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Lucio

Luiz (org.)

Reflexões sobre o podcast


DEDICAMOS ESTE LIVRO A

LUCAS AMURA
O PODCASTEIRO
ÍNDICE

INTRODUÇÃO

PARTE 1 - Reflexões “podcastais”


Capítulo 1
HISTÓRIA DO PODCAST NO BRASIL E NO MUNDO
LUCIO LUIZ

Capítulo 2
UMA MÃO LAVA OUTRA, DUAS MÃOS BATEM PALMA
KELL BONASSOLI

Capítulo 3
SOTAQUES NO PODCAST: QUEBRANDO PARADIGMAS
PEDRO DUARTE

Capítulo 4
O FEED E A FIDELIZAÇÃO DO PODOUVINTE
PABLO DE ASSIS

PARTE 2 - Reflexões pessoais


Capítulo 5
2005: O ANO EM QUE FIZ CONTATO
SERGIO VIEIRA

Capítulo 6
ESCRIBA CAFE
CHRISTIAN GURTNER

Capítulo 7
PODCASTS E MOBILIDADE
BIA KUNZE

Capítulo 8
PODCAST CAFÉ BRASIL
LUCIANO PIRES

Capítulo 9
O RÁDIO QUE NÃO É RÁDIO
LEO LOPES

Capítulo 10
ALGUNS PAPOS DE GORDO
EDUARDO SALES FILHO
Introdução

Talvez você esteja se perguntando por que um livro sobre uma mídia fortemente ligada à
internet e à tecnologia tem em sua capa uma antiga fita cassete.
A explicação é simples. Basta perguntar à maioria das pessoas que produz podcasts qual a
relação que possuem com os programas que fazem. É algo que se assemelha bastante a uma
clássica brincadeira dos anos 1980, na qual pegávamos um gravador de fita cassete e
brincávamos de fazer nossos próprios programas de rádio.
Sim, muitos podcasters hoje em dia sequer eram nascidos nos anos 1980, mas o espírito é o
mesmo: com o podcast, a “brincadeira” de gravar seu próprio programa de rádio tomou uma
proporção muito maior.
Muita gente grava podcast por diversão. Mesmo os que já profissionalizaram seus
programas, em sua maioria ainda se divertem muito com o que fazem.
Gravando sozinho ou com os amigos, apresentando uma seleção de músicas ou um bate-papo
informal, fazendo uma edição caprichada ou mantendo o áudio “bruto” por opção, o podcast em
muito se assemelha às brincadeiras com a fita cassete.
Por isso reunimos neste livro dez pessoas ligadas à podosfera para trazerem “reflexões”
sobre essa mídia. Este livro não se propõe a ser uma obra “técnica”, portanto. Nosso objetivo é
pensar sobre o podcast como meio de comunicação e, por que não?, meio de socialização.
O livro é dividido em duas partes. Na primeira, estão os artigos voltados às reflexões de uma
maneira ampla. Por isso, logo no início, Lucio Luiz faz um resumo da história do podcast no
Brasil e no mundo, ajudando a entender melhor como surgiu e o que exatamente é o podcast.
Em seguida, Kell Bonassoli comenta sobre a “podosfera” nacional, mostrando como os
podcasters brasileiros se diferenciam das demais comunidades de produtores de podcasts.
Ainda nesse sentido, Pedro Duarte analisa a “profusão” de sotaques nos podcasts nacionais,
algo que foge, de certa forma, da busca pelo chamado “sotaque neutro” nos meios de
comunicação de massa brasileiros.
Por fim, Pablo de Assis faz uma abordagem um pouco mais “técnica”, mas nem por isso
menos reflexiva, estudando o feed (sistema que ajuda na “distribuição” dos podcasts) e como
ele fideliza o ouvinte.
A segunda parte do livro traz seis experiências pessoais de podcasters de diferentes
“gerações”: Sergio Vieira (Impressões Digitais), Christian Gurtner (Escriba Cafe), Bia Kunze
(PodSemFio), Luciano Pires (Café Brasil), Leo Lopes (Rádiofobia) e Eduardo Sales Filho (Papo
de Gordo) falam sobre como começaram a ouvir e produzir podcasts, além de mostrarem
algumas de suas visões particulares sobre essa mídia.
Esperamos que este livro seja uma boa leitura tanto para quem já está envolvido com o
mundo do podcast (seja ouvindo e/ou produzindo) como para quem ainda não conhece a
podosfera e está curioso sobre o porquê desse pessoal gostar tanto do que faz.
PARTE 1

REFLEXÕES “PODCASTAIS”

Lucio Luiz
Kell Bonassoli
Pedro Duarte
Pablo de Assis
A história do podcast
Lucio Luiz

Para quem não está acostumado com os diversos “formatos” de distribuição de conteúdo na
internet, tudo parece igual. Por isso, quando falamos da “transmissão” de áudio on-line, muita
gente tem dificuldade de entender a diferença entre podcasts, audioblogs, webrádios e afins.
Tentando explicar de uma maneira bem simples, podcasts são programas de áudio ou vídeo,
cuja principal característica é um formato de distribuição direto e atemporal chamado
podcasting. Bom... Pode não ter sido uma explicação tão simples assim.
Melhor voltar um pouco no tempo e observar como tudo isso começou. Quem sabe não fica
um pouquinho mais fácil de entender...

ORIGEM
Em 2004, a distribuição de arquivos com “programas de áudio” não era novidade. Eles
seguiam a mesma lógica dos programas de rádio, mas eram distribuídos pela internet como
arquivos MP3 ou similares. Para um internauta ouvir um desses arquivos, precisava, a cada
nova “edição”, acessar o site que o hospedava, fazer o download para seu computador e, só aí,
ouvi-lo.
Houve algumas experiências voltadas ao download automático de arquivos de áudio, mas
geralmente ligadas a empresas que também eram responsáveis pela geração de conteúdo,
buscando lucro direto. Como havia dificuldade de lucrar com o sistema, essas experiências
eram deixadas de lado depois de algum tempo.
Com a profusão de aparelhos portáteis reprodutores de arquivos de áudio, notadamente os
de formato MP3, surgiram várias novas ideias de como automatizar o acesso ao conteúdo de
audioblogs e demais programas de áudio. O método que mais teve sucesso foi a possibilidade
desse download ocorrer automaticamente através de programas chamados “agregadores”,
utilizando uma tecnologia já empregada para blogs: o RSS (Really Simple Syndication).
Explicando de uma forma bem simples, o RSS é uma maneira de um programa chamado
agregador de conteúdo saber que um blog foi atualizado sem que a pessoa precise visitar o site.
Ou seja, em vez de o internauta ir até o conteúdo, é o conteúdo que “vai” para o internauta.
Antes, esse sistema funcionava para arquivos de texto, mas, em 2003, Dave Winer criou uma
forma de fazer o RSS funcionar também para arquivos de áudio, para que o jornalista
Christopher Lyndon pudesse disponibilizar uma série de entrevistas na internet.
Só que isso ainda não era podcast. Ao menos, não como nós entendemos hoje em dia. Só no
ano seguinte, em 2004, que ocorreu o “pulo do gato” que passou a diferenciar de vez esse
sistema do RSS “normal”: Adam Curry criou, a partir de um script de Kevin Marks, uma forma
de transferir esse arquivo de áudio disponibilizado via RSS para o agregador iTunes (que na
época era a única forma de “alimentar” de conteúdo os iPods, populares tocadores de mídia da
Apple - o iPhone ainda não havia sido lançado).
Esse sistema, chamado de RSStoiPod (um nome não muito criativo, mas que mostra de forma
bem clara sua função) foi disponibilizado para que outros programadores o utilizassem
livremente, o que fez com que vários outros agregadores passassem a também trazer esse
download automatizado de arquivos de áudio.
Essa forma de transmitir dados passou a ser chamada de podcasting (junção do prefixo
“pod”, oriundo de iPod, com o sufixo “casting”, originado da expressão “broadcasting”,
transmissão pública e massiva de informações). O nome fora sugerido em fevereiro de 2004 por
Ben Hammersley, no jornal The Guardian, para definir a forma de transmissão das entrevistas
de Lyndon e acabou sendo adotado posteriormente para esse novo sistema de transmissão de
dados.
Naturalmente, esse sistema não ficou limitado ao iPod, embora fizesse referência direta a
seu nome. Porém, o nome “pegou” e os programas de áudio que começaram a ser distribuídos
via podcasting passaram a ser chamado de podcasts.
Em princípio, podcasts também são os programas de vídeo distribuídos dessa forma. Porém,
no Brasil, acabou ficando uma certa “separação” informal que classifica os programas de áudio
como podcasts e os de vídeo como videocasts.

BRASIL
O Brasil possui uma tradição de adotar o uso de novas mídias de forma efetiva,
especialmente as relacionadas à internet. No caso dos podcasts não podia ser diferente, tanto
que o primeiro podcast brasileiro surgiu já em 2004.
Sendo mais preciso, foi em 20 de outubro de 2004 que Danilo Medeiros criou o podcast
Digital Minds, que surgiu como parte do blog de mesmo nome. Esse não foi o primeiro blog a
disponibilizar arquivos de áudio para download, mas o primeiro a fazê-lo através do podcasting.
Em 15 de novembro do mesmo ano, surgiu o Podcast do Gui Leite. Na primeira edição, foi
explicada a intenção de se fazer o podcast para testar esse tipo de tecnologia.
Em dezembro de 2004 ainda surgiram os podcasts Perhappiness, de Rodrigo Stulzer, e
Código Livre, de Ricardo Macari, em 3 e 13, respectivamente. No ano seguinte, vários outros
programas estrearam, muitos inspirados nesses primeiros representantes brasileiros na mídia
podcast.
Em 2005 foi organizada a primeira edição da Conferência Brasileira de Podcast (PodCon
Brasil), primeiro evento brasileiro dedicado exclusivamente ao assunto, em 2 e 3 de dezembro
em Curitiba, Paraná. O evento foi organizado por Ricardo Macari e patrocinado pelo podcaster
Eddie Silva e pela cervejaria Kaiser. Posteriormente, passou a fazer parte do Fórum de Mídias
Digitais e Sociais.
Durante a PodCon 2005, foi organizada a Associação Brasileira de Podcast (ABPod), tendo
sido indicado para presidente o podcaster Maestro Billy, aceito por unanimidade.
Contudo, apesar do promissor crescimento da mídia podcast, ainda em 2005, ocorreu o
chamado “podfade”: o fim de vários podcasts no Brasil e no mundo pelas mais diversas razões.
O fenômeno continuou até o início de 2006, adiando projetos como o Prêmio Podcast e novas
edições da PodCon.
Em meados de 2006, com poucos remanescentes da “primeira geração” de podcasters ainda
publicando, vários novos podcasts surgiram e a mídia voltou a ter um crescimento,
especialmente a partir de 2008, quando o Prêmio iBest, então um dos principais prêmios
brasileiros voltados à internet, incluiu a categoria “podcast” para julgamento exclusivo por voto
popular, tendo como vencedor Nerdcast1, seguido por Rapaduracast2 e Monacast3, todos
representantes dessa “nova geração” (os dois primeiros surgiram em 2006 e o terceiro, em
2008; sendo que apenas o Monacast não é mais produzido regularmente).
Também em 2008 foi realizada a primeira edição do Prêmio Podcast, organizada por Eddie
Silva, sendo a pioneira na premiação exclusiva para podcasts, com várias categorias de votação
popular e júri oficial, recebendo grande divulgação nos próprios podcasts. O prêmio teve apenas
mais uma edição, no ano seguinte.

PODCASTS BRASILEIROS
Quando os primeiros podcasts brasileiros surgiram, eles se assemelhavam bastante aos
norte-americanos, com programas com pouca ou nenhuma edição, lembrando programas ao
vivo de rádio.
Depois do “podfade” de 2005, novos programas surgiram inspirados nos programas de rádio
voltados para jovens, que aliavam humor, técnica e mixagem de som, produzindo pautas leves e
descompromissadas, e trilha e efeitos sonoros que valorizavam a fala dos locutores.
Um dos primeiros a explorar esse formato de produção foi o Nerdcast, surgido em 2 de abril
de 2006 (ainda chamado de Nerd Connection) como parte integrante do blog Jovem Nerd,
criado em 2002 por Alexandre Ottoni e Deive Pazos.
A popularidade do Nerdcast pode ser medida pelo fato de ser um dos poucos podcasts
brasileiros que possuem publicidade paga regular e um modelo de negócios que engloba a
venda de produtos (pela loja virtual própria Nerdstore) e regularização como empresa,
atingindo um público de 18 a 35 anos, majoritariamente masculino.
O formato básico do Nerdcast, que serviu de base para grande parte dos podcasts brasileiros
desde então, é uma conversa informal sobre temas gerais (no caso deles, dentro da “cultura
nerd”, que pode envolver desde a série cinematográfica Star Wars até discussões sobre bolsa de
valores), sempre utilizando bastante humor.
Com essa “filosofia de trabalho”, até mesmo os podcasts brasileiros que possuem temas
específicos se valem do humor e da edição e mixagem e som para desenvolver os assuntos de
cada programa. Na maioria há uma clara preocupação com a edição final, incluindo trilha
sonora.
No caso da utilização de música nos podcasts brasileiros, há os que utilizam apenas músicas
com direitos autorais livres (copyleft ou creative commons) e os que usam música comercial,
sendo que, nesse caso, também há os que as utilizam sem pagamento de direitos autorais
(alegando não lucrar com o podcast, embora não haja amparo legal para isso) e os que são
associados à ABPod e pagam um valor simbólico para o Ecad (Escritório Central de Arrecadação
e Distribuição).
Sobre a profissionalização dos podcasts, exemplos como o Nerdcast, que se tornam empresas
e, portanto, pagam impostos, são ainda raros nos Brasil. Grande parte dos podcasters são
originalmente ouvintes que resolvem fazer seus próprios podcasts apenas pela diversão que a
prática pode proporcionar.
Por essa mesma razão, são poucos os podcasts que se mantêm regulares por mais que um
ano, já que seus produtores os fazem em paralelo às suas atividades profissionais. Os podcasts
“pequenos” costumam ganhar dinheiro com banners de publicidade on-line, como Google
AdSense, que define a grande importância dada à relação entre blogs e podcasts no Brasil,
fazendo com que dificilmente existam podcasts que não possuam um blog como suporte a seus
episódios para garantir a inserção de publicidade, já que ainda é muito rara a venda de espaço
publicitário nos programas.
Além disso, no Brasil podcast é praticamente sinônimo de programas de áudio, devido à
pouca produção de podcasts em vídeo (não confundir com os programas distribuídos apenas no
YouTube, que, por não poderem ser baixados via feed, não são videocasts).
Outro ponto a se destacar é a ausência, com poucas exceções, de grandes empresas de mídia
produzindo podcasts no Brasil. Muitas vezes até existe a referência a “podcast”, mas costuma
ser um programa de áudio sem regularidade que não pode ser baixado por RSS e sequer via
download, o que é contrário ao conceito básico de podcasting.
O fato de a maioria dos podcasts brasileiros surgir por iniciativas pessoais e voltada a nichos
não valorizados pela “mídia de massa” faz com que dê suporte para o acesso à comunicação de
setores que outrora eram marginalizados nesse contexto.
Esse espírito também faz com que a “podosfera” brasileira possua diversas iniciativas de
suporte mútuo, inclusive entre programas que poderiam ser considerados como “concorrentes”.
É muito comum que podcasters participem de programas de outras pessoas, conversando sobre
assuntos variados e fazendo divulgação de seus próprios programas. Essa filosofia de
colaboração mútua é tão difundida que mesmo podcasts recém-lançados podem contar com a
participação de podcasters já “consagrados” em seus programas e vice-versa.
Importante dizer que, apesar do Nerdcast ser inspiração para vários podcasts novos, isso não
significa que a podosfera brasileira seja uma “cópia” desse programa. Pelo contrário,
atualmente há podcasts dos mais diversos formatos, estilos e temas, lidando ou não com humor
(em maior ou menor grau) e até com uma “preocupação” não tão grande com a edição de áudio
(priorizando, entre outras coisas, o conteúdo ou a agilidade da publicação).
A podosfera brasileira já se tornou suficientemente sólida (do ponto de vista de quantidade e
qualidade, embora ainda não de popularidade) a ponto de podermos encontrar programas sobre
praticamente todos os temas e, mesmo que existam muitas “cópias” (tanto do Nerdcast quanto
de outros programas mais conhecidos), muitos podcasts acabam desenvolvendo uma “cara”
própria.
Afinal, é lugar comum dizer que o tempo na internet “corre diferente”. Portanto, uma década
de podcast é tempo mais do que suficiente para que saibamos que muita coisa já mudou desde
os pioneiros e muita coisa ainda vai mudar a partir de novos programas que estão surgindo e
trazendo, aos poucos (bem mais “aos poucos” do que gostaríamos), cada vez mais público para
o podcast nacional.

1 <www.nerdcast.com.br>

2 <www.rapaduracast.com.br>

3 <www.monalisadepijamas.com.br>
Uma mão lava outra, duas mãos batem palmas
Kell Bonassoli

Na história da humanidade (e dos animais também) aqueles que aprenderam a colaborar e improvisar
foram os que prevaleceram.
(Charles Darwin)

O título desta reflexão certamente já deu uma pista do seu conteúdo: uma mão lava a
outra, duas mãos batem palmas, são expressões sobre colaboração e é com essa filosofia que
o podcast nacional expandiu-se em variedade, qualidade e alcance.
Vamos falar sobre a podosfera e entender um pouco do modus operandi desse ser que habita
a fauna digital do nosso Brasil-sil-sil: o Podcaster.
O Podcaster é o indivíduo que produz ou participa da criação do Podcast. Esse ser
extremamente curioso e persistente geralmente anda em bandos e esses bandos se relacionam
uns com os outros. Este hábito deu origem a uma rede de relacionamento comumente chamada
de Podosfera (a esfera que reúne os podcasters).
A Podosfera geralmente se reúne em seu hábitat natural, a internet, mas existem muitas
iniciativas interessantes e eficientes de reunião em locais neutros: os eventos.
Além dos eventos, essas criaturas são comunicativas e altruístas. É comum que desfrutem de
momentos de lazer e interação em bares, botecos, churrascos e até mesmo em ações coletivas
para doação de sangue, agasalhos e brinquedos para seres alheios a podosfera.
Em essência, o bicho-homem (e o bicho-mulher também) é um ser social inserido em um
meio digital. O meio digital, através das redes sociais, privilegia ainda mais os entrelaçamentos
de relações e a construção do conhecimento de forma coletiva, somos parte da cibercultura e o
podcast é uma das expressões mais autênticas dessa coletividade.
O Podcast é uma mídia essencialmente colaborativa, seja “intrapodcast”, pelo fato de os
participantes colaborarem entre si em prol da criação do programa, seja “extrapodcast”,
levando em conta que podcasters de diferentes programas colaboram uns com os outros de
alguma forma.
Agora que conversamos um pouco sobre onde vivem e do que se alimentam, vamos
acompanhar um pouco mais sobre o que esses seres fazem.

COLABORAÇÃO INTRAPODCAST
Os podcasts “de um homem só” existem, mas lobos solitários, como o podcast Café Brasil,
programa de reflexões e música da melhor qualidade, feito por Luciano Pires, e o inesquecível
programa de história Escriba Cafe de Christian Gurtner, não são a maioria entre os programas
brasileiros.
Em geral, podcasts são criados através do esforço coletivo de pelo menos três pessoas. Na
maioria das vezes, essas pessoas sequer residem próximas. São pessoas que se uniram em prol
de uma vontade em comum através das redes sociais, são frutos da internet.
Produzir um podcast pode ser uma atividade particionada em diversas outras atividades
menores, assim temos aquele que é mais crítico quanto ao desenvolvimento de pautas, temos
aquele que edita, temos aquele que tem uma presença mais carismática ou uma grande
influência e poder de engajamento, ou então, um grupo que compartilha de habilidades e de
talentos, trocando experiências e aprendizagem que resultam na evolução do todo.
A equipe costuma realizar todo o processo de criação, gravação, edição, publicação e
divulgação dos programas. São poucos os podcasts que custeiam a edição profissional de seus
programas por terceiros, em geral, cuidar desses filhos envolve trocar as fraldas, e eles as
trocam com prazer.

COLABORAÇÃO EXTRAPODCAST
A colaboração ocorre tanto em relação aos aspectos técnicos quanto ao social.
A maioria dos produtores de podcast aprendeu como desenvolver seus programas através da
ajuda de podcasters já estabelecidos e principalmente através de tutoriais, como os do
Podcasteando do Mundo Podcast (coluna de Thiago Miro, que ensina tudo sobre a criação de
podcast) ou com os episódios do Metacast (podcast de Pablo de Assis e Eduardo Sales, que fala
sobre podcasts e, inclusive, foi uma das grandes fontes de aprendizado de Thiago Miro e de
tantos outros).
A máxima aqui se confirma, uma mão lava a outra. O conhecimento propagado cada vez se
expande em mais canais e para mais pessoas.
“A coluna Podcasteando tem por objetivo facilitar o processo de produção de um podcast,
mostrando aos novatos informações importantes e necessárias. Não há um único dia sem que eu
receba um feedback, um agradecimento pelos artigos e tutoriais. Eu posso até listar alguns
podcasts que vieram até mim dizer que só saíram do papel por conta da coluna Podcasteando.
Entre eles: Geek Café FM, Verbocast (evangélico), Passa o controle… A lista pode se estender
bastante se eu for vasculhar os comentários de cada artigo.” (Thiago Miro, 27, Olinda-PE,
Técnico em Química, concurseiro.)
Outra grande fonte que precisa ser creditada são as comunidades e fóruns em que
podcasters iniciantes solicitam ajuda a veteranos. Esses grupos de discussão possibilitam que
problemas sejam resolvidos rapidamente e que as novidades se espalhem assim que um dos
membros publique para o todo.
O grupo mais antigo (e que migrou de plataforma ao longo dos anos) é o PodcastersBr, um
grupo que já foi lista de e-mails e que conta com sua versão no Facebook e no Google Plus.1
Também no Facebook, temos o grupo Podcast: Discussões, um grupo menor, mas que se
diferencia dos demais pela regra que inibe a postagem de links de divulgação, focando o
objetivo do grupo em reflexões sobre a mídia.2
A grande vantagem do podcast é o seu poder de alcance. O podcast é um produto barato e
que pode impactar milhares de ouvintes. Para expandir seu alcance é necessário que as pessoas
assinem seu feed e é nesse ponto que entra o pulo do gato: podcasters compartilham de
estratégias para ampliar o alcance e crescimento dos programas e sua expansão para um
público maior através das trocas de influência, compartilhamentos e apadrinhamentos.

PARTICIPAÇÕES, ENTREVISTAS E CROSSOVERS


Uma das melhores estratégias utilizadas pelos podcasters reside justamente nesta
colaboração extrapodcast. Ela pode ocorrer através de um convite para entrevistar outro
podcaster, através do convite para que um profissional especialista contribua com uma pauta do
seu nicho ou até mesmo programas que mesclam os estilos de dois programas e que podem vir
a ser divulgados em ambos feeds ou de forma complementar.
É o que o Quadrimcast e o Argcast costumam fazer, ambos são podcasts sobre quadrinhos e
já é uma prática recorrente que a parte 1 de um tema seja publicada por um deles e a parte 2,
pelo outro.
Ainda falando de arte sequencial, quando houve a comemoração de 90 anos de Stan Lee,
12 podcasts diferentes (Pipoca e Nanquim, Cruzador Fantasma, Marvel 616 e outros)
combinaram por e-mail cobrir aspectos diferentes da obra do mestre para evitar a repetição do
Fenômeno Avengers (ocasião em que mais de 100 podcasts diferentes lançaram programas
sobre o mesmo tema por conta do lançamento do primeiro filme) e para diversificar a produção
em prol de seus ouvintes. Após os lançamentos, um post com a coletânea foi publicado no blog
de todos eles3.

INDICAÇÕES, RECOMENDAÇÕES, ENTREVISTAS E JABÁCAST


Uma ideia que surgiu com o Filecast (atualmente Piratacast) e que é praticada de forma
adaptada por alguns outros programas é o Jabácast. A ideia do Jabácast foi reunir vários
programas num grande podcast sobre seus próprios programas.
O Jabácast foi o “primeiro multi-crossover jabazístico de toda a história dos podcasters”, o
programa reuniu seis diferentes programas (BuraculoTV, QGPodcast, AnimeCast, Nowloading e
DotCast, além do próprio Filecast), cujos participantes falaram sobre a mídia podcast e
responderam a perguntas uns dos outros sobre seus programas.
O principal diferencial do Jabácast para os demais crossovers é que todos os participantes
publicaram esse episódio em seus próprios feeds em 21 de agosto de 2008, atingindo todos os
assinantes e ouvintes. O projeto se repetiu em 20 de novembro do mesmo ano, dessa vez com a
participação dos podcasts Das Antigas SkateCast, Depois das 11, Eduardo Moreira, Nerd
Curitibano e Papo de Gordo, além, naturalmente, do Filecast (LUIZ, Lucio).
É muito comum também que os podcasters que participaram de crossovers ou de outros
programas façam a divulgação de suas “andanças podcastais” em seus programas, geralmente
durante a leitura de e-mail, aproveitam para anunciar em quais programas estiveram e os links
de acesso costumam estar na postagem do episódio. Dessa forma também contribuindo na
ampliação de backlinks do participante em outros sites, o que por sua vez aumenta o
posicionamento daquele site no ranking do Google, ou seja, quanto mais o podcaster participar
de outros programas, além de ajudar o anfitrião, divulga a si mesmo e ao seu site através dos
links: mais uma vez, uma mão lava a outra, duas mãos batem palmas e assim todos saem
ganhando.
Fora essa modalidade vinculada de participação, alguns produtores de conteúdo divulgam
colegas, parceiros ou simplesmente algo de que gostaram em seus programas, o que resulta na
mesma equação apontada acima.
As recomendações nem sempre ocorrem no mesmo meio, às vezes ocorrem também em
forma de texto nos posts dos blogs ou nas fanpages do Facebook de um produtor de conteúdo
que recomenda o produto de outro produtor.
E por fim e não menos importante, temos a modalidade de podcast de entrevistas, como a
série Arquivo Confidencial do Mundo Podcaste a série20 Perguntas do Bacanudo,
enquanto o primeiro tinha o intuito de entrevistar podcasters estabelecidos, o segundo ampliou
seu escopo para outras personalidades, mas, através do formato entrevista, tornou-se
rapidamente conhecido e querido da podosfera.

A CULTURA DO COMENTÁRIO
“Seu comentário é o meu salário”. A frase muito comum na blogosfera é também
compartilhada pelos seres da podosfera.
É comum e gentil comentar no podcast do coleguinha, da mesma forma que é absolutamente
comum pedir por comentários. Da mesma forma, existe a necessidade não pronunciada de
retribuir comentários no site de quem comentou no seu programa. Ou seja, é uma cultura que,
além dos comentários dos próprios ouvintes, cresce com comentários entre os produtores de
conteúdo.
Comentar é uma prática tão bem-vista que, depois de certo tempo, algumas pessoas se
destacaram, primeiramente pela alta quantidade de podcasts que consumiam e segundo por
comentarem com bom senso, crítica e propriedade em diversos desses programas. Surgiu um
novo ser, o comentador de podcast.
Valendo-se desse conhecimento, surgiu uma coluna de recomendações e um pouco depois um
podcast que se destaca por ser exclusivamente para comentar outros podcasts e aspectos
comuns a toda a podosfera. A iniciativa surgiu apadrinhada pelo Mundo Podcast e é chamada de
Os Comentadores. O programa reúne alguns ouvintes bem conhecidos de boa parte da
podosfera pelo seu senso crítico e presença frequente nos comentários; pessoas que de tão
integradas a mídia resolveram tornar o que faziam em texto num produto em áudio.
“O podcast surgiu de uma ideia do Thiago Miro, mas acabou surgindo como uma evolução da
coluna Recomendo, que já existia no site.” (Igor Gudima Cunha, 32, São Paulo-SP, analista de
mercado sênior, CHEP Brazil.)
“A equipe é formada por ouvintes de podcast, alguns com mais de 80 feeds assinados. Por
serem comentadores profissionais, o podcast foi denominado Os Comentadores e tem por
objetivo expressar as opiniões sobre os mais diversos assuntos da podosfera.” (Fernando
Minotto, 31 anos, Goiânia-GO, analista de sistemas, coordenador da Equipe de
Desenvolvimento, na unidade de Goiânia da Siagri Software para Agronegócio.)
“Eu acho que o objetivo do podcast é fazer com que ouvintes E podcasters vejam que a mídia
podcast tem um potencial e alcance quase infinitos!” (Alexandre Garcia de Carvalho, vulgo
NerdMaster, 40 longos anos, Niterói-RJ, professor, Microlins.)

LISTAS, FÓRUNS, COMUNIDADES E REDES SOCIAIS


As formas de se conectar entre as pessoas evoluem e metamorfoseiam-se o tempo todo. Já
houve grupos de Orkut, listas no Google e atualmente o grande foco das discussões tem
acontecido dentro do Facebook. As duas comunidades que se destacam são a PodcastersBR, por
sua longevidade e número de usuários, e a Podcast e Discussões, pela profundidade que seus
tópicos têm conseguido alcançar, graças a uma regra fundamental: o veto a links de
autopromoção. Com esta simples medida, muitos produtores de conteúdo e também ouvintes
conseguiram dar vazão e participar de forma mais ativa dos tópicos abordados.
No Twitter, a prática do RT amigo é obrigatória, assim como as parcerias feitas utilizando
plug-ins para que vários feeds sejam divulgados de forma automática, sempre que ocorrem
atualizações.

OFICINAS, CURSOS, TUTORIAIS E AJUDA


Como não existe um curso regular que ensine podcast, alguns profissionais tiveram a
iniciativa de criar tutoriais ao vivo e oficinas. Na Campus Party 2012 (evento de tecnologia e
inovação que reúne um público de aproximadamente 8 mil pessoas com conteúdo, internet
super-rápida e área de camping para as pessoas permanecerem por uma semana no Anhembi,
em São Paulo-SP), tivemos o Cubo Geek.
O Cubo Geek foi uma iniciativa conjunta do Jovem Nerd, Rádiofobia e We are Geeks, com
patrocínio da Telefonica Vivo que construiu um estúdio no meio da arena do evento com
equipamentos de áudio e sistema de vídeo para streaming das atividades. No Cubo Geek, houve
os Tutoriais Live, que foram aulas sobre podcast e, além disto, 10 podcasts iniciantes foram
escolhidos para utilizar os equipamentos do Cubo com a assessoria de Leo Lopes (Rádiofobia).
Pablo de Assis realizou oficinas em Curitiba-PR (por um valor simbólico) para ensinar
podcast e Leo Lopes promoveu cursos pagos, através da plataforma Beved, para várias cidades
brasileiras.

EVENTOS LOCAIS, NACIONAIS E PODENCONTROS


Existiu um evento exclusivo para podcast, o Podcon, porém esse evento foi absorvido por
outro, o FMDS (Fórum de Mídias Digitais e Sociais), ambos em Curitiba-PR, porém o grande
encontro da podosfera é com certeza na Campus Party, tanto a edição nacional quanto a edição
de Recife reúne diversos produtores de conteúdo que já criaram a cultura de sentarem-se nas
mesmas bancadas para promover maior integração e mostrar que a comunidade tem crescido a
olhos vistos. Muitos destes produtores são convidados diversas vezes para palestrar nesse
evento, mostrando que, mesmo para aqueles que não monetizam seu produto, podcast é coisa
séria, sim, senhor.
Foi na Campus Party que o Rádiofobia promoveu a Maratona Podcastal, foi por causa da
Campus Party que surgiu o Metacast e foi por lá que muitas vozes tornaram-se rostinhos reais
para mim e para produtores e ouvintes que mantêm o contato sonoro ao longo dos anos.

OK, E QUEM VOCÊ PENSA QUE É?


Conheci esse lance de podcast em 2006 e resolvi entrar para a turma em 2011 em um
podcast de tecnologia, infelizmente já extinto. Depois disto, ouvi uma chamada de ajuda do
Dexter’s Mind, um podcast para falar sobre o seriado Dexter, e foi assim que conheci Pablo,
Isabela Cabral, Gabriel, Warley e Iskilo. Talvez estes nomes não signifiquem muito para vocês,
mas foi através da colaboração de uns com os outros que eu comecei a aprender o que é ser
podcaster. Um belo dia apareceu uma lista no grupo PodcastersBR para que colocássemos os
temas que adoraríamos gravar, mais que depressa coloquei minha paixão: O Senhor dos Anéis.
E foi por causa desta listinha danada que conheci Thiago Miro e desde então faço parte também
do Mundo Podcast, portal de podcast no qual gravo, escrevo e estou sempre aprendendo e
tentando ensinar.
Por causa de um FMDS, conheci o Icaro (SrSeuPanda) que já fazia parte de dois podcasts:
Pauta Livre News (humor) e Diecast Conection (colecionismo), que resolveu criar um novo
podcast, e foi por esta amizade que também entrei no Cruzador Fantasma (quadrinhos).
O que eu quero dizer com tudo isso? É que, apesar das brigas e de alguns distanciamentos
da primeira e segunda geração (em que boa parte dos podcasts deixaram de ser hobby e
passaram a ser negócio e render dinheiro), a maioria de nós está sempre circulando, se
ajudando e mesmo aqueles que “se estranham” têm um objetivo em comum: mostrar a
qualidade e seriedade da produção do podcast nacional.
Encerramos o nosso Podcast Repórter de hoje, convidando você a descobrir se na sua cidade
tem algum podencontro; e se não tiver, tente mobilizar um para descobrir que esses seres que
habitam a podosfera, além de talentosos e apaixonados, são pessoas que valem muito a pena
conhecer.

1 <https://www.facebook.com/groups/podcastbr/>

2 <https://www.facebook.com/groups/podcast.discussoes/>

3 <http://mundopodcast.com/kellices/excelsior-podosfera-comemora-90-anos-de-stan-lee/>
Sotaques no podcast: quebrando paradigmas
Pedro Duarte

Jurandir Filho e Raphael PH Santos, ambos do Ceará, montaram em 2006, o Rapaduracast,


para falar sobre cinema na internet, transformando aquelas conversas que tinham após os
filmes em algo para todo mundo. O nome (Rapadura) e os sotaques remetiam, sem nenhuma
cerimônia, à origem da equipe e da produção do conteúdo. Um caso de sucesso que se
disseminou pelo Brasil e fugiu do estereotipo de “programinha engraçado do Nordeste”, como o
próprio Jurandir gosta de ressaltar.
O Rapaduracast abriu precedentes: nada de “neutralizar” sotaques, nada de prescindir das
gírias regionais. Pelo contrário. Todo mundo que ouve o programa acha bacana o “macho” que
vem a cada frase do tipo “aquele filme é muito ruim, macho”. E não é exagero dizer que quase
todos que produzem conteúdo e que “têm sotaque” já não se preocupam com a possibilidade de
não serem aceitos por essa razão – embora isso ainda ocorra.
A grande mídia do país, a “mídia oficial”, as grandes emissoras de TV, rádio, os grandes
portais, está baseada no Sudeste. Convencionou-se que “não tem sotaque” aquele que fala do
jeito que o paulistano fala (porque até mesmo quem está no interior do estado de São Paulo tem
que aprender a “neutralizar” o “r” puxado – conhecido como caipira. O mesmo acontece com
quem é do interior de Minas etc.). O carioca também é aceito, já que a principal emissora do
país está sediada no Rio de Janeiro e nos acostumamos também a dublagens com sotaque
carioca desde pequeno em animações, por exemplo.
Em algumas faculdades do Nordeste, por exemplo, nas aulas de rádio e TV, ou seja, quando a
sua voz e a maneira que você fala fazem parte do produto (e até legitimam o conteúdo), ensina-
se a neutralizar o sotaque: “junte o ‘r’ no final da palavra com a vogal que vem em seguida”.
“Por exemplo” é um exemplo, além de antas outras lições. Os fonoaudiólogos dos meios de
comunicação locais também ensinam isso. A intenção é padronizar, nivelar pelo que já é aceito.
Eu, que sou de Salvador, passei por isso, tanto na faculdade quanto nas rádios em que
trabalhei...
Assim, todos temos de falar da mesma maneira, evitar regionalismos, evitar qualquer gíria,
evitar soar como você é na vida real.
Mas chegou a internet e esse universo que possibilita que qualquer pessoa produza
conteúdo. Pessoas que não passaram por esses “ensinamentos”, que não “estudaram como se
portar na mídia” para serem aceitas, pessoas que só queriam falar da maneira que sabiam falar,
se divertir, entreter. Comunicar-se, acima de tudo.
E então voltamos ao Rapaduracast. O programa computa 70 mil ouvintes por edição
(segundo dados do próprio site) e o mais irônico é que 16% dos ouvintes são da região Nordeste
– deixando os 84% restantes para todo o país. Jurandir Filho e Raphael PH Santos são formados
em Sistemas de Informação. A coisa toda nasceu durante a faculdade, da necessidade de
comentar os assuntos que quase nunca são abordados pela “mídia oficial”, mais
especificamente, cinema – fora um ou outro trailer pago para passar nas emissoras, ou
entrevistas com artistas de grandes blockbusters. E mais especificamente ainda, alguém
falando abertamente sobre um filme, contando como foi a sessão, falando apaixonadamente que
o filme foi uma grande decepção ou que tirou lágrimas de cada um, “que foi uma merda”, “que
foi foda” etc. Nada de ter de chamar de película, de termos técnicos para mostrar conhecimento
de forma gratuita, de ter de contextualizar demais para ser legitimado dentro do que estavam
dizendo. Eram só uns caras falando de uns filmes com um monte de palavras diferentes da
mídia tradicional, e um “eita, má!”, vez ou outra. Com o tempo (e lá se foram sete anos
produzindo conteúdo) tornaram-se referências. Não só eles, claro. O programa mudou,
participam muitas pessoas, de vários estados, de vários sotaques.
O formato do programa (a apresentação, mensagens dos ouvintes, a ordem que isso seria
apresentado) nasceu de forma orgânica, empírica – fazendo, sentindo e aprendendo. Como boa
parte dos podcasts que nasceram na mesma época, portanto. O especial, o toque diferente, fora
o conteúdo em geral, era o sotaque.
Mas se o sotaque era o charme, o “algo a mais”, era também motivo de ódio, de preconceito,
de não aceitação, “como uns ‘cabeça-chatas’, que não sabem nada, dizem que tal filme é assim
ou assado?”, “e tem cinema por aí?”. São comentários usuais, mesmo atualmente, mesmo com o
público consolidado e com a mistura louca de sotaques que se tornou o programa (atualmente,
com participantes do Rio de Janeiro, São Paulo, já teve também membro fixo de Porto Alegre,
enfim).
“Por que está falando tanto do Rapadurcast assim, é fã deles?”, você pode se perguntar. A
verdade é que quando se propõe falar de sotaques na internet, principalmente nos podcasts,
não há como fugir do Rapaduracast. Então, não tinha maneira melhor de começar este texto do
que estudando o programa “com sotaque” de maior sucesso. Até porque, sejamos honestos com
o mercado desses “programas de rádio na internet”: na podosfera, poucos realmente são
autossustentáveis e não exigem dos participantes que tenham outros empregos para se manter.
E o Rapaduracast é um deles.
Voltando a mídia tradicional: de quantos programas você se lembra agora, assim, de supetão,
que têm alguém “com sotaque”? Lembrou de algum? Caso tenha lembrado, pensa comigo, é de
humor? Aliás, quando se pensa em “ter sotaque”, de que você lembra? Melhor dizendo, de que
região você lembra? Não é uma defesa nem uma reclamação do tipo “Ah, o Nordeste do país é
vítima”. É um fato. A interpretação desse fato é óbvia com tudo o vimos até agora: em 2013 o
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou que os estados de Minas Gerais,
Rio de Janeiro e São Paulo concentram, sozinhos, 53,1% do PIB (Produto Interno Bruto) do
Brasil. A mídia tradicional está sediada no Sudeste, mais da metade da produção de riquezas do
país também está sediada na mesma região. A equação é simples, o conteúdo é produzido para
ser aceito para quem melhor poderá consumir.
O podcast, contudo, tem o poder de quebrar isso porque a produção é regional, mas é
também nacional; consegue fugir de estereótipos, cria novas referências e amplia, de forma
natural, o conhecimento geral sobre o próprio país. Parece exagero, mas não é. Quantos
programas com um participante fixo de Manaus, da Bahia, Mato Grosso, enfim, nós vemos na
mídia tradicional? Produzindo conteúdo nas revistas de grande circulação, nas rádios,
emissoras de TV? A consequência disso é um conteúdo limitado a uma única maneira de
enxergar o país e um conhecimento limitado, por parte do público, do estereótipo mais chulo de
cada região: quando se pensa na região Norte do país, de que você se lembra? Da festa do Boi-
bumbá, talvez, e o que mais? Um participante da Bahia traz uma novidade, nem todo baiano
gosta de axé music e a preguiça não é inerente à região. O Mato Grosso... Bom, se você puxar
bem a memória, pode se lembrar de uma novela ou programa que fala sempre dos animais que
vivem na região, citando o Pantanal, enfim.
O podcast aguça a curiosidade dos ouvintes sobre o regionalismo, sobre o que tem de
diferente naquela outra região. Talvez seja pela relação de amizade e identificação que se cria
com o podcaster, o que torna mais aceitável que a pessoa fale diferente. O “t” forte de grande
parte do Nordeste convive bem com o jeito “puxado” de falar do carioca e com as expressões
peculiares a cada região. Nenhuma outra mídia consegue assumir de vez os regionalismos com
tanto sucesso.
A conquista da credibilidade de um podcast é lenta e gradual, não existe ainda um programa
que tenha se destacado de forma meteórica – como acontece no YouTube, por exemplo. E isso
faz com que o relacionamento seja forte, sincero: quantos “Bora Baêa Minha Porra” se ouve em
um Pauta Livre News, dito pelo Carlos Tourinho, de Salvador? Alguns, mas não tantos quanto
ele menciona nas suas redes sociais. E quem se identificou com ele, vai acompanhá-lo e
conhecer, através das fotos, declarações, um pouco mais da região onde nasceu - em primeira
pessoa, sem intermediários.
Então podemos concluir até agora que o podcast é uma mídia capaz de quebrar paradigmas,
de ter integrantes de vários locais do Brasil, com diferentes formas de falar em seus respectivos
programas, com um nível de aceitação da audiência bastante encorajador. O mais legal é que ao
acompanhar um programa, quase sempre recheado de histórias pessoais contextualizadas nas
respectivas cidades, o ouvinte passa a conhecer naturalmente um pouco mais de cada local, o
que ajuda a quebrar preconceitos e a difundir informação direta e sem formalidade. Ao se
identificar com o podcaster, o público passa a segui-lo em outras mídias e a ter acesso a mais
histórias, imagens e registros de regiões pouco abordadas na mídia tradicional. O que só amplia
o poder da mídia como uma das poucas formas de comunicação com tamanha profusão e
mistura de sotaques.
Mas existe o outro lado, e o cenário não é perfeito. Muitas pessoas desistem de ouvir um
programa, mesmo que gostem do tema e da maneira que é feito (edição, trilhas) porque não
“aguentam ouvir aquele sotaque”. Ou são mais raivosos e abertamente preconceituosos nos
comentários de um determinado podcast – desencorajando a produção de conteúdo de muitas
pessoas com potencial de inovar e enriquecer o cenário.
Estamos acostumados a ouvir um sotaque neutro, quando a credibilidade de algo está em
jogo. Mas não é só isso. Cada modo de falar representa uma situação social, um status
diferente, e a gente se identifica com essas diferenças, mesmo que não seja tão fácil reconhecê-
las. Vamos seguir com um exemplo: em sua cidade vai ser construído um edifício com
apartamentos de luxo. Como é a voz do narrador do anúncio publicitário? E os atores, como eles
são fisicamente? São negros com sotaque nordestino? Agora, em um anúncio de um mercado ou
uma feira popular, quem está à frente? São pessoas loiras com sotaque neutro?
Agora tente se lembrar de tantos outros exemplos, qual a voz de quem apresenta o jornal? E
quem está na campanha de políticos de sua cidade “tentando falar com a massa”?
Parece que há um tom de mágoa ou de revolta nesse momento, mas não há. Mais uma vez, é
só um fato, a constatação de que funciona assim. Nós fomos mesmos condicionados a associar
uma coisa a outra: o chique e sofisticado a pessoa de pele clara, que fala de determinada
maneira, mais neutra; o ladrão, nas produções nacionais, é negro ou mulato, com outra maneira
de falar, talvez com mais gírias; o núcleo engraçadinho fala mais “apertado”, mais parecido à
forma que se usa no Nordeste ou nos subúrbios de cada região. É um reflexo socioeconômico, é
um espelho geral de como vivemos, é verdade. Mas é também uma forma de perpetuar, ou seja,
dar continuidade ao cenário que já nos condicionamos a aceitar.
O que se pode concluir é que o preconceito com os produtores de conteúdo que têm sotaque
na internet não é algo isolado, pelo contrário, tem muitos braços, anos de história de uma mídia
feita de um lugar, de uma origem única, para todos os outros, para todo o restante de um país
gigantesco, com culturas e maneiras de falar tão distintas que fica difícil entender as diferentes
formas de se expressar na mesma língua.
Se a mídia tradicional está onde o “mercado está”, o podcast alcança outro mérito. A
produção de conteúdo vem de todas as partes, de pessoas diferentes, com culturas e referências
diferentes. Os sotaques servem para legitimar histórias únicas e as expressões ganham vida
fora da internet em eventos que acontecem em todo o país, quando se pode trocar referências e
o produtor de conteúdo tem a oportunidade de medir seu alcance. É um fenômeno interessante
que transforma expressões regionais que seriam malvistas ou somente interpretadas e
utilizadas em algum momento de humor, em gírias, podemos até chamar assim, que se tornam
parte da rotina de todo o nicho brasileiro que acompanha a mídia e seus amigos, e amigos dos
amigos - afinal, todo grupo tem seu formador de opinião e não podemos esquecer a máxima da
“divulgação boca a boca”.
O alcance da mídia, diferente da mídia de massa tradicional, limita-se a algumas classes
sociais que têm acesso facilitado à internet e melhores condições básicas de entender e
acompanhar os programas (não podemos nos esquecer de alguns entraves que estão ao poucos
sendo quebrados, como o feed, download etc.). Pelo menos é o que todos os estudos de público
realizados e divulgados por alguns dos maiores podcasts do Brasil afirmam: Nerdcast, Matando
Robôs Gigantes, Ultrageek, entre outros.
Mas, acima de tudo, vale o exemplo de sucesso de dois amigos do Ceará que fundaram, lá em
2006, um programa sem maiores pretensões, recheado de regionalismos, e que hoje computa
cerca de 70 mil downloads por programa, com representatividade nacional. Representatividade
positiva, que é mais importante: com voz anasalada e sotaque carregado, Raphael PH Santos
palestrou em grandes eventos, como a Campus Party e youPIX, e Jurandir Filho, “Juras”, é
presença marcante em outros grandes programas, além de ter criado mais um, o 99vidas, com
outros amigos de “sotaque”.
E temos tantos outros: o Pauta Livre News, com membros de São Paulo, Belo Horizonte, Rio
Grande do Norte; o Telhacast, com o host de Olinda, Pernambuco; o Bacanudo, com host baiano
e equipe do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul; o Livrocast, com membros fixos de Santa
Catarina e Paraná… E a profusão de sotaques, a mistura - sem estereótipos -, que só o podcast
conseguiu alcançar efetivamente, continua. Porque o que vale nessa mídia, e até seria um
exemplo a ser absorvido por tantas outras, é a produção de contéudo feita com qualidade, uma
mistura real de um país continental, que valoriza os integrantes de forma igual, com pontos de
vista de quem vive em cada ponta do país, sem juntar “a vogal com r”, sem “neutralizar” para
ser aceito, enfrentando manifestações negativas, claro, mas alimentando-se de cada retorno
positivo. E, aos poucos, todo mundo acaba sabendo o que significam os tais “mazá” ou “piá”,
dito pelos gaúchos, o “bucho”, dos nordestinos, e que não se usa a expressão “meu rei” em
Salvador há pelo menos 15 anos.
O Feed e a Fidelização do Podouvinte
Pablo de Assis

Imagine seu programa de rádio preferido. Infelizmente ele só é exibido uma vez por semana
e justamente em um horário que você não pode ouvi-lo. E quando você se mudou de cidade,
nem mais a essa emissora tinha acesso. A internet ajudou a resolver um desses problemas:
muitas rádios já apresentam sua programação on-line, na forma de web-rádio, eliminando assim
a limitação de distância das transmissões das rádios hertzianas.
Porém, esse modelo é restrito a uma certa tecnologia que, por mais libertadora que ela seja,
ainda apresenta várias limitações. Agora, imagine poder ter a experiência auditiva de uma
forma completamente diferente daquela que o rádio ou até mesmo a web-rádio pode oferecer.
Não que essa experiência seja melhor, com menos limites: ela somente é uma experiência
diferente.
E essa experiência não é somente uma nova experiência estética, não serão somente os seus
ouvidos que perceberão sons novos, mas é muito mais uma nova forma de vivenciar a
comunicação auditiva. Essa experiência nova do som e do áudio chamo aqui de podcast.
O podcast já recebeu diversas definições, umas mais precisas, outras menos. Ele já foi
chamado de “uma espécie de rádio pela internet”, ou ainda “uma forma de fazer download de
arquivos de áudio”. Porém, por mais que aqueles que nunca ouviram falar do que é um podcast
consigam ter uma imagem do que seria isso, essas definições não dão conta dessa nova mídia.
O podcast pode ser definido brevemente como um arquivo de mídia, tradicionalmente um
arquivo de formato de áudio, transmitido via podcasting. E podcasting pode ser definido como
uma forma de transmitir arquivos digitais, através da internet, utilizando a tecnologia do
feedRSS e um agregador. Mas essa nova definição nos apresenta com novos conceitos que
precisamos ainda definir para poder compreender o que seria um podcast.
O podcast, como nova tecnologia, mostra-nos com esse desafio de ser compreendido nesse
aspecto amplo. Podemos ter informações históricas documentadas, como o primeiro podcast
que surgiu em 2004, nos Estados Unidos (LUIZ e ASSIS, 2009), ou dados técnicos como
feedRSS ou MP3. Porém, esses dados não nos ajudam a definir o podcast. Essa confusão talvez
seja comparável com a tentativa de definir o rádio quando ele foi lançado comercialmente na
virada do século XIX para o século XX: como é possível sair música em uma caixa em sua casa?
Quem a toca? Como a voz consegue sair de lá sem ter um microfone ligado ao aparelho? Onde
estão as vozes que ouço, mas não vejo quem são?
Imaginar a mentalidade do cidadão daquela época, acostumado com o recebimento de
notícias através de impressos ou de ouvir música ao vivo, talvez seja um exercício interessante
de mudança de paradigmas estéticos. O rádio, quando surgiu, apresentou uma nova forma de
experimentarmos – não apenas o som e o áudio mas também todas as mensagens que o áudio
podia carregar e uma nova forma de consumir cultura. Por mais acostumados que fossem com
as mensagens de áudio, essa nova mídia modificou a relação com ele. O mesmo acontece com o
podcast atualmente.
Não são todos os que conhecem o que é um podcast e até mesmo os que o conhecem não
reconhecem todo seu potencial. Uma experiência auditiva nova que precisa de recursos
tecnológicos diferentes e muitas vezes desconhecidos pode provocar diversas reações nas
pessoas. Cada uma terá imagens diferentes não só dessa nova mídia mas também das relações
possíveis com o áudio nela transmitido. É claro que o mais comum é comparar a experiência
nova com experiências conhecidas – por isso talvez a constante comparação do podcast com o
rádio. Mas, para podermos conhecer melhor essa mídia, é necessário conhecê-la por aquilo que
ela é.

O PODCAST E O PODCASTING
A mídia do rádio recebe esse nome principalmente porque é uma mídia transmitida por
radiodifusão, ou seja, difusão ou ampla difusão (broadcasting, em inglês) através de ondas de
rádio. Não é à toa que usamos esse nome: ele indica principalmente o meio pelo qual ele é
transmitido. Ou seja, o meio indica a mídia.
Já o podcast é uma mídia transmitida via podcasting e o podcasting é uma forma de
transmissão de mídia via feedRSS (Real Symple Syndication). Um feed é uma tecnologia de
sindicalização de conteúdo, uma página com codificação simplificada em linguagem XML
(eXtended Markup Language, ou linguagem de marcação estendida) que permite a inclusão de
tags e metadados lidos e interpretados por programas agregadores, bastante utilizada para
facilitar a atualização de conteúdo e o aviso de atualização novo de conteúdo on-line. Esse feed
é então assinado pelo usuário em um programa agregador que recebe automaticamente as
atualizações. Podcast, além do nome dado à mídia, também é o nome dado ao coletivo dessas
mídias. No Brasil, segundo a Podpesquisa 20091 o formato de mídia mais comum para podcasts
é o áudio, especificamente em MP3. Mas, o que tudo isso quer dizer?
Precisamos compreender que a base do podcast está na tecnologia do feed. As principais
características e potencialidades dessa mídia acabam se relacionando à tecnologia que permite
sua transmissão. Uma dessas características é sua atemporalidade, ou seja, um mesmo
programa em formato de MP3 distribuído via podcasting continua disponível para acesso
enquanto o feed e o arquivo estiverem hospedados na internet, como é o caso do Digital Minds,
primeiro podcast publicado no Brasil com arquivos MP3 ainda disponíveis através de seu feed2.
Além disso, como o usuário baixa e salva o programa, ele pode ouvir quando quiser e quantas
vezes quiser, e não é limitado a horários ou programações de terceiros ou dos produtores.
Além da atemporalidade, outra característica do podcast relativa ao feed é a sua
disponibilidade. Segundo Vanassi, um podcast precisa estar disponível publicamente na internet
e acessível com facilidade, pois isso permite que o ouvinte possa acessá-lo, baixá-lo e ouvi-lo
quando quiser (VANASSI, 2007). Em outras palavras, essencialmente, para que isso funcione,
basta que o feed e o arquivo de mídia estejam disponíveis.
O feed disponível sempre faz com que ele seja uma base de informações confiável relativa à
mídia publicada via podcasting. Uma vez assinado o feed no agregador ou em um leitor de feeds
– também conhecido como podcatcher –, as informações podem ser acessíveis tanto on-line, no
endereço do feed, quanto off-line, no programa agregador que foi atualizado enquanto estava
conectado. Por ser um arquivo leve, essas informações não sobrecarregam o programa ou o
sistema de busca ou armazenamento.
Como a maioria dos podcasts são conhecidos por serem programas com episódios periódicos,
a melhor forma de manter uma organização dos que já foram lançados é através do feed. No
Brasil, pode-se dizer que a maioria dos podcasts lançados possuem blogs ou sites com
postagens sobre os episódios, com links, imagens e informações extras relativas à mídia
apresentada ou ainda com textos sobre outros assuntos. Atualmente, muitos utilizam fanpages
no Facebook para o mesmo fim.
Já nos Estados Unidos e em alguns países da Europa, vários podcasts não possuem blogs ou
sites e estão presentes somente em diretórios de podcasts, como o do iTunes o da Apple, ou
ainda como endereços de feed disponíveis em sites específicos ou genéricos. Mesmo assim, o
que aproxima o podcast com blog ou site daquele sem esses recursos é o feed.
Por ter várias informações e tags como data, autor, título e palavras-chave, o feed pode ser
utilizado como sistema de organização do programa. São informações lançadas de forma
simples, sem configuração de visualização, permitindo arquivos pequenos com informações
essenciais. Essas informações podem ser acessadas a qualquer momento e ajudam a organizar e
localizar os arquivos.
É claro que os arquivos XML do feed em si não são capazes dessa organização, mas eles
possuem versatilidade tal que um outro programa ou sistema pode realizar a busca ou
organização. O feed é utilizado como uma base de dados organizada pelo agregador. Se esse
feed é inserido depois em um blog que utiliza o sistema de gerenciamento de conteúdo (CMS ou
content manegement system) do Wordpress, por exemplo, o sistema de busca do blog, além de
organizar e separar os arquivos de mídia por autor, data ou categoria, pode separar e encontrar
esses arquivos por palavras-chave. Qualquer agregador que leia detalhadamente o XML do feed
do podcast pode fazer o mesmo.
Desde o surgimento do podcast em 2004 (SILVA, 2008), existem várias formas disponíveis
aos produtores de podcast, conhecidos como podcasters, para criar e distribuir os feeds. A
forma mais simples é a criação manual do arquivo XML, com inserção manual das tags em um
editor de textos e atualizado diretamente no site via FTP3.
Talvez a forma mais utilizada seja a criação automática do feed utilizando o sistema do blog
ou site do podcast. No Wordpress existem plug-ins que fazem isso automaticamente, como o
Podpress ou o Blubrry Powerpress. Além de disponibilizarem um player na página do blog,
permitindo que o ouvinte acesse o arquivo diretamente no site, os plug-ins atualizam
automaticamente o XML do feed com as informações do podcast e da postagem do blog,
permitindo assim que os programas agregadores recebam tais atualizações automaticamente.
Além dessas formas, existem programas e sistemas on-line gratuitos que criam o feeds para
podcasts, como o Huffduffer. Ele reconhece o endereço do arquivo de mídia disponível on-line e
acrescenta as informações adicionais, criando um feed que pode ser assinado por qualquer
pessoa.
É o feed que diferencia o podcasting das transmissões tradicionais via broadcasting ou até
mesmo de outras transmissões via internet. A ampla difusão do broadcasting irradia os
programas de rádio ou televisão para qualquer ouvinte que possua um aparelho receptor, em
um sistema conhecido como push, do inglês para empurrar (PRIMO, 2005). Em outras palavras,
nesse sistema a informação é empurrada para o ouvinte, que o recebe de forma passiva.
Na internet, o usuário precisa ir até o arquivo e escolher baixar ou reproduzi-lo, em um
sistema chamado de pull, do inglês puxar (PRIMO, 2005). Isso faz com que exista o trabalho de
a pessoa apanhar a informação que deseja ouvir. Essa forma é bastante comum em streamings,
como o YouTube, ou ainda em sites de download de mídia como o RapidShare ou 4Shared.
Com os podcasts e a utilização de feeds, a mídia é baixada automaticamente para o
computador ou aparelho do usuário pelo agregador, sem necessidade de pull direto ou push
involuntário. É quase como se o usuário escolhesse receber automaticamente a mídia, em um
misto de pull e push. E isso só é possível pelo uso do feed, pois o usuário precisa escolher qual
programa baixar para assinar seu feed, mas o download do programa é automático. Porém,
ainda reconhece-se o podcast como um sistema de pull, pois, por mais que o arquivo seja
baixado automaticamente, o assinante pode escolher como e quando acessa seu conteúdo e a
assinatura ainda é ativa na busca por conteúdo.
Uma última coisa notável sobre os feeds relacionados aos podcasts é a possibilidade de
assinar um podcast e baixar programas antigos presentes nesse feed e ouvi-los. Isso permite
que um programa seja “eterno, enquanto dure” na internet, pois as informações contidas nesse
feed podem ser acessadas muito tempo depois de lançados.
Analisando o processo do podcasting, é possível apontar algumas características que
demonstram vantagens do Podcast sobre outras formas de mídia. Citamos aqui a liberdade por
parte do ouvinte:
[…] a grande inovação que o Podcasting propõe: o “poder de emissão” na mão do ouvinte.
Com isso, não existe mais uma produção de conteúdo centralizado nas mãos de uma mídia.
Cada usuário produz seu conteúdo descentralizadamente, disponibilizando-o na rede da melhor
maneira que lhe convier (MEDEIROS, 2005).
Isso aponta para a questão central sobre o podcast: o ouvinte não é mais “refém” da
imposição das mídias tradicionais. Diferentemente da radiodifusão, chamada também de
broadcasting, onde o ouvinte recebe passivamente as informações de áudio passadas através de
ondas eletromagnéticas por uma central de distribuição e é recebida por um aparelho de rádio
somente nos locais e momentos disponibilizados pela central de distribuição, o podcast é
disponível a qualquer momento e a qualquer pessoa que ativamente buscar esses arquivos na
internet.
Esse exercício de liberdade que o podcast oferece é uma boa forma de mostrar ao usuário o
poder de suas ações e decisões. Ouvir um podcast não é como ouvir uma rádio: “o que será que
está passando?”, mas é mais uma ferramenta criativa: “vou ouvir o que eu quero” (FRANCO,
2009) e quando quero.
Atualmente existe uma produção grande de programas de rádio via internet, as chamadas
web-rádios, que funcionam seguindo o modelo de radiodifusão, mas utilizando a internet como
canal ou meio. Na prática, o que diferencia as web-rádios das rádios tradicionais é somente o
canal ou meio de transmissão. Mas o podcast difere dessa forma de mídia não só pelo canal
(que é o mesmo das web-rádios) mas principalmente pela participação do ouvinte, que é ativo
na hora de escolher e ouvir quando e como ele preferir – muitas vezes sem estar conectado à
internet, algo imprescindível para se ouvir uma web-rádio.
As transmissões de rádio dependem de horário e local. A radiodifusão tradicional depende de
uma programação que segue um horário predefinido, acessível somente em locais onde as
ondas eletromagnéticas são alcançadas, enquanto o streaming da web-rádio depende da mesma
programação com horários certos e é acessível somente a pessoas com acesso à internet com
capacidade de transmissão alta naquele momento. Dessa forma, o podcast se coloca – através
do feed – já diferente do rádio, principalmente pela experiência de como se ouve aquela mídia.

OS PODOUVINTES NO BRASIL E NOS EUA E O USO DO FEED


Apesar da mídia apresentar todas essas características, o usuário ainda não utiliza todo seu
potencial. No Brasil, em 2008, foi feita a PodPesquisa, ocorrendo também em 2009 (LUIZ e
ASSIS, 2009). Essa pesquisa pretendeu recolher informações sobre o perfil dos ouvintes de
podcast no Brasil, aqui chamados de podouvintes.
Nos Estados Unidos, há uma pesquisa semelhante, porém feita não somente com
podouvintes mas com a população em geral, para obter informações sobre a abrangência dessa
mídia naquele país. A pesquisa foi realizada pelo Edison Research e se chama The Podcast
Consumer (WEBSTER, 2009).
O foco de ambas as pesquisas é diferente, mas mostram informações relevantes para
compreendermos o comportamento de podouvintes. A PodPesquisa 2009 fez um levantamento
com 2.847 podouvintes no Brasil, recolhendo informações relevantes sobre como pessoas que
conhecem essa mídia a utilizam. Já o The Podcast Consumer fez uma pesquisa abrangente com
1.858 telefonemas feitos em uma amostra randômica em todo o território dos Estados Unidos,
com pessoas com mais de 12 anos de idade. A edição de 2009 foi a quarta edição realizada da
pesquisa.
Segundo Webster (2009), o conhecimento sobre podcasts cresceu de 37% para 43% da
população entre o ano de 2008 e 2009. Ao mesmo tempo, 25% dos americanos responderam já
ter baixado ou ouvido um podcast. Esses dados não são oferecidos pela Podpesquisa, pois ela
não foi feita com a população geral, mas somente com podouvintes que diretamente
responderam à pesquisa no site.
Outro dado levantado por Webster que não está presente na PodPesquisa 2009 é a principal
razão para o consumo de podcast. Segundo os dados levantados, o motivo mais forte é a
habilidade de poder ouvir podcast quando ele quiser, com 35% das respostas. Os realizadores
da pesquisa mostram que o fato tem muito a ver com a razão de a maioria das pessoas ouvirem
podcasts no computador (68% das respostas).
É interessante também perceber a definição que a pesquisa dá para podcast:
Podcasting é o conceito de baixar várias formas de programa de áudio/vídeo na forma de
arquivos digitais que podem ser ouvidos a qualquer momento. Podcasting não se refere ao ato
de baixar músicas individuais. Podcasting se refere ao ato de baixar arquivos de áudio/vídeo on-
line na forma de programas (como talkshows ou um programa musical com apresentador),
geralmente como um download automático que pode ser ouvido segundo a conveniência do
usuário (WEBSTER, 2009, p. 9).
Podemos perceber nessa definição a presença indireta do uso do feedRSS, através da
menção da automação do download. Esse download automático é feito através de um programa
agregador de podcast que assina um feedRSS. Essa definição, porém, não é amplamente
divulgada em textos brasileiros sobre podcast. Por exemplo, Gustavo Guanabara4, podcaster e
autor de um dos maiores blogs de tecnologia brasileiros, associa o podcast a um programa de
rádio que pode ser ouvido via internet, baseando-se em definição encontrada na Wikipédia
brasileira.
A PodPesquisa 2009 corrobora parte dessa visão mostrando que 60,8% dos ouvintes baixam
a maioria de seus podcasts direto dos respectivos sites e não utilizam um agregador. Porém,
57,6% dos ouvintes utiliza algum agregador para alguns podcasts. Ou seja, há um certo
conhecimento sobre a tecnologia do feedRSS, por mais que ela não seja amplamente divulgada.
Outra questão é que em geral os ouvintes preferem consumir os podcasts direto do
computador ou não utilizam tanto a tecnologia de feedRSS para tal. Em outras palavras, por
mais que o podcast tenha sido desenvolvido para ser uma mídia recebida automaticamente via
feedRSS para ser ouvida em um player portátil como o iPod, os consumidores dessa mídia a
estão utilizando de outra forma, seja por não baixar via feed ou por não ouvir em um player
portátil. Porém, é interessante notar essa relação criada com os suportes do podcast, pois esses
usos acabam criando novas possibilidades de interação:
Os novos dispositivos da comunicação não se limitam a desempenhar as funções de
instrumentos inertes da comunicação dos projectos, ideias ou sentimentos que animam os
indivíduos: tendem ainda (e sobretudo) a funcionar de maneira quase instintiva, dando origem a
regularidades automáticas que se sobrepõem, de forma cada vez mais naturalizada, à
experiência comunicacional tradicional. Constituem-se, assim, em novas modalidades de
experiência do mundo (FERREIRA, 2004, p. 210).
Ouvir o MP3 no computador ou no iPod enquanto caminha na rua além de formas de
consumir o podcast, são novas formas de se relacionar com o mundo. Pode ser que o trabalho
no computador se modifique com o podcast ou ainda, existe a possibilidade de ouvir novos
conteúdos nas interações do sujeito com o mundo, carregando o podcast no iPod ou em
qualquer outro dispositivo portátil, como os smartphones.

PODCAST, RÁDIO E TECNOLOGIAS


O rádio é uma experiência auditiva que exige uma determinada tecnologia. Sem ela, o som
continua sendo experimentado de sua maneira natural, dependente do tempo, do espaço e do
corpo. A tecnologia de transmissão radiofônica permite a ruptura espacial e corporal. A
experiência natural é modificada pela tecnologia.
O rádio proporcionou a primeira experiência maciça de implosão eletrônica, a reversão da
direção e do sentido da civilização ocidental letrada. Para os povos tribais, para aqueles cuja
existência social constitui uma extensão da vida familiar, o rádio continuará a ser uma
experiência violenta. As sociedade altamente letradas, que há muito subordinam a vida familiar
à ênfase individualista nos negócios e na política, têm conseguido absorver e neutralizar a
implosão do rádio sem revolução. Mas o mesmo não acontece com as comunidades que ainda
não possuem senão uma breve e superficial experiência da cultura letrada. Para estes, o rádio é
absolutamente explosivo (McLUHAN, 2005, p. 145).
A aceitação do meio necessita da aceitação da tecnologia. Não adianta querer mostrar o
rádio para alguém que não conhece a tecnologia. As referências ao que se conhece tornam-se
inevitáveis. Se ouvimos música e conhecemos música vinda de instrumentos e músicos e se
ouvimos vozes e a conhecemos de pessoas, o rádio nos mostrará que existem pessoas e
instrumentos dentro dessa caixinha mágica.
Pensar na forma como essa tecnologia foi absorvida e utilizada por uma cultura é perceber
as modificações que a tecnologia ofereceu. O rádio apresentou para a população tais mudanças.
O que antes dependida da distância, agora não mais. O que antes era íntimo e pessoal, agora,
tornou-se popular e amplo.
A história do rádio é instrutiva como indicadora das distorções e da cegueira que uma
tecnologia pré-existente produz numa sociedade. A palavra “sem fio” ainda é empregada para
designar o rádio na Grã-Bretanha, o que dá prova da mesma atitude negativa em relação a uma
nova forma de presente na expressão “carruagem sem cavalo”. O sem-fio inicial era considerado
como uma forma de telégrafo e não se estabelecia sequer sua relação com o telefone. Em 1916,
David Sarnoff, então empregado da American Marconi Company, enviou um memorando à
diretoria defendendo a idéia da produção de caixas de música para o lar. Foi totalmente
ignorado. Naquele mesmo ano, deu-se a rebelião na Páscoa Irlandesa e a primeira emissão de
rádio. Até então o sem-fio fora utilizado pelos barcos, como “telégrafo” mar-terra. Os rebeldes
irlandeses utilizaram o sem-fio de um barco, não para uma mensagem em código, mas para uma
emissão radiofônica, na esperança de que algum barco captasse e transmitisse a sua estória a
imprensa americana. E foi o que se deu. A radiofonia já existia há vários anos, sem que
despertasse qualquer interesse comercial. Foram os radioamadores e seus fãs que conseguiram
as primeiras providências práticas nesse sentido (McLUHAN, 2005, p. 149-150).
É interessante notar como o uso da tecnologia ajudou a moldar a mídia. O rádio comercial
surgiu do uso amador. Tanto é que o rádio em si é uma tecnologia de mão dupla: pode tanto
enviar quanto receber. Mas comercialmente ele só tinha valor como forma de enviar
informações, não de recebê-las. O rádio amador envia e recebe. O rádio comercial apenas envia.
A própria mídia também se modifica pelo seu uso.
McLuhan viu o rádio como uma nova mídia que provocava efeitos transformadores na
sociedade. Ele então propôs o que chamou de “Leis da Mídia”, que descreve os efeitos da nova
mídia.
Cruzando sua reflexão sobre mídia com as quatro causas da ação humana [de Aristóteles],
McLuhan (1988) concluiu que uma nova mídia provoca os efeitos de destacar, obsolescer,
resgatar e reverter. Explicando melhor: uma invenção ressalta alguma característica ou
experiência humana de modo que tornará obsoleto algum modo de fazer as coisas; ao mesmo
tempo recupera um velho método ou experiência há muito abandonado e por último, tem um
efeito reverso ou oposto ao que se pretendia. Os efeitos seriam simultâneos e não sequenciais
(DEL BIANCO, 2005, p. 156).
O rádio apresentaria esses efeitos da nova mídia, segundo McLuhan. O texto Rádio: o tambor
tribal ofereceria elementos para essa compreensão. E é relevante observar como isso ocorre,
inclusive se para se pensar em novas mídias, como o podcast.
O que o rádio acentua ou intensifica? A cultura oral, a fala humana. O rádio está mais
próximo do tribalismo. O que o rádio torna obsoleto ou substitui? A cultura da escrita. O
impresso é a tecnologia do individualismo; o rádio é a tecnologia da tribo. O que o resgata e que
estava na obsolescência? O sentido da comunidade, a voz do quarteirão, o localismo, a magia
tribal antes soterrada na memória, o acesso ao mundo não visual, a comunicação íntima e
particular de pessoa a pessoa. Qual é o efeito reverso ou oposto ao que pretendia? De meio
criado originalmente para comunicação ponto a ponto, o rádio torna-se massivo, explosivo,
mobilizador, um meio “quente” e rápido para transmitir informação, notícia e realizar prestação
de serviços (DEL BIANCO, 2005, p. 157).
Possivelmente as mesmas perguntas feitas sobre rádio com relação as Leis da Mídia de
McLuhan também possam ser feitas ao podcast.
O que o podcast intensifica? A experiência auditiva e a recepção do ouvir, diferente da
experiência principalmente visual presente de forma massiva na internet.
O que o podcast torna obsoleto ou substitui? O rádio e a radiodifusão. A radiodifusão prende-
se a limites temporais e espaciais que o podcast não possui. Por mais que uma pessoa possa
estar longe de quem transmite para ouvir, ainda assim o rádio depende da potência de
transmissão. Por mais que possamos ouvir rádio na internet, a transmissão vai depender da
conexão à rede. O podcast por outro lado não se prende a nada disso.
O que o podcast resgata e estava na obsolescência? Os nichos e o diálogo íntimo. Isso é algo
que na realidade foi resgatado com os blogs e os textos na internet e a ideia da cauda longa,
mas no que se refere ao diálogo íntimo, os blogs e textos on-line não fazem isso. O podcast, por
precisar da intenção do podouvinte, faz com que o processo de ouvir seja mais íntimo. Não se
ouve um podcast “por acaso”, da mesma forma como se abre um site por acaso ou lê-se uma
postagem de blog de qualquer forma. O podcast é direcionado a um público, a um nicho e se o
podouvinte faz parte dele, ele percebe justamente essa relação.
A ideia de “cauda longa”, enunciado pela primeira vez em 2004 por Chris Anderson, “é a de
que os mercados de massa, uma manifestação da economia industrial que começou a se
consolidar a partir da metade do século XIX, dependem da produção de modelos que serão
reproduzidos em larga escala para gerar lucro” (COUTINHO, 2009). Uma vez que os principais
produtos são centrados para um público grande, necessários para gerar lucro, resta sempre um
público menor que costuma abraçar produtos menores: são os nichos de consumo. Como a
internet possibilita uma redução de custos de produção, podem-se criar produtos e serviço para
os nichos e é justamente isso que o podcast faz.
Qual é o efeito reverso ou oposto do que se pretendia? O podcast funciona através da
transmissão ponto a ponto do feed. Porém, o que se percebe é que a maioria dos podouvintes –
ao menos os brasileiros e registrados pela PodPesquisa 2009 – preferem baixar o episódio
diretamente do blog ou site que anuncia o podcast. O podcast daria a liberdade do podouvinte
de fazer o que quiser, mas ele ainda se prende ao blog ou site. Inclusive, vários podcasters – por
terem suas rendas relacionadas à monetização do blog – preferem que seus ouvintes não
assinem o feed e visitem regularmente seus blogs para baixar o episódio da semana,
possibilitando assim a monetização do blog ou site.
A aceitação do podcast depende da aceitação da tecnologia. O podcast ainda é muito
comparado ao rádio, como talvez o rádio fora comparado ao teatro ou à literatura na época de
seu nascimento. Notícias são transmitidas pelo rádio da mesma forma que são no meio
impresso. Dramas são produzidos nele da mesma forma como no teatro. O podcast sofre dessa
mesma comparação, pois o que se faz no podcast também se faz no rádio.
Mas a diferença não está no conteúdo, e sim na tecnologia de transmissão. As pessoas que
descobriam o rádio pela primeira vez podiam associá-lo ao “tambor tribal”, à forma mais
próxima de transmissão de informação cultural a distância, da mesma forma que o novo
podouvinte compara o podcast ao rádio. Mas o que muda é a tecnologia por trás disso tudo. O
rádio inaugurou a radiodifusão, a emissão radiofônica, o broadcasting sem fio. O podcast
inaugura e é inaugurado com o podcasting: uma transmissão de mídia, através da internet, que
utiliza a tecnologia do feedRSS para fazer transmissão ponto a ponto. Nada antes fazia isso
dessa forma, o que permite pensar em novas e diferentes possibilidades para a mídia.

O PODCASTING E O ÁUDIO
O podcast pode ser encarado como um áudio no seu formato mais simples. Consideramos
aqui somente os podcasts de áudio, ou audio podcasts, ou audiocasts para fins deste artigo. Isso
porque o podcasting nasce inicialmente na premissa de distribuição de arquivos de áudio pela
internet, por mais que a tecnologia hoje permita a transmissão de qualquer formato de mídia.
Como todo áudio, o podcast também rompe com as noções de tempo, espaço e corpo
próprios do som. O podcasting é um meio de transmissão que realiza isso. Todo arquivo
transmitido via podcasting é necessariamente diferente de seu emissor (seja esse arquivo de
áudio, vídeo ou qualquer outro formato), e existe uma ruptura temporal e espacial diante disso.
Transmite-se ponto a ponto, de um servidor para um computador remoto do usuário que
assina o feed. Apenas essa disposição já demonstra uma ruptura espacial, pois o arquivo a ser
baixado está em outro lugar, diferente do receptor. Além disso, há a ruptura temporal, pois os
arquivos baixados já estão prontos, realizados em um tempo necessariamente anterior à
transmissão e ouvidos necessariamente em outros tempos diferentes.
Por isso mesmo não se pode esperar sincronismo entre o evento real e o registro transmitido
via podcasting. Ele não deve servir a esse propósito. Ao contrário, por estar armazenado em um
servidor para ser baixado, o propósito principal deve ser a memória e o registro.
Isso possibilita algumas coisas tanto para o ouvinte quanto para o produtor. Diferente de um
programa de rádio que depende de horários e programações, um podcast não precisa ter essas
questões. Pode-se ter uma periodicidade, mas ela não é necessária. Até mesmo porque, com a
assinatura do feed, não há a necessidade de verificar se o programa já foi lançado no horário
programado, pois o agregador faz isso automaticamente assim que o programa for atualizado.
Essa é uma das grandes utilidades do feed. Inclusive, um dos programas de maior qualidade e
popularidade da podosfera brasileira é o Escriba Cafe, com uma periodicidade completamente
aleatória.
Além disso, em um programa de rádio, tudo tem que ser feito “ao vivo”, pois é dessa forma
que ele irá ao ar. Pode-se gravar anteriormente, mas a transmissão será realizada ao vivo. Se
acontecer algum problema nessa transmissão por queda de energia, falha no sistema ou algum
evento meteorológico aleatório, perde-se esse programa e, por consequência, a informação. Já o
programa transmitido via podcasting pode ser baixado a qualquer momento, contanto que ainda
esteja disponível no servidor. A experiência da novidade para o podouvinte é necessariamente
com o passado do podcaster.
O tempo não é mais uma questão para o podcasting. Pode-se baixar em um momento, ouvir
em outro, reouvir a qualquer hora, parar em um momento, voltar e ouvir desde o início ou pular
uma parte que não se queira ouvir. Por isso mesmo o podcaster ganha tempo e pode lançar
quantos episódios quiser na periodicidade que desejar.
O mesmo procede para o ouvinte. Ele não precisa daquele áudio naquele momento, no
horário programado pela emissora: ele pode baixar e ouvir a qualquer momento. Mas pode
surgir uma ansiedade quanto a isso, justamente quando isso não é percebido e se é trabalhado
da forma de rádio, com horários e dias certos para ir ao ar.
Um fenômeno percebido por muitos podcasters e podouvintes no Brasil é a atualização
frequente da página ou “F5”. Quando um podcaster acostuma seus podouvintes que haverá um
episódio novo periodicamente, esses costumam visitar com mais frequência o blog ou site do
podcast, bem como atualizar com mais frequência a página para poder realizar o download
assim que o episódio for lançado, mostrando uma certa ansiedade por parte do podouvinte de
querer a atualização do programa em um momento determinado, como se estivesse ouvindo ao
rádio. Essa é uma característica relacionada ao efeito reverso esperado pelo podcasting,
associado às “Leis da Mídia” de McLuhan. Mas essa ansiedade só acontece por não se conhecer
a potencialidade do podcast e tratá-lo ainda como se fosse rádio ou uma mídia de tempo real.
Talvez parte disso se deva à forma como os podcasters tratam a mídia. Um dos interesses é a
monetização do podcast ou a possibilidade de ganhar algum dinheiro produzindo seus podcasts.
Vários podcasters possuem midia kits5 indicando o valor de publicidade em seus programas. E
inclusive apontam algumas vantagens para tal.
As vantagens que apontam são relativas às próprias características do podcasting, como a
atemporalidade – a publicidade veiculada na mídia permanecerá nesse arquivo enquanto o
podcast existir, ou seja, paga-se uma vez para que todas as pessoas que acessem esse programa
hoje ou em qualquer momento do futuro tenha acesso – ou o nicho específico – se o produto a
ser veiculado tem maior sucesso em um determinado grupo, a propaganda em podcast é mais
focada e com mais chances de resultado positivo – além do fato de que podouvintes, segundo
pesquisas, possuem em média renda mais alta, maior nível de escolaridade e estão mais
dispostos a gastar e a confiar em anúncios de podcasts.
Isso traz alguns problemas, pois, como a fórmula de publicidade até agora trabalhada com
áudio é a do rádio, muitos podcasters acabam tratando o seu podcast da mesma forma que os
radialistas tratam seus programas de rádio. Exige-se periodicidade, cobra-se a participação da
audiência por meio de downloads e acessos e, inclusive, associa-se o podcast ao blog, pedindo
ao podouvinte que comente no blog e deixe sua opinião sobre o episódio. A monetização dos
blogs e sites já é algo real e inclusive é fonte de renda única para muita gente6. A associação
com o blog faz com que o feed, ferramenta não monetizada (mas não quer dizer que ela não seja
monetizável), seja menosprezada a favor da visita constante ao blog. Modifica-se assim a
potencialidade da mídia a favor de outros interesses associados.
Assim, muitas vezes, um podcast pode ficar datado, ou seja, perde-se a relevância do tema
justamente por tentar associar o podcast a alguma publicidade ou evento que possa render
retorno financeiro imediato. Depois de um tempo, caso essa publicidade não seja bem
trabalhada, ela perde a relevância.
Tudo isso faz com que o podcasting não seja tão bem trabalhado ou valorizado. Outro motivo
são os comentários e informações extras presentes no blog. Por mais que o podouvinte assine
seu podcast e receba o áudio via podcasting, enquanto escuta o episódio, ouve comentários
sobre sites, imagens e outras referências que estão no post do blog. Além disso, se ele quiser
comentar algo de forma rápida, ao invés de mandar um e-mail, ele dirige-se até o blog e
comenta em parte reservada para comentários desse episódio. Assim, acaba criando também
visibilidade para si e para o podcast que, com mais comentários, tem maiores chances de ser
encontrado por novos e potenciais podouvintes e patrocinadores.
Isso acaba mostrando a forma como o podcast é tratado principalmente no Brasil. Nos
Estados Unidos, usa-se muito o feed e a forma de contato principal é por e-mail ou por
comentários nos diretórios de podcasts, como no iTunes. Muitos podcasts apenas apresentam
seu feed em diretórios como o iTunes e não possuem sites ou blogs e quando possuem, não
constroem seus sites para valorizar os comentários ou a monetização dos mesmos.
Possivelmente isso demonstre as diferenças presentes nas duas pesquisas analisadas para
definir o perfil do usuário de podcast, a PodPesquisa 2009 e o Podcast Consumers Research,
discutidas anteriormente.
O mais interessante é perceber como o podcast em geral, independente de ser em áudio ou
vídeo ou qualquer outro formato, acaba por se construir sobre as características do áudio. Os
videocasts dariam um outro tema de discussão, principalmente porque a maioria dos ditos
videocasts não são transmitidos via podcasting – ou seja, não são video podcasts –, mas sim via
streaming em sites como o YouTube ou Vimeo. Mas aqueles transmitidos via podcasting também
entram nas características de ruptura de tempo, espaço e corpo do áudio do podcast.

CARACTERÍSTICA PRÓPRIA: O PODCASTING


Não existe outra forma de transmissão ou transferência de conteúdo que funcione como o
podcasting. É possível comparar o podcast com o download, mas download por download, isso
pode ser qualquer coisa. Até mesmo processos de streaming são feitos por download, pois
recebe-se e armazena-se – por mais que por pouco tempo – a informação que passa “em tempo
real” via streaming. Inclusive é desta forma que funcionam os programas que capturam
streaming: eles convertem e copiam os dados já baixados para o computador.
Toda informação lida ou percebida on-line é baixada. Com o podcasting não é diferente,
então o download não caracteriza o podcast. Talvez o fato dele ser ponto a ponto, do servidor
para a máquina remota. O feedRSS faz a ligação através do agregador. Mas isso permite
pensarmos em programas P2P ou Peer to Peer, “pessoa a pessoa”, que liga uma máquina a
outra e permite o download de qualquer mídia (PASSAMANI, 2009). Existem tecnologias
diferenciadas, como o Torrent, que modificam e diluem os pontos de download, deixando de ser
ponto a ponto.
Mas o que diferencia o podcast não é o ponto a ponto, e sim o feedRSS e o uso do agregador.
O podcaster libera o arquivo a ser transferido em seu servidor e coloca o link para download no
feedRSS. O agregador do podouvinte reconhece a atualização do feed e faz automaticamente o
download do podcast, sem a necessidade de interferência direta para baixar ou deixar de baixar.
Se o podouvinte já assina o feed do podcast é porque ele quer receber futuras atualizações
desse programa.
E o feed carrega outras questões próprias que as diferentes formas de download não têm.
Por exemplo, no feed é possível colocar tags com informações próprias para cada arquivo,
criando uma base de dados que ajudam na organização automática dos arquivos baixados. Além
disso, o feed pode armazenar todos os episódios anteriores para que qualquer futuro usuário
possa baixar e ouvir em qualquer momento. Também, na máquina do assinante do feed, os
downloads podem ser organizados da forma como quiser, segundo as informações do feed.
A principal crítica é a falta de monetização do feed, mas essa crítica que não é fundamentada
e só pode ter valor se for pensada no que as agências de publicidade brasileiras fazem de suas
práticas on-line. Uma simples procura sobre monetização de podcast no Google revela alguns
blogs com postagens significativas. Um deles, o site Digital Podcast7, que lista várias formas de
ganhar dinheiro com podcast. Vender o conteúdo do episódio, doações de ouvintes, spots
publicitários de áudio dentro do podcast, patrocinadores financiando o podcast, publicidade no
site ou blog e usar o podcast para direcionar o tráfego, vender seus próprios produtos, vender
serviços profissionais através do podcast ou ter um serviço de vendas afiliadas que paguem
comissão por vendas direcionadas de seus links. A maioria dessas dicas requer mais um
investimento no feed e em formatos de qualidade de áudio do que valorizar o blog ou site.
Outras possibilidades incluem vender assinaturas de feed premium, assináveis mediante
mensalidade ou pagamento único ou a disponibilização de spots de áudio como arquivos
independentes no feed gratuito, permitindo assim ao podcaster vender o espaço do seu feed
para eventuais interessados.
A todo momento nasce uma nova tecnologia e uma nova forma de ganhar dinheiro com ela. O
podcast, como observamos, é uma delas. Basta ter criatividade e saber valorizar o feed.
Podcasters que monetizam o blog e somente usam o podcast para direcionar tráfego perdem
possibilidades de monetizar o podcast e o feed. O podcast se justifica pelo podcasting que, por
sua vez, se justifica pelo podcast. Não é necessário pensar nos sistemas do rádio nem do blog
para que essa mídia seja valorizada.
Existem outras imagens que talvez se assemelhem mais ao podcast que não seja a do rádio.
Se a característica principal do podcast é o feed e a transmissão via podcasting, o sistema de
assinatura de uma revista, por exemplo, acaba sendo mais próximo do que o rádio. Ninguém
assina o rádio e não se recebe o rádio para ouvi-lo a qualquer momento. Mas assina-se uma
revista ou jornal e recebe-se periodicamente para aí sim lê-los a qualquer momento. Dizer que é
como uma revista em áudio que se assina para receber periodicamente em seu computador é a
narrativa que se compara melhor à realidade do podcast.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tanto o podcaster quanto o podouvinte transcendem a dimensão temporal ao se
relacionarem com o podcast. E ainda podem transcender as limitações espaciais naturais das
relações com mídias como o rádio e a própria internet. Não só é possível podouvintes de
qualquer lugar ouvirem em qualquer lugar, como também que seus participantes sejam de
diferentes lugares. A edição permite remover eventuais falhas na gravação e torna a audição
mais agradável, criando uma sensação de intimidade, como se os participantes estivessem
juntos ao ouvinte.
Essa liberdade temporal e espacial do podcaster e do podouvinte permitem ao podcast várias
possibilidades. Ao mesmo tempo, é necessário perceber que essas possibilidades só serão
amplamente desenvolvidas se o que torna o podcast único for também valorizado: o feed. Ele é
o esqueleto do podcast que raramente aparece, mas, sem ele, o podcast perde sua estrutura.
É pertinente observar que, por mais que o feed não seja valorizado ou citado ou ainda que o
sistema do podcasting não seja mensionado, é essa estrutura que permite as relações do
podouvinte com o podcast. É uma estrutura invisível e nenhum ouvinte precisa conhecer de
codificação XML para poder utilizá-lo e uma vez assinado, ele pode ser esquecido. O feed
oferece a base para pensarmos o podcasting e, sem ele, teríamos somente arquivos de MP3
disponíveis para download, sem as possibilidades da automatização que foram o principal
incentivo para a criação desta mídia e as possibilidades de integração com a base de dados do
feed que surgiu como consequência.
O que diferencia o download de arquivos MP3 em blogs de um podcast com feed não é só o
uso do agregador, mas o poder que o podouvinte tem em gerenciar e organizar seus downloads
com facilidade e criar sua maneira de ouvir os programas da forma que desejar. Além disso, o
feed é mais do que uma base de dados organizadora, pois fideliza os ouvintes àqueles
podcasters que não se prendem a periodicidade de publicação. Com isso, garantem seus
ouvintes ao mesmo tempo que esses podouvintes têm garantido escutar esses programas
quando lançados pela atualização automática do agregador. O feed é o caminho de fidelização
do podouvinte e pode ser o caminho para a expansão da própria mídia.
Dessa maneira, a relação passa a ser outra. Não existe necessidade de mediação do site para
o podcast. Enquanto o site mediar a relação do podouvinte com o podcast, o foco é o site
enquanto agente ou ainda como produto principal e o podcast se torna um coadjuvante. Mas se
a relação do podouvinte ocorre diretamente com o podcast – através do feed –, o site passa a ser
um complemento à experiência. Se queremos valorizar a mídia podcast, precisamos reconhecer
que é o feed que a valoriza e passar a explorar seus potenciais sem precisar recair a modelos de
outras mídias.

REFERÊNCIAS
COUTINHO, M. Cauda longa. In: SPYER, J. Para Entender a Internet - noções, práticas e desafios da
comunicação em rede. [S.l.]: eBook, 2009.
DEL BIANCO, N. O tambor tribal de McLuhan. In: MEDITSCH, E. Teorias do Rádio: textos e contextos Vol.
1. Florianópolis: Insular, 2005.
FERREIRA, G. B. Novos media, experiência e identidade. In: SANTOS, J. M.; CORREIA, J. C. Teorias da
Comunicação. Covilhã: Universidade da Beira Interior, 2004.
FRANCO, D. Podcast. In: SPYER, J. Para Entender a Internet: Noções, práticas e desafios da comunicação
em rede. [S.l.]: eBook, 2009. Disponível em: <http://paraentenderainternet.blogspot.com/>.
LUIZ, L.; ASSIS, P. O crescimento do podcast: origem e desenvolvimento de uma mídia da cibercultura. 3º
Simpósio Nacional de Pesquisadores em Cibercultura, São Paulo, 2009.
McLUHAN, M. Rádio: o tambor tribal. In: MEDITSCH, E. Teorias do Rádio: textos e contextos Vol. 1.
Florianópolis: Insular, 2005.
MEDEIROS, M. S. D. Podcasting: produção descentralizada de conteúdo sonoro. CONGRESSO BRASILEIRO
DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO. São Paulo: Intercom. 2005. CD-ROM.
PASSAMANI, A. Peer-to-Peer (P2P). In: SPYER, J. Para Entender a Internet: Noções, práticas e desafios da
comunicação em rede. [S.l.]: eBook, 2009.
PRIMO, A. Para além da emissão sonora: as interações no podcasting. Intexto, Porto Alegre, 13, 2005.
SILVA, E. Vídeo da apresentação do Prêmio Podcast 2008. Blog do Prêmio Podcast, 2008. Disponível em:
<http://www.blog.premiopodcast.com.br/?p=75>. Acesso em: 5 dez. 2009.
VANASSI, G. Podcasting como processo midiático interativo. Universidade de Caxias do Sul. Caxias do
Sul. 2007. Monografia.
WEBSTER, T. The Podcast Consumer 2009. Edison Research, 22 maio 2009. Disponível em:
<http://www.edisonresearch.com/home/archives/2009/05/the_podcast_consumer_2009.php>. Acesso em: 15
abril 2010.
WEBSTER, T. The podcast consumer revealed 2009. Edison Research, 22 maio 2009. Disponível em:
<http://www.edisonresearch.com/2009_Edison_ Podcast_Consumer_Revealed.pdf>. Acesso em: 15 abril 2010.

1 <http://www.podpesquisa.com.br/>

2 Endereço do feed: <http://www.digitalminds.com.br/podcasts/rss.xml> e do arquivo MP3 do primeiro


episódio lançado em 20 de outubro de 2004:
<http://www.digitalminds.com.br/podcasts/digitalmindspodcast1.mp3>.
3 “Fast Transfer Protocol” ou protocolo de transferência rápida, sistema de transmissão de dados diretos de

um computador remoto conectado à internet para um servidor programado para hospedar sites ou
informações on-line.
4 <http://www.guanabara.info/2007/11/podcast-o-que-e-isso/>.

5 Um exemplo de mídia kit pode ser encontrado no site do podcast Papo de Gordo:
<http://www.papodegordo.com.br/PdG_mediakit.pdf>.
6 O podcast Papo de Gordo entrevistou dois desses chamados pró-bloggers. Suas experiências de monetização

podem ser conferidas no episódio 64 – Gordos vs. Blogueiros de 30 de abril de 2011:


<http://www.papodegordo.com.br/2011/04/30/papo-de-gordo-64-gordos-vs-blogueirosbobagento-
anderssauro/>.
7 A postagem inteira pode ser encontrada em <http://www.digitalpodcast.com/podcastnews/2009/06/08/10-
great-ways-to-make-money-podcasting/>.
PARTE 2

REFLEXÕES PESSOAIS

Sergio Vieira
Christian Gurtner
Bia Kunze
Luciano Pires
Leo Lopes
Eduardo Sales Filho
2005 - O ano em que fiz contato
OU
O PODCASTING EM UMA ÉPOCA EM QUE NINGUÉM SABIA O QUE ERA ISSO E QUASE TUDO
TINHA QUE SER FEITO DE MODO ARTESANAL
Sergio Vieira

Era fim de 2004, outubro ou novembro, não sei ao certo, eu estava vasculhando as notícias
da web coletadas pelos meus “feeds” quando uma palavra desconhecida - PODCAST - ganhou
minha atenção.
Ela em si não fazia sentido algum, mas na “batida de olhos” as outras palavras (MP3, WAV,
CSS, FEED, RSS, XML), que o longo parágrafo continha, apesar de serem completamente
desconhecidas para a grande maioria da população - como até hoje - me deram uma pista sobre
o que seria aquele texto.
Acessei a íntegra do artigo e, no ato compreendi a ideia principal daquilo tudo: tratava-se de
um modo engenhoso de distribuição de arquivos de áudio por intermédio de um “feed”,
exatamente como aquele texto que eu coletava por uma assinatura RSS.
Lembro de ter pensado: “Uau! dá pra distribuir música, áudio-livros, programas de rádio…”.
No momento de descoberta, no devaneio, não vislumbrei um produto específico, pensei apenas
em “produtos” já existentes e em um “motor” de distribuição.
O podcasting, naquele momento inicial, parecia-me apenas um novo modo de distribuir
conteúdo já comercializado. Jamais imaginei que o podcasting se apropriaria de um formato
específico de produção e distribuição de conteúdo inédito, meio “indie”, específico de um nicho
e um tanto marginal, tanto em seus aspectos de produção de viés pessoal e solitário, como no
viés colaborativo e coletivo. Com os anos, o podcasting adquiriu um revestimento comercial na
agregação de conceitos de patrocínio em suas páginas web (tal qual os blogs), e de editorial
pago em seu áudio (como nas rádios).
Mesmo com a evolução do mercado de fornecedores de equipamentos (microfones, mesas,
placas de áudio), da evolução de aplicativos para a produção e distribuição, principalmente pela
WordPress e Apple, o podcasting está longe de ser reconhecido como mídia diferenciada, apesar
de seu vínculo com uma assinatura personalizada e exclusiva, ou seja, uma vontade explícita do
ouvinte de acessar aquele conteúdo específico.

ERA TUDO MUITO DIFERENTE… MAS MUITO IGUAL.


No início de 2005, eu já assinava alguns poucos “feeds” de podcasts ingleses e norte-
americanos, quase tudo sobre música e tecnologia um tanto distantes de minha realidade
paulistana. Certo dia esbarrei em um blog sobre o mundo Mac que citava os podcasts do Gui
Leite, o Digital Minds e mais alguns outros estrangeiros. Assinei todos.
A medida que os meses avançavam no 1º semestre de 2005, mais podcasts produzidos por
brasileiros e brasileiras pipocavam pela rede. Um dado interessante: quem mais divulgava a
existência destes novos podcasts eram os próprios podcasters! Como não havia um portal que
centralizasse os podcasts produzidos - como o iTunes ou Feedburner -, os “feeds” ficavam
perdidos na web. Assim, quem iniciava um podcast não tinha dúvida, entrava em contato com
quem já possuía um e solicitava a divulgação. A recíproca era verdadeira: todo novato indicava
e divulgava em sua página todos os podcasts que conhecia. Era o início de um processo de
“cross fertilization” que até hoje persiste.
Em meados de 2005, fascinado pela quantidade de possibilidades que o podcasting permitia,
já com uns trinta “feeds” nacionais no meu agregador - por sinal o único que existia (Juice) -,
notando que todos possuíam os mais variados formatos e durações, e que abordavam temas que
iam de tecnologia à música, de discussões sobre o comportamento humano às notícias da
semana, de comentários sobre o mundo pop ao simples entretenimento, tomei uma decisão: vou
produzir um podcast!
Durante os meses seguintes pesquisei e li tudo sobre o processo de produção, gravação,
formatos e edição de áudio, elaboração do “feed” (é isso mesmo, elaboração “na unha” do
arquivo xml, linha por linha, código por código, caractere por caractere), ferramentas de edição
de blog, CSS, serviços de hospedagem nacionais e internacionais gratuitos que suportassem o
volume de armazenagem e a banda necessários, estruturas e portais de divulgação
exclusivamente para podcasts, e claro, quais os modelos de produção e patrocínio estavam
dando certo.
Descobri que tudo era muito solitário, mas muito colaborativo e pouco rentável… na
realidade nada rentável, apenas despesas. Não havia um modelo - dentro do mercado brasileiro
- adequado para transformar o podcast numa fonte de renda mínima que fosse, mesmo sendo
uma excelente plataforma de distribuição de conteúdo seletivo.
No fim de 2005 publiquei o Podcast Impressões Digitais - edição 000, o qual apenas
apresentava a estrutura e a temática que eu iria seguir ao longo das próximas edições, ou seja,
minha “Carta de Intenções”. Curioso que nem havia publicado um podcast e tive que responder
a um comentário gratuito (um tanto agressivo na verdade) recebido na ocasião. No mesmo dia,
me justificando, escrevi o texto a seguir - o qual divulguei sem revisão alguma apenas em
Fevereiro de 2007, em um outro contexto (admito, fui covarde):

O QUE UM SENHOR DE QUASE 50 ANOS FAZ NESTE MUNDO DE


PODCASTERS?
(texto inédito originariamente escrito para outra finalidade em dez/2005)

Em primeiro lugar - dizendo em alto e bom MP3, AAC, WAV, AIFF ou qualquer outro formato
de áudio digital - me divertindo muito!
De cara, muitos irão questionar: “Você não tem mais o que fazer, não?” - E eu respondo:
“Tenho, ô se tenho... e muito!” Como profissional “dono do meu nariz” - quem me conhece
pessoalmente sabe sobre o quão difícil é esta tarefa, literalmente falando - pai de duas
universitárias e workaholic assumido, a simples tarefa de “ajeitar” algumas horas semanais
para tocar o projeto Impressões Digitais […] é pedir uma estafa rapidinho ou um belo ataque de
ansiedade durante a madrugada vendo os ponteiros do relógio avançando céleres, e tudo o que
você deseja finalizar parece estar ainda pela metade… “Segundamente” como diria Odorico
Paraguaçu (*) - velho é o Brasil com 500 anos!!! Eu sou clássico!
(*) quem não sabe quem é esse personagem de Dias Gomes, merece crer na honestidade
política de nossos preclaros deputados e, com certeza, é neto da Velhinha de Taubaté -
personagem recentemente “falecida” pelo seu autor, Luís Fernando Veríssimo.
Pois, se qualquer boçal fala o que quer “ao vivo e em cores” (Não! Não estou falando de
políticos - vejam os apresentadores de nossa TV aberta, em qualquer horário), por que um geek
dos anos 1970 não pode? Ok, aceito, sou um tanto quanto… ahn, digamos, anacrônico, vá lá.
Afinal colecionei tudo sobre os projetos Mercury, Venera, Lunakov e Apolo, estudei e projetei
circuitos valvulados com auxílio de régua de cálculo, conheço direitinho todos os LPs “da vaca”
e “das bolinhas” do Pink Floyd, e lembro perfeitamente: minha primeira experiência em
computação foi a aplicação prática de Lógica Booleana em circuítos “solid-state”, os quais
combinados atuavam em um computador didático - do tamanho de uma mesa para seis pessoas -
e que simulavam exatamente um exemplar da tecnologia de vanguarda (à época, gente): um
chipão de 4 bits, o 4044.
Uau! A “mesa” executava as quatro operações e apresentava os resultados em doze displays
de filamento de 3/4 de polegada (os LED estava a anos de distância ainda). Cara, saca isso! Uma
máquina eletrônica que - somente com uns ajustes mecânicos (é isso mesmo, mecânicos),
chamados programas - calculava, fazia contas na base 2 e apresentava os resultados na base
10! Fantástico!!
Tudo bem que ela não conseguia fazer um décimo do que eu tirava de minha régua de
cálculo, mas que era fascinante, ah… isso era.
Voltando ao assunto em pauta (não liguem não, pessoas com certa idade são assim mesmo,
tergiversam facinho, facinho, desandando a contar estórias e histórias…): Hoje, sendo apenas
um geek mais maduro, posso tecer alguns comentários de como vivencio e encaro este diletante
meio de comunicação (pelo menos para mim até agora): o podcast.
Como assíduo (ok, e antigo) ouvinte de rádio - principalmente dos programas opinativos e de
música selecionada - era esperada uma certa atração pelo ineditismo do modelo e das
possbilidades deste formato off-line, on-demand, unidirecional e armazenável que determina um
podcast. Apesar do paralelismo midiático entre o podcast e o PY (o pessoal mais jovem
desconhece que PY é sinônimo de rádio-amador, um bisavô da internet Wi-Fi), o aspecto mais
alentador desta febre podcasteira é, certamente, a reinvenção - com aporte de uma tecnologia
no estado-da-arte e extremamente barata - da CULTURA ORAL PESSOAL. Ou seja, estruturada
e diretamente - sem traduções e/ou deformações pela transmissão por terceiros - distribui-se,
simplesmente, cultura. Ideias e conceitos originadas por algo íntimo, pessoal, e por princípio,
filtradas pela consciência e pela moral do podcaster.
Incautos questionarão: “Qual a vantagem desta cultura oral pessoal?” Bem… alguém aí
lembra da brincadeira do “telefone sem fio”, onde uma frase muito simples era cochichada ao
pé do ouvido do vizinho de uma fila de pessoas e retransmitida até o último? Invariavelmente o
que chegava lá no fim da fila não guardava qualquer traço de semelhança com a frase original.
Não podemos perder de vista que a cultura humana em sua quase totalidade foi transmitida
oralmente, de modo bem similar à nossa brincadeira acima, diga-se de passagem. Somente no
fim do século XV Gutemberg começou a prensar suas Bíblias (certo, certo, anteriormente alguns
compiladores multiplicaram uns poucos textos aqui e acolá, mas pergaminho, pena de ganso e
tinta a base de ferro não possuem grande durabilidade). E, por favor, não venham tentar provar
que hoje em dia temos livros e publicações em profusão transmitindo cultura, quando nosso
autor mais vendido é o Paulo Coelho.
Esta informação pessoal, oral e empacotadinha (alguém lembra o que siginifica POD em
inglês?!) reaviva e impulsiona a tradição humana, fazendo o conjunto podcast+weblog
funcionar tal qual uma fogueira ancestral, onde nossos antepassados acocorados em semi-
círculo ouviam casos e lendas, cultivavam tradições, trocavam experiências e aprendiam.
Criançada, a revolução da Tecnologia da Informação apenas começou.
(Pronto! Agora pode tocar o tema de 2001 - Uma Odisseia no Espaço.)

Apesar de estar com 48 anos em 2005, eu sabia que poderia dar conta da lida à qual havia
me proposto. Produzir um podcast de cabo a rabo (como faço até hoje) permite algumas
liberalidades e possui algumas limitações, quando não armadilhas. É claro que minhas
experiências anteriores com produção de áudio e em programação de computadores me
ajudaram muito na adoção do modelo DIY - do it yourself -, tão em voga hoje no mundo da
biologia e nanotecnologia, porém não me ajudaram na descoberta de um modelo financeiro
autossustentável e adequado ao meu estilo de vida pessoal e profissional. Qualquer opção
disponível dentre as diversas formas de “monetização” do podcast iria exigir o
comprometimento de um tempo que eu não poderia dispor sob a pena de perder dinheiro. Dessa
forma, somando e subtraindo valores daqui e dali, cheguei à conclusão de que deveria encarar
diletantemente o podcasting como um hobby.
Eu sabia que seria um passatempo trabalhoso (e qual não o é?), tudo o que eu necessitava
para me convencer definitivamente era - além do prazer - um ou mais objetivos.
Desde o início o paralelismo do podcast com o blog era evidente (conteúdo inédito, web, RSS,
modelo financeiro…), e desta semelhança adotei aquilo que o blog possui como raiz: seu caráter
de registro digital e público de uma vida, de uma opinião pessoal (web-log), ou seja, um querido
diário (™ @rosana) público, um espaço controlado onde eu expressaria digitalmente minhas
impressões sobre “a vida, o universo e tudo mais”, quase um áudio-livro autobiográfico com
trilha sonora, um registro “vivo” do meu “modus pensanti”, dos meus valores e gostos estéticos.
Meus descendentes - sim - saberão como eu vivi, e receberão estas informações a viva-voz do
antepassado deles. Bacana, não é?!

EU HAVIA DESCOBERTO O OBJETIVO DO MEU PODCAST


Assim que comecei a alinhavar os primeiros roteiros, ainda na vã esperança de manter uma
constância semanal ou quinzenal nas publicações, precisei associar mais um objetivo, pois notei
que a diferença de idade entre mim e o público-base do podcast seria colossal e que só uma
linguagem mais próxima deste não bastaria.
Decidi que a discrepância de gerações, ao invés de ser uma dificuldade, faria parte do
processo de aproximação e divulgação. Decidi agir como um tutor, primeiramente mostrando a
todos que eu produzia o podcast absolutamente sozinho e com o menor custo possível (exemplo
é a melhor técnica de ensino e educação, além de provocar o lado competitivo - se ele pode por
que eu não posso?) e em segundo lugar colaborando intensamente com quem se dispusesse a
me ouvir.
Graças a alguns pioneiros - que viram no podcasting oportunidades únicas e que,
incontinenti, abriram espaços de armazenagem e distribuição gratuitos em troca de conteúdo e,
por conseguinte, acessos - diversos fóruns exclusivos foram criados e viveram momentos
enriquecedores, tanto nos quesitos técnicos como humanos, fomentando amizades profundas.
Joguei minhas fichas em um formato fechado de podcast, atemporal, sem referências com
edições anteriores (só saí desta linha em uma série que fiz, “A História das Estórias do Brasil”,
cuja produção me consumiu uma pesquisa imensa e 2 anos de trabalho). A contextualização
necessária de cada edição do meu podcast recai apenas sobre a citação da data de gravação, os
textos são reflexões sobre temas que me parecem importantes no momento, mas sem ligações
diretas com fatos do momento.
A duração da edição nunca foi uma preocupação, ela pode durar de 15 a 80 minutos,
realmente não me importo em controlar este aspecto. Lembro que, uma vez questionado sobre o
porquê da flutuação do tempo, respondi algo parecido com isto:
O podcasting possui características únicas, uma delas e o viés liberal, libertário e libertino. O
pacote de informações a ser entregue deve possuir o tempo necessário e suficiente para que a
mensagem seja diligentemente entregue “em letras garrafais e amigáveis”, de forma completa,
esmiuçada e inequívoca. Nem mais nem menos.

Se você ouvir a edição 000 do Impressões Digitais (ainda com uma péssima qualidade de
gravação, graças a uma falha do equipamento que eu dispunha e que perdurou por várias
edições), ouvirá a descrição da estrutura do podcast (quase) tal qual ele ainda hoje é produzido.

Podcast 000 - gravado em 17 de Dezembro de 2005 - publicado em 18 de Dezembro de 2005


no www.sergiovds.blogspot.com:

O podcast-beta (I Dig it 000) ‘tá “no forno”… Algumas coisas já estão prontas, faltam só
alguns ajustes (cortes, bg’s…) e 3ª ou 4ª o danado ‘tá no ar… E aí é começa o trabalho de
verdade: manter as edições do Impressões Digitais constantes… Ah! Já ia esquecendo… vou
manter este Web Log como um tipo de “make-off” do podcast, enquanto o
www.impressoes.vocepod.com será utilizado única e exclusivamente para o podcast em si.
Neste “beta” aconteceu de tudo um pouco… Por exemplo: antes de iniciar as gravações das
chamadas e vinhetas, pifou o microfone (tô louco atrás de um - aviso: a entrada do mike tem
que ser USB), e, como o prazo que me dei já estava “estourado”, desisti deste modelo de gravar
pedacinhos, pois o microfone interno do iMac possui um ruído de fundo de matar. Assim,
respirei fundo e gravei direto… Só sei que pra editar vai dar um trabalhão (toda hora eu
engasgava, batia na mesa, me embanando todo com a linha de pensamento). Fui interrompido
por latido de cachorro, campainha do interfone, filhas, telefone… e queima de fogos!!!! Mas,
apesar dos pesares, tá sendo muito divertido e elucidativo… O I Dig it 000 - que significa
(I)mpressões (Dig)itais (It)em 000, desculpem não resisti ao jogo de palavras - apresenta qual
será a estrutura básica dos podcasts subsequentes. Eu não vou explicar aqui como é… vão à
pagina ou agreguem o RSS para ouví-lo, oras! Eu não tive este trabalhão por nada né?!

I Dig it 000 - gravado em 17 de Dezembro de 2005 - publicado em 20 de Dezembro de 2005


no www.impressoes.vocepod.com:
“Agora sim! No ar!! O podcast-piloto explica o que vai ser o Impressões Digitais… Sejam
todos bem-vindos!”
(Transcrições da publicação pioneira.)

Obviamente aprimorei a estrutura do “I Dig” ao longo dos anos. Após algumas edições, por
precisar de mais tempo para produzir o conjunto proposto, provoquei um spin-off da estrutura
original ao retirar uma seção sobre Cultura e Artes (Homo Sapiens) e passei a publicá-la - no
mesmo “feed” - de forma independente com o nome de “Podcast Impressões Digitais - versão
Compacto Duplo” (como eu coloquei a seção em meio a duas músicas, o nome da versão ficou
óbvio), intercalando sua publicação com o restante da estrutura inicial, agora renomeada de
“versão Full”.
Alguns anos mais tarde, contribui com diversos artigos sobre podcasting para um pequeno
portal, hoje inexistente; e para não perder o material, gravei todos estes textos e publiquei-os -
também no mesmo “feed” - como sendo a “versão Acústica” do Impressões Digitais. Algumas
edições experimentais foram publicadas com a tag “versão Especial” e
colaborações/divulgações usaram a tag “versão Extra”.
Com o fim dos artigos gravados sobre podcasting, me vi obrigado a dar continuidade ao
espaço que essa tag me propiciou (na verdade, no tempo disponível que ela me permitiu, para
produção das versões mais complexas - full e compacto duplo), assim criei a “versão Long Play”,
onde divulgo estritamente o meu gosto musical e algumas coletâneas divertidas.

NUNCA PENSEI, LÁ EM 2005, QUE O PODCAST CHEGASSE ATÉ AQUI ATIVO E


EU AINDA… VIVO, DIRÁ ALGUM AMIGO SAFADO
Como já disse, eu comecei o podcast com propósitos meio estúpidos para alguns, porém bem
definidos, ao menos para mim. Demostrei que qualquer um poderia, com recursos tecnológicos
mínimos e voz roufenha, produzir um podcast, e se fosse com conteúdo interessante, muito
melhor. O aprimoramento da técnica e dos recursos - eu sabia - viriam com a prática, com o
tempo - provei estar certo neste ponto. Quanto à qualidade do conteúdo, creio ter mantido um
nível razoável.
Afirmei, inúmeras vezes nas primeiras edições, nas trocas de ideias com outros podcasters,
que o aspecto “ganhar dinheiro com isso” não era um objetivo nem secundário. Desde então,
bato na tecla: produzo podcasts porque EU GOSTO de fazê-los, eu me divirto muito em
pesquisar um tema, roteirizar, gravar, editar, pós-produzir, publicar e ouvir alguns desaforos de
vez em quando… brincadeirinha, 99% das vezes ouço apenas elogios. Fato que não me ilude,
sempre procuro melhorar algo aqui ou ali, mesmo tendo que colocar nesse processo tempo (que
a cada ano se torna mais escasso pra mim) e dinheiro (sempre escasso pra todos).
Mesmo tendo perdido a força do impacto inicial, o ato de provocar a garotada a expor suas
ideias e a criar conteúdos inéditos, segmentados e divertidos, ainda é parte importante do
escopo, da mesma maneira que provocar os corajosos assinantes do “feed” para alguns aspectos
um tanto fora da realidade medíocre que a vida nos oferece cotidianamente.
A estrutura de gravação jazz em backgroud e a palavra falada “sobre como eu vejo o mundo”
era e é perfeita, ao meu ver. O meu medo primário era, e ainda é, o ritmo e a voz de taquara
rachada.
De propósito, provocativamente, usei nas primeiras edições do podcast o que eu tinha em
casa: um iMac 333MHz verde-limão translúcido de 1998, o microfone embutido dele (daí aquele
ruidão de fundo dos primeiros podcasts) e todos os seus 9 GB de HD. Hoje continuo usando o
que tenho à mão: o macbook pro ou o mac mini, dependendo se estou na minha escrivaninha ou
em algum outro cômodo da casa. O software para gravar já era o GarageBand, lançado em 2004
- e que eu uso até hoje, atualizado é claro. Fiz algumas experiências com vários outros, do
Audacity ao Pro Tools, mas o GarageBand me basta para o grau de qualidade que necessito.
Como já disse, o “feed” era feito por mim, mas a Apple encampou a ideia e abriu as portas
para o podcasting no iTunes, o que facilitou muito a publicação e distribuição dos conteúdos. O
Wordpress também foi de grande ajuda com seu plug-in Podpress.
Na realidade, eu não modifiquei quase nada do método de gravação do Impressões Digitais:
sento, penso, pesquiso, elaboro o roteiro da edição de cabo a rabo, estruturando as músicas e o
background. Gravo a voz de uma vez com um headset USB, desde meados de 2006, quando
consegui um adaptador de 2 pinos para USB, hoje uso o MS Lifechat LX-3000, já um tanto
antigo (creio que ele é de 2009).
Já coloquei e tirei muito penduricalho tanto do podcast como dos sites. O
impressoes.vocepod.com abriga apenas os arquivos de áudio e show notes básicos, e o que eu já
tinha à época - meu blog no blogspot aproveitei para incrementar o podcast com informações
(textos, fotos, links etc.). Mas isso não surtiu muito efeito, não. Acabei simplificando o blogspot
e ele está do mesmo jeito até hoje.
Não pretendo mudar o Impressões Digitais em curto prazo. Pois, o que importa é que em
algum momento eu consegui - alguns dizem que ainda consigo - divertir e provocar vários
ouvintes. Alguns permanecem fidelíssimos, divulgadores e provocadores, outros se tornaram
amigos queridos, colegas da podosfera, criando seus próprios podcasts, esporádicos ouvintes,
elegantes conhecedores do Impressões Digitais e uns poucos abandonaram-no completamente.
Não sinto rancor por quem não tem saco para ouvir o que penso. Eu também não tenho
paciência com o pensamento e a postura de algumas pessoas de meu convívio. O mundo, a
realidade é isso mesmo, conquistas e abandonos.
Ao longo dos anos, manter o podcast com uma qualidade boa foi uma das minhas maiores
preocupações (além do texto, da música, da qualidade sonora e do ritmo), outra tão importante
foi a necessidade de buscar e compreender os anseios da audiência, e mais importante, abstrair
de forma isenta o poder que o ouvinte/assinante possui sobre um podcast.
É, meu caro, se, por algum motivo obscuro, houver um demônio habitando seu podcast -um
diabinho que envia sinais de aprovação para aquilo que você está fazendo bem -, tenha certeza
de que esse é o “outro lado do podcast”, é o seu ouvinte (que eu prefiro chamar de assinante).
Claro que esta é minha modesta e humilde opinião, a qual meus assinantes consideram
exemplar, pois eles sabem que são a motivação e o objetivo deste meu estranho, diletante e
autoindulgente passatempo.
Sem o assinante - e sua total disposição e concordância em absorver esta barafunda de
pensamentos e esta cacofonia sonora que nós, podcasters, produzimos -, seria pura estupidez e
completamente despropositado o “zé” aqui, periodicamente, escrever e reescrever uma pauta,
ajustar ganhos de microfones, ajustar filtros e equalizar canais de gravação, esquentar as
válvulas do computador, bancar o idiota no quarto fazendo sozinho exercícios de aquecimento
de voz e perder algumas horas de lazer.
O assinante é o Rei! Apregoam os seus servos… Ele deve ser obedecido, tolerado e
diariamente reconhecido. Porém, ele deve, o-ca-sional-men-te, também ser amarrado a um poste
e devidamente açoitado, pois ele é um monstro faminto que certamente irá devorar
glutonamente seu trabalho em instantes, desprezando partes importantes daquilo que você
penou para compilar, lapidar, embalar e divulgar, ignorando solenemente o seu esforço e - mais
importante de tudo - o seu ego.
E para completar, tenha a certeza de que ele, monstruosamente, e sem o menor senso de
lealdade ou qualquer remorso, abandonará seu podcast, passando a escutar alguma outra coisa;
assim, sem mais nem menos, num piscar de olhos. Sem dúvida, o assinante é um completo e
perfeito bastardo!
Após ouvir algumas milhares de horas de podcasting em todos esses anos e produzir mais de
130 podcasts, comecei a ter ciência e a delinear o que a audiência espera genericamente de um
podcast. O que compartilho a seguir não é um guia definitivo, são apenas alguns tópicos
completamente desordenados e decorrentes apenas de minhas experiências e observações
desde 2005:
Qualidade de Gravação: A maioria dos que ouvem meu podcast, de acordo com seus
comentários, confirmam (além da exigência de um microfone ao menos razoável para captação)
meu acerto em buscar a nivelação entre a voz e a música de fundo, ou efeitos, de modo a um
não sobressair em demasia ao outro; assim como equalizar todo o podcast em um nível razoável.
Pois, nada mais frustrante que ajustar o volume do tocador de MP3 a todo momento.
Conteúdo: As pessoas NÃO ouvem podcasts seguindo uma ordem cronológica. Quaisquer que
sejam os conteúdos do podcast, eles devem encerrar-se em si, na mesma edição. Referências a
edições anteriores devem ser evitadas; caso ocorra a necessidade de uma citação de origem,
deve-se resumir o já apresentado. Creio que não deve-se forçar quem ouve seu podcast a buscar
referências em outros podcasts para compreender o que está sendo tratado.
Duração: Alguns podcasts passam “um pouquinho” do tempo perfeito. Outros são
extremamente enxutos. Mas há os que parecem que nunca vão acabar… Já estou até cansado de
encontrar por aí receitas de quanto deve ser a duração adequada de um podcast. Muitas vezes
recebi indicações sobre a duração do meu podcast (“’tá meio longo” ou “porque ‘tá assim, tão
curto?”), só porque decidi mantê-lo dentro de uma faixa de 20 a 70 minutos (a maioria dos
“manuais de podcasts” recomendam como duração adequada a faixa entre 30 e 45 minutos).
Mas, na verdade, o que rege o tempo do meu podcast são as questões: Isto aqui é interessante a
quem ouve? Devo resumir o assunto ou devo exaurir o tema? Porém, uma regra é de ouro: não
embrome, seja objetivo (se bem que vira e mexe, para mim, a objetividade é um tanto circular).
Regularidade: Não há nada mais chato que assinar um feed, um podcast superinteressante e
ter que esperar um novo episódio sabe-se lá quando. Nossa vida é envolta em programações.
Temos horários para tudo: para trabalhar, para transporte, para o futebolzinho de fim de
semana e para dormir. Creio que o assinante prefere que seus podcasts favoritos sigam uma
periodicidade, qualquer que seja, para ele poder se organizar. Nota: Mesmo tendo plena certeza
desta afirmação, não consigo manter periodicidade alguma. Admito, sou um relapso
desorganizado.
Personalidade: Por que você acompanha um programa de rádio ou TV? É bem possível que as
razões recaiam sobre a personalidade do apresentador ou protagonista. Creio que isso também
ocorre com o podcasting. Sua voz e seu modo de comunicar-se com a audiência é algo muito
pessoal, e quem o ouve tende a se sentir muito próximo a você. Já recebi várias mensagens que
confirmam esta aproximação e, claro, vários ouvintes hoje são caros amigos.
Honestidade: Como já mencionei, o podcasting pode ser muito pessoal. No meu caso, me
exponho até em demasia em alguns casos, compartilho pensamentos e conceitos pessoais com
meus ouvintes e, frequentemente, sou relembrado de minha honestidade, de minhas falhas e de
meus lapsos. Uma vez que o Impressões Digitais é um podcast do tipo one-man-“tagarela”-show,
por excelência, é óbvio que o ego se expõe constantemente, mas o sustentáculo de tudo é a
minha verdade, mesmo que esta “verdade pessoal” esteja equivocada. Creio, sinceramente, que
a audiência aprecia a honestidade do podcaster, mesmo quando não compartilham os mesmos
ideais, pontos de vista e opiniões.
Respostas e Interação: Eu respondo religiosamente - posso dizer com orgulho - e quando é
possível, imediatamente, a todos ouvintes que me enviam e-mails e comentários no blog (ainda
dá tempo, afinal não são tantos ouvintes assim). Se as mensagens não são espetaculares em
quantidade, elas são em qualidade. Para mim é absolutamente imperativo o reconhecimento
destas, e o envio de minhas respostas através de um e-mail pessoal ou em áudio no podcast. Se
a audiência dedica tempo e neurônios para compor uma mensagem com seu ponto de vista,
então o mínimo da boa educação é uma resposta imediata agradecendo (isto deveria ser uma
das regras do código de ética do podcaster).

Tenho absoluta certeza de que há muito mais necessidades desta exigente fera, o assinante
de podcast, mas estas observações já pautam o essencial para domar este “monstro” e como
alimentá-lo com o melhor conteúdo possível.
Como podcaster você necessita estabelecer - com algumas míseras palavras - uma relação
fluida e isenta de imposição com o seu fiel ouvinte, este eterno desconhecido. Você precisa
descobrir a forma mais simples, direta e qualificada de saciar sua sede de informação, de
atender suas expectativas mais íntimas e, claro, sua curiosidade.
No entanto, isso não basta, você precisa de algo mais. Pois, essa nova estética midiática
exige (ao menos num primeiro instante) que o produtor do podcast seja um one-man-show, que,
além de desenvolver o conteúdo (som, imagens e textos), atue como comunicador, editor,
técnico de manutenção, “marketeiro” e também manuseie programas diversos, e
concomitantemente resolva problemas envolvendo siglas como XML, PHP, RSS, HTML, CSS, et
cetera, ou pelos menos compreenda o que elas representam na elaboração e publicação de um
podcast.
Ser podcaster - seja em 2005 ou em 2014 - resume-se à arte de ser capaz de se comunicar, de
ser em sua plenitude mais que um poeta, mais que um fingidor - daqueles preconizados pelo
Fernando Pessoa (ou um de seus heterônimos, sinceramente não me lembro se foi o poeta ou o
fingido autor) -, ser aquele que, expondo sua verdade, “finge tão completamente, que a chega a
fingir a dor que deveras sente”.
Escriba Cafe
Christian Gurtner

INTROITUS
Alea jacta est, disse Julius Cæsar ao cruzar o rio Rubicão1. Foi esse também meu pensamento
ao publicar, em meados de 2005, o primeiro episódio do podcast Escriba Cafe.
Porém, tudo começou muito antes dessa publicação.
Eu estava numa viagem a bordo do navio Dei Gratia, pelo Atlântico, quando ouvi um pequeno
tumulto se formar no convés da proa. Apressei o passo, com bastante curiosidade, para ver do
que se tratava. Os demais membros da tripulação apontavam para o horizonte fazendo
comentários que pude entender de forma superficial que se tratava de um curioso navio mais ao
longe.
Quando finalmente vi o navio, não compreendi bem o porquê do alvoroço. “Ora, o que tem
demais um navio no mar?”. “Não vê?” - respondeu um marinheiro sem paciência pela minha
ignorância. “Já se passaram horas e ele continua seguindo o vento, está à deriva”.
Confesso que fiquei, então, curioso. Naquele remoto ponto do oceano, um veleiro à deriva só
podia significar uma coisa ou outra: um leme quebrado ou uma tripulação morta.
A primeira opção foi gradativamente sendo descartada à medida que nos aproximávamos do
navio e, tentando enviar sinais visuais e sonoros, não obtivemos resposta. Ninguém estava no
convés.
Mas de forma surpreendente, a segunda opção também não se encaixou no que encontramos
ao emparelhar com o estranho veleiro. Segui um dos oficiais que subiu a bordo da outra
embarcação para descobrir que não havia ninguém a bordo. A maioria dos objetos pessoais e a
carga do navio estavam intactas, mas não havia lá mais ninguém.
***
Essa é a história do Mary Celeste, um dos maiores mistérios do mar. Tirando o fato fictício de
minha presença a bordo do Dei Gratia, a história é real, tendo acontecido em 4 de dezembro de
1872.
É uma história fascinante, assim como quase toda a história de nossa civilização, bem como
um mistério que nos faz vasculhar a imaginação em busca de respostas. Mas o fato é que,
sentindo-me dentro da história, como um observador, tudo fica mais fantástico ainda. E é isso
que, desde o início, tento construir com o Escriba Cafe.
A história do Mary Celeste foi narrada no episódio 11 do Escriba Cafe que, obviamente,
ainda se encontrava em sua infância, com qualidade deplorável e longe do objetivo de colocar o
ouvinte dentro da história - e de boas intenções o inferno está cheio -, muito embora alguns
tenham me dado retorno dizendo que se sentiram participantes do ocorrido.
Mas considero o Mary Celeste - bem como boa parte das primeiras histórias narradas pelo
Escriba Cafe - um marco. E o motivo é que todas essas histórias tiveram como fonte inspiradora
um único livro que me acompanhou por quase toda a infância: O grande livro do maravilhoso e
do fantástico.
Publicado em 1977, o livro é grande em ambos os sentidos, com 592 páginas bem maiores
que a média e pesando 1,5 kg. Encontrei-o na biblioteca do meu pai, lá pelos meus 9 ou 10 anos
de idade. Contém várias seções, como “Mistérios intrigantes ainda por solucionar”, que trata
exatamente disso: mistérios da história; “Passos no desconhecido”, sobre acontecimentos ditos
sobrenaturais, e outras seções narrando jornadas, expedições, invenções bizarras, superstições,
ciência etc.
Passei toda minha adolescência com aquele livro na cabeceira. É claro que me impressionou
muito e, acho que, por isso, anos depois eu ainda o tinha e sempre relia algo ou, por incrível que
pareça, ainda conseguia achar um artigo ou uma nota que ainda não tinha lido.
Por ser antigo, é óbvio que estava cheio de informações desatualizadas ou erradas, o que
requeria muita pesquisa em outros livros e na internet para se chegar a uma história mais
completa; mas, mesmo assim, o considero a pedra fundamental do Escriba Cafe. Muitas
histórias do livro já foram reproduzidas pelo podcast. Mas algumas foram desperdiçadas. Pelo
menos é o que penso quando olho para trás. Tantos temas fantásticos produzidos com um certo
amadorismo e com tão poucos detalhes. Mas infelizmente essa foi a trilha de aprendizado inicial
que tive que seguir (seria isso um sinal de futuros “remakes”?).
Comparando os episódios mais atuais com os primeiros, como o do Mary Celeste, considero
os mais antigos um fiasco, um projeto de escola ou simplesmente o retrato mais amador de
edição, da roteirização e da locução. Mas a receita da falta de qualidade envolvia tudo: um
headset ruim, um computador ruim e um programa de edição ruim. E para piorar tudo, meus
conhecimentos sobre edição eram tão ruins quanto os equipamentos, o que fez com que o
primeiro episódio2 (que eu considero o pior de todos - no quesito qualidade) foi, ironicamente,
um dos mais demorados para produzir, afinal enquanto gravava e editava eu estava ao mesmo
tempo aprendendo a gravar e editar.
Apesar disso estranhamente fez um modesto sucesso aquela publicação. No início eu não
entendia bem o porquê, mas os poucos comentários que recebi daqueles primeiros ouvintes
logo me fizeram ver que o fato de o Escriba Cafe não se tratar de um “bate-papo” e possuir um
formato completamente diferente da maioria dos podcasts que existiam na época atraía a
atenção daqueles que gostavam desse estilo e não tinham essa opção.
Além disso, o Escriba Cafe surgiu numa época em que a grande maioria dos podcasts
brasileiros tinha a tecnologia como assunto principal, sendo uma exceção à “regra”. Contudo,
eu produzia o que eu mesmo gostaria de ouvir, mas ainda não tinha chegado perto da qualidade
que eu gostaria de ter como ouvinte.
Vale lembrar que, quando digo “modesto sucesso”, é exatamente isso: só algumas dezenas de
ouvintes. Era uma época em que pouquíssimas pessoas sabiam o que era um podcast - e hoje
em dia, no Brasil, ainda não são muitos os que sabem o que é um.
E foi graças a essas poucas dezenas de ouvintes, alguns dos quais escutam e enviam seus
feedbacks até hoje, que continuei a produzir e aprimorar o Escriba Cafe, pois não havia mais
nada que justificasse o tempo e o sacrifício destinados à produção.

PRÆCURSOR
O Escriba Cafe faz parte de uma leva de podcasts que se arranhou e tropeçou muito para
que, hoje, quem quiser produzir um podcast consiga informações e ferramentas sob medida
para tal, o que não havia em português na época e muito pouco em inglês.
Éramos poucos, mas trocávamos informações, alguns faziam tutoriais explicando como
produzir etc. Hoje temos o Wordpress com seus plug-ins que tornam a publicação de podcasts
algo relativamente fácil (bem como outras ferramentas), mas lá no início, não. Era uma
ferramenta atrás da outra que aparecia, testávamos e, logo depois, ela deixava de ser
suportada. Era algo muito chato e o Escriba Cafe teve que migrar pelo menos três vezes até
chegar ao Wordpress com o gerador de feeds que suportasse podcasts e plug-ins adequados.
Assim a evolução do Escriba Cafe era uma batalha travada em vários fronts: conhecimento,
sistema para publicação, softwares para gravação e edição e equipamentos. Era uma luta sem
fim que, em outras épocas, eu já teria desistido nesse ponto, não fosse a paixão que me
despertava cada vez mais por todas as viagens em que eu mergulhava através da pesquisa de
temas e produção.
Com o passar do tempo, meu conhecimento em edição e produção finalmente ultrapassou os
limites dos equipamentos ruins e fui obrigado a investir alto, pela primeira vez, no Escriba Cafe.
Alguns milhares de reais depois, o miniestúdio estava pronto para fornecer qualidade sonora,
mas eu ainda tinha muito o que aprender.
É isso que sinto até hoje, produzir o Escriba Cafe é um eterno aprendizado, seja na produção
ou na pesquisa, a cada dia algo novo é acrescentado. Penso ser algo comum em todo podcast.

PROVENTUS
Poderia nos ajudar a fazer um podcast? Gostamos muito do seu estilo e ele que nos vai servir
de inspiração.
— Não sei como ajudar. O que vocês precisam saber?
— Você fez algum curso, qualquer coisa para nos recomendar?
— Não.
— Software? Hardware?
— Usei o Sony Vegas por muito tempo, uma mesa de som e um microfone AKG. Hoje só muda
o software, pois, por estar usando Mac, tive que me readaptar e usar o Soundtrack Pro.
— E como você decide por temas, pesquisa etc?
— Essa pergunta é muito difícil de responder, principalmente digitando, pois eu ficaria muito
tempo explicando, é algo quase metafísico.
— Entendo. Está aí uma ideia para um livro.
GRAÇAS AO SENHOR LUCIO LUIZ A HORA É AGORA
O formato do Escriba Cafe e todo seu desenvolvimento e evolução é fruto de uma só ideia: o
que EU gostaria de ouvir?
Começando desse ponto, todo o resto fica fácil em conceito, só faltava conseguir reproduzir a
ideia de forma fiel ao que eu gostaria como ouvinte. E é aí que tudo fica difícil, pois a
imaginação é ilimitada, enquanto o conhecimento e recursos, não.
Já se passou quase uma década desde o primeiro podcast publicado e foi um grande
tormento evoluir dia após dia para tentar chegar perto do que minha imaginação demandava.
Eu ainda não tinha ouvido um podcast 100% igual ao que eu gostaria de ouvir. E digo que até
hoje não consegui, sempre esbarrando em limitações técnicas ou de matéria-prima.
É claro que isso exigia muito aprendizado, tentativa e erro, pesquisa e o mais difícil de tudo:
sacrifícios - tanto na vida pessoal e profissional quanto na própria produção do podcast.
Um exemplo disso é o fato de que até determinado episódio eu ainda lia os comentários
enviados como forma de retribuir o feedback dos ouvintes, porém, com o crescente número de
ouvintes e comentários, eu comecei a achar a leitura das mensagens algo muito chato de se
ouvir, o que me fez parar, com certo pesar por não retribuir mais aos ouvintes a dedicação - isso
me foi aliviado quando vários deles me disseram também preferir assim.
Em resumo, isso é o cerne do Escriba Cafe, como nunca conseguirei agradar a todos, pois
cada um tem preferências e opiniões diferentes, coloco a minha preferência como guia, o que eu
gostar, o que eu preferir e o que eu gostaria de ouvir é o que é produzido - ou, pelo menos, até
onde minhas limitações me permitem.
Falando assim fica a impressão de que não levo em conta o que os ouvintes pensam. Pelo
contrário, é muito importante ouvir o que têm a dizer, pois, sempre aparece uma ideia de que o
produtor goste mas que nunca tinha pensado nela. Mas quando o que o ouvinte quer é algo que
eu não quero, me torno irredutível, afinal eu sou meu principal ouvinte. Até a publicação final
do episódio, eu o ouço em média umas cinquenta vezes, então o mínimo que eu posso fazer é
produzir algo que eu goste de ouvir.
Mas, mesmo assim, os detalhes que acabo não conseguindo deixar exatamente como eu
queria, chegam a doer meus ouvidos durante as revisões. Alguns eu tento aprimorar enquanto
outros eu me dou - temporariamente - por vencido, devido à falta de tempo ou recursos. Mas
isso me deixa contrariado.

VESTIGIA
Ao contrário da maioria dos podcasts com roteiros pré-definidos, o Escriba Cafe possui um
desenvolvimento peculiar: eu só pego na pena e no papel quando surge um tema que eu goste
muito - destaco o muito. Algumas vezes produzi temas que, apesar de gostar, não faziam
despertar aquela paixão (energia que alimenta o Escriba Cafe). E posso garantir que temas que
não despertam paixão, jamais serão tão bem produzidos quanto aqueles que nos fazem viajar
por entre as linhas do roteiro, dos sons e da música. Na verdade imagino essa ser a regra para
tudo na vida.
Já a forma como encontro o tema a ser tratado varia muito. Mas uma coisa que após oito
anos eu descobri é que nunca, nem uma única vez (e olha que tentei inúmeras vezes), consegui
encontrar ou decidir sobre um tema quando eu quis - ou seja: “agora vou sentar e pesquisar na
internet algum tema para o próximo podcast” - os minutos passam, as horas, os dias e NADA.
Contudo, às vezes, de forma despretensiosa, estou ouvindo música, olhando para o mar e,
então, La Musica Notturna, de Luigi Boccherini, me faz lembrar do filme O Mestre dos Mares,
que me remete depois a alguma passagem da história que se passa no mar e voilá: aquilo ficará
pulsando em minha cabeça por alguns dias, cada vez com mais detalhes e então resolvo iniciar
uma pesquisa - só para checar - e ao pesquisar mais sobre determinada história, duas coisas
podem acontecer: eu desistir (o que é raro) ou me impressionar ainda mais com aquilo e decidir
produzir aquele tema.
Começa então uma das partes mais trabalhosas da produção: pesquisar, pesquisar, pesquisar
e escrever, escrever, escrever. Até que o roteiro fica pronto.
Normalmente eu escrevo seguindo o ritmo de músicas que eu imagino serem perfeitas para
essa ou aquela parte e, com isso, boa parte da trilha já é escolhida enquanto ainda escrevo.
Mas aí chega a hora de gravar. Nunca gravo o roteiro inteiro de uma só vez. Normalmente
separo cada episódio em capítulos (essa divisão pode ser vista de forma clara na transcrição do
episódio que sempre publico junto com o podcast). Gravo um capítulo por vez e quase nunca sai
exatamente como eu escrevi. Isso porque muitas vezes o que foi escrito não fica tão
interessante quando falado, e assim vários ajustes no texto são feitos durante a gravação -
alguns até de maneira improvisada.
Agora é a vez da música, dos efeitos sonoros e de ambientação. É uma parte complicada, pois
tenho que pensar em duas situações: o ouvinte com fone de ouvidos e o ouvinte com caixas de
som.
Apesar de cuidar dos detalhes sonoros que só podem ser percebidos com bons fones ou
excelentes caixas de som - esse é um dos segredos do Escriba Cafe -, cuido também para que
quem vai ouvir o episódio em caixas de som ruins também possa ter um pouco de qualidade.
Mas sempre prego que, para uma experiência real, os ouvintes devem sempre ter fones de
ouvido bons (testo também nos da Apple, que geram ótimos resultados) ou caixas de som com
alta definição.
Um exemplo: a máquina do tempo do Escriba Cafe pode ser “observada” de duas formas:
como mero espectador através de caixas de som ou como participante dentro da máquina ao
usar fones de ouvido, pois todos os sons são criados e editados de forma “surround”, bastando
fechar os olhos para deixar a imaginação fazer o resto.
Acho que essa é a mágica de podcasts como o Escriba Cafe: por não ser um filme, as
imagens ficam por conta da imaginação de cada ouvinte e a nitidez dos sons deve criar o
ambiente para isso: fechar os olhos e viajar no tempo e no espaço para, finalmente, estar
presente na história e não simplesmente ouvi-la. Pelo menos é isso que tento fazer e, posso
dizer feliz que, a cada produção, chego mais perto do objetivo.
É trabalhoso. É como um quadro a óleo, em que cada som é uma cor de tinta e tenho que
misturar, pincelar e aplicar até começar a criar forma. É um trabalho tão minucioso que, na
verdade, quase não é percebido conscientemente. Já me perguntaram onde eu consegui o som
da máquina do tempo. Eu não o “consegui”, eu o criei com outros pequenos sons, uma alavanca,
um motor, pequenas pinceladas de atrito metálico e outros sons específicos que gravei com o
microfone.
Isso leva muitas horas, mas quando fica pronto, me imagino como o Dr. Frankenstein dando
vida à minha criação. Pode não ser a melhor edição do mundo, mas, quando vemos que
vencemos mais um limite, com certeza acabamos por ficar orgulhosos de nós mesmos. Agora
posso viajar no tempo como o Doctor Who e sua TARDIS.
Por isso, a única sugestão que dou quando me pedem dicas para fazer podcast é: paixão. Seja
apaixonado pelo que vai gravar e editar. Essa “paixão” lhe fará aprender, melhorar e ficar cada
dia mais próximo daquilo que você quer e imagina.

DEUS EX MACHINA
Qual o objetivo disso tudo? Fazer algo que eu gostaria de ouvir para eu mesmo ouvir? Até o
mais requintado louco estranharia uma mania dessas. Para que gastar dinheiro, tempo e
neurônios para produzir um podcast tão complicado como o Escriba Cafe?
A resposta é simples: existem histórias que devem ser contadas.
E é nesse ponto que surge outro fator tão importante quanto a paixão: os ouvintes. Eles
basicamente são a única razão para qualquer podcast existir. São eles que definem a
continuidade do projeto ou não e, mesmo com a filosofia do Escriba Cafe de só produzir o que
eu gostaria de ouvir, se não houver mais ninguém no mundo que compartilhe esse gosto, então
o podcast está fadado a desaparecer. Mas felizmente esse não é o caso.
Leio todos os comentários postados no Escriba Cafe - e todos são publicados, afinal o site não
possui sistema de moderação, o que é muito utilizado para evitar comentários impróprios ou, no
caso de muitos sites, evitar certas críticas. Mas a filosofia que compartilho com os ouvintes do
E.C. é a de que falem o que têm que falar. Mantendo o respeito e o bom senso, até a mais dura
crítica é válida - e veja que já recebi até tickets para o inferno.
Porém, no Escriba Cafe, os comentários muitas vezes tornam-se um show a parte, onde os
ouvintes não só comentam, criticam e enriquecem o conteúdo publicado como também, muitas
vezes, criam debates impressionantes. Percebi que todos têm algo a acrescentar e, por isso, o
ouvinte deve ter voz sempre - seja abrindo um espaço para comentários ou simplesmente uma
página no Facebook. Deixe seu ouvinte falar, pois você, assim, terá muito mais inspiração para
futuras produções e, como no meu caso, vai até se surpreender como existem pessoas que te
acompanham há uma década.
A relação com os ouvintes é difícil no meu caso, pois não tenho o tempo hábil para responder
todas as solicitações, afinal toda a produção e tudo que envolve o Escriba Cafe é fruto do
trabalho de somente uma pessoa, o que torna extremamente difícil de dedicar o tempo
necessário para tudo isso. Porém, essa relação também é mágica: ler nomes que já te são tão
familiares nos comentários e criar vínculos invisíveis e muitas vezes silenciosos com pessoas
que você nunca conheceu é brilhante.
Senhoras e senhores, essa foi uma pequena visita técnica ao centro de criação de Löwenttur3
e que guardem o que lhes for útil.
Não sei quais caminhos tomará o podcast no Brasil e no mundo, porém, em alguns, vejo uma
nostálgica volta à época em que as pessoas se reuniam em volta do rádio para ouvir uma novela
ou o noticiário do dia e, hoje, em meio a uma mídia tão errada e desacreditada como os jornais e
revistas, o podcast é mais uma ferramenta que revoluciona a comunicação e dá, cada vez mais,
voz ao povo.
Hoje todos têm voz.
E algumas histórias devem ser contadas.

1 Na antiga República Romana, como medida para evitar golpes e proteger o centro do império, era proibido

que qualquer general romano cruzasse com suas tropas o rio Rubicão, que demarcava os limites territoriais
da cidade de Roma. Cæsar o fez em 49 a.C., como forma de contra-atacar Pompeu, que planejava,
provavelmente, sua morte. Não se sabe, nos dias de hoje, qual rio foi chamado na época por esse nome.
2 O “primeiro” episódio oficialmente publicado no Escriba Cafe foi numerado como “8”.

3 Löwenttur é um condado criado durante a evolução do Escriba Cafe. Ele fica entre o real e o imaginário e

abriga tudo que envolve o Escriba Cafe e recebe, periodicamente, visitas especiais e os próprios ouvintes.
Löwenttur é um projeto de realidade.
Podcasts e mobilidade
Bia Kunze

COMO A GAROTA SE TORNOU SEM FIO


Não sei bem como entrei nesse mundo da tecnologia móvel, mas sempre soube que caminho
seguiria. Como tudo o que fazia na vida, adorava fuçar novidades e pensava num jeito de colocá-
las na minha vida prática. Foi assim com os celulares, os Palms, os smartphones e os podcasts.
Em 1997 eu era uma dentista recém-formada, ansiosa para começar a vida profissional.
Iniciei num consultório simples, sem telefone nem secretária. Ainda estávamos na época das
estatais dominando as telecomunicações. Aqui no Paraná, era a Telepar que monopolizava o
serviço. Solicitar uma linha telefônica era caro e demorado. Demorava-se para instalar uma, e
era caro. Declarava-se como bem no imposto de renda! E havia pessoas proprietárias de
diversas linhas, que viviam de alugá-las.
Além de uma linha telefônica, precisava de uma secretária. Tinha começado a cursar uma
especialização em outra cidade e servia o Exército por meio período. Como uma recém-formada
ia colocar uma pessoa para trabalhar, pagando salário e tributos, só para atender os escassos
telefonemas de uma recém-formada?
Algum tempo antes, meu pai havia pedido à companhia telefônica uma linha de telefone
móvel, a grande novidade do momento. Demorou tanto que, quando chegou a carta da Telepar
informando que sua linha estava disponível, ele já estava aposentado. Uma linha móvel, pensei,
poderia ser muito útil. Dispensaria a fixa e a secretária ociosa. Contei a ideia ao meu pai, que
topou. E assim começou minha carreira.
O celular mudou tanto meu modo de trabalhar; também me tornei plantonista em um
hospital que me apaixonei pela mobilidade. Em 2001, adotei os Palms, que me ajudaram muito
mais. Virei entusiasta de tecnologias wireless. Usava a web e listas de discussão para aprender
a usá-las. Tornei-me referência entre pessoas que queriam ser mais produtivas com ajuda da
tecnologia, mas não eram “ninjas” ou da área de TI. Por isso, em 2002, fundei uma lista de
discussão no Yahoo! Grupos, até hoje na ativa (com o nome Mundo Sem Fio) e em seguida
decidi criar um blog e compartilhar com pessoas leigas, como eu, tudo o que aprendia. Foi
assim que nasceu o Garota Sem Fio. Pouco mais de um ano depois surgiram os podcasts e fiquei
entusiasmada com a nova forma de se comunicar.
Bem antes do vestibular, uma das minhas opções de carreira era a área da comunicação. Mas
eu queria fazer as coisas de maneira diferente. Queria dominar uma área e só depois usar a
comunicação, atuando como especialista. Enquanto cursava odontologia, fiz alguns trabalhos de
locução para rádio, comerciais para audiovisual e até mesmo escrevi e atuei numa peça de
teatro. Achei muito mais fascinante escrever do que atuar. Algum tempo depois de formada e
com especialização, já mordida pelo bichinho da tecnologia, com blog e podcast, decidi me
aperfeiçoar. Entrei em um novo curso superior, Rádio e TV.
Foi uma experiência difícil: a única faculdade, particular, que oferecia esse curso na cidade,
tinha equipamentos ultrapassados e os softwares nos laboratórios e ilhas de edição eram
piratas. Eu e alguns amigos lutamos para melhorar o curso, sem êxito. Ao contrário, nos
tornamos as ovelhas negras da faculdade. Eu era a maluca que tomava notas em um Palm com
teclado bluetooth, estruturava os trabalhos escolares com mapas mentais e fotografava o
quadro negro com os tópicos das aulas com o celular Enquanto os colegas copiavam no caderno
o que o professor escrevia na lousa, eu avançava no tema fazendo pesquisas na internet no
próprio Palm.
Nas férias, antes de começar o quarto ano, o último antes de me formar, fui dissuadida do
meu projeto original, que era criar conteúdo audiovisual para dispositivos móveis, como Palms e
celulares. Hoje, quando digo que meus professores não viam futuro naquilo, só sinto vontade de
rir. Mas na época foi frustrante, pois ao mesmo tempo, briguei com alguns colegas e desanimei
com o curso. A gota d’água foi não ter encontrado professor para me orientar no TCC. Um dos
possíveis candidatos a orientador disse para eu fazer um TCC de um tema “mais fácil”, como um
projeto de programa de rádio ou TV, só para terminar o curso e pegar o diploma. Meu mundo
caiu. Nunca entrei nesse curso pelo diploma, afinal, já tinha um! Felizmente, havia uma
professora que pensava diferente e sempre me incentivou a seguir meus sonhos. Acho que era a
única que me entendia, e não é de se admirar que também fosse antenada com novas
tecnologias. Larguei a faculdade de rádio e TV e fui convidada a ir para outra instituição fazer
jornalismo, onde eu “poderia usar toda a estrutura disponível e botar meus projetos para
funcionar”, segundo disse o coordenador do curso quando fui conhecer a faculdade nas férias.
De fato, meus anos na Universidade Positivo foram maravilhosos. A professora que pensava
diferente, Alessandra Assad, estava lecionando lá e havia deixado a outra faculdade também.
Somos amigas até hoje. Ela continua sendo minha inspiração, pois além de competente e
dedicada, é ética e faz tudo com paixão. É o que temos em comum. O resto é história: meu blog
e podcast estouraram, junto com a telefonia móvel no país. Comecei a dar palestras e
consultorias, escrever para diversos veículos e atuar como comentarista na rádio CBN Curitiba.
Durante o curso, ganhei prêmios e reconhecimento. Também não terminei essa faculdade, mas
por um motivo muito melhor: minha carreira em tecnologia, antes paralela à odonto, se tornou a
principal. Viajava tanto que comecei a reprovar por faltas em todas as matérias. Mas os
professores, desta vez, sempre me animaram a seguir em frente.

FÃ DE PODCASTS
Comecei a ouvir podcasts por volta de 2003 ou 2004, tão logo Adam Curry apresentou ao
mundo sua invenção. Me tornei fã dessa nova mídia porque se encaixava perfeitamente no meu
ritmo de vida: poderia ouvir os programas quando e onde bem entendesse. Eu fazia meus
horários. Durante a noite, baixava todos os novos episódios e os ouvia ao longo dos dias
seguintes, quando aparecesse a ocasião ideal: no ônibus, ou dirigindo, ou na academia, ou
durante atividades domésticas chatas.
A dupla iPod e iTunes entrou na minha vida bem depois do advento dos podcasts. Eu tive
vários Palms e Pocket PCs, os chamados PDAs, personal digital assistants. Com um software
agregador instalado e uma conexão Wi-Fi disponível, eu baixava os episódios em qualquer lugar
e começava a ouvir tão logo o download acabasse. Baixar os episódios num PC, para depois
sincronizar com um iPod, ia totalmente contra minha filosofia de mobilidade. Acabei tendo
iPods, mas só os usava para ouvir música. Podcasts, só nos meus PDAs. Meu software agregador
favorito foi o Egress. Quando passei a usar PDAs híbridos com linha de celular, os smartphones
de hoje, a brincadeira ficava ainda melhor, pois eu tinha conexão constante. Quando saía novo
episódio, o aparelho me notificava e eu podia fazer o download. Alguns programas mais pesados
eu deixava para baixar quando houvesse banda larga sem fio, mas os mais curtos eu baixava ali
mesmo.
Estávamos entre 2004 e 2005, e, no meu plano corporativo, um pacote de dados GPRS/EDGE
ilimitado custava R$ 100 por mês. Para mim, valia cada centavo. A tecnologia GSM ainda era
recente no país, mas adotei-a desde o início. Eu usava internet móvel para tudo, e meu maior
prazer era poder trabalhar e me divertir em qualquer lugar. Todo momento ocioso era
produtivo. Aquela história de chegar em casa à noite e sentar na frente de um computador para
se fazer coisas que não dava para fazer durante o dia, definitivamente não existia para mim. Eu
trabalhava no consultório, fazia uma segunda faculdade, frequentava academia e viajava. Todos
queiram saber qual meu segredo; algo que virou uma brincadeira na internet, pois diziam que
eu tinha um clone. Houve até uns malucos que postaram fotos minhas em diferentes eventos e
diziam que eu estava em lugares diferentes ao mesmo tempo. Mas não: meu segredo de
produtividade era a tecnologia móvel. Até hoje, o slogan do meu blog é: mobilidade é liberdade.

PODCAST SEM FIO


Os primeiros podcasts que surgiram em 2004 falavam sobre tecnologia. Faz sentido, já que
podcast é um produto tech e para fazê-lo era necessária certa habilidade nesse campo. Os
podcasts made in Brasil surgiram logo na sequência, e acompanhei o trabalho dos pioneiros
Danilo Medeiros e Gui Leite. Grande entusiasta da plataforma Apple, com um blog popular
entre os fãs da marca, Gui também foi um incentivador do podcast no país. Conto às dezenas a
quantidade de amigos podcasters que começaram a gravar inspirados por ele. Ricardo Macari e
Eddie Silva começaram suas atividades, sendo os primeiros a agregar os podcasters como
comunidade, promovendo encontros e eventos. Participei dos primeiros eventos de podcasters
do Brasil. Lembro-me com carinho dos cerca de vinte gatos pingados se reunindo
animadamente na primeira PodCon. Estrutura inversamente proporcional ao entusiasmo!
Foram meus amigos Gui e Ricardo quem mais me incentivaram a gravar o meu próprio
podcast. Assim, no ano de 2005, estreou o meu podcast sem fio, que se chama, como não
poderia deixar de ser, PodSemFio.
Como acontece com todo estreante, o primeiro episódio foi vergonhoso. Apesar da
experiência com locução e desinibição para falar em público, deu um certo receio transformar a
voz em bytes. Tudo era novidade: os equipamentos para gravação, os softwares para edição,
entender o que eram os tais feeds que caracterizavam o podcast como uma assinatura em vez
de arquivos de áudio esparsos, e como fazer a conversão para MP3 em diversas taxas de
compressão. Ter versões em alta e baixa qualidade era fundamental nos tempos em que banda
larga apenas engatinhava e era exclusiva dos centros urbanos. Mas até hoje mantenho meu feed
em qualidade menor, pois muita gente tem acesso a podcasts usando apenas internet móvel.
Os primeiros episódios foram gravados com um microfone bem ordinário, e o Audacity era o
software (livre) usado para gravar, editar e converter para MP3. Desde o início, usei meu
próprio servidor para hospedá-lo, usando o MovableType e depois o Wordpress como sistemas
de publicação.
Muitos podcasters investiram pesado em seus estúdios caseiros. Bons microfones,
computadores, mesas e até ilhas completas de edição. Eu quase fui por esse caminho, quando
me dei conta que meu trabalho no Garota Sem Fio era pura e simplesmente o retrato do meu
estilo móvel de vida. É claro que isso deveria se refletir no podcast!
Continuei gravando no meu laptop Dell e editando no Audacity. Troquei apenas o microfone
barato por um headset Plantronics. Mais tarde, em 2007, troquei meu PC por um Mac, o
Audacity pelo Garage-band e passei a usar um headset USB, também da Plantronics. Mas não
eram esses os meus principais equipamentos de gravação.
Tive diversos Pocket PCs e smartphones ao longo dos anos. Foram incontáveis os episódios
que gravei neles. Nos PDAs Windows Mobile, usava um ótimo software chamado Resco Audio
Recorder. Gravava os episódios nos intervalos entre pacientes em meu consultório, em casa à
noite ou em viagens nos fins-de-semana. Também usei gravadores em smartphones Symbian e
depois iOS.
Quando comecei a gravar entrevistas, o software de escolha foi o Skype, usando um add-on
chamado Call Recorder. Mas também gravo muitas entrevistas por telefone, usando meu
discador VoIP e o programa Camtasia. E as entrevistas presenciais, hoje, faço com a Livescribe,
uma caneta que permite gravar áudio e tomar notas ao mesmo tempo. A grande sacada é que as
notas são sincronizadas com a timeline do áudio, permitindo que eu ouça mais tarde alguns
trechos apenas tocando a caneta no ponto da anotação desejado. Uso esses áudios não só para
entrevistas, mas também para registrar palestras e aulas.
Desde o início, por esses motivos, a qualidade do áudio do podcast oscilava muito. Mas eu
achava que mais importante que a qualidade do áudio era a natureza dele, ser um podcast
móvel. Eu podia gravar em qualquer lugar, com qualquer dispositivo, era isso que importava.
Minha preocupação maior era encontrar um bom headset, fone de ouvido com microfone, pois
os que costumam vir de fábrica com os smartphones são sofríveis.
Fazer o upload dos episódios muitas vezes também era uma tarefa árdua. Quando me mudei
para minha atual residência, em 2006, fiquei sabendo que, ao contrário do que havia sido
previamente informada pela companhia telefônica, não havia banda larga no trecho da rua em
que moraria. Alguns meses depois, ofereceram-me 1MB de internet por um valor tão
exorbitante que declinei. Na cidade já havia 3 ou 4 companhias oferecendo o serviço, e a
concorrência estava derrubando os preços. Decidi esperar, quem sabe em algumas semanas o
cenário não mudaria com a vinda das demais empresas?
Acabei esperando 1 ano e meio.
Ao mesmo tempo que foi penosa, a situação provou ser uma oportunidade e tanto para
mostrar ao mundo, através do meu blog e podcast, as agruras das conexões de internet no país.
Continuei com meu plano de internet móvel corporativo ilimitado. Meu smartphone na época
era um Qtek 9090, adquirido na operadora assim que surgiu o primeiro plano pós-pago de
internet. Era a primeira vez que eu tinha um smartphone “de verdade”, com a plataforma
Windows Mobile, com linha de celular integrada. Até então, eu usava Palms e Pocket PCs como
“computadores” ligados à conexão GPRS/ EDGE de celulares via bluetooth. Tive alguns Nokias
Symbian antes do Qtek, que posso chamar de smartphones, mas o sistema operacional não
possuía a vasta biblioteca de aplicativos do Windows Mobile, incluindo os de odonto, como o
banco de dados dos pacientes. O Qtek era inferior aos PDAs Windows Mobile da época,
inclusive o antecessor, um Dell Axim x50v. Mas a convergência fazia toda a diferença do mundo.
Facilitava meu trabalho, tinha menos tralhas eletrônicas para carregar, e ainda por cima ele
funcionava em “tethering” com meu laptop, servindo como um modem sem fio.
Na época, estava iniciando minhas atividades em odontologia homecare. Tinha acabado de
comprar um consultório odontológico portátil, e por isso mesmo precisava de um escritório
móvel compacto.
O laptop e o Qtek formavam uma dupla e tanto. Poderia navegar na web (a no máximo 56K,
já que o Qtek ainda não suportava EDGE!), gerenciar e-mails, escrever no blog e cumprir
minhas tarefas básicas de trabalho. Mas e o podcast?
Claro que além da internet móvel ser lenta para subir podcasts, nem sempre dava para
confiar em sua estabilidade, mesmo para as tarefas mais leves. Assinei um plano de Wi-Fi da
Vex, que daria direito a usar hotspot espalhados por todo o país. Parecia o plano perfeito, pois
combinava perfeitamente com meu estilo itinerante de trabalho; vivia circulando pela cidade, e
minha filosofia de “mobilidade é liberdade”.
Parecia e seria, se o sistema fosse confiável.
Eu gravava o podcast em casa ou no consultório, e durante compromissos na rua,
aproveitava para almoçar ou tomar café nos lugares com hotspots da Vex. Mas nem sempre a
rede estava disponível, ou estava funcionando a contento, e lá ia eu procurar outro ponto de
acesso. Muitos funcionários de café sequer entendiam o que eu dizia quando falava que o
hotspot estava fora do ar.
Mas consegui. Aos trancos e barrancos, escrevia no blog e fazia meu podcast. Obviamente, o
próprio esforço em publicar no blog e podcast eram temas recorrentes de ambos. Fui a primeira
blogueira móvel no país a denunciar nossas mazelas com internet, tanto fixa quanto móvel,
principalmente a móvel, e por isso mesmo acabei me tornando especialista e referência. Na
Universidade Positivo, inscrevi meu podcast no prêmio Sangue Novo do Sindicato dos
Jornalistas do Paraná. Fiquei com o segundo lugar. Antes disso, meu podcast também já tinha
sido finalista do Best of Blogs da Deutsche Welle. Estava no caminho certo.

IDAS E VINDAS
Em 2009, vivi um paradigma profissional. Dedicava-me ao odonto-homecare, mas viajava
bastante por causa da minha atividade paralela de consultora e blogueira. As pessoas achavam
que eu devia escolher um lado ou outro, mas, para mim, o desafio era conciliar as duas coisas.
Enfim, descobri aquilo que realmente amava: adorava tecnologia e era maravilhoso viver
trabalhando nesse mundo. Mas, com o homecare odontológico, por outro lado, aprendi a me
realizar de verdade na profissão. Trabalhar com idosos e portadores de deficiência dava outra
dimensão à minha realização profissional. Mais do que viver daquilo, eu chegava à noite em
casa exausta mas feliz, porque estava fazendo diferença na vida de muitas pessoas. Não era só o
dinheiro. Aliás, fiz muitos atendimentos voluntários por puro senso de dever.
Até que chegou o momento em que precisei parar tudo e reorganizar minha vida.
No início de 2010 descobri da pior forma possível que estava com uma doença autoimune
incapacitante. Foram meses imobilizada, fazendo fisioterapia e, mais tarde, vivendo em cadeira
de rodas. Quando não sentia dores, escrevia e fazia meus podcasts normalmente. Sem poder
trabalhar, meu site foi um alento, era a maneira de continuar com a mente ativa. Perdi os
movimentos das pernas e um pouco da coluna, os cabelos caíram, a pele do rosto e couro
cabeludo foi acometida por psoríase severa.
Quando não sentia dores lancinantes nas articulações, me dava por satisfeita. Só não queria
ficar inativa. Quando a Anvisa liberou no país o medicamento certo para tratar meu problema,
as dores se tornaram controláveis.
Foi um aprendizado. Sendo uma profissional de saúde que cuidava de pacientes especiais,
tive a “chance” de fazer uma pós-graduação de vida aprendendo como é ser um de fato. Hoje
até sou grata por ter passado por isso. Vivia uma rotina insana de trabalho, conciliando como
podia a vida familiar e o lazer. Hoje dou mais valor às relações humanas, aos pequenos gestos, a
uma alimentação saudável e um estilo de vida mais calmo.
E o desfecho foi melhor do que imaginava. Já tinha recuperado os movimentos e voltado a
andar, ainda vagarosamente, quando ganhei o prêmio Mulher Imprensa 2011, categoria Mídias
Digitais. Apesar de nunca ter dado muita bola para premiações na internet, as indicações que
ganhei recentemente de certa forma mostravam que eu estava no caminho certo. E esse prêmio
da Revista Imprensa era o reconhecimento da, digamos, “mídia tradicional” sobre a “mídia
alternativa”, que era o que eu fazia. Achei sempre uma bobagem a tal rivalidade da mídia
tradicional e da internet. Só queria passar meu recado. Mas ser premiada junto com jornalistas
famosas de rádio e TV mostraram que eu podia mais. Meu sonho maior sempre foi ir além de
tudo isso: era melhorar a vida das pessoas. Ter uma ONG no futuro para ajudar idosos e
deficientes a lidar com a tecnologia para melhorar sua qualidade de vida. Ainda desejo isso, tão
logo eu restabeleça a saúde. Quero ser eu mesma a prova de que é possível mudar o modo de
viver para a melhor com a ajuda da tecnologia móvel.

Pouco antes de adoecer, tinha contratado uma agência para redesenhar todo o meu site, o
blog e o podcast, além de fazer uma nova página para minha nova empresa de consultoria em
mobilidade. Já estava com planos de profissionalizar aquilo que até então era um hobby. A
doença interrompeu o novo projeto logo no início, mas serviu para eu refletir sobre que rumos
tomar a respeito de carreira e negócios.
Na época, discutia-se muito a respeito da ética envolvida nos processos de monetização de
blogs e podcasts. Claro que viver disso era o sonho dourado da maioria dos entusiastas dessas
novas mídias, mas eu pensava um pouco diferente. Achava que poderia ganhar dinheiro
disseminando conhecimento, ensinando, ajudando as pessoas, mas sem comprometer a
idoneidade do blog. Não tenho nada contra ações publicitárias em blogs, nem contra os que
vivem disso, mas meus planos eram um pouco diferentes: queria dar aulas, cursos, consultorias
e palestras em empresas grandes e universidades. Como eu ia aceitar ser patrocinada por uma
empresa e no dia seguinte ir a outra e indicar produtos e serviços que por coincidência fossem
dos meus patrocinadores? Por maior que fosse minha credibilidade, eu jamais conseguiria
colocar a cabeça no travesseiro se deixasse qualquer suspeita sobre conflitos de interesses no
ar. Fiz algumas poucas ações e decidi parar. O caminho era outro. E olha que poderia estar
ganhando muito bem com o site no período em que fiquei doente, parada de toda atividade.
Ainda estou em processo de recuperação, e nesses últimos anos, a prioridade deixou de ser a
odonto, a consultoria ou o blog e o podcast. As publicações se tornaram esparsas, os
atendimentos a pacientes idem, pois eu vivia à base de imunossupressores e qualquer infecção
menor me levava ao hospital. Paralelamente, investi pesado em fisioterapia e atividades físicas.
Minha vida é uma luta constante em busca de saúde, pratico corrida, remo e ciclismo e só agora
estou conciliando isso tudo com meu trabalho. Estou voltando aos poucos.
É muito comum que podcasters parem com suas atividades por falta de tempo, de estímulo
financeiro, de apoio e repercussão dos ouvintes. Enfim, desânimo mesmo. Comigo era o
contrário. Nas pausas que era obrigada a fazer no podcast, eu sempre pensava: “na próxima
semana consiguirei”. Nem sempre dava certo, e cheguei a parar por vários meses seguidos.
Também nada adiantaria retomar para parar novamente por mais um par de meses. Preferi
esperar minhas internações se tornaram mais raras e retomei. O motivo maior de não ter
parado para sempre com o podcast foram meus ouvintes. A cada recaída no hospital, entre uma
ou outra crise de choro, de medo do futuro, eram os recados deles que me levantavam. Eram e-
mails, mensagens nas redes sociais e até flores e presentes que chegavam ao antigo endereço
do meu consultório.
Foi aí que eu entendi que as pessoas enxergavam em mim o que até eu tive dificuldade de
assimilar: eu era uma pessoa que só fazia o que gostava. Assim, tudo o que eu fazia era por
paixão. Meus leitores são mais perspicazes que eu. Precisei ouvir da boca de uma coach de
carreira.
“Trabalhe fazendo aquilo que ama, e não passarás sequer um dia da sua vida trabalhando”.
Isso envolve meu trabalho com as mídias digitais. Saber que ajudei alguém ou melhorei o
trabalho e a produtividade de uma única pessoa é minha maior recompensa. Quando chega um
e-mail de alguém dizendo que ouve há muitos anos meu podcast e cita assuntos e experiências
de anos atrás, ou simplesmente diz um “obrigado por tal coisa”, eu ganho o dia. Tenho certeza
de que esse feedback me ajudou até a voltar a andar.
Podcast Café Brasil
Luciano Pires

AS RAÍZES
Começo recorrendo a Érico Veríssimo
“[…] O menos que um escritor pode fazer, numa época de atrocidades como a nossa, é
acender a sua lâmpada, fazer luz sobre a realidade de seu mundo, evitando que sobre ele caia a
escuridão, propícia aos ladrões, aos assassinos e aos tiranos. Sim, segurar a lâmpada, a
despeito da náusea e do horror. Se não tivermos uma lâmpada elétrica, acendamos o nosso toco
de vela ou, em último caso, risquemos fósforos repetidamente, como sinal de que não
desertamos nosso posto.”
Sou um cartunista. Desenho desde que me lembro e publiquei meus trabalhos em jornais e
revistas, mantendo entre 1979 e 1982 uma coluna semanal chamada Vírgula, no Jornal da
Cidade, de Bauru, minha cidade natal, interior do estado de São Paulo.
Eu achava que seguiria a carreira de cartunista numa época em que O Pasquim era o porta-
voz de uma geração desesperada para romper com o passado. Por isso, em vez de Engenharia
fui estudar Comunicação Visual na capital. Quando me formei, comecei a trabalhar por conta
própria na área de comunicação, até descobrir que, como cartunista, eu teria grandes chances
de morrer de fome. Entre 1982 e 2002, deixei de lado os cartuns e textos para seguir a carreira
de executivo, tornando-me diretor de Comunicação Corporativa de uma multinacional de
autopeças, a Dana, onde construí uma bela carreira que terminou em 2008, após 26 anos.
Em 2000, quando eu tinha 44 anos, aconteceram algumas mudanças operacionais na
empresa, que me afetaram profundamente. Eu era diretor de Comunicação e Marketing, e
assisti as áreas de promoção e assistência técnica, que construí com amor e carinho ao longo de
mais de dez anos, sendo destruídas aos poucos após serem transferidas para a área comercial
da empresa. Era uma “decisão organizacional”, que desconsiderava a total incapacidade das
áreas comerciais de pensar no longo prazo e investir em ações intangíveis. Tudo que eu havia
construído seria transformado em descontos – precinho e prazão – para os clientes, sabe como
é? Assistir àquela destruição me fez mal, gerando uma energia negativa que comecei a
somatizar. Decidi escolher. Ou aquela energia me empurrava para uma depressão ou eu a
utilizaria para realizar algo extraordinário.
Escolhi a segunda opção. Tirei férias e fui fazer uma caminhada até o Acampamento Base do
Monte Everest, no Nepal. Essa história, que mudou minha vida, você encontra no livro O Meu
Everest e no meu site www.omeueverest.com.br.
Ao retornar da viagem, achei que podia fazer muito mais do que simplesmente ser um alto
executivo de multinacional. E decidi voltar a escrever sobre temas do cotidiano que me
chamavam a atenção. Qualquer tema. Eu precisava me expressar. Eu queria falar, tocar o
coração das pessoas, queria impactar suas vidas, inspirá-las! Mesmo sem ser um intelectual,
sem diploma de doutor, eu achava que minha experiência de vida podia acrescentar algo às
pessoas. Sem ter onde publicar meus textos – já que o espaço na mídia brasileira não é definido
pela qualidade do conteúdo, mas pela política dos compadres –, passei a remeter por e-mail uma
crônica, toda sexta-feira, para um grupo de amigos que mantinha em meu cadastro.
Eram 300 nomes em novembro de 2001.
Com o tempo, esse rol de amigos foi crescendo. Até que um dia, tentando conseguir
divulgação para meu livro, O Meu Everest, entrei em contato com o radialista Irineu Toledo. Ele,
junto com Alexandre Pelegi e Renata Leite, apresentava um programa chamado Nova Manhã,
na rádio Nova Brasil FM, em São Paulo, com alcance nacional. Por uma dessas coincidências, o
Irineu tinha programado um de meus textos para ser lido no programa. Marcamos um bate-
papo e viramos irmãos no primeiro contato. Tornei-me colunista do programa e a coisa foi
crescendo. Um dia, se não me engano 9 de fevereiro de 2003, um domingo, eu estava em casa
escrevendo com a televisão ligada. Na troca de canais, caí no SBT, no meio do programa do
Gugu Liberato, o Domingo Legal, no exato momento em que Gugu anunciava uma grande
atração. Eram MC Serginho e Lacraia, interpretando a espetacular “Eguinha Pocotó”.
“Vou mandando um beijinho / Pra filhinha e pra vovó / Só não posso esquecer / Da minha
eguinha pocotó / Pocotó pocotó pocotó pocotó / Minha eguinha pocotó…”
Fiquei petrificado com aquilo. Quando a “música” acabou, em vez de o Gugu voltar, soltaram
outro funk, e a coisa continuou.
“Vai, Lacraia, vai, Lacraia, vai, Lacraia, vai, Lacraia…”
Para encurtar: o Gugu não voltou ao palco e outros grupos – de axé, pagode e coisas
parecidas – entraram em cena e cantaram suas músicas enquanto o dançarino Lacraia se
contorcia. Desliguei a televisão. Era demais. À noite, volto, ligo a televisão e pego o final do
programa do Gugu que, exultante, diz algo assim:
“Gente, estou muito feliz, pois esta tarde tivemos um recorde de audiência. E pra comemorar
vou repetir o que passou à tarde”. E botou o Pocotó no ar outra vez…
Fiquei enlouquecido! Como era possível que a então segunda maior rede de televisão do
país, em horário nobre, servisse apenas para transmissão daquele tipo de – desculpem –
“música”?
Indignado, escrevi um texto chamado Eguinha Pocotó. Nele eu dizia da minha perplexidade e
tristeza de ver a televisão transformada numa lixeira, cujo conteúdo era diariamente jogado em
minha sala de jantar.
Publiquei o texto na internet e ele foi lido no programa Nova Manhã, em rede nacional.
Aquilo, a leitura de meus textos pelos radialistas, foi o embrião do que viria a se transformar
no podcast Café Brasil.

O PROPÓSITO
O que aconteceu em seguida determinou o rumo das coisas. Minha caixa postal e a da rádio
explodiram, com e-mails de pessoas tão ou mais indignadas do que eu. E descobri que os
brasileiros queriam discutir e questionar a baixaria. Não estavam satisfeitos com ela. Eram a
maioria silenciosa, refém de uma minoria que, antes da cidadania, da educação ou da cultura,
coloca os interesses comerciais.
Por causa daquele texto, minha lista de 300 amigos pulou para 2.500 em uma semana. Os
brasileiros queriam discutir o emburrecimento do país! E na sequência, o Irineu me convidou
para passar a ler meus textos eu mesmo. Seria a minha voz interpretando meus textos! Achei
aquilo o máximo e corri me matricular num curso de radialista, onde eu faria exercícios de
leitura de textos. Valeu pela experiência, mas o resultado foi um horror…
De qualquer forma, eu estava empenhado em despocotizar o Brasil e precisava mergulhar de
cabeça na missão.
O termo “despocotização” vem de “pocotó”, neologismo inspirado no tal “funk” da Eguinha e
que designa as pessoas que, tendo oportunidade de escolha, conformam-se em permanecer
estagnadas. Consomem sem qualquer cuidado o que a mídia lhes serve, adotam todos os
modismos criados pelos marqueteiros, não exercem pensamento crítico, resistem ao que é novo
e, principalmente, recusam-se a praticar a nobre arte da reflexão crítica. Pocotós são bovinos
resignados. São a massa de manobra dos vendedores. São os acomodados, os que fazem
apologia da ignorância.
O grito que lancei lá em 2003 foi: você acha que o Brasil está ficando burro? RESISTA! E
marquei a posição laçando o livro Brasileiros Pocotó – Reflexões Sobre a Mediocridade que
Assola o Brasil.
A experiência do lançamento do livro, das centenas de palestras que realizei e a repercussão
das entrevistas e encontros deram-me a certeza de que o Brasil precisava multiplicar a
discussão sobre a mediocrização cultural do país.
Eu tinha encontrado um propósito. Ser o agente da despocotização.

O PROGRAMA CAFÉ BRASIL


Chegamos então a 2005, quando eu buscava formas de ampliar o alcance de meu trabalho.
Queria levar para mais gente, buscar meios de falar às pessoas que não estavam conectadas ao
limitado universo da internet. Naquele momento eu já era colunista do programa do Irineu
Toledo, que tinha algum alcance, mas eu queria mais. Levei meus textos gravados para outras
rádios e só ouvi recusas e propostas de mudar o formato, o conteúdo, as músicas, em suma, de
fazer as porcarias que eles estavam acostumados a colocar no ar. Aquilo não me interessava.
Foi quando meu amigo Jackson Dorta sugeriu que eu procurasse a rádio Mundial FM, em São
Paulo, que vendia horários para os interessados e dava independência de conteúdo. Fiquei
curioso e marquei uma reunião com a diretora. Expliquei quem eu era, mostrei meus livros e
disse que queria comprar um horário para colocar um programa no ar, com os mesmos
conteúdos de meus textos. A diretora gostou. Era uma terça-feira e ela disse: “Muito bem,
sexta-feira você está no ar…”
Como assim? Entrar no ar em três dias? Eu estava fazendo apenas uma sondagem, vendo
quanto custava, conhecendo a rádio… E ela me colocava na parede: é pegar ou largar!
É claro que eu topei. Adoro entrar em frias! E numa sexta-feira 13, em abril de 2005, estreei
na rádio meu programa Café Brasil, que era feito ao vivo nos estúdios da própria rádio Mundial.
Sexta feira, 13…
Foi uma experiência louca mesmo. Eu não tinha a menor ideia de como escrever um roteiro,
como separar as músicas, e fiz o que eu sabia. Montei uma palestra de 25 minutos, toda escrita,
e entrei no estúdio com meu laptop e um PowerPoint. Em cada lâmina estava uma parte do
texto, que eu leria como se estivesse palestrando. Levei as músicas num CD, entreguei ao
técnico e entrei no estúdio. Eu não sabia se o material que eu tinha caberia em 25 minutos, não
tinha ideia se o técnico conseguiria soltar as músicas no ponto certo. Mas já que eu tinha
entrado no jogo, vamos lá.
Fiquei nervoso, especialmente com a impressão de que eu não poderia errar. E falei para um
microfone, sem ver o rosto de quem me ouvia. Era algo muito diferente das palestras, sem
reação do público, um formato que me era estranho e profundamente solitário. Foi assim que
me senti: só.
Quando ouço hoje o primeiro programa, fico com vergonha. Um horror. Não no conteúdo,
mas na forma. Se você quiser arriscar, é possível ouvi-lo aqui:
<http://www.portalcafebrasil.com.br/historia-dopodcast-cafe-brasil>.
Passei então a trabalhar bastante para melhorar, chegando a um formato interessante. A
ideia era lançar “iscas intelectuais”, usando meus textos e de meus conhecidos (ou outros que
encontro em publicações e na internet), mesclados com música popular brasileira. Com uma
característica: as músicas teriam que ter relação com o assunto do programa, o que me abriu
oportunidade de tocar qualquer artista. Em nenhum outro lugar você escuta um programa que
começa com Monsueto, vai a Antônio Nóbrega, retorna para Mamonas Assassinas, segue com
André Abujamra, vai pra Villa-Lobos e termina com Tião Carreiro e Pardinho… Uma festa!
Algum tempo antes do programa nascer, eu havia lançado um vídeo na internet, Melô do
Pocotó, que fez muito sucesso com o boneco da Eguinha manipulado pelos bonequeiros da Cia
Truks enquanto cantava e dançava uma versão da música Banana Boat, que Harry Belafonte
transformou num sucesso nos anos 1950. A música pareceu cair como uma luva e a reproduzi
integralmente no primeiro programa. Depois a adotei como uma espécie de vinheta da
introdução, o que acabou se transformando na marca registrada do programa.
E assim foi, por cerca de 60 semanas. Até surgir o podcast.

O PODCAST CAFÉ BRASIL


Ainda em 2005, um conhecido propôs colocar os programas no ar pela internet, num
esquema que ele chamou de Rádio Café Brasil. Era um sisteminha tosco, que tocava os
programas, mas não permitia download. E um dia recebi um contato de uma pessoa que se
gabava de ter baixado todos os programas. Como eu não entendia nada do assunto, especulo
que o nerd usou algo através do “temp” e conseguiu montar uma coleção de programas…
Hummmm… Será que dava?
Um ano e meio após o nascimento do programa, concluí que precisava encontrar uma forma
mais fácil de deixar os programas à disposição das pessoas. Pô, dava um trabalhão, ia pro ar e
depois acabava? Foi quando descobri um tal de “podcast”. E em setembro de 2006 assinei com
o pessoal do www.podbr.com.br, um dos primeiros sites de agregação de podcasts, um contrato
para distribuição do programa Café Brasil. Eles estavam acostumados a produzir e veicular
programas, e eu seria o primeiro que chegaria pronto, apenas para distribuição. Lembro-me de
que no momento em que fechei o contrato comentei com o pessoal da Podbr: “O dia em que eu
tiver 3 mil downloads por mês estarei realizado.”
Quando o primeiro podcast foi ao ar, eu já tinha feito cerca de 70 programas na rádio
Mundial e o Café Brasil era gravado no estúdio do músico Sérgio Sá, que compôs as vinhetas do
programa. Optei por gravar fora da rádio para poder trabalhar melhor os textos, caprichar na
edição, tirar os erros de locução, melhorar o uso das músicas e da distribuição do conteúdo
dentro dos 25 minutos que eu tinha na rádio.
Quem determinou o tempo de duração do Podcast Café Brasil, portanto, foi a rádio Mundial:
25 minutos era o tamanho-padrão. No princípio me incomodou um pouco, pois eu estava
acostumado aos 90 minutos das palestras, mas com o tempo me convenci de que essa é a
duração ideal para um podcast.
E como o podcast continuou sendo distribuído pela rádio Mundial, os 25 minutos tornaram-se
sagrados. Só fui tornar a duração mais flexível cerca de cinco anos depois, quando me convenci
de que quem determina o tamanho do programa é o assunto. Hoje, embora 90% dos programas
continuem com 25 minutos, de quando em quando, lançamos algum especial com duração
maior.
Em 2007, conheci a Ciça Camargo, que assumiu as funções de produtora do programa,
ajudando imensamente a colocar ordem na casa. E também em 2007 conheci o Lalá Moreira
que em seguida assumiu a direção técnica. Lalá vem do rádio e é um conceituado DJ. Sua
rapidez e criatividade nos permitiram um ganho de qualidade e produtividade excepcional.
O Café Brasil é um dos raríssimos podcasts que está pronto para ir ao ar 10 minutos após ser
gravado. Entro em estúdio com o programa escrito e um pen-drive com as músicas escolhidas. E
saio de lá duas horas depois com o programa pronto para ir ao ar. Nunca passou pela minha
cabeça investir tempo na edição do programa, simplesmente porque me convenci desde o início
de que meu valor está na produção do conteúdo, e não na edição. Para isso eu poderia
encontrar gente mais competente que eu, dedicando meus esforços ao que é realmente meu
negócio: conteúdo.
Tenho certeza absoluta de que a decisão de não editar eu mesmo é que fez com que o
programa permanecesse. Eu não teria tempo para gastar 3, 4 ou 5 horas na produção de um
programa. Hoje, entro em estúdio a cada 15 dias e cinco horas depois saio com dois programas
prontos.

A CONTINUIDADE
Em 2007 foram 427 mil downloads. Em 2008, 887 mil. 2009, 1.095 mil. 2010, chegamos aos
1,3 milhões de downloads. E em 2013, quebramos a barreira dos 3 milhões. Um número
excepcional!
Na edição de 2008 do Prêmio Podcast Brasil, o Café Brasil foi escolhido pelo Júri Técnico
como o melhor podcast de Variedades e Entretenimento. E em 2009, na derradeira edição do
Prêmio, conquistamos mais uma vez como o Melhor podcast de Variedades, no voto do Júri e no
do Popular. E fomos o podcast mais votado em todas as categorias.
Em 2010, cheguei a uma compreensão do que é que eu chamo de “Cultura Brasileira”
quando falo do Café Brasil. É diferente do que se convenciona chamar de cultura por aí, e
explica a minha visão para montar cada programa.
Dividi a Cultura Brasileira em quatro blocos:
EXPRESSÃO: o idioma falado, as artes, a mídia, o folclore, a literatura
CIDADANIA: a política, a organização social
EDUCAÇÃO: a escola, a política educacional
COMPORTAMENTO: as relações dos brasileiros com o meio ambiente, com o mundo, a
religião etc.
É nesses quatro blocos que costumo reinar, e eles definem claramente como abordarei os
temas que escolho.

O PROCESSO DE CRIAÇÃO
Tudo começa com uma inspiração que vem de várias formas. Pode ser uma música que ouvi
(como nos programas UM DIA ÚTIL, BOHEMIAN RHAPSODY, STAIRWAY TO HEAVEN ou
ARQUEOLOGIA MUSICAL). Pode ser um filme ou programa de televisão (como no DIE
GEDANKEN SIND FREI ou CHOREI, CHOREI). Pode ser uma carta de um leitor (como nos
programas GRANA, JOÃO BRASILEIRO MÉDIO ou PINXADO NO MURO). Pode ser um artigo
que escrevi na semana (como a maioria dos programas). Pode ser um acontecimento (como
SOLTO NAS RUAS ou NUNCA SERÃO ou ORAÇÃO DA MAÇANETA). Podem ser temas em
discussão na sociedade (como MAIORIDADE PENAL ou ESFRIANDO O AQUECIMENTO
GLOBAL).
A partir dessa inspiração começo a reunir textos meus e de outros autores em arquivos de
trabalho (Word). Até que um dia escolho um arquivo e passo a redigir o programa, tendo em
mente um texto com aproximadamente 14 a 15 mil caracteres, que renderá cerca de 17 minutos
de locução. Para escrever o texto, sigo as minhas orientações pessoais: quero provocar, trazer
uma visão diferente, contestar, desenvolver o espírito crítico das pessoas. Quero chamar a
atenção, surpreender, entreter. Fazer com que as pessoas sintam tudo, menos indiferença. Se o
roteiro não tem esse espírito, salvo num canto e um dia volto a ele para reescrever, até chegar
num ponto que considero bom.
Se pego um assunto que vem sendo muito discutido pela sociedade, vou procurar um ângulo
de abordagem diferente, uma posição original, algo que abra uma nova perspectiva para quem
estará ouvindo. Do mesmo modo, se o assunto é árido, complexo, vou tentar simplificar ao
máximo, de forma que as pessoas compreendam. Afinal de contas, estou apenas distribuindo
uma isca, não é? Não dá para ser profundo em 17 minutos de texto.
Para isso realizo pesquisas em meus materiais de leitura, sites e blogs. E, não raro, alguns
temas rendem mais de um programa em sequência, quando aproveito até mesmo comentários
de ouvintes para abordar novas perspectivas do assunto.
Não me interessa se o ouvinte vai concordar ou discordar de mim. Interessa fazer com que
ele pense a respeito.
Escrevo o roteiro do programa já determinando os locais onde entrarão as músicas, mesmo
sem saber que músicas serão. Para isso é preciso ter alguma experiência com o ritmo da escrita
para rádio, coisa que a gente vai adquirindo com o tempo.
As músicas funcionam como a laranja da feijoada ou o gengibre do restaurante japonês:
quebram o enjoo. Um texto grande e pesado torna-se leve e mais fácil de deglutir quando uma
música surge para aliviar. Mas não pode ser qualquer música…
Depois de pronto o roteiro, vou para o Windows Media Player e começo a explorar meu
arquivo musical. Coloco na busca o tema do programa (por exemplo, a palavra “tempo”) e vou
selecionando as músicas que têm tempo no nome. Coloco também outros termos que tenham a
ver com o conteúdo do programa, e assim vou selecionando 20 ou 30 músicas. Vou também para
o YouTube e o Google em busca de outras músicas que eu não tenha no arquivo. Crio uma
playlist e faço uma primeira rodada de audição, já descartando as que acho que não têm a ver.
Dependendo do clima de abertura do programa escolho a música, e assim vou encontrando uma
a uma, ouvindo, predeterminando o local de entrada ou corte. No final do processo terei
escolhido entre 5 e 7 músicas, que salvarei num pen-drive e levarei no dia da gravação e edição.
Quando considero o roteiro pronto, dou uma última olhada, buscando saber se ele tem
características criativas, excepcionais, únicas e sensoriais. Se tem algo que dará um susto ou
quebrará a previsibilidade. O mesmo acontece durante a gravação.
Pronto o roteiro, subo para um site de trabalho, que compartilho com a minha produtora
Ciça Camargo, que dá uma olhada, corrige algumas coisas, formata o texto e deixa tudo pronto
para a gravação. Vou então para o estúdio, onde faremos a arte de gravar a locução e mixar as
músicas.
A gravação é um caso à parte. O roteiro é lido diretamente na tela de meu laptop, direto do
site de trabalho. Mas não é a leitura mecânica do texto, e sim uma interpretação, que é
interrompida a cada entrada musical. Aliás, a locução é um caso à parte, é o que sempre me
tirou o sono. Como fazer para ler um texto sem fazer com que isso seja excessivamente chato,
impostado, falso e pretensioso? Não achei um jeito, a não ser gravando e ouvindo, gravando e
ouvindo, gravando e ouvindo. Acho que sou o maior ouvinte do programa, buscando criticar as
coisas que podem ser melhoradas. Com o tempo fui pegando o jeito, e a locução acabou sendo
outra marca registrada do programa, embora eu tenha consciência de que muita gente não
gosta, prefere o formato mais livre de outros podcasts de bate-papo.
Fazer o quê?
Muito bem, continuando a gravação, paramos a locução no ponto onde está a marcação de
entrada das músicas e aguardo que o Lalá faça sua arte, para só então seguir a gravação. O
Lalá vai cortar, aumentar as introduções, emendar, mixar músicas, e assim por diante. Enquanto
isso, vou ouvindo e vamos trocando ideias sobre o resultado. Acredito que assim consigo
capturar o espírito da melodia usada, estabelecendo um ritmo, equilibrando o tom da locução
com o da música que vai entrar ou acaba de terminar. E mantendo um certo sabor de “ao vivo”,
que faz toda a diferença. Parece frescura, mas acho que é isso que dá o molho do programa.
Já tentamos fazer diferente, com a gravação de todo o roteiro para posterior edição das
músicas. É muito mais rápido, mas o resultado final deixa a desejar, pois perco as oportunidades
de colocar alguns cacos, de decidir em conjunto com o Lalá e a Ciça, de aproveitar um acorde
ou uma frase da música para enfatizar algum ponto, uma ironia ou até mesmo um silêncio, que
muitas vezes diz mais que as palavras. Isso tudo tem que ser vivenciado durante a gravação-
edição. É ponto de honra.
Além disso, na própria locução estou atento para as entonações que denotam ironia,
desprezo, entusiasmo. E na necessidade do criativo, excepcional, único e sensorial. Não raro, na
fluência da narração, na letra de uma música, num poema, numa mudança de ritmo, numa
vinheta, uma opinião é embutida. Alguns ouvintes têm a perspicácia de sacar essas pequenas
jogadas e é sempre uma satisfação quando recebo um e-mail de um deles comentando aquele
detalhe.
Enquanto gravamos, a Ciça vai acompanhando os cacos e mudanças no roteiro. Depois ela
vai para casa com o programa num pen-drive, que ouvirá para aplicar no roteiro as alterações e
depois publicar no portal.
Tudo pronto e aprovado, liberamos o arquivo para os sites que vão distribuir o programa, o
www.podbr.com.br (que alimenta o iTunes) e o www.portalcafebrasil.com.br. E também
disponibilizamos para as rádios que veiculam o programa. Hoje são cerca de 25 rádios pelo
Brasil.
O RETORNO DOS OUVINTES
A intenção de sempre provocar as pessoas me obrigou a desenvolver uma carapaça que
chamo de proteção emocional. Especialmente com relação aos comentários.
Não raro recebo críticas, de todas as formas. Tem gente que implica com minha voz, outros
com meu estilo de leitura. Tem gente que detesta as músicas que uso. Outros têm argumentos
contrários. Isso tudo me expõe constantemente a críticas, o que por algum tempo foi um
problema. Meu sangue subia e cheguei a entrar em discussões com alguns críticos, até
perceber que isso era parte do processo, que ninguém vai se incomodar em escrever uma
crítica para algo com o que não se importa. Que vários críticos têm um interesse genuíno em
ver a melhora do programa. Que outros criticam por ignorância, enquanto alguns criticam com
argumentações sólidas.
Aprendi que as críticas me ajudam a crescer, e então adotei outro comportamento. Não deixo
barato críticas que julgo injustas ou que demonstrem que a pessoa não entendeu meu ponto. A
esses respondo, mas só até certo ponto. Não entro mais em discussões. Se o assunto pegar fogo,
parto para fazer mais um programa abordando a questão polêmica. Foi assim com aquecimento
global e mudanças climáticas e com maioridade penal, por exemplo.
Sempre que posso, deixo uma recomendação ao ouvinte para que não encare o Café Brasil
de forma maniqueísta, do oito ou oitenta, preto ou branco, cheio ou vazio. Para que o considere
um estímulo, uma provocação. E com o tempo, aprendi como abordar os diversos assuntos.
A “agonia do retorno” também me pegou durante algum tempo: eu produzia o programa e
ninguém falava nada? Na verdade, o “ninguém” nunca existiu, pois o programa foi sequência de
algo que eu já fazia e que tinha algum retorno: os artigos semanais que publico desde 2001. O
retorno do programa de rádio sempre foi próximo a zero, a não ser nas ocasiões em que eu fui
até a rádio para transmitir o programa ao vivo, abrindo o microfone. É possível ouvir o que
acontecia em programas como VERGONHA DE SER BRASILERO
(<http://www.portalcafebrasil.com.br/podcasts/065-vergonha-de-ser-brasileiro-ao-vivo>) ou
FESTA JUNINA (http://www.portalcafebrasil.com.br/podcasts/043-festa-junina-ao-vivo), nos
quais já dá para perceber minha sintonia com o técnico, fazendo o programa ao vivo. Era uma
experiência sensacional, que só parei de fazer quando a rádio mudou o programa da noite da
sexta-feira para a tarde do domingo. Nos programas ao vivo dava para sentir o pulso dos
ouvintes, o que era fascinante.
O outro retorno era o dos e-mails, que sempre foram poucos, o que me incomodou um
bocado e fez com que eu fizesse programas cobrando dos ouvintes o mínimo que eles podiam
fazer: dizer o que estavam achando. Insisti nisso, pois o retorno dos ouvintes era um dos
indicadores de sucesso que eu teria para mostrar para um futuro patrocinador.
Quando surgiu a possibilidade de dar algum prêmio no programa, optei por fazer com que o
ganhador merecesse. Em vez de sorteio, decidi que escolheria um comentário para ser lido no
programa, e como retribuição eu daria um livro de minha autoria. Assim nasceu a leitura do e-
mail da semana, que me esforço para que tenha a ver com o conteúdo do programa.
Com o tempo, o crescimento da audiência e das plataformas de distribuição, o retorno
passou a ser constante, o que me colocou diante de outra reflexão: que tipo de retorno
interessa?
Observando os podcasts de sucesso, reparei que a maior quantidade de retornos era de
afirmações do tipo “first”, “gostei”, “vou ouvir”, “massa”, “ieah!” e outras coisas que, embora
positivas por demonstrar a participação dos ouvintes, pouco agregavam.
Tenho certeza que muita gente deixa de comentar o podcast por achar que tem que escrever
coisas com conteúdo “à altura” do programa, o que é sempre um impeditivo. As pessoas não
querem “passar vergonha”. Sempre que posso, recomendo que comentem usando o coração,
não o cérebro. Textos escritos com o coração são irresistíveis, não há falta de repertório ou
erros de português que apaguem um sentimento sincero e várias vezes usei e-mails escritos
num português errático no programa. O conteúdo era sensacional, e é isso que interessa.
Tenho um orgulho imenso dos ouvintes do Café Brasil, especialmente pela qualidade do que
escrevem. São comentários quilométricos, aos quais as pessoas dedicam um tempo
considerável, a que só posso agradecer. Isso traz uma discussão interessante, comum a todas
mídias: o que interessa mais, a quantidade ou a qualidade dos comentários? Para mim, é a
qualidade, sem dúvida.
Quero ouvintes que provoquem, que exijam de mim, que me obriguem a crescer, a melhorar.
Esse é o círculo virtuoso do programa, aquele em que eu puxo o ouvinte para cima e ele me
puxa também. Todos crescem e a missão é cumprida.
Essa questão ficou clara no dia em que anunciei que criaria uma vinheta da ironia, para usar
sempre que eu colocasse uma ironia no programa. Usei a vinheta pela primeira vez e a reação
dos ouvintes foi impressionante, zangados, dizendo que eu estaria nivelando o programa por
baixo, fazendo pouco dos ouvintes, que descobrir a ironia era parte do desafio de ouvir o
programa etc. e tal. Ficou claro que a audiência é composta de pessoas exigentes, que pensam,
que exercitam o espírito crítico e com as quais eu tenho um compromisso de qualidade que
preciso manter.

O INVESTIMENTO
Quando comecei com o programa, tratei-o como um veículo para divulgar meu nome. A
intenção era distribuir conteúdo para que o nome Luciano Pires ficasse conhecido e assim mais
pessoas contratassem minhas palestras. Era uma ferramenta de divulgação, que me custava
tempo e dinheiro e que traria como retorno o prestígio. E assim foi por muuuuuuito tempo, de
2005 a 2010, pelo menos. Exatamente o que eu imaginava: qualquer pretensão de retorno eu
sabia que só aconteceria depois de cinco anos, quando o programa estaria maduro.
E eu gastei, viu? Chutando baixo, de 2005 até 2010, eu devo ter investido entre compra de
espaço na rádio, pagamento do pessoal (Sérgio Sá e depois Lalá e Ciça), mais a estrutura do
site, ECAD e outras coisas, algo em torno de R$ 250 mil, o que representa R$ 50 mil por ano.
Não é pouco dinheiro, mas eu encarava essa “despesa” como custo de meu marketing, que me
permitiria construir a marca Luciano Pires. E tratava a “despesa” como um investimento na
construção de algo que daria retorno lá na frente, quando chegasse a hora.
O que fiz logo no começo, em busca de apoio, foi recorrer a conhecidos. Durante um bom
tempo o Café Brasil foi anunciado como “Porto Seguro, apresenta…”, o que deu ao programa
um prestígio necessário a quem estava começando. A Porto Seguro pagava exatamente zero
reais pelo patrocínio. Nada. Só emprestou o apoio do nome. Quando o programa cresceu e achei
que tinha bala na agulha para cobrar alguma coisa, eles desemprestaram o nome.
Comercializar, “monetizar” como diz a turma, revelou-se o grande desafio. Eu não tinha
tempo para ficar vendendo, e pouca coisa é tão frustrante quanto você visitar um potencial
patrocinador, anunciar que você é do Podcast Café Brasil e ouvir:
“Pode o quê?”
Essa mídia, o podcast, era (e de certa forma ainda é) algo desconhecido. Como vender a uma
pessoa algo que ela desconhece e nem sabe que precisa?
Eu tinha a opção de tentar a venda no varejo, obter R$ 300 aqui, R$ 500 ali com
patrocinadores que participariam de um programa só, específico. Mas isso demandaria um
esforço imenso e seria um desastre em termos de planejamento. Só me interessavam
patrocinadores que concordassem com contratos de seis meses, de preferência um ano. E fui
tocando até o cinto apertar. Em 2008, eu já não tinha grana para pagar o espaço semanal na
rádio Mundial, e comuniquei a eles que estaria desistindo do horário. A diretora me ligou em
seguida, dizendo que a dona da rádio era tão fã do Café Brasil, que eles gostariam que eu
permanecesse no ar, sem pagar. E o programa continuou no ar até hoje, resultado de um
trabalho feito com qualidade, demonstrando que os esforços em manter um alto padrão
recompensam.
Preparando o terreno para qualificar a audiência e conseguir argumentos para vender
patrocínios para o programa, coloquei no ar uma pesquisa que, com mais de 1.500
questionários respondidos, determinou o perfil médio do ouvinte do Café Brasil: homem, classe
média alta, formação universitária, idade de 30 anos, com ganhos superiores a R$ 4.500,00
mensais. Uma audiência extremamente qualificada, eu diria até apetitosa. Faltava provar para
os patrocinadores que valia a pena.
Mas um dia a hora chegou. Conversando com um conhecido que tinha uma editora, ele me
contou que tinha terceirizado seu departamento comercial para uma empresa que vendia
espaço publicitário em revistas segmentadas. Eles juntavam dezenas de revistas de baixa
tiragem e focadas em mercados específicos e ofereciam às agências de publicidade alternativas
de mídia barata e extremamente dirigida. Eu poderia usá-los como um cavalo de Troia. Quando
eles estivessem na frente de um mídia mostrando pacote de revistas, puxariam um tal de
Podcast Café Brasil e aproveitariam o embalo. No mínimo estariam explicando ao mercado que
existia uma coisa chamada podcast e que o Café Brasil era o canal! Fechei um contrato com eles
que, algum tempo depois, acertaram na mosca. Conseguiram o interesse do Itaú Cultural, que
começou pagando uma banana, para testar a nova mídia. Hoje, três anos depois, o Itaú Cultural
continua como patrocinador do programa, tendo incluído no pacote o Auditório Ibirapuera, num
arranjo que foi bom para todos e que muito me orgulha. Ter um nome importante como Itaú,
seguido do adjetivo “cultural” é mais do que eu poderia desejar. O Itaú Cultural abriu caminho
para que outras empresas se interessassem pelo programa e aos poucos fomos conseguindo
mais patrocinadores.
Mas não dava para “vender reclame”. Isso seria pouco. Desenvolvi então um pacote
mesclando as veiculações no programa com uma página no Facebook, o que se revelou precioso
para conquistar novos apoios. As páginas no Facebook, algumas criadas especificamente para a
ação com o Café Brasil, foram uma surpresa. Além da quantidade de curtidores, conseguimos
colocar na área de comentários das páginas centenas, se não milhares, de ouvintes que
escreviam agradecendo pelo apoio que os patrocinadores estavam dando ao Café Brasil. Isso
aconteceu especialmente com a DKT (facebook.com/dktbrasil), mas também com a Nakata
(facebook.com/componentesnakata) e Pellegrino (facebook.com/pellegrinodistribuidora).
Por outro lado, os “reclames” no programa também eram uma situação delicada. Colocar
onde? De que jeito? Para mim sempre esteve claro que só haveria integração ao programa se as
propagandas fizessem parte do conteúdo, e foi isso que fizemos. Escrevo cada participação dos
patrocinadores de acordo com o tema ou o ritmo do programa, sempre procurando integrar os
assuntos. E coloco no começo e no final do programa, sem interromper o fluxo do conteúdo.
Depois de algumas pesquisas entre os ouvintes, tivemos mais de 95% de apoio ao formato,
tamanho e quantidade de patrocinadores, sem chocar ninguém. Acredito que encontramos o
caminho, mas não sem algumas polêmicas. Ouça o programa GRANA
(<http://www.portalcafebrasil.com.br/podcasts/237-grana>) para conhecer a maior delas.
O volume de comentários, a qualidade dos mesmos e agora a capacidade de mobilizar os
ouvintes para que expressassem sua simpatia às marcas patrocinadoras é um recurso que só os
podcasts têm. Afinal, que empresa já recebeu 500 e-mails de potenciais clientes agradecendo
pelo anúncio que ela veiculou na Globo, no Estadão ou na revista Exame? É exatamente isso que
acontece com os patrocinadores do Café Brasil: o retorno direto de seu público-alvo, na forma e
um simpático agradecimento pelo apoio ao programa que eles ouvem e do qual gostam.
Imagine o impacto que isso causa na área de marketing das empresas, acostumadas a ter
nenhum retorno direto de suas ações?

REFLEXÕES FINAIS
Hoje o Café Brasil está sólido, tendo se transformado numa parte importante das receitas do
Café Brasil Editorial, sem perder a essência. Costumo dizer que se eu pegar o conteúdo do
programa número 1, lá de Abril de 2005, e regravar com os recursos técnicos de hoje, funciona
perfeitamente. Mantive a essência, o propósito, a coerência, e se o programa tem algum
sucesso, isso é parte fundamental, demonstra coerência e clareza.
Outra coisa fundamental: o programa é semanal. Enquanto escrevo estas linhas, estou
publicando o programa 365, sem falhar uma semana. Isso demonstra comprometimento,
seriedade e profissionalismo.
Mais algumas coisas que aprendi:

não me levo a sério. O programa tem uma pegada mais séria, apenas porque a maioria dos
podcasts que está por aí é mais focado na brincadeira, no humor, no papo de bar. Na
comparação com eles, o Café Brasil é “sério”. Mas não acho que seja um programa sério. É
um programa bem-humorado, que trata de temas sérios de forma suave, sem tentar forçar
ninguém a concordar com as ideias apresentadas. Gostou? Muito bem. Não gostou? Muito
bem também. Apenas não fique indiferente.
respeito os ouvintes. Não xingo, não destrato, não ridicularizo. Às vezes dou uma dura
educada, mas é o máximo. Sempre respeito.
tenho uma imensa responsabilidade social. Quando recebi fotos de escolas mostrando a
garotada de 14 anos ouvindo o programa que professores estão usando em sala de aula,
além de emocionado, fiquei assustado com a responsabilidade. Cada vez que abro a boca
no programa, estou falando para dezenas de milhares de pessoas e fazendo cabeças. Não
posso ser um inconsequente.
sou generoso com os colegas podcasters. Mais de uma vez integrei ao Café Brasil podcasts
dos quais participei e que julguei que mereciam ser divulgados para meus ouvintes. Não
tive problema algum em colocar o programa de outra pessoa dentro do meu, convidando
meus ouvintes para que conhecessem o trabalho legal de outros podcasters. Acho que isso
é também uma responsabilidade. Não perdi nada, pelo contrário, ganhei amigos e
possibilitei a meus ouvintes que conhecessem outras propostas.
tenho tentado colocar em meus textos a grande contradição de nossos tempos. Convivemos
com verdades antagônicas. Não existe mais o lado bom e o ruim, assim absolutos,
reconhecidos à primeira vista. Essa distinção está demolida pela complexidade de nossas
vidas, e a mídia tem sido uma das grandes responsáveis. Usando o que já foi chamado de
“pseudoeventos”, ela contribui para criar mitos e dar importância a fatos que antigamente
seriam menores. Esconde-se atrás de uma “liberdade de imprensa” que é intencionalmente
confundida com “liberdade de expressão” e usada para justificar a disseminação da burrice
e de uma realidade mentirosa, que gera reações que a legitimam.

É contra esse estado de coisas que escrevo. E não acho que vou resolver muita coisa
escrevendo, mas pelo menos provoco algumas pessoas a refletir sobre o assunto. Quem sabe o
jovem ouvinte um dia chega à presidência da República? Você acha impossível? Ou vira diretor
da Rede Globo? Ou editor da revista Veja? Ou reitor de universidade? Ou presidente de uma
rede de rádios? Ou diretor de uma grande empresa anunciante? E então se lembra da luta pela
despocotização?
Tá vendo? Eu também tenho esperança.
Escrevo sem freios, com o coração, interessado no debate. Escrevo para provocar reações.
Não estou interessado em provar que estou certo, em ter seguidores ou em ganhar discussões.
E peço que não venham me cobrar coerência. Sou um habitante do novo milênio. Não sei mais o
que é verdade e o que é mentira, apenas desconfio.
Quando muito, reflito. Quando pouco, provoco.
Já se passou um bom tempo desde 2005. E os pocotós continuam, firmes, fortes, cheios de
planos e dominando.
Mas eu sou chato.
O rádio que não é rádio
Leo Lopes

Conheci o podcast em 2008, quando, motivado a fazer um curso de dublagem, buscava na


internet entrevistas do ator e dublador Guilherme Briggs. Foi assim que ouvi meu primeiro
podcast: o “Nerdcast 94 - Max, traga minha capa!”. Naquele momento não poderia imaginar
que em alguns anos aquilo daria um novo rumo à minha vida, tanto pessoal como profissional. Ô
lôco, bicho!
Minha paixão pelo rádio vem desde muito pequeno. Lembro-me de, com 7 ou 8 anos, acordar
cedo para ir à escola sentindo o aroma do café preparado pela minha avó, que sempre me
acordava junto com o som do velho rádio preto de pilha, onde ela ouvia o sorriso do Eli Corrêa,
as histórias policiais do Gil Gomes e as cartas das amigas do Paulo Barboza. Isso depois de ter
ouvido os “causos” e as modas de viola no programa do Zé Béttio.
Cresci influenciado por esses comunicadores do rádio e da TV, bem como pelos humoristas e
comediantes que me fascinavam com suas imitações e vozes: Silvio Santos, Chico Anysio, Jô
Soares, Tatá e Escova, Djalma Jorge, Pardini e Zé Américo eram alguns dos ídolos que
inspiravam minha brincadeira preferida: gravar programas de rádio em uma fita cassete, junto
com meu amigo Quessa, falando besteira e fazendo imitações. Ainda cedo vislumbrei o sonho de
um dia ser radialista e ter um programa de humor no rádio para fazer as pessoas se divertirem.
Mas meu ingresso no rádio se deu tardiamente, aos 30 anos, idade em que geralmente os
locutores já estão firmados em suas carreiras, depois de terem passado vários anos trabalhando
como folguistas (fazendo as folgas dos locutores titulares) e fazendo horários na madrugada, até
conquistarem um horário bacana na emissora. Com tal idade, casado e com dois filhos, seria
inviável começar a trilhar o caminho do rádio do zero, como um garoto de 17 ou 18 anos que
começa a realizar seu sonho. Afinal, eu tinha uma família pra sustentar. Bati em algumas portas,
entreguei alguns pilotos, mas, como não obtive resposta, peguei minha carteira de trabalho com
o registro na DRT recém-carimbado, ainda cheirando a tinta, e guardei na gaveta junto com o
sonho de trabalhar no rádio. E foi assim, enquanto trabalhava como relações públicas no mundo
corporativo, que conheci o podcast.
Aquele Nerdcast desencadeou um processo inexplicável que me impulsionou a baixar todos
os programas publicados até então, para ouvir na sequência. Sinceramente, era melhor e mais
engraçado do que qualquer programa de rádio no ar naquele momento. Durante oito meses eu
não ouvi outra coisa no carro, no trajeto diário de quase três horas entre casa e trabalho.
Comecei gravando os programas em CDs até finalmente comprar um mp3 player automotivo,
pra que pudesse ouvir direto do pen-drive. Em pouco tempo, havia me tornado o que hoje eu
chamo de um “entusiasmado”, algo que ocorre quando o sujeito é picado pelo “bichinho
podcastal” e, sem perceber, já não ouve outra coisa.
Mas esse processo evolui. A partir do primeiro podcast, o “entusiasmado” conhece e passa a
ouvir outros, e outros, e mais outros, e sem notar já está acompanhando quatro, cinco, dez
podcasts diferentes. Chega então o momento mais crítico dessa intoxicação: se não parar a
tempo, a loucura evolui e o “entusiasmado” digivolve para um “entusiasta”, estágio
perigosíssimo, no qual o cidadão começa a pensar: “cara, como eu gostaria de também fazer o
meu próprio podcast”. Aí não tem mais volta.
Claro que isso aconteceu comigo, e foi nessa fase que, empolgadíssimo, fiz a ligação entre o
rádio e o podcast. Por força do (bom ou mau) hábito, eu sempre ouvia os podcasts com ouvidos
de editor. “Ah, aqui tem um fade out.”; “Aqui eles colocaram um efeito mais alto pra esconder a
virada da trilha”; “Ah, aqui eles cortaram a respiração pra dar mais ritmo ao programa”.
Comigo, pensava: “EU CONSIGO FAZER ISSO, e talvez seja um caminho para concretizar meu
sonho de trabalhar com rádio”.
Como já tinha um home studio montado, onde gravava meus freelas de locução, fiz alguns
testes de gravação e edição, convidei meu amigo Quessa a reviver nossa brincadeira de infância
preferida, e assim nasceu o Rádiofobia, na segunda-feira do carnaval de 2009. Nosso primeiro
convidado foi Marcos Aguena, o Japa, meu Padim no mundo do rádio.
Por 17 programas eu fiz como a maioria faz: grava o “flat” do papo e depois edita, fazendo
cortes e emendas, e inserindo os elementos sonoros. Mas meu perfeccionismo me obrigava a
levar de 15 a 20 horas editando um programa de 90 minutos até ficar redondinho como eu
queria. Foi no momento que pensei em parar que uma voz da minha cabeça me deu um esporro
e disse: “MAS VOCÊ É RADIALISTA, PORRA! FAÇA AO VIVO!”.
Nessa hora eu tive uma epifania (se você não sabe o que significa, dá uma olhada no texto do
Luciano Pires aqui mesmo neste livro que com certeza ele explica. Ou não.): eu percebi que o
rádio onde eu sempre quis trabalhar não era o rádio daquele momento, novembro de 2009. O
rádio onde eu gostaria de trabalhar era o rádio dos anos 1980, que já não existia mais.
Explico: na década de 1980, com meus 10, 11 anos de idade eu ainda ouvia rádio, e me
divertia a ponto de fazer dele minha brincadeira favorita. Tinha muito humor, muito conteúdo,
muito papo. O radialista não era só um locutor, era um comunicador, um maestro que regia seu
horário de forma a cativar seu ouvinte. Era divertido, alegre, pra cima. Era algo tão fascinante
que me fez querer fazer daquilo o meu ofício, a minha profissão. Estou falando do rádio em
geral, AM ou FM.
Mas o rádio em 2009 já não era mais assim. Primeiro, porque ficou cada vez mais complicado
ouvir rádio AM, fosse pela dificuldade em sintonizar, pela interferência ou mesmo porque quase
ninguém mais tem rádio com banda AM. E no FM o radialista, salvo raras exceções, deixou de
ser um comunicador pra ser um cara que fica atrás do microfone pra fazer um testemunhal ou
outro entre as músicas previamente programadas por outra pessoa.
A percepção de que o rádio que eu tanto amava de uma certa forma não existia mais mexeu
comigo. E já que trabalhar no rádio, da maneira como eu sempre quis, não era mais possível,
por que não fazer “o meu rádio, do meu jeito”?
A partir daí, tudo mudou. Refiz a estrutura de gravação do Rádiofobia para poder inserir os
elementos sonoros - efeitos, vinhetas e trilhas em tempo real, durante a gravação, e transmitir
via streaming, exatamente como faria se o programa estivesse no ar em uma emissora de rádio!
Troquei as longas horas de edição por algumas horas de gravação improvisando, errando e
acima de tudo me divertindo com meus amigos e convidados.
Foi por isso que passei a falar que o Rádiofobia é um programa de rádio disfarçado de
podcast: porque eu passei a fazer com a dinâmica, a alegria, o espírito do rádio que eu trago
comigo desde sempre. Quando eu digo isso, eu não estou diminuindo o rádio, pelo contrário. Eu
estou exaltando o podcast como sendo O MEU RÁDIO. Entende?
Isso também é resultado das diferenças de característica entre o podcast brasileiro e os
podcasts “gringos”. Enquanto lá fora os programas são mais curtos, geralmente feitos por uma
só pessoa, com uma produção mais simples e focados no conteúdo, aqui no Brasil os podcasts
são mais longos, feitos por grupos de pessoas, com produção mais trabalhada e focados no
papo, bem parecidos com programas de rádio AM.
Talvez por isso, uma forma comum de se explicar para alguém que não conhece o podcast
(forma essa que muita gente discorda, mas eu concordo plenamente) é dizer que “podcast é
como se fosse um programa de rádio, só que na internet”. Se observamos bem, apesar de as
mídias serem bem diferentes, a linguagem é praticamente a mesma. E mais: no podcast temos
liberdade de produção de conteúdo, algo cada vez mais raro no rádio.
Você pode me perguntar se “mídia” não seria a internet, na qual o podcast existe como uma
ferramenta de distribuição de conteúdo, mas me atrevo a dizer que não: o podcast já há algum
tempo tem se transformado em uma mídia, tanto por quem faz como por quem apoia. Vejamos:
Antigamente (e por “antigamente” aqui me refiro a 2005, 2006), quando alguém queria
começar um podcast, não tinha outra opção senão ouvir os que já existiam para se guiar. Os
tutoriais de podcast eram praticamente inexistentes, e os novos podcasters aprendiam tudo na
base da tentativa e erro. Era aceito que a qualidade do áudio fosse “ruim”, uma vez que quem
se dispõe a fazer podcast não precisa ter necessariamente experiência prévia em gravação e
edição.
Mas hoje a situação é bem diferente. Existem tutoriais aos montes, cursos, palestras e até
workshops (TICLIN!) sobre produção de podcasts, com dicas que vão da captação do áudio à
publicação do programa, passando pela edição, hospedagem, preparação da pauta e etecetera.
Com equipamentos de baixo custo e softwares gratuitos, é possível começar um podcast com
qualidade profissional já desde o primeiro episódio.
Isso, aliado a características do podcast, tais como disponibilização de conteúdo sob
demanda, flexibilidade, portabilidade, interatividade, fidelização e engajamento do ouvinte (que
também é um assinante), tornam o podcast atraente para que agências apresentem a seus
clientes planos de mídia que envolvem anúncio em TV, cinema, rádio, TV por assinatura, jornais,
revistas e internet, e dentro desta, o podcast. Assim, é crescente o número de empresas que
querem apresentar seus produtos e serviços aos consumidores dessa MÍDIA.
À medida que a audiência do Rádiofobia foi crescendo, fui conhecendo a história e a evolução
do podcast no Brasil e no mundo, relacionando-me com as pessoas que compõe a chamada
“podosfera” brasileira e me envolvendo cada vez mais com esse meio. Os encontros com os
colegas podcasters nos eventos de mídias sociais passaram a ser ocasiões ansiosamente
esperadas para encontrar pessoalmente as vozes com as quais gravamos o ano todo.
Estranhamente, apesar de estarmos pela primeira vez frente a frente, a sensação sempre é a de
que somos amigos de longa data.
Uma das coisas mais incríveis em se participar de eventos como a Campus Party ou o youPIX
é poder bater papo e trocar ideia com outros podcasters e com nossos ouvintes (que muitas
vezes, e por nossa culpa, já pularam de entusiasmados para entusiastas e não conseguem mais
se livrar dessa cachaça), e descobrir a imensa diversidade de temas, formatos e motivos que
levam esse bando de desocupados a fazer um podcast. Entendedores entenderão.
Existem inúmeras motivações para se começar a fazer um podcast: apresentar um produto
ou serviço; falar sobre um tema que se goste, estude ou entenda; criar um canal para o seu
business; ou simplesmente reunir os amigos para um papo de boteco, estão entre as mais
comuns. Mas independente da motivação, observo que TODOS, sem exceção, estão sempre
buscando melhorar sua atração e aprimorar sua qualidade para assim ampliar sua audiência e
fidelizar ainda mais seus ouvintes. E acredito que seja esse espírito, essa vontade de crescer e
se aprimorar a cada programa, que torna o podcast brasileiro tão atraente.
Acho que, por conta do meu fascínio pelo rádio e a identificação natural com o podcast,
acabei me envolvendo muito mais do que tinha planejado, a ponto de participar ativamente do
“movimento podcastal” atual e me tornar um defensor ferrenho da mídia, de seu potencial e
daqueles que se empenham em fazer um trabalho bem-feito, com garra e dedicação.
Mas em determinado momento, passei a viver um empasse entre a “vida podcastal” e o
trabalho no mundo corporativo que, no final das contas, era a fonte de renda para manter
minha família. E passei a sofrer por isso.
Aqui aproveito para fazer uma urubuservação: até hoje, NINGUÉM ficou rico no Brasil
fazendo podcast. Não, nem o Jovem Nerd. É sério. Então, se esse é o seu objetivo, aconselho
parar agora. Isso, fecha o livro. Tchau, bebê.
Mas se você insiste em continuar lendo, saiba que o podcast pode te dar, sim, uma certa
renda, mas acima de tudo pode servir como uma grande vitrine sua e do seu trabalho.
Dependendo da forma como você conduz o seu programa, capricha na produção, prepara uma
pauta bacana, administra o papo e o ritmo, se esmera na edição, mantém a periodicidade e se
empenha na divulgação, seu podcast pode trazer excelentes oportunidades pra você e sua
equipe. Pelo menos foi isso o que aconteceu comigo. #SOUHUMILDÃO
Felizmente pra mim, aquela picada do bichinho do podcast se espalhou demais, infeccionou e
tomou conta das minhas células, a ponto de, como eu disse no primeiro parágrafo deste texto,
mudar a minha vida. Eu já não tenho cura.
Quando ouvi aquele Nerdcast 94 em 2008, não poderia imaginar que Alexandre e Deive -
Jovem Nerd e Azaghâl -se tornariam meus amigos e um dia ligariam me convidando a assumir a
edição do Nerd-cast.
Quando convidei meu amigo Quessa para gravarmos aquele primeiro Rádiofobia com o Japa,
resgatando nossa brincadeira de infância, não poderia imaginar que um dia deixaria o emprego
em uma multinacional e abriria uma empresa especializada em produção e edição de podcasts.
Quando guardei minha carteira de trabalho na gaveta, com o carimbo da DRT ainda
cheirando a tinta, frustrado por não ter conseguido entrar no rádio, jamais poderia imaginar
que um dia me sentiria plenamente realizado como radialista, trabalhando, feliz, no rádio que
não é rádio.
Alguns papos de gordo
Eduardo Sales Filho

Em 2007 eu morava em Amargosa, uma pequena cidade no interior da Bahia com cerca de
30 mil habitantes. Lá não tinha cinema nem teatro. As únicas formas de entretenimento para
um nerd velho como eu eram a TV via satélite e a internet via rádio.
A velocidade da internet não era das melhores, mas quebrava o galho e me possibilitava
acompanhar as últimas notícias nos sites de cinema, quadrinhos e seriados. Foi navegando em
um desses sites que acabei descobrindo o que era um podcast.
Estava buscando informações sobre Duro de Matar 4.0 (o quarto filme da franquia, estrelado
por Bruce Willis) quando caí em um site chamado Jovem Nerd. Era agosto de 2007 e eles
haviam lançado o “NERDCAST 73 – DURO DE MATAR – YIPEE-KI-YAY!” há poucos dias.
Enquanto lia o post, percebi que havia um player no final da página. Antes mesmo de acabar
minha leitura já havia apertado o PLAY e mergulhado de cabeça naquele universo que viria a se
tornar a minha principal fonte de diversão nos anos que se seguiriam.
Naquela época eu não fazia a menor ideia do que era feed ou de que era possível baixar os
episódios e levar comigo para escutar onde quisesse. Simplesmente sentava na frente do PC,
apertava o PLAY e ficava lá parado, escutando.
Repetia esse ritual duas vezes por semana, a primeira às sextas, para escutar o Nerdcast da
semana, e a segunda nas noites de sábado ou domingo, quando parava para escutar algum
episódio antigo.
Ouvir o Nerdcast me passava a sensação de que estava escutando uma conversa de amigos
em que todo mundo tinha a possibilidade de falar o que achava sobre o tema da semana.
Comecei a enviar e-mails e mensagens de voz pra eles exatamente por isso, porque também
queria dar a minha opinião, me juntar à discussão.
Eu curtia ouvir o Nerdcast, adorava quando meus e-mails eram lidos, mas nem pensava na
possibilidade de produzir meu próprio podcast. Achava que deveria ser difícil demais,
complicado demais. A dificuldade realmente existe, mas só fui descobrir que ela não era tão
grande assim quando conheci um sujeito que se tornaria um grande amigo, Ernesto Belote.
Belote também era ouvinte do Nerdcast e quando escutou um dos meus e-mails lidos no
programa, percebeu que não era o único baiano a curtir podcasts. Ele procurou por mim nas
redes sociais (meio stalker, eu sei) e me achou no Twitter. Sabe aquele papo de que são as más
influências que levam as pessoas às drogas? Pois foi mais ou menos isso que aconteceu comigo
e os podcasts.
Até conhecer Belote, eu não sabia que existiam outros podcasts no Brasil. Ele me apresentou
ao Rapaduracast, Monacast, Escriba Cafe, Filecast, Café Brasil, Guanacast etc. Eu mal havia
acabado a minha maratona do Nerdcast e agora tinha trocentos programas novos para escutar.
Só quando descobri que a podosfera nacional era tão grande assim, que finalmente resolvi
perder o medo e decidi criar meu próprio podcast. Comprei um headset baratinho, fiz download
do Audacity e Belote me passou as primeiras dicas de edição.
Meu primeiro podcast se chamaria Lá Ele e seria feito em parceria com mais três amigos
baianos: Ernesto Belote, Laert Yamazaki e Roberto Câmara Jr. Gravamos um episódio piloto que
Belote demorou quase dois meses para editar. Apesar do programa ter ficado divertido, este
projeto morreu antes mesmo de nascer.
Meu segundo podcast se chamaria MorsaCast e faria parte de um portal de cultura nerd
chamando Mundo Morsa. Ele tinha nome, URL, vinhetas e uma lista de temas definidos, mas
nenhum episódio chegou a ser gravado.
Era o segundo semestre de 2008 e, além dos meus projetos de podcast, eu tinha um blog
criado um ano antes para falar sobre a minha cirurgia de redução de estômago. O Contrapeso
era um projeto pessoal e estava com seus dias contados porque eu sabia que mais cedo ou mais
tarde o assunto tratado ali chegaria ao fim.
Não sei se resolvi criar um podcast pro Contrapeso porque estava entediado ou se
simplesmente queria praticar mais antes de começar o meu verdadeiro projeto, o MorsaCast.
Chamei um grupo de amigos que não fazia a menor ideia do que era um podcast e assim
gravamos o primeiro episódio do Papo de Gordo.
O “Papo de Gordo 01: Infância de Peso – Parte I” foi publicado em 15 de setembro de 2008 e
tinha menos de vinte minutos. Eu havia decidido fazer programas curtos porque achava que
ninguém teria paciência pra nos ouvir falando por mais de meia hora. Curiosamente, antes
mesmo de chegarmos no episódio 10, a duração média do PdG já era de 60 minutos.
Como o Contrapeso era meu blog pessoal, a ideia era que o Papo de Gordo também o fosse.
Eu seria o único integrante fixo no elenco e receberia convidados diferentes em cada episódio,
mas ao final da primeira gravação já estava claro que isso não iria acontecer.
Dudu Sales, Maira Moraes, Lucio Luiz e Flavio Soares formaram uma equipe que funcionava
muito bem. Com a chegada de Conrad Pilchler (PdG 05) e Dr. Tapioca (PdG 09), o time estava
montado. Apesar de eu ser o único do grupo que conhecia todos os outros pessoalmente, isso
não impediu os laços de amizade que surgiram e/ou se fortaleceram durante as gravações.
As amizades também surgiram fora do Papo de Gordo. Não tínhamos nem cinco episódios
publicados quando fomos convidados pelo pessoal do Filecast para participar da segunda edição
do Jabácast juntamente com Eduardo Moreira (Podcast do Eduardo Moreira), Ernesto Belote
(Das Antigas Skatecast), os nerds do Nerd Express e os bêbados do Depois das 11. Eles
montaram um programa onde vários podcasters se apresentavam e compartilhavam as suas
audiências.
Naquele grupo, o Papo de Gordo era o podcast mais recente e com menos ouvintes, mas
ainda assim todos toparam compartilhar suas audiências com a gente. A ideia de ajuda mútua
do Jabácast era muito boa e serviu não apenas para tornar o PdG mais conhecido, mas também
para transformar todos os envolvidos na gravação em bons amigos.
A amizade forjada no Jabácast se fortaleceu através de participações nos podcasts dos outros
e, principalmente, pelos longos papos madrugada adentro. Foi em uma dessas conversas que
surgiu o meu quarto podcast, o SpinOff.
A ideia por trás do SpinOff era simples. Pessoas de outros podcasts se juntariam para formar
um novo programa, sem periodicidade definida, e falar sobre séries de TV. Não lembro se a
ideia veio do Iskilo666 (Filecast) ou do meu xará Eduardo Moreira, mas sei que era muito
divertido participar daquilo.
Depois de gravar praticamente todos os episódios da primeira temporada e diversos da
segunda temporada do SpinOff, acabei me afastando por uma simples questão de falta de
tempo. Além dos compromissos da minha vida profissional como professor universitário, o Papo
de Gordo estava crescendo e demandando cada vez mais dedicação da minha parte.
Como o Papo de Gordo era parte do meu blog pessoal, eu tinha de fazer tudo: montar pautas,
encontrar os convidados, gravar, editar, fazer as vitrines, escrever os posts e ainda atualizar o
Contrapeso com outros assuntos. Era muito trabalho pra uma pessoa só.
O Contrapeso havia crescido e se tornado um blog referência em saúde e tratamento contra
a obesidade ao mesmo tempo em que eu travava a minha batalha pessoal contra a gordura. O
podcast era pra ser apenas uma brincadeira entre amigos, mas acabou se tornando um sucesso
virtual.
Em pouco tempo o Papo de Gordo já tinha se tornado maior que o Contrapeso e impulsionado
de maneira assustadora as visitas do blog. O próximo passo era natural. Em abril de 2009 as
coisas mudaram e o meu blog pessoal morreu para que o Portal Papo de Gordo pudesse nascer.
Longe dos limites impostos pelo formato pessoal do Contrapeso, o novo Papo de Gordo
mesclava informação, diversão, dicas para uma vida mais saudável, e muito bom humor. Com a
ajuda de Maira, Lucio e Flavio, o site passou a ter atualizações diárias e cresceu rapidamente.
Paralelo a essa mudança no Papo de Gordo, eu lancei meu quinto podcast. O Metacast
nasceu depois da Campus Party de 2009. Infelizmente eu não estava no evento, mas vários
amigos podcasters estiveram lá e gravaram um programa especial falando sobre podcasts e a
podosfera de modo geral. Eu achei aquilo fantástico!
Antes de acabar de escutar o resto do programa, eu já sabia que queria fazer um podcast
sobre podcasts! Juntei-me a Pablo de Assis, do Nerd Express e, no final de março de 2009,
lançamos o primeiro episódio do Metacast.
O Metacast tinha vários objetivos e acho que, modéstia à parte, todos foram alcançados.
Além de discutir a podosfera, divulgávamos diversos podcasts novos (em todos os episódios,
indicávamos dois programas diferentes) e dávamos dicas de como melhorar (ou criar) o seu
próprio podcast.
Apesar de ter sido incialmente divulgado no Papo de Gordo e no Nerd Express, o crescimento
do Metacast seguiu um rumo completamente diferente dos demais. Nosso público era formado
por produtores em potencial e não apenas ouvintes. Eles queriam criar seus próprios podcasts e
estavam ali para pegar dicas conosco e com nossos convidados.
O formato do Metacast era simples e bem didático. Como cada episódio tinha
aproximadamente 20 minutos, conseguíamos gravar vários de uma vez e lançá-los ao longo do
mês. O programa era semanal e trazia sempre um podcast mais técnico, um discutindo a
podosfera, outro com os amigos podcasters compartilhando suas experiências na mídia e,
fechando o ciclo, um especial com a leitura de e-mails e comentários dos últimos trinta dias.
Pablo e eu nos tornamos referência no assunto podcast e, na condição de “Metacaster”, fui
convidado para ser o mediador do painel sobre podcasts na Campus Party Brasil 2010. Foi
exatamente nessa mesma época que lancei meu sexto podcast, o Losties.
A ideia do Losties Podcast partiu do Raphael “PH” Santos, um dos criadores do
Rapaduracast. Ele queria criar um programa para acompanhar a última temporada da série
Lost e me convidou pra fazer parte disso.
O conceito era bem simples e incentivava a participação do público. Sempre que um episódio
de Lost era lançado, publicávamos um post no blog pra que o pessoal dissesse o que achou. Os
comentários eram usados como pauta durante a gravação do podcast e o Losties era publicado
um dia antes do lançamento do novo episódio do seriado.
O Losties foi o primeiro podcast que conheci que tinha data para começar e terminar. Ele
seria produzido apenas durante a última temporada de Lost. Dezoito episódios e nada mais.
Como praticamente todo mundo na internet era fã de Lost, o podcast já começou grande. O
primeiro episódio teve mais de cinco mil downloads e o último chegou na casa dos vinte mil
ouvintes. Muitos convidados passaram pelo Losties e, cada um à sua maneira, ajudaram a
tornar o programa ainda melhor.
Mas o que fez o Losties Podcast ser realmente grandioso foram os ouvintes. Milhares de
pessoas faziam centenas de comentários sobre o seriado em nossos “posts-pauta”,
compartilhando impressões e teorias. Eu não tenho o menor pudor em falar que o Losties não
foi apenas um podcast. Aquilo era uma experiência de vida e com certeza mudou/ afetou todos
que fizeram parte disso.
O fim do Losties coincidiu com a criação do meu sétimo podcast se bem que neste caso está
mais para um spin-off -, o Papo de Gordo na Copa. Criado durante a Copa do Mundo de 2010,
a ideia básica do programa era comentar jogos, notícias e curiosidades do mundial de futebol,
seguindo aquele tradicional formato de mesa-redonda que estamos acostumados a ver na TV.
Com um estilo mais despojado e uma edição mais solta (leia-se preguiçosa), o programa
acompanhou todas as sete rodadas do campeonato e retornou durante a Copa das
Confederações de 2013, mas agora com o diferencial de ser gravado ao vivo via Google
Hangout.
Apesar de ter feito um relativo sucesso para um programa novo, a audiência foi menor do
que a do Papo de Gordo regular. Creio que, ao contrário do se diz por aí, nem todo brasileiro
gosta de futebol.
No início de 2013, depois de pensar muito sobre isso, achei que era a hora de criar o meu
oitavo podcast (ou segundo spin-off, se preferirem). Após mais de quatro anos como podcaster,
produzindo duas edições do Papo de Gordo por mês, eu não conseguia me livrar de uma
sensação ruim que vinha me acompanhando já há algum tempo...
Podem perguntar para qualquer podcaster qual a opinião deles sobre o feedback dos
ouvintes, garanto que todos serão unânimes em destacar a importância disso para manter a
equipe motivada em produzir um programa cada vez melhor. É por isso que a esmagadora
maioria dos podcasts brasileiros tem um bloco específico para a leitura de e-mails e
comentários.
Não sei se foi a minha falta de tempo que passou a me impedir de ouvir tantos podcasts
quanto antes, ou se estava apenas de saco cheio disso mesmo, mas a verdade é que comecei a
pular o bloco de leitura de e-mails em todos os programas que escutava, inclusive no Papo de
Gordo.
Foi aí que caiu a ficha... se nem eu ouvia o bloco de e-mails no meu próprio programa, por
que alguém escutaria?
A fórmula de um programa com bloco de e-mails de até 20 minutos após a abertura não me
satisfazia mais. Eu queria dar voz a mais ouvintes ao mesmo tempo em que queria agradar a
aqueles que, assim como eu, pulavam essa parte dos episódios, foi assim que nasceu o Papo de
Gordo Café.
Assim como o Papo de Gordo na Copa, esse programa teria uma edição mais solta (leia-se
preguiçosa), mas serviria como uma continuidade dos episódios regulares. A ideia era bem
simples, um novo podcast seria lançado no dia 10 de cada mês para ler e discutir os e-mails e
comentários recebidos nos dois últimos casts. O diferencial aqui é que, pela primeira vez,
faríamos isso ao vivo.
Escolhemos o Google Hangout como ferramenta para as transmissões e começamos a fazer
testes. Depois da parte técnica definida, era hora de pensar no formato. Se tem uma coisa que
aprendi depois de tanto tempo fazendo e ouvindo podcast, é que o programa precisa começar
bem e terminar bem. Se o “miolo” ficar um pouco monótono ou sem graça, os ouvintes tendem a
perdoar e continuar escutando.
Pra tentar deixar o Papo de Gordo Café mais atraente para o público geral, resolvemos
dividir o programa em blocos. Todo podcast teria uma abertura com aquele jeitinho PdG de ser,
seguido por um quadro novo onde comentaríamos com muito humor alguma notícia relacionada
com o universo gordo. Só depois disso que o bloco de e-mails realmente começaria.
Para incentivar o pessoal a assistir e participar da transmissão ao vivo, criamos o Pergunte
aos Gordos, um bloco dedicado a responder e comentar sobre qualquer coisa que nossos
ouvintes pedissem durante a gravação. Deixamos a já tradicional seção de “Abraços” para o
final e assim conseguimos montar um programa redondinho (em mais de um sentido), que caiu
no gosto dos nossos ouvintes.
O sucesso do PdG Café nos fez trazer de volta o Papo de Gordo na Copa durante a Copa
das Confederações de 2013, mas agora ele também seria gravado ao vivo via Google Hangout.
Com esse formato mais despojado e uma maior interação dos ouvintes, a nova versão da nossa
mesa-redonda futebolística deu tão certo que o seu retorno durante a Copa do Mundo de 2014
já está praticamente garantido.
Cinco anos se passaram desde a criação do Papo de Gordo e, obviamente, o programa mudou
ao longo do tempo. Apesar de manter o mesmo grupo central, diversos convidados apareceram
no podcast. Alguns se tornaram figurinhas carimbadas, como Ernesto Belote, Ricardo Ferro, PH
Santos, Júnior etc... Outros acabaram sendo integrados à equipe, caso de Eubalena.
Foi tanta gente participando do Papo de Gordo que até criamos um prêmio para eleger os
melhores convidados do ano. A disputa é acirrada e rende boas risadas nas redes sociais com os
amigos podcasters provocando uns aos outros enquanto pedem votos.
“Amigos podcasters”. Gosto dessa expressão. Não vou dizer que resolvi criar um podcast
porque precisava de amigos, mas a verdade é que acabei conhecendo muita gente boa graças
ao Papo de Gordo. Seja recebendo pessoas em meu podcast ou participando dos programas de
terceiros, fiz amigos que carregarei para o resto da minha vida. Acabei descobrindo que a
podosfera é um ótimo “lugar” para conhecer gente nova.
A minha paixão pela mídia podcast me trouxe a fama de arroz de festa da podosfera, ou
riceguy, por conta das minhas sucessivas participações em programas diferentes. Diz a lenda
que eu aceito participar até para falar de assuntos que não conheço, como o seriado Chaves,
por exemplo. ;-)
A fama de riceguy é merecida, mas existem bons motivos para isso. Três, para ser exato.
O primeiro, e provavelmente o mais importante, é que eu adoro gravar. Gosto demais de
conversar com os amigos sobre qualquer coisa.
Quando era apenas um ouvinte, ficava imaginando como seria legal se pudesse entrar
naquela discussão também e dizer o que penso sobre o assunto. Se pudesse, adoraria participar
de todos os episódios do Piratacast, Pauta Livre News, WeRgeeks, Na Calçada, Rádiofobia,
Rapaduracast, MRG… basicamente porque são os meus amigos batendo papo e todo mundo
adora jogar conversa fora com os amigos.
Um outro motivo bem mais egoísta e profissional está relacionado a SEO, é uma coisa
chamada link building. Pra resumir de forma bem simples: quanto mais links o seu site recebe,
mais o Google te ama e melhor é a sua posição nos resultados de busca. Então, sempre que
participo de um podcast, estou conseguindo um link novo em folha pro Papo de Gordo, ao
mesmo passo que compartilho o link de volta para o podcast em que fui convidado. É SEO bem-
feito agregando valor pros dois sites.
Já o terceiro motivo pode ser interpretado erroneamente e muita gente acabar me achando
metido a besta ou algo assim, mas vamos lá… eu “debutei” na podosfera com o já citado
Jabácast, uma iniciativa muito legal do Jabour e Iskilo666.
O Jabácast é uma ideia fantástica, mas que não funciona se for usada toda hora. Porém, o
conceito de compartilhar as audiências pode acontecer de outra maneira: com participações em
podcasts de terceiros. Cada vez que apareço num programa diferente, estou apresentando o
Papo de Gordo para um grupo que ainda não me conhece. Por menor que seja este grupo, toda
audiência é bem-vinda e é de grão em grão que a galinha enche o papo! Paralelo a isso, convido
meu público a conhecer um podcast novo. Eles até podem ouvir porque eu estava lá, mas só vão
continuar escutando se os programas forem realmente bons… e assim a troca de audiência
acontece.
Honestamente, não me importo de mandar mais ouvintes do que os que recebi porque – é
aqui que entra a parte de me acharem metido a besta – nem sempre fui “grande”. Na época do
Jabácast, o Papo de Gordo tinha bem menos ouvintes que a maioria dos demais participantes no
programa. Se todos ali foram generosos o bastante para compartilhar suas audiências comigo,
acho justo que eu faça o mesmo com os zilhões de podcasters que estão por aí brigando por seu
lugar ao sol. A minha parte nisso é mínima e limita-se a apenas mostrar para os ouvintes que
existem outros programas por aí e que é muito legal conhecer as novidades e não ficar bitolado
ouvindo sempre os mesmos. Eu abro a porta, mas a pessoa só entra se gostar do que estiver lá
dentro.
Muita gente pode não entender isso, mas encaro a podosfera quase como uma rede social.
São pessoas diferentes, compartilhando histórias e conhecimentos distintos, mas com um
interesse em comum: tornar a mídia podcast cada vez mais conhecida. E se no meio desse
processo ainda der pra fazer novos amigos, melhor ainda.
BIOGRAFIAS

KELL BONASSOLI é graduada em Letras, especialista em Psicopedagogia, escritora desde


sempre e podcaster desde 2011. Escreve sobre podcast na coluna Kellices do
mundopodcast.com.br (antigo Telhacast), também administra o intravenosa.com.br, um blog de
escrita criativa que aceita transfusões artísticas e textuais, além de contribuir com outros
projetos.

BIA KUNZE é consultora em tecnologia móvel, dentista homecare, comentarista da CBN


Curitiba, embaixadora da Evernote. Blogueira, podcaster, palestrante e professora universitária.

PABLO DE ASSIS é psicólogo e podcaster, além de professor e pesquisador de psicologia e


cibercultura. É mestre em Comunicação e Linguagens com uma pesquisa sobre processos
imaginários do podcast. Trabalha também como editor e consultor em tecnologia educacional.
Nas horas vagas é aspirante a escritor, cronista e articulista particular de seu blog “Psicologia,
Tecnologia e Tudo Mais”.

PEDRO DUARTE é jornalista com alergia a jornal, blogueiro e podcaster. Colaborou para a
Superinteressante, youPIX, TechTudo, Vida Simples, guias de viagem e um monte de outras
publicações. Criador do Bacanudo, blog que reúne textos diários, podcasts, vídeos e realiza
festivais trimestrais com personalidades da internet.

LUCIANO PIRES é um profissional de comunicação, cartunista, escritor e palestrante que, à


frente da fertilizadora cultural Café Brasil, distribui Iscas Intelectuais com a intenção de ajudar
a desemburrecer o Brasil. Desde 2005 dirige e apresenta o programa Café Brasil que em 2006
transformou-se num dos mais populares podcasts brasileiros.

CHRISTIAN GURTNER é escritor, pesquisador, roteirista, dramaturgo, produtor de vídeos e


podcasts e piloto comercial de avião.

SERGIO VIEIRA, estudou engenharia elétrica e eletrônica quando ainda se usavam válvulas e
réguas de cálculo, ou seja, é um dinossauro que há mais de 56 anos habita este pequeno planeta
azul. Por crer que a observação da realidade é o resultado do colapso da função de onda de
Erwin Schrödinger (colapso quântico), decidiu aos 48 anos produzir um podcast e não parou
mais.

LEO LOPES é radialista por paixão e Zé-Graça por natureza. É criador, produtor, âncora e
editor do podcast Rádiofobia, no ar desde 2009 como um programa de humor e entrevistas que
procura levar ao podcast a linguagem e o clima do rádio ao vivo. Criou a RÁDIOFOBIA Podcast
e Multimídia, empresa especializada em consultoria, produção e edição de podcasts, e tem
percorrido o Brasil ministrando seu Workshop de Produção de Podcasts. É responsável pela
edição do Nerdcast desde setembro de 2012. <http://about.me/leolopes>

LUCIO LUIZ é jornalista, podcaster, quadrinista e pesquisador acadêmico nas áreas de


quadrinhos, tecnologia (especialmente podcasting) e cultura participativa. Já publicou diversos
artigos científicos ligados a esses temas desde 2009. Seus trabalhos acadêmicos podem ser
encontrados no site www.lucioluiz.com.br.

EDUARDO SALES FILHO é publicitário, professor, podcaster, blogueiro, tradutor, chef amador
e gordo. Divide seu tempo entre o Portal Papo de Gordo e a Virtualnet Marketing Digital, onde
atua como Gerente de Projetos e Coordenador de Mídias Sociais.
Título da Obra
REFLEXÕES SOBRE O PODCAST

Autores
Lucio Luiz, Kell Bonassoli, Pedro Duarte, Pablo de Assis, Sergio Vieira, Christian Gurtner, Bia Kunze, Luciano Pires,
Leo Lopes, Eduardo Sales Filho

© 2014 Marsupial Editora Ltda. Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou
transmitida por qualquer meio (escrito ou eletrônico) sem a prévia autorização por escrito da editora.

Design de Capa
Studio Mói (fale.studiomoi@gmail.com)

Revisão
Leandra Trindade

Produção do arquivo ePub


Rejane Megale

MARSUPIAL EDITORA LTDA.


Caixa Postal 77100
Nova Iguaçu - RJ
CEP 26210-970
www.marsupialeditora.com.br

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
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Reflexões sobre o podcast / Lucio Luiz (org.) . -- Nova Iguaçu, RJ : Marsupial Editora, 2014.

ISBN 978-85-66293-11-1

1. Ambientes colaborativos 2. Comunicação na tecnologia 3. Informação - Sistemas de armazenagem e recuperação


4. Internet (Rede de computadores) 5. Publicações eletrônicas 6. Redes sociais 7. Tecnologia da informação e
comunicação I. Luiz, Lucio.

14-00216 CDD-302.3

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Índices para catálogo sistemático:

1. Podcast : Publicações : Comunicação digital


302.3

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