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162/2019-0
RELATÓRIO
ressaltou que a partir dos anos 70, quando a instituição possuía caráter de fundação pública de
direito privado, havia facilidade no processo de entrega e venda de produtos. As flexibilidades
perdidas com a alteração feita pela Constituição Federal de 1988 foram recuperadas com a
instituição de uma fundação de apoio (Fundação para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico em
Saúde - Fiotec).
32. Mas após decisão de órgãos de controle, que determinou que a apropriação das receitas
de exportação deveria ser feita via conta única, houve suspensão das exportações pela falta de
capacidade financeira de arcar com os custos de produção, o que gerou repercussão imediata entre os
organismos internacionais devido ao desabastecimento de vacinas gerado.
33. A Fiocruz destacou que com o advento da Lei 13.801/2019, a exportação dos produtos por
meio da Fiotec passou a ser permitida, conforme ratificado pelas justificativas do projeto de lei (peça
293, p.9-11).
34. Por fim, cabe dizer que a Fiocruz não se manifestou sobre falhas no estudo de
alternativas.
Análise
a) Estudo de demanda - Riscos associados aos processos de transferência de tecnologia
35. Com relação à afirmação da Fiocruz de que carece de plausibilidade o apontamento do
relatório segundo o qual o Ministério da Saúde não possui obrigação em adquirir os objetos da PDP,
quando é o Ministério quem autoriza e fomenta a política das parcerias, o Anexo XCV da Portaria de
Consolidação GM/MS 5/2017 estabelece que a aquisição desses produtos será realizada mediante
comprovação do registro sanitário junto à Anvisa, da evolução das etapas de desenvolvimento,
transferência e absorção de tecnologia, bem como da observância e reanálise dos critérios
estabelecidos na portaria, entre eles a redução relevante de preços de mercado decorrente de
estratégias de competição das empresas (art. 55, inciso III, “b”).
36. Ou seja, apesar de fomentar a política das PDPs, há uma série de requisitos que devem
ser atendidos para que se concretize a aquisição pelo MS.
37. Para exemplificar a existência desse risco, é importante trazer à baila que, no âmbito do
TC 020.378/2017-3, relativo à representação para que o Tribunal apure possíveis atos ilegais e
antieconômicos na opção do Ministério da Saúde e da Empresa Brasileira de Hemoderivados e
Biotecnologia em rescindir unilateralmente PDP firmada com a empresa Baxter/Baxalta para a
produção e transferência de tecnologia do Fator VIII Recombinante, o MS afirmou (peça 85, p. 5-6,
TC 020.378/2017-3):
‘Destaca-se também que o art. 55 da mesma Portaria, prevê que o setor do Ministério da Saúde
responsável pela aquisição do produto deve avaliar a capacidade de atendimento por parte da
Instituição Pública, demanda da rede, preços, economicidade e vantajosidade da aquisição por meio
da PDP. Dessa forma, entende-se que no caso de parcerias que estão em descumprimento à Norma,
as aquisições por meio desse instrumento também podem ser suspensas.
(...)
Dessa forma, entende-se que não há obrigatoriedade por parte da União em adquirir a demanda da
rede SUS para o Fator VIII recombinante por meio da PDP em tela. Ainda, é destacável que a PDP
não é o único instrumento de aquisição do produto pelo Ministério da Saúde.’
38. Pode-se citar como outro exemplo, a representação recebida neste Tribunal (TC
014.687/2017-8) tendo como objeto a existência de possíveis irregularidades na contratação direta
pelo MS de laboratório privado para o fornecimento de alfaepoetina humana. Naquele processo,
verificou-se que o Termo de Execução Descentralizada (TED) 9/2016, celebrado entre o Ministério da
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68. A composição dos investimentos reversíveis, calculada com base no valor de construção
previsto na planilha orçamentária, totaliza um custo de R$ 2.695.005.652,58 (data base: dez/2018) e a
parcela de aluguel mensal representa 0,9% desse custo total do empreendimento.
69. Ao final dos 20 anos, o total de desembolsos será de R$ 7,3 bilhões para a amortização
completa dos investimentos. Destaca-se que os valores desembolsados mensalmente ainda serão
corrigidos anualmente pelo Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M) divulgado pelo Instituto
Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV).
70. A evidenciação do achado relacionado à projeção inadequada de preço de aluguel devido
às falhas no processo de orçamentação da obra decorre das impropriedades detectadas na
composição do valor corrente mensal máximo e na composição dos investimentos reversíveis.
71. Iniciando pela composição do valor corrente mensal máximo, entendeu-se que, no modelo
de financiamento definido, em que há a reversão do imóvel para a autarquia ao final do período
contratual, as parcelas mensalmente pagas não se referem a um aluguel propriamente dito, mas sim a
uma amortização financeira (uma parcela refere-se ao pagamento de juros e outra à reversão),
assemelhando-se a uma operação de crédito e devendo-se comportar como tal. Logo, a parcela do
pagamento mensal intitulada “Aluguel mensal” seria na verdade juros.
72. Outrossim, relatou-se que a escolha do modelo de financiamento via FII não foi
acompanhada de motivação embasada em análise comparativa com outros modelos.
73. Já as impropriedades na composição dos investimentos reversíveis decorrem da utilização
de unidade de “Rateio” (RT), utilização de metodologia de cálculo de BDI não amparada por esse
Tribunal, e atualização de preço de serviços, para um horizonte de mais de 3 anos, por meio de índice
de preço (Índice Nacional de Custo da Construção – INCC).
74. De acordo com Bio-Manguinhos, “a abreviação "RT" constante da planilha em
referência, bem como nas demais ocasiões em que é utilizada no procedimento, significa "Rateio",
ensejando a expressão "rateio de valores" (evidência 22, p. 1). A adoção da unidade de medida “RT”
não encontra amparo legal em nenhum normativo, nem mesmo pode ser considerada unidade. Nota-se
que foi feita uma distribuição de um valor total orçado entre as edificações que compõem o complexo.
75. Quanto ao BDI, esse foi dividido em BDI para mão de obra (evidência 23) e BDI para
materiais (evidência 24). Porém, alguns serviços da planilha não apresentam cotação dividida entre
mão de obra e materiais, logo, nesses serviços foi adotado um critério em que se atribuí um rateio de
custo do serviço em 20% para mão de obra e 80% para materiais seguindo, de acordo com Bio-
Manguinhos, em atenção à Instrução Normativa 971/2009 da Receita Federal (evidência 22, p.1-2).
76. Entendeu-se ainda que as determinações exaradas nos itens 9.2.2, 9.2.3 e 9.3 do Acórdão
2.687/2018 – TCU – Plenário, que tratam de reiteração das determinações efetuadas no Acórdão
2.008/2017-TCU-Plenário, que também versam sobre impropriedades da planilha orçamentária,
permanecem pendentes de atendimento.
77. Diante das inconsistências na orçamentação, que impossibilitaram verificar a
adequabilidade do orçamento da obra, e considerando que na nova metodologia apresentada para
adoção do modelo built to suit, o valor do custo da obra representa o componente principal, a partir
do qual é calculado o valor mensal a ser pago por Bio-Manguinhos, efetuou-se, apenas com o intuito
de evidenciar a sensibilidade da orçamentação nos desembolsos, uma análise paramétrica das
edificações que compõem o projeto. Foram utilizadas para cálculo as edificações que não se se
revestem de especificidades inerentes de plantas fabris farmacêuticas, com por exemplo: restaurante,
guaritas, prédios administrativos etc. (esse conjunto de edificações foi nomeado no relatório como
“edificações ordinárias”).
78. O conjunto de edificações analisado representa 13% do total do orçamento e, na análise
paramétrica, foi utilizado como referência o Custo Unitário Básico de Construção (CUB/m2). Como
resultado, apesar da baixa representatividade da amostra, observou- uma variação de 170% frente ao
valor orçado.
79. Soma-se a isso o fato de que para os itens dos “Serviços Adicionais”, constantes na
planilha orçamentária, que se revestem de um caráter de mero fornecimento, como mobiliário,
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instalação, montagem e fornecimento, não foi aplicada uma taxa de BDI diferenciado, conforme
entendimento disposto no § 1º do art. 9º do Decreto 7.983/2013 e constante do Acórdão 2.622/2013-
TCU-Plenário.
80. A equipe promoveu a adaptação da planilha orçamentária dos “Serviço Adicionais’ com a
utilização de um BDI de 16,10%, estabelecido no Acórdão 2.622/2013 – TCU-Plenário, e constatou
uma diferença de aproximadamente 3% em relação ao valor orçado por Bio-Manguinhos.
81. Finalizando, a equipe demonstrou a sensibilidade da modelagem econômico-financeira a
um sobrepreço na planilha orçamentária. Menciona-se que 10% de variação no orçamento poderia
impactar em mais de R$ 475 milhões ao longo do projeto.
82. Outro ponto que sensibiliza a modelagem econômico-financeira é o Custo Médio
Ponderado de Capital (CMPC) aplicado ao projeto de 8,09% a.a. Verificou-se que uma variação de
1% no CMPC pode ocasionar impacto da ordem de R$ 700 milhões ao longo do projeto.
Manifestação Fiocruz (peça 293, p. 12-33)
83. Quanto às falhas no orçamento da obra, a Fiocruz iniciou sua argumentação trazendo
uma lista de índices de preços com seus conceitos e variações para o horizonte de tempo utilizado na
atualização dos preços orçados (jul/2015 a dez/2018).
84. Foram elencados: o Índice Nacional de Custo da Construção do Mercado (INCC-
M/FGV); o Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M/FGV); o Índice de Preços ao Consumidor
Amplo (IPCA/IBGE); o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC/IBGE); e o Índice Geral de
Edificações (IGE) calculado pela Fipe e publicado pela Secretaria de Fazenda do Estado de São
Paulo.
85. Da análise comparativa dos índices, a Fiocruz contra-argumentou que a adoção de um ou
outro índice pouco afetaria a atualização de preço dos itens da planilha orçamentária.
86. Prosseguiu ainda afirmando que a adoção de atualização de preço via índice só foi
proferida nos itens que não tinham: composição de preços unitários no Sinapi, ou composição de
preços unitários do informativo SBC ou itens com cotação de preços com fornecedores e fabricantes
estrangeiros.
87. Por fim, na argumentação da utilização do INCC, a Fiocruz declara que o índice eleito
representa a coletânea da variação dos custos agregados aos processos da construção civil e está em
consonância com o publicado na Cartilha TCU Referência Obras Públicas 2014, em seu parágrafo
"2.11.2 Temporalidade", logo o uso de um índice setorial de uso nacional, publicado por entidade de
incontestável seriedade é plenamente aceitável por permitir boa aproximação econômica no cálculo
da atualização monetária e em sintonia com as variações de custos setoriais típicos da construção
civil.
88. Avançando, a Fiocruz apresentou alegação para a baixa porcentagem de itens cotados
utilizando o Sinapi. De acordo com a Fundação, os relatórios integrantes do Sinapi abrangem
insumos de materiais, mão de obra, equipamentos e composições, que representam os serviços mais
frequentes na construção civil (e de baixo padrão de complexidade técnica).
89. E, robustecendo a argumentação, trouxe excerto do Decreto 7.983, de 8 de abril de 2013.
‘Art. 3º O custo global de referência de obras e serviços de engenharia, exceto os serviços e obras de
infraestrutura de transporte, será obtido a partir das composições dos custos unitários previstas no
projeto que integra o edital de licitação, menores ou iguais à mediana de seus correspondentes nos
custos unitários de referência do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção
Civil - Sinapi, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser
considerados como de construção civil.
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(...)
Art. 6º Em caso de inviabilidade da definição dos custos conforme o disposto nos arts. 3º, 4º e 5º, a
estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados contidos em tabela de
referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal em
publicações técnicas especializadas, em sistema específico instituído para o setor ou em pesquisa de
mercado.’
90. No caso concreto do NCPFI, a Fundação conclui que somente com o auxílio de
composições de preço não originários do Sinapi, ou seja, de instituições de engenharia de custos
tradicionais do setor de construção civil e de pesquisas de mercado de preços referenciais junto a
fabricantes e fornecedores que atendem a este padrão de projeto industrial, é possível calcular o valor
estimado do CAPEX em questão.
91. Já sobre a utilização da unidade “RT” (Rateio), a Fiocruz alegou que utilizou
metodologia aplicada aos rateios técnicos para as disciplinas cujas cotações não forneceram custos
por prédio ou infraestrutura do complexo NCPFI.
92. Prosseguiu apresentando a distribuição dos quantitativos não cotados individualmente
para os seguintes sistemas prediais/industriais: HVAC; Elétrica e serviços afins; Montagem
Eletromecânica; Teledata (dados e voz); ACS (Controle de Acesso); CFTV; SDA I (Sistema de
Detecção e Alarme de Incêndio) e Combate a Incêndio; e Instalações Hidrossanitárias. E embasou a
utilização da unidade (“RT”) em previsão preestabelecida na “Cartilha TCU”, adotando a
metodologia paramétrica para a alocação dos valores por edificação ou infraestrutura.
93. Em relação ao método de composição do BDI em dois, um para materiais/equipamentos e
outro para mão de obra, e a incidência dos percentuais de 80% para materiais e equipamentos e de
20% para mão de obra, referente a cotações e pesquisas de mercado que não apresentaram essa
segregação em suas tabelas de custo, a Fiocruz argumentou que a metodologia foi utilizada com base
em indicações proferidas no bojo do Acórdão TCU 2.369/2011-Plenário, de 31/8/2011, relator
Ministro Marcos Bemquerer.
94. Ainda, a Fundação afirmou que essa atribuição de percentuais segue um conceito do
“Teorema de Pareto” e encontra respaldo na Instrução Normativa 971/2009, da Receita Federal do
Brasil.
95. Continuando, a Fiocruz trouxe argumentação detalhando a origem e forma de aplicação
do CUB como índice de referência de custo de obra. Concluiu que a utilização do CUB em uma
análise comparativa de todo o projeto do NCPFI não se mostra adequada dada a falta de aderência
técnica entre os projetos arquitetônicos e de engenharia complementar do NCFPI e os da NBR 12721
(norma que define a aplicação do CUB/m2), registrando ser inadequado aplicar qualquer relação de
custo utilizando os índices do CUB/m2 no corpo das planilhas orçamentárias do CAPEX em tela,
motivo pelo qual não se pode inferir pela falha no orçamento sem que sejam considerados os
argumentos técnicos ora expostos.
96. Por fim, foram encaminhados o CAPEX atualizados (peça 306), a modelagem financeira
do empreendimento (peça 307) e a nota técnica da modelagem financeira elaborada pela FGV (peça
308). Todos atualizados.
Análise
97. Quanto à seleção do INCC como índice para atualização dos custos dos itens orçados em
detrimento a outros índices (IPCA, IGP-M, INPC etc), não foi feito apontamento pela equipe de
auditoria no achado em tela. O que de fato foi questionado foi o risco de os custos atualizados via
INCC após mais de 3 anos propiciarem distorções no custo final do empreendimento. Logo, o
apontamento deste achado versou sobre a utilização de índices de preço na atualização de custo de
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itens que foram obtidos via cotação de mercado, em vez de serem feitas novas cotações, sendo assim
essa parte das alegações do jurisdicionado não justificou o que de fato foi elencado.
98. Adentrando de fato no que foi relatado pela equipe de auditoria, o jurisdicionado
respaldou a atualização de custos via INCC em orientação contida na “Cartilha TCU Referência
Obras Públicas 2014”, em seu parágrafo "2.11.2 Temporalidade".
99. A “Cartilha TCU Referência Obras Públicas 2014” se refere a publicação “Orientações
Para Elaboração de Planilhas Orçamentárias De Obras Públicas” (disponível em <
https://portal.tcu.gov.br/biblioteca-digital/orientacoes-para-elaboracao-de-planilhas-orcamentarias-
de-obras-publicas.htm>, consultado em 25/8/2020) e traz a definição de Temporalidade utilizado pelo
jurisdicionado em suas alegações.
‘2.11.2 Temporalidade: Os valores orçados tornam-se defasados ao longo do tempo. Tal fato ocorre
tanto em função da perda do poder aquisitivo da moeda (inflação), quanto em função de flutuações de
preços dos insumos, alterações tributárias, evolução dos métodos construtivos, bem como diferentes
cenários financeiros e gerenciais, que limitam no tempo a validade e a precisão de um orçamento. Em
regra, quanto mais tempo transcorrer após a elaboração do orçamento, menor será a sua precisão na
estimativa do custo efetivo da obra. Assim, o orçamento tem sua validade associada a uma
determinada data-base. O decurso do tempo pode exigir a incorporação de novos parâmetros e a
necessidade de realizar ajustes financeiros. Ou seja, a adequação do orçamento para data-base
posterior não é somente função da correção monetária. As flutuações dos preços dos insumos não
devem ser desprezadas, assim como as modificações e a obsolescência de equipamentos, que podem
alterar suas produtividades e respectivos custos de propriedade. Assim, as correções de preços por
índices em períodos demasiadamente longos nem sempre reproduzem as exatas condições da obra na
época que será efetivamente realizada.’
100. Ora, o próprio conceito trazido pelo jurisdicionado reafirma o apontamento da equipe e
evidencia o risco de que atualizações de custo via índice em um lapso temporal considerável pode
acarretar um orçamento distorcido.
101. Nesse ponto, vale reiterar que o apontamento nesse quesito, da atualização via cotação
atualizada de preço em vez de atualização de cotações antigas por índice de preço, não tem o condão
de determinar uma diminuição dos custos orçados, mas, sim, de propiciar uma melhor estimativa de
custo para a implementação do empreendimento. Cabe esclarecer que custos subestimados também
são impropriedades, pois tal subestimação pode acarretar obra inacabada, aditivos contratuais,
licitação deserta e qualidade deficiente na execução da obra, gerando, por conseguinte, prejuízo à
Administração Pública.
102. Pelo exposto, o risco inerente da atualização via INCC dos custos obtidos via cotação de
mercado permanece.
103. Quanto à baixa utilização do Sinapi, a argumentação trazida pela jurisdicionada no
sentido de que a utilização do sistema oficial de referência de preço se mostra limitada dada a
complexidade da planta fabril do NCPFI (por se tratar de projeto único de produção de vacinas e de
biofármacos), se mostra razoável.
104. Em análise já proferida no bojo do relatório de auditoria, restou evidenciado que 97% da
amostra que compunha a curva ABC eram oriundas de cotação de preço junto aos fornecedores (peça
264). Em nova análise da curva ABC do CAPEX apresentado (peça 306), constatou-se que a
representatividade de itens provenientes de sistemas oficiais de preço é de aproximadamente 14% da
amostra, o que equivale a aproximadamente R$ 280 milhões (peça 325).
Tabela 1 representatividade amostra da curva ABC CAPEX.
DESCRIÇÃO MONTANTE REPRESENTATIVIDADE
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2013. Exemplificativamente esse mero fornecimento representa uma compra simples do item junto ao
fornecedor que entrega o item na obra.
114. Logo, persiste a inconsistência de divisão do BDI em mão de obra e materiais.
115. Com relação à análise comparativa do projeto do NCPFI e à metodologia definida na
NBR 12721 (norma que define a aplicação do CUB/m2), cumpre realizar algumas considerações,
algumas já postas no relatório de auditoria.
116. A comparação não foi realizada para todo o projeto do NCPFI, mas sim para as
edificações ditas ordinárias, que não se revestem de especificidades de plantas fabris (como por
exemplo: restaurante, guaritas, prédios administrativos etc.).
117. No mais, a análise comparativa foi promovida seguindo todas as determinações da
NBR 12721, buscando diminuir ao máximo as distorções propiciadas pela não contemplação, no
cálculo do CUB, de elementos construtivos capazes de elevar consideravelmente o custo das
edificações, como por exemplo elevadores e ar-condicionado.
118. Enfim, reitera-se aqui que a análise via CUB não teve o propósito de imputar
impropriedades na orçamentação do empreendimento, mas de chamar a atenção para a gravidade de
não ser possível avaliar o orçamento apresentado, uma vez que ficou demonstrado o impacto que uma
variação no preço orçado pode causar no valor do aluguel.
119. Conforme discutido na presente análise, os argumentos trazidos por Bio-Manguinhos não
conseguiram solucionar todos os apontamentos proferidos pela equipe de auditoria. Coube razão à
jurisdiciona quanto à especificidade do projeto do NCPFI, o que propicia dificuldades justificáveis na
utilização dos sistemas oficiais de preço, bem como, inferiu-se que a utilização da unidade “RT” para
o rateio dos quantitativos não cotados individualmente para algumas edificações do complexo
caracterizou-se como falha formal na apresentação do CAPEX.
120. Porém, as atualizações via índice de preço das cotações obtidas há mais de 3 anos junto
aos fornecedores propiciam riscos de imprecisão à orçamentação, o que, junto à segregação do BDI
em materiais e mão de obra, persiste como impropriedade na orçamentação da obra.
121. Por fim, vale reiterar que o novo CAPEX (peça 306) ainda apresenta falhas na sua
formulação como ausências de unidades, de quantitativos, de preço unitário e de composição de
preços unitários (CPUs). Também não foi identificada no CAPEX a ART do orçamentista.
122. Tais fatos inserem mais risco ao processo pois, como explicitado, o valor total do
investimento projetado possui grande sensibilidade em relação à orçamentação, podendo
proporcionar variações expressivas nos desembolsos a serem efetuados no decorrer do contrato e um
risco de prejuízo aos cofres públicos. Por isso, há inconsistências que não permitem avaliar a
comprovação de economicidade do objeto.
123. Assim, permanece o entendimento de considerar não atendidos os itens 9.2.2 e 9.3 do
Acórdão 2.687/2018-TCU-Plenário.
124. Pontua-se, porém, que as determinações supra tinham o condão de aprimorar a minuta de
edital, propiciando uma mitigação de riscos. Dado a atual estágio da contratação do objeto (edital já
publicado) e dado que o modelo BTS, em teoria, não exige um detalhamento orçamentário nos moldes
exigidos pela lei 8.666/93, conforme exposto no anexo do Relatório de Auditoria, entende-se não ser
mais adequada a reiteração das determinações pendentes de implementação, cabendo assim, em
respeito a Resolução-TCU 315, de 22 de abril de 2020, cientificar a Fiocruz das falhas, alertando-a
para os riscos elencados.
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125. Cabe pontuar, ainda, que a despeito de o modelo BTS não exigir um orçamento detalhado,
foi realizada uma licitação para contratação de empresa para elaboração do projeto executivo e foi
realizado o aceite de um projeto com falhas que são objeto de apontamento pelo TCU desde 2016, sem
as devidas correções. Eventuais responsabilidades relacionadas ao orçamento poderão ser analisadas
no âmbito do processo de auditoria em aberto (TC 017.376/2016-5), que avaliará entre outros itens a
regularidade do contrato 104/2012, celebrado com a empresa IPS – Integrated Project Services Inc.,
para elaboração do projeto executivo da obra.
Achado III.3-Riscos relacionados à aplicação do modelo Built to suit - F/I (peça 276, p. 28-37)
126. Os riscos relacionados à aplicação do modelo BTS se dividem em: falta de
regulamentação; ausência de instrumento orçamentário apropriado e possível impacto nas regras
fiscais; e fragilidade no modelo de garantia previsto.
127. Quanto à falta de regulamentação, apontou-se que a previsão legal existente expõe o
modelo built to suit a riscos de concepção e implica em insegurança jurídica, pois permite que cada
órgão faça uma interpretação diferente do único artigo no ordenamento jurídico que trata do tema.
Foram demonstrados os riscos referentes às possíveis interpretações para o limite do aluguel mensal
disposto no § 3º, art. 47-A, da Lei do RDC e sobre a forma de atualização contratual (parágrafos 174
a 192 da peça 276).
128. Sobre a suficiência dos instrumentos orçamentários para autorizar o investimento e
garantir recursos ao pagamento dos aluguéis, verificou-se que o desembolso financeiro por parte da
administração pública somente será iniciado após 3 anos de início da obra (pagamento de 60% do
aluguel por 2 anos) e terá duração de 15 anos (com pagamento integral do aluguel), ou seja, o
instrumento orçamentário plurianual existente não é capaz de abranger o período total de desembolso
do projeto e registrar o valor total do investimento, conforme confirmado pelo Ministério da
Economia.
129. Como consequência, haverá possibilidade de celebração de um contrato cujo valor global
pode alcançar R$ 7,3 bilhões sem qualquer tipo de autorização orçamentária e legislativa
previamente à licitação, por falta de instrumento adequado, não sendo possível, inclusive, verificar o
cumprimento de outras regras fiscais dispostas na Lei de Responsabilidade Fiscal.
130. Outro ponto abordado diz respeito ao fato de que como o imóvel será revertido à
Administração ao final do período de amortização, a essência da operação pressupõe que mesmo que
o contrato seja definido como um aluguel sob medida, a despesa decorrente da reversão do bem deve
ser classificada como uma despesa de capital derivada de uma operação de crédito. Apesar de no
caso concreto o Ministério da Economia ter afirmado que não há materialidade significativa para
afetar regras fiscais como “Regra de Ouro” ou “Teto dos Gastos”, pois os limites são avaliados a
nível agregado de despesas primárias do Poder Executivo Federal, caso os demais órgãos da
Administração passem a adotar o modelo built to suit com reversão, poderá ser constituída uma
carteira significativa capaz de afetar tais regras.
131. Sobre esses dois pontos, as propostas de encaminhamento foram direcionadas aos
Ministérios da Economia, da Saúde, Casa Civil, bem como ao Congresso Nacional, a fim de alertá-los
sobre os riscos de insegurança jurídica e possíveis impactos orçamentários e fiscais identificados por
este Tribunal na aplicação do modelo built to suit.
132. Em relação ao último ponto, mais diretamente relacionado à Fiocruz, foram elencadas
fragilidades na previsão para utilização do Fundo Garantidor de Infraestrutura (FGIE) como
cobertura da operação.
133. De acordo com a minuta do contrato, cláusula 26.3, é prevista a cobertura de 12 meses de
aluguel via garantia locatícia contratada junto ao FGIE, porém, ficou evidenciado que não há
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possibilidade no regulamento do FGIE que permita ao fundo garantir operações de BTS. Para a
viabilização da operação, faz-se necessária a aprovação de um regulamento específico pelo Conselho
de Participação de Fundos Garantidores para Cobertura de Riscos em Operações de Projetos de
Infraestrutura de Grande Vulto (CPFGIE) e pela assembleia dos cotistas.
134. Portanto, entendeu-se não ser adequado a abertura de procedimento licitatório antes de
as regras do fundo estarem devidamente formalizadas, em virtude do aumento do risco associado a
essa questão ser precificado nas propostas dos participantes do certame.
135. Ainda em relação à garantia, foi questionada a cobertura de apenas 12 meses, o que
representa apenas 6% da duração total do contrato. Tal período foi considerado pequeno por
investidores em audiência pública, dado o horizonte de 20 anos do projeto.
136. Desta forma, as incertezas relacionadas à capacidade do órgão de manter o adimplemento
do contrato associadas à garantia de apenas 12 meses de aluguel inspira cautela por parte dos
investidores. Tal fato pode influenciar diretamente o valor das propostas, de forma a embutir no preço
apresentado o risco de inadimplemento, ainda mais considerando o elevado valor contratual.
137. Por fim, também foram identificados riscos relacionados à manutenção da garantia pelo
FGIE. Na configuração existente, apesar de o aporte inicial no fundo ser de responsabilidade do
Ministério da Saúde, eventuais recomposições decorrentes de utilização da garantia deverão ser
efetuadas por Bio-Manguinhos, conforme estabelecido na cláusula 26.6 da minuta do contrato. Assim,
a própria entidade que teria dado origem à inadimplência contratual seria o responsável por
recompor o saldo do fundo garantidor.
138. Pelo exposto, considerando os riscos envolvidos relacionados à formalização, suficiência
e recomposição do fundo garantidor, a equipe propôs determinar à Fiocruz que apresente a este
Tribunal a formalização da garantia locatícia pelo Fundo Garantidor de Infraestrutura (FGIE),
avaliando inclusive a conveniência e a oportunidade de rever as regras de recomposição do fundo em
caso de utilização, de forma a segregar responsabilidades, bem como de avaliar se a cobertura
oferecida é suficiente para reduzir o risco de afetar os preços das propostas de preço na licitação.
Manifestação Fiocruz (peça 294, p. 1-4)
139. Apesar de os riscos apontados acerca da falta de regulamentação do BTS e da ausência de
instrumento orçamentário apropriado não terem sido objetos de encaminhamento à Fiocruz, o órgão
fez considerações sobre o tema.
140. Inicialmente a Fiocruz se manifesta indo ao encontro do proferido pela equipe de
auditoria sobre a aplicabilidade do limite de 1% no valor pago a título de “aluguel” nos contratos de
BTS estabelecido no art. 47-A da Lei do RDC. A Fundação entende que tal limite é aplicável
exclusivamente ao valor do aluguel, não contemplando as hipóteses em que há reversão do bem ao
final do contrato, nas quais há um destaque necessário entre o valor da locação e o valor de reversão
da propriedade do bem imóvel locado.
141. Quanto ao enquadramento da despesa como despesa de capital, a Fiocruz recepcionou a
orientação e se manifestou no sentido de classificar a despesa como de capital, porém, a Fundação
refutou a semelhança do contrato a uma operação de crédito e a um arrendamento mercantil
(leasing).
142. Na sua argumentação, a Fiocruz enumera os fatores que torna a impossibilidade da
comparação (peça 294, p. 2):
i) O contrato não é firmado com instituição financeira e não é regulamentado pelo Banco
Central;
17
18
149. Logo, como consignado no relatório, a equipe mapeou os riscos decorrentes da falta de
instrumento orçamentário adequado para aprovação do empreendimento, da ausência de limites
adequados do valor das parcelas mensais denominadas de aluguel e sua forma de atualização, bem
como o risco de insegurança jurídica e possíveis impactos orçamentários e fiscais, e ofereceu um
diagnóstico prévio aos órgãos competentes alertando-os sobre a falta de regulamentação da
aplicação do modelo built to suit no setor público, especialmente para os contratos que prevejam
reversão do imóvel à Administração Pública ao final do período contratual.
150. Sendo assim, os riscos mapeados persistem. Logo, o encaminhamento da decisão aos
órgãos responsáveis ainda se mostra oportuno.
151. No tocante ao FGIE, especificamente em relação à desconfiança por parte dos
investidores sobre a capacidade de pagamento da instituição e ao pequeno prazo e baixo valor de
garantia, a Fiocruz insiste na possibilidade de utilização das receitas advindas das exportações de
Bio-Manguinhos/Fiocruz. Tal tema já foi tratado na análise das manifestações do Achado III.1, logo,
com a reformulação do entendimento (possibilitando que a Fiocruz promova exportação pela Fiotec),
cabe razão à manifestação apresentada pela jurisdicionada.
152. Entretanto reitera-se a necessidade de formulação dos mecanismos de controle interno
para mitigar os riscos na apuração da receita da exportação promovida pela Fiotec, bem como, o
estabelecimento da restituição do FGIE por parte dessas receitas.
153. Por fim, em relação ao risco de falta de cobertura locatícia devido a não definição de
prazo certo para recomposição do fundo em caso de utilização, a Fiocruz concordou com o
posicionamento da auditoria e efetuou alteração no edital estipulando prazo de 3 meses, conforme
disposto na nova minuta de contrato apresentada (peça 319, p. 31). Porém, não houve manifestação
acerca dos riscos apontados relacionados ao responsável por efetuar essa recomposição.
154. Quanto à possibilidade de consignação de garantia via FGIE, a Fiocruz reiterou a
incertezas na possibilidade de utilização do fundo garantidor nos modelos de built to suit, porém, a
Fundação demonstrou estar buscando uma solução conjunta com os gestores do FGIE para o impasse
sobre a alteração do regulamento do fundo (peça 294, p. 4).
155. Logo, a despeito de ainda persistir a impossibilidade de utilização do fundo, Bio-
Manguinhos/Fiocruz vem construindo conjuntamente com os gestores do FGIE mecanismos para a
efetivação da utilização do fundo.
156. Assim, dado o atual estágio da contratação (edital publicado), os encaminhamentos
promovidos pela jurisdicionada junto aos gestores do FGIE com o objetivo de sanar as pendências e
com base na nova metodologia adotada a partir da Resolução-TCU 315, de 22 de abril de 2020,
compreende-se não ser mais aplicável a proposição de determinação referente ao FGIE proferida no
bojo do relatório preliminar de auditoria (peça 276), mas sim cientificar a fundação dos riscos
relacionados à falta de regulamentação.
Achado III.4-Riscos identificados na minuta do edital que podem prejudicar a competitividade do
certame e o andamento contratual adequado - F/I (peça 276, p. 37-41)
157. Preliminarmente, frisa-se que o que foi ressaltado nesse achado é um risco potencial para
a licitação.
158. Foram constatadas duas situações que podem comprometer a competitividade da
licitação: (i) conflito de interesses no modelo de contratação da Fundação Getúlio Vargas (FGV)
para prestação de serviço de assessoria técnica e (ii) adoção de critérios inadequados de habilitação
e julgamento.
a) Conflito de interesses no modelo de contratação da Fundação Getúlio Vargas (FGV)
19
159. O primeiro diz respeito à forma de remuneração da FGV para a elaboração dos estudos
de viabilidade e de modelagem financeira, e para a captação de possíveis licitantes.
160. A FGV foi responsável pela elaboração e definição da viabilidade econômica e financeira
do empreendimento e, depois, em um segundo contrato, desenvolveu a modelagem financeira segundo
a qual se executaria o projeto e ficou responsável pela prospecção dos potenciais investidores que
participarão do certame.
161. Especificamente no segundo contrato, a cláusula de remuneração dos serviços prestados
pela FGV firmou um preço de “2,25% sobre o total do valor do financiamento para implementação do
empreendimento”, sendo o pagamento de responsabilidade da vencedora do certame.
162. Ou seja, no cenário em que o custo de construção seria o orçamento estimativo (no valor
de R$ 2.490.037.887,23, data-base: dez/2018), a FGV receberia o valor de R$ 56.025.852,46, para a
estruturação do projeto de apoio. E ainda, o contrato dispõe que não cabe à Bio-Manguinhos
quaisquer ônus financeiros, a qualquer título, pelos serviços prestados, bem como registra que o
recebimento pela prestação de serviços depende exclusivamente do êxito do certame licitatório.
163. No contexto apresentado, o que se visualiza é um conflito de interesses da FGV em relação
à contratação pois, como somente haverá recebimento dos serviços prestados caso a licitação tenha
sucesso, a remuneração do segundo contrato depende diretamente de que o estudo de viabilidade
econômico-financeira do empreendimento seja favorável ao investidor, a fim de que se possa dar
continuidade à licitação.
164. Esse conflito ainda é acentuado ao se considerar que a remuneração da FGV, empresa
responsável pela elaboração da modelagem de financiamento, é obtida a partir de uma porcentagem
do valor do financiamento definido para implementação do empreendimento, o que na prática indica
que, quanto mais recursos a Administração Pública despender no valor do contrato, maior será a
remuneração da FGV, o que a coloca em objetivos opostos com o interesse público. Assim, resta claro
o risco de o estudo elaborado não ser condizente com a melhor alternativa para Bio-Manguinhos.
165. Em outra ponta, há também o risco de a FGV não ser remunerada pelo serviço prestado
caso a licitação não alcance êxito, caracterizado assim possível enriquecimento sem causa por parte
da Administração.
166. Entendeu-se que tais riscos poderiam ser minimizados caso o contrato previsse uma
remuneração atrelada à taxa de desconto da licitação, de modo que quanto maior for o desconto da
licitação, maior a remuneração a ser recebida pela FGV. Outra alternativa seria a estipulação de um
valor fixo a ser pago pelo serviço, a preços de mercado, sendo a responsabilidade pelo pagamento da
própria Bio-Manguinhos, pois, assim, o fator “incentivo” seria consideravelmente reduzido.
167. Adicionalmente, vislumbrou-se, como alternativa, a retirada do sigilo da licitação, de
modo que todos os possíveis participantes tenham acesso às informações que são repassadas durante
as reuniões de prospecção de investidores e reduza, assim, a assimetria de informações entre os
concorrentes.
168. Desta forma, propôs recomendar à Fiocruz que revise as condições de pagamento dos
serviços prestados pela FGV, de modo a reduzir o incentivo gerado de haver uma contratação
antieconômica. Também propôs-se recomendar a retirada do sigilo do orçamento de forma a se evitar
assimetria de informações entre os licitantes que poderiam ser provocadas pelas informações
repassadas nas reuniões de prospecção de investidores.
b) Critérios inadequados de habilitação e julgamento
169. Sobre os critérios de habilitação e julgamento, entendeu-se que a regra que exige a
comprovação de que a licitante tenha participado de empreendimento que tenha captado pelo menos
um bilhão de reais para cumprimento das obrigações financeiras assumidas, por meio de
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188. Quanto aos demais apontamentos que versam sobre os critérios de julgamento da
proposta comercial e a metodologia de análise dos preços no ordenamento das propostas, todos foram
aprimorados na nova minuta de edital e contrato (peças 311 e 312) perdendo assim o objeto dos
encaminhamentos.
189. Logo, no que concerne aos critérios inadequados de habilitação e julgamento na minuta
de edital, cabe sopesar que a equipe técnica fez uma análise e apresentou alguns riscos potenciais que
podem impactar o certame e na busca de uma construção participativa da deliberação, oportunizou à
jurisdicionada as críticas à proposta. A jurisdicionada por sua vez recepcionou os apontamentos
promovendo as alterações que entendeu plausíveis.
190. Soma-se a isso o atual estágio da contração (edital publicado) e a nova metodologia
adotada a partir da Resolução-TCU 315, que os encaminhamentos proferidos pelo TCU devem ser
imprescindíveis à finalidade do controle, corolário do princípio da racionalização das deliberações, a
despeito de ainda existir alguns riscos elencados, entende-se que os encaminhamentos ora proferidos
em relação: ao conflito de interesses no modelo de contratação da FGV para prestação de serviço de
assessoria técnica; e adoção de critérios inadequados de habilitação e julgamento, não se mostram
mais aplicáveis.
CONCLUSÃO
191. A presente instrução avaliou as manifestações da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em
relação aos apontamentos da unidade técnica consignados no Relatório de Fiscalização 90/2019
(peça 276). Tais manifestações foram autorizadas pelo Exmo. Relator, Ministro Benjamin Zymler,
conforme despacho acostado à peça 280.
192. Com relação às falhas nos estudos de viabilidade técnica-econômica-financeira do
empreendimento (achado III.1), apontou-se que tais falhas decorrem de falhas no estudo de demanda
e de falhas no estudo de alternativas.
193. As falhas no estudo de demanda, em apertada síntese, versaram sobre riscos decorrentes
de frustação na expectativa de realização das receitas previstas no EVTE, em função das incertezas de
aquisição dos produtos pelo Ministério da Saúde (MS) e pelos organismos internacionais, bem como
em função dos riscos associados aos processos de transferência de tecnologia (decorrentes de
Parcerias para Desenvolvimento Produtivo - PDPs) necessários à formulação e venda dos produtos a
serem fabricados no complexo. E, ainda, resta dúvidas sobre a possibilidade de realização de
exportação por parte de Bio-Manguinhos via Fundação de Apoio (Fiotec).
194. Após análises (parágrafos 35 a 53), concluiu-se que, apesar de os riscos decorrentes da
aquisição de produtos frutos de PDPs permanecerem, a apresentação de ofício do MS, em que o ex-
Ministro de Estado da Saúde, Eduardo Pazuello, reitera a importância estratégica da construção do
NCPFI (peças 326 e 327), a apresentação de dados históricos para justificar a demanda dos produtos,
as alterações trazidas na Lei 13.801/2019 que abriu possibilidade de se exportar via Fiotec e a nova
realidade imposta pela pandemia do novo coronavírus diminuem as incertezas de demanda elencadas
no relatório.
195. Assim, considerando que a análise do EVTE do NCPFI já foi tema de algumas
fiscalizações por parte do TCU, em que foram realizados mapeamento dos riscos, considerando que
Bio-Manguinhos/Fiocruz acatou algumas recomendações, refutou outras e promoveu aprimoramentos
no modelo, e considerando ainda que houve publicação do edital de licitação, entende-se não ser mais
razoável a proposta do relatório preliminar de reiteração da determinação do item 9.2.1 do Acórdão
2687/2018-TCU- Plenário, que tratava de reapresentação do EVTE.
196. Quanto às falhas no estudo de alternativas, essas decorrem do fato de Bio-Manguinhos, na
escolha da metodologia construtiva e de contratação, ter feito a opção pelo built to suit amparada no
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mérito administrativo e não em um estudo de alternativas comparativo com outros modelos, como
pautado no Acórdão 1.301/2013-TCU-Plenário. Sobre as falhas no estudo de alternativas a
jurisdicionada não apresentou manifestação.
197. Porém, no atual estágio da contratação (edital publicado), entende-se não ser mais
aplicável a determinação apresentada no relatório preliminar (peça 276), cabendo apenas a
proposição de dar ciência, com o intuito de aprimoramento da gestão de contratações por parte da
Fiocruz, de que as contatações no modelo built to suit devem ser precedidas de estudo de alternativas,
destacando-se o custo-benefício de cada alternativa levantada do ponto de vista dos riscos envolvidos,
dos valores a serem desembolsados e demais vantagens e desvantagem verificadas, consoante o
disposto no Acórdão 1.301/2013-TCU-Plenário.
198. Quanto ao preço de aluguel inadequado devido as falhas no orçamento da obra (achado
III.2), apontou-se que a inadequação decorria de fragilidades e imperfeições encontradas no processo
de orçamentação do empreendimento, bem como na modelagem financeira.
199. As falhas na orçamentação derivavam da utilização inapropriada de unidade de “Rateio”
(RT), utilização de metodologia de cálculo de BDI não amparada por esse Tribunal, e atualização de
preço de serviços, para um horizonte de mais de 3 anos, por meio de índice de preço (Índice Nacional
de Custo da Construção – INCC). Ainda restou por constatar que as determinações 9.2.2, 9.2.3 e 9.3
do Acórdão 2.687/2018 – TCU – Plenário ainda estavam pendentes de implementação.
200. Conforme discutido na presente análise (parágrafos 97 a 125), os argumentos trazidos por
Bio-Manguinhos não conseguiram solucionar todos os apontamentos proferidos pela equipe de
auditoria. Coube razão à jurisdiciona quanto à especificidade do projeto do NCPFI, o que propicia
dificuldades justificáveis na utilização dos sistemas oficiais de preço, bem como, inferiu-se que a
utilização da unidade “RT” para o rateio dos quantitativos não cotados individualmente para
algumas edificações do complexo caracterizou-se como falha formal na apresentação do CAPEX.
201. Porém, as atualizações via índice de preço das cotações obtidas há mais de 3 anos junto
aos fornecedores propiciam riscos de imprecisão à orçamentação, o que, junto à segregação do BDI
em materiais e mão de obra, persiste como impropriedade na orçamentação da obra.
202. Por fim, vale reiterar que o novo CAPEX apresentado (peça 306) ainda apresenta falhas
na sua formulação como ausências de unidades, de quantitativos, de preço unitário e de composição
de preços unitários (CPUs). Também não foi identificada no CAPEX a ART do orçamentista.
203. Tais fatos inserem mais risco ao processo pois, como explicitado, o valor total do
investimento projetado possui grande sensibilidade em relação à orçamentação, podendo
proporcionar variações expressivas nos desembolsos a serem efetuados no decorrer do contrato e um
risco de prejuízo aos cofres públicos. Por isso, há inconsistências que não permitem avaliar a
comprovação de economicidade do objeto.
204. Pontua-se, porém, que as determinações supra tinham o condão de aprimorar a minuta de
edital, propiciando uma mitigação de riscos. Dado a atual estágio da contratação do objeto (edital já
publicado) e dado que o modelo BTS, em teoria, não exige um detalhamento orçamentário nos moldes
exigidos pela lei 8.666/93, conforme exposto no anexo do Relatório de Auditoria, entende-se não ser
mais adequada a reiteração das determinações pendentes de implementação, cabendo assim, em
respeito a Resolução-TCU 315, de 22 de abril de 2020, cientificar a Fiocruz das falhas, alertando-a
para os riscos elencados.
205. Cabe pontuar, ainda, que a despeito de o modelo BTS não exigir um orçamento detalhado,
foi realizada uma licitação para contratação de empresa para elaboração do projeto executivo e foi
realizado o aceite de um projeto com falhas que são objeto de apontamento pelo TCU desde 2016, sem
as devidas correções. Eventuais responsabilidades relacionadas ao orçamento poderão ser analisadas
24
no âmbito do processo de auditoria em aberto (TC 017.376/2016-5), que avaliará entre outros itens a
regularidade do contrato 104/2012, celebrado com a empresa IPS – Integrated Project Services Inc.,
para elaboração do projeto executivo da obra.
206. Quanto aos riscos relacionados à aplicação do modelo Built to suit (achado III.3), o
achado teve o condão de elencar os riscos decorrentes da baixa regulamentação do modelo de
contratação Built to suit para a aplicação do modelo pela Administração Pública, principalmente
quando o empreendimento é desenvolvido em terreno público com reversão ao final do contrato.
207. Resumidamente os riscos relacionados à aplicação do modelo BTS se dividem em: falta de
regulamentação; ausência de instrumento orçamentário apropriado e possível impactos nas regras
fiscais; e fragilidade no modelo de garantia previsto.
208. Quanto à falta de regulamentação, a Fiocruz apresentou alegações em linha ao
consignado no relatório de auditoria de que o limite de um porcento para o aluguel não se mostra
adequado quando há reversão do imóvel ao final do contrato. Logo, ainda se mostra oportuno o
encaminhamento da decisão aos órgãos responsáveis reiterando a falta de regulamentação do BTS
para a Administração Pública notadamente quando há reversão ao final do contrato.
209. Com relação aos instrumentos orçamentários apropriados e à classificação da despesa, a
jurisdicionada reconhece a classificação da despesa como sendo de capital, porém refuta a analogia a
operação de crédito.
210. Sendo assim, dado o ineditismo do modelo e o impasse na classificação, se mostra
imprescindível o posicionamento da Secretaria do Tesouro Nacional, órgão competente em
determinar qual de fato é a classificação da despesa, bem como cabe ao Tesouro Nacional informar
qual instrumento orçamentário adequado para a previsão do investimento de 20 anos com
desembolsos previsto para ocorrer apenas 3 anos após o início da obra.
211. Quanto ao FGIE, em relação a suficiência da garantia, Bio-Manguinhos reafirmou a
possibilidade de utilização das receitas provenientes das exportações serem utilizadas. Logo, com a
reformulação do entendimento do tema na análise das manifestações do achado III.1, cabe razão a
jurisdicionada.
212. No que concerne ao prazo para recomposição da garantia, foi efetuada alteração no edital
estipulando prazo de 3 meses, porém ainda persiste o impasse de quem seria o órgão responsável por
efetuar essa recomposição.
213. Ainda em relação ao FGIE, a jurisdicionada reconheceu a incertezas na possibilidade de
utilização do fundo garantidor nos modelos de built to suit, e informou que vem buscando junto os
gestores do FGIE solução para o impasse.
214. Assim, dado o atual estágio da contratação (edital publicado), os encaminhamentos
promovidos pela jurisdicionada junto aos gestores do FGIE com o objetivo de sanar as pendências e
com base na nova metodologia adotada a partir da Resolução-TCU 315, compreende-se não ser mais
aplicável a proposição de determinação referente ao FGIE proferida no bojo do relatório preliminar
de auditoria (peça 276), cabendo dar ciência à jurisdicionada dos riscos remanescentes.
215. Por fim, sobre os riscos identificados na minuta do edital que podem prejudicar a
competitividade do certame e o andamento contratual adequado (achado III.4), foram levantados
riscos potenciais derivados de conflito de interesses no modelo de contratação da FGV para prestação
de serviço de assessoria técnica; e de adoção de critérios inadequados de habilitação e julgamento.
216. Quanto ao risco de conflito de interesse no modelo de contratação da FGV, esse se dividia
no critério remuneratório do serviço indexado a 2,25% do total do contrato celebrado e do pagamento
ser executado pelo vencedor do certame.
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26
228. Considerar não atendidos os itens 9.2.2, 9.2.3 e 9.3, todos do Acórdão 2.687/2018-TCU-
Plenário.
229. Dar ciência à Fiocruz, com fundamento no art. 9º, inciso I, da Resolução-TCU 315, de
2020:
229.1. das falhas na planilha orçamentária do projeto executivo, conforme impropriedades
elencadas nesta instrução e no relatório de auditoria, incluindo ausências de unidades, de
quantitativos, de preço unitário e de composição de preços unitários; atualização via índice de preço
das cotações obtidas há mais de 3 anos junto aos fornecedores em detrimento de ajuste dos preços dos
serviços pelos valores de mercado; a utilização de unidade de rateio e demais verbas em detrimento
de unidades efetivas de medida de serviço; utilização de metodologia de cálculo de BDI não
amparada por esse Tribunal, conforme Acórdão 2.622/2013-TCU-Plenário e Decreto 7.983/2013;
229.2. que as contratações no modelo built to suit deve ser precedida de estudo de alternativas,
destacando-se o custo-benefício de cada alternativa levantada do ponto de vista dos riscos envolvidos,
dos valores a serem desembolsados e demais vantagens e desvantagem verificadas, consoante o
disposto no Acórdão 1.301/2013-TCU-Plenário.
229.3. que a falta de formalização da garantia locatícia pelo Fundo Garantidor de Infraestrutura
– FGIE, bem como as regras de recomposição do fundo em caso de utilização expõem o
empreendimento a riscos de descontinuidade e podem afetar os preços das propostas da licitação;
230. Encaminhar o acórdão que vier a ser proferido, acompanhado do voto e do relatório que o
fundamentarem, aos Ministérios da Economia; da Saúde, Casa Civil, bem como para o Congresso
Nacional, para fins de alerta sobre os riscos de insegurança jurídica e possíveis impactos
orçamentários e fiscais identificados por este Tribunal devido à falta de regulamentação da aplicação
do modelo built to suit no setor público, especialmente para os contratos que prevejam reversão do
imóvel à Administração Pública.
231. Encerrar o presente processo.”
6. O corpo diretivo da unidade técnica aquiesceu ao aludido encaminhamento.
7. Submetidos os autos ao meu gabinete, verifiquei que algumas questões levantadas pela
SeinfraUrbana envolviam o debate de temas afetos ao direito financeiro e orçamentário, a exemplo da
discussão quanto à natureza da contratação como operação de crédito e à eventual necessidade de
cumprimento da legislação orçamentária e financeira, em especial dos arts. 30 a 32 da LRF.
8. Tendo em vista a especificidade do tema e a urgência no deslinde da questão, haja vista a
iminência do prazo de abertura das propostas (10/8/2021), solicitei a manifestação da Secretaria de
Macroavaliação Governamental (Semag), a fim de que:
a) analisasse se o contrato decorrente do RDC Presencial 1/2021-BM poderia ser enquadrado
como uma operação de crédito, do tipo aquisição financiada de bem;
b) em caso positivo, indicasse as condições legais a serem atendidas pela Fiocruz antes da
conclusão da contratação e se o eventual descumprimento desses requisitos seria fator impeditivo para
a continuidade do certame licitatório e/ou para a assinatura do contrato; e
c) se pronunciasse a respeito de outras questões vinculadas à referida contratação como BTS
que eventualmente possam implicar a violação de normas orçamentárias e financeiras.
9. Em cumprimento, a unidade técnica especializada elaborou a instrução transcrita
parcialmente a seguir, a qual contou com a anuência de seu corpo diretivo:
“12. Conforme o termo de referência do RDC Presencial 01/2021-BM, o processo licitatório
buscará identificar:
27
‘o Menor Valor Presente Líquido Proposto, considerando o valor corrente mensal máximo e o valor
presente líquido máximo estabelecidos pela Administração, que a Bio-Manguinhos pagará ao longo
do Contrato de Locação com Construção Ajustada, através de parcelas mensais de amortização
(composto de valor de ALUGUEL + valor de REVERSÃO), de forma que ao final do Contrato todas
as benfeitorias construídas pelo licitante vencedor (LOCADOR), reverterão sem outro custo para a
Bio-Manguinhos’.
13. Cuida-se, portanto, de locação sob medida com cláusula de reversão do bem construído
ao patrimônio da Fiocruz. Ainda segundo o termo de referência, o imóvel será edificado em terreno
da própria entidade contratante.
14. O built to suit – ou construção e locação sob encomenda – é o contrato por meio do qual
determinada pessoa contrata a construção ou reforma de uma edificação, de acordo com suas
especificações. O usuário pagará ao contratado, mensalmente, determinado valor que se destinará
tanto a remunerar o uso do imóvel quanto a amortizar o investimento por este realizado.
15. Desse modo, é o negócio jurídico no qual um empreendedor imobiliário reforma ou edifica
determinado imóvel sob medida a um ocupante, e, terminada a obra, cede o uso da edificação, por
período determinado. É um contrato bilateral (ou plurilateral), consensual, comutativo, oneroso e de
execução periódica [GOMIDE, A. J. Contratos Built to Suit: aspectos controvertidos decorrentes de
uma nova modalidade contratual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2017. p. 32].
16. É comumente utilizado na iniciativa privada, principalmente por empresas que desejam se
instalar em imóvel adequado às suas necessidades, porém, sem a imobilização do seu capital. Do
ponto de vista do locador, o retorno financeiro é obtido através dos aluguéis pagos mensalmente para
remunerar o uso do imóvel e amortizar o investimento realizado, bem como pela garantia do longo
prazo contratual, que costuma variar entre dez e trinta anos.
17. O Brasil incorporou esse tipo de instrumento a partir da Lei 12.744, de 19/12/2012, que
acrescentou o artigo 54-A à Lei do Inquilinato (Lei 8.245/1991), que trata da contratação de locação
com prévia aquisição, construção ou reforma de imóvel urbano não residencial:
‘Art. 54-A. Na locação não residencial de imóvel urbano na qual o locador procede à prévia
aquisição, construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por terceiros, do imóvel então
especificado pelo pretendente à locação, a fim de que seja a este locado por prazo determinado,
prevalecerão as condições livremente pactuadas no contrato respectivo e as disposições
procedimentais previstas nesta Lei.
§ 1º Poderá ser convencionada a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis durante o prazo
de vigência do contrato de locação.
§ 2º Em caso de denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário, compromete-se este a
cumprir a multa convencionada, que não excederá, porém, a soma dos valores dos aluguéis a receber
até o termo final da locação.’
18. A edição dessa nova regra legal proporcionou maior segurança às partes contratantes,
uma vez que os contratos built to suit eram considerados atípicos por não serem expressamente
disciplinados por lei. Outro ponto que impactava negativamente a realização das operações era a
falta de previsão legal sobre a revisão do valor dos aluguéis e sobre a regra aplicada em caso de
denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário, uma vez que nesse tipo de contrato a
manutenção do valor de aluguel fixado dentro de um prazo de locação mais alongado mostra-se
fundamental para garantir ao locador o retorno do investimento realizado.
19. No âmbito do setor público, a lei que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações
Públicas (RDC) foi alterada pela Lei 13.190/2015, possibilitando a contratações de locação sob
medida pelo referido regime:
28
29
26. Para o setor público, conceitua-se aquisição financiada de bens como a espécie de
operação de crédito contratual em que não há ingresso efetivo de recursos financeiros nos cofres da
entidade, como, por exemplo, a aquisição financiada diretamente com o fornecedor do bem [BRASIL,
Secretaria do Tesouro Nacional. Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público. 8ª ed., Brasília,
2018, p. 313].
27. É verdade que se costuma denominar “financiamento” a operação na qual uma instituição
financeira antecipa o numerário especificamente necessário para a aquisição de bens pelo cliente,
sobre créditos que este cliente possa ter. Na configuração tradicional do financiamento, assim, uma
instituição financeira faz o pagamento correspondente ao comerciante ou fabricante, cobrando seu
cliente em momento posterior. No caso de uma compra financiada contratada diretamente com o
consumidor, por exemplo, a garantia provavelmente será a alienação fiduciária do bem objeto da
transação.
28. Já na aquisição financiada de bens, o financiamento da compra é realizado diretamente
pelo fornecedor dos bens e serviços, não por terceiro. No setor privado, é comum o financiamento de
imóveis ser realizado pela própria construtora ou incorporadora (cf. art. 35-A da Lei 4.591/1964, e
art. 26-A, da Lei 6.766/1979). O conceito de financiamento é econômico, e não jurídico, pois perpassa
diversos institutos e contratos, típicos e atípicos.
29. A situação é distinta daquela encontrada no mútuo, espécie de operação de crédito em que
há obtenção de recurso junto a uma instituição financeira para pagamento posterior acrescido de
juros e demais encargos contratualmente previstos. Nessa forma de contrato, o mutuante
simplesmente empresta determinada quantia ao mutuário, o qual se obriga a devolvê-la com os
acrescimentos pactuados, podendo, até o prazo contratualmente estipulado, usá-la para a finalidade
que lhe aprouver.
30. A aquisição financiada de bens, normalmente, é uma compra e venda: contrato bilateral
pelo qual uma pessoa (vendedor) se obriga a transferir a propriedade de um bem, corpóreo ou
incorpóreo, a uma outra pessoa (comprador), que se obriga a pagar-lhe certo preço em dinheiro – no
caso, de forma diferida no tempo, utilizando-se da confiança (fidúcia) do vendedor.
31. Da forma como a presente operação está estruturada, ela apresenta os elementos típicos
não de uma compra e venda, mas de um contrato de empreitada – contrato no qual uma das partes,
mediante remuneração a ser paga pelo outro contraente, obriga-se a realizar determinada obra, de
acordo com as instruções deste e sem relação de subordinação.
32. Estão presentes os seguintes elementos do contrato de empreitada: i) o resultado, o Novo
Centro de Processamento Final de Imunobiológicos de Bio-Manguinhos – RJ, a ser definitivamente
incorporado ao patrimônio da fundação pública após determinado prazo; ii) o consentimento, a ser
expresso mediante a assinatura de contrato administrativo atípico; e iii) o preço, a ser pago durante
intervalo de tempo e condições previamente acertadas.
33. Embora a empreitada – quando o fornecimento de materiais é responsabilidade do
empreiteiro – aproxime-se da compra e venda, difere desta pois não visa a uma obrigação de dar, mas
à obrigação de fazer uma obra, sendo fundamental a produção do resultado. Dessa definição,
extraem-se três características do contrato de empreitada:
a) Consensualidade: o contrato de empreitada resulta da troca de consentimento a respeito
de um resultado, a ser realizado mediante um preço, e, eventualmente, sob outras condições.
b) Onerosidade: a prestação do empreiteiro supõe a contrapartida, que é o pagamento do
preço em dinheiro;
c) Bilateralidade: as duas partes assumem direitos e obrigações recíprocos, sendo, ao
mesmo tempo, credor e devedor um do outro.
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34. No que se refere ao preço, ele pode ser pago de forma imediata ou diferida no tempo,
situação na qual ocorrerá efetivo financiamento do contraente pelo empreiteiro.
35. Portanto, o fato de que o NCPFI Bio-Manguinhos ainda terá de ser erguido, sob demanda,
pelo vencedor do RDC Presencial 01/2021-BM não representa óbice à caracterização do contrato
como operação de crédito – ainda que como operação assemelhada à aquisição financiada de bens,
prevista na parte final do art. 29, inciso III, da LRF.
36. Veja-se também que, no próprio conceito citado do Manual de Contabilidade Aplicada ao
Setor Público, a “aquisição financiada de bens” é definida em seu sentido amplo: conceitua-se
simplesmente como a operação de crédito contratual em que não há ingresso efetivo de recursos
financeiros, sendo a aquisição financiada diretamente com o fornecedor do bem apenas um dos
possíveis casos.
37. De toda sorte, ainda que não se considerasse a prestação financiada de serviços de
empreitada como uma operação assemelhada à aquisição financiada de bens, o contrato examinado
importa assunção de obrigação com fornecedor para pagamento a posteriori de bens e serviços, que –
caso realizada sem a devida autorização orçamentária – seria considerada operação equiparada a
operação de crédito e vedada pelo art. 37, inciso IV, da LRF.
38. Portanto, a prestação financiada de serviços de empreitada constitui operação de crédito
assemelhada à aquisição financiada de bens, enquadrando-se na definição do art. 29, inciso III, da
Lei Complementar 101/2000.
III.1.2. Do arrendamento mercantil
39. O contrato de locação por encomenda, por outro lado, também pode mostrar considerável
similaridade com o de arrendamento mercantil – contrato pelo qual uma empresa, desejando utilizar
determinado imóvel, pactua com uma instituição financeira (ou sociedade de arrendamento mercantil)
para que adquira o referido bem, o qual será alugado à interessada por prazo certo. Admite-se que,
terminado o prazo locativo, o arrendatário possa optar entre: i) a devolução do bem; ii) a renovação
da locação; ou iii) a compra pelo preço residual fixado no contrato.
40. O arrendamento mercantil (também denominado “leasing”) é disciplinado pela Lei
6.099/1974, segundo a qual:
Considera-se arrendamento mercantil, para os efeitos desta lei, o negócio jurídico realizado entre
pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de
arrendatária. e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo
especificações da arrendatária e para uso próprio desta” (art. 1°, parágrafo único).
41. A mesma lei prevê que os contratos de arrendamento mercantil conterão disposições
sobre: i) a opção de compra ou renovação de contrato, como faculdade do arrendatário, e ii) o preço
para opção de compra ou critério para sua fixação, quando for estipulada esta cláusula (art. 5°).
42. Desse modo, o contrato envolve elementos de locação, financiamento e venda – o
arrendatário antecipa a fruição de um bem, diferindo seu pagamento no tempo. Em vez de a
instituição financeira celebrar um contrato de mútuo, adiantando os recursos financeiros para a
aquisição do bem, ela mesma o adquire e o disponibiliza, recebendo pagamentos periódicos como
contraprestação.
43. Sobre o tema, a Norma Brasileira de Contabilidade NBC TG 06 (R1) – Operações de
Arrendamento Mercantil estabelece:
‘10. A classificação de um arrendamento mercantil como arrendamento mercantil financeiro ou
arrendamento mercantil operacional depende da essência da transação e não da forma do contrato.
31
32
33
Nessa deliberação, o TCU também estabeleceu outras orientações que devem ser observadas pela
Administração Pública Federal para contratação de operações built to suit. Em breve síntese, podem
ser retiradas da proposta de deliberação e do voto revisor que deram origem ao referido decisum as
seguintes principais conclusões e orientações:
a) a operação de built to suit trata-se de contrato de prestação de serviço, tendo como objeto principal
a locação de um imóvel cuja construção, ou reforma substancial, é parte acessória do referido ajuste;
b) o órgão/entidade deve demonstrar claramente que as necessidades de instalação e de localização
condicionam a escolha de determinado imóvel e que o preço da locação se mostra compatível com o
valor de mercado, segundo avaliação prévia, bem assim que a junção do serviço de locação com a
eventual execução indireta de obra não ofende o princípio do parcelamento do objeto; e
c) a fundamentação da decisão pela locação sob medida deve ser baseada em estudos técnicos,
pareceres e documentos comprobatórios que justifiquem tal opção contratual, incluindo a necessidade
de se demonstrar que, comprovada a impossibilidade de suprir a demanda por outras formas, a
utilização da locação sob encomenda mostra-se inequivocamente mais favorável economicamente do
que a realização de reforma ou adequação em imóvel alugado sob a forma convencional.’
59. É possível, entretanto, que o imóvel especificado já seja de propriedade do futuro
ocupante – nesse caso, o empreendedor deve adquirir o imóvel do futuro ocupante para, ao final das
obras necessárias, alugar-lhe por determinado período. É ainda factível também que, em vez de
adquirir o imóvel especificado de propriedade do futuro ocupante, o empreendedor adquira direito de
superfície sobre o referido imóvel, para, posteriormente, realizar o empreendimento e ceder o uso da
posse ao futuro ocupante [BENEMOND, F. H. Contratos built to suit. Coimbra: Almeidina, 2013, p.
59].
60. Sobre o direito de superfície, trata-se de direito real imobiliário que consiste na concessão
a um terceiro, chamado superficiário, da propriedade de plantações ou construções feitas por este
sobre ou sob o solo alheio, podendo ser pactuado por prazo certo ou indeterminado. Assim, ainda que
o terreno continue propriedade de seu dono original, o superficiário exerce direito de proprietário
sobre a obra por ele erguida.
61. Nesse caso, quando o contraente pertence à Administração Pública, a reversão do bem
imóvel ao final do prazo do contrato deverá ser clausula obrigatória do instrumento contratual,
devido à inalienabilidade do bem público de uso especial (art. 99, inciso II, do Código Civil). Tendo
ocorrido a cessão do direito de superfície ao empreendedor locatário, portanto, a reversão celebrada
por ente do setor público deixa de ser uma simples possibilidade (prevista em abstrato no art. 47-A da
Lei 12.462/2011), e passa a ser obrigatória [CRISTOVAM, J. S. da S. e BERTONCINI, E. J. Contrato
Built to Suit na Administração Pública: um novo modelo de contratação administrativa. Curitiba:
Juruá, 2018, p. 84].
62. Em posicionamentos anteriores (Acórdãos 1.301/2013–TCU–Plenário e 2.219/2018–
TCU–Plenário), o Tribunal se centrou na possibilidade de dispensa de licitação na celebração de
built to suit, não tendo abordado a compatibilidade desse instrumento contratual – quando o imóvel
adequado já for propriedade da administração pública – com o ordenamento jurídico. Referida
celebração é entendida como uma simples variante – em relação ao modelo built to suit importado da
prática empresarial norte-americana e positivado na Lei do inquilinato – na qual não poderia ocorrer
a dispensa de licitação, uma vez que a concorrência, nesse caso, seria sempre possível.
63. Entretanto, a razão pela qual a concorrência sempre se afigura como possível nesses
casos é porque, o componente “locação” resta completamente diminuído frente às prestações de
empreitada. A obrigatoriedade de reversão ao final do contrato faz com que o contrato seja
predominantemente a prestação de um serviço de empreitada – fundeado de modo diverso do habitual
– a menos que, da mesma forma que em uma Parceria Público-Privada (PPP) modalidade concessão
34
administrativa, estejam sendo licitados conjuntamente serviços tais como de manutenção, segurança e
administração predial.
64. Lembre-se que, caso a Fiocruz venha a denunciar o contrato, estará obrigada, da mesma
forma, a pagar o valor da soma dos valores dos aluguéis que ainda deveriam ser pagos até o termo
final da locação (“multa compensatória”), conforme previsto no art. 54-A da Lei do Inquilinato. Para
elevar ainda mais a equivalência entre a presente modelagem e o simples pagamento parcelado de
serviços de empreitada, o pagamento dessa referida multa compensatória será igualmente parcelado
em um prazo correspondente ao período remanescente até o final do prazo de vigência do contrato
(clausula vigésima terceira da minuta contratual).
65. Não fica clara, em nenhum momento, a distinção de conteúdo contratual entre a aquisição
financiada de bens e de serviços de empreitada e o contrato ora a ser celebrado. A própria
necessidade de se recorrer ao artifício de se ceder o terreno público ao locatário – para que este
possa cobrar aluguéis do proprietário original – já é forte indício da artificialidade do mecanismo, o
que o distancia da concepção tradicional plasmada no caput do art. 54-A da Lei do Inquilinato, a qual
previa apenas a locação de imóvel precedida da aquisição, construção ou substancial reforma.
66. Na locação built to suit, a contraprestação paga pelo contraente deverá não apenas
remunerar o uso do bem, mas também permitir a amortização, ainda que parcial, dos investimentos
feitos pelo proprietário do imóvel. Isso porque, após o prazo contratual, ainda restaria a possibilidade
de o imóvel vir a ser destinado a outra finalidade pelo locador empreendedor. Mesmo que se
reconheçam as dificuldades na concretização dessa possibilidade, devido às especificações da
construção ou da reforma substancial, ela simplesmente deixa de existir com a reversão obrigatória
do bem ao proprietário original.
67. A realização de built to suit em terreno da própria administração, por outro lado, faz com
que o ente público passe a remunerar o contratado pelo uso de um bem público a ele cedido, e precise
pagar a amortização total dos investimentos feitos pelo cessionário locador.
68. Uma das vantagens do built to suit para o contratante é a de deixar de investir grande
soma na eventual compra, construção ou reforma substancial de um imóvel que, após decorrido o
prazo contratual, pode não atender mais às suas necessidades. Nesse caso, bastaria ao contratante
não renovar o contrato após o decurso do prazo estabelecido – não havendo o que se falar nessa
possibilidade quando o imóvel já era de propriedade do ente público e estabelece-se a reversão
obrigatória.
69. O caráter de operação de crédito do contrato built to suit é derivado do fato de que o
locatário não imobiliza os seus recursos financeiros, nem para a aquisição do terreno (quando não já
é o proprietário), nem para a construção de suas instalações, o que permite direcioná-los para sua
atividade principal.
70. É por tal motivo que contrata uma locação por longo prazo, assumindo o compromisso
financeiro, nos dizeres do art. 29, inciso III, da LRF, de pagar as prestações durante todo esse
período, pagamento que servirá tanto para amortizar os custos da construção e remunerar os
recursos financeiros do contratante empreendedor.
71. O built to suit, portanto, realiza a diluição temporal do valor devido ao empreendedor, a
título de remuneração, ao longo do contrato, iniciando-se a partir do uso e fruição do imóvel por
parte do locatário. A entidade pública, portanto, substitui um gasto público atual (ou, mais
precisamente, a ser realizado durante o prazo de construção da obra desejada – cinco anos) por um
gasto público futuro, diluído no prazo contratual – quinze anos após estes cinco anos.
72. Nos termos do Manual de Demonstrativos Fiscais (9ª edição), em regra, as operações de
crédito possuem pelo menos uma das seguintes características:
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36
administrativa, seja um efetivo serviço – e não, essencialmente, obra pública – justifica seu custeio
com despesas correntes, não de capital.
81. Cite-se a Proposta de Deliberação do Acórdão 1.301/2013–TCU–Plenário, segundo a
qual:
‘Para justificar a estruturação dessa operação no setor público, os motivos informados pelos gestores
públicos situam-se, em essência, na inexistência ou no contingenciamento de dotação orçamentária
para aquisição plena de terreno e construção completa de imóveis, no alto custo das reformas
realizadas em imóveis alugados pela administração pública junto ao setor privado sem devolução
posterior pelo locador dos valores não amortizados e na falta, junto ao mercado imobiliário, de
edificações que atendam às necessidades de estruturação operacional dos órgãos, de forma a melhor
prestarem os serviços públicos. [...]
A contratação ‘built-to-suit’, desenvolvido em caráter experimental na Justiça Federal – Seção
Judiciária do Paraná, foi concebida para implementar a nova política contornando a ausência de
orçamento para construção (investimento) e edificando um imóvel adequado para sediar a Subseção
de Campo Mourão utilizando-se do orçamento destinado ao aluguel de imóveis (despesa corrente).’
82. A inexistência ou contingenciamento de dotações orçamentárias para investimentos não
são fruto do acaso, nem a elaboração da proposta orçamentária e sua aprovação pelos representantes
da população são meras formalidades colocadas por alguém que deseje dificultar os trabalhos do
gestor público. São a melhor forma possível, em um regime democrático, de refletir: i) a ordenação de
preferências e prioridades dessa população; ii) a compatibilidade dessas prioridades com os recursos,
atuais ou futuros, que ela mesmo está disposta a gastar na concretização dessas demandas.
83. Essa compatibilidade, naturalmente, é fortemente influenciada pela atividade econômica,
que determina a possibilidade de arrecadação de receitas públicas, além da própria disposição da
sociedade em alocar seus recursos em gastos governamentais. Todas essas informações devem ser
produzidas de forma transparente, de modo a garantir a responsividade (accountability) dos gestores
públicos perante seus representados.
84. Assim, a eventual inexistência ou contingenciamento de dotações orçamentárias para
investimentos decorre ou da definição de prioridades materializada na Lei Orçamentária Anual, ou de
contingências econômicas, não sendo simples obstáculos a serem driblados de forma artificial, por
mais meritórias que sejam as finalidades buscadas pelo gestor público.
85. Não se busca, entretanto, proibir a operação ou a inovação na gestão pública, mas
simplesmente compatibilizar as referidas inovações com a manutenção da confiabilidade das
demonstrações contábeis do ente administrativo e com os outros valores buscados pelas normas
fiscais, tais como a sustentabilidade e a transparência das finanças públicas.
86. Desse modo, não se procura afastar a possibilidade de a Administração Pública efetuar
locação sob demanda – built to suit junto a particulares, ainda que a construção ou reforma ocorram
em imóvel ou edificação de propriedade pública, com reversão obrigatória do produto do contrato ao
patrimônio público ao final do período de “locação”. Todavia, nessa hipótese, ocorre a celebração de
verdadeira operação de crédito equiparada à aquisição financiada de bens, exigindo-se a observância
de toda a normatização orçamentária e financeira relativa ao tema.
III.2. Das condições legais a serem atendidas pela Fiocruz antes da conclusão da contratação e se o
eventual descumprimento desses requisitos é fator impeditivo para a continuidade do certame
licitatório e/ou da assinatura do contrato
87. No Relatório de Auditoria (peça 276), verificou-se que o desembolso financeiro por parte
da Administração Pública somente será iniciado após três anos de início da obra (pagamento de 60%
do aluguel por dois anos) e terá duração de quinze anos (com pagamento integral do aluguel). Desse
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modo, o instrumento orçamentário plurianual existente não seria capaz de abranger o período total de
desembolso do projeto (vinte anos) e registrar o valor total do investimento.
88. Como consequência, aventou-se a possibilidade de celebração de um contrato cujo valor
global pode alcançar R$ 7,3 bilhões sem nenhum tipo de autorização orçamentária e legislativa
previamente à licitação, não tendo sido possível também verificar o cumprimento de outras regras
orçamentárias e fiscais dispostas na Lei 4.320/1964, na Lei de Responsabilidade Fiscal e na
Constituição Federal.
89. Nos termos do art. 3º da Lei 4.320/1964, a Lei de Orçamentos compreenderá todas as
receitas, inclusive as de operações de crédito autorizadas em lei. A Constituição também vedou a
realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas que excedam os créditos orçamentários
ou adicionais (art. 167, inciso II, da CF/1988).
90. Dessa forma, a União deve consignar a referida operação, de alguma forma, no
orçamento – notando-se que a contratação de operação de crédito constitui fato contábil distinto de
sua efetiva realização.
91. No caso de uma aquisição financiada de bens, de acordo com o MCASP, no momento da
contratação da operação de crédito, haveria apenas o registro do compromisso assumido com o
contratado. [BRASIL, STN. Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público. 8ª ed., Brasília,
2018, p. 314].
92. Já o registro da despesa orçamentária (despesa de capital – investimento) ocorreria no
momento da aquisição propriamente dita, i.e., no recebimento do NCPFI de Bio-Manguinhos. A
operação deve ser considerada como efetivada apenas no momento do recebimento do bem adquirido
– usualmente, em arrendamentos mercantis e aquisição financiada de bens, esse recebimento ocorre
logo após a contratação da operação, no mesmo exercício.
93. No presente caso concreto, ele ocorrerá apenas quando a NCPFI de Bio-Manguinhos
houver sido recebida. Portanto, também deve ser nesse momento que se registrará a receita
orçamentária (receita de capital – operação de crédito), ainda que não haja ingresso efetivo de
recurso financeiro nos cofres públicos.
94. Já o registro de despesa orçamentária com amortizações e com encargos do
financiamento (mesmo que estes tenham sido impropriamente chamados de “aluguéis”) deve ocorrer
no momento do pagamento das parcelas – ou seja, inclusive durante o período de “carência”, no qual
a Fiocruz pagará apenas uma parte da prestação total (60%).
95. Quanto à inclusão do investimento na Lei 13.971/2019 (Plano Plurianual 2020–2023),
uma vez que a despesa de investimento será considerada materializada em um único exercício – o de
recebimento do NCPFI – não há a incidência do art. 167, § 1º da CF/1988 e do art. 5º, § 5º, da LRF.
96. Além disso, como condição prévia à efetiva realização da operação de crédito
(recebimento do NCPFI), deverá haver a verificação, por parte do Ministério da Economia, dos
limites e condições exigíveis, nos termos do art. 32 da Lei de Responsabilidade Fiscal:
‘Art. 32. O Ministério da Fazenda verificará o cumprimento dos limites e condições relativos à
realização de operações de crédito de cada ente da Federação, inclusive das empresas por eles
controladas, direta ou indiretamente.
§ 1º O ente interessado formalizará seu pleito fundamentando-o em parecer de seus órgãos técnicos e
jurídicos, demonstrando a relação custo-benefício, o interesse econômico e social da operação e o
atendimento das seguintes condições:
I - existência de prévia e expressa autorização para a contratação, no texto da lei orçamentária, em
créditos adicionais ou lei específica;
38
39
103. Nesse sentido, incidiria também o art. 33, § 1º, da LRF, segundo o qual a operação
realizada com infração do disposto na referida Lei será considerada nula, procedendo-se ao seu
cancelamento, mediante a devolução do principal, vedados o pagamento de juros e demais encargos
financeiros.
104. Uma vez que não terá ocorrido a entrada de recursos financeiros da contratada nos cofres
da Fiocruz, a aplicação do referido dispositivo não é imediata, como no caso de uma operação de
mútuo bancário declarada irregular. A anulação da operação após sua efetiva realização envolveria,
na medida do possível, o retorno ao estado anterior à contratação, envolvendo i) o fim da cessão do
terreno especificado; ii) o pagamento à contratada apenas das quantias relativas aos custos de
construção do NCPFI, mas não dos relacionados aos aluguéis – correspondentes, na modelagem
apresentada, à remuneração do capital investido pelo empreendedor imobiliário; e iii) a aplicação
das penalidades legais aos gestores responsáveis (e.g. art. 359-A do Código Penal).
105. Quando da inclusão da operação de crédito no orçamento (no exercício de sua realização
efetiva), é que deverão ser verificados o atendimento à Regra de Ouro do art. 167, inciso III, da
CF/1988 e aos limites da RSF 48/2007, a qual dispõe sobre os limites globais para as operações de
crédito interno e externo da União, de suas autarquias, e demais entidades controladas pelo Poder
Público federal, além de estabelecer limites e condições para a concessão de garantia da União em
operações de crédito externo e interno.
106. Esses limites deverão ser verificados no momento da efetiva realização da operação de
crédito – o recebimento do NCPFI pela Fiocruz – sendo sua observância condição necessária para o
início da etapa de operação e para o início dos pagamentos ao empreendedor locador contratado.
107. Quanto ao atendimento ao Teto de Gastos e às metas fiscais, reitera-se que – embora as
prestações mensais sejam compostas por parcelas referentes à reversão do imóvel para a fundação e
parcelas denominadas de “aluguéis”, esses últimos, no caso concreto, são remuneração não do uso
do NCPFI, mas do uso do capital do contratado investidor – em última análise, juros.
108. Ocorre que, quando da apuração oficial dos resultados fiscais pelos órgãos competentes,
poderá haver classificações distintas quanto ao efeito fiscal dessas transações, tendo em vista que a
Secretaria do Tesouro Nacional – STN, nos termos do Decreto 9.745/2019, Anexo I, arts. 49, inciso
XXV, e 52, inciso IX, utiliza a metodologia “acima da linha”, que considera os fluxos de receitas e
despesas, ao passo que o Banco Central do Brasil – Bacen, nos termos do art. 11, inciso IV, da Lei
14.116/2020 – Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) da União para 2021, c/c a Mensagem
Presidencial de encaminhamento do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) da União para 2021
(Projeto de Lei PLN 28/2020), adota a metodologia “abaixo da linha”, que considera as variações do
endividamento líquido. Nesse sentido, as eventuais discrepâncias decorrentes dessas formas distintas
de apuração deverão ser acompanhadas oportunamente por este Tribunal à luz do disposto no art. 3-
A, § 2º, alíneas “b”, “h” e “j”, da Resolução-TCU 142/2001.
109. Desse modo, o pagamento do contrato é realizado mediante despesas financeiras, não
primárias. Os impactos no Teto de Gastos e nos resultados fiscais serão verificados no exercício de
materialização da operação de crédito, quando do recebimento do NCPFI pela Fiocruz, quando
deverá ser registrada a despesa de capital – investimento.
IV. CONCLUSÃO
110. A LRF optou por conceituar a expressão “operações de crédito” de forma ampla e
exemplificativa, utilizando-se do recurso a “outras operações assemelhadas” para estender a
aplicação do instituto. Nesse sentido, o conceito de operação de crédito foi estabelecido de modo a
nem sempre envolver a entrada de recursos obtidos junto a uma instituição financeira. Citam-se, à
guisa de exemplo, os casos de assunção, reconhecimento ou confissão de dívidas – e de aquisição de
bens financiada pelo próprio vendedor ou fabricante.
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111. Para o setor público, também se conceitua aquisição financiada de bens em sentido
amplo, como a espécie de operação de crédito contratual em que não há ingresso efetivo de recursos
financeiros nos cofres da entidade, como, por exemplo, a aquisição financiada diretamente com o
fornecedor do bem. Pode, portanto, abranger também a prestação de serviços, dentre os quais os de
empreitada – contrato no qual uma das partes, mediante remuneração a ser paga pelo outro
contraente, obriga-se a realizar determinada obra, de acordo com as instruções deste e sem relação
de subordinação.
112. Da forma como a presente operação está estruturada, ela apresenta os elementos típicos
da empreitada: i) um resultado, o Novo Centro de Processamento Final de Imunobiológicos de Bio-
Manguinhos – RJ, a ser definitivamente incorporado ao patrimônio da fundação pública após
determinado prazo; ii) o consentimento, a ser expresso mediante a assinatura de contrato
administrativo atípico; e iii) o preço, a ser pago durante intervalo de tempo e condições previamente
acertadas.
113. O caráter de operação de crédito do contrato built to suit é derivado do fato de que o
empresário locatário não imobiliza os seus recursos financeiros, nem para a aquisição do terreno
(quando não já é o proprietário), nem para a construção de suas instalações, o que permite direcioná-
los para sua atividade principal. É por tal motivo que contrata uma locação por longo prazo,
assumindo o compromisso financeiro, nos dizeres do art. 29, inciso III, da LRF, de pagar as
prestações durante todo esse período, pagamento que servirá tanto para amortizar os custos da
construção e remunerar os recursos financeiros do contratante empreendedor.
114. As locações sob encomenda – built to suit, portanto, realizam a diluição temporal do valor
devido ao empreendedor, a título de remuneração, ao longo do contrato, iniciando-se a partir do uso
e fruição do imóvel por parte do locatário. Tal característica é inerente a todas as contratações na
referida modalidade, mas é especialmente constatada nos casos em que há a reversão obrigatória do
objeto adquirido, construído ou reformado substancialmente ao patrimônio do ente público, nos
termos do art. 47-A, § 2º, da Lei 12.462/2011.
115. Embora a operação de crédito seja materializada no momento do recebimento do NCPFI
de Bio-Manguinhos, ela deve ser considerada como contratada no momento da celebração do
contrato de built to suit com o vencedor da licitação. É nesse momento que já se faz necessária a
existência de prévia e expressa autorização para a contratação, esteja ela presente no texto da lei
orçamentária do exercício, em créditos adicionais ou em lei específica. Portanto, embora eventual
ausência de autorização legislativa expressa não impeça a realização da licitação, ela deverá impedir
a assinatura do contrato.
116. Por outro lado, para a validade do recebimento do NCPFI pela Fiocruz (efetiva
realização da receita de operação de crédito e ato de geração das despesas) e início da operação do
complexo serão exigíveis: a) a estimativa do impacto orçamentário e financeiro; b) a declaração do
ordenador de despesa de adequação orçamentária e financeira; c) a inclusão no orçamento ou em
créditos adicionais dos recursos provenientes da operação com entrada no exercício a que se refere o
orçamento; e d) verificação dos limites e condições relativos à operação de crédito pela Secretaria do
Tesouro Nacional.
117. Além disso, quando da inclusão da operação de crédito no orçamento (no exercício de sua
realização efetiva), deverá ser verificado o atendimento à Regra de Ouro do art. 167, inciso III da
CF/1988 e aos limites da Resolução do Senado Federal 48/2007, a qual dispõe sobre os limites
globais para as operações de crédito interno e externo da União, de suas autarquias, e demais
entidades controladas pelo Poder Público federal, além de estabelecer limites e condições para a
concessão de garantia da União em operações de crédito externo e interno.
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2. A nova revisão do Capex avaliada neste parecer foi encaminhada via e-mail pela Fiocruz
(peça 343) e todas as planilhas e documentos que a integram encontram-se como itens não
digitalizados junto a peça 343.
II. EXAME TÉCNICO
3. O projeto do NCPFI consiste no desenvolvimento, construção e implantação de novas
instalações industriais para as atividades de processamento final (formulação, envase, liofilização,
recravação, revisão, rotulagem e embalagem), controle e garantia da qualidade, armazenagem de
matérias primas e de produtos acabados, construção de áreas de suporte técnico e administrativo e a
urbanização do novo Campus de Santa Cruz.
4. Cabe pontuar que o empreendimento se reveste de particularidades derivadas de sua
natureza. Sendo assim, na análise orçamentária, a representatividade dos itens provenientes de
sistemas oficiais de referência de preço é baixa nos itens integrantes das faixas A e B da Curva ABC
elaborada pela jurisdicionada (peça 338, p.48).
5. Sendo assim, dada a alta materialidade dos itens provenientes de pesquisa de preços,
promoveu-se, de forma adaptativa, a análise do Capex apresentado com o intuito de avaliar se as
informações disponíveis são completas e suficientes para que o orçamento seja considerado auditável.
II.1. Faixa A da curva ABC
6. A faixa A da curva ABC é composta de seis itens que somados totalizam materialidade
superior a R$ 1,5 bilhão de reais.
Figura 1
7. Todos os itens integrantes da faixa A da curva ABC são provenientes de pesquisa de preço
II.1.1. Estrutura Metálica
8. O item “2.4 Estrutura Metálica” representa de acordo com a curva ABC produzida pelo
próprio jurisdicionado mais de 17% do montante financeiro da obra e é obtido via pesquisa de preço.
9. Na memória de cálculo dos itens (planilha: “MEMO.CALC.ESTRUTURA.METÁLICA”,
pasta: “CAPEX-Memo_Calc_R6R.xlsx”) consta a informação que o item foi orçado com cinco
empresas, porém as respectivas cotações de preço não constam dos arquivos entregues.
10. Cabe pontuar que, de acordo com a própria jurisdicionada em nota de esclarecimento
(RL-3-500-Z-00904-R6R - CRITÉRIOS DE CORREÇÃO E ATUALIZAÇÃO DO CAPEX PO-3-500-Z-
00904-R6E, peça 338, p.3-6), foram obtidos preços atualizados dos principais itens integrantes da
curva ABC. Porém, na lista apresentada no documento supracitado não se encontra o item “Estrutura
Metálica”, bem como não há as cotações na documentação entregue, o que sinaliza que a atualização
de preços do item pode ter sido realizada via índice. De acordo com o documento, para os itens que
não tiveram a proposta de preço atualizada, o valor foi corrigido via índice a partir dos valores
cotados em 2015.
11. Conforme apontado na auditoria, é esperado que o item de maior materialidade possua
seu preço o mais próximo da realidade possível, sendo importante que a sua atualização via índice
43
seja executada apenas para horizontes de tempo menores, para se enquadrar em data-base geral do
orçamento.
Quantitativos e Unidades
12. Observou-se que os quantitativos apresentados na curva ABC (figura 1) para o item
“Estrutura Metálica” eram inferiores os constantes da memória de cálculo, pois deixou de contemplar
o item “Estrutura Metálica” do item 3.3 da planilha (“3-PLAN.CIVIL - ÁREA EXTERNA”) da pasta
principal (PO-3-500Z-00904-R6R.xlsx).
13. Logo, apenas após a agregação desses dois quantitativos é que se chega ao quantitativo
apresentado na memória de cálculo e o item salta de R$ 506 milhões para R$ 510 milhões de valor
total.
14. Outro ponto dissonante é que na totalização dos itens na planilha de memória de cálculo
(planilha: “MEMO.CALC.ESTRUTURA.METÁLICA”, pasta: “CAPEX-Memo_Calc_R6R.xlsx”,
Figura 2) consta o item “Conectores Stud Bolt (Ø 3/4")” que tem como unidade de medida
“quantidade (Qt)”, porém, foi incorporado ao serviço na planilha geral (planilha: “2-PLAN.CIVIL-
EDIFICAÇÕES”, pasta: “PO-3-500Z-00904-R6R.xlsx”, Figura 3) o item “2.4 – Estrutura Metálica”
conta apenas com a unidade de medida quilogramas (kg).
Figura 2
Figura 3
15. Ainda, percebe-se que o item tratado como Estrutura Metálica contempla, além dos "stud
bolts", proteção, pintura, transporte vertical/horizontal e demais serviços necessários a execução
conforme especificações técnicas e projetos, porém a unidade de medida é uma só “kg”. Logo, se
depreende da observação que os itens supra sofreram uma transformação para serem expressos em
“kg” na orçamentação. No entanto, não há memória de cálculo que detalhe esse procedimento.
16. Por tudo dito entende-se que o item de maior materialidade no orçamento padece de
fragilidades no processo de orçamentação, como falta de cotação atualizada, inconsistência no
somatório dos quantitativos, bem como transformação de unidades de medidas sem a devida memória
de cálculo. Tais fragilidades aumenta assim o risco de obtenção de preços inadequados, bem como
prejudicam a auditabilidade do orçamento.
II.1.2. HVAC
17. O Heating, Ventilating and Air Conditioning (Hvac), em português, é traduzido para
“Aquecimento, Ventilação e Ar-Condicionado”, é o sistema de climatização utilizada no complexo.
18. Na curva ABC elaborada pelo jurisdicionado o item ocupa a segunda posição em termos
de materialidade, representando quase 10% do custo total da obra.
19. Pelas exigências de ambientes com criticidade de assepsia, o Hvac utilizado no NCPFI é
de elevada especificidade. Sendo assim, houve a impossibilidade de utilização de preço de sistemas de
climatização oriundos de sistemas oficiais de referência de preço. Tal justificativa já havia sido
44
recepcionada por essa unidade técnica que entendeu válida a pesquisa de preço para cotação do item
em comento.
20. Porém, em análise do presente Capex (versão R6R), na planilha de memória de cálculo do
Hvac, consta apenas a proposta de uma única fornecedora: Heating Cooling.
21. Por certo que o item se reveste de uma especificidade derivada das exigências inerentes ao
complexo, porém, é de se esperar que em uma busca por fornecedores em âmbito mundial, seja
possível encontrar mais de um fornecedor apto a atender as especificidades demandadas.
22. E, a despeito desse Tribunal, em circunstâncias excepcionais, aceitar a utilização em
orçamentação de obras públicas de itens não integrantes de sistemas oficiais de referência de preço,
nos termos do Decreto 7.983, de 8 de abril de 2013, há o entendimento de que tais pesquisas de preço
devem seguir um mínimo de exigência procedimental.
23. Assim, no caso de não ser possível obter preços referenciais nos sistemas oficiais para a
estimativa de custos, deve ser realizada pesquisa de preços contendo o mínimo de três cotações de
empresas/fornecedores distintos, fazendo constar do respectivo processo a documentação
comprobatória pertinente aos levantamentos e estudos que fundamentaram o preço estimado. Caso
não seja possível obter esse número de cotações, deve ser elaborada justificativa circunstanciada. O
entendimento narrado tem amparo nos Acórdão 2.531/2011-TCU-Plenário e Acórdão 1.266/2011 -
TCU-Plenário.
24. No item em análise não foi apresentada a justificativa para a cotação com um único
fornecedor. E é esperado, como já dito, que em um cenário de oferta mundial exista mais de um
fornecedor para o item cotado.
II.1.3. Instalação Elétrica Industrial (SE-PRINC. / SE's-SEC. / GERADORES)
25. O item “7.1 Instalação Elétrica Industrial” é o terceiro item da curva ABC com um custo
de mais de R$ 245 milhões e representa 8% do custo total da obra.
26. O item é um agrupamento de três itens da planilha “7-PLAN.INSTAL.INDUST.” que
integra a pasta “PO-3-500Z-00904-R6R”.
Figura 4
27. A presente análise identificou que também não foram realizadas três cotações de preço
para o item de maior relevância dentre os agrupados: “Subestações Secundarias” que representa
mais de 70% dos valores agrupados.
28. Nas memórias de cálculo do item selecionado (planilhas:
“MEMO_CALC_SE_SECUNDÁRIAS-I” e “MEMO.CALC.SE-SECUNDÁRIAS-II” da pasta:
“CAPEX-Memo_Calc_R6R.xlsx”) consta a pesquisa de preço em duas empresas, porém deixa a
entender que devido a acréscimo e exclusão de itens, apenas a proposta da empresa Weg
Equipamentos Elétricos SA foi considerada. Esse entendimento ganha força, pois apenas a proposta
dessa empresa consta na documentação apresentada.
29. Mesmo que a proposta da empresa Orteng fosse considerada, ainda não seria atingido o
número recomendado de pelo menos três cotações.
Figura 5
45
46
38. Novamente a jurisdicionada apresentou apenas uma cotação de preço, executada junto a
empresa Atec Sterile Technology, porém, para o presente item, apesar de não formalizar a
justificativa, a jurisdicionada alegou durante a auditoria que a empresa que instalaria os
equipamentos deveria ser a Atec por questões de garantia. Tal justificativa se mostra razoável.
39. Porém, nota-se que o item ora tratado abarca todas as atividades necessárias para a
retirada dos equipamentos dos galpões até sua completa instalação na fábrica. Em análise do
detalhamento do preço para a orçamentação do item, percebe-se a aplicação integral dos BDIs
(material (16,60%) e mão de obra (22,98%) na composição de preço do item. Do cálculo do BDI
efetivo obtém-se um BDI de 21,43%.
Figura 6
40. Percebe-se que a vencedora do certame deverá contratar a empresa Atec, sem opção de
execução direta do serviço, e reitera-se que o item em análise envolve desde o transporte até a
completa instalação na fábrica. Neste caso, entende-se que é aplicável, por analogia, a ideia de um
BDI reduzido, na medida em que a participação da empresa executora da obra, na realização desses
serviços é reduzida.
41. Então apenas com o intuito de avaliação de impacto, uma vez que o BDI efetivo da obra
completa está abaixo do 1º quartil do quadro proposto no Acórdão 2.622/2013-TCU-Plenário,
projetou-se a utilização do 1º quartil do BDI para itens de mero fornecimento de materiais e
equipamentos: 11,10%.
Figura 7
47
44. A presente análise focou no item “4.2.1 Divisórias Padrão GMP” que representa mais de
90% do custo total do item.
45. Novamente cabe pontuar que a jurisdicionada informa que procedeu a atualização da
cotação de preço em maio de 2020 para os materiais GMP (peça 338, p. 7), mas nas memórias de
cálculo apresentadas não constam as cotações junto às empresas.
46. Ainda na memória de cálculo consta apenas o detalhamento de uma única empresa (AES
Clean Technology), o que, caso confirmado, fere o entendimento desse Tribunal quanto à necessidade
de pelo menos três cotações para obtenção do preço orçado.
II.2. Faixa B da curva ABC
47. A faixa B da curva ABC é composta de doze itens e tem uma materialidade de
aproximadamente R$ 900 milhões de reais.
Figura 9
48. Dada a quantidade de itens e o tempo exíguo para análise, para a faixa B foi promovido
um levantamento de questionamentos oriundos de constatações durante a análise de alguns itens
dessa faixa.
i. Qual a justificativa para a mão de obra (de instalação de divisórias e forro gmp) ser de
10% do valor do material (embora esteja escrito 16% na planilha “CAPEX-Memo_Calc_R6R”, na
aba “MEMO.CALC.MAT.GMP-II”)? Principalmente considerando que o produto está cotado em
dólar, vai ser paga mão de obra sobre imposto e transporte?
ii. Por que todo o material GMP está sendo importado? Não há fabricante nacional capaz de
atender à demanda?
iii. Há erros na planilha desmembrada. Item 9.6, que segundo a curva ABC (planilha:
“CURVA ABC_NIVEL2”, pasta: “Curva ABC_NCPFI_CAPEX R6R+SERV.COMP. R6R1aR6R9”)
teria “CENTRAIS PW / PS / WFI”, contém outra coisa. O item em questão está no 9.20 da planilha:
“9-PLAN.EQUIP.UTILIDADES” na pasta: “PO-3-500Z-00904-R6R.xlsx”.
iv. Como foram obtidos os preços das esquadrias (item 4.12)? Não foram encontradas as
fontes de referência. Material e mão de obra são divididos na proporção 80/20, sem justificativas para
tal procedimento.
v. Itens referenciados no Sinapi estão corretos de acordo com uma análise amostral de dez
itens.
vi. Não há correspondência perfeita entre a planilha “curva ABC” e a planilha “PO-3-500Z-
00904-R6R”, dificultando a avaliação. Exemplo: o primeiro item da parte B da curva é “6.3 –
instalação de combate a incêndio”. Na planilha PO-3-500Z-00904-R6R, o item está no 6.2.2. O item
7.3 da curva ABC, na verdade corresponde aos itens 7.5 e 7.6 do orçamento completo. Também não
está clara a forma de obtenção dos preços.
vii. O item “ponto de combate a incêndio tipo sprinkler c/ todos os insumos” está cotado a
quase R$ 4 mil por unidade (de sprinkler), totalizando quase R$ 100 milhões só de sprinkler e seus
48
53. Ainda, quanto ao BDI, em orçamentos que apresentam uma materialidade elevada de itens
de serviços provenientes de pesquisa de preço, cabe o cuidado de não duplicar o BDI, total ou
parcialmente pois, via de regra, os custos indiretos (como tributos, custos administrativos e lucro)
necessários à execução daqueles encargos contratuais já se encontram na proposta apresentada.
Logo, aplicar o BDI contratual sobre o valor da pesquisa pode redundar na sobreavaliação de preços
do serviço em comparação com os de mercado, principalmente se o serviço for executado diretamente
pela futura contratada (sem a subcontratação).
III. CONCLUSÃO
54. A presente instrução teve por objetivo avaliar se foram corrigidas as impropriedades
apontadas anteriormente no novo Capex (revisão R6R data-base set/20) para a construção do NCPFI
de Bio-Manguinho/Fiocruz.
55. Reitera-se que a análise ora proferida não teve o condão de determinar a adequabilidade
do preço final proposto para a obra, mas sim de avaliar a adequabilidade dos procedimentos
49
utilizados para a produção das planilhas orçamentárias que integram o Capex e se as informações
apresentadas permitem considerar orçamento auditável.
56. Cabe reconhecer que em análise comparativa com a versão do Capex (versão R6E)
verificada na instrução que avaliou os comentários dos gestores houve um aprimoramento das peças
com a busca de um maior detalhamento, apresentando memórias de cálculos e algumas CPUs.
57. Como já dito na supracitada instrução, o Capex (tanto na versão R6E como na versão
R6R) não apresenta mais a unidade de medida “RT” que designava rateio de valores. Tal unidade
não se revestia de qualidade, pois nem unidade pode ser considerada e inseria uma dificuldade no
dimensionamento e análise dos itens do orçamento por ela (“RT”) mensurados.
58. Também se reconhece que a jurisdicionada recepcionou em algumas medidas os
encaminhamentos proferidos nos Acórdãos 2.687/2018-TCU-Plenário e 2.008/2017-TCU-Plenário e
buscou uma maior representatividade dos itens integrantes da obra que continham referência em
sistemas oficiais de preço.
59. Do outro lado, ainda restam apontamentos que fragilizam o procedimento de
orçamentação e dificultam a análise como: atualização via índice de preços para horizontes acima de
3 anos para itens de alta materialidade (por exemplo, estrutura metálicas); BDI fragmentado em
materiais e mão de obra; e pesquisa de preço com menos de três cotações. Verifica-se ainda que a
falta de detalhamento de alguns serviços de grande relevância e a complexidade de apresentação dos
serviços em diferentes planilhas, com rateios em diferentes prédios dificultam a conciliação de valores
e a análise da adequabilidade do preço.”
É o relatório.
50
VOTO
“i. as locações sob encomenda – built to suit, ao realizarem a diluição temporal do valor
devido ao empreendedor ao longo do contrato, caracterizam-se como operações de crédito
nos termos do art. 29, inciso III, da Lei Complementar 101/2000. Tal característica é
especialmente verificada nos casos em que há a reversão obrigatória do objeto adquirido,
construído ou reformado substancialmente ao patrimônio do ente público, nos termos do
art. 47-A, § 2º, da Lei 12.462/2011;
ii. como condição para a assinatura do contrato, faz-se necessária a existência de prévia e
expressa autorização para a contratação da operação de crédito, esteja ela presente no
texto da lei orçamentária do exercício, em créditos adicionais ou em lei específica, nos
termos do art. 32, inciso I, da Lei Complementar 101/2000;
iii. a operação de crédito é definitivamente materializada no momento do recebimento do
objeto adquirido, construído ou reformado substancialmente pelo contratante. Como
condição para o referido aperfeiçoamento da operação e o recebimento do objeto da
locação sob encomenda, exigem-se, nos termos do art. 16, incisos I e II, e do art. 32, inciso
II, ambos da Lei Complementar 101/2000: a) a estimativa do impacto orçamentário e
financeiro; b) a declaração do ordenador de despesa de adequação orçamentária e
financeira; c) a inclusão no orçamento ou em créditos adicionais dos recursos
provenientes da operação; e d) verificação dos limites e condições relativos à operação de
crédito pela Secretaria do Tesouro Nacional;
iv. quando da inclusão da operação de crédito no orçamento (no exercício de sua
realização efetiva), bem como do recebimento do NCPFI pela Fiocruz (registro da
despesa primária com a incorporação do bem), deverá ser verificado o atendimento ao
Teto de Gastos da EC 95/2016, à Regra de Ouro do art. 167, inciso III, da CF/1988, às
metas fiscais de que trata a Lei Complementar 101/2000 e a Lei de Diretrizes
Orçamentárias e aos limites da Resolução do Senado Federal 48/2007.”
21. Estando os autos em meu gabinete, a Fiocruz/Bio-Manguinhos fez juntar os elementos
adicionais de defesa que passaram a constituir as peças 336 a 340. Ademais, a entidade encaminhou,
por meio eletrônico, link de acesso ao seu sistema interno, o que possibilitou o download das
planilhas orçamentárias do orçamento da obra, as quais, segundo ela, estariam de acordo com as
premissas do Acórdão 2.687/2018-Plenário.
22. Diante dos documentos novos apresentados e da urgência do exame da matéria, por conta
da proximidade da data de abertura das propostas do RDC Presencial 1/2021-BM, solicitei à minha
assessoria que procedesse a uma análise expedita dos elementos apresentados. Da mesma forma, fiz
retornar os autos à SeinfraUrbana para que examinasse a adequação das planilhas juntadas.
23. Nesse contexto, a unidade técnica acostou a análise e os documentos de suporte que
constituíram as peças 343 a 346.
24. Feito esse necessário resumo, passo a analisar os achados e as conclusões da unidade
técnica.
II - Falhas nos estudos de viabilidade técnica e econômico-financeira (EVTE)
25. Inicialmente, cabe destacar que o EVTE do empreendimento foi originalmente analisado
no TC 007.991/2017-7, tendo a equipe de auditoria concluído que o estudo apresentado não
comprovava a viabilidade econômico-financeira do empreendimento e demandava correções.
26. Em suma, a então Secex/RJ apontou as seguintes inconsistências:
a) indefinição quanto ao valor exato da obra e inexistência de créditos orçamentários
suficientes para custear o empreendimento em sua integralidade;
II.1. Análise
II.1.1 - Contextualização
44. Com relação às questões suscitadas no presente achado, registro, inicialmente, que a
Fiocruz é uma fundação dotada de personalidade jurídica de direito público, vinculada ao Ministério
da Saúde, que tem por finalidade desenvolver atividades nos campos da saúde, da educação e do
desenvolvimento científico e tecnológico.
45. A entidade iniciou suas atividades no início do século passado e sofreu diversas
transformações quanto a sua denominação, seu regime jurídico e suas finalidades, até assumir a
configuração atual. Dentre as diversas mudanças ocorridas em sua base jurídica, cabe ressaltar a
inclusão da competência de “elaborar e fabricar produtos biológicos, profiláticos e medicamentos
necessários às atividades do Ministério da Saúde, às necessidades do País, e as exigências da
Segurança Nacional”, conforme o Decreto 66.624, de 22 de maio de 1970.
46. Essa atribuição também consta do art. 1º, inciso VI, do Anexo I do Decreto 8.932, de 14 de
dezembro de 2016, que cuida do estatuto da Fiocruz. Conforme o dispositivo a entidade tem a
finalidade de “fabricar produtos biológicos, diagnósticos, profiláticos, prognósticos, medicamentos,
fármacos e outros produtos de interesse para a saúde”.
47. O exercício dessas atividades de forma direta pelo Estado tem respaldo no art. 200, inciso
I, da Constituição Federal de 1988, segundo o qual compete ao sistema único de saúde, dentre outros,
“controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde e participar
da produção de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos”
(grifos acrescidos).
48. Dentro da estrutura da Fiocruz, o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-
Manguinhos) é a unidade responsável pela “pesquisa, inovação, desenvolvimento tecnológico e pela
produção de vacinas, reativos e biofármacos voltados para atender prioritariamente às demandas da
saúde pública nacional” (fonte: <https://www.bio.fiocruz.br/index.php/br/home/quem-somos>.
Acesso em: 24/7/2021).
49. Conforme informações colhidas do site da entidade, Bio-Manguinhos tem atuação
destacada no cenário internacional, não só pela exportação do excedente de sua produção para mais de
70 países, através da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e do Unicef, como também pelo
fato de ter sido pré-qualificado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para o fornecimento da
vacina contra a febre amarela e, em 2008, da vacina meningocócica AC para agências das Nações
Unidas.
50. Sendo assim, embora a Fiocruz seja uma fundação pública ou uma autarquia fundacional,
ela está autorizada a exercer, e, na prática, exerce atividades de produção e fornecimento de bens, que,
por sua vez, podem ser consideradas como econômicas, já que geram excedente econômico a partir da
transformação de insumos.
51. Por evidente, esses eventuais ganhos não se revertem em lucros distribuídos entre sócios,
até porque estes nem sequer existem devido à natureza jurídica da entidade, sendo obrigatório o
reinvestimento dos excessos econômicos na própria atividade desenvolvida.
52. O art. 38 do Decreto 8.932/2016, em seus incisos II e III, elenca, dentre as receitas da
Fiocruz, as provenientes da exploração de seus bens e serviços e de operações técnicas e financeira,
assim como as originárias de convênios, acordos, ajustes e contratos.
53. A análise do balanço financeiro da entidade relativa ao ano de 2019 revela que parcela
significativa dos ingressos correspondeu a transferências financeiras recebidas (89%) (disponível em:
<http://www.dirad.fiocruz.br/files/BGU-Balan%C3%A7o%20Financeiro-Anual-Orgao36201.pdf>.
Acesso em: 22 de julho de 2021).
8
65. Com isso, a Fiotec poderá administrar os valores pertinentes à produção e ao fornecimento
de vacinas, sem ingresso na Conta Única do Tesouro Nacional, o que será importante para viabilizar
essa sui generis atividade econômica por parte da Fiocruz/Bio-Manguinhos.
66. Sendo assim, reputo superado o risco relacionado à exploração de atividade econômica
pela Fiocruz e à exportação de vacinas.
II.1.3 – Dos demais riscos
67. Tomando como base a modelagem econômica descrita no próximo capítulo, a produção do
NCPFI teria de ser capaz de gerar um excedente de produção mensal da ordem de R$ 46,655 milhões
mensais, durante um período de 15 anos, a fim de possibilitar o pagamento do aluguel e a plena
amortização dos investimentos para a construção do complexo.
68. Todavia, compreendo que a forte dependência das receitas relativas aos fornecimentos
decorrentes das PDPs em andamento e das exportações aos organismos internacionais é um
componente que dá uma grande dose de incerteza à projeção de receita do NCPFI, o que prejudica uma
análise segura de sua viabilidade econômica.
69. O trecho a seguir, extraído do relatório de fiscalização, descreve a situação encontrada:
“A análise das premissas do estudo de viabilidade de Bio-Manguinhos demonstra que há
uma grande incerteza em relação à efetiva produção dos biofármacos e vacinas da
carteira atual e da carteira esperada do Instituto, pois tem-se observado um atraso nos
processos de transferência de tecnologia de produtos para saúde e na construção dos
parques fabris. Além de cancelamentos de termos de execução descentralizada para
fornecimento de produtos de PDP e suspensões de PDP. A própria política de PDP não
oferece garantia ao laboratório público de aquisição de medicamentos durante a vigência
da parceria ou após a sua extinção ou de manutenção do preço de fornecimento constante
da proposta de PDP.”
70. A unidade técnica aduziu que foram estimadas receitas, inclusive no cenário pessimista, de
produtos com PDPs suspensas pelo Ministério da Saúde e de biofármacos que não constam da Relação
Nacional de Medicamentos Essenciais – condição prévia para aquisição do medicamento pelo
Ministério –, bem como foram consideradas receitas com vacinas que ainda estão em fase inicial de
execução do desenvolvimento do produto, não havendo tempo hábil para finalização e comercialização
no prazo estimado.
71. Considerando a análise empreendida pela SeinfraUrbana sobre a situação das PDPs dos
produtos designados no EVTE – das quatorze informadas, três estão na fase III (transferência de
tecnologia) e vigentes, tendo as demais sido suspensas –, é possível afirmar que a decisão de levar o
projeto à frente se baseou em projeções bastante otimistas quanto à demanda, o que confere um certo
grau de risco aos investimentos necessários à implantação do complexo industrial.
72. Em sua resposta à oitiva, Bio-Manguinhos/Fiocruz basicamente se apegou ao histórico de
crescimento e consolidação da instituição e à crença de que o Ministério da Saúde apoiará a operação
do NCPFI, devido à condição da entidade de parceira estratégica do órgão no Programa Nacional de
Imunizações (PNI).
73. Ademais, a autarquia fez menção a uma nota técnica do Ministério da Saúde que
confirmaria o interesse do órgão no projeto. O documento, assinado pelo então Ministro Eduardo
Pazuello, foi posteriormente juntado aos autos. Nele se reitera a importância estratégia da construção
do NCPFI já prolatada na Portaria nº 3.876/GM/MS, de 6/12/2018 (peças 326 e 327).
74. Conforme exposto no capítulo III.1.1, a produção e o fornecimento de vacinas e
biofármacos faz parte da missão do Ministério da Saúde, não sendo, de fato, razoável que o órgão
10
deixe de adotar as ações necessárias para aproveitar os investimentos que serão realizados na
construção de um moderno complexo industrial, ainda mais no contexto pós-pandemia da Covid-19.
75. Sendo assim, entendo que a viabilidade do NCPFI depende de condutas afetas à órbita de
decisão dos próprios atores envolvidos, in casu, o Ministério da Saúde e a Fiocruz/Bio-Manguinhos,
que, dentro de uma postura de colaboração construtiva e diálogo interinstitucional, devem e podem
atuar em conjunto para a viabilização de uma produção nacional de vacinas e biofármacos.
76. Dessa forma, não obstante as falhas no EVTE elencadas pela unidade técnica e a forte
dependência do sucesso do empreendimento das receitas relativas aos fornecimentos decorrentes das
PDPs em andamento e das exportações aos organismos internacionais, entendo que os riscos
identificados no EVTE quanto aos dados das receitas são superáveis pelo próprio Poder Público,
motivo pelo qual reputo elidida a irregularidade em análise.
77. Todavia, sob a perspectiva das despesas, compreendo que persiste a falha quanto à falta de
justificativa da escolha do modelo dos investimentos (BTS), uma vez que não houve avaliação de
outras alternativas para a satisfação da necessidade pública, como exigem os princípios da eficiência e
as boas práticas de gestão de projetos.
78. Por consequência, não há certeza se a opção escolhida por Bio-Manguinhos/Fiocruz será a
que proporcionará a melhor relação custo-benefício para o Poder Público, o que se revela grave,
considerando o volume dos investimentos requeridos e o próprio cenário de escassez de recursos
públicos, em um contexto de crise fiscal persistente no curto e médio prazo.
79. No caso, avalio que houve descumprimento de uma das condições estabelecidas por esta
Corte de Contas, em sede de consulta, para a contratação de locação sob demanda (BTS), a saber, a
capitulada no subitem 9.4.3 do Acórdão 1.301/2013-Plenário, in verbis:
“9.4.3. fundamentação da decisão pela locação sob medida baseada em estudos técnicos,
pareceres e documentos comprobatórios que justifiquem tal opção contratual, incluindo a
necessidade de se demonstrar que, comprovada a impossibilidade de suprir a demanda
por outras formas, a utilização da locação sob encomenda mostra-se inequivocamente
mais favorável economicamente do que a realização de reforma ou adequação em imóvel
alugado sob a forma convencional”.
80. Considerando a especificidade da contratação em exame, comparada com a que foi objeto
da consulta apreciada no referido decisum – construção em terreno da própria entidade pública e
reversão obrigatória do bem ao final do contrato, o que revela uma intenção de pactuar um contrato de
empreitada mediante o uso de recursos do próprio empreiteiro ou terceiro financiador –, seria
necessário incluir no estudo de alternativas outras formas de execução indireta de obra pública, quais
sejam a construção mediante recursos públicos (contrato de obra pública tradicional) ou PPP.
81. No primeiro caso, o argumento invocado por Bio-Manguinhos/Fiocruz para defender a
viabilidade econômica do empreendimento – o reconhecimento da importância estratégia da
construção do NCPFI por parte do Ministério da Saúde – poderia ter sido usado para viabilizar um
acréscimo no volume de créditos orçamentários no plano plurianual, a fim de permitir a construção da
obra com recursos públicos ou, pelo menos, com uma menor necessidade de investimentos privados.
82. Alternativamente, a entidade poderia ter analisado outras formas de financiamento da obra,
a exemplo da realização de operações de crédito, previamente autorizadas pelo Poder Legislativo,
junto a instituições do sistema financeiro nacional ou ao próprio BNDES, o que poderia acarretar
custos financeiros menores que o projetado na modelagem escolhida.
83. Não obstante a falta do estudo de alternativas, deixo de adotar qualquer medida no âmbito
dos controles objetivo e subjetivo, por entender que a opção pelo BTS em si pode ser considerada
razoável, diante das limitações orçamentárias e fiscais e da importância estratégica do NCPFI, e que os
11
gestores da entidade da atuaram premidos pela necessidade de atender a relevante objetivo de política
pública, ainda mais no contexto que sobressaiu após a pandemia do novo coronavírus.
84. Tais circunstâncias especiais permitem relevar as inconsistências verificadas no
procedimento de definição e justificação das escolhas para implantação do empreendimento, o que não
impede a adoção de eventuais medidas corretivas no futuro, caso sobrevenham fatos novos indicativos
da antieconomicidade da escolha dos gestores da Fiocruz/Bio-Manguinhos.
85. Dessa forma, reputo superadas as falhas nos estudos de viabilidade técnica e econômico-
financeira (EVTE), consubstanciadas no achado 3.1 do relatório preliminar de auditoria, com fulcro no
art. 22 da LINDB.
III - Preço de aluguel inadequado devido a falhas no orçamento da obra
86. Conforme já adiantado, a Fiocruz/Bio-Manguinhos optou pelo uso da modelagem built to
suit para a implantação do NCPFI.
87. Para tanto, ela se valeu do permissivo do inciso IX do art. 1º da Lei 12.462/2011, que
admitiu a utilização do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) para a celebração de
contratos BTS. Esse novo tipo de contrato administrativo foi expressamente previsto no art. 47-A da
Lei do RDC, incluído pela Lei 13.190/2015. Segue a redação do dispositivo:
“Art. 47-A. A administração pública poderá firmar contratos de locação de bens móveis e
imóveis, nos quais o locador realiza prévia aquisição, construção ou reforma substancial,
com ou sem aparelhamento de bens, por si mesmo ou por terceiros, do bem especificado
pela administração. (Incluído pela Lei nº 13.190, de 2015) (Vide Lei nº 14.133, de 2021)
§ 1º A contratação referida no caput sujeita-se à mesma disciplina de dispensa e
inexigibilidade de licitação aplicável às locações comuns. (Incluído pela Lei nº 13.190, de
2015)
§ 2º A contratação referida no caput poderá prever a reversão dos bens à administração
pública ao final da locação, desde que estabelecida no contrato. (Incluído pela Lei nº
13.190, de 2015)”
88. No presente caso, como o terreno era da própria Fiocruz, a entidade decidiu abrir licitação,
na modalidade RDC, para a contratação de investidor com vistas à construção de imóvel, pelo regime
BTS, contemplando a execução das obras de construção, a montagem dos equipamentos de produção
adquiridos pela instituição e o fornecimento de equipamentos de utilidades e materiais.
89. O plano de negócio foi elaborado sob a premissa de que a construção do NCPFI será
financiada por um Fundo de Investimento Imobiliário (FII).
90. O valor mensal a ser pago ao fundo é composto por uma parcela referente à reversão do
imóvel para a Fiocruz/Bio-Manguinhos e outra referente ao aluguel. De acordo com o plano de
negócios analisado à época da auditoria, a composição da parcela mensal foi distribuída da seguinte
forma, em valores referenciados a dezembro de 2018:
13
101. Dessa forma, a SeinfraUrbana concluiu que os itens 9.2.2, 9.2.3 e 9.3 do Acórdão
2.687/2018-Plenário, que tratam de reiteração das determinações efetuadas no Acórdão 2.008/2017-
Plenário, não haviam sido atendidos.
102. Segundo a unidade técnica, as inconsistências reportadas acima impossibilitaram a
verificação da adequabilidade do orçamento global da obra. Não obstante essas limitações, ela fez
procedeu a uma análise paramétrica da parcela das edificações que não se se revestem de
especificidades inerentes a plantas fabris farmacêuticas (13% do orçamento total) e apurou possível
sobrepreço no valor do BDI relativo aos serviços adicionais (instalação de equipamentos de produção e
outros).
103. Quanto ao primeiro aspecto, a SeinfraUrbana comparou o preço indicado no orçamento
com o valor referencial obtido a partir do uso do Custo Unitário Básico de Construção (CUB/m2),
tendo verificado um excesso de 170% naquele. Com relação aos serviços adicionais, ela apurou um
sobrepreço da ordem de 3% em razão da utilização de BDI superior ao preconizado no Acórdão
2.622/2013-Plenário para itens de mero fornecimento (16,10%).
104. Na resposta à oitiva, a Fiocruz/Manguinhos aduziu que somente “[...] com o auxílio de
composições de preço não originários do Sinapi, ou seja, de instituições de engenharia de custos
tradicionais do setor de construção civil e de pesquisas de mercado de preços referenciais junto a
fabricantes e fornecedores que atendem a este padrão de projeto industrial, é possível calcular o valor
estimado do CAPEX em questão”.
105. Quanto aos demais aspecto, buscou explicar o uso da unidade de medida “Rateio”,
rechaçou o uso do CUB como referência e, por fim, enviou o CAPEX atualizado (peça 306), a
modelagem financeira do empreendimento (peça 307) e a nota técnica da modelagem financeira
elaborada pela FGV (peça 308).
106. A unidade técnica analisou os argumentos apresentados e concluiu que eles não foram
aptos a elidir as irregularidades. Ademais asseverou que o CAPEX apresentado por último ainda
continha falhas na sua formulação como ausências de unidades, de quantitativos, de preço unitário e de
composição de preços unitários (CPU). Também não foi identificada no CAPEX a Anotação de
Responsabilidade Técnica (ART) do orçamentista.
107. Conforme a SeinfraUrbana, “tais fatos inserem mais risco ao processo pois, como
explicitado, o valor total do investimento projetado possui grande sensibilidade em relação à
orçamentação, podendo proporcionar variações expressivas nos desembolsos a serem efetuados no
decorrer do contrato e um risco de prejuízo aos cofres públicos. Por isso, há inconsistências que não
permitem avaliar a comprovação de economicidade do objeto”.
108. Por fim, a unidade técnica levou em conta o atual estágio da contratação do objeto (edital
já publicado) e, após asseverar que o modelo BTS, em teoria, não exigia um detalhamento
orçamentário nos moldes exigidos pela lei 8.666/1993, entendeu que não era mais adequada a
reiteração das determinações pendentes de implementação.
III.1 - Análise
109. Divirjo da proposta da SeinfraUrbana.
110. Inicialmente, é preciso destacar que não é porque uma licitação adentrou a sua fase
externa, com a publicação do edital, que esta Corte de Contas estará impossibilitada de apontar
eventuais irregularidades ocorridas no curso do procedimento e propor as medidas corretivas cabíveis.
111. Como é cediço, não há a estabilização dos efeitos de eventuais ilicitudes praticadas na fase
de planejamento do certame ou de julgamento, ainda que a licitação tenha sido concluída e o contrato
assinado. Tanto isso é verdade que não há nenhum óbice a que o TCU determine a anulação dos atos
14
15
127. Segundo o auditor-instrutor, o CAPEX (tanto na versão R6E como na versão R6R) não
apresenta mais a unidade de medida “RT”, tendo sido ampliado o uso dos sistemas oficiais de
referência em parcelas do empreendimento enquadradas como obras civis. Quanto ao último aspecto,
assinalou que os “itens referenciados no Sinapi estão corretos de acordo com uma análise amostral de
dez itens”. Assim, a unidade técnica concluiu que houve o cumprimento das principais premissas
impostas nos Acórdãos 2.687/2018-Plenário e 2.008/2017-Plenário
128. De outro lado, o auditor-instrutor apontou fragilidades no processo de orçamentação, tais
como a atualização de preços unitários de itens de alta materialidade, que haviam sido obtidos por
cotação, mediante o uso de índice de preços para horizontes acima de 3 anos (por exemplo, estrutura
metálicas); a utilização de BDI fragmentado em materiais e mão de obra; a realização de pesquisa de
preço com menos de três cotações; o uso de BDI “cheio” em itens de mera intermediação de mão de
obra; a estimativa do custo de mão de obra como percentual do custo total do item; e a apropriação de
custos de serviços entre os diversos prédios do complexo segundo uma metodologia paramétrica (por
unidade de área), sem avaliar propriamente os quantitativos em cada unidade (por exemplo, estrutura
metálica).
129. O signatário do parecer asseverou que não houve o detalhamento de alguns serviços de
grande relevância e complexidade, tendo destacado o de estrutura metálica, o principal da Curva ABC
elaborada pela própria Fiocruz/Bio-Manguinhos, com custo de R$ 506 milhões ou 17% do total da
obra.
130. Esse item contempla serviços e materiais diversos, tais como conectores stud bolts,
proteção, pintura, transporte vertical/horizontal e outros. A propósito do assunto, observo que a
entidade jurisdicionada obteve o custo da estrutura metálica a partir do somatório dos valores dos
diversos insumos usados para a consecução, discriminados em custos de fornecimento de material e de
mão de obra. Não houve a discriminação dos profissionais e dos coeficientes de produção envolvidos,
como ocorre com a técnica de orçamentação do Sinapi. Tal aspecto confere um grande fator de
imprecisão ao custo total da estrutura metálica, o que é complementando pela incerteza quanto à
precisão dos quantitativos, como exposto no item anterior.
131. A propósito dos elementos novos juntados pela entidade jurisdicionada e do exame
empreendido pela SeinfraUrbana, observo que o novo orçamento contemplou melhoramentos frente
aos apresentados anteriormente, cabendo destacar a utilização de preços de referência extraídos do
Sinapi, do ORSE e do Sistema de Custos para Obras e Serviços de Engenharia (SCO-RIO), este último
adotado pelo Município do Rio de Janeiro, em diversos itens da planilha de obras civis.
132. Embora não caiba afirmar que houve o pleno atendimento das normas de regência, já que o
envio da última versão das planilhas orçamentárias do custo da obra somente ocorreu após a conclusão
da etapa de instrução, quando o processo estava neste gabinete em vias de julgamento, é possível
perceber que a metodologia utilizada na parcela de obras civis seguiu as premissas dos §3º e 4º do art.
8º da Lei do RDC, in verbis:
“3º O custo global de obras e serviços de engenharia deverá ser obtido a partir de custos
unitários de insumos ou serviços menores ou iguais à mediana de seus correspondentes ao
Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi), no caso
de construção civil em geral, ou na tabela do Sistema de Custos de Obras Rodoviárias
(Sicro), no caso de obras e serviços rodoviários.
§ 4º No caso de inviabilidade da definição dos custos consoante o disposto no § 3º deste
artigo, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados
contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da
administração pública federal, em publicações técnicas especializadas, em sistema
específico instituído para o setor ou em pesquisa de mercado.”
17
133. Com relação ao item de estrutura metálica, observo que, a despeito de algumas fragilidades
apontadas pela unidade técnica, o custo unitário total por kg – R$ 14,28 – parece dentro da faixa de
variação de serviços similares contidas no Sistema Sinapi. Em arrimo a essa constatação, reproduzo
algumas composições de peças estruturais metálicas diversas contidas no referido sistema referencial,
na data-base de setembro/2020:
134. Ademais, ressalto que os itens supramencionados do Sinapi não incluem os serviços de
pintura, o que favorece a percepção, em cognição perfunctória, de que os custos de estrutura metálica
contidos no orçamento do NCPFI não parecem excessivos frente aos contidos no aludido sistema.
Dessa forma, considerando essa visão paramétrica do custo do serviço de estrutura metálica
(preço/kg), entendo que não há fumaça do bom direito para se cogitar a suspensão cautelar do certame.
135. Essa assertiva não significa, em absoluto, a validação do custo do item “Fornecimento,
Fabricação, Pintura, Transporte e Montagem de Estruturas Metálicas” no orçamento estimativo do
RDC Presencial 1/2021-BM, até porque não houve uma análise detalhada da composição de custo
18
unitário do item, seja pela demora na remessa do orçamento detalhado do empreendimento, seja pelas
fragilidades já anunciadas na forma de orçamentação usada pela Fiocruz.
136. No que se refere aos itens relacionados a obras industriais, é preciso ressaltar a dificuldade
de se obterem preços de referência, já que não há sistemas oficiais, principalmente quando o objeto
envolve serviços e equipamentos com especificidades, como é o caso de uma obra de um complexo
industrial farmacêutico.
137. Não se olvida que os riscos de sobrepreço seriam mitigados caso a Fiocruz tivesse seguido
as boas práticas de orçamentação, expostas na jurisprudência e nos roteiros de auditoria desta Casa, a
exemplo da utilização de 3 cotações para a obtenção de preços de serviços não especificados nos
sistemas oficiais. Da mesma forma, seria pertinente a obtenção de cotações em datas-bases próximas à
da licitação em causa, a fim de evitar a atualização de pesquisas pretéritas, não necessariamente
representativas da situação atual de mercado.
138. Não obstante essas fragilidades, entendo que não cabe a expedição de medida obstativa da
continuidade da licitação, haja vista a importância da política pública associada ao bem pretendido
pelo RDC Presencial 1/2021-BM, os aperfeiçoamentos promovidos na planilha orçamentária e a
dificuldade prática de se extrair um valor seguro de mercado de obras com essa especificidade, a exigir
uma postura de maior cautela na tomada de decisões drásticas, como a interrupção de uma licitação.
139. Dessa forma, considerando que a análise exauriente da planilha orçamentária dos
investimentos para implantação do NCPFI não foi realizada na presente fiscalização, devido aos
motivos já suscitados, determino à SeinfraUrbana que examine a adequação do orçamento estimativo
do RDC Presencial 1/2021-BM e da planilha dos investimentos a ser apresentado pela vencedora da
licitação, no próximo ciclo do Fiscobras.
140. Tal procedimento se mostra importante devido à grande sensibilidade dos desembolsos da
Fiocruz, no âmbito do BTS, em relação ao custo global da construção, o que impõe o exame da
economicidade dessa parcela dos investimentos.
141. A propósito do assunto, verifico que a cláusula 6.3.2 do edital impõe a cada licitante a
elaboração e entrega de Plano de Negócios, conforme o Anexo 8 da minuta de contrato, constante do
Anexo VIII do edital.
142. Segundo o item 7 da cláusula de definições do edital, o Plano de Negócios é “o conjunto
de premissas, parâmetros e valores, utilizados para compor a proposta do Licitante. Aqui deverão
estar descritos os investimentos, receitas, despesas, tributos, resultados, enfim tudo o necessário para
estabelecer as condições para a execução do objeto deste edital. Sua data inicial será a de assinatura
do contrato”.
143. O Anexo 8 da minuta do contrato, por sua vez, impõe ao licitante a elaboração de diversas
planilhas, cabendo destacar a intitulada “Quadro 6 – Investimentos Programados”, na qual “deverão
ser indicados os valores totais necessários, para cumprir as obrigações descritas no Edital e Contrato
de Locação para implantação do NCPFI, discriminando por grupo de itens” (grifos acrescidos).
144. A meu juízo, esse nível de detalhamento não está de acordo com o art. 17, inciso III, da Lei
12.462/2011, que estabelece que “nas licitações de obras ou serviços de engenharia, após o
julgamento das propostas, o licitante vencedor deverá reelaborar e apresentar à administração
pública, por meio eletrônico, as planilhas com indicação dos quantitativos e dos custos unitários, bem
como do detalhamento das Bonificações e Despesas Indiretas (BDI) e dos Encargos Sociais (ES), com
os respectivos valores adequados ao lance vencedor”.
145. Sendo assim, deve a entidade jurisdicionada dar cumprimento ao dispositivo legal
supramencionado, bem como ao art. 40, § 2º, do Decreto 7.581/2011, que exige a apresentação de
planilha orçamentária contendo “a indicação dos quantitativos e dos custos unitários, vedada a
19
utilização de unidades genéricas ou indicadas como verba; a composição dos custos unitários quando
diferirem daqueles constantes dos sistemas de referências adotados nas licitações; e o detalhamento
das Bonificações e Despesas Indiretas - BDI e dos Encargos Sociais – ES”.
146. Dessa forma, cabe determinar à Fiocruz/Bio-Manguinhos que exija da empresa contratada
a apresentação de planilha orçamentária dos investimentos para a construção do NCPFI segundo o
nível de detalhamento exigido pelo art. 17, inciso III, da Lei 12.462/2011 c/c o art. 40, § 2º, do Decreto
7.581/2011.
147. Assinalo que a referida obrigação decorre diretamente da lei, sendo desnecessário
republicar o edital, a fim de mandar incluir esse comando.
IV - Riscos relacionados à aplicação do modelo built to suit (BTS)
148. A SeinfraUrbana apontou a existência de riscos relativos à falta de regulamentação do
modelo BTS, à ausência de instrumento orçamentário apropriado e de análise de possível impacto nas
regras fiscais e à fragilidade no modelo de garantia previsto.
IV.1 - Falta de regulamentação
149. Com relação ao primeiro aspecto, a unidade técnica assinalou que a falta de regras
detalhadas expõe o modelo a riscos de concepção e insegurança jurídica, tendo ressaltado a existência
de dúvidas e possíveis interpretações divergentes quanto ao limite do aluguel mensal disposto no § 3º
do art. 47-A da Lei do RDC e à forma de atualização contratual.
150. Conforme o referido dispositivo, “o valor da locação a que se refere o caput [built to
suit] não poderá exceder, ao mês, 1% (um por cento) do valor do bem locado”.
151. Sobre o assunto, a Fiocruz/Bio-Manguinhos pontuou que esse percentual máximo se
aplicaria apenas aos casos em que não há reversão do bem, o que estaria em consonância com a visão
da SeinfraUrbana.
IV.1.1 - Análise
152. A propósito do tema, verifico, a partir dos números apresentados pela SeinfraUrbana à
época da auditoria, que o valor do aluguel segundo o plano de negócios elaborado pela Fundação
Getúlio Vargas, de R$ 38,293 milhões, equivalia a aproximadamente 1,42% do custo de construção
(obras mais despesas acessórias relacionadas à instalação dos equipamentos), R$ 2.695.005.652,58
(peça 276, p. 22-23).
153. Não obstante, entendo que é razoável a interpretação da SeinfraUrbana e da Fiocruz/Bio-
Manguinhos de que o § 3º do art. 47-A da Lei 12.462/2011 somente se aplica aos BTS sem reversão
final do bem.
154. Isso porque, nos casos de BTS com reversão do bem, parte do denominado valor da
locação corresponde à amortização do imóvel construído, de modo que um maior percentual sobre o
valor do bem locado, em verdade construído de forma financiada, não significa a ocorrência de
superfaturamento, mas sim uma maior amortização mensal, o que acarreta uma menor duração
contratual.
155. Dito de outra forma, não há lógica em limitar o valor da amortização mensal do bem que
será revertido à administração pública. Em minha visão, o Poder Público pode estipular as condições
de financiamento que melhor lhe aprouver, segundo critérios econômicos racionais e sua capacidade
de pagamento.
156. Em situações do tipo, a entidade contratante deve, com o auxílio e a autorização do
Ministério da Economia, definir um valor de locação, leia-se de amortização acrescida do custo do
capital de terceiros investido, compatível com o espaço fiscal eventualmente existente e projetado
20
21
167. Por esse motivo, a unidade técnica alvitrou encaminhar cópia da deliberação aos
Ministérios da Economia, da Saúde e da Casa Civil, bem como ao Congresso Nacional, “para fins de
alerta sobre os riscos de insegurança jurídica e possíveis impactos orçamentários e fiscais
identificados por este Tribunal devido à falta de regulamentação da aplicação do modelo built to suit
no setor público, especialmente para os contratos que prevejam reversão do imóvel à Administração
Pública”.
168. À vista da especificidade do assunto, solicitei o pronunciamento da Semag, conforme
exposto no item 19 retro.
169. A unidade técnica especializada trouxe substancioso parecer no qual aduziu, quanto à
natureza da contratação decorrente do RDC Presencial 01/2021-BM como operação de crédito e à
eventual necessidade de cumprimento da legislação orçamentária e financeira, que:
“i. as locações sob encomenda – built to suit, ao realizarem a diluição temporal do valor
devido ao empreendedor ao longo do contrato, caracterizam-se como operações de crédito
nos termos do art. 29, inciso III, da Lei Complementar 101/2000. Tal característica é
especialmente verificada nos casos em que há a reversão obrigatória do objeto adquirido,
construído ou reformado substancialmente ao patrimônio do ente público, nos termos do
art. 47-A, § 2º, da Lei 12.462/2011;
ii. como condição para a assinatura do contrato, faz-se necessária a existência de prévia e
expressa autorização para a contratação da operação de crédito, esteja ela presente no
texto da lei orçamentária do exercício, em créditos adicionais ou em lei específica, nos
termos do art. 32, inciso I, da Lei Complementar 101/2000;
iii. a operação de crédito é definitivamente materializada no momento do recebimento do
objeto adquirido, construído ou reformado substancialmente pelo contratante. Como
condição para o referido aperfeiçoamento da operação e o recebimento do objeto da
locação sob encomenda, exigem-se, nos termos do art. 16, incisos I e II, e do art. 32, inciso
II, ambos da Lei Complementar 101/2000: a) a estimativa do impacto orçamentário e
financeiro; b) a declaração do ordenador de despesa de adequação orçamentária e
financeira; c) a inclusão no orçamento ou em créditos adicionais dos recursos
provenientes da operação; e d) verificação dos limites e condições relativos à operação de
crédito pela Secretaria do Tesouro Nacional;
iv. quando da inclusão da operação de crédito no orçamento (no exercício de sua
realização efetiva), bem como do recebimento do NCPFI pela Fiocruz (registro da
despesa primária com a incorporação do bem), deverá ser verificado o atendimento ao
Teto de Gastos da EC 95/2016, à Regra de Ouro do art. 167, inciso III, da CF/1988, às
metas fiscais de que trata a Lei Complementar 101/2000 e a Lei de Diretrizes
Orçamentárias e aos limites da Resolução do Senado Federal 48/2007.”
IV.2.1 - Análise
170. Não obstante as abalizadas considerações da Semag, entendo que o BTS apresenta, em
essência, características próximas de uma PPP – concessão administrativa, com prévia execução de
obra pública. Em verdade, compreendo que o ajuste em exame guarda semelhança e se insere no
contexto desse e de outros modelos contratuais introduzidos mais recentemente no ordenamento
jurídico, cujo traço comum é o prazo de duração mais longo, a execução de obras com recursos do
próprio contratado ou de terceiros e a amortização desses investimentos mediante o pagamento de
parcelas diluídas no curso de sua vigência.
171. A título de exemplo, menciono:
22
edital do RDC Presencial 01/2021-BM, suportar a demanda crescente do SUS por vacinas e
biofármacos. Ademais, ela também servirá ao suprimento de vacinas ao resto do mundo,
principalmente aquelas que que a Fiocruz tem a liderança Mundial na produção, como é o caso da
vacina contra a Febre Amarela.
180. Vê-se, portanto, que a contratação em exame envolve a realização de relevante interesse
público. Em verdade, a necessidade de sua consecução se tornou ainda mais evidente após a epidemia
do novo coronavírus. É possível afirmar que a construção de uma fábrica de vacinas se enquadra
dentro de uma estratégia nacional de segurança sanitária, já que viabiliza o enfrentamento de eventuais
futuras pandemias.
181. Aplica-se, aqui, os arts. 21, 22 e 24 da LINDB:
“Art. 21. A decisão que, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, decretar a
invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa deverá indicar de
modo expresso suas consequências jurídicas e administrativas.
Art. 22. Na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os
obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu
cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados.
Art. 24. A revisão, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, quanto à validade
de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa cuja produção já se houver
completado levará em conta as orientações gerais da época, sendo vedado que, com base
em mudança posterior de orientação geral, se declarem inválidas situações plenamente
constituídas.”
182. Assim, diante da existência de variados argumentos quanto à natureza jurídica do contrato
em exame, opto pela interpretação que permita o melhor atendimento do interesse público.
Considerando as especificidades do objeto da contratação em exame e as dúvidas suscitadas a respeito
do regime jurídico aplicável ao BTS, opto por não adotar nenhuma medida obstativa da continuidade
do certame licitatório, na linha da proposta inicial da SeinfraUrbana.
183. Conforme visto, adotei a PPP – concessão administrativa como o modelo de contratação já
experimentado mais próximo do BTS em questão. Não desconheço que a Lei 11.079/2014 também
exige que sejam atendidos alguns pressupostos para a contratação de uma PPP.
184. Por exemplo, o art. 14, caput c/c o § 3º, da aludida norma impõe que esse tipo de
contratação seja precedida de autorização do órgão gestor instituído para esse fim, o qual avaliará
expediente instruído com pronunciamento prévio e fundamentado:
“I – do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, sobre o mérito do projeto;
II – do Ministério da Fazenda, quanto à viabilidade da concessão da garantia e à sua
forma, relativamente aos riscos para o Tesouro Nacional e ao cumprimento do limite de
que trata o art. 22 desta Lei.”
185. O art. 22, por sua vez, estabelece que “a União somente poderá contratar parceria
público-privada quando a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das
parcerias já contratadas não tiver excedido, no ano anterior, a 1% (um por cento) da receita corrente
líquida do exercício, e as despesas anuais dos contratos vigentes, nos 10 (dez) anos subseqüentes, não
excedam a 1% (um por cento) da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios”.
186. Como se vê, as exigências para as PPPs são fundamentalmente distintas daquelas
colocadas no art. 32 da LRF, para as operações de crédito, o que favorece o entendimento de que o
BTS não necessariamente deve estar sujeito às mesmas condições legais deste tipo jurídico.
24
187. No presente caso, mesmo que o contrato em exame não seja propriamente uma PPP – esse
modelo foi usado como referência apenas para a reflexão sobre o enquadramento ou não desse arranjo
contratual como uma operação de crédito –, verifico que o valor estimado anual a ser pago (reversão +
aluguel), em torno de R$ 559,86 milhões, corresponde a um percentual bastante pequeno (0,06%) da
receita corrente líquida anual estimada em abril de 2021 (R$ 816,149 bilhões, segundo dados da
Secretaria do Tesouro Nacional (Disponível em:
<https://sisweb.tesouro.gov.br/apex/f?p=2501:9::::9:P9_ID_PUBLICACAO:31425>. Acesso em:
9/8/2021).
188. Quanto à garantia, cabe destacar que a Fiocruz/Bio-Manguinhos está viabilizando outra
alternativa para o uso do FGIE, como será mais bem ilustrado no próximo capítulo.
189. Não obstante a interpretação conferida ao presente caso, julgo pertinente, diante dos vários
argumentos apresentados na discussão do processo, dar ciência desta deliberação ao Ministério da
Economia a fim de que analise, para casos futuros, o enquadramento de contratações do tipo BTS com
reversão do bem, assim como dos demais contratos indicados no item 171 retro, como uma operação
de crédito, verificando as condições que devem ser atendidas para a sua conclusão.
190. Por fim, considerando as restrições atualmente existentes à expansão do gasto público,
reputo pertinente determinar à Fiocruz/Bio-Manguinhos que, antes do início da execução das despesas
relativas ao pagamento do aluguel do contrato que decorrerá do RDC Presencial 01/2021-BM,
verifique o atendimento ao Teto de Gastos da EC 95/2016.
IV.3 - Fragilidades no modelo de garantia previsto
191. Com relação ao último risco, a equipe de auditoria assinalou a existência de fragilidades na
previsão da utilização do Fundo Garantidor de Infraestrutura (FGIE) como cobertura da operação,
conforme indicado no item 26.2 da minuta do contrato.
192. Segundo os auditores da SeinfraUrbana, o regulamento do FGIE não prevê o uso do fundo
para a garantia de operações de BTS, de modo que, para a viabilização da operação, seria necessária
“a aprovação de um regulamento específico pelo Conselho de Participação de Fundos Garantidores
para Cobertura de Riscos em Operações de Projetos de Infraestrutura de Grande Vulto (CPFGIE) e
pela assembleia dos cotistas”.
193. Por esse motivo, entenderam que não seria adequada a abertura de procedimento licitatório
antes “[...] de as regras do fundo estarem devidamente formalizadas, em virtude do aumento do risco
associado a essa questão ser precificado nas propostas dos participantes do certame”.
194. A equipe de fiscalização também chamou atenção para o fato de o valor da garantia do
contrato englobar apenas 12 parcelas mensais do aluguel, consoante o item 26.3 da minuta do
instrumento analisada à época. Esse período corresponde a apenas 6% da duração do ajuste, o que foi
considerado pequeno por investidores reunidos em audiência pública promovida pela Fiocruz/Bio-
Manguinhos, dado o horizonte de 20 anos do projeto.
195. Na visão dos auditores da unidade técnica, esse aspecto pode influenciar negativamente o
valor das propostas, que podem embutir o risco de inadimplemento no preço apresentado, ainda mais
se for considerada a materialidade dos valores a serem investidos.
196. Por fim, a equipe de auditoria também verificou riscos relacionados à manutenção da
garantia pelo FGIE. Nesse sentido, aduziram que, apesar de o aporte inicial no fundo ser de
responsabilidade do Ministério da Saúde, eventuais recomposições decorrentes de utilização da
garantia deverão ser efetuadas pela Fiocruz/Bio-Manguinhos, conforme estabelecido na cláusula 26.6
da minuta do contrato. Em outros termos, a própria entidade que teria dado origem à inadimplência
contratual seria a responsável por recompor o saldo do fundo garantidor, o que não parece razoável,
sob o ponto de vista da viabilidade operacional.
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197. Dessa forma, a SeinfraUrbana propôs, na fase preliminar do processo, que fosse
determinado à Fiocruz que apresentasse a este Tribunal a formalização da garantia locatícia pelo
Fundo Garantidor de Infraestrutura (FGIE) e que avaliasse a conveniência e a oportunidade de rever as
regras de recomposição do fundo em caso de utilização, bem como o prazo de cobertura da garantia.
198. Em sua resposta à oitiva, a entidade jurisdicionada assinalou que continuava aguardando a
posição da Secretaria do Tesouro Nacional quanto ao eventual encaminhamento de proposta de
alteração do regulamento do FGCIE, no intuito de abranger o uso daqueles recursos na garantia de
operações sob a modelagem BTS.
199. Apesar disso, argumentou que, para avaliar a suficiência da garantia dos investimentos que
serão realizados no empreendimento em exame, não se pode afastar a possibilidade de utilização dos
ingressos advindos das exportações de Bio-Manguinhos/Fiocruz. Ademais, lembrou que as receitas
oriundas do Ministério da Saúde seguem o fluxo corriqueiro do orçamento público, com
direcionamento anual de acordo com a programação de ações para o período, sem grandes variações
ano a ano.
200. Por fim, no que se refere à recomposição do FGCIE, Bio-Manguinhos/Fiocruz argumentou
que foi proposta a definição do prazo de 3 meses em lugar da indeterminação observada pela equipe de
auditoria, sempre no propósito de ampliar a segurança jurídica que envolve a operação.
201. A unidade técnica analisou a matéria e asseverou que, apesar de persistir a impossibilidade
de utilização do fundo, a entidade jurisdicionada vinha construindo conjuntamente com os gestores do
FGIE mecanismos para a efetivação da utilização do fundo.
202. Quanto à devolução dos valores ao FGCIE, a SeinfraUrbana considerou pertinente a
fixação de um prazo para tanto, mas constatou que não houve manifestação acerca dos riscos
apontados relacionados ao responsável por efetuar essa recomposição.
203. Assim, apesar de reconhecer que não houve o saneamento de todos os riscos pertinentes à
matéria, concluiu que não era mais aplicável a proposta de determinação consignada no relatório
preliminar, haja vista o estágio da contratação (edital publicado) e os encaminhamentos promovidos
pela jurisdicionada junto aos gestores do FGIE com o objetivo de superar os obstáculos existentes para
o uso do fundo.
204. Por isso, alvitrou apenas a expedição de ciência à Fiocruz/Bio-Manguinhos sobre a “falta
de formalização da garantia locatícia pelo Fundo Garantidor de Infraestrutura – FGIE, bem como as
regras de recomposição do fundo em caso de utilização expõem o empreendimento a riscos de
descontinuidade e podem afetar os preços das propostas da licitação”.
IV.3.1 - Análise
205. Com relação ao assunto, entendo, em linha de consonância com a unidade técnica, que os
obstáculos jurídicos existentes ao uso do FGCIE constituem um fator de risco à modelagem escolhida
para a implantação do NCPFI, a ser assumido pelo investidor privado.
206. Seguindo uma lógica econômica, a tendência é que haja a precificação dessa contingência,
que seria transferida ao Poder Público mediante a oferta de propostas com menores taxas de desconto
no valor do aluguel frente ao estimado no certame. Isso seria uma perspectiva otimista, pois não se
pode descartar a ausência de interessados na licitação que se aproxima, haja vista os riscos elencados
nesta fiscalização.
207. Todavia, estando os autos em meu gabinete, Bio-Manguinhos/Fiocruz encaminhou
elementos adicionais de defesa nos quais assinalou, no que interessa ao presente achado, que houve
mudança na forma de garantia dos investimentos que serão aportados no NCPFI.
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208. Na ocasião, a entidade reconheceu a inviabilidade de se usar o FGCIE, de modo que houve
a alteração do edital para prever uma nova garantia ofertada pelo Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID). Transcrevo a seguir as ponderações trazidas por Bio-Manguinhos/Fiocruz:
“Restou a busca por uma outra emitente à condição de organismo garantidor. Optou-se
por um organismo internacional capaz de ser mais atraente ao mercado, aliando a
segurança necessária à operação e reputação internacional, de modo a ampliar o espectro
de investidores internacionais acostumados a operarem com garantias sólidas, fornecidas
por instituição financeira, entidade governamental ou organismo multilateral, com rating
(taxa de risco) diferenciado, concedido por agência internacional de classificação de
risco.
Tal processo terminou pela escolha do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID,
como organismo a assumir a condição de garantidor. O mesmo possui qualificação triplo
AAA internacional cujas tratativas asseguram a garantia para 12 (doze) vezes o valor do
aluguel mensal do empreendimento, sem exigência de aporte prévio do valor equivalente
ao montante das 12 (doze) PMTs, como anteriormente exigido pela ABGF. Esse processo
de contratação, por redundar em financiamento externo, demanda autorização da
Comissão de Financiamentos Externos - COFIEX – ME, estando tal processo em curso,
contando ainda com o aval do Ministério da Saúde.
Vale destacar que o Edital foi alterado nesse ponto, e recentemente republicado, retirando
a ABGF como garantidora e introduzindo novo ente garantidor, embora não citando
formalmente o BID.
Aqui destaca-se que a chancela de referida organização joga luzes à maior bancabilidade
e atratividade econômica e sucesso do empreendimento conforme esperado por Bio-
Manguinhos/Fiocruz.
Adicionalmente a essa garantia, o edital, então republicado, conta ainda com uma
garantia em caráter adicional, referente ao complemento de mais 3 (três) vezes o valor do
aluguel mensal que somada à anterior, perfará um total de 15 (quinze) parcelas para o
caso de eventual inadimplência pela Contratante pública, o que pelo demonstrado nos
estudos de viabilidade e orçamentação do projeto possui riscos de moderado a baixo,
comuns a qualquer negociação, mitigados por esse instrumento tão bem aceito pelo
mercado. Especificamente a esta garantia adicional, a mesma é fornecida através da
Fiotec, amparada na lei 13.801/2019, vinculada a capacidade de arrecadação por Bio-
Manguinhos na conta de exportações de produtos.” (grifos acrescidos).
209. Não obstante a mudança realizada, observo que a estipulação dessa garantia depende de
condição ainda não efetivada, a saber, a autorização da Comissão de Financiamentos Externos
(COFIEX) do Ministério da Economia. Conforme informado pela jurisdicionada, tal processo ainda
está em curso, o que implica concluir que não ainda houve o equacionamento do risco de garantia, pois
a aprovação da pasta econômica é ainda incerta.
210. Apesar da permanência desse fator de incerteza, entendo que não cabe a adoção de
nenhuma medida obstativa da continuidade do certame licitatório, levando em conta as exigências de
políticas públicas associadas à contratação em análise, bem como as providências em curso no âmbito
da Fiocruz/Bio-Manguinhos para o equacionamento desse risco.
211. Todavia, a fim de prevenir situações futuras, julgo pertinente recomendar à Casa Civil que,
em face de sua atribuição de coordenação e integração das ações governamentais, avalie a
conveniência e oportunidade de regulamentar as garantias a serem ofertadas pelo Poder Público em
contratações built to suit de que trata o art. 47-A da Lei 12.462/2011, a fim de reduzir os fatores de
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riscos envolvidos nesses ajustes, permitir propostas mais vantajosas e viabilizar o uso desse modelo de
contratação no âmbito da administração pública.
V - Riscos identificados na minuta do edital que podem prejudicar a competitividade do certame
212. A equipe de auditoria identificou dois achados que poderiam comprometer a
competitividade da licitação: o conflito de interesses no modelo de contratação da Fundação Getúlio
Vargas (FGV) para prestação de serviço de assessoria técnica; e a adoção de critérios inadequados de
habilitação e julgamento.
V.1 – Modelagem da contratação da FGV
213. Com relação à primeira ocorrência, cabe destacar que a Fiocruz/Manguinhos assinou o
Contrato 76/2017 com a FGV, mediante dispensa de licitação, para “a execução de serviço de
assessoria técnica de apoio a Bio-Manguinhos, com vistas a realizar a modelagem de estruturação de
financiamento para o processo licitatório para construção no complexo NCPFI, dividido em 3 etapas
de serviço: prospecção de potenciais investidores, modelagem econômico-financeira e suporte à
realização do processo licitatório” (peça 248, p. 41).
214. Conforme a cláusula terceira do ajuste, o valor global foi fixado em 2,25% “[...] sobre o
total do valor do financiamento para a implementação do empreendimento”. O pagamento desse
montante seria realizado pela vencedora do certame licitatório para a construção do NCPFI, ou seja,
pela empresa contratada no âmbito do RDC Presencial 1/2021-BM. Não houve, portanto, a atribuição
de nenhum ônus financeiro à Fiocruz/Manguinhos.
215. Consta da letra “d” da referida cláusula a informação de que “o pagamento depende do
êxito do certame licitatório acima mencionado, de maneira que a CONTRATADA assume todos os
riscos da disponibilização de seus recursos humanos e técnicos sem a garantia da contrapartida
financeira correspondente” (peça 248, p. 42).
216. Para a equipe de fiscalização, essas condições configuram “[...] um conflito de interesses
da FGV em relação à contratação pois, como somente haverá recebimento dos serviços prestados
caso a licitação tenha sucesso, a remuneração do segundo contrato depende diretamente de que o
estudo de viabilidade econômico-financeira do empreendimento seja favorável ao investidor, a fim de
que se possa dar continuidade à licitação”.
217. Na visão da unidade técnica, essa situação seria agravada pelo fato de a remuneração da
FGV ser uma porcentagem do valor do financiamento. Ou seja, na prática, quanto maior o valor do
orçamento estimativo da modelagem maior será a remuneração da FGV, o que coloca a instituição
com objetivos opostos ao interesse público.
218. A SeinfraUrbana também destacou a existência do risco assumido pela FGV, a saber, a
possibilidade de ela não ser remunerada pelo serviço prestado caso a licitação não alcance êxito. Isso
configuraria, em sua análise, possível enriquecimento sem causa por parte da administração.
219. Nesse cenário, a equipe de auditoria recomendou a modificação das condições de
pagamento do ajuste a fim de mitigar esses riscos, tendo sugerido que a remuneração da instituição
fosse atrelada à taxa de desconto da licitação para implantação do empreendimento ou que fosse
estabelecido um valor fixo a ser pago pelo serviço, a preços de mercado. Também se cogitou que a
responsabilidade pelo pagamento da FGV fosse da Fiocruz/Bio-Manguinhos, pois, assim, não estaria
presente a estrutura de incentivos descrita acima, que induzia comportamentos contrários ao interesse
público.
220. Por fim, o corpo de auditores também recomendou a retirada do sigilo da licitação, de
modo que todos os possíveis participantes tivessem acesso às informações que seriam repassadas
durante as reuniões de prospecção de investidores, reduzindo, assim, a assimetria de informações entre
os concorrentes.
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do ressarcimento a ser pago pelo licitante à FGV não poderá superar R$ 48.862.022,33
(quarenta e oito milhões, oitocentos e sessenta e dois mil, vinte e dois reais e trinta e três
centavos).”
237. Consoante a tabela ilustrativa indicada no aludido anexo, caso não haja nenhum desconto
sobre o VPL máximo estimado para o certame, a remuneração da FGV corresponderá a R$ 18,372
milhões.
238. A respeito do assunto, compreendo que foi inadequada a opção inicial da Fiocruz/Bio-
Manguinhos de vincular o preço da modelagem ao que seria obtido na licitação para implantação do
NCPFI.
239. Isso porque essa forma de remuneração acaba incentivando o contratado a agir de forma
oposta ao interesse da entidade contratante, já que seus ganhos serão tanto maiores quanto mais
elevado for o valor desembolsado pela administração, quando o contrário seria razoável, sob a
perspectiva da teoria econômica dos contratos.
240. Não se está aqui a sugerir que a FGV atuou de modo contrário ao interesse da Fiocruz/Bio-
Manguinhos, até porque não há nenhum elemento nos autos que conduza a essa conclusão. O que se
objeta é a forma como foi estruturada originalmente a remuneração da instituição, a qual pode ter
induzido comportamentos direcionados a maximizar seus ganhos privados, em detrimento do Poder
Público.
241. Do mesmo modo, também reputo inadequado atrelar a remuneração da modelagem à taxa
de desconto da licitação para implantação do empreendimento, ou seja, à diferença percentual entre o
VPL máximo e o ofertado pela licitante vencedora. Em minha visão, essa sistemática também tem o
potencial de induzir uma sobre-estimativa do valor orçado da licitação, a fim de artificialmente
provocar maiores taxas de desconto.
242. Não obstante o exposto, compreendo que o valor da remuneração da FGV parece estar de
acordo com o nível de risco assumido pela contratada quando da assinatura do Contrato 76/2017,
apesar das falhas em sua justificação.
243. Considerando que o pagamento da instituição foi condicionado ao sucesso da licitação para
implantação do NCPFI, cuja viabilidade econômico-financeira era incerta naquela oportunidade e
ainda hoje é objeto de dúvidas quanto à adequação de suas premissas, entendo que o caráter aleatório
do referido ajuste o aproxima do pactuado no âmbito de Procedimentos de Manifestação de Interesse
(PMI), quanto à definição de seu valor.
244. Por consequência, haverá a precificação dos riscos assumidos pelo contratado, o que
implicará valores de remuneração mais elevados para a elaboração do projeto/modelagem, devido à
inclusão desse fator de contingência – o sucesso ou não da licitação.
245. A propósito do assunto, ressalto que o modelo de PMI foi objeto de críticas quanto ao
valor da remuneração dos estudos, a distribuição de riscos, a estrutura de incentivos e a baixa
efetividade do procedimento. O tema foi discutido no Acórdão 1.873/2016-Plenário (relator: Ministro
Walton Alencar), que endereçou uma série de determinações ao então Ministério dos Transportes com
vistas ao aperfeiçoamento do modelo.
246. No presente caso, apesar da incerteza quanto à adequação do preço do Contrato 76/2017,
compreendo que não cabe a imposição de qualquer medida corretiva deste Tribunal sobre o valor da
remuneração, passados 4 anos da celebração da avença.
247. A uma porque há riscos que foram assumidos pelo contratado, quando da assinatura do
ajuste, que implicaram a realização de serviços em favor da Fiocruz/Bio-Manguinhos sem a certeza de
remuneração. Tal fator de incerteza persiste e, a despeito das falhas na condução do procedimento,
devem ser objeto de retribuição.
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BENJAMIN ZYMLER
Relator
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1. Processo nº TC 008.162/2019-0.
2. Grupo II – Classe de Assunto V – Relatório de Auditoria:
3. Interessados/Responsáveis:
3.1. Interessado: Congresso Nacional (vinculador)
4. Entidade: Fundação Oswaldo Cruz.
5. Relator: Ministro Benjamin Zymler.
6. Representante do Ministério Público: não atuou.
7. Unidade Técnica: Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Urbana (SeinfraUrb).
8. Representação legal: não há.
9. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de relatório de auditoria realizada na Fundação Oswaldo
Cruz (Fiocruz) com o objetivo de avaliar, por meio da análise da minuta do edital RDC Presencial
01/2019-BM e seus anexos, a adequação da modelagem built to suit (BTS) à execução do Novo Centro
de Processamento Final de Imunobiológicos de Bio-Manguinhos – RJ (NCPFI), localizado em Santa
Cruz, zona oeste do município do Rio de Janeiro/RJ.
Fui presente:
(Assinado Eletronicamente)
CRISTINA MACHADO DA COSTA E SILVA
Procuradora-Geral