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Esta tese trata da política cultural brasileira que articula museus, revitalização urbana,

diferença cultural e patrimônio, por meio de diretrizes multiculturais e de economia criativa.


Este tópico consiste em um conjunto de políticas e discursos que produziram um sujeito
capaz de se governar; e quem deve se tornar um cidadão apto a viver em ordem global,
democrática e cultural-capitalista. A construção desse tipo de cidadania é o principal
interesse aqui, e exploro esse assunto através da inter-relação entre questões éticas e
estéticas, apresentando como algumas políticas e instituições operam para produzir esse
tipo de cidadão. Além disso, enfatizo sua eficácia, pois isso implica simultaneamente em
desvios, contra-condutas e formas de resistência.

Este trabalho discute uma política cultural que opera a partir da instrumentalização da
diferença, sob o signo do reconhecimento e da diversidade, e que engendra uma cidadania
cultural a qual tem o espaço urbano revitalizado como nicho privilegiado de sua formulação.
A análise se dá sob duas experiências de revitalização que utilizam museus como
dispositivos produtores de verdades, e os quais servem ao propósito de incutir sob os
sujeitos incompletudes éticas que os filiem moralmente a ordem liberal democrática que
estrutura esta política cultural. Tal processo, que articula verdade e subjetividade, é
percebido aqui como uma experiência de governo interessada em produzir um indivíduo
auto governável e moralmente comprometido com uma lógica cultural-capitalista de
Estado. Esta relação é precisamente o que Michel Foucault cunhou como
governamentalidade, e é sua forma de funcionar por meio da cultura e, mais
especificamente, em favor da produção de sujeitos que se auto regulam, e se reconhecem
em um modelo específico de composição urbana, o que interessa centralmente aqui.
As experiências de revitalização que servem a esta análise são o Bairro do Recife Antigo, no
Recife, e o Porto Maravilha, no Rio de Janeiro. Em cada uma destas, um par de museus
funciona sob uma arquitetura gerencial e um lógica política similar, e de forma a inscrever
sob tais áreas a condição de santuários de nossas identidades culturais. Ao mesmo tempo,
estas instituições fomentam uma lógica do entretenimento e do consumo também baseada
na diferença cultural como elemento norteador. Isto implica dizer que o sujeito que emerge
desse processo é construído por meio da cultura e fundado em uma substância ética que se
forma a partir da condensação de morais distintas – da cidadania e do consumo. É este, por
conseguinte, um sujeito mais global, que tem sua cidadania estruturada a partir da
diferença cultural, ao invés de outros elementos que o dizem a partir da nação. Ou ainda, é
o próprio sentido de nação, do qual convencionalmente se depende para a construção da
cidadania, que passa a ter inscrito sobre si um sentido multicultural a partir desta política.
Esta cidadania traz ainda em si uma série de imperativos éticos-políticos que devem ser
cultivados pelo indivíduo, sendo isto uma condicionalidade que se impõe ao sujeito como
requisito ao gozo do seu respectivo status de cidadão. É nesta ética a ser praticada onde a
referida operação de governo se faz mais potente e visível, e são os seus respectivos
elementos e efeitos – olhados sob o referido ângulo da política cultural que opera com a
revitalização urbana, a questão central a ser esmiuçada neste trabalho.

o que se busca demonstrar neste trabalho é como a cidadania que floresce desta política
cultural
de base multiculturalista tem operado em favor da produção de uma cidadania em que o
manejo da diferença cultural é o elo que une o sujeito e ordem democrática que lhe faz
cidadão. Mais ainda, que este elo se funda em condicionalidades éticas que são impostas ao
cidadão, que

Tão importante para uma ordem liberal democrática


os tons com que se produz esta cidadania cultural,

assim como os

A terceira onda democratizante na América Latina não se mostrou capaz de suprimir


desigualdades estruturais nem garantiu a efetivação dos direitos civis e sociais dos
cidadãos. Isto representou um desafio às abordagens formalistas da teoria política,
incapazes de explicar satisfatoriamente as especificidades que caracterizaram este
processo. 
Nesse cenário, a antropologia, com seu foco etnográfico, tem muito a contribuir para
o debate sobre “direitos”, “cidadania”, “igualdade” e “justiça”. Ao deslocar a análise
da dimensão formal da cidadania para como os direitos são vividos, concebidos e
problematizados cotidianamente pelos atores sociais, abre-se espaço para perceber
rearranjos e concepções distintas da formulação eurocêntrica. Ao fazer isso, os
antropólogos têm desestabilizado abordagens que naturalizam o modelo liberal,
demonstrando que não é possível compreender a “cidadania” como um status
puramente legal que garante ao indivíduo um conjunto de direitos e deveres em sua
relação com o Estado. 
Tendo isto em mente, o GT busca comparar e debater trabalhos etnográficos que
abordem: como a “cidadania” é significada por diferentes atores associados às
agências do Estado, ONGs, movimentos sociais e outros coletivos; como se dão as
relações que estes diferentes atores estabelecem entre si; quais são os desafios
metodológicos dos estudos etnográficos sobre “cidadania”.

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