribui para a expansão do mercado. Por outro lado, a expansão do comércio
e a relação de concorrência que se estabelece com outros países estimulou os avanãos
t?cnicos. Como exemplo, o autor apresenta o caso da Holanda que teve seu
desenvolvimento industrial graças à supremacia naval que detinha. O mesmo pode ser
observado na 'Inglaterra, onde o surto comercial precedeu as transformações da
indústria' (pg. 73). além disso, este país contou com outro elemento vital para o
desenvolvimento de seu transporte, comercio e, conseq?entemente, de sua indústria:
sua posição geogr?fica.

       A posição insular, a atuação dos corsérios, a criação de companhias comerciais


privilegiadas, os Atos de Navegação de Cromwell, a marinha mercante e, finalmente, a
revolução Gloriosa de 1688, que deu à Inglaterra um governo livre, foram essenciais para
que a ilha se transformasse na 'Rainha dos mares'. E foi durante a revolução de 1688 que
surgiu o Banco da Inglaterra que futuramente serviria como um dos alicerces do
desenvolvimento da grande indústria, graças aos créditos por ele fornecido. Este
conjunto de elementos que caracterizou o triunfo do mercantilismo inglês não estava
imune a ataques irrepar?veis, como a Guerra contra a França e a revolução Americana
que ocasionaram depressão no comércio internacional da Inglaterra. porém, passada a
crise houve um rápido e brusco reerguimento dessas atividades, o que se deve
principalmente ao desenvolvimento do maquinismo.

       Podemos ver assim que a indústria auxiliou o desenvolvimento comercial que, por
sua vez, também auxiliou no desenvolvimento industrial. Tomemos como exemplo
Liverpool que, ao contrário do que se pensa, foi primeiramente um centro comercial e,
posteriormente, industrial.

       Ao mesmo tempo em que o desenvolvimento do transporte marítimo mostrava-se


espl?ndido e, como já vimos, foi um dos fatores determinantes no surgimento da grande
indústria, o desenvolvimento comercial no interior da Inglaterra apresentava-se um tanto
quanto feudal. Este comércio interno baseava-se na existência de feiras peri?dicas,
atividade de mascates e precariedade dos meios de transporte, o que pode ser explicado
pela riqueza de portos naturais em seu litoral que beneficiava a navegação marítima em
detrimento do transporte terrestre que ainda era feito no lombo de mulas. Este quadro
somente passou por mudanças significativas com a criação dos turnpike acts que foram
responsáveis pela crescente facilidade e seguran?a do transporte terrestre, o que
impulsionou o comércio interno em toda Inglaterra.

       Outro problema de transporte interno foi o retardado desenvolvimento do transporte


fluvial que, apesar de encontrar na ilha condições naturais favor?veis, foi ofuscado pela
existência de um grande número de portos marítimos e pela pequena dist?ncia entre as
cidades do interior e a costa. porém, este problema também passou a ser combatido
com a crescente utilização da hulha que, por ser material pesado e de grande
importância para a grande indústria, necessitava de um meio de transporte mais barato e
eficiente, o que impulsionou a construção de um complexo sistema de canais que, em
apenas trinta anos, já cruzava toda a superf?cie da Inglaterra. Entretanto, não foi o
carvão o único produto beneficiado por esta rede de canais. Circulavam agora pela rede
fluvial todos os produtos requeridos pelas mais long?nquas regiões da Gr?-Bretanha,
sem necessitarem de intermedi?rios. Este tipo de transporte interno somente perdeu sua
hegemonia com o advento das ferrovias.

       Após analisarmos todo o processo de desenvolvimento do transporte e do


comércio, seja ele interno ou externo, podemos observar que o desenvolvimento
comercial precedeu e impulsionou o desenvolvimento da grande indústria, pois o
comércio, ou melhor, o livre comércio, representa a divisão do trabalho levada ao seu
ponto máximo, permitindo a cada país especializar-se nas mercadorias que pode
produzir a menor custo.

BIBLIOGRAFIA

MANTOUX, Paul, A revolução Industrial no S?culo XVIII - Estudo sobre os prim?rdios da


grande indústria moderna na Inglaterra. trad. de Sonia Rangel. são Paulo, Hucitec/Unesp.
p. 1 - 120.

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