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Ciência da Informação:
o passado e a atualidade
Antônio Felipe Corrêa da Costa GÊNESE HISTÓRICA do saber. O suporta fisíco da informação -
para o acesso à mesma - deveria ser feito
A compreensão racional de um todo com- em fichas padronizadas, e o seu conteúdo
plexo* exige o conhecimento de sua estru- expresso em linguagem internacional. O
tura, suas propriedades e interações. Para acesso físico ao documento seria dado
ser compreendida em seu conceito e em através da grande biblioteca centrai con-
toda a sua abrangência, a Ciência da In- cebida. O acesso ao conteúdo informativo
formação deve ser posicionada no quadro do documento deveria ser obtido por meio
histórico da Ciência. de um padrão de normalização - regras
comuns para o tratamento analítico dos
De acordo com um fenômeno muito documentos, adotando-se um sistema de
freqüente na história das ciências, pode-se classificação único, origem da atual Clas-
dizer - parafraseando a genealogia bíblica sificação Decimal Universal (CDU).
- que a Biblioteconomia gerou a Bibliogra-
fia, a Bibliografia gerou a Documentação, e Em 1930, John C. Dana formou, com um
esta gerou a Ciência da Informação. Ou, grupo de dissidentes da American Library
como afirmam alguns autores, gerou a In- Association (ALA), a Special Libraries As-
formatologia ou o estudo da informação1. sociation, com a conseqüente criação do
American Documentation Institute (ADI).
Para Zaher & Gomes2, a Bibliografia é ins-
trumento indispensável para o controle e a
divulgação do desenvolvimento científico e Em 1931, Otlet e La Fontaine criaram o
Resumo Instituto Internacional de Documentação
tecnológico e, para o seu aperfeiçoamento,
têm sido tentados técnicas e métodos no- (IID).
O artigo aborda o quadro teórico e o
desenvolvimento histórico da área interdisciplinar vos. A tentativa de se fazer o controle bi-
Em 1937, realizou-se o Congresso Mundial
Ciência da Informação. Parte do conceito de bliográfico universal data do século XVI,
informação e de sua importância como fator de de Documentação.
em conseqüência da invenção da impren-
desenvolvimento social. Apresenta os conceitos de
sa e do volume crescente da produção bi-
Ciência da Informação segundo as tendências Em 1938, como conseqüência dessa reali-
européia e americana. Procura mostrar a bliográfica.
zação, o IID foi transformado em Fede-
abrangência e a interdisciplinaridade da disciplina
ração internacional de Documentação
e as relações existentes entre a Ciência da Para Shera3, a idéia de elaborar um levan-
Informação/Biblioteconomia/Documentação. (FID). Surgia, assim, a Documentação.
tamento bibliográfico universal recua
Aborda os dois tipos de pesquisas realizadas na
área - pura e aplicada, evidenciando as nove
ao tempo de Johann Tritheim e Konrad
categorias de pesquisas realizadas. Apresenta a Gesner, nos idos de 1595. Entre muitas Durante o período da Segunda Guerra
posição da Ciência da Informação no panorama proposições formuladas, a melhor foi, na Mundial (1939-45), as atividades do ADI e
científico internacional contemporâneo e a sua época, a de Paul Otlet e Henri La Fontaine, de Documentação foram interrompidas.
colocação no cenário nacional da atualidade. os quais consideraram o controle bibliográ- Todos os esforços voltaram-se para o
fico universal como o resultado da conju- Conflito Mundial, com conseqüências múl-
* Considera-se complexo, segundo o Novo Di- gação de esforços para se fazer o controle tiplas para as atividades de Documen-
cionário da Língua Portuguesa, de A. B. de Holan- bibliográfico em nível nacional. Os dois tação. Entre eles, o aumento considerável
da Ferreira, o adjetivo "que abrange ou encerra idealistas belgas conceberam uma grande de literatura científica resultante da de-
muitos elementos ou partes; observável sob dife- monstração do valor prático da Ciência du-
biblioteca central que teria a função de
rentes aspectos". Como substantivo, significa gru-
po ou conjunto de coisas, fatos ou circunstâncias reunir e divulgar o conhecimento gerado
rante a Guerra. Os problemas criados para
que têm qualquer ligação entre si. em todos os países e em todos os ramos a comunicação dessa explosão de docu-
mentos não impediu, contudo, o progresso transmissão de informações, como a me- Na Rússia, A.I. Mikhailow, do VINITI*, ao
da Ciência. canização e a microfilmagem, propôs a publicar a obra Fundamentos da Infor-
criação de um aparelho mecanizado, o mação Científica, recebeu a sugestão para
A necessidade de se obter novas infor- Memex, onde poderiam ser armazenados chamar a nova disciplina de Informática
mações científicas e técnicas, quase sem- livros, registros e comunicações, com a (Informação + Automática). Mikhailow
pre num rápido espaço de tempo, motivou possibilidade de serem as informações re- usou o termo, em 1966, considerando-o
os técnicos - engenheiros, químicos, físi- cuperadas facilmente quando necessário. um nome novo para a Informação Científi-
cos e biólogos - a deixar seus laboratórios O Memex atuaria como um suplemento ca. Entretanto, já antes, em junho de 1962,
de pesquisas para organizar serviços es- ampliado e familiar à memória humana. na França, Phillipe Dreyfus havia divulga-
peciais de informação, chamados por eles do o artigo L'lnformatique, na revista Ges-
de serviços/centros de informação. A partir de 1950, acentuou-se a separação tion6. O conceito de Mikhailow não consi-
entre a Biblioteconomia e a Documen- derou o aspecto qualitativo da informação
Em decorrência do interesse especial pela tação. A Biblioteconomia seguiu duas - ou seja, a sua avaliação.
coleta de dados e informações necessá- tendências distintas. Nos Estados Unidos
rias para as atividades dos técnicos, esta- da América do Norte - de economia capi- Nos Estados Unidos, o termo Documen-
beleceu-se o ensino da Documentação talista, a atitude competitiva originou a tação perdeu seu interesse prático. Para
como disciplina especial, distinta da Biblio- tendência democrática, voltada para a isso, contribuíram três fatos importantes:
teconomia. A Biblioteconomia continuou a prestação de serviços, com a criação e
tarefa do tratamento e controle da pro- funcionamento dos serviços de infor- 1. A American Library Association (ALA)
dução bibliográfica crescente: livros, pe- mação. Na Europa, os países - com ex- negou-se a usar o nome Documen-
riódicos e outros documentos. Contudo, o ceção da Inglaterra, que seguia seus pro- tação em sua nova divisão, chaman-
crescimento bibliográfico tomou-se maior gramas de trabalho nos moldes das biblio- do-a de Division of Information Science
do que a capacidade de controle do que tecas norte-americanas - permaneciam and Automation.
era produzido, gerando-se, então, um sério com a tendência erudita, originada na An-
impasse a ser resolvido. tigüidade, com os serviços bibliotecários 2. O American Documentation Institute
mantendo uma atitude sofisticada e con- (ADI) passou a chamar-se American
servadora. Continuou-se a estudar os fun- Society for Information Science (ASIS).
Em 1945, Bush escreveu As we may
damentos e a promoção da Classificação
think, artigo clássico no qual fez a previsão
Decimal Universal (CDU). 3. Em 1966, passou a ser editado
de uma nova e revolucionária tecnologia
o Annual Review of Information Science
Segundo Pereira4, para Bush, "instrumen-
Com o término da Segunda Grande Guer- and Technology (ARIST).
tos já disponíveis, se desenvolvidos ade-
ra, apareceram novas disciplinas, resulta-
quadamente, permitirão ao homem o aces-
do de estudos para solucionar problemas O termo Documentação passou a ser
so e comando sobre a herança do conhe-
práticos enfrentados na Guerra. Entre substituído, sistematicamente, por Infor-
cimento dos séculos. A perfeição desses
elas, a Pesquisa Operacional, a Análise de mação. Segundo Sambaquy1, passou-se a
instrumentos pacíficos deverá ser o primei-
Sistemas, a Cibernética e a Teoria dos Jo- usar a expressão Técnica de Informação"
ro objetivo de nossos cientistas, tão logo
gos. para designar a Biblioteconomia do tipo
eles saiam de seu trabalho na guerra". O
não tradicional, mais voltada para o trata-
autor abordou alguns processos já então
Os centros de documentação, criados du- mento dos dados e da informação do que
disponíveis de coleta, armazenamento e
rante e após o Conflito, eram administra- do livro ou documento.
dos por profissionais de outras especiali-
dades. Por não obedecerem a normas es-
Em 1962, o Geórgia Institute of Techno-
pecíficas para o tratamento da Documen-
logy (GIT) realizou um Congresso sobre a
tação, prejudicavam os serviços progra-
formação de técnicos de informação. Fo-
mados, ao tentar criar novos processos
ram indicadas cinco categorias de técni-
nem sempre de acordo com a experiência
cos necessários para realizar o trabalho
comprovada petos bibliotecários. Segundo
de tratamento da informação:
Shera3, "muitos desses membros não dis-
simulavam o seu desdém pelos bibliotecá-
• Bibliotecário (Librarian)
rios.
Pessoa com treinamento formal em Biblio-
A partir de 1950, o uso sistemático do
teconomia, bacharel por Escola de Biblio-
computador contribuiu para agilizar os tra-
teconomia reconhecida.
balhos da Bibliografia, Documentação e
das bibliotecas especializadas.
• Bibliotecário Especializado
5 (Special Librarian)
Segundo Harmón , apareceu, nessa épo-
ca, uma atividade chamada, primeiro, Do-
Pessoa com formação intelectual ou
cumentação, depois, Recuperação da In-
tendência especial por determinada disci-
formação, e, após passar por vários mode-
plina, conhecendo bem a literatura de um
los, chamou-se Ciência da Informação.
assunto específico e as necessidades de
seus usuários.
CONCEITO DE CIÊNCIA DA
INFORMAÇÃO • Bibliotecário Especializado em Ciência
(Science Librarian)
O termo Ciência da Informação existe há
* VINITI - Vsesojuznyl Institut Naucnotechlceses-
algum tempo. O conceito despertou, à Pessoa com treinamento formal em Biblio-
koi Informacii. (Instituto Nacional para a Informação época de sua formulação, controvérsias, teconomia e conhecimento especializado
Científica e Tecnológica) conforme as duas tendências seguidas. em determinado campo científico.
9 Áreas Correlatas
- Lingüística
- Comunicação
her13, tem procurado melhorar, em todo o
inundo e com ênfase especial nos países
Bibliotecários (IFLA-FIAB) e o Conselho
Internacional de Arquivos (CIA), a Con-
em desenvolvimento, os meios de infor- ferência Intergovernamental sobre o Plane-
- Arquivologia mação, tomando esta uma prioridade nos jamento de Infra-Estruturas Nacionais de
- Editoração seus planos de trabalho. Nos últimos 15 Documentação, Bibliotecas e Arquivos.
- Ciência da Computação e Informáti- anos, tem-se incumbido de facilitar o
ca acesso dos povos à literatura e à arte, ofe- A Conferência baseou-se no princípio de
- Telemática recendo os meios de eliminar as barreiras que "a informação representa parte es-
- Estatística que impedem a circulação das idéias, co- sencial dos recursos de uma nação e que
- Administração mo também tem procurado encontrar so- o acesso à mesma é um dos direitos fun-
luções sistemáticas para os problemas de damentais do homem". Teve como um dos
seleção, controle e disseminação da in- objetivos mais importantes "a definitiva in-
formação entre os indivíduos, procurando tegração dos serviços de bibliotecas, in-
encontrar um reequilibrio na circulação en- formação e arquivos num todo sistemático
tre países ricos em informação e países de atividades e serviços, de modo que as
carentes de informação. Para esse fim, respectivas infra-estruturas ou sistemas
destinou grande parte de seus recursos ao nacionais de informação fossem criados
desenvolvimento das bibliotecas, dos ar- com base nessa orientação". Esse objeti-
quivos e de outros modernos veículos de vo foi concretizando, bem como as reco-
comunicação de massa. mendações do Seminário de Washington,
D.C., ao ser criado, nesse mesmo ano de
Ainda, segundo Zaher, a partir de 1967, 1974, pela Unesco, o programa de Siste-
deliberou que fossem desenvolvidos estu- mas Nacionais de Informação (National In-
dos sobre a possibilidade de ser criado um formation Systems - Natis).
Sistema Mundial de informação Cientifica,
interligando os sistemas de informação já As recomendações da Conferência de Pa-
existentes através de uma. estreita coope- ris façam endossadas, por todos, os con-
ração internacional. Em 1971, foi criado o gressos brasileiros de especialistas na
programa Unisist, com o princípio básico área de informação realizados após 1975.
da "colaboração internacional,-nacional e
regional, com o fim de facilitar a troca de Segundo Zaher13, "ambos os programas
informações e dados entre os sistemas de lançados pela Unesco - o Unisist e o
informação existentes e de contribuir para Natis - desempenharam a função de cata-
o desenvolvimento da Ciência e da Tecno- lisadores na promoção dos veículos de in-
logia13. formação junto aos meios governamentais,
atraindo a atenção para o problema da falta
Colocando em prática seus propostos, a de planejamento, que impede o desenvol-
Unesco patrocinou uma série de reuniões vimento ideal das bibliotecas, centros de
regionais, para promover o planejamento documentação e arquivos".
das infra-estruturas nacionais de docu-
mentação, bibliotecas e arquivos e o de- Em 1976, os programas Unisist e Natis
senvolvimento de Sistemas Nacionais de foram fundidos no Programa Geral de In-
Informação (National Information Systems formação (PGI) da Unesco, que incluiu
- Natis)14. nos seus objetivos o desenvolvimento de
sistemas especializados de informação
Dentro desse princípio, foi realizado, em nos campos da Educação, Cultura, Ciên-
Washington, D.C., de 6 a 17 de novembro cia e Tecnologia, além de assumir a res-
de 1972, o Seminário Interamericano sobre ponsabilidade pelo planejamento e desen-
a Integração dos Serviços de Informação volvimento das infra-estruturas nacionais
de Arquivos, Bibliotecas e Centros de Do- de informação.
vas para Ciência da Informação, Bibliote- Mesmo diante desta última constatação
conomia e Arquivologia18. O documento melancólica, mas realística, é impossí-
salientou que as três áreas têm se desen- vel não admitir o pensamento de EA
volvido sempre ligadas ao avanço de ou- Haeffner, ao afirmar "ser o progresso téc-
tras áreas do conhecimento e da própria nico devido, principalmente, à utilização,
evolução social, recebendo e gerando in- por indivíduos criativos, de conhecimento
formações que devem ter um tratamento facilmente acessível e disseminado am-
adequado para facilidade de uso. plamente, visando à criação e ao desen-
volvimento de novos produtos, métodos e
Seguindo as recomendações da Con- processos". Momento em que se torna ne-
ferência da Unesco, o documento preco- cessário que a difusão dos conhecimentos
nizou a "definitiva integração dos serviços gerados seja realizada de modo eficaz - o
de bibliotecas, informação e arquivos"..., e que é feito pela informação, insumo vital
que "esse princípio de integração não de- para o desenvolvimento da Ciência, da
veria ser apenas retórico, mas de adoção Tecnologia, para o bem-estar da socieda-
indispensável, em nível organizacional e de e para o enobrecimento do homem e da
em termos de política de planejamento, própria vida.
pesquisa e de formação de recursos hu-
manos".
CONCLUSÃO
7. TAYLOR, R.S. Professional aspects of 17. COSTA, J. F. da. O Sistema Nacional de In-
Information Science and Technology. Ire formação Cientifica e Tecnológica -
CUADRA, C.A., ed. Annual Review of SNICT. Revista de Biblioteconomia de
Information Science and - Technology Brasília, Brasília, 1 (2): 97-107,1973.
- ARIST, 1, 1966.
18. SEPLAN/CNPq. Avaliação e Perspectivas
8. BORKO, H. Information Science: What is It? 1978: Ciência da Informação, Biblioteco-
Information Science: American Documentation, 19(1):3-5, nomia e Arquivologia. Brasília, D. F.,
the past and nowadays 1968. 1978.