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TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO TC 008.

162/2019-0

GRUPO II – CLASSE VII – Plenário


TC 008.162/2019-0
Natureza: Relatório de Auditoria
Entidade: Fundação Oswaldo Cruz
Interessado: Congresso Nacional (vinculador)
Representação legal: não há.

SUMÁRIO: RELATÓRIO DE AUDITORIA. IMPLANTAÇÃO


DO NOVO CENTRO DE PROCESSAMENTO FINAL DE
IMUNOBIOLÓGICOS DE BIO-MANGUINHOS – RJ. NÃO
CORREÇÃO DAS FALHAS NOS ESTUDOS DE
VIABILIDADE ECONÔMICO-FINANCEIRA (EVTE).
AUSÊNCIA DE ESTUDO DE ALTERNATIVAS AO MODELO
DE FINANCIAMENTO ESCOLHIDO. BUILT TO SUIT.
ORÇAMENTO DA OBRA CONTENDO IMPRECISÕES.
RISCOS RELACIONADOS À MODELAGEM. CLÁUSULAS
NO EDITAL QUE PODEM RESTRINGIR A
COMPETITIVIDADE. OITIVA PRÉVIA. SANEAMENTO
PARCIAL DAS FALHAS NO EVTE. PROJETO ESTRATÉGICO
DO MINISTÉRIO DA SAÚDE. SUCESSO DO
EMPREENDIMENTO ASSOCIADO A AÇÕES DO PRÓPRIO
MINISTÉRIO DA SAÚDE. CORREÇÃO DAS CLÁUSULAS
EDITALÍCIAS QUE PREJUDICAVAM A COMPETITIVIDADE.
DETERMINAÇÕES E MEDIDAS ACESSÓRIAS.

RELATÓRIO

Cuidam os autos de relatório de auditoria realizada na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)


com o objetivo de avaliar, por meio da análise da minuta do edital RDC Presencial 01/2019-BM e seus
anexos, a adequação da modelagem built to suit (BTS) à execução do Novo Centro de Processamento
Final de Imunobiológicos de Bio-Manguinhos – RJ (NCPFI), localizado em Santa Cruz, zona oeste do
município do Rio de Janeiro/RJ.
2. Após a conclusão dos trabalhos de campo, a Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura
Urbana (SeinfraUrbana) verificou o atendimento do Acórdão 2.687/2018-Plenário, que, por sua vez,
cuidava de monitoramento de determinações proferidas em auditoria realizada no aludido
empreendimento, no âmbito do Fiscobras 2017.
3. Na ocasião, a unidade técnica logrou encontrar os seguintes achados, conforme descrição
contida no despacho preliminar que proferi nestes autos:
a) “falhas nos estudos de viabilidade técnica-econômica-financeira do empreendimento,
consubstanciadas pelas seguintes ocorrências: não saneamento das inconsistências verificadas no
Acórdão 2.687/2018-Plenário, de modo que não foi possível comprovar que o projeto é viável
financeira e economicamente; falhas no estudo de alternativas ao não se comprovar que a escolha
pelo modelo built to suit é a mais adequada para a execução do objeto” (Achado 3.1 – IGC);
b) “preço de aluguel inadequado devido a falhas no orçamento da obra” (Achado 3.2 –
IGC);

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c) “riscos relacionados à aplicação do modelo built to suit, a saber: riscos relacionados à


falta de regulamentação do modelo, como por exemplo a interpretação da extensão do percentual
limitador do valor aluguel e a definição das regras de atualização contratual; ausência de
instrumento orçamentário para aprovação do investimento e possíveis impactos nas regras fiscais;
falta de requisitos mínimos para utilização do Fundo Garantidor de Infraestrutura como cobertura da
operação BTS” (Achado 3.3 – F/I); e
d) “riscos identificados na minuta do edital que podem prejudicar a competitividade do
certame, a saber: conflito de interesses no modelo de contratação da FGV para prestação de serviço
de assessoria técnica e adoção de critérios inadequados de habilitação e julgamento” (Achado 3.4 –
F/I).
4. Nesse cenário, ordenei a oitiva da Fiocruz, com fulcro no art. 250, inciso V, do Regimento
Interno do TCU, a fim de subsidiar o direito de defesa da entidade e permitir o amplo entendimento
das conclusões preliminares da unidade técnica, antes de eventual adoção de medida corretiva.
5. Cumprida a medida processual, a SeinfraOperações analisou a resposta enviada pela
Fiocruz, na forma da instrução transcrita parcialmente a seguir com os ajustes que entendi pertinentes:
“Achados (Relatório de Fiscalização 90/2019 – Exame técnico)
Achado III.1-Falhas nos estudos de viabilidade técnica-econômica-financeira do empreendimento –
IGC (peça 276, p. 15-21)
8. As falhas apontadas no Estudo de Viabilidade Técnica Econômica (EVTE) se dividem em:
a) falhas no estudo de demanda; e b) falhas no estudo de alternativas.
9. Quanto às falhas no estudo de demanda, cabe informar que o estudo já foi objeto de
fiscalizações anteriores (TC 007.991/2017-7 e TC 033.932/2017-4), por meio das quais foram
detectadas inconsistências relacionadas à expectativa de realização das receitas previstas, em função
das incertezas de aquisição dos produtos pelo Ministério da Saúde e pelos organismos internacionais,
bem como em função dos riscos associados aos processos de transferência de tecnologia necessários à
formulação e venda dos produtos a serem fabricados no complexo.
10. Como resultado das fiscalizações supra, o Acórdão 2.687/2018-TCU- Plenário determinou
que a Fiocruz corrigisse as irregularidades e apresentasse diferentes cenários (otimista, base e
pessimista) de modo a ponderar as diversas condicionantes de realização das receitas esperadas.
11. Após análise do novo estudo apresentado, objeto desta auditoria, verificou-se que os
riscos relacionados às transferências de tecnologia (como suspensão, cancelamento e atrasos) não
foram considerados para definição das quantidades e preços previstos.
12. Os riscos acima elencados ficaram comprovados, pois foram estimadas receitas, inclusive
no cenário pessimista, de produtos cujas Parcerias para Desenvolvimento Produtivo (PDP) vieram a
ser suspensas pelo Ministério da Saúde; de biofármacos que não constam da Relação Nacional de
Medicamentos Essenciais, condição prévia para aquisição do medicamento pelo Ministério; bem
como foram consideradas receitas com vacinas que ainda estão em fase inicial de execução do
desenvolvimento do produto, não havendo tempo hábil para finalização e comercialização no prazo
estimado.
13. Também se verificou que as incertezas quanto à aquisição de novos produtos pelo
Ministério da Saúde permaneciam, pois, ao ser chamado a confirmar o interesse em adquirir de Bio-
Manguinhos os produtos descritos nas premissas do estudo de viabilidade, o Ministério informou que
somente faz previsões anualmente, e por isso, apresentou a perspectiva de aquisição apenas para o
ano 2020.

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14. Sobre os biofármacos, Bio-Manguinhos informou que os Protocolos Clínicos e Diretrizes


Terapêuticas elaborados pelo Ministério da Saúde estão em constante revisão e por isso pode haver o
surgimento de novas alternativas e medicamentos para tratamentos. Além disso, sobre os preços de
aquisição previstos no estudo, o Ministério ressaltou existirem várias modalidades de compras e que
não há como estabelecer a previsibilidade dos preços que poderão ser alcançados durante as
negociações e contratações.
15. Por fim, em relação às falhas no estudo de demanda, cabe destacar que há uma carteira
de vacinas destinadas à exportação, contudo, verificou-se que a exploração de atividade econômica
pela Fiocruz extrapola os ditames da Constituição Federal e das normas de Direito Administrativo,
pois fundações de direito público são criadas para o desempenho de atividades administrativas
públicas próprias do Estado, sob regime de direito público, não sendo cabível que executem
diretamente atividades subordinadas ao regime de direito privado, tal como a exploração econômica.
16. Nesse sentido, também não há manifestação do Ministério da Saúde acerca do interesse
em direcionar parte da produção de vacinas do país para comercialização e, consequentemente, para
exportação. Como resultado, verificou-se que ao se desconsiderar as receitas provenientes de
exportação de vacinas do estudo de viabilidade apresentado, o projeto se tornaria inviável
economicamente para o cenário pessimista.
17. Desta forma, concluiu-se que a determinação disposta no item 9.2.1 do Acórdão
2.687/2018-TCU-Plenário não foi atendida e, em que pese ser possível se verificar a importância
social do empreendimento, o entendimento do Ministro-relator Benjamin Zymler ressaltado no TC
033.932/2017-4 de que “o EVTE apresentado não é apto a demonstrar a viabilidade econômica e
financeira do empreendimento” permanece. Desta forma, propôs-se considerar não atendida a
determinação em questão, estipulando-se novo prazo para correção das pendências e comprovação
da viabilidade no dimensionamento proposto.
18. Além das falhas no estudo de demanda, outra inconsistência identificada relacionada à
fase inicial do ciclo built to suit diz respeito ao estudo de alternativas apresentado para justificar a
escolha pelo modelo, conforme exigido pelo Acórdão 1.301/2013-TCU-Plenário.
19. Verificou-se que o estudo apresentado pela Fiocruz trilhou o caminho inverso do proposto
pelo acórdão, pois, em vez de efetuar uma análise das alternativas existentes, considerando custo-
benefício, valores, vantagens e desvantagens, para posteriormente se analisar com base nas
informações levantadas qual o melhor modelo a ser adotado, foi feita a escolha pelo built to suit
considerando o mérito administrativo e posteriormente foram apontadas as desvantagens de uma
única opção considerada que foi a PPP, de modo a desconsiderar outros modelos.
20. Concluiu ser fundamental para o atendimento aos princípios da transparência e
motivação que a escolha do modelo de contratação seja baseada em estudos técnicos, pareceres e
documentos comprobatórios que demonstrem que opção definida é a mais favorável sob os aspectos
técnicos, financeiros e de qualidade para o alcance do objetivo, conforme orientado pelo Acórdão
1.301/2013-TCU-Plenário.
Manifestação Fiocruz (peça 293, p. 2-12)
21. Inicialmente, a Fiocruz ressalta que qualquer estudo de viabilidade deve levar em
consideração que Bio-Manguinhos necessita de instalações eficientes, adequadas e certificadas junto
aos padrões regulatórios atuais e às boas práticas farmacêuticas para cumprimento de sua missão.
Ressalta que o Centro de Processamento Final de Vacinas atual está entre as áreas de maior
criticidade no processo produtivo (peça 293, p.1).
22. A Fiocruz afirmou que os riscos apontados no Relatório de Fiscalização não se mostram
razoáveis em qualquer cenário de composição do EVTE porque ignoram o histórico da Instituição de

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mais de 40 anos de produção, desenvolvimento e fornecimento ao MS e a organismos internacionais,


além de contradizerem o cenário consolidado em favor da instituição (peça 293, p. 2).
23. A Fundação argumentou que, sob o ponto de vista de quem vivencia a atividade
farmacêutica no contexto governamental, os riscos de demanda apontados pelo Relatório carecem de
plausibilidade pois não interferem na projeção dos cenários do EVTE.
24. Cita, como exemplo, o fato de um dos fármacos apontados no relatório como risco ao
EVTE por não integrar a Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (Rename) estar em fase final
de estudo clínico, necessário para registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Assim, somente após finalizar essas fases preliminares é que haverá inclusão ao Rename.
25. Critica também a afirmação feita de que o Ministério da Saúde não possui obrigação de
adquirir os objetos da PDP, quando é o Ministério quem autoriza e fomenta a política.
26. Sobre cancelamentos e atrasos das PDPs, apresentou a relação de produtos que compõem
a carteira de Bio-Manguinhos acompanhada da informação acerca de acordos de fornecimento, de
forma a demonstrar o equívoco de informações constantes do relatório acerca do cancelamento ou da
suspensão de PDPs.
27. A Fundação alega que, em um EVTE que utiliza fluxo de caixa descontado, a projeção das
receitas deve refletir as melhores estimativas e avaliações disponíveis à época de elaboração, mas não
é possível evitar incertezas. Por isso, entende que a abordagem mais coerente do ponto de vista
técnico deve ser a de tomar a estruturação do EVTE sob um contexto histórico, considerando os dados
projetados por profissionais com expertise no tema. De acordo com a Fiocruz (peça 293, p.8):
‘Pelo exposto, a abordagem mais coerente do ponto de vista técnico deve ser a de tomar a
estruturação do EVTE sob um contexto histórico, considerando os dados projetados pelos
profissionais com expertise no tema, de forma a possibilitar uma estratégia de viabilidade de longo
prazo. O resultado prático disso está no fato de Bio-Manguinhos/Fiocruz vir procedendo dessa
maneira ao longo dos anos e acertando nos investimentos, nas entregas de produtos, nas
incorporações de tecnologias e no atendimento às demandas cada dia mais crescentes. Do contrário,
se assumido o cenário apresentado no relatório, somente se levaria em consideração o cenário de
caos total e, consequentemente, a extinção de Bio-Manqguinhos/Fiocruz seria o único resultado, por
exclusão. Portanto, durante a execução de uma análise para qualquer estudo de viabilidade, em
qualquer mercado, projetar cenários catastróficos não é o caminho para viabilizar qualquer projeto
de longo prazo, pois a incerteza com o futuro não pode paralisar o presente.’
28. Ainda sobre as falhas no estudo de demanda, a Fundação rechaçou a afirmação quanto à
existência de incertezas sobre a aquisição de novos produtos pelo Ministério da Saúde, pois Bio-
Manguinhos é parceiro estratégico do órgão no Programa Nacional de Imunizações (PNI).
29. Afirmou que toda aquisição no PNI é estipulada pelo governo como meta prioritária, o
que coíbe seu contingenciamento. Para ilustrar, apresentou gráficos de faturamento de Bio-
Manguinhos nos últimos dez anos, de forma a demonstrar o aumento ocorrido de 13% a.a. no
faturamento e a estabilidade na política de preços de biofármacos junto ao MS até 2014, quando teria
havido a introdução de biofármacos de maior valor agregado na carteira (peça 293, p.9 c/c peça
299).
30. Ainda na manifestação, a Fundação asseverou que tramita entre a Fiocruz e o MS nota
técnica para formalizar a continuidade do projeto, de modo que seria um contrassenso o governo
avalizar um projeto dessa monta para não fazer uso de suas finalidades institucionais (peça 293, p.9).
31. Sobre a existência de incertezas quanto à possibilidade de exploração de atividade
econômica, destacou que a exportação de imunobiológicos não pode ser tratada sob um viés
comercial. Citou o histórico de fornecimento de produtos à sociedade e a organismos internacionais e
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ressaltou que a partir dos anos 70, quando a instituição possuía caráter de fundação pública de
direito privado, havia facilidade no processo de entrega e venda de produtos. As flexibilidades
perdidas com a alteração feita pela Constituição Federal de 1988 foram recuperadas com a
instituição de uma fundação de apoio (Fundação para o Desenvolvimento Científico e Tecnológico em
Saúde - Fiotec).
32. Mas após decisão de órgãos de controle, que determinou que a apropriação das receitas
de exportação deveria ser feita via conta única, houve suspensão das exportações pela falta de
capacidade financeira de arcar com os custos de produção, o que gerou repercussão imediata entre os
organismos internacionais devido ao desabastecimento de vacinas gerado.
33. A Fiocruz destacou que com o advento da Lei 13.801/2019, a exportação dos produtos por
meio da Fiotec passou a ser permitida, conforme ratificado pelas justificativas do projeto de lei (peça
293, p.9-11).
34. Por fim, cabe dizer que a Fiocruz não se manifestou sobre falhas no estudo de
alternativas.
Análise
a) Estudo de demanda - Riscos associados aos processos de transferência de tecnologia
35. Com relação à afirmação da Fiocruz de que carece de plausibilidade o apontamento do
relatório segundo o qual o Ministério da Saúde não possui obrigação em adquirir os objetos da PDP,
quando é o Ministério quem autoriza e fomenta a política das parcerias, o Anexo XCV da Portaria de
Consolidação GM/MS 5/2017 estabelece que a aquisição desses produtos será realizada mediante
comprovação do registro sanitário junto à Anvisa, da evolução das etapas de desenvolvimento,
transferência e absorção de tecnologia, bem como da observância e reanálise dos critérios
estabelecidos na portaria, entre eles a redução relevante de preços de mercado decorrente de
estratégias de competição das empresas (art. 55, inciso III, “b”).
36. Ou seja, apesar de fomentar a política das PDPs, há uma série de requisitos que devem
ser atendidos para que se concretize a aquisição pelo MS.
37. Para exemplificar a existência desse risco, é importante trazer à baila que, no âmbito do
TC 020.378/2017-3, relativo à representação para que o Tribunal apure possíveis atos ilegais e
antieconômicos na opção do Ministério da Saúde e da Empresa Brasileira de Hemoderivados e
Biotecnologia em rescindir unilateralmente PDP firmada com a empresa Baxter/Baxalta para a
produção e transferência de tecnologia do Fator VIII Recombinante, o MS afirmou (peça 85, p. 5-6,
TC 020.378/2017-3):
‘Destaca-se também que o art. 55 da mesma Portaria, prevê que o setor do Ministério da Saúde
responsável pela aquisição do produto deve avaliar a capacidade de atendimento por parte da
Instituição Pública, demanda da rede, preços, economicidade e vantajosidade da aquisição por meio
da PDP. Dessa forma, entende-se que no caso de parcerias que estão em descumprimento à Norma,
as aquisições por meio desse instrumento também podem ser suspensas.
(...)
Dessa forma, entende-se que não há obrigatoriedade por parte da União em adquirir a demanda da
rede SUS para o Fator VIII recombinante por meio da PDP em tela. Ainda, é destacável que a PDP
não é o único instrumento de aquisição do produto pelo Ministério da Saúde.’
38. Pode-se citar como outro exemplo, a representação recebida neste Tribunal (TC
014.687/2017-8) tendo como objeto a existência de possíveis irregularidades na contratação direta
pelo MS de laboratório privado para o fornecimento de alfaepoetina humana. Naquele processo,
verificou-se que o Termo de Execução Descentralizada (TED) 9/2016, celebrado entre o Ministério da
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Saúde e a Fiocruz foi cancelado em dezembro de 2016 e o MS adquiriu o produto de laboratório


privado, por meio de dispensa de licitação, sob o argumento de ser economicamente mais vantajoso.
39. O entendimento acima exposto da não obrigatoriedade por parte do MS em adquirir os
objetos da PDP encontra respaldo no TCU como já proferido no Acórdão 2.977/2018-TCU-Plenário,
de 12/12/2018, de relatoria do Ministro Augusto Nardes.
‘9.4. determinar ao Ministério da Saúde, com fundamento no art. 43, inciso I, da Lei 8.443/1992 c/c o
art. 250, inciso II, do RI/TCU, que adote, no prazo de sessenta dias, providências com vistas a:
(...)
9.4.3. cumprir os princípios da economicidade e da eficiência que regem a Administração Pública,
insculpidos nos arts. 37, caput, e 70 da Constituição Federal, no âmbito do Termo de Execução
Descentralizada 3/16 e de outras avenças que venham a ser firmadas, com objetivo de aquisição de
eritropoietina junto à Fiocruz/Bio-Manguinhos, de maneira a que:
9.4.3.1. as aquisições sejam balizadas em pesquisas de preços de mercado atualizadas, realizadas, no
mínimo, anualmente, nos moldes da sistemática das pesquisas de preços adotada pela equipe de
auditoria nestes autos (itens 335-370 do Relatório de Auditoria, reproduzido no relatório que
fundamenta este acórdão), e/ou com base em aquisições de quantidades compatíveis com as que se
pretende adquirir; justificando circunstanciadamente as premissas adotadas para a realização da
pesquisa de preços;
9.4.3.2. somente se adquira de Fiocruz/Bio-Manguinhos por preços iguais ou inferiores aos preços de
mercado; e
9.4.3.3. somente se adquira de Fiocruz/Bio-Manguinhos após restar demonstrada a viabilidade
econômica da produção pela mesma;’
40. Ainda em relação aos riscos acerca do cancelamento ou da suspensão de PDPs, é
importante ressaltar que o fornecimento do produto somente ocorrerá após a assinatura do contrato
de fornecimento com o Ministério da Saúde, caracterizando a fase III da parceria. Da relação de
produtos apresentada de forma a demonstrar possíveis equívocos de informações constantes do
relatório acerca do cancelamento ou da suspensão de PDPs, verifica-se que de quatorze PDPs, três
estão na fase III e vigentes.
41. Logo, como posto acima, a premissa de compra por parte do MS dos produtos objetos de
PDPs não é líquida e certa como colocado na modelagem financeira do empreendimento, pois o
número de PDPs em fase de assinatura do contrato ainda é baixo em relação ao total da carteira e
tanto o MS quanto este Tribunal partem do entendimento que as aquisições por parte do MS devem
ser feitas observando a vantajosidade econômica da aquisição.
b) Estudo de demanda - Incertezas relativas à aquisição de novos produtos pelo MS
42. Sobre as incertezas relativas à aquisição de novos produtos pelo MS, Bio-Manguinhos
afirmou que não pode concordar com o apontado no relatório, pois é parceiro estratégico do órgão
no Programa Nacional de Imunizações. Apresentou gráficos de faturamento dos últimos dez anos, de
forma a demonstrar o aumento ocorrido e a estabilidade na política de preços de biofármacos junto
ao MS (peça 299).
43. Bio-Manguinhos ainda afirmou que tramita entre a Fiocruz e o MS, nota técnica para
formalizar a continuidade do projeto, de modo que seria um contrassenso o governo avalizar um
projeto dessa monta para não fazer uso de suas finalidades institucionais. Porém, tal nota técnica não
foi juntada aos autos.
44. Entretanto, a despeito de não ter juntada a nota técnica, cabe pontuar que Bio-
Manguinhos juntou aos autos o Ofício 38/2021/DATDOF/CGGM/GM/MS, de 14/1/2021, do Ministro
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de Estado da Saúde, Eduardo Pazuello, reiterando a importância estratégia da construção do NCPFI


já prolatada na Portaria nº 3.876/GM/MS, de 6/12/2018 (peças 326 e 327).
45. Com tal manifestação, o MS reconhece a importância social e de adequação para o
regular funcionamento das instalações de produção de vacina e biofármacos de Bio-Manguinhos,
porém, percebe-se, em relação à validação quantitativa do EVTE, que o MS ainda projeta sua
demanda para apenas um ano. Dessa forma, Bio-Manguinhos/Fiocruz, mesmo dentro de suas
limitações, promoveu os acertes de projeção de demanda futura baseada em sua expertise e dados
históricos.
46. Assim, cabe razão a Bio-Manguinhos, dado ao horizonte de apenas um ano na previsão de
compra do MS, em utilizar da sua expertise e dados históricos para a projeção de demanda de longo
prazo.
c) Estudo de demanda - Incertezas quanto à possibilidade de exploração de atividade econômica
47. Sobre as incertezas quanto à possibilidade de exploração de atividade econômica pela
Fiocruz, Bio-Manguinhos destacou que a exportação de imunobiológicos por meio da Fiotec é
permitida pela Lei 13.801/2019.
48. Cabe trazer para discussão o texto da lei citada:
‘Art. 1° O art. 1º da Lei nº 8.958, de 20 de dezembro de 1994 , passa a vigorar acrescido do seguinte §
3º-A:
§ 3º-A. No caso da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), na condição de ICT, o convênio ou contrato
com a fundação de apoio, de que trata o caput deste artigo, poderá abranger o apoio a projetos de
produção e fornecimento de vacinas, medicamentos e outros insumos e serviços para a saúde, nos
termos das competências da Fiocruz, aplicando-se a esses projetos o disposto no § 1º do art. 3º desta
Lei.
O § 1º do art. 3º da Lei 8958/94, a que se refere o parágrafo acima diz que:
Art. 3º Na execução de convênios, contratos, acordos e demais ajustes abrangidos por esta Lei que
envolvam recursos provenientes do poder público, as fundações de apoio adotarão regulamento
específico de aquisições e contratações de obras e serviços, a ser editado por meio de ato do Poder
Executivo de cada nível de governo.
§ 1º As fundações de apoio, com a anuência expressa das instituições apoiadas, poderão captar e
receber diretamente os recursos financeiros necessários à formação e à execução dos projetos de
pesquisa, desenvolvimento e inovação, sem ingresso na Conta Única do Tesouro Nacional.’
49. Quanto a essa possibilidade de exportação, destaca-se que a metodologia como as
receitas/lucros provenientes das exportações apuradas pela Fiotec retornará para a Fiocruz se mostra
sensível nesse modelo de negociação desenhado, pois no caso em tela a Fiocruz seria a entidade
(pessoa jurídica) de fato quem estaria realizando a exportação e a Fiotec entraria como apuradora da
receita, de modo que o valor não passaria pela Conta Única do Tesouro.
50. Tal mecanismo de apuração de receitas já foi objeto de análise pelo TCU, que firmou
entendimento de que a apropriação das receitas próprias advindas de exportações deve ser realizada
por meio da conta única do Tesouro Nacional, adequando-as à sistemática adotada às receitas
públicas, conforme preconizam o art. 56 da Lei 4.320/1964 e o art. 2º do Decreto 93.872/1986
(Acórdãos 917/2017-TCU-1ª Câmara e 2.008/2017-TCU-Plenário). O monitoramento e discussão
desse tema estão sendo tratados no âmbito no TC 033.932/2017-4.
51. Entretanto, os acórdãos supracitados firmaram entendimento antes da edição da Lei
13.801/2019 que possibilitou expressamente que a Fiocruz utilize fundação de apoio para o

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fornecimento de vacina e medicamento. Viabilizando inclusive a apuração da receita fora da Conta


Única do Tesouro Nacional.
52. Logo, a possibilidade de apropriação de receitas oriundas de exportação via fundação de
apoio, após a edição da Lei 13.801/2019, passou a ser tema aceito juridicamente.
53. Ressalta-se, entretanto, que, com a possibilidade de exportação via Fiotec, há a
necessidade de fortalecimento das estruturas de controle na sistemática que será implementa para a
apuração da receita proveniente dessa atividade, dado que tal receita não transitará pelos cofres da
União. Esse tópico não foi tema da presente auditoria e será tratado no âmbito do TC 033.932/2017-
4.
d) Ausência de estudo de alternativas
54. Sobre as falhas no estudo de alternativas para atendimento da finalidade do objeto,
registra-se que a Fiocruz não se manifestou. Reitera-se aqui que, durante a auditoria, o Ministério da
Saúde se manifestou sobre a necessidade de apresentação, por parte da Fiocruz, de estudo avaliando
a possibilidade de utilizar outros modelos, além do built to suit, para viabilização do projeto (peça
211).
55. Para demonstrar a importância de um estudo de alternativas, citou-se, como exemplo de
outros modelos, a execução indireta de obra. Apesar de a Fiocruz informar que não há recursos no
momento para essa escolha, somente o valor que deve ser aportado no fundo garantidor da operação
built to suit no primeiro ano de contrato é suficiente para cobrir 18,5% do valor total do custo obra,
conforme dados informados no modelo de financiamento (peça 50). Ao se somar o aluguel anual a ser
pago (R$ 459 milhões), verifica-se que seriam suficientes para cobrir os custos de construção apenas
4 anos e meio das parcelas de aluguel. Portanto, apesar da falta de manifestação da Fundação, a
falha no estudo de alternativas deve ser ressaltada como um problema ao EVTE e à motivação dos
atos.
56. Nesse ponto, em termos de análise econômica/financeira do EVTE, cabe destacar que este
Tribunal já se debruçou sobre essa modelagem, mapeou riscos e identificou fragilidades, oferecendo
pontos de atenção a Bio-Manguinhos/Fiocruz.
57. Superada a necessidade de adequação econômica/financeira do projeto exposta no EVTE,
restou por evidenciado, no decorrer da auditoria, a inegável importância social do empreendimento,
inclusive para adequação de Bio-Manguinhos/Fiocruz às normas exigidas pela Anvisa.
58. Soma-se a nova realidade, produzida pela crise sanitária decorrente da pandemia do novo
coronavírus, que expôs a sensibilidade da saúde pública dos países a uma hipossuficiência na
produção de imunizantes. Nesse novo cenário, se levada para o EVTE a carteira de vacinas de Covid-
19, é possível que tenha saldo positivo em uma modelagem por Fluxo de Caixa Descontado (FCD).
59. Consta informar ainda que, no dia 8/2/2021, foi publicado no Portal de Compras do
Governo Federal (Comprasnet, http://www.comprasnet.gov.br/acesso.asp?url=/edital-254445-99-
00001-2021) o edital de licitação do RDC PRESENCIAL Nº 1/2021 que tem como objeto:
“Contratação de investidor para construção de imóvel, pelo regime BTS (construção sob medida),
para operação do Novo Centro de Processamento Final - NCPFI, pelo Instituto de Tecnologia em
Imunobiológicos-Bio-Manguinhos/Fiocruz, contemplando a execução das obras de construção,
montagem dos equipamentos de produção adquiridos pela Fiocruz e o fornecimento de equipamentos
de utilidades e materiais”.
60. Logo, a despeito de ainda restarem os riscos elencados, considerando todo esse cenário
do EVTE descrito acima, a publicação do edital e com base na nova metodologia adotada a partir da
Resolução-TCU 315, de 22 de abril de 2020, compreende-se não ser mais aplicável a reiteração da

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determinação constante no item 9.2.1 do Acórdão 2.687/2018-TCU- Plenário, no sentido de se


apresentar novo estudo de viabilidade.
61. Entende-se que, com a manifestação do MS sobre a importância estratégia da construção
do NCPFI (peça 326), restou confirmado que o Ministério reconhece a necessidade da construção do
empreendimento tanto para atender as exigências de produção das agências reguladoras (Anvisa e
agências internacionais) como para adequação da produção de vacinas e imunobiológicos.
62. Cabe, porém, com a finalidade de contribuir para o aperfeiçoamento da gestão de
contratações futuras da Fiocruz, dar ciência à jurisdicionada que as contratações no modelo built to
suit devem ser precedidas de estudo de alternativas, destacando-se o custo-benefício de cada
alternativa levantada do ponto de vista dos riscos envolvidos, dos valores a serem desembolsados e
demais vantagens e desvantagem verificadas, consoante o disposto no Acórdão 1.301/2013-TCU-
Plenário.
63. Finalizando, a despeito de não mais reiterar as determinações, pontua-se alguns riscos
decorrentes das análises proferidas nesse achado.
64. Primeiro que o planejamento de apenas um ano do MS para compras de vacinas e
biofármacos se mostra temerário na gestão do PNI e no atendimento das demandas do Sistema Único
de Saúde (SUS), à medida que prejudica o planejamento das ações dos órgãos produtores e
fornecedores dos produtos.
65. Outro risco se consubstancia na necessidade de estabelecimento de mecanismos
adequados de controle internos, por parte de Bio-Manguinhos/Fiotec, para a apuração das receitas
provenientes da exportação que será apurada na conta da fundação de apoio (Fiotec) não transitando
assim pela Conta Única do Tesouro.
Achado III.2-Preço de aluguel inadequado devido a falhas no orçamento da obra – IGC (peça 276, p.
22-28)
66. A modelagem financeira foi idealizada sob a perspectiva de composição de um fundo de
investimento imobiliário (FII) como forma de consecução do empreendimento e prevê, a um custo
médio ponderado de capital (CMPC) de 8,09% ao ano, um período total de execução da obra de 5
anos e mais um período máximo de 15 anos para amortização dos investimentos, o que totalizaria 20
anos de tempo máximo de projeto. Ao final do período o imóvel será revertido à Fiocruz.
67. O valor mensal a ser pago ao fundo é composto por uma parcela referente à reversão do
imóvel para o órgão e outra referente ao aluguel. A parcela referente à reversão é calculada, de
acordo com a modelagem financeira, com o objetivo de arcar com o pagamento dos custos dos
investimentos reversíveis (R$ 2,695 bilhões, data-base: dez/2018) e a parcela de aluguel se refere à
remuneração do FII.

68. A composição dos investimentos reversíveis, calculada com base no valor de construção
previsto na planilha orçamentária, totaliza um custo de R$ 2.695.005.652,58 (data base: dez/2018) e a
parcela de aluguel mensal representa 0,9% desse custo total do empreendimento.
69. Ao final dos 20 anos, o total de desembolsos será de R$ 7,3 bilhões para a amortização
completa dos investimentos. Destaca-se que os valores desembolsados mensalmente ainda serão

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corrigidos anualmente pelo Índice Geral de Preços - Mercado (IGP-M) divulgado pelo Instituto
Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV).
70. A evidenciação do achado relacionado à projeção inadequada de preço de aluguel devido
às falhas no processo de orçamentação da obra decorre das impropriedades detectadas na
composição do valor corrente mensal máximo e na composição dos investimentos reversíveis.
71. Iniciando pela composição do valor corrente mensal máximo, entendeu-se que, no modelo
de financiamento definido, em que há a reversão do imóvel para a autarquia ao final do período
contratual, as parcelas mensalmente pagas não se referem a um aluguel propriamente dito, mas sim a
uma amortização financeira (uma parcela refere-se ao pagamento de juros e outra à reversão),
assemelhando-se a uma operação de crédito e devendo-se comportar como tal. Logo, a parcela do
pagamento mensal intitulada “Aluguel mensal” seria na verdade juros.
72. Outrossim, relatou-se que a escolha do modelo de financiamento via FII não foi
acompanhada de motivação embasada em análise comparativa com outros modelos.
73. Já as impropriedades na composição dos investimentos reversíveis decorrem da utilização
de unidade de “Rateio” (RT), utilização de metodologia de cálculo de BDI não amparada por esse
Tribunal, e atualização de preço de serviços, para um horizonte de mais de 3 anos, por meio de índice
de preço (Índice Nacional de Custo da Construção – INCC).
74. De acordo com Bio-Manguinhos, “a abreviação "RT" constante da planilha em
referência, bem como nas demais ocasiões em que é utilizada no procedimento, significa "Rateio",
ensejando a expressão "rateio de valores" (evidência 22, p. 1). A adoção da unidade de medida “RT”
não encontra amparo legal em nenhum normativo, nem mesmo pode ser considerada unidade. Nota-se
que foi feita uma distribuição de um valor total orçado entre as edificações que compõem o complexo.
75. Quanto ao BDI, esse foi dividido em BDI para mão de obra (evidência 23) e BDI para
materiais (evidência 24). Porém, alguns serviços da planilha não apresentam cotação dividida entre
mão de obra e materiais, logo, nesses serviços foi adotado um critério em que se atribuí um rateio de
custo do serviço em 20% para mão de obra e 80% para materiais seguindo, de acordo com Bio-
Manguinhos, em atenção à Instrução Normativa 971/2009 da Receita Federal (evidência 22, p.1-2).
76. Entendeu-se ainda que as determinações exaradas nos itens 9.2.2, 9.2.3 e 9.3 do Acórdão
2.687/2018 – TCU – Plenário, que tratam de reiteração das determinações efetuadas no Acórdão
2.008/2017-TCU-Plenário, que também versam sobre impropriedades da planilha orçamentária,
permanecem pendentes de atendimento.
77. Diante das inconsistências na orçamentação, que impossibilitaram verificar a
adequabilidade do orçamento da obra, e considerando que na nova metodologia apresentada para
adoção do modelo built to suit, o valor do custo da obra representa o componente principal, a partir
do qual é calculado o valor mensal a ser pago por Bio-Manguinhos, efetuou-se, apenas com o intuito
de evidenciar a sensibilidade da orçamentação nos desembolsos, uma análise paramétrica das
edificações que compõem o projeto. Foram utilizadas para cálculo as edificações que não se se
revestem de especificidades inerentes de plantas fabris farmacêuticas, com por exemplo: restaurante,
guaritas, prédios administrativos etc. (esse conjunto de edificações foi nomeado no relatório como
“edificações ordinárias”).
78. O conjunto de edificações analisado representa 13% do total do orçamento e, na análise
paramétrica, foi utilizado como referência o Custo Unitário Básico de Construção (CUB/m2). Como
resultado, apesar da baixa representatividade da amostra, observou- uma variação de 170% frente ao
valor orçado.
79. Soma-se a isso o fato de que para os itens dos “Serviços Adicionais”, constantes na
planilha orçamentária, que se revestem de um caráter de mero fornecimento, como mobiliário,
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instalação, montagem e fornecimento, não foi aplicada uma taxa de BDI diferenciado, conforme
entendimento disposto no § 1º do art. 9º do Decreto 7.983/2013 e constante do Acórdão 2.622/2013-
TCU-Plenário.
80. A equipe promoveu a adaptação da planilha orçamentária dos “Serviço Adicionais’ com a
utilização de um BDI de 16,10%, estabelecido no Acórdão 2.622/2013 – TCU-Plenário, e constatou
uma diferença de aproximadamente 3% em relação ao valor orçado por Bio-Manguinhos.
81. Finalizando, a equipe demonstrou a sensibilidade da modelagem econômico-financeira a
um sobrepreço na planilha orçamentária. Menciona-se que 10% de variação no orçamento poderia
impactar em mais de R$ 475 milhões ao longo do projeto.
82. Outro ponto que sensibiliza a modelagem econômico-financeira é o Custo Médio
Ponderado de Capital (CMPC) aplicado ao projeto de 8,09% a.a. Verificou-se que uma variação de
1% no CMPC pode ocasionar impacto da ordem de R$ 700 milhões ao longo do projeto.
Manifestação Fiocruz (peça 293, p. 12-33)
83. Quanto às falhas no orçamento da obra, a Fiocruz iniciou sua argumentação trazendo
uma lista de índices de preços com seus conceitos e variações para o horizonte de tempo utilizado na
atualização dos preços orçados (jul/2015 a dez/2018).
84. Foram elencados: o Índice Nacional de Custo da Construção do Mercado (INCC-
M/FGV); o Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M/FGV); o Índice de Preços ao Consumidor
Amplo (IPCA/IBGE); o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC/IBGE); e o Índice Geral de
Edificações (IGE) calculado pela Fipe e publicado pela Secretaria de Fazenda do Estado de São
Paulo.
85. Da análise comparativa dos índices, a Fiocruz contra-argumentou que a adoção de um ou
outro índice pouco afetaria a atualização de preço dos itens da planilha orçamentária.
86. Prosseguiu ainda afirmando que a adoção de atualização de preço via índice só foi
proferida nos itens que não tinham: composição de preços unitários no Sinapi, ou composição de
preços unitários do informativo SBC ou itens com cotação de preços com fornecedores e fabricantes
estrangeiros.
87. Por fim, na argumentação da utilização do INCC, a Fiocruz declara que o índice eleito
representa a coletânea da variação dos custos agregados aos processos da construção civil e está em
consonância com o publicado na Cartilha TCU Referência Obras Públicas 2014, em seu parágrafo
"2.11.2 Temporalidade", logo o uso de um índice setorial de uso nacional, publicado por entidade de
incontestável seriedade é plenamente aceitável por permitir boa aproximação econômica no cálculo
da atualização monetária e em sintonia com as variações de custos setoriais típicos da construção
civil.
88. Avançando, a Fiocruz apresentou alegação para a baixa porcentagem de itens cotados
utilizando o Sinapi. De acordo com a Fundação, os relatórios integrantes do Sinapi abrangem
insumos de materiais, mão de obra, equipamentos e composições, que representam os serviços mais
frequentes na construção civil (e de baixo padrão de complexidade técnica).
89. E, robustecendo a argumentação, trouxe excerto do Decreto 7.983, de 8 de abril de 2013.
‘Art. 3º O custo global de referência de obras e serviços de engenharia, exceto os serviços e obras de
infraestrutura de transporte, será obtido a partir das composições dos custos unitários previstas no
projeto que integra o edital de licitação, menores ou iguais à mediana de seus correspondentes nos
custos unitários de referência do Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção
Civil - Sinapi, excetuados os itens caracterizados como montagem industrial ou que não possam ser
considerados como de construção civil.
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(...)
Art. 6º Em caso de inviabilidade da definição dos custos conforme o disposto nos arts. 3º, 4º e 5º, a
estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados contidos em tabela de
referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da administração pública federal em
publicações técnicas especializadas, em sistema específico instituído para o setor ou em pesquisa de
mercado.’
90. No caso concreto do NCPFI, a Fundação conclui que somente com o auxílio de
composições de preço não originários do Sinapi, ou seja, de instituições de engenharia de custos
tradicionais do setor de construção civil e de pesquisas de mercado de preços referenciais junto a
fabricantes e fornecedores que atendem a este padrão de projeto industrial, é possível calcular o valor
estimado do CAPEX em questão.
91. Já sobre a utilização da unidade “RT” (Rateio), a Fiocruz alegou que utilizou
metodologia aplicada aos rateios técnicos para as disciplinas cujas cotações não forneceram custos
por prédio ou infraestrutura do complexo NCPFI.
92. Prosseguiu apresentando a distribuição dos quantitativos não cotados individualmente
para os seguintes sistemas prediais/industriais: HVAC; Elétrica e serviços afins; Montagem
Eletromecânica; Teledata (dados e voz); ACS (Controle de Acesso); CFTV; SDA I (Sistema de
Detecção e Alarme de Incêndio) e Combate a Incêndio; e Instalações Hidrossanitárias. E embasou a
utilização da unidade (“RT”) em previsão preestabelecida na “Cartilha TCU”, adotando a
metodologia paramétrica para a alocação dos valores por edificação ou infraestrutura.
93. Em relação ao método de composição do BDI em dois, um para materiais/equipamentos e
outro para mão de obra, e a incidência dos percentuais de 80% para materiais e equipamentos e de
20% para mão de obra, referente a cotações e pesquisas de mercado que não apresentaram essa
segregação em suas tabelas de custo, a Fiocruz argumentou que a metodologia foi utilizada com base
em indicações proferidas no bojo do Acórdão TCU 2.369/2011-Plenário, de 31/8/2011, relator
Ministro Marcos Bemquerer.
94. Ainda, a Fundação afirmou que essa atribuição de percentuais segue um conceito do
“Teorema de Pareto” e encontra respaldo na Instrução Normativa 971/2009, da Receita Federal do
Brasil.
95. Continuando, a Fiocruz trouxe argumentação detalhando a origem e forma de aplicação
do CUB como índice de referência de custo de obra. Concluiu que a utilização do CUB em uma
análise comparativa de todo o projeto do NCPFI não se mostra adequada dada a falta de aderência
técnica entre os projetos arquitetônicos e de engenharia complementar do NCFPI e os da NBR 12721
(norma que define a aplicação do CUB/m2), registrando ser inadequado aplicar qualquer relação de
custo utilizando os índices do CUB/m2 no corpo das planilhas orçamentárias do CAPEX em tela,
motivo pelo qual não se pode inferir pela falha no orçamento sem que sejam considerados os
argumentos técnicos ora expostos.
96. Por fim, foram encaminhados o CAPEX atualizados (peça 306), a modelagem financeira
do empreendimento (peça 307) e a nota técnica da modelagem financeira elaborada pela FGV (peça
308). Todos atualizados.
Análise
97. Quanto à seleção do INCC como índice para atualização dos custos dos itens orçados em
detrimento a outros índices (IPCA, IGP-M, INPC etc), não foi feito apontamento pela equipe de
auditoria no achado em tela. O que de fato foi questionado foi o risco de os custos atualizados via
INCC após mais de 3 anos propiciarem distorções no custo final do empreendimento. Logo, o
apontamento deste achado versou sobre a utilização de índices de preço na atualização de custo de
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itens que foram obtidos via cotação de mercado, em vez de serem feitas novas cotações, sendo assim
essa parte das alegações do jurisdicionado não justificou o que de fato foi elencado.
98. Adentrando de fato no que foi relatado pela equipe de auditoria, o jurisdicionado
respaldou a atualização de custos via INCC em orientação contida na “Cartilha TCU Referência
Obras Públicas 2014”, em seu parágrafo "2.11.2 Temporalidade".
99. A “Cartilha TCU Referência Obras Públicas 2014” se refere a publicação “Orientações
Para Elaboração de Planilhas Orçamentárias De Obras Públicas” (disponível em <
https://portal.tcu.gov.br/biblioteca-digital/orientacoes-para-elaboracao-de-planilhas-orcamentarias-
de-obras-publicas.htm>, consultado em 25/8/2020) e traz a definição de Temporalidade utilizado pelo
jurisdicionado em suas alegações.
‘2.11.2 Temporalidade: Os valores orçados tornam-se defasados ao longo do tempo. Tal fato ocorre
tanto em função da perda do poder aquisitivo da moeda (inflação), quanto em função de flutuações de
preços dos insumos, alterações tributárias, evolução dos métodos construtivos, bem como diferentes
cenários financeiros e gerenciais, que limitam no tempo a validade e a precisão de um orçamento. Em
regra, quanto mais tempo transcorrer após a elaboração do orçamento, menor será a sua precisão na
estimativa do custo efetivo da obra. Assim, o orçamento tem sua validade associada a uma
determinada data-base. O decurso do tempo pode exigir a incorporação de novos parâmetros e a
necessidade de realizar ajustes financeiros. Ou seja, a adequação do orçamento para data-base
posterior não é somente função da correção monetária. As flutuações dos preços dos insumos não
devem ser desprezadas, assim como as modificações e a obsolescência de equipamentos, que podem
alterar suas produtividades e respectivos custos de propriedade. Assim, as correções de preços por
índices em períodos demasiadamente longos nem sempre reproduzem as exatas condições da obra na
época que será efetivamente realizada.’
100. Ora, o próprio conceito trazido pelo jurisdicionado reafirma o apontamento da equipe e
evidencia o risco de que atualizações de custo via índice em um lapso temporal considerável pode
acarretar um orçamento distorcido.
101. Nesse ponto, vale reiterar que o apontamento nesse quesito, da atualização via cotação
atualizada de preço em vez de atualização de cotações antigas por índice de preço, não tem o condão
de determinar uma diminuição dos custos orçados, mas, sim, de propiciar uma melhor estimativa de
custo para a implementação do empreendimento. Cabe esclarecer que custos subestimados também
são impropriedades, pois tal subestimação pode acarretar obra inacabada, aditivos contratuais,
licitação deserta e qualidade deficiente na execução da obra, gerando, por conseguinte, prejuízo à
Administração Pública.
102. Pelo exposto, o risco inerente da atualização via INCC dos custos obtidos via cotação de
mercado permanece.
103. Quanto à baixa utilização do Sinapi, a argumentação trazida pela jurisdicionada no
sentido de que a utilização do sistema oficial de referência de preço se mostra limitada dada a
complexidade da planta fabril do NCPFI (por se tratar de projeto único de produção de vacinas e de
biofármacos), se mostra razoável.
104. Em análise já proferida no bojo do relatório de auditoria, restou evidenciado que 97% da
amostra que compunha a curva ABC eram oriundas de cotação de preço junto aos fornecedores (peça
264). Em nova análise da curva ABC do CAPEX apresentado (peça 306), constatou-se que a
representatividade de itens provenientes de sistemas oficiais de preço é de aproximadamente 14% da
amostra, o que equivale a aproximadamente R$ 280 milhões (peça 325).
Tabela 1 representatividade amostra da curva ABC CAPEX.
DESCRIÇÃO MONTANTE REPRESENTATIVIDADE
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TOTAL DE ITENS OBTIDOS POR R$ 1.767.247.154,95 86,30%


COTAÇÃO
TOTAL DE ITENS OBTIDOS POR R$ 280.788.682,10 13,71%
SISTEMAS OFICIAIS DE PREÇO
(SINAPI-RJ, ORSE, EMOP)
TOTAL DA AMOSTRA R$ 2.048.035.837,05 100%
Fonte: elaboração própria a partir do CAPEX (peça 306).
105. Logo, em decorrência da especificidade da planta fabril do NCPFI, a utilização do Sinapi,
bem como de demais sistemas de preços oficiais, restou prejudicada.
106. Já a argumentação da utilização da unidade de rateio (“RT”) embasada na metodologia
paramétrica definida na “Cartilha TCU” não merece prosperar.
107. Novamente a utilização da “Cartilha TCU” se refere à publicação “Orientações Para
Elaboração de Planilhas Orçamentárias De Obras Públicas”. Na Orientação consta que quando
adotado a metodologia paramétrica (páginas 123-125) na orçamentação o rateio é feito utilizando-se
unidade representativa, como por exemplo: Tonelada de Refrigeração (TR) no caso de ar-
condicionado.
108. Cabe, porém, reconhecer que na resposta apresentada por Bio-Manguinhos consta a
distribuição por prédio da carga instalada (peça 293, p. 20-28), porém no novo CAPEX (peça 306)
apresentado não consta mais a divisão por prédio, bem como, não constam as unidades, os
quantitativos nem os custos unitários dos itens, apenas o valor global dividido em mão de obra e
materiais.
109. Logo, pelo exposto, entende-se que a utilização de unidade genérica “RT” para alocação
de custo por edificação não se mostra adequada e propicia distorções na leitura da planilha
orçamentária, porém, no caso concreto, infere-se que a utilização de tal unidade reveste-se de erro
formal, pois a jurisdicionada fez a divisão da carga instalada por prédio (como consta na resposta do
ofício) e apenas não adotou tal metodologia na formulação da planilha orçamentária apresentada
(CAPEX).
110. Porém, restou prejudicada a evidenciação de que a correção da unidade “RT” seria
promovida no novo CAPEX (peça 306). Como já elencado acima, não consta no novo CAPEX as
unidades dos itens. Pelo exposto, persiste ainda a impropriedade na utilização da unidade de rateio
“RT” na planilha orçamentária (CAPEX).
111. Quanto à utilização de dois BDIs (para mão-de-obra e para materiais) e sua distribuição
em uma porcentagem de 80% para mão de obra e 20% para materiais nas cotações que não
trouxerem o BDI segregado, a Fiocruz argumentou que se baseia na IN 971/2009 da Receita Federal
do Brasil (RFB) e acrescentou que a sistemática ora adotada está respaldada no Acórdão 2.369/2011-
TCU-Plenário.
112. Ocorre que a IN 971/2009 da Receita Federal traz essa repartição para fins tributários e
não de orçamentação, assim, o rateio dos serviços da forma processada insere na planilha
orçamentária um grau de incerteza na formação dos preços desses itens.
113. Em termos de orçamentação de obras, existem apenas duas modalidades de BDI: uma que
incide sobre os serviços (material e mão de obra); e outra, denominada diferenciada, que incide
apenas sobre os itens de mero fornecimento e de relevante materialidade em relação ao orçamento de
obra, conforme preceitua o Acordão 2.622/2013-TCU-Plenário (conhecido por estabelecer faixas de
parâmetros para os BDIs nas mais diferentes tipologias de obra) e no Decreto 7.983, de 8 de abril de

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2013. Exemplificativamente esse mero fornecimento representa uma compra simples do item junto ao
fornecedor que entrega o item na obra.
114. Logo, persiste a inconsistência de divisão do BDI em mão de obra e materiais.
115. Com relação à análise comparativa do projeto do NCPFI e à metodologia definida na
NBR 12721 (norma que define a aplicação do CUB/m2), cumpre realizar algumas considerações,
algumas já postas no relatório de auditoria.
116. A comparação não foi realizada para todo o projeto do NCPFI, mas sim para as
edificações ditas ordinárias, que não se revestem de especificidades de plantas fabris (como por
exemplo: restaurante, guaritas, prédios administrativos etc.).
117. No mais, a análise comparativa foi promovida seguindo todas as determinações da
NBR 12721, buscando diminuir ao máximo as distorções propiciadas pela não contemplação, no
cálculo do CUB, de elementos construtivos capazes de elevar consideravelmente o custo das
edificações, como por exemplo elevadores e ar-condicionado.
118. Enfim, reitera-se aqui que a análise via CUB não teve o propósito de imputar
impropriedades na orçamentação do empreendimento, mas de chamar a atenção para a gravidade de
não ser possível avaliar o orçamento apresentado, uma vez que ficou demonstrado o impacto que uma
variação no preço orçado pode causar no valor do aluguel.
119. Conforme discutido na presente análise, os argumentos trazidos por Bio-Manguinhos não
conseguiram solucionar todos os apontamentos proferidos pela equipe de auditoria. Coube razão à
jurisdiciona quanto à especificidade do projeto do NCPFI, o que propicia dificuldades justificáveis na
utilização dos sistemas oficiais de preço, bem como, inferiu-se que a utilização da unidade “RT” para
o rateio dos quantitativos não cotados individualmente para algumas edificações do complexo
caracterizou-se como falha formal na apresentação do CAPEX.
120. Porém, as atualizações via índice de preço das cotações obtidas há mais de 3 anos junto
aos fornecedores propiciam riscos de imprecisão à orçamentação, o que, junto à segregação do BDI
em materiais e mão de obra, persiste como impropriedade na orçamentação da obra.
121. Por fim, vale reiterar que o novo CAPEX (peça 306) ainda apresenta falhas na sua
formulação como ausências de unidades, de quantitativos, de preço unitário e de composição de
preços unitários (CPUs). Também não foi identificada no CAPEX a ART do orçamentista.
122. Tais fatos inserem mais risco ao processo pois, como explicitado, o valor total do
investimento projetado possui grande sensibilidade em relação à orçamentação, podendo
proporcionar variações expressivas nos desembolsos a serem efetuados no decorrer do contrato e um
risco de prejuízo aos cofres públicos. Por isso, há inconsistências que não permitem avaliar a
comprovação de economicidade do objeto.
123. Assim, permanece o entendimento de considerar não atendidos os itens 9.2.2 e 9.3 do
Acórdão 2.687/2018-TCU-Plenário.
124. Pontua-se, porém, que as determinações supra tinham o condão de aprimorar a minuta de
edital, propiciando uma mitigação de riscos. Dado a atual estágio da contratação do objeto (edital já
publicado) e dado que o modelo BTS, em teoria, não exige um detalhamento orçamentário nos moldes
exigidos pela lei 8.666/93, conforme exposto no anexo do Relatório de Auditoria, entende-se não ser
mais adequada a reiteração das determinações pendentes de implementação, cabendo assim, em
respeito a Resolução-TCU 315, de 22 de abril de 2020, cientificar a Fiocruz das falhas, alertando-a
para os riscos elencados.

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125. Cabe pontuar, ainda, que a despeito de o modelo BTS não exigir um orçamento detalhado,
foi realizada uma licitação para contratação de empresa para elaboração do projeto executivo e foi
realizado o aceite de um projeto com falhas que são objeto de apontamento pelo TCU desde 2016, sem
as devidas correções. Eventuais responsabilidades relacionadas ao orçamento poderão ser analisadas
no âmbito do processo de auditoria em aberto (TC 017.376/2016-5), que avaliará entre outros itens a
regularidade do contrato 104/2012, celebrado com a empresa IPS – Integrated Project Services Inc.,
para elaboração do projeto executivo da obra.
Achado III.3-Riscos relacionados à aplicação do modelo Built to suit - F/I (peça 276, p. 28-37)
126. Os riscos relacionados à aplicação do modelo BTS se dividem em: falta de
regulamentação; ausência de instrumento orçamentário apropriado e possível impacto nas regras
fiscais; e fragilidade no modelo de garantia previsto.
127. Quanto à falta de regulamentação, apontou-se que a previsão legal existente expõe o
modelo built to suit a riscos de concepção e implica em insegurança jurídica, pois permite que cada
órgão faça uma interpretação diferente do único artigo no ordenamento jurídico que trata do tema.
Foram demonstrados os riscos referentes às possíveis interpretações para o limite do aluguel mensal
disposto no § 3º, art. 47-A, da Lei do RDC e sobre a forma de atualização contratual (parágrafos 174
a 192 da peça 276).
128. Sobre a suficiência dos instrumentos orçamentários para autorizar o investimento e
garantir recursos ao pagamento dos aluguéis, verificou-se que o desembolso financeiro por parte da
administração pública somente será iniciado após 3 anos de início da obra (pagamento de 60% do
aluguel por 2 anos) e terá duração de 15 anos (com pagamento integral do aluguel), ou seja, o
instrumento orçamentário plurianual existente não é capaz de abranger o período total de desembolso
do projeto e registrar o valor total do investimento, conforme confirmado pelo Ministério da
Economia.
129. Como consequência, haverá possibilidade de celebração de um contrato cujo valor global
pode alcançar R$ 7,3 bilhões sem qualquer tipo de autorização orçamentária e legislativa
previamente à licitação, por falta de instrumento adequado, não sendo possível, inclusive, verificar o
cumprimento de outras regras fiscais dispostas na Lei de Responsabilidade Fiscal.
130. Outro ponto abordado diz respeito ao fato de que como o imóvel será revertido à
Administração ao final do período de amortização, a essência da operação pressupõe que mesmo que
o contrato seja definido como um aluguel sob medida, a despesa decorrente da reversão do bem deve
ser classificada como uma despesa de capital derivada de uma operação de crédito. Apesar de no
caso concreto o Ministério da Economia ter afirmado que não há materialidade significativa para
afetar regras fiscais como “Regra de Ouro” ou “Teto dos Gastos”, pois os limites são avaliados a
nível agregado de despesas primárias do Poder Executivo Federal, caso os demais órgãos da
Administração passem a adotar o modelo built to suit com reversão, poderá ser constituída uma
carteira significativa capaz de afetar tais regras.
131. Sobre esses dois pontos, as propostas de encaminhamento foram direcionadas aos
Ministérios da Economia, da Saúde, Casa Civil, bem como ao Congresso Nacional, a fim de alertá-los
sobre os riscos de insegurança jurídica e possíveis impactos orçamentários e fiscais identificados por
este Tribunal na aplicação do modelo built to suit.
132. Em relação ao último ponto, mais diretamente relacionado à Fiocruz, foram elencadas
fragilidades na previsão para utilização do Fundo Garantidor de Infraestrutura (FGIE) como
cobertura da operação.
133. De acordo com a minuta do contrato, cláusula 26.3, é prevista a cobertura de 12 meses de
aluguel via garantia locatícia contratada junto ao FGIE, porém, ficou evidenciado que não há

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possibilidade no regulamento do FGIE que permita ao fundo garantir operações de BTS. Para a
viabilização da operação, faz-se necessária a aprovação de um regulamento específico pelo Conselho
de Participação de Fundos Garantidores para Cobertura de Riscos em Operações de Projetos de
Infraestrutura de Grande Vulto (CPFGIE) e pela assembleia dos cotistas.
134. Portanto, entendeu-se não ser adequado a abertura de procedimento licitatório antes de
as regras do fundo estarem devidamente formalizadas, em virtude do aumento do risco associado a
essa questão ser precificado nas propostas dos participantes do certame.
135. Ainda em relação à garantia, foi questionada a cobertura de apenas 12 meses, o que
representa apenas 6% da duração total do contrato. Tal período foi considerado pequeno por
investidores em audiência pública, dado o horizonte de 20 anos do projeto.
136. Desta forma, as incertezas relacionadas à capacidade do órgão de manter o adimplemento
do contrato associadas à garantia de apenas 12 meses de aluguel inspira cautela por parte dos
investidores. Tal fato pode influenciar diretamente o valor das propostas, de forma a embutir no preço
apresentado o risco de inadimplemento, ainda mais considerando o elevado valor contratual.
137. Por fim, também foram identificados riscos relacionados à manutenção da garantia pelo
FGIE. Na configuração existente, apesar de o aporte inicial no fundo ser de responsabilidade do
Ministério da Saúde, eventuais recomposições decorrentes de utilização da garantia deverão ser
efetuadas por Bio-Manguinhos, conforme estabelecido na cláusula 26.6 da minuta do contrato. Assim,
a própria entidade que teria dado origem à inadimplência contratual seria o responsável por
recompor o saldo do fundo garantidor.
138. Pelo exposto, considerando os riscos envolvidos relacionados à formalização, suficiência
e recomposição do fundo garantidor, a equipe propôs determinar à Fiocruz que apresente a este
Tribunal a formalização da garantia locatícia pelo Fundo Garantidor de Infraestrutura (FGIE),
avaliando inclusive a conveniência e a oportunidade de rever as regras de recomposição do fundo em
caso de utilização, de forma a segregar responsabilidades, bem como de avaliar se a cobertura
oferecida é suficiente para reduzir o risco de afetar os preços das propostas de preço na licitação.
Manifestação Fiocruz (peça 294, p. 1-4)
139. Apesar de os riscos apontados acerca da falta de regulamentação do BTS e da ausência de
instrumento orçamentário apropriado não terem sido objetos de encaminhamento à Fiocruz, o órgão
fez considerações sobre o tema.
140. Inicialmente a Fiocruz se manifesta indo ao encontro do proferido pela equipe de
auditoria sobre a aplicabilidade do limite de 1% no valor pago a título de “aluguel” nos contratos de
BTS estabelecido no art. 47-A da Lei do RDC. A Fundação entende que tal limite é aplicável
exclusivamente ao valor do aluguel, não contemplando as hipóteses em que há reversão do bem ao
final do contrato, nas quais há um destaque necessário entre o valor da locação e o valor de reversão
da propriedade do bem imóvel locado.
141. Quanto ao enquadramento da despesa como despesa de capital, a Fiocruz recepcionou a
orientação e se manifestou no sentido de classificar a despesa como de capital, porém, a Fundação
refutou a semelhança do contrato a uma operação de crédito e a um arrendamento mercantil
(leasing).
142. Na sua argumentação, a Fiocruz enumera os fatores que torna a impossibilidade da
comparação (peça 294, p. 2):
i) O contrato não é firmado com instituição financeira e não é regulamentado pelo Banco
Central;

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ii) No caso em tela, a reversão do bem é obrigatória, ao passo que em arrendamentos


mercantis deve ser uma faculdade, sob pena de descaracterização do contrato para compra e venda,
conforme jurisprudência firme do STJ (Resp 163.845-RS);
iii) O imóvel é da União, portanto, não há aquisição da propriedade de um bem. Note-se que,
neste caso, haverá a reversão apenas da edificação, sendo que o terreno ficará na posse do locador
por meio de contrato de cessão de direito de superfície;
iv) A edificação se dará por meio de um contrato de empreitada, este sim, podendo ser
enquadrado como despesa de capital (investimento);
v) No caso em exame, não há configuração de uma operação de crédito. A remuneração é
diluída em um prazo maior, embutidos nos valores mensais o aluguel do edifício (pelo prazo da cessão
do direito de superfície) e a empreitada da edificação.
143. Quanto à ausência de instrumento orçamentário possível de prever a execução do
empreendimento, a Fiocruz alegou que o contrato do NCPFI se enquadra nas mesmas condições de
uma Parceria Público-Privada (PPP), se subjugando as condições exigidas no art. 10 da Lei 11.079,
de 30 de dezembro de 2004 (Lei das PPPs).
144. Com relação à falta de previsão no regulamento do FGIE para garantir operações do tipo
built to suit, a Fiocruz entende que o fato de o projeto ter sido incluído como projeto estratégico do
Ministério da Saúde já é suficiente para fundamentar a utilização do fundo como garantia. Mas
ratificou que ainda persiste um aparente impasse sobre a alteração do regulamento do fundo e, por
isso, solicitou posicionamento do Tesouro Nacional (peça 294, p. 4):
Assim, em vista do aparente impasse o Coordenador do Projeto do NCPFI solicitou posição do
Tesouro Nacional quanto ao firme propósito de encaminhar a proposta de alteração do regulamento
ao Conselho de Participação de Fundos Garantidores para Coberturas de Riscos em Operações de
Projetos de Infraestrutura de Grande Vulto - CPFGIE, no intuito de abranger a modelagem BTS, caso
a licitação do Novo Centro de Processamento Final - NCPFI obtenha êxito. No presente momento,
estamos aguardando referida manifestação. (grifos acrescidos)
145. Já em relação à suficiência da garantia, a Fiocruz argumenta que, para se avaliar tal
suficiência, não se pode afastar a possibilidade de utilização das receitas advindas das exportações de
Bio-Manguinhos/Fiocruz e reforçou que as receitas provenientes do Ministério da Saúde seguem o
trâmite orçamentário anual de acordo com a programação de ações para o período, sem grandes
variações ano a ano.
146. Por fim, no que se refere à recomposição do Fundo, foi proposta a definição do prazo de 3
meses em lugar da indeterminação observada pela equipe de auditoria, sempre no propósito de
ampliar a segurança jurídica que envolve a operação.
Análise
147. Quanto ao impasse em relação à classificação da despesa, cumpre salientar que o
apontamento posto no relatório buscou entender a categoria econômica da despesa, nesse sentido
solicitou um posicionamento da Secretaria do Tesouro Nacional, órgão competente em determinar
qual de fato é a classificação da despesa, porém, dado o ineditismo da execução de empreendimento
no modelo do BTS, não se obteve êxito na busca.
148. Nessa mesma linha seguiu o questionamento junto ao Tesouro Nacional sobre qual seria o
instrumento orçamentário adequado para a previsão do investimento de 20 anos com desembolsos
previsto para ocorrer apenas 3 anos após o início da obra. Novamente não houve uma resposta
conclusiva por parte do Tesouro.

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149. Logo, como consignado no relatório, a equipe mapeou os riscos decorrentes da falta de
instrumento orçamentário adequado para aprovação do empreendimento, da ausência de limites
adequados do valor das parcelas mensais denominadas de aluguel e sua forma de atualização, bem
como o risco de insegurança jurídica e possíveis impactos orçamentários e fiscais, e ofereceu um
diagnóstico prévio aos órgãos competentes alertando-os sobre a falta de regulamentação da
aplicação do modelo built to suit no setor público, especialmente para os contratos que prevejam
reversão do imóvel à Administração Pública ao final do período contratual.
150. Sendo assim, os riscos mapeados persistem. Logo, o encaminhamento da decisão aos
órgãos responsáveis ainda se mostra oportuno.
151. No tocante ao FGIE, especificamente em relação à desconfiança por parte dos
investidores sobre a capacidade de pagamento da instituição e ao pequeno prazo e baixo valor de
garantia, a Fiocruz insiste na possibilidade de utilização das receitas advindas das exportações de
Bio-Manguinhos/Fiocruz. Tal tema já foi tratado na análise das manifestações do Achado III.1, logo,
com a reformulação do entendimento (possibilitando que a Fiocruz promova exportação pela Fiotec),
cabe razão à manifestação apresentada pela jurisdicionada.
152. Entretanto reitera-se a necessidade de formulação dos mecanismos de controle interno
para mitigar os riscos na apuração da receita da exportação promovida pela Fiotec, bem como, o
estabelecimento da restituição do FGIE por parte dessas receitas.
153. Por fim, em relação ao risco de falta de cobertura locatícia devido a não definição de
prazo certo para recomposição do fundo em caso de utilização, a Fiocruz concordou com o
posicionamento da auditoria e efetuou alteração no edital estipulando prazo de 3 meses, conforme
disposto na nova minuta de contrato apresentada (peça 319, p. 31). Porém, não houve manifestação
acerca dos riscos apontados relacionados ao responsável por efetuar essa recomposição.
154. Quanto à possibilidade de consignação de garantia via FGIE, a Fiocruz reiterou a
incertezas na possibilidade de utilização do fundo garantidor nos modelos de built to suit, porém, a
Fundação demonstrou estar buscando uma solução conjunta com os gestores do FGIE para o impasse
sobre a alteração do regulamento do fundo (peça 294, p. 4).
155. Logo, a despeito de ainda persistir a impossibilidade de utilização do fundo, Bio-
Manguinhos/Fiocruz vem construindo conjuntamente com os gestores do FGIE mecanismos para a
efetivação da utilização do fundo.
156. Assim, dado o atual estágio da contratação (edital publicado), os encaminhamentos
promovidos pela jurisdicionada junto aos gestores do FGIE com o objetivo de sanar as pendências e
com base na nova metodologia adotada a partir da Resolução-TCU 315, de 22 de abril de 2020,
compreende-se não ser mais aplicável a proposição de determinação referente ao FGIE proferida no
bojo do relatório preliminar de auditoria (peça 276), mas sim cientificar a fundação dos riscos
relacionados à falta de regulamentação.
Achado III.4-Riscos identificados na minuta do edital que podem prejudicar a competitividade do
certame e o andamento contratual adequado - F/I (peça 276, p. 37-41)
157. Preliminarmente, frisa-se que o que foi ressaltado nesse achado é um risco potencial para
a licitação.
158. Foram constatadas duas situações que podem comprometer a competitividade da
licitação: (i) conflito de interesses no modelo de contratação da Fundação Getúlio Vargas (FGV)
para prestação de serviço de assessoria técnica e (ii) adoção de critérios inadequados de habilitação
e julgamento.
a) Conflito de interesses no modelo de contratação da Fundação Getúlio Vargas (FGV)

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159. O primeiro diz respeito à forma de remuneração da FGV para a elaboração dos estudos
de viabilidade e de modelagem financeira, e para a captação de possíveis licitantes.
160. A FGV foi responsável pela elaboração e definição da viabilidade econômica e financeira
do empreendimento e, depois, em um segundo contrato, desenvolveu a modelagem financeira segundo
a qual se executaria o projeto e ficou responsável pela prospecção dos potenciais investidores que
participarão do certame.
161. Especificamente no segundo contrato, a cláusula de remuneração dos serviços prestados
pela FGV firmou um preço de “2,25% sobre o total do valor do financiamento para implementação do
empreendimento”, sendo o pagamento de responsabilidade da vencedora do certame.
162. Ou seja, no cenário em que o custo de construção seria o orçamento estimativo (no valor
de R$ 2.490.037.887,23, data-base: dez/2018), a FGV receberia o valor de R$ 56.025.852,46, para a
estruturação do projeto de apoio. E ainda, o contrato dispõe que não cabe à Bio-Manguinhos
quaisquer ônus financeiros, a qualquer título, pelos serviços prestados, bem como registra que o
recebimento pela prestação de serviços depende exclusivamente do êxito do certame licitatório.
163. No contexto apresentado, o que se visualiza é um conflito de interesses da FGV em relação
à contratação pois, como somente haverá recebimento dos serviços prestados caso a licitação tenha
sucesso, a remuneração do segundo contrato depende diretamente de que o estudo de viabilidade
econômico-financeira do empreendimento seja favorável ao investidor, a fim de que se possa dar
continuidade à licitação.
164. Esse conflito ainda é acentuado ao se considerar que a remuneração da FGV, empresa
responsável pela elaboração da modelagem de financiamento, é obtida a partir de uma porcentagem
do valor do financiamento definido para implementação do empreendimento, o que na prática indica
que, quanto mais recursos a Administração Pública despender no valor do contrato, maior será a
remuneração da FGV, o que a coloca em objetivos opostos com o interesse público. Assim, resta claro
o risco de o estudo elaborado não ser condizente com a melhor alternativa para Bio-Manguinhos.
165. Em outra ponta, há também o risco de a FGV não ser remunerada pelo serviço prestado
caso a licitação não alcance êxito, caracterizado assim possível enriquecimento sem causa por parte
da Administração.
166. Entendeu-se que tais riscos poderiam ser minimizados caso o contrato previsse uma
remuneração atrelada à taxa de desconto da licitação, de modo que quanto maior for o desconto da
licitação, maior a remuneração a ser recebida pela FGV. Outra alternativa seria a estipulação de um
valor fixo a ser pago pelo serviço, a preços de mercado, sendo a responsabilidade pelo pagamento da
própria Bio-Manguinhos, pois, assim, o fator “incentivo” seria consideravelmente reduzido.
167. Adicionalmente, vislumbrou-se, como alternativa, a retirada do sigilo da licitação, de
modo que todos os possíveis participantes tenham acesso às informações que são repassadas durante
as reuniões de prospecção de investidores e reduza, assim, a assimetria de informações entre os
concorrentes.
168. Desta forma, propôs recomendar à Fiocruz que revise as condições de pagamento dos
serviços prestados pela FGV, de modo a reduzir o incentivo gerado de haver uma contratação
antieconômica. Também propôs-se recomendar a retirada do sigilo do orçamento de forma a se evitar
assimetria de informações entre os licitantes que poderiam ser provocadas pelas informações
repassadas nas reuniões de prospecção de investidores.
b) Critérios inadequados de habilitação e julgamento
169. Sobre os critérios de habilitação e julgamento, entendeu-se que a regra que exige a
comprovação de que a licitante tenha participado de empreendimento que tenha captado pelo menos
um bilhão de reais para cumprimento das obrigações financeiras assumidas, por meio de
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financiamentos de longo prazo, ultrapassa os limites da razoabilidade, pois pode impedir a


participação de uma empresa que tenha capital próprio suficiente para garantir a entrega do
empreendimento. Ademais não se verificou justificativa ou estudo que demonstre a adequabilidade da
exigência do valor de R$ 1 bilhão, não sendo possível verificar o quanto esse valor traz de benefício à
execução do objeto em detrimento da competitividade da licitação (peça 276, parágrafos 263 a 266).
170. Por fim, também se observou falta de clareza e objetividade na forma de análise das
propostas, pois o edital apenas afirma que serão classificadas por “ordem decrescente de
vantajosidade”, sem qualquer definição do que seria esse termo (peça 276, parágrafos 267 a 269).
171. Quanto aos dois pontos listados nos parágrafos precedentes, a equipe propôs dar ciência
a Fiocruz das inconsistências detectadas.
Manifestação Fiocruz (peça 294, p. 4-6)
172. Quanto ao eventual conflito de interesse na relação estabelecida entre Bio-
Manguinhos/Fiocruz e a FGV, a Fiocruz, na busca de mitigar o risco, estabeleceu um valor fixo para
a remuneração da FGV, porém esse valor foi definido no mesmo percentual pactuado (2,25%), tendo
como base de cálculo o valor nominal do orçamento da obra na data base de jul/15, representando um
valor fixo de R$ 48.862.022,33 (peça 310). Permanecendo ainda o pagamento condicionado ao
sucesso da licitação e de responsabilidade do vencedor do certame.
173. Quanto à adoção de critérios inadequados de habilitação e julgamento, a Fiocruz reitera
que a exigência para participação no certame de empresa que já tenha executado empreendimento no
qual captou pelo menos um bilhão de reais para cumprimento das obrigações financeiras assumidas
se mostra razoável, pois encontra-se em linha com a jurisprudência da Corte de Contas que, no caso
de obras, admite exigência editalícia de comprovação de quantidades mínimas de até 50% dos itens
de maior relevância na obra ou serviço.
174. No entanto, concordou com o Tribunal em relação aos demais riscos e efetuou alterações,
nas minutas de edital e de contrato, relacionadas à origem desse recurso de um bilhão de reais (se de
capital próprio ou de terceiros), ao critério de julgamento da proposta comercial, que passou a ser
considerado o “menor valor presente líquido”, bem como retirou o sigilo do orçamento conforme
peças 312 e 319.
Análise
175. Quanta à mitigação do conflito de interesse na atuação da FGV, verifica-se que a Fiocruz
fixou um valor a ser pago pela prestação do serviço, porém tal quantia ainda se encontra indexada
(2,25%) ao valor da orçamentação da obra na data base de jul/2015.
176. Na justificativa trazida por Bio-Manguinhos, o valor fixado deriva de “percentual previsto
em lei” (peça 294, p. 4), porém, a jurisdicionada não apresentou qual lei seria. Subentende-se, de
manifestação ainda proferida na auditoria, que a jurisdicionada insiste no entendimento de que ele se
encontra abaixo do limite estabelecido pelo Decreto 8.428/2015, que dispõe sobre o Procedimento de
Manifestação de Interesse (PMI), conforme peça 248, p. 311.
177. Entretanto, como já explanado no relatório de auditoria (peça 276, p. 39), a FGV foi
contratada diretamente por meio de dispensa de licitação, utilizando-se como embasamento o art. 24,
inciso XIII, da Lei 8.666/1993, conforme pareceres apresentados (peça 248, p. 294). Mas, para a
atribuição da remuneração dos serviços se ampara no decreto do PMI, ou seja, houve a aplicação de
diferentes legislações para justificar os atos.
178. Ademais, as cláusulas que condicionam o pagamento dessa remuneração ao sucesso da
licitação e atribuem a responsabilidade do pagamento ao vencedor do certame permanecem. Cumpre
reiterar que a unidade técnica apontou os riscos de que caso a contratação não logre sucesso a
instituição (FGV) ficaria sem receber os serviços prestados. Contudo, como consta na “Renegociação
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de Cláusula” (peça 310), Bio-Manguinhos/Fiocruz manteve todas as demais condições ajustadas


entre as partes, logo a FGV reiterou a sua vontade de firmar tal acordo assumindo os riscos ora
elencados.
179. Quanto ao novo valor ora proposto na “Renegociação de Cláusula” (peça 310), esse é
aproximadamente R$ 6 milhões inferior ao preço teto da proposta presente na modelagem financeira
com data-base: dez/2018. A fixação em um valor tão próximo do preço teto se mostra desarrazoável,
pois, na opção por fixar a parcela esperava-se uma quantia consideravelmente menor ao preço teto,
uma vez que, nesse novo cenário de parcela fixa, os riscos na variação do montante recebido pela
FGV foram mitigados.
180. Todavia, em análise, vale reconhecer que Bio-Manguinhos recepcionou os apontamentos
elencados no relatório preliminar e aprimorou a forma de contratação da FGV fixando um valor, a
despeito de tal valor ser muito próximo ao preço teto consubstanciado na modelagem financeira.
Reconhece-se, também, que a retirada do sigilo da licitação da minuta do edital e contrato (peças 311
e 312) propicia uma mitigação dos riscos de assimetria de informações entre os licitantes e
direcionamento da contratação.
181. Logo, reconhece-se que a Fiocruz aprimorou a relação contratual com a FGV acatando
alguns apontamentos promovidos pela unidade técnica.
182. Quanto à adoção de critérios inadequados de habilitação e julgamento, a Fiocruz
reconsiderou a exigência na fase de habilitação de comprovação de participação em empreendimento
que tenha captado pelo menos um bilhão de reais por meio de financiamentos de longo prazo, na
forma disposto no item 7.9.2 da minuta do edital (peça 19).
183. Porém, Bio-Manguinhos ainda sustenta a razoabilidade da exigência do valor de um
bilhão de reais, aplicados em projeto anterior, alegando estar em linha a jurisprudência do TCU que
possibilita exigências de comprovação de quantidades mínimas de até 50% dos itens de maior
relevância na obra ou serviço.
184. Nesse ponto, cabe a abertura de parênteses para breves explanações. A supracitada
jurisprudência deriva da Sumula TCU 263.
‘SÚMULA TCU 263: Para a comprovação da capacidade técnico-operacional das licitantes, e desde
que limitada, simultaneamente, às parcelas de maior relevância e valor significativo do objeto a ser
contratado, é legal a exigência de comprovação da execução de quantitativos mínimos em obras ou
serviços com características semelhantes, devendo essa exigência guardar proporção com a dimensão
e a complexidade do objeto a ser executado.’
185. Nota-se como bem definido na Súmula que a exigência de comprovação tem o condão de
verificar com atestados pretéritos a capacidade técnico-operacional da futura contratada executar os
itens mais sensíveis de uma determinada obra, garantindo assim a execução do objeto como um todo.
Exigir a execução de valor global de projeto não é equivalente a exigir a comprovação de execução
de uma parcela relevante do objeto.
186. As manifestações da Fiocruz não trouxeram estudo ou justificativa demonstrando a
adequabilidade para atribuição do valor de R$ 1 bilhão no critério de habilitação disposto no item
7.9.1 da nova minuta do edital (peça 312).
187. Entretanto, dado ao ineditismo e unicidade do empreendimento ora em análise, a
comparação com outras contratações públicas se mostra prejudicada. A vultuosidade e complexidade
do empreendimento e a carência de obras similares demonstram que o encaminhamento proposto no
relatório de auditoria, sobre a necessidade de justificativa adequada do valor de R$ 1 bilhão no
critério de habilitação disposto no item 7.9.1 da minuta de edital (peça 312) não se mostra mais
oportuno.
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188. Quanto aos demais apontamentos que versam sobre os critérios de julgamento da
proposta comercial e a metodologia de análise dos preços no ordenamento das propostas, todos foram
aprimorados na nova minuta de edital e contrato (peças 311 e 312) perdendo assim o objeto dos
encaminhamentos.
189. Logo, no que concerne aos critérios inadequados de habilitação e julgamento na minuta
de edital, cabe sopesar que a equipe técnica fez uma análise e apresentou alguns riscos potenciais que
podem impactar o certame e na busca de uma construção participativa da deliberação, oportunizou à
jurisdicionada as críticas à proposta. A jurisdicionada por sua vez recepcionou os apontamentos
promovendo as alterações que entendeu plausíveis.
190. Soma-se a isso o atual estágio da contração (edital publicado) e a nova metodologia
adotada a partir da Resolução-TCU 315, que os encaminhamentos proferidos pelo TCU devem ser
imprescindíveis à finalidade do controle, corolário do princípio da racionalização das deliberações, a
despeito de ainda existir alguns riscos elencados, entende-se que os encaminhamentos ora proferidos
em relação: ao conflito de interesses no modelo de contratação da FGV para prestação de serviço de
assessoria técnica; e adoção de critérios inadequados de habilitação e julgamento, não se mostram
mais aplicáveis.
CONCLUSÃO
191. A presente instrução avaliou as manifestações da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em
relação aos apontamentos da unidade técnica consignados no Relatório de Fiscalização 90/2019
(peça 276). Tais manifestações foram autorizadas pelo Exmo. Relator, Ministro Benjamin Zymler,
conforme despacho acostado à peça 280.
192. Com relação às falhas nos estudos de viabilidade técnica-econômica-financeira do
empreendimento (achado III.1), apontou-se que tais falhas decorrem de falhas no estudo de demanda
e de falhas no estudo de alternativas.
193. As falhas no estudo de demanda, em apertada síntese, versaram sobre riscos decorrentes
de frustação na expectativa de realização das receitas previstas no EVTE, em função das incertezas de
aquisição dos produtos pelo Ministério da Saúde (MS) e pelos organismos internacionais, bem como
em função dos riscos associados aos processos de transferência de tecnologia (decorrentes de
Parcerias para Desenvolvimento Produtivo - PDPs) necessários à formulação e venda dos produtos a
serem fabricados no complexo. E, ainda, resta dúvidas sobre a possibilidade de realização de
exportação por parte de Bio-Manguinhos via Fundação de Apoio (Fiotec).
194. Após análises (parágrafos 35 a 53), concluiu-se que, apesar de os riscos decorrentes da
aquisição de produtos frutos de PDPs permanecerem, a apresentação de ofício do MS, em que o ex-
Ministro de Estado da Saúde, Eduardo Pazuello, reitera a importância estratégica da construção do
NCPFI (peças 326 e 327), a apresentação de dados históricos para justificar a demanda dos produtos,
as alterações trazidas na Lei 13.801/2019 que abriu possibilidade de se exportar via Fiotec e a nova
realidade imposta pela pandemia do novo coronavírus diminuem as incertezas de demanda elencadas
no relatório.
195. Assim, considerando que a análise do EVTE do NCPFI já foi tema de algumas
fiscalizações por parte do TCU, em que foram realizados mapeamento dos riscos, considerando que
Bio-Manguinhos/Fiocruz acatou algumas recomendações, refutou outras e promoveu aprimoramentos
no modelo, e considerando ainda que houve publicação do edital de licitação, entende-se não ser mais
razoável a proposta do relatório preliminar de reiteração da determinação do item 9.2.1 do Acórdão
2687/2018-TCU- Plenário, que tratava de reapresentação do EVTE.
196. Quanto às falhas no estudo de alternativas, essas decorrem do fato de Bio-Manguinhos, na
escolha da metodologia construtiva e de contratação, ter feito a opção pelo built to suit amparada no

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mérito administrativo e não em um estudo de alternativas comparativo com outros modelos, como
pautado no Acórdão 1.301/2013-TCU-Plenário. Sobre as falhas no estudo de alternativas a
jurisdicionada não apresentou manifestação.
197. Porém, no atual estágio da contratação (edital publicado), entende-se não ser mais
aplicável a determinação apresentada no relatório preliminar (peça 276), cabendo apenas a
proposição de dar ciência, com o intuito de aprimoramento da gestão de contratações por parte da
Fiocruz, de que as contatações no modelo built to suit devem ser precedidas de estudo de alternativas,
destacando-se o custo-benefício de cada alternativa levantada do ponto de vista dos riscos envolvidos,
dos valores a serem desembolsados e demais vantagens e desvantagem verificadas, consoante o
disposto no Acórdão 1.301/2013-TCU-Plenário.
198. Quanto ao preço de aluguel inadequado devido as falhas no orçamento da obra (achado
III.2), apontou-se que a inadequação decorria de fragilidades e imperfeições encontradas no processo
de orçamentação do empreendimento, bem como na modelagem financeira.
199. As falhas na orçamentação derivavam da utilização inapropriada de unidade de “Rateio”
(RT), utilização de metodologia de cálculo de BDI não amparada por esse Tribunal, e atualização de
preço de serviços, para um horizonte de mais de 3 anos, por meio de índice de preço (Índice Nacional
de Custo da Construção – INCC). Ainda restou por constatar que as determinações 9.2.2, 9.2.3 e 9.3
do Acórdão 2.687/2018 – TCU – Plenário ainda estavam pendentes de implementação.
200. Conforme discutido na presente análise (parágrafos 97 a 125), os argumentos trazidos por
Bio-Manguinhos não conseguiram solucionar todos os apontamentos proferidos pela equipe de
auditoria. Coube razão à jurisdiciona quanto à especificidade do projeto do NCPFI, o que propicia
dificuldades justificáveis na utilização dos sistemas oficiais de preço, bem como, inferiu-se que a
utilização da unidade “RT” para o rateio dos quantitativos não cotados individualmente para
algumas edificações do complexo caracterizou-se como falha formal na apresentação do CAPEX.
201. Porém, as atualizações via índice de preço das cotações obtidas há mais de 3 anos junto
aos fornecedores propiciam riscos de imprecisão à orçamentação, o que, junto à segregação do BDI
em materiais e mão de obra, persiste como impropriedade na orçamentação da obra.
202. Por fim, vale reiterar que o novo CAPEX apresentado (peça 306) ainda apresenta falhas
na sua formulação como ausências de unidades, de quantitativos, de preço unitário e de composição
de preços unitários (CPUs). Também não foi identificada no CAPEX a ART do orçamentista.
203. Tais fatos inserem mais risco ao processo pois, como explicitado, o valor total do
investimento projetado possui grande sensibilidade em relação à orçamentação, podendo
proporcionar variações expressivas nos desembolsos a serem efetuados no decorrer do contrato e um
risco de prejuízo aos cofres públicos. Por isso, há inconsistências que não permitem avaliar a
comprovação de economicidade do objeto.
204. Pontua-se, porém, que as determinações supra tinham o condão de aprimorar a minuta de
edital, propiciando uma mitigação de riscos. Dado a atual estágio da contratação do objeto (edital já
publicado) e dado que o modelo BTS, em teoria, não exige um detalhamento orçamentário nos moldes
exigidos pela lei 8.666/93, conforme exposto no anexo do Relatório de Auditoria, entende-se não ser
mais adequada a reiteração das determinações pendentes de implementação, cabendo assim, em
respeito a Resolução-TCU 315, de 22 de abril de 2020, cientificar a Fiocruz das falhas, alertando-a
para os riscos elencados.
205. Cabe pontuar, ainda, que a despeito de o modelo BTS não exigir um orçamento detalhado,
foi realizada uma licitação para contratação de empresa para elaboração do projeto executivo e foi
realizado o aceite de um projeto com falhas que são objeto de apontamento pelo TCU desde 2016, sem
as devidas correções. Eventuais responsabilidades relacionadas ao orçamento poderão ser analisadas

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no âmbito do processo de auditoria em aberto (TC 017.376/2016-5), que avaliará entre outros itens a
regularidade do contrato 104/2012, celebrado com a empresa IPS – Integrated Project Services Inc.,
para elaboração do projeto executivo da obra.
206. Quanto aos riscos relacionados à aplicação do modelo Built to suit (achado III.3), o
achado teve o condão de elencar os riscos decorrentes da baixa regulamentação do modelo de
contratação Built to suit para a aplicação do modelo pela Administração Pública, principalmente
quando o empreendimento é desenvolvido em terreno público com reversão ao final do contrato.
207. Resumidamente os riscos relacionados à aplicação do modelo BTS se dividem em: falta de
regulamentação; ausência de instrumento orçamentário apropriado e possível impactos nas regras
fiscais; e fragilidade no modelo de garantia previsto.
208. Quanto à falta de regulamentação, a Fiocruz apresentou alegações em linha ao
consignado no relatório de auditoria de que o limite de um porcento para o aluguel não se mostra
adequado quando há reversão do imóvel ao final do contrato. Logo, ainda se mostra oportuno o
encaminhamento da decisão aos órgãos responsáveis reiterando a falta de regulamentação do BTS
para a Administração Pública notadamente quando há reversão ao final do contrato.
209. Com relação aos instrumentos orçamentários apropriados e à classificação da despesa, a
jurisdicionada reconhece a classificação da despesa como sendo de capital, porém refuta a analogia a
operação de crédito.
210. Sendo assim, dado o ineditismo do modelo e o impasse na classificação, se mostra
imprescindível o posicionamento da Secretaria do Tesouro Nacional, órgão competente em
determinar qual de fato é a classificação da despesa, bem como cabe ao Tesouro Nacional informar
qual instrumento orçamentário adequado para a previsão do investimento de 20 anos com
desembolsos previsto para ocorrer apenas 3 anos após o início da obra.
211. Quanto ao FGIE, em relação a suficiência da garantia, Bio-Manguinhos reafirmou a
possibilidade de utilização das receitas provenientes das exportações serem utilizadas. Logo, com a
reformulação do entendimento do tema na análise das manifestações do achado III.1, cabe razão a
jurisdicionada.
212. No que concerne ao prazo para recomposição da garantia, foi efetuada alteração no edital
estipulando prazo de 3 meses, porém ainda persiste o impasse de quem seria o órgão responsável por
efetuar essa recomposição.
213. Ainda em relação ao FGIE, a jurisdicionada reconheceu a incertezas na possibilidade de
utilização do fundo garantidor nos modelos de built to suit, e informou que vem buscando junto os
gestores do FGIE solução para o impasse.
214. Assim, dado o atual estágio da contratação (edital publicado), os encaminhamentos
promovidos pela jurisdicionada junto aos gestores do FGIE com o objetivo de sanar as pendências e
com base na nova metodologia adotada a partir da Resolução-TCU 315, compreende-se não ser mais
aplicável a proposição de determinação referente ao FGIE proferida no bojo do relatório preliminar
de auditoria (peça 276), cabendo dar ciência à jurisdicionada dos riscos remanescentes.
215. Por fim, sobre os riscos identificados na minuta do edital que podem prejudicar a
competitividade do certame e o andamento contratual adequado (achado III.4), foram levantados
riscos potenciais derivados de conflito de interesses no modelo de contratação da FGV para prestação
de serviço de assessoria técnica; e de adoção de critérios inadequados de habilitação e julgamento.
216. Quanto ao risco de conflito de interesse no modelo de contratação da FGV, esse se dividia
no critério remuneratório do serviço indexado a 2,25% do total do contrato celebrado e do pagamento
ser executado pelo vencedor do certame.

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217. Em relação ao critério de remuneração indexado, Bio-Manguinhos promoveu uma


“Renegociação de Cláusula” (peça 310) na qual estabeleceu um valor fixo de remuneração, no
montante de R$ 48,8 milhões aos serviços prestado pela FGV e manteve as demais cláusulas, inclusive
a que estabelece que o pagamento deve ser executado pelo vencedor do certame.
218. A despeito de o valor ora apresentado ser apenas R$ 6 milhões abaixo do valor teto caso o
empreendimento fosse contratado sem nenhuma taxa de desconto, reconhece-se que a jurisdicionada
retirou a indexação do contrato.
219. Persiste, ainda, o entendimento da jurisdicionada de que o valor devido do serviço
prestado pela FGV seja pago pelo vencedor do certame. Nesse ponto cabe parêntese para evidenciar
que a FGV reiterou sua vontade de participar do modelo contratado, pois não se opões em nenhum
ponto da Renegociação proposta por Bio-Manguinhos. Logo, a FGV assina contrato sabendo dos
riscos assumidos.
220. Ainda, na busca de mitigar o risco de prejuízo a competitividade do certame, Bio-
Manguinhos retirou o sigilo da licitação da minuta do edital e contrato (peças 311 e 312).
221. Em análise, vale reconhecer que Bio-Manguinhos recepcionou os apontamentos elencados
no relatório preliminar e aprimorou a forma de contratação da FGV fixando um valor, a despeito de
tal valor ser muito próximo ao preço teto consubstanciado na modelagem financeira. Reconhece-se,
também, que a retirada do sigilo da licitação da minuta do edital e propicia uma mitigação dos riscos
de assimetria de informações entre os licitantes e direcionamento da contratação.
222. Com relação a adoção de critérios inadequados de habilitação e julgamento, a
jurisdicionada, na nova minuta de edital e contrato (peças 311 e 312), reconsiderou: a necessidade de
comprovação de participação em empreendimento que tenha captado pelo menos um bilhão de reais
por meio de financiamentos de longo prazo, incluindo a possibilidade de se utilizar capital próprio; a
metodologia de análise dos preços no ordenamento das propostas, alterando o critério de
classificação para “menor valor presente líquido” e a retirada do sigilo da licitação. Logo, houve
perda do objeto dos encaminhamentos.
223. Porém, ainda persiste a ausência de estudo ou justificativa demonstrando a
adequabilidade para atribuição do valor de R$ 1 bilhão no critério de habilitação disposto no item
7.9.1 da nova minuta do edital (peça 312).
224. Entretanto, dado ao ineditismo e unicidade do empreendimento ora em análise, a
comparação com outras contratações públicas se mostra prejudicada. Sendo assim, a despeito de não
haver justificativa, com a carência de obras similares que possam fundamentar o encaminhamento de
necessidade de justificativa adequada do valor de R$ 1 bilhão no critério de habilitação disposto no
item 7.9.1 da minuta de edital (peça 312), entende-se que tão encaminhamento não se mostra mais
oportuno.
225. Por fim, cabe pontuar que os encaminhamentos propostos no bojo da auditoria foram
revistos na presente instrução com o intuito de atendimento da Portaria-TCU-Segecex nº 9, de
14/5/2020, que disciplina a proposição das deliberações previstas na Resolução-TCU nº 315, de
22/4/2020.
PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO
226. Ante o exposto, submetem-se os autos à consideração superior, para posterior envio ao
gabinete do Ministro Relator Benjamin Zymler, propondo:
227. Considerar não mais aplicável a determinação do subitem 9.2.1 do Acórdão 2.687/2018-
TCU- Plenário.

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228. Considerar não atendidos os itens 9.2.2, 9.2.3 e 9.3, todos do Acórdão 2.687/2018-TCU-
Plenário.
229. Dar ciência à Fiocruz, com fundamento no art. 9º, inciso I, da Resolução-TCU 315, de
2020:
229.1. das falhas na planilha orçamentária do projeto executivo, conforme impropriedades
elencadas nesta instrução e no relatório de auditoria, incluindo ausências de unidades, de
quantitativos, de preço unitário e de composição de preços unitários; atualização via índice de preço
das cotações obtidas há mais de 3 anos junto aos fornecedores em detrimento de ajuste dos preços dos
serviços pelos valores de mercado; a utilização de unidade de rateio e demais verbas em detrimento
de unidades efetivas de medida de serviço; utilização de metodologia de cálculo de BDI não
amparada por esse Tribunal, conforme Acórdão 2.622/2013-TCU-Plenário e Decreto 7.983/2013;
229.2. que as contratações no modelo built to suit deve ser precedida de estudo de alternativas,
destacando-se o custo-benefício de cada alternativa levantada do ponto de vista dos riscos envolvidos,
dos valores a serem desembolsados e demais vantagens e desvantagem verificadas, consoante o
disposto no Acórdão 1.301/2013-TCU-Plenário.
229.3. que a falta de formalização da garantia locatícia pelo Fundo Garantidor de Infraestrutura
– FGIE, bem como as regras de recomposição do fundo em caso de utilização expõem o
empreendimento a riscos de descontinuidade e podem afetar os preços das propostas da licitação;
230. Encaminhar o acórdão que vier a ser proferido, acompanhado do voto e do relatório que o
fundamentarem, aos Ministérios da Economia; da Saúde, Casa Civil, bem como para o Congresso
Nacional, para fins de alerta sobre os riscos de insegurança jurídica e possíveis impactos
orçamentários e fiscais identificados por este Tribunal devido à falta de regulamentação da aplicação
do modelo built to suit no setor público, especialmente para os contratos que prevejam reversão do
imóvel à Administração Pública.
231. Encerrar o presente processo.”
6. O corpo diretivo da unidade técnica aquiesceu ao aludido encaminhamento.
7. Submetidos os autos ao meu gabinete, verifiquei que algumas questões levantadas pela
SeinfraUrbana envolviam o debate de temas afetos ao direito financeiro e orçamentário, a exemplo da
discussão quanto à natureza da contratação como operação de crédito e à eventual necessidade de
cumprimento da legislação orçamentária e financeira, em especial dos arts. 30 a 32 da LRF.
8. Tendo em vista a especificidade do tema e a urgência no deslinde da questão, haja vista a
iminência do prazo de abertura das propostas (10/8/2021), solicitei a manifestação da Secretaria de
Macroavaliação Governamental (Semag), a fim de que:
a) analisasse se o contrato decorrente do RDC Presencial 1/2021-BM poderia ser enquadrado
como uma operação de crédito, do tipo aquisição financiada de bem;
b) em caso positivo, indicasse as condições legais a serem atendidas pela Fiocruz antes da
conclusão da contratação e se o eventual descumprimento desses requisitos seria fator impeditivo para
a continuidade do certame licitatório e/ou para a assinatura do contrato; e
c) se pronunciasse a respeito de outras questões vinculadas à referida contratação como BTS
que eventualmente possam implicar a violação de normas orçamentárias e financeiras.
9. Em cumprimento, a unidade técnica especializada elaborou a instrução transcrita
parcialmente a seguir, a qual contou com a anuência de seu corpo diretivo:
“12. Conforme o termo de referência do RDC Presencial 01/2021-BM, o processo licitatório
buscará identificar:

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‘o Menor Valor Presente Líquido Proposto, considerando o valor corrente mensal máximo e o valor
presente líquido máximo estabelecidos pela Administração, que a Bio-Manguinhos pagará ao longo
do Contrato de Locação com Construção Ajustada, através de parcelas mensais de amortização
(composto de valor de ALUGUEL + valor de REVERSÃO), de forma que ao final do Contrato todas
as benfeitorias construídas pelo licitante vencedor (LOCADOR), reverterão sem outro custo para a
Bio-Manguinhos’.
13. Cuida-se, portanto, de locação sob medida com cláusula de reversão do bem construído
ao patrimônio da Fiocruz. Ainda segundo o termo de referência, o imóvel será edificado em terreno
da própria entidade contratante.
14. O built to suit – ou construção e locação sob encomenda – é o contrato por meio do qual
determinada pessoa contrata a construção ou reforma de uma edificação, de acordo com suas
especificações. O usuário pagará ao contratado, mensalmente, determinado valor que se destinará
tanto a remunerar o uso do imóvel quanto a amortizar o investimento por este realizado.
15. Desse modo, é o negócio jurídico no qual um empreendedor imobiliário reforma ou edifica
determinado imóvel sob medida a um ocupante, e, terminada a obra, cede o uso da edificação, por
período determinado. É um contrato bilateral (ou plurilateral), consensual, comutativo, oneroso e de
execução periódica [GOMIDE, A. J. Contratos Built to Suit: aspectos controvertidos decorrentes de
uma nova modalidade contratual. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2017. p. 32].
16. É comumente utilizado na iniciativa privada, principalmente por empresas que desejam se
instalar em imóvel adequado às suas necessidades, porém, sem a imobilização do seu capital. Do
ponto de vista do locador, o retorno financeiro é obtido através dos aluguéis pagos mensalmente para
remunerar o uso do imóvel e amortizar o investimento realizado, bem como pela garantia do longo
prazo contratual, que costuma variar entre dez e trinta anos.
17. O Brasil incorporou esse tipo de instrumento a partir da Lei 12.744, de 19/12/2012, que
acrescentou o artigo 54-A à Lei do Inquilinato (Lei 8.245/1991), que trata da contratação de locação
com prévia aquisição, construção ou reforma de imóvel urbano não residencial:
‘Art. 54-A. Na locação não residencial de imóvel urbano na qual o locador procede à prévia
aquisição, construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por terceiros, do imóvel então
especificado pelo pretendente à locação, a fim de que seja a este locado por prazo determinado,
prevalecerão as condições livremente pactuadas no contrato respectivo e as disposições
procedimentais previstas nesta Lei.
§ 1º Poderá ser convencionada a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis durante o prazo
de vigência do contrato de locação.
§ 2º Em caso de denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário, compromete-se este a
cumprir a multa convencionada, que não excederá, porém, a soma dos valores dos aluguéis a receber
até o termo final da locação.’
18. A edição dessa nova regra legal proporcionou maior segurança às partes contratantes,
uma vez que os contratos built to suit eram considerados atípicos por não serem expressamente
disciplinados por lei. Outro ponto que impactava negativamente a realização das operações era a
falta de previsão legal sobre a revisão do valor dos aluguéis e sobre a regra aplicada em caso de
denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário, uma vez que nesse tipo de contrato a
manutenção do valor de aluguel fixado dentro de um prazo de locação mais alongado mostra-se
fundamental para garantir ao locador o retorno do investimento realizado.
19. No âmbito do setor público, a lei que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações
Públicas (RDC) foi alterada pela Lei 13.190/2015, possibilitando a contratações de locação sob
medida pelo referido regime:
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‘Art. 1º É instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), aplicável


exclusivamente às licitações e contratos necessários à realização:
[...]
IX - dos contratos a que se refere o art. 47-A.
[...]
Art. 47-A. A administração pública poderá firmar contratos de locação de bens móveis e imóveis, nos
quais o locador realiza prévia aquisição, construção ou reforma substancial, com ou sem
aparelhamento de bens, por si mesmo ou por terceiros, do bem especificado pela administração.
§ 1º A contratação referida no caput sujeita-se à mesma disciplina de dispensa e inexigibilidade de
licitação aplicável às locações comuns.
§ 2º A contratação referida no caput poderá prever a reversão dos bens à administração pública ao
final da locação, desde que estabelecida no contrato (grifos acrescidos).
§ 3º O valor da locação a que se refere o caput não poderá exceder, ao mês, 1% (um por cento) do
valor do bem locado.’
20. Quanto à possível qualificação dos contratos built to suit como operação de crédito, a Lei
de Responsabilidade Fiscal traz a definição necessária:
‘Art. 29. Para os efeitos desta Lei Complementar, são adotadas as seguintes definições:
III - operação de crédito: compromisso financeiro assumido em razão de mútuo, abertura de crédito,
emissão e aceite de título, aquisição financiada de bens, recebimento antecipado de valores
provenientes da venda a termo de bens e serviços, arrendamento mercantil e outras operações
assemelhadas, inclusive com o uso de derivativos financeiros;’
21. A LRF optou por conceituar a expressão “operações de crédito” de forma bastante ampla,
incluindo operações que classicamente se configuram como tal, a exemplo do mútuo e da abertura de
crédito, e outras operações em que tal configuração não se afigura como imediata.
22. Nota-se, ainda, que a definição não é exaustiva, mas meramente exemplificativa,
utilizando-se do recurso a “outras operações assemelhadas” para estender a aplicação do instituto.
Nesse sentido, o conceito de operação de crédito foi estabelecido de modo a nem sempre envolver a
entrada de recursos obtidos junto a uma instituição financeira. Citam-se, à guisa de exemplo, os casos
de assunção, reconhecimento ou confissão de dívidas – e de aquisição de bens financiada pelo próprio
vendedor ou fabricante.
23. Nos termos do Manual de Instrução de Pleitos da Secretaria do Tesouro Nacional do
Ministério da Economia, “dessa maneira, há operações que eventualmente podem não ser
caracterizadas como operações de crédito pelo sistema financeiro, mas se enquadram no conceito da
LRF, devendo, portanto, ser objeto de verificação prévia pelo Ministério da Fazenda”.
24. As operações de crédito tradicionais são aquelas relativas aos contratos de financiamento,
empréstimo ou mútuo. A legislação englobou no mesmo conceito, ainda, as operações assemelhadas,
tais como a aquisição financiada de bens, o arrendamento mercantil e as operações de derivativos
financeiros, inclusive operações dessas categorias realizadas com instituição não financeira.
25. É necessário, portanto, examinar também os conceitos de “aquisição financiada de bens”
e “arrendamento mercantil”, até para verificar a possibilidade de enquadrar a contratação em
questão como uma “operação assemelhada” prevista no art. 29, inciso III, da LRF.
III.1.1. Aquisição financiada de bens

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26. Para o setor público, conceitua-se aquisição financiada de bens como a espécie de
operação de crédito contratual em que não há ingresso efetivo de recursos financeiros nos cofres da
entidade, como, por exemplo, a aquisição financiada diretamente com o fornecedor do bem [BRASIL,
Secretaria do Tesouro Nacional. Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público. 8ª ed., Brasília,
2018, p. 313].
27. É verdade que se costuma denominar “financiamento” a operação na qual uma instituição
financeira antecipa o numerário especificamente necessário para a aquisição de bens pelo cliente,
sobre créditos que este cliente possa ter. Na configuração tradicional do financiamento, assim, uma
instituição financeira faz o pagamento correspondente ao comerciante ou fabricante, cobrando seu
cliente em momento posterior. No caso de uma compra financiada contratada diretamente com o
consumidor, por exemplo, a garantia provavelmente será a alienação fiduciária do bem objeto da
transação.
28. Já na aquisição financiada de bens, o financiamento da compra é realizado diretamente
pelo fornecedor dos bens e serviços, não por terceiro. No setor privado, é comum o financiamento de
imóveis ser realizado pela própria construtora ou incorporadora (cf. art. 35-A da Lei 4.591/1964, e
art. 26-A, da Lei 6.766/1979). O conceito de financiamento é econômico, e não jurídico, pois perpassa
diversos institutos e contratos, típicos e atípicos.
29. A situação é distinta daquela encontrada no mútuo, espécie de operação de crédito em que
há obtenção de recurso junto a uma instituição financeira para pagamento posterior acrescido de
juros e demais encargos contratualmente previstos. Nessa forma de contrato, o mutuante
simplesmente empresta determinada quantia ao mutuário, o qual se obriga a devolvê-la com os
acrescimentos pactuados, podendo, até o prazo contratualmente estipulado, usá-la para a finalidade
que lhe aprouver.
30. A aquisição financiada de bens, normalmente, é uma compra e venda: contrato bilateral
pelo qual uma pessoa (vendedor) se obriga a transferir a propriedade de um bem, corpóreo ou
incorpóreo, a uma outra pessoa (comprador), que se obriga a pagar-lhe certo preço em dinheiro – no
caso, de forma diferida no tempo, utilizando-se da confiança (fidúcia) do vendedor.
31. Da forma como a presente operação está estruturada, ela apresenta os elementos típicos
não de uma compra e venda, mas de um contrato de empreitada – contrato no qual uma das partes,
mediante remuneração a ser paga pelo outro contraente, obriga-se a realizar determinada obra, de
acordo com as instruções deste e sem relação de subordinação.
32. Estão presentes os seguintes elementos do contrato de empreitada: i) o resultado, o Novo
Centro de Processamento Final de Imunobiológicos de Bio-Manguinhos – RJ, a ser definitivamente
incorporado ao patrimônio da fundação pública após determinado prazo; ii) o consentimento, a ser
expresso mediante a assinatura de contrato administrativo atípico; e iii) o preço, a ser pago durante
intervalo de tempo e condições previamente acertadas.
33. Embora a empreitada – quando o fornecimento de materiais é responsabilidade do
empreiteiro – aproxime-se da compra e venda, difere desta pois não visa a uma obrigação de dar, mas
à obrigação de fazer uma obra, sendo fundamental a produção do resultado. Dessa definição,
extraem-se três características do contrato de empreitada:
a) Consensualidade: o contrato de empreitada resulta da troca de consentimento a respeito
de um resultado, a ser realizado mediante um preço, e, eventualmente, sob outras condições.
b) Onerosidade: a prestação do empreiteiro supõe a contrapartida, que é o pagamento do
preço em dinheiro;
c) Bilateralidade: as duas partes assumem direitos e obrigações recíprocos, sendo, ao
mesmo tempo, credor e devedor um do outro.
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34. No que se refere ao preço, ele pode ser pago de forma imediata ou diferida no tempo,
situação na qual ocorrerá efetivo financiamento do contraente pelo empreiteiro.
35. Portanto, o fato de que o NCPFI Bio-Manguinhos ainda terá de ser erguido, sob demanda,
pelo vencedor do RDC Presencial 01/2021-BM não representa óbice à caracterização do contrato
como operação de crédito – ainda que como operação assemelhada à aquisição financiada de bens,
prevista na parte final do art. 29, inciso III, da LRF.
36. Veja-se também que, no próprio conceito citado do Manual de Contabilidade Aplicada ao
Setor Público, a “aquisição financiada de bens” é definida em seu sentido amplo: conceitua-se
simplesmente como a operação de crédito contratual em que não há ingresso efetivo de recursos
financeiros, sendo a aquisição financiada diretamente com o fornecedor do bem apenas um dos
possíveis casos.
37. De toda sorte, ainda que não se considerasse a prestação financiada de serviços de
empreitada como uma operação assemelhada à aquisição financiada de bens, o contrato examinado
importa assunção de obrigação com fornecedor para pagamento a posteriori de bens e serviços, que –
caso realizada sem a devida autorização orçamentária – seria considerada operação equiparada a
operação de crédito e vedada pelo art. 37, inciso IV, da LRF.
38. Portanto, a prestação financiada de serviços de empreitada constitui operação de crédito
assemelhada à aquisição financiada de bens, enquadrando-se na definição do art. 29, inciso III, da
Lei Complementar 101/2000.
III.1.2. Do arrendamento mercantil
39. O contrato de locação por encomenda, por outro lado, também pode mostrar considerável
similaridade com o de arrendamento mercantil – contrato pelo qual uma empresa, desejando utilizar
determinado imóvel, pactua com uma instituição financeira (ou sociedade de arrendamento mercantil)
para que adquira o referido bem, o qual será alugado à interessada por prazo certo. Admite-se que,
terminado o prazo locativo, o arrendatário possa optar entre: i) a devolução do bem; ii) a renovação
da locação; ou iii) a compra pelo preço residual fixado no contrato.
40. O arrendamento mercantil (também denominado “leasing”) é disciplinado pela Lei
6.099/1974, segundo a qual:
Considera-se arrendamento mercantil, para os efeitos desta lei, o negócio jurídico realizado entre
pessoa jurídica, na qualidade de arrendadora, e pessoa física ou jurídica, na qualidade de
arrendatária. e que tenha por objeto o arrendamento de bens adquiridos pela arrendadora, segundo
especificações da arrendatária e para uso próprio desta” (art. 1°, parágrafo único).
41. A mesma lei prevê que os contratos de arrendamento mercantil conterão disposições
sobre: i) a opção de compra ou renovação de contrato, como faculdade do arrendatário, e ii) o preço
para opção de compra ou critério para sua fixação, quando for estipulada esta cláusula (art. 5°).
42. Desse modo, o contrato envolve elementos de locação, financiamento e venda – o
arrendatário antecipa a fruição de um bem, diferindo seu pagamento no tempo. Em vez de a
instituição financeira celebrar um contrato de mútuo, adiantando os recursos financeiros para a
aquisição do bem, ela mesma o adquire e o disponibiliza, recebendo pagamentos periódicos como
contraprestação.
43. Sobre o tema, a Norma Brasileira de Contabilidade NBC TG 06 (R1) – Operações de
Arrendamento Mercantil estabelece:
‘10. A classificação de um arrendamento mercantil como arrendamento mercantil financeiro ou
arrendamento mercantil operacional depende da essência da transação e não da forma do contrato.

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Exemplos de situações que individualmente ou em conjunto levariam normalmente a que um


arrendamento mercantil fosse classificado como arrendamento mercantil financeiro são:
(a) o arrendamento mercantil transfere a propriedade do ativo para o arrendatário no fim do prazo do
arrendamento mercantil;
(b) o arrendatário tem a opção de comprar o ativo por um preço que se espera seja suficientemente
mais baixo do que o valor justo à data em que a opção se torne exercível de forma que, no início do
arrendamento mercantil, seja razoavelmente certo que a opção será exercida;
(c) o prazo do arrendamento mercantil refere-se à maior parte da vida econômica do ativo mesmo que
a propriedade não seja transferida;
(d) no início do arrendamento mercantil, o valor presente dos pagamentos mínimos do arrendamento
mercantil totaliza pelo menos substancialmente todo o valor justo do ativo arrendado; e
(e) os ativos arrendados são de natureza especializada de tal forma que apenas o arrendatário pode
usá-los sem grandes modificações.’
44. Desse modo, mesmo uma locação por encomenda – nos moldes normalmente praticados
pelo mercado, sem a obrigatoriedade da reversão ao final do prazo – poderia ser qualificada como
uma operação assemelhada ao arrendamento mercantil, atraindo, portanto, a incidência do art. 29,
inciso III, da LRF.
45. Há características próprias, decerto, que dificultam a qualificação do contrato em questão
como um arrendamento mercantil financeiro. Inicialmente, como a própria Fiocruz aponta, o contrato
não é firmado com instituição financeira (e nem com sociedade de arrendamento mercantil).
46. Em seguida, a Fiocruz ainda destaca o fato de a reversão do bem NCPFI Bio-Manguinhos
ser obrigatória, ao passo que, em arrendamentos mercantis, esta deve ser uma faculdade, sob pena de
descaracterização do contrato para compra e venda (cf. jurisprudência firme do Superior Tribunal de
Justiça).
47. Assiste razão nesse ponto específico à Fiocruz – a “locação sob encomenda” em questão
não configura arrendamento mercantil (peça 294, p. 2). A Fiocruz alega que o imóvel propriamente
dito é da União, e que, portanto, não haveria a aquisição da propriedade de um bem – uma vez que,
ao final do prazo contratual, haveria a reversão apenas da edificação.
48. A citada decorrência natural do arcabouço jurídico desenhado é incapaz de esconder que,
após o prazo contratual, encerra-se também a cessão do terreno ao locador, retornando este para a
esfera patrimonial da União.
49. Ou seja, afirmar que “há reversão apenas da edificação, não do terreno” não afasta o
fato de que todo o complexo, ao final do prazo e com o pagamento do preço parcelado, encontrar-se-á
na esfera jurídica da União, dando à operação o caráter de prestação financiada de serviços de
empreitada –– operação de crédito assemelhada à aquisição financiada de bens.
50. Observe-se que a Fiocruz afirma ainda que a “remuneração é diluída em um prazo maior,
embutidos nos valores mensais o aluguel do edifício (pelo prazo da cessão do direito de superfície) e a
empreitada da edificação” – como se não fosse esse compromisso financeiro justamente a
característica definidora de operações de crédito, no âmbito do setor público.
51. De toda sorte, tanto o arrendamento mercantil financeiro quanto a aquisição financiada
de bens são contabilizadas nos mesmos moldes [BRASIL, STN. Manual de Contabilidade Aplicada ao
Setor Público. 8ª ed., Brasília, 2018, p. 320]. Inicialmente o bem deve ser contabilizado como ativo,
tendo como contrapartida uma obrigação no passivo (de curto e/ou longo prazo).

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52. Trata-se de mais um elemento a ilustrar a reduzida diferença, em termos econômicos,


entre a aquisição financiada de um bem imóvel, o arrendamento mercantil financeiro e as operações a
eles assemelhadas, como a prestação financiada de serviços de empreitada (apresentada como
locação por encomenda) analisada nos presentes autos.
III.1.3. Da qualificação do built to suit com reversão obrigatória do produto como operação de
crédito
53. Novamente, cite-se o dispositivo legal da Lei do Inquilinato que introduz o contrato built
to suit no ordenamento jurídico brasileiro:
‘Art. 54-A. Na locação não residencial de imóvel urbano na qual o locador procede à prévia
aquisição, construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por terceiros, do imóvel então
especificado pelo pretendente à locação, a fim de que seja a este locado por prazo determinado,
prevalecerão as condições livremente pactuadas no contrato respectivo e as disposições
procedimentais previstas nesta Lei.
§ 1º Poderá ser convencionada a renúncia ao direito de revisão do valor dos aluguéis durante o prazo
de vigência do contrato de locação.
§ 2º Em caso de denúncia antecipada do vínculo locatício pelo locatário, compromete-se este a
cumprir a multa convencionada, que não excederá, porém, a soma dos valores dos aluguéis a receber
até o termo final da locação.’
54. Antes de mais nada, estabelece-se que o contrato de locação por encomenda há de ser um
contrato de locação não residencial. Segundo o art. 565 do Código Civil, em todo contrato de
locação, uma das partes se obriga a ceder à outra – por tempo determinado ou indeterminado – o uso
e gozo de coisa não fungível, mediante certa retribuição.
55. Assim, é da essência de todo contrato de locação: i) cessão, por tempo determinado ou
indeterminado, do uso e gozo de um bem; e ii) a remuneração em razão do uso e gozo dessa coisa.
Caso esses elementos não estejam presentes, não haverá contrato de locação, devendo ser aplicável
outro subsistema jurídico.
56. Ocorre que, cf. o art. 54-A da Lei do Inquilinato, o contrato built to suit também possui
outros elementos essenciais para além daqueles componentes do contrato de locação, desta vez,
típicos do contrato de empreitada: i) a construção ou substancial reforma, por si mesmo ou por
terceiros, do imóvel então especificado; e ii) remuneração a ser paga pelo ocupante.
57. Além de locação e empreitada, é comum a presença de elementos do contrato de compra e
venda – isso porque o art. 54-A da Lei 8.245/1991 também prevê a possibilidade de o empreendedor-
locador ter que, inicialmente, adquirir o imóvel cujo uso e gozo será cedido ao locatário. Na maioria
dos casos, a aquisição será realizada junto a um terceiro.
58. Sendo em última análise contratos de locação, observa-se que os contratos de built to suit
firmados entre particulares normalmente não incluem cláusula que permita o exercício da opção de
compra do imóvel de forma automática por parte do locatário. O que a lei prevê é o direito de
preferência de compra, no caso de o proprietário manifestar desejo de venda do bem (art. 27 da Lei
8.245/1991). Nos termos do voto condutor do Acórdão TCU 2.219/2018–TCU–Plenário:
‘Dessa forma, a aquisição do imóvel pelo locatário ao final do contrato de locação sob medida, o qual
coincide com o prazo de aluguel da edificação, é apenas uma possibilidade que dependerá da
manifestação da vontade de ambas as partes (locador e locatário) que permita estabelecer cláusulas
no contrato a ser firmado prevendo a incorporação do bem pelo locatário ao término do ajuste (o que,
no caso em tela, se constituiria na reversão do imóvel locado para a Administração) ou instituindo
uma promessa futura de compra e venda do imóvel. (grifos acrescidos) [...]

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Nessa deliberação, o TCU também estabeleceu outras orientações que devem ser observadas pela
Administração Pública Federal para contratação de operações built to suit. Em breve síntese, podem
ser retiradas da proposta de deliberação e do voto revisor que deram origem ao referido decisum as
seguintes principais conclusões e orientações:
a) a operação de built to suit trata-se de contrato de prestação de serviço, tendo como objeto principal
a locação de um imóvel cuja construção, ou reforma substancial, é parte acessória do referido ajuste;
b) o órgão/entidade deve demonstrar claramente que as necessidades de instalação e de localização
condicionam a escolha de determinado imóvel e que o preço da locação se mostra compatível com o
valor de mercado, segundo avaliação prévia, bem assim que a junção do serviço de locação com a
eventual execução indireta de obra não ofende o princípio do parcelamento do objeto; e
c) a fundamentação da decisão pela locação sob medida deve ser baseada em estudos técnicos,
pareceres e documentos comprobatórios que justifiquem tal opção contratual, incluindo a necessidade
de se demonstrar que, comprovada a impossibilidade de suprir a demanda por outras formas, a
utilização da locação sob encomenda mostra-se inequivocamente mais favorável economicamente do
que a realização de reforma ou adequação em imóvel alugado sob a forma convencional.’
59. É possível, entretanto, que o imóvel especificado já seja de propriedade do futuro
ocupante – nesse caso, o empreendedor deve adquirir o imóvel do futuro ocupante para, ao final das
obras necessárias, alugar-lhe por determinado período. É ainda factível também que, em vez de
adquirir o imóvel especificado de propriedade do futuro ocupante, o empreendedor adquira direito de
superfície sobre o referido imóvel, para, posteriormente, realizar o empreendimento e ceder o uso da
posse ao futuro ocupante [BENEMOND, F. H. Contratos built to suit. Coimbra: Almeidina, 2013, p.
59].
60. Sobre o direito de superfície, trata-se de direito real imobiliário que consiste na concessão
a um terceiro, chamado superficiário, da propriedade de plantações ou construções feitas por este
sobre ou sob o solo alheio, podendo ser pactuado por prazo certo ou indeterminado. Assim, ainda que
o terreno continue propriedade de seu dono original, o superficiário exerce direito de proprietário
sobre a obra por ele erguida.
61. Nesse caso, quando o contraente pertence à Administração Pública, a reversão do bem
imóvel ao final do prazo do contrato deverá ser clausula obrigatória do instrumento contratual,
devido à inalienabilidade do bem público de uso especial (art. 99, inciso II, do Código Civil). Tendo
ocorrido a cessão do direito de superfície ao empreendedor locatário, portanto, a reversão celebrada
por ente do setor público deixa de ser uma simples possibilidade (prevista em abstrato no art. 47-A da
Lei 12.462/2011), e passa a ser obrigatória [CRISTOVAM, J. S. da S. e BERTONCINI, E. J. Contrato
Built to Suit na Administração Pública: um novo modelo de contratação administrativa. Curitiba:
Juruá, 2018, p. 84].
62. Em posicionamentos anteriores (Acórdãos 1.301/2013–TCU–Plenário e 2.219/2018–
TCU–Plenário), o Tribunal se centrou na possibilidade de dispensa de licitação na celebração de
built to suit, não tendo abordado a compatibilidade desse instrumento contratual – quando o imóvel
adequado já for propriedade da administração pública – com o ordenamento jurídico. Referida
celebração é entendida como uma simples variante – em relação ao modelo built to suit importado da
prática empresarial norte-americana e positivado na Lei do inquilinato – na qual não poderia ocorrer
a dispensa de licitação, uma vez que a concorrência, nesse caso, seria sempre possível.
63. Entretanto, a razão pela qual a concorrência sempre se afigura como possível nesses
casos é porque, o componente “locação” resta completamente diminuído frente às prestações de
empreitada. A obrigatoriedade de reversão ao final do contrato faz com que o contrato seja
predominantemente a prestação de um serviço de empreitada – fundeado de modo diverso do habitual
– a menos que, da mesma forma que em uma Parceria Público-Privada (PPP) modalidade concessão
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administrativa, estejam sendo licitados conjuntamente serviços tais como de manutenção, segurança e
administração predial.
64. Lembre-se que, caso a Fiocruz venha a denunciar o contrato, estará obrigada, da mesma
forma, a pagar o valor da soma dos valores dos aluguéis que ainda deveriam ser pagos até o termo
final da locação (“multa compensatória”), conforme previsto no art. 54-A da Lei do Inquilinato. Para
elevar ainda mais a equivalência entre a presente modelagem e o simples pagamento parcelado de
serviços de empreitada, o pagamento dessa referida multa compensatória será igualmente parcelado
em um prazo correspondente ao período remanescente até o final do prazo de vigência do contrato
(clausula vigésima terceira da minuta contratual).
65. Não fica clara, em nenhum momento, a distinção de conteúdo contratual entre a aquisição
financiada de bens e de serviços de empreitada e o contrato ora a ser celebrado. A própria
necessidade de se recorrer ao artifício de se ceder o terreno público ao locatário – para que este
possa cobrar aluguéis do proprietário original – já é forte indício da artificialidade do mecanismo, o
que o distancia da concepção tradicional plasmada no caput do art. 54-A da Lei do Inquilinato, a qual
previa apenas a locação de imóvel precedida da aquisição, construção ou substancial reforma.
66. Na locação built to suit, a contraprestação paga pelo contraente deverá não apenas
remunerar o uso do bem, mas também permitir a amortização, ainda que parcial, dos investimentos
feitos pelo proprietário do imóvel. Isso porque, após o prazo contratual, ainda restaria a possibilidade
de o imóvel vir a ser destinado a outra finalidade pelo locador empreendedor. Mesmo que se
reconheçam as dificuldades na concretização dessa possibilidade, devido às especificações da
construção ou da reforma substancial, ela simplesmente deixa de existir com a reversão obrigatória
do bem ao proprietário original.
67. A realização de built to suit em terreno da própria administração, por outro lado, faz com
que o ente público passe a remunerar o contratado pelo uso de um bem público a ele cedido, e precise
pagar a amortização total dos investimentos feitos pelo cessionário locador.
68. Uma das vantagens do built to suit para o contratante é a de deixar de investir grande
soma na eventual compra, construção ou reforma substancial de um imóvel que, após decorrido o
prazo contratual, pode não atender mais às suas necessidades. Nesse caso, bastaria ao contratante
não renovar o contrato após o decurso do prazo estabelecido – não havendo o que se falar nessa
possibilidade quando o imóvel já era de propriedade do ente público e estabelece-se a reversão
obrigatória.
69. O caráter de operação de crédito do contrato built to suit é derivado do fato de que o
locatário não imobiliza os seus recursos financeiros, nem para a aquisição do terreno (quando não já
é o proprietário), nem para a construção de suas instalações, o que permite direcioná-los para sua
atividade principal.
70. É por tal motivo que contrata uma locação por longo prazo, assumindo o compromisso
financeiro, nos dizeres do art. 29, inciso III, da LRF, de pagar as prestações durante todo esse
período, pagamento que servirá tanto para amortizar os custos da construção e remunerar os
recursos financeiros do contratante empreendedor.
71. O built to suit, portanto, realiza a diluição temporal do valor devido ao empreendedor, a
título de remuneração, ao longo do contrato, iniciando-se a partir do uso e fruição do imóvel por
parte do locatário. A entidade pública, portanto, substitui um gasto público atual (ou, mais
precisamente, a ser realizado durante o prazo de construção da obra desejada – cinco anos) por um
gasto público futuro, diluído no prazo contratual – quinze anos após estes cinco anos.
72. Nos termos do Manual de Demonstrativos Fiscais (9ª edição), em regra, as operações de
crédito possuem pelo menos uma das seguintes características:

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i) envolvem o reconhecimento, por parte do setor público, de um passivo, que equivale a um


aumento do endividamento público com impactos no montante da dívida pública e na capacidade de
endividamento do ente;
ii) pressupõem a existência de risco de não adimplemento de obrigações que, em geral,
materializa-se na forma de cobrança de juros explícitos ou implícitos, deságio e demais encargos
financeiros, tendo como consequência uma redução do Patrimônio Líquido do ente que equivale a um
aumento do valor original da dívida; e
iii) diferimento no tempo, uma vez que, em regra, as operações de crédito envolvem o
recebimento de recursos financeiros, bens, ou prestação de serviços, os quais terão como
contrapartida a incorporação de uma dívida a ser quitada em momento futuro. (grifos acrescidos)
73. No caso, conforme examinado, a partir do recebimento do NCPFI pela Fiocruz, o bem
deve ser contabilizado como ativo, tendo como contrapartida uma obrigação no passivo (de curto e/ou
longo prazo).
74. Nos termos do Acórdão 2.461/2015–TCU–Plenário, de relatoria do ministro Augusto
Nardes, que analisou as contas prestadas pela Presidente da República no exercício de 2014, o
conceito dessas operações de crédito alcança a assunção de qualquer compromisso financeiro por
parte dos entes das três esferas de governo para pagamento com uma abrangência intertemporal.
75. Acrescente-se ainda o fato de o plano de negócio ter sido elaborado sob a premissa de que
a construção do NCPFI será financiada em um modelo de Fundo de Investimento Imobiliário (FII), a
quem será pago, mensalmente, uma parcela referente à reversão do imóvel para o órgão e outra
referente ao aluguel.
76. Nos termos dos esclarecimentos prestados pela própria Fiocruz, referido componente de
“aluguel” da prestação deve ser entendido como instrumento de remuneração do FII, tendo sido
definido o seu valor máximo de forma que o valor a ser recebido pelos cotistas do Fundo importe na
amortização do aporte realizado, acrescido da remuneração desse capital, calculada de acordo com o
fluxo de pagamento ao FII e com o Modelo de Precificação de Ativos Financeiros (CAPM, na sigla em
inglês) estimado para o projeto (peça 276, p. 23).
77. Corrobora-se o entendimento, nesse sentido, de que há o pagamento de um valor de
principal (referente à construção do imóvel) e de outra parcela denominada de aluguel, mas que na
prática se trata da remuneração dos juros devidos ao investidor durante a vigência do contrato,
assumindo todos os contornos de uma operação de crédito.
78. Constata-se também que utilizar dotação de despesas correntes para realizar algo que, em
última análise, constitui investimento público, não pode ser considerada uma boa prática
orçamentário-financeira, por produzir informações contábeis que não refletem a efetiva situação
fiscal e patrimonial do ente administrativo.
79. Nesse sentido, oportuno citar a recomendação trazida pelo Acórdão 1.301/2013–TCU–
Plenário, segundo o qual o Conselho Superior da Justiça do Trabalho e o Conselho Nacional de
Justiça, quando intentassem dotar os Tribunais de imóveis adequados com serviços públicos
adicionados para o bom funcionamento institucional, avaliassem a conveniência e a oportunidade de
celebrar parcerias público-privadas, na modalidade concessão administrativa.
80. Tal recomendação deve ser entendida como efeito da adequada regulação normativa do
instituto da Parceria Público-Privada – modalidade concessão administrativa, que impede a
celebração de parceria cujo objeto seja exclusivamente a realização de obra pública, devendo
necessariamente haver uma prestação de serviços, ainda que precedida de execução de obra. A
exigência de que aquilo que se esteja contratando, em uma PPP modalidade concessão

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administrativa, seja um efetivo serviço – e não, essencialmente, obra pública – justifica seu custeio
com despesas correntes, não de capital.
81. Cite-se a Proposta de Deliberação do Acórdão 1.301/2013–TCU–Plenário, segundo a
qual:
‘Para justificar a estruturação dessa operação no setor público, os motivos informados pelos gestores
públicos situam-se, em essência, na inexistência ou no contingenciamento de dotação orçamentária
para aquisição plena de terreno e construção completa de imóveis, no alto custo das reformas
realizadas em imóveis alugados pela administração pública junto ao setor privado sem devolução
posterior pelo locador dos valores não amortizados e na falta, junto ao mercado imobiliário, de
edificações que atendam às necessidades de estruturação operacional dos órgãos, de forma a melhor
prestarem os serviços públicos. [...]
A contratação ‘built-to-suit’, desenvolvido em caráter experimental na Justiça Federal – Seção
Judiciária do Paraná, foi concebida para implementar a nova política contornando a ausência de
orçamento para construção (investimento) e edificando um imóvel adequado para sediar a Subseção
de Campo Mourão utilizando-se do orçamento destinado ao aluguel de imóveis (despesa corrente).’
82. A inexistência ou contingenciamento de dotações orçamentárias para investimentos não
são fruto do acaso, nem a elaboração da proposta orçamentária e sua aprovação pelos representantes
da população são meras formalidades colocadas por alguém que deseje dificultar os trabalhos do
gestor público. São a melhor forma possível, em um regime democrático, de refletir: i) a ordenação de
preferências e prioridades dessa população; ii) a compatibilidade dessas prioridades com os recursos,
atuais ou futuros, que ela mesmo está disposta a gastar na concretização dessas demandas.
83. Essa compatibilidade, naturalmente, é fortemente influenciada pela atividade econômica,
que determina a possibilidade de arrecadação de receitas públicas, além da própria disposição da
sociedade em alocar seus recursos em gastos governamentais. Todas essas informações devem ser
produzidas de forma transparente, de modo a garantir a responsividade (accountability) dos gestores
públicos perante seus representados.
84. Assim, a eventual inexistência ou contingenciamento de dotações orçamentárias para
investimentos decorre ou da definição de prioridades materializada na Lei Orçamentária Anual, ou de
contingências econômicas, não sendo simples obstáculos a serem driblados de forma artificial, por
mais meritórias que sejam as finalidades buscadas pelo gestor público.
85. Não se busca, entretanto, proibir a operação ou a inovação na gestão pública, mas
simplesmente compatibilizar as referidas inovações com a manutenção da confiabilidade das
demonstrações contábeis do ente administrativo e com os outros valores buscados pelas normas
fiscais, tais como a sustentabilidade e a transparência das finanças públicas.
86. Desse modo, não se procura afastar a possibilidade de a Administração Pública efetuar
locação sob demanda – built to suit junto a particulares, ainda que a construção ou reforma ocorram
em imóvel ou edificação de propriedade pública, com reversão obrigatória do produto do contrato ao
patrimônio público ao final do período de “locação”. Todavia, nessa hipótese, ocorre a celebração de
verdadeira operação de crédito equiparada à aquisição financiada de bens, exigindo-se a observância
de toda a normatização orçamentária e financeira relativa ao tema.
III.2. Das condições legais a serem atendidas pela Fiocruz antes da conclusão da contratação e se o
eventual descumprimento desses requisitos é fator impeditivo para a continuidade do certame
licitatório e/ou da assinatura do contrato
87. No Relatório de Auditoria (peça 276), verificou-se que o desembolso financeiro por parte
da Administração Pública somente será iniciado após três anos de início da obra (pagamento de 60%
do aluguel por dois anos) e terá duração de quinze anos (com pagamento integral do aluguel). Desse
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modo, o instrumento orçamentário plurianual existente não seria capaz de abranger o período total de
desembolso do projeto (vinte anos) e registrar o valor total do investimento.
88. Como consequência, aventou-se a possibilidade de celebração de um contrato cujo valor
global pode alcançar R$ 7,3 bilhões sem nenhum tipo de autorização orçamentária e legislativa
previamente à licitação, não tendo sido possível também verificar o cumprimento de outras regras
orçamentárias e fiscais dispostas na Lei 4.320/1964, na Lei de Responsabilidade Fiscal e na
Constituição Federal.
89. Nos termos do art. 3º da Lei 4.320/1964, a Lei de Orçamentos compreenderá todas as
receitas, inclusive as de operações de crédito autorizadas em lei. A Constituição também vedou a
realização de despesas ou a assunção de obrigações diretas que excedam os créditos orçamentários
ou adicionais (art. 167, inciso II, da CF/1988).
90. Dessa forma, a União deve consignar a referida operação, de alguma forma, no
orçamento – notando-se que a contratação de operação de crédito constitui fato contábil distinto de
sua efetiva realização.
91. No caso de uma aquisição financiada de bens, de acordo com o MCASP, no momento da
contratação da operação de crédito, haveria apenas o registro do compromisso assumido com o
contratado. [BRASIL, STN. Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público. 8ª ed., Brasília,
2018, p. 314].
92. Já o registro da despesa orçamentária (despesa de capital – investimento) ocorreria no
momento da aquisição propriamente dita, i.e., no recebimento do NCPFI de Bio-Manguinhos. A
operação deve ser considerada como efetivada apenas no momento do recebimento do bem adquirido
– usualmente, em arrendamentos mercantis e aquisição financiada de bens, esse recebimento ocorre
logo após a contratação da operação, no mesmo exercício.
93. No presente caso concreto, ele ocorrerá apenas quando a NCPFI de Bio-Manguinhos
houver sido recebida. Portanto, também deve ser nesse momento que se registrará a receita
orçamentária (receita de capital – operação de crédito), ainda que não haja ingresso efetivo de
recurso financeiro nos cofres públicos.
94. Já o registro de despesa orçamentária com amortizações e com encargos do
financiamento (mesmo que estes tenham sido impropriamente chamados de “aluguéis”) deve ocorrer
no momento do pagamento das parcelas – ou seja, inclusive durante o período de “carência”, no qual
a Fiocruz pagará apenas uma parte da prestação total (60%).
95. Quanto à inclusão do investimento na Lei 13.971/2019 (Plano Plurianual 2020–2023),
uma vez que a despesa de investimento será considerada materializada em um único exercício – o de
recebimento do NCPFI – não há a incidência do art. 167, § 1º da CF/1988 e do art. 5º, § 5º, da LRF.
96. Além disso, como condição prévia à efetiva realização da operação de crédito
(recebimento do NCPFI), deverá haver a verificação, por parte do Ministério da Economia, dos
limites e condições exigíveis, nos termos do art. 32 da Lei de Responsabilidade Fiscal:
‘Art. 32. O Ministério da Fazenda verificará o cumprimento dos limites e condições relativos à
realização de operações de crédito de cada ente da Federação, inclusive das empresas por eles
controladas, direta ou indiretamente.
§ 1º O ente interessado formalizará seu pleito fundamentando-o em parecer de seus órgãos técnicos e
jurídicos, demonstrando a relação custo-benefício, o interesse econômico e social da operação e o
atendimento das seguintes condições:
I - existência de prévia e expressa autorização para a contratação, no texto da lei orçamentária, em
créditos adicionais ou lei específica;
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II - inclusão no orçamento ou em créditos adicionais dos recursos provenientes da operação, exceto


no caso de operações por antecipação de receita;
III - observância dos limites e condições fixados pelo Senado Federal;
IV - autorização específica do Senado Federal, quando se tratar de operação de crédito externo;
V - atendimento do disposto no inciso III do art. 167 da Constituição;
VI - observância das demais restrições estabelecidas nesta Lei Complementar.’
97. Tais registros resolveriam a questão da autorização orçamentária, restando a questão da
autorização legislativa. Nesse sentido, a LRF estabeleceu as condições para a geração de despesa: o
ato que cria despesa deverá ser acompanhado de:
a) estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que for entrar em vigor, e
nos dois subsequentes; e
b) declaração do ordenador de despesa de que tem adequação com a LOA e compatibilidade
com o Plano Plurianual e a Lei de Diretrizes Orçamentárias, sem o que tal geração de despesa ou
assunção de obrigação será considerada não autorizada, irregular e lesiva ao patrimônio público
(arts. 15, 16 e 29, §1º, da LRF).
98. Além disso, reforça-se que as operações de crédito estão sujeitas às seguintes exigências:
a) existência de prévia e expressa autorização para a contratação, no texto da lei
orçamentária, em créditos adicionais ou lei específica para o montante total da operação contratada;
b) inclusão no orçamento ou em créditos adicionais dos recursos provenientes da operação
com entrada no exercício a que se refere o orçamento, quando houver, exceto no caso de operações
por antecipação de receita.
99. Assim, uma vez que não se trata de antecipação de receita orçamentária, além da já
examinada inclusão dos recursos provenientes da operação no orçamento ou em créditos adicionais, a
contratação de operações de crédito exige também a existência de prévia e expressa autorização
legislativa.
100. Embora a operação de crédito seja materializada no momento do recebimento do NCPFI
de Bio-Manguinhos, ela deve ser considerada como contratada no momento da celebração do
contrato de built to suit com o vencedor da licitação. É nesse momento que já se faz necessária a
existência de prévia e expressa autorização para a contratação, esteja ela presente no texto da lei
orçamentária do exercício, em créditos adicionais ou em lei específica. Portanto, embora eventual
ausência de autorização legislativa expressa não impeça a realização da licitação, ela deverá impedir
a assinatura do contrato.
101. Por outro lado, para a validade do recebimento do NCPFI pela Fiocruz (efetiva
realização da receita de operação de crédito e ato de geração das despesas) serão exigíveis: a) a
estimativa do impacto orçamentário e financeiro; e b) a declaração do ordenador de despesa de
adequação orçamentária e financeira; e c) inclusão no orçamento ou em créditos adicionais dos
recursos provenientes da operação com entrada no exercício a que se refere o orçamento
102. O eventual descumprimento de tais condições, nesse sentido, atrairá a incidência do art.
37, inciso IV, da LRF, pois implicaria a ocorrência de assunção, sem autorização orçamentária, de
obrigação com fornecedores para pagamento a posteriori de bens e serviços. Nesse sentido, o art. 5º
da Resolução do Senado Federal (RSF) 48/2007 também expressamente veda à União a assunção de
obrigação, sem autorização orçamentária, com fornecedores para pagamento a posteriori de bens e
serviços, reforçando o disposto no art. 37, inciso IV, da LRF.

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103. Nesse sentido, incidiria também o art. 33, § 1º, da LRF, segundo o qual a operação
realizada com infração do disposto na referida Lei será considerada nula, procedendo-se ao seu
cancelamento, mediante a devolução do principal, vedados o pagamento de juros e demais encargos
financeiros.
104. Uma vez que não terá ocorrido a entrada de recursos financeiros da contratada nos cofres
da Fiocruz, a aplicação do referido dispositivo não é imediata, como no caso de uma operação de
mútuo bancário declarada irregular. A anulação da operação após sua efetiva realização envolveria,
na medida do possível, o retorno ao estado anterior à contratação, envolvendo i) o fim da cessão do
terreno especificado; ii) o pagamento à contratada apenas das quantias relativas aos custos de
construção do NCPFI, mas não dos relacionados aos aluguéis – correspondentes, na modelagem
apresentada, à remuneração do capital investido pelo empreendedor imobiliário; e iii) a aplicação
das penalidades legais aos gestores responsáveis (e.g. art. 359-A do Código Penal).
105. Quando da inclusão da operação de crédito no orçamento (no exercício de sua realização
efetiva), é que deverão ser verificados o atendimento à Regra de Ouro do art. 167, inciso III, da
CF/1988 e aos limites da RSF 48/2007, a qual dispõe sobre os limites globais para as operações de
crédito interno e externo da União, de suas autarquias, e demais entidades controladas pelo Poder
Público federal, além de estabelecer limites e condições para a concessão de garantia da União em
operações de crédito externo e interno.
106. Esses limites deverão ser verificados no momento da efetiva realização da operação de
crédito – o recebimento do NCPFI pela Fiocruz – sendo sua observância condição necessária para o
início da etapa de operação e para o início dos pagamentos ao empreendedor locador contratado.
107. Quanto ao atendimento ao Teto de Gastos e às metas fiscais, reitera-se que – embora as
prestações mensais sejam compostas por parcelas referentes à reversão do imóvel para a fundação e
parcelas denominadas de “aluguéis”, esses últimos, no caso concreto, são remuneração não do uso
do NCPFI, mas do uso do capital do contratado investidor – em última análise, juros.
108. Ocorre que, quando da apuração oficial dos resultados fiscais pelos órgãos competentes,
poderá haver classificações distintas quanto ao efeito fiscal dessas transações, tendo em vista que a
Secretaria do Tesouro Nacional – STN, nos termos do Decreto 9.745/2019, Anexo I, arts. 49, inciso
XXV, e 52, inciso IX, utiliza a metodologia “acima da linha”, que considera os fluxos de receitas e
despesas, ao passo que o Banco Central do Brasil – Bacen, nos termos do art. 11, inciso IV, da Lei
14.116/2020 – Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) da União para 2021, c/c a Mensagem
Presidencial de encaminhamento do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) da União para 2021
(Projeto de Lei PLN 28/2020), adota a metodologia “abaixo da linha”, que considera as variações do
endividamento líquido. Nesse sentido, as eventuais discrepâncias decorrentes dessas formas distintas
de apuração deverão ser acompanhadas oportunamente por este Tribunal à luz do disposto no art. 3-
A, § 2º, alíneas “b”, “h” e “j”, da Resolução-TCU 142/2001.
109. Desse modo, o pagamento do contrato é realizado mediante despesas financeiras, não
primárias. Os impactos no Teto de Gastos e nos resultados fiscais serão verificados no exercício de
materialização da operação de crédito, quando do recebimento do NCPFI pela Fiocruz, quando
deverá ser registrada a despesa de capital – investimento.
IV. CONCLUSÃO
110. A LRF optou por conceituar a expressão “operações de crédito” de forma ampla e
exemplificativa, utilizando-se do recurso a “outras operações assemelhadas” para estender a
aplicação do instituto. Nesse sentido, o conceito de operação de crédito foi estabelecido de modo a
nem sempre envolver a entrada de recursos obtidos junto a uma instituição financeira. Citam-se, à
guisa de exemplo, os casos de assunção, reconhecimento ou confissão de dívidas – e de aquisição de
bens financiada pelo próprio vendedor ou fabricante.
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111. Para o setor público, também se conceitua aquisição financiada de bens em sentido
amplo, como a espécie de operação de crédito contratual em que não há ingresso efetivo de recursos
financeiros nos cofres da entidade, como, por exemplo, a aquisição financiada diretamente com o
fornecedor do bem. Pode, portanto, abranger também a prestação de serviços, dentre os quais os de
empreitada – contrato no qual uma das partes, mediante remuneração a ser paga pelo outro
contraente, obriga-se a realizar determinada obra, de acordo com as instruções deste e sem relação
de subordinação.
112. Da forma como a presente operação está estruturada, ela apresenta os elementos típicos
da empreitada: i) um resultado, o Novo Centro de Processamento Final de Imunobiológicos de Bio-
Manguinhos – RJ, a ser definitivamente incorporado ao patrimônio da fundação pública após
determinado prazo; ii) o consentimento, a ser expresso mediante a assinatura de contrato
administrativo atípico; e iii) o preço, a ser pago durante intervalo de tempo e condições previamente
acertadas.
113. O caráter de operação de crédito do contrato built to suit é derivado do fato de que o
empresário locatário não imobiliza os seus recursos financeiros, nem para a aquisição do terreno
(quando não já é o proprietário), nem para a construção de suas instalações, o que permite direcioná-
los para sua atividade principal. É por tal motivo que contrata uma locação por longo prazo,
assumindo o compromisso financeiro, nos dizeres do art. 29, inciso III, da LRF, de pagar as
prestações durante todo esse período, pagamento que servirá tanto para amortizar os custos da
construção e remunerar os recursos financeiros do contratante empreendedor.
114. As locações sob encomenda – built to suit, portanto, realizam a diluição temporal do valor
devido ao empreendedor, a título de remuneração, ao longo do contrato, iniciando-se a partir do uso
e fruição do imóvel por parte do locatário. Tal característica é inerente a todas as contratações na
referida modalidade, mas é especialmente constatada nos casos em que há a reversão obrigatória do
objeto adquirido, construído ou reformado substancialmente ao patrimônio do ente público, nos
termos do art. 47-A, § 2º, da Lei 12.462/2011.
115. Embora a operação de crédito seja materializada no momento do recebimento do NCPFI
de Bio-Manguinhos, ela deve ser considerada como contratada no momento da celebração do
contrato de built to suit com o vencedor da licitação. É nesse momento que já se faz necessária a
existência de prévia e expressa autorização para a contratação, esteja ela presente no texto da lei
orçamentária do exercício, em créditos adicionais ou em lei específica. Portanto, embora eventual
ausência de autorização legislativa expressa não impeça a realização da licitação, ela deverá impedir
a assinatura do contrato.
116. Por outro lado, para a validade do recebimento do NCPFI pela Fiocruz (efetiva
realização da receita de operação de crédito e ato de geração das despesas) e início da operação do
complexo serão exigíveis: a) a estimativa do impacto orçamentário e financeiro; b) a declaração do
ordenador de despesa de adequação orçamentária e financeira; c) a inclusão no orçamento ou em
créditos adicionais dos recursos provenientes da operação com entrada no exercício a que se refere o
orçamento; e d) verificação dos limites e condições relativos à operação de crédito pela Secretaria do
Tesouro Nacional.
117. Além disso, quando da inclusão da operação de crédito no orçamento (no exercício de sua
realização efetiva), deverá ser verificado o atendimento à Regra de Ouro do art. 167, inciso III da
CF/1988 e aos limites da Resolução do Senado Federal 48/2007, a qual dispõe sobre os limites
globais para as operações de crédito interno e externo da União, de suas autarquias, e demais
entidades controladas pelo Poder Público federal, além de estabelecer limites e condições para a
concessão de garantia da União em operações de crédito externo e interno.

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118. Quanto ao impacto das despesas submetidas à EC 95/2016 e às metas fiscais, o


pagamento do contrato é realizado mediante despesas financeiras, não primárias, que não
sensibilizam o Teto de Gastos – apenas os juros passam a ser denominados de “aluguéis”. O impacto
no Teto de Gastos e nos resultados fiscais será verificado no exercício de materialização da operação
de crédito, quando do recebimento do NCPFI pela Fiocruz, quando deverá ser registrada a despesa
de capital – investimento. Ocorre que, quando da apuração oficial dos resultados fiscais pelos órgãos
competentes (STN e Bacen), poderá haver classificações distintas quanto ao efeito fiscal dessas
transações, o que deverá ser acompanhado oportunamente por este Tribunal.
V. PROPOSTA DE ENCAMINHAMENTO
119. Ante o exposto, submete-se ao relator a manifestação requerida no despacho de peça 332,
nos seguintes termos:
a) Quanto à natureza da contratação decorrente do RDC Presencial 01/2021-BM como
operação de crédito e à eventual necessidade de cumprimento da legislação orçamentária e
financeira:
i. as locações sob encomenda – built to suit, ao realizarem a diluição temporal do valor
devido ao empreendedor ao longo do contrato, caracterizam-se como operações de crédito nos termos
do art. 29, inciso III, da Lei Complementar 101/2000. Tal característica é especialmente verificada
nos casos em que há a reversão obrigatória do objeto adquirido, construído ou reformado
substancialmente ao patrimônio do ente público, nos termos do art. 47-A, § 2º, da Lei 12.462/2011;
ii. como condição para a assinatura do contrato, faz-se necessária a existência de prévia e
expressa autorização para a contratação da operação de crédito, esteja ela presente no texto da lei
orçamentária do exercício, em créditos adicionais ou em lei específica, nos termos do art. 32, inciso I,
da Lei Complementar 101/2000;
iii. a operação de crédito é definitivamente materializada no momento do recebimento do
objeto adquirido, construído ou reformado substancialmente pelo contratante. Como condição para o
referido aperfeiçoamento da operação e o recebimento do objeto da locação sob encomenda, exigem-
se, nos termos do art. 16, incisos I e II, e do art. 32, inciso II, ambos da Lei Complementar 101/2000:
a) a estimativa do impacto orçamentário e financeiro; b) a declaração do ordenador de despesa de
adequação orçamentária e financeira; c) a inclusão no orçamento ou em créditos adicionais dos
recursos provenientes da operação; e d) verificação dos limites e condições relativos à operação de
crédito pela Secretaria do Tesouro Nacional;
iv. quando da inclusão da operação de crédito no orçamento (no exercício de sua realização
efetiva), bem como do recebimento do NCPFI pela Fiocruz (registro da despesa primária com a
incorporação do bem), deverá ser verificado o atendimento ao Teto de Gastos da EC 95/2016, à
Regra de Ouro do art. 167, inciso III, da CF/1988, às metas fiscais de que trata a Lei Complementar
101/2000 e a Lei de Diretrizes Orçamentárias e aos limites da Resolução do Senado Federal 48/2007.
b) Encaminhar cópia do acordão à Fiocruz, ao Ministério da Saúde, à Secretaria do Tesouro
Nacional e à Secretaria de Orçamento Federal.”
10. Na sequência, Bio-Manguinhos/Fiocruz fez juntar os elementos adicionais de defesa que
passaram a constituir as peças 336 a 340.
11. À vista da juntada de novo detalhamento do orçamento das obras do NCPFI, fiz retornar os
autos à SeinfraUrbana, que elaborou a seguinte análise:
“A presente instrução tem por objetivo avaliar a adequação das planilhas orçamentárias
(chamada de Capex, em sua revisão R6R data-base set/20) para a construção do Novo Centro de
processamento Final de Imunobiológicos de Bio-Manguinhos/Fiocruz (NCPFI), localizado em Santa
Cruz, zona oeste do município do Rio de Janeiro/RJ.
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2. A nova revisão do Capex avaliada neste parecer foi encaminhada via e-mail pela Fiocruz
(peça 343) e todas as planilhas e documentos que a integram encontram-se como itens não
digitalizados junto a peça 343.
II. EXAME TÉCNICO
3. O projeto do NCPFI consiste no desenvolvimento, construção e implantação de novas
instalações industriais para as atividades de processamento final (formulação, envase, liofilização,
recravação, revisão, rotulagem e embalagem), controle e garantia da qualidade, armazenagem de
matérias primas e de produtos acabados, construção de áreas de suporte técnico e administrativo e a
urbanização do novo Campus de Santa Cruz.
4. Cabe pontuar que o empreendimento se reveste de particularidades derivadas de sua
natureza. Sendo assim, na análise orçamentária, a representatividade dos itens provenientes de
sistemas oficiais de referência de preço é baixa nos itens integrantes das faixas A e B da Curva ABC
elaborada pela jurisdicionada (peça 338, p.48).
5. Sendo assim, dada a alta materialidade dos itens provenientes de pesquisa de preços,
promoveu-se, de forma adaptativa, a análise do Capex apresentado com o intuito de avaliar se as
informações disponíveis são completas e suficientes para que o orçamento seja considerado auditável.
II.1. Faixa A da curva ABC
6. A faixa A da curva ABC é composta de seis itens que somados totalizam materialidade
superior a R$ 1,5 bilhão de reais.
Figura 1

7. Todos os itens integrantes da faixa A da curva ABC são provenientes de pesquisa de preço
II.1.1. Estrutura Metálica
8. O item “2.4 Estrutura Metálica” representa de acordo com a curva ABC produzida pelo
próprio jurisdicionado mais de 17% do montante financeiro da obra e é obtido via pesquisa de preço.
9. Na memória de cálculo dos itens (planilha: “MEMO.CALC.ESTRUTURA.METÁLICA”,
pasta: “CAPEX-Memo_Calc_R6R.xlsx”) consta a informação que o item foi orçado com cinco
empresas, porém as respectivas cotações de preço não constam dos arquivos entregues.
10. Cabe pontuar que, de acordo com a própria jurisdicionada em nota de esclarecimento
(RL-3-500-Z-00904-R6R - CRITÉRIOS DE CORREÇÃO E ATUALIZAÇÃO DO CAPEX PO-3-500-Z-
00904-R6E, peça 338, p.3-6), foram obtidos preços atualizados dos principais itens integrantes da
curva ABC. Porém, na lista apresentada no documento supracitado não se encontra o item “Estrutura
Metálica”, bem como não há as cotações na documentação entregue, o que sinaliza que a atualização
de preços do item pode ter sido realizada via índice. De acordo com o documento, para os itens que
não tiveram a proposta de preço atualizada, o valor foi corrigido via índice a partir dos valores
cotados em 2015.
11. Conforme apontado na auditoria, é esperado que o item de maior materialidade possua
seu preço o mais próximo da realidade possível, sendo importante que a sua atualização via índice

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seja executada apenas para horizontes de tempo menores, para se enquadrar em data-base geral do
orçamento.
Quantitativos e Unidades
12. Observou-se que os quantitativos apresentados na curva ABC (figura 1) para o item
“Estrutura Metálica” eram inferiores os constantes da memória de cálculo, pois deixou de contemplar
o item “Estrutura Metálica” do item 3.3 da planilha (“3-PLAN.CIVIL - ÁREA EXTERNA”) da pasta
principal (PO-3-500Z-00904-R6R.xlsx).
13. Logo, apenas após a agregação desses dois quantitativos é que se chega ao quantitativo
apresentado na memória de cálculo e o item salta de R$ 506 milhões para R$ 510 milhões de valor
total.
14. Outro ponto dissonante é que na totalização dos itens na planilha de memória de cálculo
(planilha: “MEMO.CALC.ESTRUTURA.METÁLICA”, pasta: “CAPEX-Memo_Calc_R6R.xlsx”,
Figura 2) consta o item “Conectores Stud Bolt (Ø 3/4")” que tem como unidade de medida
“quantidade (Qt)”, porém, foi incorporado ao serviço na planilha geral (planilha: “2-PLAN.CIVIL-
EDIFICAÇÕES”, pasta: “PO-3-500Z-00904-R6R.xlsx”, Figura 3) o item “2.4 – Estrutura Metálica”
conta apenas com a unidade de medida quilogramas (kg).
Figura 2

Figura 3

15. Ainda, percebe-se que o item tratado como Estrutura Metálica contempla, além dos "stud
bolts", proteção, pintura, transporte vertical/horizontal e demais serviços necessários a execução
conforme especificações técnicas e projetos, porém a unidade de medida é uma só “kg”. Logo, se
depreende da observação que os itens supra sofreram uma transformação para serem expressos em
“kg” na orçamentação. No entanto, não há memória de cálculo que detalhe esse procedimento.
16. Por tudo dito entende-se que o item de maior materialidade no orçamento padece de
fragilidades no processo de orçamentação, como falta de cotação atualizada, inconsistência no
somatório dos quantitativos, bem como transformação de unidades de medidas sem a devida memória
de cálculo. Tais fragilidades aumenta assim o risco de obtenção de preços inadequados, bem como
prejudicam a auditabilidade do orçamento.
II.1.2. HVAC
17. O Heating, Ventilating and Air Conditioning (Hvac), em português, é traduzido para
“Aquecimento, Ventilação e Ar-Condicionado”, é o sistema de climatização utilizada no complexo.
18. Na curva ABC elaborada pelo jurisdicionado o item ocupa a segunda posição em termos
de materialidade, representando quase 10% do custo total da obra.
19. Pelas exigências de ambientes com criticidade de assepsia, o Hvac utilizado no NCPFI é
de elevada especificidade. Sendo assim, houve a impossibilidade de utilização de preço de sistemas de
climatização oriundos de sistemas oficiais de referência de preço. Tal justificativa já havia sido

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recepcionada por essa unidade técnica que entendeu válida a pesquisa de preço para cotação do item
em comento.
20. Porém, em análise do presente Capex (versão R6R), na planilha de memória de cálculo do
Hvac, consta apenas a proposta de uma única fornecedora: Heating Cooling.
21. Por certo que o item se reveste de uma especificidade derivada das exigências inerentes ao
complexo, porém, é de se esperar que em uma busca por fornecedores em âmbito mundial, seja
possível encontrar mais de um fornecedor apto a atender as especificidades demandadas.
22. E, a despeito desse Tribunal, em circunstâncias excepcionais, aceitar a utilização em
orçamentação de obras públicas de itens não integrantes de sistemas oficiais de referência de preço,
nos termos do Decreto 7.983, de 8 de abril de 2013, há o entendimento de que tais pesquisas de preço
devem seguir um mínimo de exigência procedimental.
23. Assim, no caso de não ser possível obter preços referenciais nos sistemas oficiais para a
estimativa de custos, deve ser realizada pesquisa de preços contendo o mínimo de três cotações de
empresas/fornecedores distintos, fazendo constar do respectivo processo a documentação
comprobatória pertinente aos levantamentos e estudos que fundamentaram o preço estimado. Caso
não seja possível obter esse número de cotações, deve ser elaborada justificativa circunstanciada. O
entendimento narrado tem amparo nos Acórdão 2.531/2011-TCU-Plenário e Acórdão 1.266/2011 -
TCU-Plenário.
24. No item em análise não foi apresentada a justificativa para a cotação com um único
fornecedor. E é esperado, como já dito, que em um cenário de oferta mundial exista mais de um
fornecedor para o item cotado.
II.1.3. Instalação Elétrica Industrial (SE-PRINC. / SE's-SEC. / GERADORES)
25. O item “7.1 Instalação Elétrica Industrial” é o terceiro item da curva ABC com um custo
de mais de R$ 245 milhões e representa 8% do custo total da obra.
26. O item é um agrupamento de três itens da planilha “7-PLAN.INSTAL.INDUST.” que
integra a pasta “PO-3-500Z-00904-R6R”.
Figura 4

27. A presente análise identificou que também não foram realizadas três cotações de preço
para o item de maior relevância dentre os agrupados: “Subestações Secundarias” que representa
mais de 70% dos valores agrupados.
28. Nas memórias de cálculo do item selecionado (planilhas:
“MEMO_CALC_SE_SECUNDÁRIAS-I” e “MEMO.CALC.SE-SECUNDÁRIAS-II” da pasta:
“CAPEX-Memo_Calc_R6R.xlsx”) consta a pesquisa de preço em duas empresas, porém deixa a
entender que devido a acréscimo e exclusão de itens, apenas a proposta da empresa Weg
Equipamentos Elétricos SA foi considerada. Esse entendimento ganha força, pois apenas a proposta
dessa empresa consta na documentação apresentada.
29. Mesmo que a proposta da empresa Orteng fosse considerada, ainda não seria atingido o
número recomendado de pelo menos três cotações.
Figura 5

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II.1.4. Montagem Eletromecânica


30. O item “7.5 montagens eletromecânica” da ABC ocupa a quarta posição em
materialidade com mais de R$ 180 milhões de custo financeiro representando mais de 6% do custo
total da obra.
31. Novamente há falhas na metodologia de pesquisa de preço, pois a jurisdicionada
apresentou apenas uma cotação junto à empresa Montcalm Montagens Industriais (planilha:
“MEMO.CALC.MONT.ELETROMEC”, da pasta: “CAPEX-Memo_Calc_R6R.xlsx”).
32. Como já dito reiteradamente na presente peça a especificidade das atividades necessárias
para a execução da obra é consenso para todos, porém, espera-se que, em uma busca em âmbito
mundial, existam mais empresas aptas a desempenhar a montagem eletromecânica requerida para o
empreendimento.
33. Reitera-se que a jurisdicionada não apresentou justificativa para a cotação única.
34. Também cabe pontuar que não há o detalhamento dos itens necessários à execução do
serviço de montagem eletromecânica na planilha de memória de cálculo
(“MEMO.CALC.MONT.ELETROMEC”), o que prejudica a auditabilidade do orçamento.
35. Ainda consta um rateio por metro quadrado de cada edificação do complexo, sendo
utilizado assim a unidade “m2” como unidade de medida de montagem eletromecânica. Tal
procedimento insere incerteza na precificação do item e inviabiliza a aferição junto a outros
fornecedores.
II.1.5. Serviço Complementar Adicional 07 - Instalação e montagem dos equipamentos de
processo/produção fornecidos por Bio-Manguinhos
36. O quinto item da ABC “10.7” deriva da necessidade de se montar os equipamentos já
adquiridos por Bio-Manguinhos/Fiocruz e que não integram a presente contratação. Alguns dos
equipamentos já foram entregues e encontram-se em galpões armazenadores, sendo necessário o seu
transporte até a obra em momento adequado da execução da obra, a fim de possibilitar a entrada de
alguns equipamentos de grande porte.
37. O serviço de instalação é o quinto item em materialidade da curva ABC com
aproximadamente R$ 170 milhões de custo o que representa aproximadamente 6% do custo total do
empreendimento.

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38. Novamente a jurisdicionada apresentou apenas uma cotação de preço, executada junto a
empresa Atec Sterile Technology, porém, para o presente item, apesar de não formalizar a
justificativa, a jurisdicionada alegou durante a auditoria que a empresa que instalaria os
equipamentos deveria ser a Atec por questões de garantia. Tal justificativa se mostra razoável.
39. Porém, nota-se que o item ora tratado abarca todas as atividades necessárias para a
retirada dos equipamentos dos galpões até sua completa instalação na fábrica. Em análise do
detalhamento do preço para a orçamentação do item, percebe-se a aplicação integral dos BDIs
(material (16,60%) e mão de obra (22,98%) na composição de preço do item. Do cálculo do BDI
efetivo obtém-se um BDI de 21,43%.
Figura 6

40. Percebe-se que a vencedora do certame deverá contratar a empresa Atec, sem opção de
execução direta do serviço, e reitera-se que o item em análise envolve desde o transporte até a
completa instalação na fábrica. Neste caso, entende-se que é aplicável, por analogia, a ideia de um
BDI reduzido, na medida em que a participação da empresa executora da obra, na realização desses
serviços é reduzida.
41. Então apenas com o intuito de avaliação de impacto, uma vez que o BDI efetivo da obra
completa está abaixo do 1º quartil do quadro proposto no Acórdão 2.622/2013-TCU-Plenário,
projetou-se a utilização do 1º quartil do BDI para itens de mero fornecimento de materiais e
equipamentos: 11,10%.
Figura 7

42. Com a adaptação a diferença de valor é de mais de R$ 17 milhões para o item.


II.1.6. Divisórias
43. O sexto item da curva ABC é “4.2 Divisórias” e compreende o agrupamento de seis itens
como detalhado na planilha: “4-PLAN.ARQ. – EDIFICAÇÕES” da pasta: “PO-3-500Z-00904-
R6R.xlsx”.
Figura 8

47

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44. A presente análise focou no item “4.2.1 Divisórias Padrão GMP” que representa mais de
90% do custo total do item.
45. Novamente cabe pontuar que a jurisdicionada informa que procedeu a atualização da
cotação de preço em maio de 2020 para os materiais GMP (peça 338, p. 7), mas nas memórias de
cálculo apresentadas não constam as cotações junto às empresas.
46. Ainda na memória de cálculo consta apenas o detalhamento de uma única empresa (AES
Clean Technology), o que, caso confirmado, fere o entendimento desse Tribunal quanto à necessidade
de pelo menos três cotações para obtenção do preço orçado.
II.2. Faixa B da curva ABC
47. A faixa B da curva ABC é composta de doze itens e tem uma materialidade de
aproximadamente R$ 900 milhões de reais.
Figura 9

48. Dada a quantidade de itens e o tempo exíguo para análise, para a faixa B foi promovido
um levantamento de questionamentos oriundos de constatações durante a análise de alguns itens
dessa faixa.
i. Qual a justificativa para a mão de obra (de instalação de divisórias e forro gmp) ser de
10% do valor do material (embora esteja escrito 16% na planilha “CAPEX-Memo_Calc_R6R”, na
aba “MEMO.CALC.MAT.GMP-II”)? Principalmente considerando que o produto está cotado em
dólar, vai ser paga mão de obra sobre imposto e transporte?
ii. Por que todo o material GMP está sendo importado? Não há fabricante nacional capaz de
atender à demanda?
iii. Há erros na planilha desmembrada. Item 9.6, que segundo a curva ABC (planilha:
“CURVA ABC_NIVEL2”, pasta: “Curva ABC_NCPFI_CAPEX R6R+SERV.COMP. R6R1aR6R9”)
teria “CENTRAIS PW / PS / WFI”, contém outra coisa. O item em questão está no 9.20 da planilha:
“9-PLAN.EQUIP.UTILIDADES” na pasta: “PO-3-500Z-00904-R6R.xlsx”.
iv. Como foram obtidos os preços das esquadrias (item 4.12)? Não foram encontradas as
fontes de referência. Material e mão de obra são divididos na proporção 80/20, sem justificativas para
tal procedimento.
v. Itens referenciados no Sinapi estão corretos de acordo com uma análise amostral de dez
itens.
vi. Não há correspondência perfeita entre a planilha “curva ABC” e a planilha “PO-3-500Z-
00904-R6R”, dificultando a avaliação. Exemplo: o primeiro item da parte B da curva é “6.3 –
instalação de combate a incêndio”. Na planilha PO-3-500Z-00904-R6R, o item está no 6.2.2. O item
7.3 da curva ABC, na verdade corresponde aos itens 7.5 e 7.6 do orçamento completo. Também não
está clara a forma de obtenção dos preços.
vii. O item “ponto de combate a incêndio tipo sprinkler c/ todos os insumos” está cotado a
quase R$ 4 mil por unidade (de sprinkler), totalizando quase R$ 100 milhões só de sprinkler e seus
48

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acessórios. Obtenção de apenas duas propostas de fornecimento (ver planilha


“MEMO.CALC.INCENDIO-I”, pasta “CAPEX-Memo_Calc_R6R.xlsx”) muito díspares, gerando
insegurança no preço adotado. Por exemplo, na planilha supra consta o orçamento do item
“SISTEMA DE COMBATE COMBATE POR SPRINKLER” com a empresa Conaut por R$
65.021.752,00 e, o mesmo item, por R$ 1.893.000,00 com a empresa Detec.
II.3. BDI
49. Quanto ao BDI, o novo Capex (R6R data-base set/20) mantém a metodologia de
segregação em materiais e mão de obra da mesma forma adotada desde a primeira versão do Capex.
50. Com já dito na análise dos comentários dos gestores à auditoria, a segregação do BDI nos
moldes promovidos não é prática recepcionada por esse Tribunal. A segregação do BDI propicia
ainda mais distorções na análise para os itens que não apresentam valores segregados de materiais e
mão de obra, pois nesses casos a jurisdicionada promove uma distribuição dos custos em 80% para
materiais e 20% para mão de obra o que ocasiona um aumento no grau de imprecisão do preço final
do item.
51. Adentrando-se nos valores dos BDIs, a jurisdicionada atribuiu 16,60% para material e
22,98% para mão de obra, bem como apresentou suas composições detalhadas (BDI materiais:
planilha “BDI MATERIAL”, BDI mão de obra: planilha “BDI M.O.”; ambos na pasta: “PO-3-500Z-
00904-R6R.xlsx”).
52. Ainda, em uma análise expedita, realizou-se o cálculo do BDI total efetivo aplicado para
alcançar o preço final da obra e obteve-se o valor de 18,58%. Esse valor encontra-se abaixo do 1º
quartil dos referencias de BDI para obras de edificação do Acórdão 2.622/2013-TCU-Plenário,
porém, reitera-se que o cálculo supra é apenas uma avaliação expedita e o fato de o valor do BDI
efetivo ser adequado não ratifica a metodologia de cálculo utilizada pela jurisdicionada.
Figura 10

53. Ainda, quanto ao BDI, em orçamentos que apresentam uma materialidade elevada de itens
de serviços provenientes de pesquisa de preço, cabe o cuidado de não duplicar o BDI, total ou
parcialmente pois, via de regra, os custos indiretos (como tributos, custos administrativos e lucro)
necessários à execução daqueles encargos contratuais já se encontram na proposta apresentada.
Logo, aplicar o BDI contratual sobre o valor da pesquisa pode redundar na sobreavaliação de preços
do serviço em comparação com os de mercado, principalmente se o serviço for executado diretamente
pela futura contratada (sem a subcontratação).
III. CONCLUSÃO
54. A presente instrução teve por objetivo avaliar se foram corrigidas as impropriedades
apontadas anteriormente no novo Capex (revisão R6R data-base set/20) para a construção do NCPFI
de Bio-Manguinho/Fiocruz.
55. Reitera-se que a análise ora proferida não teve o condão de determinar a adequabilidade
do preço final proposto para a obra, mas sim de avaliar a adequabilidade dos procedimentos
49

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utilizados para a produção das planilhas orçamentárias que integram o Capex e se as informações
apresentadas permitem considerar orçamento auditável.
56. Cabe reconhecer que em análise comparativa com a versão do Capex (versão R6E)
verificada na instrução que avaliou os comentários dos gestores houve um aprimoramento das peças
com a busca de um maior detalhamento, apresentando memórias de cálculos e algumas CPUs.
57. Como já dito na supracitada instrução, o Capex (tanto na versão R6E como na versão
R6R) não apresenta mais a unidade de medida “RT” que designava rateio de valores. Tal unidade
não se revestia de qualidade, pois nem unidade pode ser considerada e inseria uma dificuldade no
dimensionamento e análise dos itens do orçamento por ela (“RT”) mensurados.
58. Também se reconhece que a jurisdicionada recepcionou em algumas medidas os
encaminhamentos proferidos nos Acórdãos 2.687/2018-TCU-Plenário e 2.008/2017-TCU-Plenário e
buscou uma maior representatividade dos itens integrantes da obra que continham referência em
sistemas oficiais de preço.
59. Do outro lado, ainda restam apontamentos que fragilizam o procedimento de
orçamentação e dificultam a análise como: atualização via índice de preços para horizontes acima de
3 anos para itens de alta materialidade (por exemplo, estrutura metálicas); BDI fragmentado em
materiais e mão de obra; e pesquisa de preço com menos de três cotações. Verifica-se ainda que a
falta de detalhamento de alguns serviços de grande relevância e a complexidade de apresentação dos
serviços em diferentes planilhas, com rateios em diferentes prédios dificultam a conciliação de valores
e a análise da adequabilidade do preço.”
É o relatório.

50

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VOTO

Cuidam os autos de relatório de auditoria realizada na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz)


com o objetivo de avaliar, por meio da análise da minuta do edital RDC Presencial 1/2019-BM e seus
anexos, a adequação da modelagem built to suit (BTS) à execução do Novo Centro de Processamento
Final de Imunobiológicos de Bio-Manguinhos – RJ (NCPFI), localizado em Santa Cruz, zona oeste do
município do Rio de Janeiro/RJ.
2. Após a conclusão dos trabalhos de campo, a Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura
Urbana (SeinfraUrbana) verificou se houve atendimento do Acórdão 2.687/2018-Plenário, que, por sua
vez, cuidava do monitoramento de determinações proferidas em auditoria realizada no aludido
empreendimento, no âmbito do Fiscobras 2017.
3. Na ocasião, a unidade técnica logrou encontrar os seguintes achados, conforme descrição
contida no despacho preliminar que proferi nestes autos:
a) “falhas nos estudos de viabilidade técnica-econômica-financeira (EVTE) do
empreendimento, consubstanciadas pelas seguintes ocorrências: não saneamento das inconsistências
verificadas no Acórdão 2.687/2018-Plenário, de modo que não foi possível comprovar que o projeto é
viável financeira e economicamente; falhas no estudo de alternativas ao não se comprovar que a
escolha pelo modelo built to suit é a mais adequada para a execução do objeto” (Achado 3.1 – IGC);
b) “preço de aluguel inadequado devido a falhas no orçamento da obra” (Achado 3.2 –
IGC);
c) “riscos relacionados à aplicação do modelo built to suit, a saber: riscos relacionados à
falta de regulamentação do modelo, como por exemplo a interpretação da extensão do percentual
limitador do valor aluguel e a definição das regras de atualização contratual; ausência de
instrumento orçamentário para aprovação do investimento e possíveis impactos nas regras fiscais;
falta de requisitos mínimos para utilização do Fundo Garantidor de Infraestrutura (FGIE) como
cobertura da operação BTS” (Achado 3.3 – F/I); e
d) “riscos identificados na minuta do edital que podem prejudicar a competitividade do
certame, a saber: conflito de interesses no modelo de contratação da FGV para prestação de serviço
de assessoria técnica e adoção de critérios inadequados de habilitação e julgamento” (Achado 3.4 –
F/I).
4. Nesse cenário, ordenei a oitiva da Fiocruz, com fulcro no art. 250, inciso V, do Regimento
Interno do TCU, a fim de subsidiar o direito de defesa da entidade e permitir o amplo entendimento
das conclusões preliminares da unidade técnica, antes de eventual adoção de medida corretiva.
5. Cumprida a medida processual, a SeinfraUrbana analisou a resposta enviada pela entidade,
na forma da instrução transcrita no relatório que antecede este voto.
6. Neste ponto, cabe advertir que entre o relatório da fiscalização e a última instrução da
unidade técnica, houve a publicação do edital RDC Presencial 1/2021-BM e seus anexos, que
substituiu a minuta anterior, inicialmente analisada pela SeinfraUrbana. Houve atualizações nos
valores orçados, frutos da mudança na data-base, e alterações pontuais nas condições de pagamento da
modelagem, que não afetam as constatações iniciais da equipe de auditoria.
7. Com relação às falhas no EVTE, a unidade técnica aduziu que a Fiocruz/Bio-Manguinhos
acatou algumas recomendações, refutou outras e promoveu aprimoramentos no estudo. Diante desse
contexto e da publicação do edital de licitação das obras civis do NCPFI, concluiu que não era mais
razoável a proposta contida no relatório preliminar de reiteração da determinação do item 9.2.1 do
Acórdão 2.687/2018-Plenário.

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8. No que se refere à ausência de estudos de alternativas, a SeinfraUrbana entendeu que,


apesar da falta de resposta da Fiocruz/Bio-Manguinhos acerca dessa questão, também não era mais
aplicável a determinação alvitrada no relatório preliminar, tendo em vista o estágio atual da licitação.
Desse modo, propôs a expedição de ciência à Fiocruz, a fim de possibilitar o aprimoramento da gestão
das futuras contratações da entidade.
9. Quanto ao preço de aluguel inadequado devido às falhas no orçamento da obra, as
impropriedades decorriam das fragilidades e imperfeições encontradas no processo de orçamentação
do empreendimento, bem como na sua modelagem financeira. Sobre o assunto, a unidade técnica
asseverou que os argumentos trazidos pela Fiocruz/Bio-Manguinhos não conseguiram elidir todos os
apontamentos proferidos pela equipe de auditoria, o que impossibilitava a avaliação da economicidade
do objeto.
10. Todavia, diante do atual estágio da contratação e da não obrigatoriedade do detalhamento
do orçamento da obra nos moldes exigidos pela Lei 8.666/1993, em licitações para a execução de
contratos built to suit, assinalou mais uma vez que não era mais adequada a reiteração das
determinações pendentes de implementação, sendo cabível a cientificação da Fiocruz sobre as falhas
apontadas.
11. Com relação aos riscos relacionados à aplicação do referido modelo de contratação, a
SeinfraUrbana aduziu que era imprescindível o posicionamento da Secretaria do Tesouro Nacional
acerca da classificação da despesa e o seu enquadramento como operação de crédito, bem como sobre
o instrumento orçamentário adequado para o seu custeio, considerando o período de duração de 20
anos, com desembolsos após 3 anos do início do ajuste.
12. No tocante ao Fundo Garantidor de Infraestrutura (FGIE), a unidade técnica destacou que a
entidade jurisdicionada havia reconhecido a existência de incertezas quanto à possibilidade de
utilização dessa modalidade de garantia em contratos built to suit, tendo informado que vinha
buscando a solução para o impasse junto aos gestores do fundo.
13. Assim, invocando mais uma vez o atual estágio da contratação (edital publicado) e os
encaminhamentos promovidos pela Fiocruz/Bio-Manguinhos junto ao FGIE com o objetivo de sanar
as pendências, consignou mais uma vez que não era mais aplicável a proposição de determinação
referente ao assunto proferida no bojo do relatório preliminar de auditoria, tendo alvitrado a expedição
de ciência a respeito dos riscos remanescentes.
14. Acerca do último achado, a SeinfraUrbana reconheceu que a Fiocruz/Bio-Manguinhos
havia corrigido alguns apontamentos elencados no relatório preliminar e aprimorado a forma de
contratação da FGV, ao estabelecer um valor fixo para o contrato, muito embora em montante próximo
ao teto consubstanciado na modelagem financeira.
15. Ademais, a unidade técnica assinalou que a retirada do sigilo da licitação mitigou os riscos
de assimetria de informações entre os licitantes e de direcionamento da contratação, de modo que não
eram mais necessárias as determinações entabuladas nesse sentido no relatório preliminar da
fiscalização.
16. A SeinfraUrbana verificou que ainda persistia a ausência de estudo ou justificativa
demonstrando a adequabilidade da atribuição do valor de R$ 1 bilhão, de capital próprio ou financiado,
como critério de habilitação disposto no item 7.9.1 da nova minuta do edital. Não obstante, a unidade
técnica pontuou que a inexistência de empreendimentos que possam servir de comparação ao ora
analisado torna inoportuno o encaminhamento anterior, contido no relatório preliminar, para que fosse
providenciada a devida justificativa da condição de habilitação.
17. Dessa forma, a unidade técnica alvitrou:

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“227. Considerar não mais aplicável a determinação do subitem 9.2.1 do Acórdão


2.687/2018-TCU- Plenário.
228. Considerar não atendidos os itens 9.2.2, 9.2.3 e 9.3, todos do Acórdão
2.687/2018-TCU- Plenário.
229. Dar ciência à Fiocruz, com fundamento no art. 9º, inciso I, da Resolução-TCU
315, de 2020:
229.1. das falhas na planilha orçamentária do projeto executivo, conforme
impropriedades elencadas nesta instrução e no relatório de auditoria, incluindo ausências
de unidades, de quantitativos, de preço unitário e de composição de preços unitários;
atualização via índice de preço das cotações obtidas há mais de 3 anos junto aos
fornecedores em detrimento de ajuste dos preços dos serviços pelos valores de mercado; a
utilização de unidade de rateio e demais verbas em detrimento de unidades efetivas de
medida de serviço; utilização de metodologia de cálculo de BDI não amparada por esse
Tribunal, conforme Acórdão 2.622/2013-TCU-Plenário e Decreto 7.983/2013;
229.2. que as contratações no modelo built to suit deve ser precedida de estudo de
alternativas, destacando-se o custo-benefício de cada alternativa levantada do ponto de
vista dos riscos envolvidos, dos valores a serem desembolsados e demais vantagens e
desvantagem verificadas, consoante o disposto no Acórdão 1.301/2013-TCU-Plenário.
229.3. que a falta de formalização da garantia locatícia pelo Fundo Garantidor de
Infraestrutura – FGIE, bem como as regras de recomposição do fundo em caso de
utilização expõem o empreendimento a riscos de descontinuidade e podem afetar os preços
das propostas da licitação;
230. Encaminhar o acórdão que vier a ser proferido, acompanhado do voto e do
relatório que o fundamentarem, aos Ministérios da Economia; da Saúde, Casa Civil, bem
como para o Congresso Nacional, para fins de alerta sobre os riscos de insegurança
jurídica e possíveis impactos orçamentários e fiscais identificados por este Tribunal
devido à falta de regulamentação da aplicação do modelo built to suit no setor público,
especialmente para os contratos que prevejam reversão do imóvel à Administração
Pública.”
18. Submetidos os autos ao meu gabinete, verifiquei que algumas questões levantadas pela
SeinfraUrbana envolviam debate de temas afetos ao direito financeiro e orçamentário, a exemplo da
discussão quanto à natureza da contratação como operação de crédito e à eventual necessidade de
cumprimento da legislação orçamentária e financeira, em especial dos arts. 30 a 32 da LRF.
19. Tendo em vista a especificidade do tema e a urgência no deslinde da questão, haja vista a
iminência do prazo de abertura das propostas da licitação (10/8/2021 – posteriormente adiado para
24/8/2021), solicitei a manifestação da Secretaria de Macroavaliação Governamental (Semag), a fim
de que:
a) analisasse se o contrato decorrente do RDC Presencial 1/2021-BM poderia ser enquadrado
como uma operação de crédito, do tipo aquisição financiada de bem;
b) em caso positivo, indicasse as condições legais a serem atendidas pela Fiocruz antes da
conclusão da contratação e se o eventual descumprimento desses requisitos seria fator impeditivo para
a continuidade do certame licitatório e/ou para a assinatura do contrato; e
c) se pronunciasse a respeito de outras questões vinculadas à referida contratação como BTS
que eventualmente possam implicar a violação de normas orçamentárias e financeiras.
20. Em cumprimento, a unidade técnica especializada concluiu que:
3

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“i. as locações sob encomenda – built to suit, ao realizarem a diluição temporal do valor
devido ao empreendedor ao longo do contrato, caracterizam-se como operações de crédito
nos termos do art. 29, inciso III, da Lei Complementar 101/2000. Tal característica é
especialmente verificada nos casos em que há a reversão obrigatória do objeto adquirido,
construído ou reformado substancialmente ao patrimônio do ente público, nos termos do
art. 47-A, § 2º, da Lei 12.462/2011;
ii. como condição para a assinatura do contrato, faz-se necessária a existência de prévia e
expressa autorização para a contratação da operação de crédito, esteja ela presente no
texto da lei orçamentária do exercício, em créditos adicionais ou em lei específica, nos
termos do art. 32, inciso I, da Lei Complementar 101/2000;
iii. a operação de crédito é definitivamente materializada no momento do recebimento do
objeto adquirido, construído ou reformado substancialmente pelo contratante. Como
condição para o referido aperfeiçoamento da operação e o recebimento do objeto da
locação sob encomenda, exigem-se, nos termos do art. 16, incisos I e II, e do art. 32, inciso
II, ambos da Lei Complementar 101/2000: a) a estimativa do impacto orçamentário e
financeiro; b) a declaração do ordenador de despesa de adequação orçamentária e
financeira; c) a inclusão no orçamento ou em créditos adicionais dos recursos
provenientes da operação; e d) verificação dos limites e condições relativos à operação de
crédito pela Secretaria do Tesouro Nacional;
iv. quando da inclusão da operação de crédito no orçamento (no exercício de sua
realização efetiva), bem como do recebimento do NCPFI pela Fiocruz (registro da
despesa primária com a incorporação do bem), deverá ser verificado o atendimento ao
Teto de Gastos da EC 95/2016, à Regra de Ouro do art. 167, inciso III, da CF/1988, às
metas fiscais de que trata a Lei Complementar 101/2000 e a Lei de Diretrizes
Orçamentárias e aos limites da Resolução do Senado Federal 48/2007.”
21. Estando os autos em meu gabinete, a Fiocruz/Bio-Manguinhos fez juntar os elementos
adicionais de defesa que passaram a constituir as peças 336 a 340. Ademais, a entidade encaminhou,
por meio eletrônico, link de acesso ao seu sistema interno, o que possibilitou o download das
planilhas orçamentárias do orçamento da obra, as quais, segundo ela, estariam de acordo com as
premissas do Acórdão 2.687/2018-Plenário.
22. Diante dos documentos novos apresentados e da urgência do exame da matéria, por conta
da proximidade da data de abertura das propostas do RDC Presencial 1/2021-BM, solicitei à minha
assessoria que procedesse a uma análise expedita dos elementos apresentados. Da mesma forma, fiz
retornar os autos à SeinfraUrbana para que examinasse a adequação das planilhas juntadas.
23. Nesse contexto, a unidade técnica acostou a análise e os documentos de suporte que
constituíram as peças 343 a 346.
24. Feito esse necessário resumo, passo a analisar os achados e as conclusões da unidade
técnica.
II - Falhas nos estudos de viabilidade técnica e econômico-financeira (EVTE)
25. Inicialmente, cabe destacar que o EVTE do empreendimento foi originalmente analisado
no TC 007.991/2017-7, tendo a equipe de auditoria concluído que o estudo apresentado não
comprovava a viabilidade econômico-financeira do empreendimento e demandava correções.
26. Em suma, a então Secex/RJ apontou as seguintes inconsistências:
a) indefinição quanto ao valor exato da obra e inexistência de créditos orçamentários
suficientes para custear o empreendimento em sua integralidade;

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b) forte vinculação e dependência do sucesso e arrecadação futura do NCPFI à continuidade


das Parcerias de Desenvolvimento Produtivo (PDP); e
c) possibilidade de comprometimento da atividade finalística de Bio-Manguinhos/Fiocruz
(fornecimento de imunobiológicos para o MS), em virtude do aumento da dependência das receitas
decorrentes de exportação para fazer face ao eventual compromisso com parceiro privado.
27. Tais ocorrências deram ensejo à expedição de determinação corretiva, consubstanciada no
subitem 9.2 do Acórdão 2.008/2017-Plenário, in verbis:
“9.2. determinar à Fiocruz que, no prazo de 60 (sessenta dias):
9.2.1. conclua o estudo de viabilidade técnica, econômica e financeira para a implantação
do NCPFI, indicando os valores necessários para a conclusão do empreendimento,
definindo os produtos que serão processados na planta (com as receitas decorrentes) e
detalhando os valores previstos para arcar com o custo de operação, simulando, portanto,
as entradas e saídas de recursos no seu caixa ao longo de sua vida útil, demonstrando,
assim, a sua viabilidade econômica (VPL > 0), visando corrigir as impropriedades
detectadas nos itens 149 a 159 e 160 a 165 do relatório de auditoria (peça 114),
ressalvadas as considerações dos itens 44 e 45 do voto, quando se descreveu o ‘Estudo de
Viabilidade Econômica realizado em 2015’ e a ‘Forte vinculação do empreendimento à
Política de Parceria de Desenvolvimento Produtivo’”.
28. A aludida deliberação foi objeto de monitoramento (TC 033.932/2017-4), que culminou
com a expedição do Acórdão 2.687/2018-Plenário, no qual o Tribunal concluiu que a mencionada
determinação estava em cumprimento.
29. Na oportunidade, esta Corte de Contas assinou o prazo de 45 dias para que Fiocruz
revisasse “[...] o estudo de viabilidade técnica, econômica e financeira para a implantação do NCPFI,
corrigindo as inconsistências apontadas pela unidade técnica, consignadas no relatório que antecede
esta deliberação”.
30. As impropriedades apontadas à época foram:
“i) não inclusão dos gastos com a construção e pré-operação de outras plantas cujas
receitas foram contempladas na análise integrada da viabilidade econômica do
empreendimento, (CHP, Processamento Rotavirus, CPTV e IFA Santa Cruz), de modo que
não foi abordada “a real necessidade de financiamento para que todas as plantas operem
de forma integrada”;
ii) não consideração das influências dos riscos associados aos processos de transferências
de tecnologia do Instituto, a saber: atrasos recorrentes e não garantia de compra dos
produtos por parte do Ministério da Saúde;
iii) existência de incertezas relativas às compras por parte dos organismos internacionais,
o que se mostra relevante ante o aumento da importância das exportações para o
atingimento do Resultado Operacional Bruto previsto, que atinge em torno de 25% a
partir do sétimo ano de operação da planta NCPFI;
iv) existência de incertezas quanto à aquisição de novos produtos pelo Ministério da
Saúde, especialmente em ambiente de controle rígido de gastos, que deve respeitar o limite
estipulado para o Poder Executivo previsto pela Emenda Constitucional 95, de 15 de
dezembro de 2016;
v) apresentação do estudo em cenário único, otimista, sem ponderar diversas
condicionantes do Resultado Operacional Bruto encontrado.”

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31. A SeinfraUrbana, que assumiu a responsabilidade pela fiscalização do empreendimento,


promoveu a continuidade do monitoramento da supramencionada decisão, no âmbito da presente
fiscalização, tendo inicialmente concluído pelo não atendimento do subitem 9.2.1 do Acórdão
2.687/2018-Plenário.
32. Na oportunidade, a unidade técnica apontou as seguintes inconsistências no EVTE:
a) “falhas no estudo de demanda, consubstanciadas na existência de riscos que poderiam
comprometer a realização das receitas previstas e, consequentemente, a viabilidade do projeto, a
saber: incertezas associadas aos processos de transferência de tecnologia (suspensão, cancelamento e
atrasos) no âmbito dos PDPs, à aquisição de novos produtos pelo Ministério da Saúde e à
possibilidade de exploração de atividade econômica pela Fiocruz”; e
b) “falhas no estudo de alternativas ao uso do modelo de contratação built to suit (BTS), na
medida em que não foram avaliadas as possibilidades de aquisição direta de vacinas de outros
fornecedores nacionais e internacionais, de celebração de parceria com outros laboratórios para
execução de determinadas etapas de produção ou da própria construção do empreendimento”.
33. Com relação à inconsistência indicada na letra “a” do item 32 retro, a unidade técnica
verificou que foram estimadas receitas, inclusive no cenário pessimista, “de produtos cujas Parcerias
para Desenvolvimento Produtivo (PDP) vieram a ser suspensas pelo Ministério da Saúde; de
biofármacos que não constam da Relação Nacional de Medicamentos Essenciais, condição prévia
para aquisição do medicamento pelo Ministério; bem como foram consideradas receitas com vacinas
que ainda estão em fase inicial de execução do desenvolvimento do produto, não havendo tempo hábil
para finalização e comercialização no prazo estimado”.
34. Com relação às incertezas associadas à aquisição de novos produtos pelo Ministério da
Saúde, elas decorrem do fato de a pasta somente ter informado a previsão de compra para o ano de
2020, não havendo informações para um horizonte de prazo mais amplo.
35. Sobre a possibilidade de exploração de atividade econômica pela Fiocruz, o assunto veio à
baila em razão de a entidade ter informado no EVTE que parte dos recursos para viabilizar a
implantação do empreendimento adviriam da exportação de vacinas.
36. Contudo, a unidade técnica pontuou “que a exploração de atividade econômica pela
Fiocruz extrapola os ditames da Constituição Federal e das normas de Direito Administrativo, pois
fundações de direito público são criadas para o desempenho de atividades administrativas públicas
próprias do Estado, sob regime de direito público, não sendo cabível que executem diretamente
atividades subordinadas ao regime de direito privado, tal como a exploração econômica”.
37. No tocante à letra “b” do item 32 retro, a SeinfraUrbana constatou que a “Fiocruz trilhou
o caminho inverso do proposto pelo acórdão, pois, em vez de efetuar uma análise das alternativas
existentes, considerando custo- benefício, valores, vantagens e desvantagens, para posteriormente se
analisar com base nas informações levantadas qual o melhor modelo a ser adotado, foi feita a escolha
pelo built to suit considerando o mérito administrativo e posteriormente foram apontadas as
desvantagens de uma única opção considerada que foi a PPP, de modo a desconsiderar outros
modelos”.
38. Em sua resposta à oitiva, a Fiocruz/Bio-Manguinhos asseverou que:
a) o EVTE partiu da premissa de que ela necessita de instalações eficientes, adequadas e
certificadas de acordo com os padrões regulatórios atuais e as boas práticas farmacêuticas para
cumprimento de sua missão;
b) os riscos apontados não se mostram razoáveis, considerando o histórico de 40 anos da
instituição, de modo que eles não interferem na projeção dos cenários do EVTE;

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c) a estruturação do EVTE deve ser realizada sob um contexto histórico, considerando os


dados projetados por profissionais com expertise no tema;
d) se fossem seguidas as premissas do relatório de fiscalização, somente se levaria em
consideração o cenário de caos total, de modo que o resultado seria a extinção da Fiocruz/Bio-
Manguinhos;
e) não há incertezas sobre a aquisição de novos produtos pelo Ministério da Saúde, pois Bio-
Manguinhos é parceiro estratégico do órgão no Programa Nacional de Imunizações (PNI);
f) o Ministério da Saúde estava elaborando uma nota técnica para formalizar a continuidade
do projeto;
g) a exportação de imunobiológicos não pode ser tratada sob um viés comercial e as
flexibilidades perdidas pela entidade com a alteração feita pela Constituição Federal foram recuperadas
com a instituição de uma fundação de apoio; e
h) a exportação dos produtos por meio da Fiotec passou a ser permitida com o advento da Lei
13.801/2019.
39. A SeinfraUrbana analisou os argumentos apresentados e rechaçou os que assinalavam
inexistirem riscos de demanda relacionados aos PDPs, aduzindo que não há obrigatoriedade por parte
do Ministério da Saúde em adquirir os objetos relacionados a essas parcerias, consoante a
jurisprudência desta Casa; e que o número de PDP em fase de assinatura do contrato ainda é baixo em
relação ao total da carteira.
40. Ademais, a unidade técnica verificou que a Fiocruz/Bio-Manguinhos não se manifestou a
respeito da ausência de estudos de alternativas, de forma que persistia a irregularidade atinente à falta
de justificação do uso do modelo built to suit.
41. Em sua análise, a SeinfraUrbana comparou os gastos a serem incorridos nessa modelagem
(aporte inicial de R$ 459 milhões ao fundo garantidor, logo no início do contrato, seguido de aluguéis
anuais de R$ 459 milhões após a entrega da obra) com o que seria incorrido mediante a execução
indireta (custo de construção de R$ 2,490 bilhões, segundo dados da época da auditoria) e constatou
que os gastos desta última opção seriam cobertos após 4,5 anos, com os mesmos dispêndios anuais do
modelo escolhido.
42. Dessa forma, apesar de registrada a permanência das falhas e das incertezas apontadas, a
unidade técnica concluiu que não cabia a reiteração da determinação consignada no subitem 9.2.1 do
Acórdão 2.687/2018-Plenário, uma vez que:
a) o Ministério da Saúde havia reconhecido a importância estratégia da construção do NCPFI,
em nota técnica assinada pelo então Ministro da Saúde, posteriormente juntada aos autos;
b) a projeção de demanda futura baseada na expertise e em dados históricos da Fiocruz/Bio-
Manguinhos constituía um procedimento aceitável, dado o horizonte de apenas um ano na previsão de
compra do MS; e
c) a Lei 13.801/2019 havia tornado possível a apropriação de receitas oriundas de exportação
via Fiotec.
43. Com isso, a SeinfraUrbana propôs dar ciência à Fiocruz de que “as contratações no
modelo built to suit devem ser precedidas de estudo de alternativas, destacando-se o custo-benefício
de cada alternativa levantada do ponto de vista dos riscos envolvidos, dos valores a serem
desembolsados e demais vantagens e desvantagem verificadas, consoante o disposto no Acórdão
1.301/2013-TCU-Plenário”.

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II.1. Análise
II.1.1 - Contextualização
44. Com relação às questões suscitadas no presente achado, registro, inicialmente, que a
Fiocruz é uma fundação dotada de personalidade jurídica de direito público, vinculada ao Ministério
da Saúde, que tem por finalidade desenvolver atividades nos campos da saúde, da educação e do
desenvolvimento científico e tecnológico.
45. A entidade iniciou suas atividades no início do século passado e sofreu diversas
transformações quanto a sua denominação, seu regime jurídico e suas finalidades, até assumir a
configuração atual. Dentre as diversas mudanças ocorridas em sua base jurídica, cabe ressaltar a
inclusão da competência de “elaborar e fabricar produtos biológicos, profiláticos e medicamentos
necessários às atividades do Ministério da Saúde, às necessidades do País, e as exigências da
Segurança Nacional”, conforme o Decreto 66.624, de 22 de maio de 1970.
46. Essa atribuição também consta do art. 1º, inciso VI, do Anexo I do Decreto 8.932, de 14 de
dezembro de 2016, que cuida do estatuto da Fiocruz. Conforme o dispositivo a entidade tem a
finalidade de “fabricar produtos biológicos, diagnósticos, profiláticos, prognósticos, medicamentos,
fármacos e outros produtos de interesse para a saúde”.
47. O exercício dessas atividades de forma direta pelo Estado tem respaldo no art. 200, inciso
I, da Constituição Federal de 1988, segundo o qual compete ao sistema único de saúde, dentre outros,
“controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde e participar
da produção de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos”
(grifos acrescidos).
48. Dentro da estrutura da Fiocruz, o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-
Manguinhos) é a unidade responsável pela “pesquisa, inovação, desenvolvimento tecnológico e pela
produção de vacinas, reativos e biofármacos voltados para atender prioritariamente às demandas da
saúde pública nacional” (fonte: <https://www.bio.fiocruz.br/index.php/br/home/quem-somos>.
Acesso em: 24/7/2021).
49. Conforme informações colhidas do site da entidade, Bio-Manguinhos tem atuação
destacada no cenário internacional, não só pela exportação do excedente de sua produção para mais de
70 países, através da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e do Unicef, como também pelo
fato de ter sido pré-qualificado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para o fornecimento da
vacina contra a febre amarela e, em 2008, da vacina meningocócica AC para agências das Nações
Unidas.
50. Sendo assim, embora a Fiocruz seja uma fundação pública ou uma autarquia fundacional,
ela está autorizada a exercer, e, na prática, exerce atividades de produção e fornecimento de bens, que,
por sua vez, podem ser consideradas como econômicas, já que geram excedente econômico a partir da
transformação de insumos.
51. Por evidente, esses eventuais ganhos não se revertem em lucros distribuídos entre sócios,
até porque estes nem sequer existem devido à natureza jurídica da entidade, sendo obrigatório o
reinvestimento dos excessos econômicos na própria atividade desenvolvida.
52. O art. 38 do Decreto 8.932/2016, em seus incisos II e III, elenca, dentre as receitas da
Fiocruz, as provenientes da exploração de seus bens e serviços e de operações técnicas e financeira,
assim como as originárias de convênios, acordos, ajustes e contratos.
53. A análise do balanço financeiro da entidade relativa ao ano de 2019 revela que parcela
significativa dos ingressos correspondeu a transferências financeiras recebidas (89%) (disponível em:
<http://www.dirad.fiocruz.br/files/BGU-Balan%C3%A7o%20Financeiro-Anual-Orgao36201.pdf>.
Acesso em: 22 de julho de 2021).
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54. Embora as informações pertinentes às receitas com essa produção de vacinas e


biofármacos não estejam discriminadas nos relatórios de gestão da fundação, infere-se que essas
transferências sejam oriundas dos acordos de cooperação firmados em diversas áreas, dentre os quais
os pertinentes ao fornecimento desses insumos.
55. A propósito, compulsando o relatório de gestão da Fiocruz relativo a 2020, é possível
verificar que a entidade cumpriu um papel estratégico no atendimento às demandas do Programa
Nacional de Imunizações, tendo fornecido 111 milhões de doses de vacinas (relacionadas a diversas
patologias), 11,5 milhões de reativos para diagnósticos e 5,7 milhões de biofármacos (disponível em:
<https://portal.fiocruz.br/sites/portal.fiocruz.br/files/documentos/relatorio_de_gestao_fiocruz_2020_0.
pdf>. Acesso em: 22 de julho de 2021).
56. Essas informações ilustram o importante papel exercido pela Fiocruz no mercado de
fornecimento de insumos de interesse do SUS.
III.1.2 – Do exercício de atividades econômicas pela Fiocruz
57. Entendi necessário fazer essa contextualização para demonstrar que a Fiocruz, mesmo
sendo uma fundação de direito público, realiza atividades que podem ser enquadradas como
econômicas, já que ela compete com a iniciativa privada no fornecimento de insumos para o SUS.
58. Essa afirmação desafia a noção corrente, extraída do art. 173 da Lei Maior, de que o
Estado somente pode exercer atividade econômica por meio de empresas públicas e sociedades de
economia mista, gerando certa perplexidade, ainda mais se considerarmos as amarras impostas pelo
direito público ao dinamismo que essa forma de atuação requer.
59. Todavia, esse modo de agir do Ministério da Saúde, mediante descentralização
administrativa a uma fundação pública, parece estar autorizada pelo art. 200, inciso I da Lei Maior, não
cabendo falar em inconstitucionalidade, pelo menos numa leitura sistêmica da Constituição.
60. Sendo assim, não vislumbro infração à ordem normativa no fato de a Fiocruz ter sido
legalmente incumbida de produzir e fornecer vacinas e biofármacos, seja para apoiar o SUS, seja para
viabilizar acordos de cooperação internacionais, seguindo as diretrizes traçadas pelo Ministério da
Saúde e pelo Governo Central.
61. No limite, haveria, de lege ferenda, uma inconveniência quanto à escolha dessa forma de
atuação, que poderia ter se dado mediante a instituição de uma empresa pública ou uma sociedade de
economia mista, haja vista a maior flexibilidade que o regime jurídico de direito privado possibilita ao
exercício de atividade econômica. Todavia, não cabe aqui avançar em uma análise das escolhas
legítimas do legislador.
62. Além de permitido pela Constituição, o exercício dessa missão da Fiocruz parece ter sido
viabilizado com a recente alteração da Lei 8.958, de 20 de dezembro de 1994, efetivada pela Lei
13.801, de 9 de janeiro de 2019.
63. Conforme o novel § 3º-A do art. 1º da primeira norma, o convênio ou o contrato entre a
Fiocruz e a sua fundação de apoio (Fiotec) “poderá abranger o apoio a projetos de produção e
fornecimento de vacinas, medicamentos e outros insumos e serviços para a saúde, nos termos das
competências da Fiocruz, aplicando-se a esses projetos o disposto no § 1º do art. 3º desta Lei”.
64. O § 1º do art. 3º, da Lei 8.958/1994, por sua vez, preconiza que “as fundações de apoio,
com a anuência expressa das instituições apoiadas, poderão captar e receber diretamente os recursos
financeiros necessários à formação e à execução dos projetos de pesquisa, desenvolvimento e
inovação, sem ingresso na Conta Única do Tesouro Nacional”.

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65. Com isso, a Fiotec poderá administrar os valores pertinentes à produção e ao fornecimento
de vacinas, sem ingresso na Conta Única do Tesouro Nacional, o que será importante para viabilizar
essa sui generis atividade econômica por parte da Fiocruz/Bio-Manguinhos.
66. Sendo assim, reputo superado o risco relacionado à exploração de atividade econômica
pela Fiocruz e à exportação de vacinas.
II.1.3 – Dos demais riscos
67. Tomando como base a modelagem econômica descrita no próximo capítulo, a produção do
NCPFI teria de ser capaz de gerar um excedente de produção mensal da ordem de R$ 46,655 milhões
mensais, durante um período de 15 anos, a fim de possibilitar o pagamento do aluguel e a plena
amortização dos investimentos para a construção do complexo.
68. Todavia, compreendo que a forte dependência das receitas relativas aos fornecimentos
decorrentes das PDPs em andamento e das exportações aos organismos internacionais é um
componente que dá uma grande dose de incerteza à projeção de receita do NCPFI, o que prejudica uma
análise segura de sua viabilidade econômica.
69. O trecho a seguir, extraído do relatório de fiscalização, descreve a situação encontrada:
“A análise das premissas do estudo de viabilidade de Bio-Manguinhos demonstra que há
uma grande incerteza em relação à efetiva produção dos biofármacos e vacinas da
carteira atual e da carteira esperada do Instituto, pois tem-se observado um atraso nos
processos de transferência de tecnologia de produtos para saúde e na construção dos
parques fabris. Além de cancelamentos de termos de execução descentralizada para
fornecimento de produtos de PDP e suspensões de PDP. A própria política de PDP não
oferece garantia ao laboratório público de aquisição de medicamentos durante a vigência
da parceria ou após a sua extinção ou de manutenção do preço de fornecimento constante
da proposta de PDP.”
70. A unidade técnica aduziu que foram estimadas receitas, inclusive no cenário pessimista, de
produtos com PDPs suspensas pelo Ministério da Saúde e de biofármacos que não constam da Relação
Nacional de Medicamentos Essenciais – condição prévia para aquisição do medicamento pelo
Ministério –, bem como foram consideradas receitas com vacinas que ainda estão em fase inicial de
execução do desenvolvimento do produto, não havendo tempo hábil para finalização e comercialização
no prazo estimado.
71. Considerando a análise empreendida pela SeinfraUrbana sobre a situação das PDPs dos
produtos designados no EVTE – das quatorze informadas, três estão na fase III (transferência de
tecnologia) e vigentes, tendo as demais sido suspensas –, é possível afirmar que a decisão de levar o
projeto à frente se baseou em projeções bastante otimistas quanto à demanda, o que confere um certo
grau de risco aos investimentos necessários à implantação do complexo industrial.
72. Em sua resposta à oitiva, Bio-Manguinhos/Fiocruz basicamente se apegou ao histórico de
crescimento e consolidação da instituição e à crença de que o Ministério da Saúde apoiará a operação
do NCPFI, devido à condição da entidade de parceira estratégica do órgão no Programa Nacional de
Imunizações (PNI).
73. Ademais, a autarquia fez menção a uma nota técnica do Ministério da Saúde que
confirmaria o interesse do órgão no projeto. O documento, assinado pelo então Ministro Eduardo
Pazuello, foi posteriormente juntado aos autos. Nele se reitera a importância estratégia da construção
do NCPFI já prolatada na Portaria nº 3.876/GM/MS, de 6/12/2018 (peças 326 e 327).
74. Conforme exposto no capítulo III.1.1, a produção e o fornecimento de vacinas e
biofármacos faz parte da missão do Ministério da Saúde, não sendo, de fato, razoável que o órgão

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deixe de adotar as ações necessárias para aproveitar os investimentos que serão realizados na
construção de um moderno complexo industrial, ainda mais no contexto pós-pandemia da Covid-19.
75. Sendo assim, entendo que a viabilidade do NCPFI depende de condutas afetas à órbita de
decisão dos próprios atores envolvidos, in casu, o Ministério da Saúde e a Fiocruz/Bio-Manguinhos,
que, dentro de uma postura de colaboração construtiva e diálogo interinstitucional, devem e podem
atuar em conjunto para a viabilização de uma produção nacional de vacinas e biofármacos.
76. Dessa forma, não obstante as falhas no EVTE elencadas pela unidade técnica e a forte
dependência do sucesso do empreendimento das receitas relativas aos fornecimentos decorrentes das
PDPs em andamento e das exportações aos organismos internacionais, entendo que os riscos
identificados no EVTE quanto aos dados das receitas são superáveis pelo próprio Poder Público,
motivo pelo qual reputo elidida a irregularidade em análise.
77. Todavia, sob a perspectiva das despesas, compreendo que persiste a falha quanto à falta de
justificativa da escolha do modelo dos investimentos (BTS), uma vez que não houve avaliação de
outras alternativas para a satisfação da necessidade pública, como exigem os princípios da eficiência e
as boas práticas de gestão de projetos.
78. Por consequência, não há certeza se a opção escolhida por Bio-Manguinhos/Fiocruz será a
que proporcionará a melhor relação custo-benefício para o Poder Público, o que se revela grave,
considerando o volume dos investimentos requeridos e o próprio cenário de escassez de recursos
públicos, em um contexto de crise fiscal persistente no curto e médio prazo.
79. No caso, avalio que houve descumprimento de uma das condições estabelecidas por esta
Corte de Contas, em sede de consulta, para a contratação de locação sob demanda (BTS), a saber, a
capitulada no subitem 9.4.3 do Acórdão 1.301/2013-Plenário, in verbis:
“9.4.3. fundamentação da decisão pela locação sob medida baseada em estudos técnicos,
pareceres e documentos comprobatórios que justifiquem tal opção contratual, incluindo a
necessidade de se demonstrar que, comprovada a impossibilidade de suprir a demanda
por outras formas, a utilização da locação sob encomenda mostra-se inequivocamente
mais favorável economicamente do que a realização de reforma ou adequação em imóvel
alugado sob a forma convencional”.
80. Considerando a especificidade da contratação em exame, comparada com a que foi objeto
da consulta apreciada no referido decisum – construção em terreno da própria entidade pública e
reversão obrigatória do bem ao final do contrato, o que revela uma intenção de pactuar um contrato de
empreitada mediante o uso de recursos do próprio empreiteiro ou terceiro financiador –, seria
necessário incluir no estudo de alternativas outras formas de execução indireta de obra pública, quais
sejam a construção mediante recursos públicos (contrato de obra pública tradicional) ou PPP.
81. No primeiro caso, o argumento invocado por Bio-Manguinhos/Fiocruz para defender a
viabilidade econômica do empreendimento – o reconhecimento da importância estratégia da
construção do NCPFI por parte do Ministério da Saúde – poderia ter sido usado para viabilizar um
acréscimo no volume de créditos orçamentários no plano plurianual, a fim de permitir a construção da
obra com recursos públicos ou, pelo menos, com uma menor necessidade de investimentos privados.
82. Alternativamente, a entidade poderia ter analisado outras formas de financiamento da obra,
a exemplo da realização de operações de crédito, previamente autorizadas pelo Poder Legislativo,
junto a instituições do sistema financeiro nacional ou ao próprio BNDES, o que poderia acarretar
custos financeiros menores que o projetado na modelagem escolhida.
83. Não obstante a falta do estudo de alternativas, deixo de adotar qualquer medida no âmbito
dos controles objetivo e subjetivo, por entender que a opção pelo BTS em si pode ser considerada
razoável, diante das limitações orçamentárias e fiscais e da importância estratégica do NCPFI, e que os
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gestores da entidade da atuaram premidos pela necessidade de atender a relevante objetivo de política
pública, ainda mais no contexto que sobressaiu após a pandemia do novo coronavírus.
84. Tais circunstâncias especiais permitem relevar as inconsistências verificadas no
procedimento de definição e justificação das escolhas para implantação do empreendimento, o que não
impede a adoção de eventuais medidas corretivas no futuro, caso sobrevenham fatos novos indicativos
da antieconomicidade da escolha dos gestores da Fiocruz/Bio-Manguinhos.
85. Dessa forma, reputo superadas as falhas nos estudos de viabilidade técnica e econômico-
financeira (EVTE), consubstanciadas no achado 3.1 do relatório preliminar de auditoria, com fulcro no
art. 22 da LINDB.
III - Preço de aluguel inadequado devido a falhas no orçamento da obra
86. Conforme já adiantado, a Fiocruz/Bio-Manguinhos optou pelo uso da modelagem built to
suit para a implantação do NCPFI.
87. Para tanto, ela se valeu do permissivo do inciso IX do art. 1º da Lei 12.462/2011, que
admitiu a utilização do Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC) para a celebração de
contratos BTS. Esse novo tipo de contrato administrativo foi expressamente previsto no art. 47-A da
Lei do RDC, incluído pela Lei 13.190/2015. Segue a redação do dispositivo:
“Art. 47-A. A administração pública poderá firmar contratos de locação de bens móveis e
imóveis, nos quais o locador realiza prévia aquisição, construção ou reforma substancial,
com ou sem aparelhamento de bens, por si mesmo ou por terceiros, do bem especificado
pela administração. (Incluído pela Lei nº 13.190, de 2015) (Vide Lei nº 14.133, de 2021)
§ 1º A contratação referida no caput sujeita-se à mesma disciplina de dispensa e
inexigibilidade de licitação aplicável às locações comuns. (Incluído pela Lei nº 13.190, de
2015)
§ 2º A contratação referida no caput poderá prever a reversão dos bens à administração
pública ao final da locação, desde que estabelecida no contrato. (Incluído pela Lei nº
13.190, de 2015)”
88. No presente caso, como o terreno era da própria Fiocruz, a entidade decidiu abrir licitação,
na modalidade RDC, para a contratação de investidor com vistas à construção de imóvel, pelo regime
BTS, contemplando a execução das obras de construção, a montagem dos equipamentos de produção
adquiridos pela instituição e o fornecimento de equipamentos de utilidades e materiais.
89. O plano de negócio foi elaborado sob a premissa de que a construção do NCPFI será
financiada por um Fundo de Investimento Imobiliário (FII).
90. O valor mensal a ser pago ao fundo é composto por uma parcela referente à reversão do
imóvel para a Fiocruz/Bio-Manguinhos e outra referente ao aluguel. De acordo com o plano de
negócios analisado à época da auditoria, a composição da parcela mensal foi distribuída da seguinte
forma, em valores referenciados a dezembro de 2018:

Reversão mensal R$ 14,076 milhões


Aluguel mensal R$ 24,217 milhões
Valor corrente mensal máximo R$ 38,293 milhões
Fonte: peça 50
91. Essa parcela foi atualizada para R$ 46,655 milhões, com data-base fixada em setembro de
2020, constituindo o valor corrente mensal máximo admitido no edital finalmente lançado – RDC
Presencial 1/2021-BM. Tais informações foram extraídas da documentação disponibilizada no site
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Comprasnet (Disponível em:


<http://comprasnet.gov.br/ConsultaLicitacoes/download/download_editais_detalhe.asp?coduasg=2544
45&modprp=99&numprp=12021>. Acesso em: 26/7/2021).
92. O valor destinado à reversão servirá para custear o pagamento dos investimentos
reversíveis, avaliados em R$ 2,695 bilhões à época da fiscalização, conforme as informações do
CAPEX e do orçamento elaborado por Bio-Manguinhos, ambos relacionados à data-base de dezembro
de 2018. O custo médio ponderado de capital foi calculado em 8,09% a.a.
93. Conforme o edital do certame – que acabou saindo com prazos distintos da modelagem
inicial da FGV analisada pela equipe de auditoria –, o complexo será executado no prazo máximo de
48 meses, havendo um período de carência de 12 meses, contados a partir da entrega definitiva do
empreendimento. Após esse período de carência, inicia-se a contagem do prazo de 180 meses para
pagamento das parcelas a título de reversão e aluguel.
94. Segundo o anexo IX do Termo de Referência da licitação, a locatária (Fiocruz/Bio-
Manguinhos) somente iniciará o pagamento ao locador (a empresa contratada) das parcelas mensais
em seu valor integral, após o período de carência supramencionado.
95. O aludido anexo preceitua, ainda, que “[...] durante o período de carência supracitado, a
Locatária poderá pagar um aluguel mensal parcial, limitado até 60% (sessenta por cento) do aluguel
mensal máximo, vinculado e condicionado ao seu aceite e assinatura dos Termos de Recebimento
Definitivo das Edificações”.
96. Essa estruturação corresponde a um desembolso total de recursos públicos da ordem de R$
8,7 bilhões em valores presentes – à época da auditoria, com valores referenciados a dezembro de
2018, esse montante equivalia a R$ 7,3 bilhões (peça 50, item não digitalizado). É importante salientar
que as parcelas serão reajustadas anualmente mediante a aplicação do índice do IPCA/IBGE (item 15
do anexo IX do Termo de Referência), ou seja, trata-se de valores reais e não nominais.
97. Retomando a análise do valor corrente mensal máximo, a SeinfraUrbana pontuou que,
“[...] no modelo de financiamento definido, em que há a reversão do imóvel para a autarquia ao final
do período contratual, as parcelas mensalmente pagas não se referem a um aluguel propriamente
dito, mas sim a uma amortização financeira (uma parcela refere-se ao pagamento de juros e outra à
reversão), assemelhando-se a uma operação de crédito e devendo-se comportar como tal. Logo, a
parcela do pagamento mensal intitulada ‘Aluguel mensal’ seria na verdade juros”.
98. Tomando como base essa premissa, a unidade técnica apontou que a opção pelo
financiamento via fundo imobiliário não foi objeto de prévia motivação, não tendo sido “demonstrada
de forma comparativa que a opção pelo modelo de financiamento via FII é melhor para a
administração em termos econômicos que outras formas de captação de recurso, como, por exemplo,
via BNDES ou via Sociedade de Propósito Específico (SPE)”.
99. No que se refere à composição dos investimentos reversíveis, a SeinfraUrbana verificou
que as inconsistências apontadas no orçamento estimativo da obra, consignadas no achado “projeto
básico/executivo deficiente - sem grau de precisão adequado para se contratar/executar o objeto”
(Acórdão 2.008/2017-Plenário) não haviam sido corrigidas.
100. Em suma, a unidade técnica assinalou que a Fiocruz/Bio-Manguinhos havia agrupado
alguns itens em unidades de medida designadas como “Rateio” (RT), usado metodologia de cálculo de
BDI não amparada por este Tribunal (não diferenciação de itens de fornecimento de materiais e
serviços) e promovido a atualização de preço de serviços para um horizonte de mais de 3 anos, por
meio de índice de preço (Índice Nacional de Custo da Construção – INCC), em vez de realizar novas
cotações em datas-bases mais próximas.

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101. Dessa forma, a SeinfraUrbana concluiu que os itens 9.2.2, 9.2.3 e 9.3 do Acórdão
2.687/2018-Plenário, que tratam de reiteração das determinações efetuadas no Acórdão 2.008/2017-
Plenário, não haviam sido atendidos.
102. Segundo a unidade técnica, as inconsistências reportadas acima impossibilitaram a
verificação da adequabilidade do orçamento global da obra. Não obstante essas limitações, ela fez
procedeu a uma análise paramétrica da parcela das edificações que não se se revestem de
especificidades inerentes a plantas fabris farmacêuticas (13% do orçamento total) e apurou possível
sobrepreço no valor do BDI relativo aos serviços adicionais (instalação de equipamentos de produção e
outros).
103. Quanto ao primeiro aspecto, a SeinfraUrbana comparou o preço indicado no orçamento
com o valor referencial obtido a partir do uso do Custo Unitário Básico de Construção (CUB/m2),
tendo verificado um excesso de 170% naquele. Com relação aos serviços adicionais, ela apurou um
sobrepreço da ordem de 3% em razão da utilização de BDI superior ao preconizado no Acórdão
2.622/2013-Plenário para itens de mero fornecimento (16,10%).
104. Na resposta à oitiva, a Fiocruz/Manguinhos aduziu que somente “[...] com o auxílio de
composições de preço não originários do Sinapi, ou seja, de instituições de engenharia de custos
tradicionais do setor de construção civil e de pesquisas de mercado de preços referenciais junto a
fabricantes e fornecedores que atendem a este padrão de projeto industrial, é possível calcular o valor
estimado do CAPEX em questão”.
105. Quanto aos demais aspecto, buscou explicar o uso da unidade de medida “Rateio”,
rechaçou o uso do CUB como referência e, por fim, enviou o CAPEX atualizado (peça 306), a
modelagem financeira do empreendimento (peça 307) e a nota técnica da modelagem financeira
elaborada pela FGV (peça 308).
106. A unidade técnica analisou os argumentos apresentados e concluiu que eles não foram
aptos a elidir as irregularidades. Ademais asseverou que o CAPEX apresentado por último ainda
continha falhas na sua formulação como ausências de unidades, de quantitativos, de preço unitário e de
composição de preços unitários (CPU). Também não foi identificada no CAPEX a Anotação de
Responsabilidade Técnica (ART) do orçamentista.
107. Conforme a SeinfraUrbana, “tais fatos inserem mais risco ao processo pois, como
explicitado, o valor total do investimento projetado possui grande sensibilidade em relação à
orçamentação, podendo proporcionar variações expressivas nos desembolsos a serem efetuados no
decorrer do contrato e um risco de prejuízo aos cofres públicos. Por isso, há inconsistências que não
permitem avaliar a comprovação de economicidade do objeto”.
108. Por fim, a unidade técnica levou em conta o atual estágio da contratação do objeto (edital
já publicado) e, após asseverar que o modelo BTS, em teoria, não exigia um detalhamento
orçamentário nos moldes exigidos pela lei 8.666/1993, entendeu que não era mais adequada a
reiteração das determinações pendentes de implementação.
III.1 - Análise
109. Divirjo da proposta da SeinfraUrbana.
110. Inicialmente, é preciso destacar que não é porque uma licitação adentrou a sua fase
externa, com a publicação do edital, que esta Corte de Contas estará impossibilitada de apontar
eventuais irregularidades ocorridas no curso do procedimento e propor as medidas corretivas cabíveis.
111. Como é cediço, não há a estabilização dos efeitos de eventuais ilicitudes praticadas na fase
de planejamento do certame ou de julgamento, ainda que a licitação tenha sido concluída e o contrato
assinado. Tanto isso é verdade que não há nenhum óbice a que o TCU determine a anulação dos atos

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praticados na etapa de licitação e no próprio ajuste pactuado, conforme o inciso IX do art. 71 da


Constituição.
112. Não se pode negar que a atuação antecipada do Tribunal se mostra preferível, pois também
é evidente que a invalidação de um certame licitatório em seu estágio final impõe consequências
jurídicas e administrativas negativas ao Estado e ao interesse público, que devem ser sopesadas pelo
julgador de contas, nos termos do art. 21 da LINDB. Todavia, isso não impõe, como já dito, uma
constrição à atividade judicante desta Corte, que pode ocorrer de forma concomitante ou a posteriori,
inclusive de modo cautelar.
113. Dito isso, passo a analisar as falhas na orçamentação da obra.
114. Conforme exposto no item 87 supra, a chamada locação sob encomenda ou built to suit
está sujeita ao Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC). Por consequência, todas as
regras da Lei 12.462/2011 são aplicáveis a esse modelo de contratação, ressalvadas as situações em
que ela ocorrer mediante dispensa ou inexigibilidade de licitação, quando incidirá a normatização das
locações comuns.
115. Tanto isso é verdade que o próprio edital estabeleceu, em seu item 2.1, que a presente
licitação seria regida pelo disposto na Lei 12.462/2011, aplicando-se de modo subsidiário a Lei
8.666/1993.
116. No presente caso, embora o edital use a expressão “locação sob medida”, a reversão
obrigatória do bem após a sua construção pelo contratado implica que o seu objeto é, em essência,
uma empreitada de obra pública a ser construído segundo o projeto executivo disponibilizado pela
Fiocruz/Bio-Manguinhos. Não é por outra razão que o instrumento também utilizou a expressão
“construção sob medida”, a meu ver mais adequada ao seu espírito.
117. Conforme já exposto, o empreendimento será implantado com recursos do contratado, os
quais serão posteriormente remunerados pelo Poder Público, mediante o pagamento de parcela
denominada “aluguel”. Tal aspecto será explorado no capítulo IV.2 deste voto, no qual se desenvolveu
a tese de que o presente ajuste se reveste da natureza de contrato de empreitada de obra e de
financiamento pelo próprio construtor, o que implica o seu enquadramento como operação de crédito
assemelhada à aquisição financiada de um bem.
118. Retomando a discussão sobre o regime jurídico aplicável à contratação, sou da opinião que
o procedimento licitatório para a contratação de um BTS com reversão do bem construído deve seguir
todas as fases do art. 12 da Lei do RDC.
119. Além do projeto básico – que somente não é exigível se o regime for o da contratação
integrada –, a administração contratante deve elaborar “orçamento detalhado do custo global da obra,
fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente avaliados”, nos termos do
art. 2º, inciso VI.
120. Ademais, o processo de orçamentação dessa contratação também deve seguir os §§ 3º e 4º
do art. 8° da Lei 12.462/2011, in verbis:
“§ 3º O custo global de obras e serviços de engenharia deverá ser obtido a partir de
custos unitários de insumos ou serviços menores ou iguais à mediana de seus
correspondentes ao Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil
(Sinapi), no caso de construção civil em geral, ou na tabela do Sistema de Custos de
Obras Rodoviárias (Sicro), no caso de obras e serviços rodoviários.
§ 4º No caso de inviabilidade da definição dos custos consoante o disposto no § 3º deste
artigo, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados
contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da

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administração pública federal, em publicações técnicas especializadas, em sistema


específico instituído para o setor ou em pesquisa de mercado.”
121. Esse orçamento poderá possuir caráter sigiloso, como é o caso da licitação em exame,
devendo o Poder Público divulgar o detalhamento dos quantitativos e as demais informações
necessárias para a elaboração das propostas, nos termos do art. 6º da Lei 12.462/2011.
122. Conforme assentado pela unidade técnica, o Tribunal já havia determinado à Fiocruz que
corrigisse o orçamento estimativo da contratação em exame, ao expedir a seguinte determinação, ainda
na fase preparatória do certame (subitem 9.2.4 do Acórdão 2.008/2017-Plenário):
“9.2.4. apresente o projeto executivo completo, mas notadamente o orçamento sem que
haja as irregularidades apontadas no presente relatório, ou seja, apresentando a
composição de custos unitários dos serviços previstos; contendo os quantitativos e o
detalhamento de todos os serviços e equipamentos; detalhando a bonificação e despesas
indiretas - BDI; efetuando, quando for possível, a diferenciação do BDI para materiais e
serviços; relacionando os valores dos serviços a serem executados com os custos
constantes em referencial de preços (de preferência o Sinapi); e os valores em data-base
atualizada, visando corrigir as falhas apontadas nos itens 180 a 196 do relatório de
auditoria – peça 114” (grifos acrescidos).
123. Em verdade, esse comando foi reiterado, por meio dos subitens 9.2. e 9.2.3 do Acórdão
2.687/2018-Plenário, in verbis:
“9.2. assinar o prazo de 45 dias para que a Fiocruz atenda à referida deliberação,
adotando as seguintes providências:
[...]
9.2.2. corrija o orçamento contido no projeto executivo do NCPFI, por meio da
elaboração da composição de custos unitários dos serviços previstos e da atualização de
sua data-base;
9.2.3. promova a comparação dos preços dos serviços especificados no orçamento do
projeto executivo do NCPFI com os consignados nos sistemas oficiais de referência,
preferencialmente no Sinapi.”
124. Dessa forma, ao basear a modelagem econômica do BTS em uma planilha de custos eivada
de inconsistências, sem um orçamento fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos
propriamente avaliados, sem justificar adequadamente os preços unitários praticados e sem diferenciar
o BDI de materiais e serviços, a Fiocruz não apenas descumpriu regras expressas da Lei 12.462/2011
mas também duas decisões deste Tribunal. Como consequência, a unidade técnica não pôde aferir a
economicidade da planilha orçamentária do empreendimento.
125. Estando os autos em meu gabinete, a entidade fez juntar elementos adicionais de defesa
nos quais aduziu, dentre outros, que os rateios foram corrigidos conforme detalhamento exposto no
arquivo referente à memória de cálculo; foram utilizadas fontes oficiais (SINAPI, SCO-RJ, EMOP,
etc.) e privadas (SBC-RJ) para apuração de preços; foi adotada a metodologia a aplicação de índice de
correção com base no INCC, data-base de dez/2019 para set/2020, em relação aos itens das planilhas
sem referência nas fontes oficiais ou sem atualização de cotação devido à recusa ou ausência de
manifestação dos fornecedores (peças 336 a 340).
126. A SeinfraUrbana procedeu à análise expedita dos elementos apresentados, por conta da
limitação de tempo imposta pela necessidade de rápida inclusão deste processo em pauta de
julgamento, e concluiu que houve um aprimoramento das planilhas orçamentárias, que vieram
acompanhadas de um melhor detalhamento, com a juntada de memórias de cálculo e algumas
composições de custos unitários.
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127. Segundo o auditor-instrutor, o CAPEX (tanto na versão R6E como na versão R6R) não
apresenta mais a unidade de medida “RT”, tendo sido ampliado o uso dos sistemas oficiais de
referência em parcelas do empreendimento enquadradas como obras civis. Quanto ao último aspecto,
assinalou que os “itens referenciados no Sinapi estão corretos de acordo com uma análise amostral de
dez itens”. Assim, a unidade técnica concluiu que houve o cumprimento das principais premissas
impostas nos Acórdãos 2.687/2018-Plenário e 2.008/2017-Plenário
128. De outro lado, o auditor-instrutor apontou fragilidades no processo de orçamentação, tais
como a atualização de preços unitários de itens de alta materialidade, que haviam sido obtidos por
cotação, mediante o uso de índice de preços para horizontes acima de 3 anos (por exemplo, estrutura
metálicas); a utilização de BDI fragmentado em materiais e mão de obra; a realização de pesquisa de
preço com menos de três cotações; o uso de BDI “cheio” em itens de mera intermediação de mão de
obra; a estimativa do custo de mão de obra como percentual do custo total do item; e a apropriação de
custos de serviços entre os diversos prédios do complexo segundo uma metodologia paramétrica (por
unidade de área), sem avaliar propriamente os quantitativos em cada unidade (por exemplo, estrutura
metálica).
129. O signatário do parecer asseverou que não houve o detalhamento de alguns serviços de
grande relevância e complexidade, tendo destacado o de estrutura metálica, o principal da Curva ABC
elaborada pela própria Fiocruz/Bio-Manguinhos, com custo de R$ 506 milhões ou 17% do total da
obra.
130. Esse item contempla serviços e materiais diversos, tais como conectores stud bolts,
proteção, pintura, transporte vertical/horizontal e outros. A propósito do assunto, observo que a
entidade jurisdicionada obteve o custo da estrutura metálica a partir do somatório dos valores dos
diversos insumos usados para a consecução, discriminados em custos de fornecimento de material e de
mão de obra. Não houve a discriminação dos profissionais e dos coeficientes de produção envolvidos,
como ocorre com a técnica de orçamentação do Sinapi. Tal aspecto confere um grande fator de
imprecisão ao custo total da estrutura metálica, o que é complementando pela incerteza quanto à
precisão dos quantitativos, como exposto no item anterior.
131. A propósito dos elementos novos juntados pela entidade jurisdicionada e do exame
empreendido pela SeinfraUrbana, observo que o novo orçamento contemplou melhoramentos frente
aos apresentados anteriormente, cabendo destacar a utilização de preços de referência extraídos do
Sinapi, do ORSE e do Sistema de Custos para Obras e Serviços de Engenharia (SCO-RIO), este último
adotado pelo Município do Rio de Janeiro, em diversos itens da planilha de obras civis.
132. Embora não caiba afirmar que houve o pleno atendimento das normas de regência, já que o
envio da última versão das planilhas orçamentárias do custo da obra somente ocorreu após a conclusão
da etapa de instrução, quando o processo estava neste gabinete em vias de julgamento, é possível
perceber que a metodologia utilizada na parcela de obras civis seguiu as premissas dos §3º e 4º do art.
8º da Lei do RDC, in verbis:
“3º O custo global de obras e serviços de engenharia deverá ser obtido a partir de custos
unitários de insumos ou serviços menores ou iguais à mediana de seus correspondentes ao
Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil (Sinapi), no caso
de construção civil em geral, ou na tabela do Sistema de Custos de Obras Rodoviárias
(Sicro), no caso de obras e serviços rodoviários.
§ 4º No caso de inviabilidade da definição dos custos consoante o disposto no § 3º deste
artigo, a estimativa de custo global poderá ser apurada por meio da utilização de dados
contidos em tabela de referência formalmente aprovada por órgãos ou entidades da
administração pública federal, em publicações técnicas especializadas, em sistema
específico instituído para o setor ou em pesquisa de mercado.”

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133. Com relação ao item de estrutura metálica, observo que, a despeito de algumas fragilidades
apontadas pela unidade técnica, o custo unitário total por kg – R$ 14,28 – parece dentro da faixa de
variação de serviços similares contidas no Sistema Sinapi. Em arrimo a essa constatação, reproduzo
algumas composições de peças estruturais metálicas diversas contidas no referido sistema referencial,
na data-base de setembro/2020:

134. Ademais, ressalto que os itens supramencionados do Sinapi não incluem os serviços de
pintura, o que favorece a percepção, em cognição perfunctória, de que os custos de estrutura metálica
contidos no orçamento do NCPFI não parecem excessivos frente aos contidos no aludido sistema.
Dessa forma, considerando essa visão paramétrica do custo do serviço de estrutura metálica
(preço/kg), entendo que não há fumaça do bom direito para se cogitar a suspensão cautelar do certame.
135. Essa assertiva não significa, em absoluto, a validação do custo do item “Fornecimento,
Fabricação, Pintura, Transporte e Montagem de Estruturas Metálicas” no orçamento estimativo do
RDC Presencial 1/2021-BM, até porque não houve uma análise detalhada da composição de custo
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unitário do item, seja pela demora na remessa do orçamento detalhado do empreendimento, seja pelas
fragilidades já anunciadas na forma de orçamentação usada pela Fiocruz.
136. No que se refere aos itens relacionados a obras industriais, é preciso ressaltar a dificuldade
de se obterem preços de referência, já que não há sistemas oficiais, principalmente quando o objeto
envolve serviços e equipamentos com especificidades, como é o caso de uma obra de um complexo
industrial farmacêutico.
137. Não se olvida que os riscos de sobrepreço seriam mitigados caso a Fiocruz tivesse seguido
as boas práticas de orçamentação, expostas na jurisprudência e nos roteiros de auditoria desta Casa, a
exemplo da utilização de 3 cotações para a obtenção de preços de serviços não especificados nos
sistemas oficiais. Da mesma forma, seria pertinente a obtenção de cotações em datas-bases próximas à
da licitação em causa, a fim de evitar a atualização de pesquisas pretéritas, não necessariamente
representativas da situação atual de mercado.
138. Não obstante essas fragilidades, entendo que não cabe a expedição de medida obstativa da
continuidade da licitação, haja vista a importância da política pública associada ao bem pretendido
pelo RDC Presencial 1/2021-BM, os aperfeiçoamentos promovidos na planilha orçamentária e a
dificuldade prática de se extrair um valor seguro de mercado de obras com essa especificidade, a exigir
uma postura de maior cautela na tomada de decisões drásticas, como a interrupção de uma licitação.
139. Dessa forma, considerando que a análise exauriente da planilha orçamentária dos
investimentos para implantação do NCPFI não foi realizada na presente fiscalização, devido aos
motivos já suscitados, determino à SeinfraUrbana que examine a adequação do orçamento estimativo
do RDC Presencial 1/2021-BM e da planilha dos investimentos a ser apresentado pela vencedora da
licitação, no próximo ciclo do Fiscobras.
140. Tal procedimento se mostra importante devido à grande sensibilidade dos desembolsos da
Fiocruz, no âmbito do BTS, em relação ao custo global da construção, o que impõe o exame da
economicidade dessa parcela dos investimentos.
141. A propósito do assunto, verifico que a cláusula 6.3.2 do edital impõe a cada licitante a
elaboração e entrega de Plano de Negócios, conforme o Anexo 8 da minuta de contrato, constante do
Anexo VIII do edital.
142. Segundo o item 7 da cláusula de definições do edital, o Plano de Negócios é “o conjunto
de premissas, parâmetros e valores, utilizados para compor a proposta do Licitante. Aqui deverão
estar descritos os investimentos, receitas, despesas, tributos, resultados, enfim tudo o necessário para
estabelecer as condições para a execução do objeto deste edital. Sua data inicial será a de assinatura
do contrato”.
143. O Anexo 8 da minuta do contrato, por sua vez, impõe ao licitante a elaboração de diversas
planilhas, cabendo destacar a intitulada “Quadro 6 – Investimentos Programados”, na qual “deverão
ser indicados os valores totais necessários, para cumprir as obrigações descritas no Edital e Contrato
de Locação para implantação do NCPFI, discriminando por grupo de itens” (grifos acrescidos).
144. A meu juízo, esse nível de detalhamento não está de acordo com o art. 17, inciso III, da Lei
12.462/2011, que estabelece que “nas licitações de obras ou serviços de engenharia, após o
julgamento das propostas, o licitante vencedor deverá reelaborar e apresentar à administração
pública, por meio eletrônico, as planilhas com indicação dos quantitativos e dos custos unitários, bem
como do detalhamento das Bonificações e Despesas Indiretas (BDI) e dos Encargos Sociais (ES), com
os respectivos valores adequados ao lance vencedor”.
145. Sendo assim, deve a entidade jurisdicionada dar cumprimento ao dispositivo legal
supramencionado, bem como ao art. 40, § 2º, do Decreto 7.581/2011, que exige a apresentação de
planilha orçamentária contendo “a indicação dos quantitativos e dos custos unitários, vedada a
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utilização de unidades genéricas ou indicadas como verba; a composição dos custos unitários quando
diferirem daqueles constantes dos sistemas de referências adotados nas licitações; e o detalhamento
das Bonificações e Despesas Indiretas - BDI e dos Encargos Sociais – ES”.
146. Dessa forma, cabe determinar à Fiocruz/Bio-Manguinhos que exija da empresa contratada
a apresentação de planilha orçamentária dos investimentos para a construção do NCPFI segundo o
nível de detalhamento exigido pelo art. 17, inciso III, da Lei 12.462/2011 c/c o art. 40, § 2º, do Decreto
7.581/2011.
147. Assinalo que a referida obrigação decorre diretamente da lei, sendo desnecessário
republicar o edital, a fim de mandar incluir esse comando.
IV - Riscos relacionados à aplicação do modelo built to suit (BTS)
148. A SeinfraUrbana apontou a existência de riscos relativos à falta de regulamentação do
modelo BTS, à ausência de instrumento orçamentário apropriado e de análise de possível impacto nas
regras fiscais e à fragilidade no modelo de garantia previsto.
IV.1 - Falta de regulamentação
149. Com relação ao primeiro aspecto, a unidade técnica assinalou que a falta de regras
detalhadas expõe o modelo a riscos de concepção e insegurança jurídica, tendo ressaltado a existência
de dúvidas e possíveis interpretações divergentes quanto ao limite do aluguel mensal disposto no § 3º
do art. 47-A da Lei do RDC e à forma de atualização contratual.
150. Conforme o referido dispositivo, “o valor da locação a que se refere o caput [built to
suit] não poderá exceder, ao mês, 1% (um por cento) do valor do bem locado”.
151. Sobre o assunto, a Fiocruz/Bio-Manguinhos pontuou que esse percentual máximo se
aplicaria apenas aos casos em que não há reversão do bem, o que estaria em consonância com a visão
da SeinfraUrbana.
IV.1.1 - Análise
152. A propósito do tema, verifico, a partir dos números apresentados pela SeinfraUrbana à
época da auditoria, que o valor do aluguel segundo o plano de negócios elaborado pela Fundação
Getúlio Vargas, de R$ 38,293 milhões, equivalia a aproximadamente 1,42% do custo de construção
(obras mais despesas acessórias relacionadas à instalação dos equipamentos), R$ 2.695.005.652,58
(peça 276, p. 22-23).
153. Não obstante, entendo que é razoável a interpretação da SeinfraUrbana e da Fiocruz/Bio-
Manguinhos de que o § 3º do art. 47-A da Lei 12.462/2011 somente se aplica aos BTS sem reversão
final do bem.
154. Isso porque, nos casos de BTS com reversão do bem, parte do denominado valor da
locação corresponde à amortização do imóvel construído, de modo que um maior percentual sobre o
valor do bem locado, em verdade construído de forma financiada, não significa a ocorrência de
superfaturamento, mas sim uma maior amortização mensal, o que acarreta uma menor duração
contratual.
155. Dito de outra forma, não há lógica em limitar o valor da amortização mensal do bem que
será revertido à administração pública. Em minha visão, o Poder Público pode estipular as condições
de financiamento que melhor lhe aprouver, segundo critérios econômicos racionais e sua capacidade
de pagamento.
156. Em situações do tipo, a entidade contratante deve, com o auxílio e a autorização do
Ministério da Economia, definir um valor de locação, leia-se de amortização acrescida do custo do
capital de terceiros investido, compatível com o espaço fiscal eventualmente existente e projetado

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segundo as estimativas de receitas e despesas do ente contratante, no horizonte de médio e longo


prazo. Tais valores seriam definidos a partir do valor do investimento necessário à aquisição ou
construção do bem e do custo médio ponderado de capital do projeto.
157. Assim, a administração poderia optar por firmar contrato com maior relação aluguel/valor
do bem e menor duração, o que resultaria em menores custos financeiros e numa amortização mais
rápida do bem a ser entregue ao Poder Público.
158. Dessa forma, reputo superado o risco aventado.
IV.2 - Ausência de instrumento orçamentário e riscos fiscais
159. Quanto à ausência de instrumento orçamentário adequado ao modelo BTS e aos riscos
fiscais pertinentes, a SeinfraUrbana verificou que o desembolso financeiro por parte da administração
pública somente será iniciado após 3 anos do início da obra (pagamento de 60% do aluguel por 2 anos)
e terá duração de 15 anos (com pagamento integral do aluguel) – essa formatação foi alterada na
minuta definitiva do edital, consoante exposto no item 93 supra. Por tal motivo, concluiu que o
instrumento orçamentário plurianual existente não é capaz de abranger todo o período de desembolso
do projeto e registrar o valor total do investimento, conforme confirmado pelo Ministério da
Economia.
160. Como consequência, “haverá possibilidade de celebração de um contrato cujo valor
global pode alcançar R$ 7,3 bilhões sem qualquer tipo de autorização orçamentária e legislativa
previamente à licitação, por falta de instrumento adequado, não sendo possível, inclusive, verificar o
cumprimento de outras regras fiscais dispostas na Lei de Responsabilidade Fiscal”.
161. Adiante, a unidade técnica aduziu que a reversão do bem ao final de sua construção
implica que a essência da operação é a realização de “[...] uma despesa de capital derivada de uma
operação de crédito”.
162. Nesse contexto, manifestou preocupação quanto ao uso recorrente desse tipo de
contratação, pois apesar de o Ministério da Economia ter afirmado “que não há materialidade
significativa para afetar regras fiscais como ‘Regra de Ouro’ ou ‘Teto dos Gastos’”, no caso
concreto, a SeinfraUrbana entende que, “[...] caso os demais órgãos da Administração passem a
adotar o modelo built to suit com reversão, poderá ser constituída uma carteira significativa capaz de
afetar tais regras”.
163. Em resposta à oitiva, a Fiocruz/Bio-Manguinhos acolheu a observação de que as despesas
relacionadas ao contrato de locação de edificação com construção ajustada (built to suit) deveriam ser
classificadas como de capital, mas refutou o enquadramento do ajuste como uma operação de crédito
ou um arrendamento mercantil (leasing).
164. Como justificativas, aduziu que o contrato não é firmado com instituição financeira, nem
regulamentado pelo Banco Central; a reversão do bem é obrigatória, ao passo que no arrendamento
mercantil isso é uma faculdade, sob pena de caracterização do ajuste como compra e venda, conforme
jurisprudência firme do STJ (REsp 163.845-RS); o imóvel é da União, não havendo aquisição da
propriedade de um bem, mas tão somente a reversão da edificação; esta ocorrerá mediante um contrato
de empreitada, que pode ser enquadrado como despesa de capital (investimento).
165. Quanto à ausência de instrumento orçamentário apto a prever a execução do
empreendimento, a entidade aduziu que o contrato está sujeito às mesmas condições de uma parceria
público-privada (PPP), devendo cumprir o art. 10 da Lei 11.079, de 30 de dezembro de 2004.
166. Ao analisar os elementos apresentados, a SeinfraUrbana pontuou que não obteve êxito em
esclarecer as questões acima levantadas junto à Secretaria do Tesouro Nacional, tendo se limitado a
concluir que persistiam os riscos identificados na modelagem do BTS.

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167. Por esse motivo, a unidade técnica alvitrou encaminhar cópia da deliberação aos
Ministérios da Economia, da Saúde e da Casa Civil, bem como ao Congresso Nacional, “para fins de
alerta sobre os riscos de insegurança jurídica e possíveis impactos orçamentários e fiscais
identificados por este Tribunal devido à falta de regulamentação da aplicação do modelo built to suit
no setor público, especialmente para os contratos que prevejam reversão do imóvel à Administração
Pública”.
168. À vista da especificidade do assunto, solicitei o pronunciamento da Semag, conforme
exposto no item 19 retro.
169. A unidade técnica especializada trouxe substancioso parecer no qual aduziu, quanto à
natureza da contratação decorrente do RDC Presencial 01/2021-BM como operação de crédito e à
eventual necessidade de cumprimento da legislação orçamentária e financeira, que:
“i. as locações sob encomenda – built to suit, ao realizarem a diluição temporal do valor
devido ao empreendedor ao longo do contrato, caracterizam-se como operações de crédito
nos termos do art. 29, inciso III, da Lei Complementar 101/2000. Tal característica é
especialmente verificada nos casos em que há a reversão obrigatória do objeto adquirido,
construído ou reformado substancialmente ao patrimônio do ente público, nos termos do
art. 47-A, § 2º, da Lei 12.462/2011;
ii. como condição para a assinatura do contrato, faz-se necessária a existência de prévia e
expressa autorização para a contratação da operação de crédito, esteja ela presente no
texto da lei orçamentária do exercício, em créditos adicionais ou em lei específica, nos
termos do art. 32, inciso I, da Lei Complementar 101/2000;
iii. a operação de crédito é definitivamente materializada no momento do recebimento do
objeto adquirido, construído ou reformado substancialmente pelo contratante. Como
condição para o referido aperfeiçoamento da operação e o recebimento do objeto da
locação sob encomenda, exigem-se, nos termos do art. 16, incisos I e II, e do art. 32, inciso
II, ambos da Lei Complementar 101/2000: a) a estimativa do impacto orçamentário e
financeiro; b) a declaração do ordenador de despesa de adequação orçamentária e
financeira; c) a inclusão no orçamento ou em créditos adicionais dos recursos
provenientes da operação; e d) verificação dos limites e condições relativos à operação de
crédito pela Secretaria do Tesouro Nacional;
iv. quando da inclusão da operação de crédito no orçamento (no exercício de sua
realização efetiva), bem como do recebimento do NCPFI pela Fiocruz (registro da
despesa primária com a incorporação do bem), deverá ser verificado o atendimento ao
Teto de Gastos da EC 95/2016, à Regra de Ouro do art. 167, inciso III, da CF/1988, às
metas fiscais de que trata a Lei Complementar 101/2000 e a Lei de Diretrizes
Orçamentárias e aos limites da Resolução do Senado Federal 48/2007.”
IV.2.1 - Análise
170. Não obstante as abalizadas considerações da Semag, entendo que o BTS apresenta, em
essência, características próximas de uma PPP – concessão administrativa, com prévia execução de
obra pública. Em verdade, compreendo que o ajuste em exame guarda semelhança e se insere no
contexto desse e de outros modelos contratuais introduzidos mais recentemente no ordenamento
jurídico, cujo traço comum é o prazo de duração mais longo, a execução de obras com recursos do
próprio contratado ou de terceiros e a amortização desses investimentos mediante o pagamento de
parcelas diluídas no curso de sua vigência.
171. A título de exemplo, menciono:

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a) o contrato de gestão para ocupação de imóveis públicos, que envolve a prestação de


serviços de gerenciamento e manutenção de imóvel, incluído o fornecimento dos equipamentos,
materiais e outros serviços necessários ao uso pela administração pública, podendo ser prevista a
realização de obras. O prazo de duração pode ser de até 20 anos (Lei 14.011/2020);
b) o contrato de eficiência, cujo objeto é a prestação de serviços, que pode incluir a realização
de obras e o fornecimento de bens, com o objetivo de proporcionar economia ao contratante em
despesas correntes. O prazo de duração poderá ser de até 35 anos, nos contratos com investimento,
assim considerados aqueles que impliquem a elaboração de benfeitorias permanentes, realizadas
exclusivamente a expensas do contratado, que serão revertidas ao patrimônio da Administração
Pública ao término do contrato (Lei 14.133/2021); e
c) o contrato de fornecimento e prestação de serviço associado, no qual o contratado se
responsabiliza pelo fornecimento e pela operação e manutenção do objeto, por tempo determinado. O
prazo de duração pode se estender por até 10 anos mais o período de fornecimento inicial e de entrega
da obra (Lei 14.133/2001).
172. Todos esses modelos contratuais se caracterizam pela realização de pagamentos diferidos
no tempo, os quais embutem não apenas o custo dos serviços, quando existentes, como também os
investimentos realizados pelo particular na execução de uma obra pública. Apesar dessa característica,
não há nas leis de regência nenhum dispositivo que os enquadre como uma operação de crédito e
imponha o cumprimento dos requisitos da espécie.
173. Como dito, eles consubstanciam a intenção do legislador de criar modelos de contratação
com prazos mais longos, concretizando uma espécie de compromisso intergeracional para a realização
de políticas públicas. Esses novos arranjos tiveram como objetivo criar uma alternativa para a
prestação de serviços e a execução de obras públicas, mediante o uso de recursos privados com
posterior pagamento pelo Poder Público.
174. Tal situação também ocorre nos contratos BTS, que foram inseridos na Lei do RDC dentro
do mesmo contexto de viabilizar a celebração de contratos mais longos prevendo investimentos
privados na prestação de serviços e execução de obras, com pagamentos diluídos. Da mesma forma,
não há no art. 47-A nenhuma exigência quanto à observância das regras relacionadas à realização de
uma operação de crédito.
175. Desse modo, entendo que há relevantes ponderações que conduzem à plausibilidade da
conclusão oposta à da Semag, no sentido de que o BTS, como as outras espécies indicadas no item 171
supra, pode ser considerado um contrato administrativo autônomo não enquadrado como operação de
crédito.
176. Diante dessa zona de incerteza, deve-se levar em conta o objeto da contratação em exame e
as consequências negativas que adviriam da interrupção da presente licitação.
177. No presente caso, a Fiocruz/Bio-Manguinhos visa o desenvolvimento, a construção e a
implantação de novas instalações industriais para as atividades de processamento final (formulação,
envase, liofilização, recravação, revisão, rotulagem e embalagem), controle e garantia da qualidade,
armazenagem de matérias primas e de produtos acabados, construção de áreas de suporte técnico e
administrativo e a urbanização do novo Campus de Santa Cruz.
178. Segundo a entidade, a decisão para implantação desse projeto decorreu da necessidade de
atender a exigências regulatórias da Anvisa, mais especificamente da RDC 17, “[...] que em uma
primeira análise colocava em risco toda produção de vacinas e biofármacos do Instituto e provocaria
risco de desabastecimento a nível nacional colocando em xeque o Programa de vacinação do país”.
179. Além de possibilitar a adaptação das linhas produtivas de Bio-Manguinhos às condições
impostas pela Anvisa, o NCPFI também tem como objetivo, segundo a descrição contida na minuta do
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edital do RDC Presencial 01/2021-BM, suportar a demanda crescente do SUS por vacinas e
biofármacos. Ademais, ela também servirá ao suprimento de vacinas ao resto do mundo,
principalmente aquelas que que a Fiocruz tem a liderança Mundial na produção, como é o caso da
vacina contra a Febre Amarela.
180. Vê-se, portanto, que a contratação em exame envolve a realização de relevante interesse
público. Em verdade, a necessidade de sua consecução se tornou ainda mais evidente após a epidemia
do novo coronavírus. É possível afirmar que a construção de uma fábrica de vacinas se enquadra
dentro de uma estratégia nacional de segurança sanitária, já que viabiliza o enfrentamento de eventuais
futuras pandemias.
181. Aplica-se, aqui, os arts. 21, 22 e 24 da LINDB:
“Art. 21. A decisão que, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, decretar a
invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa deverá indicar de
modo expresso suas consequências jurídicas e administrativas.
Art. 22. Na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os
obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu
cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados.
Art. 24. A revisão, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, quanto à validade
de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa cuja produção já se houver
completado levará em conta as orientações gerais da época, sendo vedado que, com base
em mudança posterior de orientação geral, se declarem inválidas situações plenamente
constituídas.”
182. Assim, diante da existência de variados argumentos quanto à natureza jurídica do contrato
em exame, opto pela interpretação que permita o melhor atendimento do interesse público.
Considerando as especificidades do objeto da contratação em exame e as dúvidas suscitadas a respeito
do regime jurídico aplicável ao BTS, opto por não adotar nenhuma medida obstativa da continuidade
do certame licitatório, na linha da proposta inicial da SeinfraUrbana.
183. Conforme visto, adotei a PPP – concessão administrativa como o modelo de contratação já
experimentado mais próximo do BTS em questão. Não desconheço que a Lei 11.079/2014 também
exige que sejam atendidos alguns pressupostos para a contratação de uma PPP.
184. Por exemplo, o art. 14, caput c/c o § 3º, da aludida norma impõe que esse tipo de
contratação seja precedida de autorização do órgão gestor instituído para esse fim, o qual avaliará
expediente instruído com pronunciamento prévio e fundamentado:
“I – do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, sobre o mérito do projeto;
II – do Ministério da Fazenda, quanto à viabilidade da concessão da garantia e à sua
forma, relativamente aos riscos para o Tesouro Nacional e ao cumprimento do limite de
que trata o art. 22 desta Lei.”
185. O art. 22, por sua vez, estabelece que “a União somente poderá contratar parceria
público-privada quando a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das
parcerias já contratadas não tiver excedido, no ano anterior, a 1% (um por cento) da receita corrente
líquida do exercício, e as despesas anuais dos contratos vigentes, nos 10 (dez) anos subseqüentes, não
excedam a 1% (um por cento) da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios”.
186. Como se vê, as exigências para as PPPs são fundamentalmente distintas daquelas
colocadas no art. 32 da LRF, para as operações de crédito, o que favorece o entendimento de que o
BTS não necessariamente deve estar sujeito às mesmas condições legais deste tipo jurídico.

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187. No presente caso, mesmo que o contrato em exame não seja propriamente uma PPP – esse
modelo foi usado como referência apenas para a reflexão sobre o enquadramento ou não desse arranjo
contratual como uma operação de crédito –, verifico que o valor estimado anual a ser pago (reversão +
aluguel), em torno de R$ 559,86 milhões, corresponde a um percentual bastante pequeno (0,06%) da
receita corrente líquida anual estimada em abril de 2021 (R$ 816,149 bilhões, segundo dados da
Secretaria do Tesouro Nacional (Disponível em:
<https://sisweb.tesouro.gov.br/apex/f?p=2501:9::::9:P9_ID_PUBLICACAO:31425>. Acesso em:
9/8/2021).
188. Quanto à garantia, cabe destacar que a Fiocruz/Bio-Manguinhos está viabilizando outra
alternativa para o uso do FGIE, como será mais bem ilustrado no próximo capítulo.
189. Não obstante a interpretação conferida ao presente caso, julgo pertinente, diante dos vários
argumentos apresentados na discussão do processo, dar ciência desta deliberação ao Ministério da
Economia a fim de que analise, para casos futuros, o enquadramento de contratações do tipo BTS com
reversão do bem, assim como dos demais contratos indicados no item 171 retro, como uma operação
de crédito, verificando as condições que devem ser atendidas para a sua conclusão.
190. Por fim, considerando as restrições atualmente existentes à expansão do gasto público,
reputo pertinente determinar à Fiocruz/Bio-Manguinhos que, antes do início da execução das despesas
relativas ao pagamento do aluguel do contrato que decorrerá do RDC Presencial 01/2021-BM,
verifique o atendimento ao Teto de Gastos da EC 95/2016.
IV.3 - Fragilidades no modelo de garantia previsto
191. Com relação ao último risco, a equipe de auditoria assinalou a existência de fragilidades na
previsão da utilização do Fundo Garantidor de Infraestrutura (FGIE) como cobertura da operação,
conforme indicado no item 26.2 da minuta do contrato.
192. Segundo os auditores da SeinfraUrbana, o regulamento do FGIE não prevê o uso do fundo
para a garantia de operações de BTS, de modo que, para a viabilização da operação, seria necessária
“a aprovação de um regulamento específico pelo Conselho de Participação de Fundos Garantidores
para Cobertura de Riscos em Operações de Projetos de Infraestrutura de Grande Vulto (CPFGIE) e
pela assembleia dos cotistas”.
193. Por esse motivo, entenderam que não seria adequada a abertura de procedimento licitatório
antes “[...] de as regras do fundo estarem devidamente formalizadas, em virtude do aumento do risco
associado a essa questão ser precificado nas propostas dos participantes do certame”.
194. A equipe de fiscalização também chamou atenção para o fato de o valor da garantia do
contrato englobar apenas 12 parcelas mensais do aluguel, consoante o item 26.3 da minuta do
instrumento analisada à época. Esse período corresponde a apenas 6% da duração do ajuste, o que foi
considerado pequeno por investidores reunidos em audiência pública promovida pela Fiocruz/Bio-
Manguinhos, dado o horizonte de 20 anos do projeto.
195. Na visão dos auditores da unidade técnica, esse aspecto pode influenciar negativamente o
valor das propostas, que podem embutir o risco de inadimplemento no preço apresentado, ainda mais
se for considerada a materialidade dos valores a serem investidos.
196. Por fim, a equipe de auditoria também verificou riscos relacionados à manutenção da
garantia pelo FGIE. Nesse sentido, aduziram que, apesar de o aporte inicial no fundo ser de
responsabilidade do Ministério da Saúde, eventuais recomposições decorrentes de utilização da
garantia deverão ser efetuadas pela Fiocruz/Bio-Manguinhos, conforme estabelecido na cláusula 26.6
da minuta do contrato. Em outros termos, a própria entidade que teria dado origem à inadimplência
contratual seria a responsável por recompor o saldo do fundo garantidor, o que não parece razoável,
sob o ponto de vista da viabilidade operacional.
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197. Dessa forma, a SeinfraUrbana propôs, na fase preliminar do processo, que fosse
determinado à Fiocruz que apresentasse a este Tribunal a formalização da garantia locatícia pelo
Fundo Garantidor de Infraestrutura (FGIE) e que avaliasse a conveniência e a oportunidade de rever as
regras de recomposição do fundo em caso de utilização, bem como o prazo de cobertura da garantia.
198. Em sua resposta à oitiva, a entidade jurisdicionada assinalou que continuava aguardando a
posição da Secretaria do Tesouro Nacional quanto ao eventual encaminhamento de proposta de
alteração do regulamento do FGCIE, no intuito de abranger o uso daqueles recursos na garantia de
operações sob a modelagem BTS.
199. Apesar disso, argumentou que, para avaliar a suficiência da garantia dos investimentos que
serão realizados no empreendimento em exame, não se pode afastar a possibilidade de utilização dos
ingressos advindos das exportações de Bio-Manguinhos/Fiocruz. Ademais, lembrou que as receitas
oriundas do Ministério da Saúde seguem o fluxo corriqueiro do orçamento público, com
direcionamento anual de acordo com a programação de ações para o período, sem grandes variações
ano a ano.
200. Por fim, no que se refere à recomposição do FGCIE, Bio-Manguinhos/Fiocruz argumentou
que foi proposta a definição do prazo de 3 meses em lugar da indeterminação observada pela equipe de
auditoria, sempre no propósito de ampliar a segurança jurídica que envolve a operação.
201. A unidade técnica analisou a matéria e asseverou que, apesar de persistir a impossibilidade
de utilização do fundo, a entidade jurisdicionada vinha construindo conjuntamente com os gestores do
FGIE mecanismos para a efetivação da utilização do fundo.
202. Quanto à devolução dos valores ao FGCIE, a SeinfraUrbana considerou pertinente a
fixação de um prazo para tanto, mas constatou que não houve manifestação acerca dos riscos
apontados relacionados ao responsável por efetuar essa recomposição.
203. Assim, apesar de reconhecer que não houve o saneamento de todos os riscos pertinentes à
matéria, concluiu que não era mais aplicável a proposta de determinação consignada no relatório
preliminar, haja vista o estágio da contratação (edital publicado) e os encaminhamentos promovidos
pela jurisdicionada junto aos gestores do FGIE com o objetivo de superar os obstáculos existentes para
o uso do fundo.
204. Por isso, alvitrou apenas a expedição de ciência à Fiocruz/Bio-Manguinhos sobre a “falta
de formalização da garantia locatícia pelo Fundo Garantidor de Infraestrutura – FGIE, bem como as
regras de recomposição do fundo em caso de utilização expõem o empreendimento a riscos de
descontinuidade e podem afetar os preços das propostas da licitação”.
IV.3.1 - Análise
205. Com relação ao assunto, entendo, em linha de consonância com a unidade técnica, que os
obstáculos jurídicos existentes ao uso do FGCIE constituem um fator de risco à modelagem escolhida
para a implantação do NCPFI, a ser assumido pelo investidor privado.
206. Seguindo uma lógica econômica, a tendência é que haja a precificação dessa contingência,
que seria transferida ao Poder Público mediante a oferta de propostas com menores taxas de desconto
no valor do aluguel frente ao estimado no certame. Isso seria uma perspectiva otimista, pois não se
pode descartar a ausência de interessados na licitação que se aproxima, haja vista os riscos elencados
nesta fiscalização.
207. Todavia, estando os autos em meu gabinete, Bio-Manguinhos/Fiocruz encaminhou
elementos adicionais de defesa nos quais assinalou, no que interessa ao presente achado, que houve
mudança na forma de garantia dos investimentos que serão aportados no NCPFI.

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208. Na ocasião, a entidade reconheceu a inviabilidade de se usar o FGCIE, de modo que houve
a alteração do edital para prever uma nova garantia ofertada pelo Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID). Transcrevo a seguir as ponderações trazidas por Bio-Manguinhos/Fiocruz:
“Restou a busca por uma outra emitente à condição de organismo garantidor. Optou-se
por um organismo internacional capaz de ser mais atraente ao mercado, aliando a
segurança necessária à operação e reputação internacional, de modo a ampliar o espectro
de investidores internacionais acostumados a operarem com garantias sólidas, fornecidas
por instituição financeira, entidade governamental ou organismo multilateral, com rating
(taxa de risco) diferenciado, concedido por agência internacional de classificação de
risco.
Tal processo terminou pela escolha do Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID,
como organismo a assumir a condição de garantidor. O mesmo possui qualificação triplo
AAA internacional cujas tratativas asseguram a garantia para 12 (doze) vezes o valor do
aluguel mensal do empreendimento, sem exigência de aporte prévio do valor equivalente
ao montante das 12 (doze) PMTs, como anteriormente exigido pela ABGF. Esse processo
de contratação, por redundar em financiamento externo, demanda autorização da
Comissão de Financiamentos Externos - COFIEX – ME, estando tal processo em curso,
contando ainda com o aval do Ministério da Saúde.
Vale destacar que o Edital foi alterado nesse ponto, e recentemente republicado, retirando
a ABGF como garantidora e introduzindo novo ente garantidor, embora não citando
formalmente o BID.
Aqui destaca-se que a chancela de referida organização joga luzes à maior bancabilidade
e atratividade econômica e sucesso do empreendimento conforme esperado por Bio-
Manguinhos/Fiocruz.
Adicionalmente a essa garantia, o edital, então republicado, conta ainda com uma
garantia em caráter adicional, referente ao complemento de mais 3 (três) vezes o valor do
aluguel mensal que somada à anterior, perfará um total de 15 (quinze) parcelas para o
caso de eventual inadimplência pela Contratante pública, o que pelo demonstrado nos
estudos de viabilidade e orçamentação do projeto possui riscos de moderado a baixo,
comuns a qualquer negociação, mitigados por esse instrumento tão bem aceito pelo
mercado. Especificamente a esta garantia adicional, a mesma é fornecida através da
Fiotec, amparada na lei 13.801/2019, vinculada a capacidade de arrecadação por Bio-
Manguinhos na conta de exportações de produtos.” (grifos acrescidos).
209. Não obstante a mudança realizada, observo que a estipulação dessa garantia depende de
condição ainda não efetivada, a saber, a autorização da Comissão de Financiamentos Externos
(COFIEX) do Ministério da Economia. Conforme informado pela jurisdicionada, tal processo ainda
está em curso, o que implica concluir que não ainda houve o equacionamento do risco de garantia, pois
a aprovação da pasta econômica é ainda incerta.
210. Apesar da permanência desse fator de incerteza, entendo que não cabe a adoção de
nenhuma medida obstativa da continuidade do certame licitatório, levando em conta as exigências de
políticas públicas associadas à contratação em análise, bem como as providências em curso no âmbito
da Fiocruz/Bio-Manguinhos para o equacionamento desse risco.
211. Todavia, a fim de prevenir situações futuras, julgo pertinente recomendar à Casa Civil que,
em face de sua atribuição de coordenação e integração das ações governamentais, avalie a
conveniência e oportunidade de regulamentar as garantias a serem ofertadas pelo Poder Público em
contratações built to suit de que trata o art. 47-A da Lei 12.462/2011, a fim de reduzir os fatores de

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riscos envolvidos nesses ajustes, permitir propostas mais vantajosas e viabilizar o uso desse modelo de
contratação no âmbito da administração pública.
V - Riscos identificados na minuta do edital que podem prejudicar a competitividade do certame
212. A equipe de auditoria identificou dois achados que poderiam comprometer a
competitividade da licitação: o conflito de interesses no modelo de contratação da Fundação Getúlio
Vargas (FGV) para prestação de serviço de assessoria técnica; e a adoção de critérios inadequados de
habilitação e julgamento.
V.1 – Modelagem da contratação da FGV
213. Com relação à primeira ocorrência, cabe destacar que a Fiocruz/Manguinhos assinou o
Contrato 76/2017 com a FGV, mediante dispensa de licitação, para “a execução de serviço de
assessoria técnica de apoio a Bio-Manguinhos, com vistas a realizar a modelagem de estruturação de
financiamento para o processo licitatório para construção no complexo NCPFI, dividido em 3 etapas
de serviço: prospecção de potenciais investidores, modelagem econômico-financeira e suporte à
realização do processo licitatório” (peça 248, p. 41).
214. Conforme a cláusula terceira do ajuste, o valor global foi fixado em 2,25% “[...] sobre o
total do valor do financiamento para a implementação do empreendimento”. O pagamento desse
montante seria realizado pela vencedora do certame licitatório para a construção do NCPFI, ou seja,
pela empresa contratada no âmbito do RDC Presencial 1/2021-BM. Não houve, portanto, a atribuição
de nenhum ônus financeiro à Fiocruz/Manguinhos.
215. Consta da letra “d” da referida cláusula a informação de que “o pagamento depende do
êxito do certame licitatório acima mencionado, de maneira que a CONTRATADA assume todos os
riscos da disponibilização de seus recursos humanos e técnicos sem a garantia da contrapartida
financeira correspondente” (peça 248, p. 42).
216. Para a equipe de fiscalização, essas condições configuram “[...] um conflito de interesses
da FGV em relação à contratação pois, como somente haverá recebimento dos serviços prestados
caso a licitação tenha sucesso, a remuneração do segundo contrato depende diretamente de que o
estudo de viabilidade econômico-financeira do empreendimento seja favorável ao investidor, a fim de
que se possa dar continuidade à licitação”.
217. Na visão da unidade técnica, essa situação seria agravada pelo fato de a remuneração da
FGV ser uma porcentagem do valor do financiamento. Ou seja, na prática, quanto maior o valor do
orçamento estimativo da modelagem maior será a remuneração da FGV, o que coloca a instituição
com objetivos opostos ao interesse público.
218. A SeinfraUrbana também destacou a existência do risco assumido pela FGV, a saber, a
possibilidade de ela não ser remunerada pelo serviço prestado caso a licitação não alcance êxito. Isso
configuraria, em sua análise, possível enriquecimento sem causa por parte da administração.
219. Nesse cenário, a equipe de auditoria recomendou a modificação das condições de
pagamento do ajuste a fim de mitigar esses riscos, tendo sugerido que a remuneração da instituição
fosse atrelada à taxa de desconto da licitação para implantação do empreendimento ou que fosse
estabelecido um valor fixo a ser pago pelo serviço, a preços de mercado. Também se cogitou que a
responsabilidade pelo pagamento da FGV fosse da Fiocruz/Bio-Manguinhos, pois, assim, não estaria
presente a estrutura de incentivos descrita acima, que induzia comportamentos contrários ao interesse
público.
220. Por fim, o corpo de auditores também recomendou a retirada do sigilo da licitação, de
modo que todos os possíveis participantes tivessem acesso às informações que seriam repassadas
durante as reuniões de prospecção de investidores, reduzindo, assim, a assimetria de informações entre
os concorrentes.
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221. Em resposta à oitiva, a Fiocruz/Bio-Manguinhos acatou parcialmente as sugestões contidas


no relatório preliminar da SeinfraUrbana e afirmou ter estabelecido um valor fixo de R$ 48.862.022,33
para a remuneração da FGV, correspondente a 2,25% do valor nominal do orçamento da obra na
data-base de julho/2015. Porém, o pagamento permaneceu condicionado ao sucesso da licitação e sob
a responsabilidade do vencedor do certame. Ademais, a entidade retirou o sigilo da licitação e da
documentação pertinente.
222. A unidade técnica analisou os elementos apresentados e concluiu que a entidade
contratante havia aprimorado a relação contratual com a FGV, acatando alguns apontamentos. Dessa
forma, aduziu que as recomendações outrora alvitradas não eram mais aplicáveis, após sopesar o atual
estágio da contratação (edital publicado).
223. Estando os autos em meu gabinete, a entidade ingressou com elementos adicionais de
defesa, dentre os quais consta expediente enviado pela FGV suscitando uma nova remuneração ao
aludido contrato.
V.1.1 - Análise
224. Sobre o assunto, entendo que há irregularidades no procedimento de contratação direta da
aludida instituição, especialmente quanto à justificativa de seu preço, bem como na definição da
responsabilidade pelo pagamento.
225. Conforme a justificativa elaborada por ocasião da abertura do procedimento, a dispensa de
licitação foi fundamentada no inciso XIII do art. 24 da Lei 8.666/1993, que permite a contratação
direta “[...] de instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino
ou do desenvolvimento institucional, ou de instituição dedicada à recuperação social do preso, desde
que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos”.
226. Compreendo que a FGV se amolda aos critérios subjetivos acima elencados, uma vez que
ela é instituição brasileira incumbida regimental ou estatutariamente da pesquisa, do ensino ou do
desenvolvimento institucional.
227. Da mesma forma, entendo que o objeto do contrato, a realização de “serviços de
assessoria técnica de apoio a Bio-Manguinhos/Fiocruz, com vistas a realizar a modelagem detalhada
da estruturação de financiamento para o processo licitatório para a Construção do Novo Centro de
Processamento Final do Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos – NCPFI [...]” é compatível com
algumas as finalidades da FGV, consoante o seu estatuto, a saber a prestação de “[...] assistência
técnica a organizações públicas ou privadas, objetivando coadjuvá-las na busca de eficiência” e a
concepção e implementação de “[...] de projetos de fortalecimento e desenvolvimento institucional”.
228. O objeto da avença, por sua vez, parece contribuir para o desenvolvimento institucional da
Fiocruz/Bio-Manguinhos, na medida em que busca viabilizar a modelagem da estruturação do
financiamento para o processo licitatório do NCPFI.
229. Isso porque o empreendimento está alinhado com as estratégias funcionais de Bio-
Manguinhos, uma vez que visa “[...] a ampliação e a modernização da infraestrutura do instituto, de
modo a contemplar as necessidades presentes e de expansão para os próximos 10 anos e instalações
ambientalmente sustentáveis” (peça 248, p. 15). Sob essa singela perspectiva, também estão satisfeitos
os critérios objetivos da lei para a dispensa de licitação com base no inciso XIII de seu art. 24, segundo
a jurisprudência desta Casa.
230. Por fim, parece razoável a razão da escolha da instituição, uma vez que elaborou o estudo
de viabilidade econômica do empreendimento em 2010 e a sua atualização em 2015, de forma que ela
parece deter melhores conhecimentos para definir o modelo de financiamento da implantação do
NCPFI e prestar os serviços acessórios consignados no projeto básico (prospecção de clientes e apoio à
licitação no que se refere à modelagem econômica).
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231. Com relação ao preço, verifico que a Fiocruz/Bio-Manguinhos o fixou, originalmente, em


2,25% do montante do financiamento para a implementação do empreendimento no projeto básico
assinado em 10/3/2017 (peça 248, p. 35).
232. Esse foi o valor sugerido pela FGV em 29/12/2016 (peça 248, p. 69), após o Sr. Artur
Roberto Couto, Diretor de Bio-Manguinhos ter solicitado a apresentação de proposta técnica e
comercial para a realização dos serviços indicados (peça 248, p. 47). Nesse expediente, foi indicado
que a remuneração da instituição deveria ser feita por meio de uma taxa de sucesso incidente sobre o
valor do financiamento das obras, incluída nos estudos de financiamento e paga diretamente pelo
licitante vencedor, como, ao final, veio a constar da minuta do contrato indicada no edital.
233. Na análise do preço ofertado, o Sr. Maurício Zuma Medeiros, Coordenador do Projeto do
NCPFI, consignou que o percentual sugerido estava abaixo do limite estabelecido no art. 4°, § 5º,
inciso II, do Decreto 8.428, de 2 de abril de 2015, que dispõe sobre o procedimento de manifestação de
interesse (PMI). Segue a redação do dispositivo:
“§ 5º O valor nominal máximo para eventual ressarcimento dos projetos, levantamentos,
investigações ou estudos:
[...]
II - não ultrapassará, em seu conjunto, dois inteiros e cinco décimos por cento do valor
total estimado previamente pela administração pública para os investimentos necessários
à implementação do empreendimento ou para os gastos necessários à operação e à
manutenção do empreendimento durante o período de vigência do contrato, o que for
maior.”
234. Na resposta à oitiva, a Fiocruz aduziu que havia acordado com a FGV a alteração de sua
remuneração e estipulado um valor fixo de R$ 48.862.022,33. Essa quantia corresponde a
aproximadamente 1,64 % do valor total estimado para a implantação do NCPFI (R$ 2,976 bilhões).
235. Estando os autos em meu gabinete, a Fiocruz/Bio-Manguinhos fez juntar expediente
trazido pela FGV propondo um novo modelo de remuneração, dessa feita atrelado à taxa de desconto
da licitação. Em suma, a contratada aduziu:
“A remuneração da FGV se mantém a cargo do licitante vencedor, que deverá inclui-la no
seu Plano de Negócios como despesa/investimento do projeto, como previsto no Edital e
no Contrato 076/2017.
Se o VPL do licitante for igual ao VPL máximo fixado no Edital, a remuneração da FGV
será de 0.4% sobre o valor do VPL proposto.
Para cada redução de VPL de 1% ou fração na proposta do licitante sobre o VPL máximo,
ante o benefício que isto representará para a Bio-Manguinhos/Fiocruz, o percentual de
0,4% será acrescido de mais 0,04%. A remuneração máxima a ser paga pelo licitante não
poderá superar R$ 48, 862 milhões.”
236. Tal proposição constou da última versão do edital, mais especificamente do Anexo 8 da
minuta do contrato de locação, denominado Diretrizes para a Elaboração do Plano de Negócios,
encaminhado por mensagem eletrônica à minha assessoria. Conforme o item 2.6 do documento:
“O valor do ressarcimento da modelagem devida à Fundação Getúlio Vargas, será
calculado com base no VPL proposto pelo licitante. Se o VPL proposto for igual ao VPL
máximo fixado no Edital (item 6.5), o valor do ressarcimento será igual a 0,40% (zero
virgula quatro por cento) sobre o VPL proposto. Para cada redução de 1% ou fração do
VPL proposto pelo licitante sobre o VPL máximo fixado no Edital, o valor do
ressarcimento será acrescido de mais 0,04% (zero virgula zero quatro por cento). O valor
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do ressarcimento a ser pago pelo licitante à FGV não poderá superar R$ 48.862.022,33
(quarenta e oito milhões, oitocentos e sessenta e dois mil, vinte e dois reais e trinta e três
centavos).”
237. Consoante a tabela ilustrativa indicada no aludido anexo, caso não haja nenhum desconto
sobre o VPL máximo estimado para o certame, a remuneração da FGV corresponderá a R$ 18,372
milhões.
238. A respeito do assunto, compreendo que foi inadequada a opção inicial da Fiocruz/Bio-
Manguinhos de vincular o preço da modelagem ao que seria obtido na licitação para implantação do
NCPFI.
239. Isso porque essa forma de remuneração acaba incentivando o contratado a agir de forma
oposta ao interesse da entidade contratante, já que seus ganhos serão tanto maiores quanto mais
elevado for o valor desembolsado pela administração, quando o contrário seria razoável, sob a
perspectiva da teoria econômica dos contratos.
240. Não se está aqui a sugerir que a FGV atuou de modo contrário ao interesse da Fiocruz/Bio-
Manguinhos, até porque não há nenhum elemento nos autos que conduza a essa conclusão. O que se
objeta é a forma como foi estruturada originalmente a remuneração da instituição, a qual pode ter
induzido comportamentos direcionados a maximizar seus ganhos privados, em detrimento do Poder
Público.
241. Do mesmo modo, também reputo inadequado atrelar a remuneração da modelagem à taxa
de desconto da licitação para implantação do empreendimento, ou seja, à diferença percentual entre o
VPL máximo e o ofertado pela licitante vencedora. Em minha visão, essa sistemática também tem o
potencial de induzir uma sobre-estimativa do valor orçado da licitação, a fim de artificialmente
provocar maiores taxas de desconto.
242. Não obstante o exposto, compreendo que o valor da remuneração da FGV parece estar de
acordo com o nível de risco assumido pela contratada quando da assinatura do Contrato 76/2017,
apesar das falhas em sua justificação.
243. Considerando que o pagamento da instituição foi condicionado ao sucesso da licitação para
implantação do NCPFI, cuja viabilidade econômico-financeira era incerta naquela oportunidade e
ainda hoje é objeto de dúvidas quanto à adequação de suas premissas, entendo que o caráter aleatório
do referido ajuste o aproxima do pactuado no âmbito de Procedimentos de Manifestação de Interesse
(PMI), quanto à definição de seu valor.
244. Por consequência, haverá a precificação dos riscos assumidos pelo contratado, o que
implicará valores de remuneração mais elevados para a elaboração do projeto/modelagem, devido à
inclusão desse fator de contingência – o sucesso ou não da licitação.
245. A propósito do assunto, ressalto que o modelo de PMI foi objeto de críticas quanto ao
valor da remuneração dos estudos, a distribuição de riscos, a estrutura de incentivos e a baixa
efetividade do procedimento. O tema foi discutido no Acórdão 1.873/2016-Plenário (relator: Ministro
Walton Alencar), que endereçou uma série de determinações ao então Ministério dos Transportes com
vistas ao aperfeiçoamento do modelo.
246. No presente caso, apesar da incerteza quanto à adequação do preço do Contrato 76/2017,
compreendo que não cabe a imposição de qualquer medida corretiva deste Tribunal sobre o valor da
remuneração, passados 4 anos da celebração da avença.
247. A uma porque há riscos que foram assumidos pelo contratado, quando da assinatura do
ajuste, que implicaram a realização de serviços em favor da Fiocruz/Bio-Manguinhos sem a certeza de
remuneração. Tal fator de incerteza persiste e, a despeito das falhas na condução do procedimento,
devem ser objeto de retribuição.
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248. A duas porque pela dificuldade de se obter um valor seguro de comparação da


remuneração da modelagem do RDC Presencial 1/2021-BM, em razão da ausência de elementos para
se aferir os custos de elaboração dos estudos, incluindo margem de lucro compatível com a natureza
do serviço e com os riscos envolvidos.
249. A três porque a remuneração da FGV foi fixada no patamar entre R$ 18,372 milhões e R$
48,862 milhões, ou seja, entre 0,62% e 1,64% do valor total estimado para a implantação do NCPFI,
estando abaixo do limite estabelecido no art. 4°, § 5º, inciso II, do Decreto 8.428/2015, que se aplica à
remuneração no âmbito do PMI.
250. Diante desse contexto, cabe acolher as justificativas trazidas pela entidade jurisdicionada, o
que não impede o Tribunal de, no futuro, adotar procedimentos de auditoria para avaliar a
economicidade do ajuste e propor as medidas adequadas à reparação de eventuais prejuízos ao erário.
V.2 - Adoção de critérios inadequados de habilitação e julgamento
251. A equipe de auditoria assinalou que a regra que exige a comprovação de que a licitante
tenha participado de empreendimento que tenha captado pelo menos um bilhão de reais para
cumprimento das obrigações financeiras assumidas, por meio de financiamentos de longo prazo, não
era razoável, pois impedia a participação de uma empresa que tivesse capital próprio suficiente para
garantir a entrega do empreendimento. Ademais, aduziu que não foi demonstrada a adequabilidade da
exigência desse valor.
252. Por fim a SeinfraUrbana pontuou que faltava clareza e objetividade na forma de análise das
propostas, pois o edital apenas afirmava que elas seriam classificadas por “ordem decrescente de
vantajosidade”, sem qualquer definição do que seria esse termo.
253. Em sua resposta à oitiva, a Fiocruz/Bio-Manguinhos alegou que a referida exigência estava
de acordo com a jurisprudência do TCU, que admite a comprovação de quantidades mínimas de até
50% dos itens de maior relevância na obra ou serviço como condição de habilitação.
254. Não obstante, concordou com o Tribunal em relação aos demais riscos e efetuou
alterações, nas minutas de edital e de contrato, relacionadas à origem desse recurso de um bilhão de
reais (se de capital próprio ou de terceiros) e ao critério de julgamento da proposta comercial, que
passou a ser considerado o “menor valor presente líquido”, bem como retirou o sigilo do orçamento.
V.2.1 - Análise
255. A respeito do assunto, entendo que a exigência de comprovação de que a licitante tenha
participado de empreendimento de grande porte no qual tenha sido necessário investimento de pelo
menos R$ 1.000.000.000,00 (um bilhão de reais), provenientes de capital próprio ou de terceiros,
parece condizente com o objeto do certame, que envolve, primordialmente, a execução do que se
chama de Project Finance.
256. Quanto a esse valor, observo que ele corresponde a aproximadamente 1/3 do custo
estimado da obra atual – R$ 2,976 bilhões (data-base: setembro/2020) –, não havendo, em minha
visão, falta de razoabilidade dessa condição.
257. Quanto aos demais aspectos, observo que a Fiocruz/Bio-Manguinhos corrigiu os
apontamentos iniciais, motivo pelo qual considero a irregularidade elidida.
258. Diante de todo o exposto, VOTO por que seja adotada a deliberação que ora submeto a
este Colegiado.
TCU, Sala das Sessões, em 11 de agosto de 2021.

BENJAMIN ZYMLER
Relator
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ACÓRDÃO Nº 1928/2021 – TCU – Plenário

1. Processo nº TC 008.162/2019-0.
2. Grupo II – Classe de Assunto V – Relatório de Auditoria:
3. Interessados/Responsáveis:
3.1. Interessado: Congresso Nacional (vinculador)
4. Entidade: Fundação Oswaldo Cruz.
5. Relator: Ministro Benjamin Zymler.
6. Representante do Ministério Público: não atuou.
7. Unidade Técnica: Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Urbana (SeinfraUrb).
8. Representação legal: não há.

9. Acórdão:
VISTOS, relatados e discutidos estes autos de relatório de auditoria realizada na Fundação Oswaldo
Cruz (Fiocruz) com o objetivo de avaliar, por meio da análise da minuta do edital RDC Presencial
01/2019-BM e seus anexos, a adequação da modelagem built to suit (BTS) à execução do Novo Centro
de Processamento Final de Imunobiológicos de Bio-Manguinhos – RJ (NCPFI), localizado em Santa
Cruz, zona oeste do município do Rio de Janeiro/RJ.

ACORDAM os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, diante


das razões expostas pelo Relator, em:

9.1. determinar à Fiocruz/Bio-Manguinhos que:


9.1.1. exija da empresa contratada em face do RDC Presencial 1/2021-BM a apresentação de
planilha orçamentária dos investimentos para a construção do NCPFI segundo o nível de detalhamento
exigido pelo art. 17, inciso III, da Lei 12.462/2011 c/c o art. 40, § 2º, do Decreto 7.581/2011;
9.1.2. antes do início da execução das despesas relativas ao pagamento do aluguel do contrato que
decorrerá do RDC Presencial 01/2021-BM, verifique o atendimento ao Teto de Gastos da EC 95/2016;
9.2. recomendar à Casa Civil que, em face de sua atribuição de coordenação e integração das ações
governamentais, avalie a conveniência e oportunidade de regulamentar as garantias a serem ofertadas
pelo Poder Público em contratações built to suit de que trata o art. 47-A da Lei 12.462/2011, a fim de
reduzir os fatores de riscos envolvidos nesses ajustes, permitir propostas mais vantajosas e viabilizar o
uso desse modelo de contratação no âmbito de administração pública;
9.3. dar ciência desta deliberação ao Ministério da Economia a fim de que analise, para casos
futuros, o enquadramento de contratações do tipo BTS com reversão, do contrato de gestão para
ocupação de imóveis públicos (Lei 14.011/2020), do contrato de eficiência (Lei 14.133/2021) e do
contrato de fornecimento e prestação de serviço associado (Lei 14.133/2021) como uma operação de
crédito, verificando as condições que devem ser atendidas para a sua celebração;
9.4. determinar à SeinfraUrbana que examine a adequação do orçamento estimativo do RDC
Presencial 1/2021-BM e da planilha dos investimentos a ser apresentado pela vencedora da licitação,
no próximo ciclo do Fiscobras;
9.5. dar ciência desta deliberação ao Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-
Manguinhos), à Fundação Oswaldo Cruz, ao Ministério da Economia e à Fundação Getúlio Vargas.

10. Ata n° 30/2021 – Plenário.


11. Data da Sessão: 11/8/2021 – Telepresencial.
12. Código eletrônico para localização na página do TCU na Internet: AC-1928-30/21-P.

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13. Especificação do quórum:


13.1. Ministros presentes: Ana Arraes (Presidente), Walton Alencar Rodrigues, Benjamin Zymler
(Relator), Aroldo Cedraz, Raimundo Carreiro, Bruno Dantas, Vital do Rêgo e Jorge Oliveira.
13.2. Ministro-Substituto convocado: Marcos Bemquerer Costa.
13.3. Ministros-Substitutos presentes: Augusto Sherman Cavalcanti, André Luís de Carvalho e Weder
de Oliveira.

(Assinado Eletronicamente) (Assinado Eletronicamente)


ANA ARRAES BENJAMIN ZYMLER
Presidente Relator

Fui presente:

(Assinado Eletronicamente)
CRISTINA MACHADO DA COSTA E SILVA
Procuradora-Geral

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