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FUNDAÇÕES, OBRAS DE TERRA E

MECÂNICA DAS ROCHAS


TAYRA LOPES
PALOMA MORAIS DE SOUZA
MARCUS VINÍCIUS PAULA DE LIMA
5 GEOSSINTÉTICOS E BARRAGENS

INTRODUÇÃO

Neste bloco serão apresentados os geossintéticos, além de tópicos sobre barragens. Em


barragens, serão expostas as suas finalidades, etapas de estudos e projetos, além dos
seus diversos tipos. Serão abordados os elementos básicos e a seção típica de barragens.

Análise e controle da percolação, compactação e tratamento de fundação e análise das


tensões e deformações em barragens também serão tratados. Serão apresentados, por
fim, tópicos em instrumentação de barragens, legislação de barragens, além da
introdução em barragens de rejeito.

5.1 Geossintéticos

Geossintéticos são os produtos poliméricos empregados em obras geotécnicas e de


proteção ambiental (PALMEIRA, 2018). O uso de geossintéticos abrange o reforço ou
estabilização de solos, filtração, separação, contenção em obras hidráulicas, aplicações
em drenagem, barreira para fluidos, controle de erosão, barreira de sedimentos,
barreiras impermeabilizantes, acondicionamento e dessecagem de lodos e lamas,
dentre outras (PALMEIRA, 2018; VERTEMATTI et al., 2015).

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Fonte: ALONSO, 2018.

Figura 5.1 - Seção esquemática de um poço

Há diversos geossintéticos, com distintas funções e normas a cumprir. Os principais


geossintéticos são o geotêxtil (GT), a geogrelha (GG), a geotira (GI), a geocélula (GL),
o geocomposto (GC), o geoespaçador (GS), o geoexpandido (GE), o geobloco ou
geoespuma, geofibra, a geofôrma (GF), a georrede (GN), a geomanta (GA), o geotubo
(GP), a geobarra (GB) e os tubos geotêxteis (PALMEIRA, 2018).

O geotêxtil (GT) é um produto têxtil permeável (Figura 5.2) muito anisotrópico que
tem função de separação, proteção, filtração, drenagem, erosão, reforço e
impermeabilização quando impregnado com material asfáltico (VERTEMATTI et al.,
2015). Este geossintético pode ser classificado como geotêxtil não tecido (GTN),
geotêxtil tecido (GTW) ou geotêxtil tricotado (GTK).

O GTN é um produto composto de fibras ou filamentos distribuídos aleatoriamente


cujas fibras são ligadas mecanicamente por processo de agulhagem (geotêxtil não
tecido agulhado, GTNa) ou as fibras são ligadas durante fusão parcial (GTNt) ou ainda
as fibras são interligadas por uso de compostos químicos (GTNr).

O geotêxtil tecido é um produto composto de fios, filamentos ou laminetes


entrelaçados no sentido transversal (trama) e no sentido longitudinal (urdume).

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Por fim, o geotêxtil tricotado é o produto cujos fios são entrelaçados por
tricotamento (PALMEIRA, 2018).

Fonte: PALMEIRA, 2018.

Figura 5.2 - Imagens ampliadas de geotêxtil tecido (a) e o geotêxtil não tecido (b)

A geogrelha (GG) é um produto em forma de grelha (Figura 5.3) constituída por


elementos que predominantemente resistem a tração, tendo função de separação e de
reforço (PALMEIRA, 2018; VERTEMATTI et al., 2015). As geogrelhas podem ser
classificadas como geogrelha extrudada (GGE), geogrelha soldada (GGB) e geogrelha
tecida (GGW).

A geogrelha extrudada (GGE) é um produto formado por processo de extrusão e


estiramento. Quando o estiramento é realizado em sentido único tem-se geogrelha
unidimensional, que é muito anisotrópica. Por sua vez, quando o estiramento ocorre em
dois sentidos, é confeccionada a geogrelha bidimensional. Ainda há as geogrelhas
multiaxiais, com aberturas em formato triangular (PALMEIRA, 2018).

A geogrelha soldada é constituída por elementos de tração longitudinais e transversais


soldados nas juntas e recobertos por capa protetora. Por sua vez, a geogrelha tecida é
formada por elementos de tração longitudinais e transversais tricotados ou tecidos nas
juntas, sendo geralmente revestidos com capa protetora (PALMEIRA, 2018).

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Fonte: PALMEIRA, 2018.

Figura 5.3 - Geogrelhas uniaxiais e biaxiais (a) e o geogrelha multiaxial (b)

A geotira (GI) é uma tira constituída por feixes de fibra sintética envolta por mais feixes
de fibra sintética ou matriz de material de proteção utilizada como reforço em obras de
solo reforçado (PALMEIRA, 2018). A geocélula (GL) é um produto formado por células
com estrutura tridimensional que confinam os materiais inseridos nelas.

As geocélulas (Figura 5.4) são expandidas na obra e grampos são instalados para manter
os painéis abertos antes da inserção de material nas células (PALMEIRA, 2018). As
geocélulas podem ser empregadas em funções de proteção, controle de erosão e
reforço (VERTEMATTI et al., 2015).

Fonte: PALMEIRA, 2018.

Figura 5.4 - Geocélula

A geobarra (GB) é um geossintético em forma de barra com função de reforço


(PALMEIRA, 2018). O geoespaçador (Figura 5.5) é um geossintético criado para prover
espaços vazios entre estruturas contíguas com função de drenagem (PALMEIRA, 2018).

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Fonte: PALMEIRA, 2018.

Figura 5.5 - Geoespaçador

O geocomposto (GC) é um produto constituído pela associação de um ou mais


geossintéticos. O geocomposto argiloso (GCL) é um produto formado pela associação de
geossintéticos e material argiloso que tem por função a impermeabilização (Figura 5.6a).
Por sua vez, o geocomposto para drenagem (GCD) é constituído por uma associação de
geossintéticos muito utilizados para drenagem em taludes e escavações em aterros
moles para aceleração do adensamento (Figura 5.6b e 5.6c). São também conhecidos
como drenos sintéticos ou drenos em tira (PALMEIRA, 2018).

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(a) (b)

(c)

Fonte: PALMEIRA, 2018.

Figura 5.6 - Geocomposto argiloso (a) e geocomposto para drenagem (b, c)

O geoexpandido (GE) é um produto de baixa massa específica (Figura 5.7c) para


substituir materiais de aterro granulares convencionais com o objetivo de reduzir peso
(PALMEIRA, 2018). O geobloco ou geoespuma é um geossintético constituído por um
bloco de baixa densidade (geoexpandido), contudo suficientemente rígido para
constituir aterros (Figura 5.7a). Apresenta grande aplicabilidade em aterros sobre solos
moles (PALMEIRA, 2018).

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(a) (b)

(c)

Fonte: PALMEIRA, 2018.

Figura 5.7 - Geoblocos em aterro (a), geofibra (b), e geoexpandido (c)

A geofibra é uma fibra sintética para mistura com solo para reforço (PALMEIRA, 2018;
VERTEMATTI et al., 2015). As fibras podem ser disponibilizadas em segmentos ou
contínuas (Figura 5.7b) com importante aplicabilidade em aterro rodoviários, bases de
pavimentos ou como material de reaterro de estruturas de contenção (PALMEIRA,
2018).

A geofôrma (GF) é uma estrutura constituída de geossintético para contenção provisória


ou permanente (Figura 5.8) em obras hidráulicas, para contenção de resíduos e controle
de erosão (PALMEIRA, 2018). A georrede (GN) é uma estrutura em forma de grelha
(Figura 5.9a) para proporcionar vazios, com uso predominante de drenagem, podendo
também ser utilizado para proteção (PALMEIRA, 2018; VERTEMATTI et al., 2015).
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Fonte: PALMEIRA, 2018.

Figura 5.8 - Geofôrma

Geomanta é um importante geossintético que consiste em uma manta sintética para


uso em obra de proteção contra erosão (Figura 5.9b). Quando biodegradável, é
denominado biomanta (PALMEIRA, 2018).

(a) (b)

Fonte: PALMEIRA, 2018.

Figura 5.9 - Georrede (a) e geomanta (b)

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Geomembrana (GM) é um geossintético importante e de grande aplicação prática para
impermeabilização, podendo também ser usado para separação. É um produto com
baixíssimo coeficiente de permeabilidade (comumente 𝟏𝟎−𝟏𝟏 𝒄𝒎⁄𝒔 a 𝟏𝟎−𝟏𝟑 𝒄𝒎⁄𝒔)
que pode apresentar superfície lisa ou rugosa (Figura 5.10a). São fornecidos em rolos ou
painéis de variadas dimensões que devem ser soldados em campo por meio de
procedimentos especiais (PALMEIRA, 2018; VERTEMATTI et al., 2015).

(a) (b)

Fonte: PALMEIRA, 2018.

Figura 5.10 - Geomembrana lisa e texturizada (a) e geotubos (b)

Por fim, geotubo (GP) é um geossintético que consiste em um tubo para utilização em
drenagem, que pode ser produzido com perfurações para compor drenos (Figura 5.10b).
Tem aplicação prática crescente pela facilidade de instalação e resistência a agentes
químicos e biológicos (PALMEIRA, 2018).

Os geossintéticos são testados para determinação das propriedades físicas, mecânicas,


hidráulicas, assim como estão sujeitos a ensaios de desempenho com numerosas
normas a seguir. Maiores detalhes podem ser verificados na literatura específica
(PALMEIRA, 2018; VERTEMATTI et al., 2015).
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5.2 Barragens – Finalidades, Etapas de Estudos e Projetos e Tipos de Barragens

5.2.1 Finalidades

Com a crescente limitação dos recursos naturais e a demanda dos mesmos, tornou-se
essencial que uma barragem tenha múltiplos usos. Dentre os diversos usos, há dois
grupos distintos de finalidades: as barragens de regularização e as barragens de
retenção (ASSIS, 2014).

As barragens de regularização são construídas para regularizar o regime hidrológico de


um rio, proporcionando vazões superiores às naturais em períodos de estiagem. As
barragens que se enquadram nesta finalidade comumente apresentam mais de um uso
específico, como a navegação, o aproveitamento hidrelétrico e os usos consuntivos.

Para uso específico da navegação, é desejada a regularização do período de estiagem à


jusante e o afogamento de corredeiras e cachoeiras à montante. Por sua vez, os usos
consuntivos englobam o abastecimento urbano e rural, a agropecuária e o uso
industrial.

As barragens de retenção têm como usos específicos a retenção de sedimentos ou


resíduos industriais ou ainda o amortecimento de cheias. Neste caso, a onda de cheia é
temporariamente armazenada para não causar danos à jusante, e posteriormente o
volume é liberado (ASSIS, 2014). O uso múltiplo em barragens de retenção não é sempre
possível.

5.2.2 Etapas de Estudos e Projetos

Os estudos e projetos para implantação final de uma barragem são divididos em quatro
etapas, que objetivam a otimização da bacia hidrográfica: a etapa de Inventário, de
Viabilidade, o Projeto Básico e o Projeto Executivo.

Na etapa de inventário são realizados os primeiros estudos em uma bacia hidrográfica.


Nestes estudos é caracterizado o potencial da bacia e é determinada a melhor divisão
de queda da bacia hidrográfica. A divisão de quedas consiste em dividir a bacia em
trechos do rio de 1 a 5km para aproveitamento múltiplo, que podem ser de micro
(MCH), de pequeno (PCH) e de médio a grande porte (UHE) em função da potência a ser
instalada, como se segue (MAGELA, 2015):

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 MCHs: com potência instalada menor que 1,0MW, de acordo com a
Resolução nº 395, de 4 de dezembro de 1998, da Aneel (MAGELA, 2015);

 PCHs: com potência instalada entre 1,0MW e 30,0MW, de acordo com a


Resolução nº 652, de 9 de dezembro de 2003, da Aneel (MAGELA, 2015);

 UHEs: com potência instalada maior que 30MW.

O inventário fornece, para cada local, as características de aproveitamento e as


estimativas de custo, com erro de, aproximadamente, 20% do valor final. Contudo, no
inventário, ainda não é definido precisamente o eixo. Apenas para ilustrar, na Figura
5.11 e 5.12 é apresentada a alternativa selecionada para a divisão de queda do rio Teles
Pires (MT) a partir do inventário concluído em 2005 (MAGELA, 2015).

Fonte: ANEEL, 2005.

Figura 5.11 - Alternativa selecionada da divisão de queda do Rio Teles Pires (MT)

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Na etapa de inventário são determinadas as limitações físicas, como a localização de
cidades, estradas, parques nacionais e indígenas, Áreas de Proteção Ambiental (APAs) e
sítios arqueológicos. Os estudos necessários são baseados em dados topográficos,
topobatimétricos, hidrométricos, geológicos, geotécnicos e ambientais da bacia
hidrográfica (MAGELA, 2015).

O estudo de viabilidade apresenta duração de 1 a 2 anos, podendo estender-se quando


a área de estudo é mais complexa. Trata-se de uma análise técnico-econômica dos
possíveis eixos dentro do trecho do rio determinado no inventário e a escolha do melhor
eixo, além da definição do arranjo geral.

São realizados estudos que objetivam a elaboração do EIA/RIMA e a obtenção da Licença


Prévia, além de definidos o melhor eixo, o arranjo geral e a comprovação técnico-
econômica do conjunto. Resumidamente, o estudo de viabilidade trata das seguintes
inviabilidades para projeto:

 Condição da fundação - Fuga geológica (rochas carbonáticas), área de


empréstimo.

 Fuga topográfica - Análise de fechamento do reservatório, ou seja, se há


vertentes suficientes para fechar o reservatório.

 Instabilidade - Instabilidade dos taludes naturais no entorno do


reservatório. O carreamento de material geológico pode assorear o
reservatório e a onda gerada pode provocar galgamento.

 Assoreamento do reservatório - O quartzo que compõe a parcela granular


do solo provoca danos na turbina dando-a aspecto de queijo suíço.

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Fonte: EPE, 2009.

Figura 5.12 - Locais selecionados para divisão de queda do Rio Teles Pires (MT)

Durante o projeto básico devem ser conhecidas todas as condicionantes de projeto.


Nesta etapa são realizadas:

 A definição final da obra;

 Os memoriais descritivos e as especificações técnicas;

 O dimensionamento final com plantas e cortes das estruturas e equipamentos


permanentes;

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 O orçamento final;

 O projeto que será utilizado para licitação;

 O cronograma de execução da obra.

Durante o projeto básico, é necessário ter clareza quanto à geologia estrutural da área,
pois quase todo local candidato à construção de uma barragem é geologicamente
conturbado (CRUZ, 1996). Além das sondagens à percussão e sondagens rotativas,
devem ser executadas trincheiras exploratórias, poços e galerias para detectar aspectos
geológicos não detectados previamente. O estudo hidrogeológicos das fundações e
ombreiras é de fundamental importância para prever os tratamentos necessários (CRUZ,
1996).

Devem ser computados os volumes de material para a barragem, acampamentos,


estradas, alojamentos e desvios do rio. A falta de previsão das áreas de empréstimo de
solos, pedreiras e depósitos de areia pode comprometer o projeto de um barramento.
O material de empréstimo disponível apresenta impactos na compactação, pois solos
úmidos podem gerar problemas de produtividade e solos muito secos exigem recursos
adicionais para umedecimento (CRUZ, 1996).

Alguns equipamentos especiais devem ser previstos no projeto básico e nos


documentos de licitação, como fresas para execução de cortinas e parede diafragma em
rocha. Caso os equipamentos especiais não sejam previstos no projeto básico, podem
inviabilizar a solução proposta ou onerá-la significativamente (CRUZ, 1996).

Além dos problemas geotécnicos, é necessário considerar os problemas sociopolíticos e


econômicos envolvidos. Deve-se ressaltar que, se os custos reais estipulados no projeto
básico forem muito acima do economicamente aceitável, é preferível não executar o
empreendimento a apresenta-lo a custos fictícios que tornem a obra mais
antieconômica e a um alto custo social injustificável (CRUZ, 1996).

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No projeto executivo são apresentados os detalhes para a execução de obras civis, os
detalhes das montagens de equipamentos permanentes, detalhes da fiscalização, do
teste de funcionamento e orientação para treinamento de operadores (ASSIS, 2014).

Além dessas pesquisas que antecedem a execução da obra ou a sua finalização, há


outros estudos e projetos que devem ser elaborados. Exemplos destes estudos são o as
built, os manuais de operação e o as is.

O as built é um relatório do processo de construção, portanto, a adequação do processo


executivo durante a execução da obra. Apesar da possibilidade de alterar o projeto
executivo em campo, soluções alternativas só devem ser consideradas se achados
desconhecidos na fase de projeto básico forem observados durante a obra.

Por sua vez, os manuais de operação são essenciais por apresentarem o cenário de
comportamento dos equipamentos e instrumentação da barragem. Por fim, o as is é um
estudo de como foi realizada a obra, normalmente necessário para obras que não
apresentam o as built.

5.2.3 Tipos de Barragens

As barragens podem ser classificadas quanto ao tipo de seção em barragens


convencionais e não convencionais (ASSIS, 2014). As barragens convencionais são
classificadas como barragens de terra, de enrocamento, de concreto, mistas e de rejeito.
As barragens não convencionais são classificadas como barragens em gabião, de
madeira e de alvenaria de blocos de rocha.

Os fatores que interferem na escolha do arranjo geral de uma barragem são as


condições topográficas locais; o apoio logístico em fase de construção; a possibilidade
de evacuação de cheias durante a construção; a disponibilidade de material de
construção; as condições geológicas e geotécnicas gerais; a potência instalada; a
descarga calculada para o vertedouro; e os resultados dos estudos realizados (ASSIS,
2014).

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Dentre esses fatores, o arranjo geral é muito influenciado pelo tipo de vale. Os vales
fechados (encaixados e estreitos), comumente em rocha sã, são propícios para
construção de barragens de concreto do tipo arco. Nos vales semi-encaixados
comumente são construídas barragens do tipo gravidade com contrafortes ou barragens
de enrocamento. Por fim, nos vales abertos são construídas barragens do tipo gravidade
de concreto compactado com rolo (CCR) e barragens de terra.

Fonte: CRUZ, 1996.

Figura 5.13 - Barragem de Itumbiara. Seção homogênea com pseudo-núcleo

As barragens de terra comumente apresentam grande volume, taludes suaves e seção


transversal com grande área de base. A base alargada é necessária para distribuir a
tensão e aumentar a seção de percolação, diminuindo o gradiente hidráulico. Em
barragens de terra a estabilidade é proporcionada pelo peso próprio, que deve ser
suficientemente grande. Além disso, as barragens de terra são executadas em locais cuja
fundação não é suficientemente competente e/ou apresenta maior deformabilidade, o
que é incompatível com a implantação de barragem de enrocamento ou concreto.

As barragens de terra podem ser classificadas como homogêneas e zonadas. A barragem


homogênea refere-se àquela que é constituída por único material, apresentando
pseudo-núcleo (Figura 5.13) com compactação acima da ótima para obter menor
permeabilidade (CRUZ, 1996). Nela, há outros materiais incluídos em sua seção que são
essenciais à drenagem e à proteção dos taludes (ASSIS, 2014). A barragem zonada ou
zoneada é um tipo de barragem de terra em que não há predominância de material
(Figura 5.13). A escolha entre seção zonada e homogênea é determinada pela
disponibilidade de material e custo associado.
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Fonte: ROMANINI, 2020.

Figura 5.14 - Seção zonada ou zoneada

As barragens de enrocamento são construídas quando há predominância de material


rochoso na região. Elas são estáveis pelo peso próprio, mesmo sendo sujeitas a força
hidrostática. Contudo, deve-se ressaltar que as barragens de enrocamento podem não
ser estáveis em galgamento.

Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.15 - UHE Itá, barragem de enrocamento com face de concreto

18
As barragens de enrocamento devem ser compactadas em camadas de 0,80m a 1,20m.
Quando compactado, o enrocamento é menos deformável e mais resistente. A
compactação do enrocamento tem permitido a construção de barragens de
enrocamento com face de concreto ou núcleo argiloso com altura de 200m ou até de
maiores alturas (CRUZ, MATERÓN, FREITAS, 2014).

Fonte: ROMANINI, 2020.

Figura 5.16 - Barragem de enrocamento com face de concreto

As barragens de enrocamento podem ser classificadas quanto à estrutura que provoca


o estanqueamento para o talude de jusante como barragem com face de concreto
(Figura 5.15 e 5.16) com núcleo de aterro (Figura 5.17, 5.18 e 5.19), com núcleo asfáltico
(Figura 5.20) ou barragem de enrocamento com face de concreto asfáltico (Figura 5.21).

19
Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.17 - UHE Corumbá, barragem de enrocamento com núcleo impermeável


de argila

Fonte: MAGELA, 2015.

Figura.5.18 - UHE Nova Ponte, barragem de enrocamento com núcleo impermeável


de argila

20
Fonte: CRUZ, 1996.

Figura 5.19 - Seção de barragem de enrocamento com núcleo impermeável de argila

Fonte: MAGELA, 2015: ROMANINI, 2020.

Figura 5.20 - Barragem de enrocamento com núcleo asfáltico (a) e UHE Foz do
Chapecó, seção de barragem de enrocamento com núcleo asfáltico (b)
21
Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.21 - Barragem de enrocamento com face de concreto asfáltico em Glarus, na


Suíça

As barragens de concreto podem ser classificadas em barragem de gravidade de


concreto convencional (CCV), barragem de gravidade de concreto compactado a rolo
(CCR) (Figura 5.22) e barragem do tipo abóboda (Figura 5.23). Na barragem de concreto
compactado a rolo (CCR), o concreto é espalhado e compactado, o que acelera a
execução.

Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.22 - Barragem de concreto compactado a rolo, CCR

22
(a)

(b)

Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.23 - UHE Funil, barragem de concreto do tipo abóboda ou arco (a, b)

23
Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.24 - Barragem de concreto compactado a rolo, CCR

As barragens mistas podem ser constituídas de terra e enrocamento, enrocamento e


concreto ou qualquer outra combinação das demais.

5.3 Barragens - Elementos básicos

Uma barragem para retenção ou regularização contém todos ou alguns dos seguintes
elementos básicos: ensecadeira (no início da construção ou incorporada a ela); tomada
d’água; vertedouro e estruturas dissipadoras; canal de adução; canal de restituição ou
de fuga; eclusa; casa de força; rip rap; filtro; e núcleo.

5.3.1 Ensecadeira

As ensecadeira são as estruturas responsáveis pelo fechamento do rio para construção


da barragem (Figura 5.25). São estruturas complexas que envolvem a Geotecnia e a
Hidráulica. Em geral uma ensecadeira é provisória, devendo ser projetadas para uma
vazão de rio correspondente a um período de recorrência de 25 anos.

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Na maioria dos casos, as ensecadeiras envolvem um trecho sobre a margem do rio e
outro sobre o leito. No trecho da margem do rio, a ensecadeira comumente é construída
sobre aluviões, que podem conter bolsões de areia, solos silto-arenosos, silto argilosos
e solos moles. No trecho sobre o leito do rio pode haver rocha; cascalho; areia fina e
fofa; presença de depressões da rocha preenchidas por areia; blocos de rocha; ou argila
mole (CRUZ, 1996). O problema torna-se mais grave devido à falta de conhecimento da
fundação antes da execução da ensecadeira.

Caso não sejam bem projetadas, as ensecadeiras podem consumir os melhores


materiais de construção disponíveis com prejuízos para a obra definitiva (CRUZ, 1996).
Por isso, para sua execução, podem ser usados blocos de arenito ou basalto
potencialmente desagregáveis e a vedação externa pode ser executada com qualquer
tipo de solo.

O reaproveitamento dos materiais da ensecadeira é chamado de “canibalização”, como


ocorreu em Tucuruí (CRUZ, 1996). A incorporação parcial das ensecadeiras à barragem
pode ser uma opção mais econômica e recomendável. Contudo, neste caso, os
requisitos de segurança da barragem devem ser cumpridos para a construção da
ensecadeira (CRUZ, 1996).

Fonte: ASSIS, 2014.

Figura 5.25 - Ensecadeira

25
Nem sempre há, na obra blocos de rocha, dimensões recomendadas pelos estudos
hidráulicos. Neste caso, pode-se confeccionar blocos especiais de concreto. Além disso,
durante a execução de uma ensecadeira, pode haver dificuldade de dragagem com
variações bruscas do gradiente de percolação. O material sob a ensecadeira e as
vibrações causadas pelos equipamentos podem criar condições favoráveis à liquefação
de areias. Também há a possibilidade de ocorrência de piping.
As etapas da construção da ensecadeira no trecho de leito do rio são as seguintes (CRUZ,
1996):
 Execução da pré-ensecadeira: solo ou rocha é lançado quando a vazão do
rio é baixa, ou seja, no período de estiagem (b).
 Observe a Figura 5.26.
 O alteamento é executado totalmente a seco ou com parte submersa e
parte a seco. O solo ou enrocamento que é utilizado para o alteamento
deve ser compactado.
É fundamental que entre a vedação e a pré-ensecadeira seja executada uma
transição. Uma falha da transição pode resultar em piping, como ocorreu em Tucuruí
(CRUZ, 1996). O desvio do rio também pode ser realizado por túnel.

(a)

(b)

Fonte: CRUZ, 1996.

Figura 5.26 - Pré-ensecadeira e alteamento sem transição (a) e com transição (b)

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5.3.2 Tomada de água
A tomada de água é uma estrutura de transição entre um escoamento livre, sujeito à
pressão piezométrica nula do reservatório, e um escoamento forçado, em seção sempre
fechada e completamente cheia. O escoamento na tomada de água deve afluir à
velocidade mínima possível para limitar a perda de carga e obter o melhor rendimento
da turbina (MAGELA, 2015).

A tomada de água pode ser classificada em tomada de água em torre ou em seção


gravidade. A tomada de água do tipo torre é posicionada no lago, não sendo incorporada
à barragem (Figura 5.27).

(a) (b)

Fonte: ELETROBRÁS, 2007 (a); ESPADA, MENDES e OLIVEIRA, 2011 (b)

Figura 5.27 - Esquema de tomada de água do tipo torre (a) e vista lateral de
tomada de água do tipo torre (b)

Torre em seção gravidade (Figura 5.28) funciona como parte da barragem, mas pode
estar ou não integrada ao corpo da barragem (MAGELA, 2015). Na face de montante,
são dispostas grades de proteção.

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5.3.3 Canal de adução

Canal de adução é o canal que conduz o escoamento de aproximação à tomada de água,


prevenindo de formar-se o escoamento turbulento (Figura 5.29). O escoamento até a
tomada de água deve ser subcrítico, hidraulicamente tranquilo, bem acomodado às
superfícies de contorno para minimizar a formação de vórtices - característicos de
regime turbulento – e perdas de carga (MAGELA, 2015). Todo o esforço para garantir o
regime laminar deve-se ao fato de que grande gradiente hidráulico e escoamento
turbulento podem causar danos aos sistemas hidráulicos.

(a)

(b)

Fonte: Adaptado de Magela 2015.

Figura 5.28 - UHE Itaipu, tomada de água em seção gravidade cuja localização é
indicada por seta vermelha (a) e tomada de água em seção gravidade da UHE Tucuruí
(b)
28
5.3.4 Túnel de adução
O túnel de adução representa a ligação mais curta possível entre a tomada de água e a
casa de força (Figura 5.30). Trata-se de um conduto forçado no qual o revestimento é
necessário apenas no trecho em que a rocha não é suficientemente competente ou a
cobertura não é suficiente.

Fonte: adaptado de MAGELA, 2015

Figura 5.29 - UHE Itaipu, canal de adução indicado por seta vermelha, que antecede
o vertedouro

Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.30 - Esquema de túnel de adução, referido como “conduto forçado”

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5.3.5 Casa de força

A casa de força é onde a energia mecânica é transformada em energia elétrica. Ela pode
ser classificada como casa de força subterrânea (Figura 5.31) ou casa de força exterior
abrigada, semi-abrigada ou desabrigada (Figura 5.32).

(a)

(b)

Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.31 - UHE Paulo Afonso IV, casa de força subterrânea (a, b)

30
Sob o ponto de vista do barramento, a estrutura da casa de força pode fazer parte do
corpo, estar no pé ou estar isolada da barragem (Figura 5.33). Os transformadores
podem ser instalados dentro ou fora da casa de força em função das particularidades de
cada caso (MAGELA, 2015).

(a)

(b)

Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.32 - UHE Itumbiara, casa de força abrigada (a, b)

31
Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.33 - UHE Tucuruí, casa de força no pé da barragem

5.3.6 Canal de fuga

Na saída da turbina, tem-se o tubo de sucção e, à jusante dele, tem-se o canal ou túnel
de fuga. Por meio do canal de fuga a vazão turbinada é restituída ao rio (Figura 5.34). O
canal ou túnel de fuga tipicamente é um conduto não forçado, excetua-se quando a
turbina precisa de uma contrapressão para evitar cavitação, como em Paulo Afonso IV,
figura 5.31 (MAGELA, 2015).

Fonte: ANA, S.D.

Figura 5.34 - Canal de fuga

32
Equivalente ao canal de fuga, o canal de restituição escoa ao rio a vazão do vertedouro.
O canal de restituição deve ser perpendicular ao vertedouro para não haver erosão no
canal (Figura 5.35).

Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.35 - Canal de restituição

5.3.7 Vertedouro

O vertedouro é a estrutura do aproveitamento hidrelétrico para extravasar o volume


das cheias que possam exceder a capacidade de armazenamento do reservatório,
objetivando proteger a barragem contra o galgamento (MAGELA, 2015). Ou seja, o
vertedouro é a estrutura empregada para evitar que o nível de água máximo
maximorum (Figura 5.36) do reservatório seja ultrapassado em galgamento.

Os aspectos topográficos e geológicos condicionam a escolha do tipo de vertedouro. As


estruturas dos vertedouros compreendem cinco elementos distintos: o canal de
entrada, a estrutura de controle, a calha de descarga, o dissipador de energia e o canal
de restituição do escoamento à calha do rio (já tratado no item anterior).

Os vertedouros podem ser posicionados no corpo do barramento principal, na lateral ao


barramento ou em estruturas separadas do barramento, como nas ombreiras (MAGELA,
2015). Os vertedouros podem ser classificados como vertedouros de superfície ou
vertedouros de fundo.

33
Os vertedouros de superfície podem ser livres ou controlados por comportas e
permitem o rebaixamento do reservatório até a sua crista. Os vertedouros de fundo são
necessariamente controlados por comportas e permitem o esvaziamento total ou
parcial do reservatório.

Figura 5.36 - Nível máximo maximorum.

Instalar dissipadores à jusante do vertedouro é essencial para diminuir a energia com


que a água é restituída ao rio, prevenindo erosão do leito. Exemplos de estruturas
dissipadoras são os saltos de esqui, as bacias de dissipação e os degraus dissipadores.

Fonte: Magela 2015.

Figura 5.37 - Canal de restituição

34
No salto de esqui, a energia cinética do escoamento é aproveitada para lançar o jato e
fazer com que a energia seja dissipada longe do vertedouro e das demais estruturas do
barramento. No salto de esqui a energia é dissipada em três etapas: na fase aérea do
jato; pela resistência do ar; no contato com a água à jusante que está em repouso; e na
estrutura à jusante, após o impacto (MAGELA, 2015).

Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.38 - Vertedouro em salto de esqui

35
Na estrutura à jusante, comumente constituída pelo maciço rochoso, há o
desenvolvimento de fossa de erosão (Figura 5.39). Quando a fossa é rasa, o gradiente
de pressão é elevado e o maciço rochoso defletirá o jato. Quando há planos de
estratificação, falhas e fraturas no maciço rochoso, a erosão desenvolve-se por
fraturamento. Por sua vez, quando não há planos para essa pressão propagar, ela fica
confinada na zona de impacto do jato e a ação é mais intensa, com erosão concentrada
(MAGELA, 2015).

Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.39 - Erosão à jusante do vertedouro

Nas bacias de dissipação, a dissipação de energia ocorre na estrutura de concreto por


meio do ressalto hidráulico (Figura 5.40). Ressalto hidráulico é definido como a brusca e
turbulenta passagem do escoamento de um estágio de energia baixo, abaixo da
profundidade crítica, para um estágio de energia alto, acima da profundidade crítica,
com a velocidade mudando de supercrítica para subcrítica. Portanto, no ressalto, há um
violento impacto com abrupto aumento do nível de água na região do impacto entre o
escoamento rápido e o lento (MAGELA, 2015).

36
As bacias de dissipação podem ser de quatro distintos tipos: bacia tipo I a tipo IV (Figura
5.41).

A bacia tipo I é livre sem blocos. Nela não há necessidade de nenhum dispositivo
complementar, devendo-se apenas garantir a horizontalidade da bacia e a sua proteção
em um trecho com comprimento maior do que quatro vezes a profundidade de jusante
(MAGELA, 2015).

Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.40 - Ressalto hidráulico

A bacia do tipo II contém blocos de queda e soleira de saída denteada para número de
Froude (𝑭𝒓) ≥4,5 e velocidade de aproximação maior do que 𝟐𝟎 𝒎⁄𝒔.

A bacia do tipo III contém blocos de queda, blocos de amortecimento e soleira de saída
para número de Froude a montante (𝑭𝒓) ≥4,5 e velocidade de aproximação menor do
que 𝟐𝟎 𝒎⁄𝒔, sendo uma bacia compacta.

A bacia do tipo IV apresenta blocos de queda e soleira de saída. É adequada para


pequenos canais de drenagem. Este tipo de bacia não é adequado a barragens por
apresentar baixa eficiência, podendo ocorrer ondas não controladas a jusante (MAGELA,
2015).
37
Os degraus dissipadores são estruturas com vários degraus que dissipam energia através
do impacto do jato de água com a estrutura e através da formação do ressalto hidráulico
em cada degrau (Figura 5.42). Para que haja ressalto em cada degrau é necessário que
o espaçamento entre cada um deles possibilite essa ocorrência (MAGELA, 2015).

(a) (b)

(c) (d)

Fonte: BAPTISTA, 2010 apud MAGELA, 2015.

Figura 5.41 - Bacias de dissipação tipo I a IV

5.3.8 Eclusa
A eclusa apresenta mecanismo semelhante aos elevadores, contudo, segundo o
princípio de vasos comunicantes, enchendo ou esvaziando a câmara onde ficam as
embarcações. O objetivo da eclusa é transpor embarcações através de desníveis, como
as barragens, permitindo a navegação (MAGELA, 2015).

38
Fonte: ATLAS DAS ÁGUAS, 2017.

Figura 5.42 - Degraus dissipadores

Fonte: MAGELA, 2015.

Figura 5.43 - Eclusa de Tucuruí

5.3.9 Filtro

Os filtros apresentam funções essenciais à estabilidade da barragem, como interceptar


a freática, prevenir o carreamento de material entre montante e jusante e
compatibilizar a permeabilidade e a deformação em ter o núcleo argiloso e o material
do espaldar. Há quatro disposições de drenos: o dreno vertical, o horizontal, o inclinado
e o dreno de pé (Figura 5.44).

39
O dreno vertical ou inclinado (Figura 5.45) previne o carreamento de material de
montante a jusante através de trincas resultantes de rupturas hidráulicas e deformações
diferenciais. O dreno de vertical deve ser elevado até o máximo maximorum, contudo,
o dreno inclinado é preferível ao vertical por reduzir problemas consequentes à
diferença de deformabilidade e, portanto, o acúmulo de tensões.

No dreno vertical ou inclinado é escoada água do talude de montante para o dreno


horizontal. O filtro vertical ou inclinado é executado com forma deslizante escavando-
se vala assim que a camada de solo é compactada.

Fonte: MÜLLER, 2020.

Figura 5.44 - Drenos em seção transversal de barragem zonada

O dreno horizontal controla o fluxo proveniente do dreno vertical ou inclinado e da


fundação, sendo predominante o fluxo pela fundação. O dreno horizontal deve estar no
contato entre a barragem e a fundação e, à jusante dele, deve ser implantado um dreno
de pé para registro da vazão e verificação de piping. O dreno de pé deve ser executado
antes do primeiro enchimento.

40
Fonte: CRUZ, 1996.

Figura 5.45 - Filtro adjacente ao núcleo.

O filtro Victor de Mello (Figura 5.46) apresenta os benefícios do filtro vertical, menor
risco de ruptura do talude de jusante na fase de operação, menores empuxos a
montante do filtro, além de gerar maior peso na porção jusante, o que melhora as
condições de estabilidade.

Fonte: ASSIS, 2014.

Figura 5.46 - Filtro Victor de Mello

41
5.3.10 Rip rap
O rip rap é um enrocamento de proteção de talude à montante formado por duas
camadas de materiais rochosos (Figura 5.47). A camada interna é formada por filtros ou
transições de pedregulhos com granulometria controlada para prevenir a perda do solo
do maciço através dos vazios do enrocamento. Já a camada externa é formada por
blocos rochosos de tamanhos suficientes para não serem carreados pela ação das ondas
do reservatório. O rip rap deve ser implantado entre o mínimo minimorum e a crista,
incluindo a borda livre.

Para uma maior durabilidade do rip rap, recomenda-se que os blocos rochosos utilizados
tenham baixa alterabilidade e alta resistência para suportar os ciclos de saturação e
secagem na zona de oscilação do nível máximo e normal da água, evitando-se, assim, a
desagregação dos blocos e consequentemente exposição da superfície da barragem à
erosão.

Fonte: ROMANINI, 2020.

Figura 5.47 - Seção de barragem homogênea de terra com rip rap

5.3.11 Núcleo
O núcleo é a vedação do corpo da barragem, sendo constituída por solo de baixa
permeabilidade, comumente, argila. Ocupa a região central da seção transversal do
barramento. É uma região da barragem sujeita a fraturamento hidráulico e a elevados
gradientes hidráulicos. Por isso, deve ser amplo em seção transversal (Figura 5.44).

42
5.4 Barragens - Seção Típica
As definições de seção típica serão baseadas em Cruz (1996). Em uma seção típica, a
largura da crista deve ser maior ou igual a seis metros e sempre que for previsto tráfego,
a largura da crista deve ser de dez metros. As bermas no talude de jusante em solo
devem apresentar largura mínima de três metros, espaçadas em dez ou quinze metros
de altura.

Os taludes podem ter inclinação máxima de 1,5(H):1,0(V). Como material para


constituição em barragens homogêneas e núcleos de barragens são aceitáveis colúvios,
solos residuais, solos lateríticos, solos saprolíticos e cascalhos arenosos com
porcentagem mínima de 25% de finos (<#200).

As barragens para controle de cheias ou para hidrelétricas devem ter vazão ≤ 5,0
l/min/m. Por sua vez, as barragens para abastecimento de água e irrigação devem ter
vazão máxima de 0,1% da média das vazões naturais. A largura do núcleo de barragens
de terra e/ou enrocamento devem apresentar largura mínima, em metros, de 𝟔 +
𝟎, 𝟐∆𝒉 para solos argilosos e 𝟔 + 𝟎, 𝟑∆𝒉 para solos siltosos, sendo ∆𝒉 a diferença de
carga dos pontos a montante e jusante do plano considerado.

Referindo-se ao tratamento de fundações, o espaçamento máximo dos furos de injeção


deve ser de 3,0m. A linha de injeção para barreira deve ter largura de 1,5m e
permeabilidade de 𝟏𝟎−𝟓 a 𝟏𝟎−𝟔 cm/s. Linha tripla de injeções para barreira deve ter
largura de três metros e permeabilidade de 𝟏𝟎−𝟓 a 𝟏𝟎−𝟔 cm/s. A posição ideal do cut-
off é a central ou pouco a montante do centro da barragem e a largura da base do cut-
off deve ser maior do que quatro metros e menor do que vinte metros.

Quanto aos níveis de água, a borda livre é a altura entre a cota da crista e o máximo
maximorum, dá a altura da onda somada à dissipação da onda e ao recalque após
construção. O nível máximo maximorum é o nível de máxima enchente no reservatório.
Ele ativa a operação das comportas. O nível mínimo operacional deve ser respeitado
para assegurar a qualidade da água e a sobrevivência das espécies no reservatório e
nível mínimo minimorum é o nível atingível pelo deplecionamento do nível de água por
gravidade (turbinas, válvulas de fundo).

43
A altura da onda pode ser estimada com a determinação do fetch, conforme o método
preconizado por Saville, Mcclendon e Cochran (ROMANINI, 2020). Por meio deste valor,
obtém-se a altura de onda significativa e a altura de onda de projeto, cujo valor é a altura
significativa ponderada pelo Fator de Segurança de 1,2. A altura de onda significativa
(HS) é dada por meio da seguinte formulação:

𝑯𝑺 = 𝟎, 𝟎𝟑𝟒𝑽𝟏,𝟎𝟔 𝑭𝟎,𝟒𝟕

Equação 5.1

Sendo HS a altura de onda significativa (em pés); V a velocidade de vento (em milhas/h)
e F o Fetch (em milhas).

Figura 5.48 - Níveis do reservatório

Sherard (1963 apud CRUZ, 1996) recomenda empregar altura de onda máxima entre
dois e três metros, valores estes adotando-se velocidade máxima de 80km/h (CRUZ,
1996).

5.5 Análise e controle da percolação


Os problemas causados pela falta de controle da percolação no barramento são a erosão
interna (piping), a desestabilização do talude de jusante e a perda excessiva de água do
reservatório (Figura 5.49).

44
O dreno vertical só é recomendável para barragens com altura máxima de 30m devido
à concentração de tensões entre ele e os materiais adjacentes. Para alturas maiores do
que 30m, deve-se utilizar dreno inclinado. A espessura mínima do dreno vertical e
inclinado deve ser de 0,8m. O dreno horizontal deve ter espessura máxima de dois
metros por motivos econômicos. Para maiores vazões, é necessário utilizar dreno
sanduíche.

O dreno de saída ou de pé deve ter altura mínima do dobro da espessura do dreno


horizontal e a largura mínima de quatro metros. Os furos de drenagem devem ter
espaçamento médio de 3,0m. O dreno chaminé deve ter gradiente hidráulico igual a 1
ou igual à inclinação do dreno. O dreno horizontal deve ter gradiente hidráulico médio
de 10% a 15%, sendo menor do que 20%. Para comparação, o núcleo deve ter gradiente
hidráulico entre 3 e 5.

A integridade dos filtros deve ser verificada com a leitura dos piezômetros e dos
medidores de vazão. Quando colmatarem, devem ser recuperados por sondagem
rotacional.

Fonte: HANSON, HUNT, 2007 apud MAGELA, 2015.

Figura 5.49 - Erosão interna

45
5.6 Compactação e tratamento de fundação

Os objetivos da compactação são aumentar o contato entre os grãos, reduzir o volume


de vazios (sem expulsão de água), aumentar a resistência, gerar um material mais
homogêneo, reduzir a permeabilidade e a compressibilidade.

O ensaio de compactação é usado para determinar a curva de compactação e


parâmetros como a umidade ótima (𝒘𝒐𝒕 ) e o peso específico aparente seco máximo
(𝜸𝒅𝒎𝒂𝒙 ). Solos dos espaldares (taludes de montante e jusante) precisam ter elevada
resistência, logo, precisam ser compactos em ramo seco. Solos do núcleo devem ter
pequena variação da permeabilidade, logo devem ser compactados no ramo úmido. A
faixa de compactação deve estar em 95% ou 98%.

O tratamento de fundação inclui a limpeza, a regularização do topo rochoso e a


execução do tratamento em si. Dentre os diversos métodos de tratamento, há a
trincheira de vedação (cut off), a parede diafragma, os tapetes vedantes e as injeções.

A vedação deve ser realizada no eixo do barramento, podendo estender-se até um terço
da projeção do talude a jusante. Deve-se ressaltar que a vedação da fundação exige
rebaixamento do lençol freático (Figura 5.50).

A trincheira de vedação (cut off) é a única solução efetiva por interceptar integralmente
a feição permeável, a largura da base entre dez e vinte metros, com altura de 0,3H a
35m. As trincheiras de vedação são executadas geralmente em fundações em areia ou
cascalho, que são muito pouco compressíveis. Deve-se compatibilizar a deformação da
trincheira com o material adjacente para prevenir arqueamento. Para tal, é necessário
executar taludes mais abatidos e não é recomendável compactar o solo imediatamente
adjacente à trincheira. É importante destacar que a trincheira de vedação é um
concentrador de tensões.

46
Fonte: MÜLLER, 2020.

Figura 5.50 - Tratamento de fundação

A parede diafragma consiste simplificadamente em injetar concreto ou solo concreto.


Ela pode ser executada por profundidade de até 65m, sendo que a profundidade
máxima para impermeabilizar uma fundação de barragem é a altura do próprio
barramento (1H). Caso impermeabilize por maior profundidade, a água escoará pelo
núcleo. O diâmetro da parede diafragma deve ser de até 1,8m.

Para executar a cortina injetada, devem-se executar os primeiros furos como


exploratórios com profundidade de até de 1,5H. Os furos primários efetivos devem ser
executados entre os furos exploratórios. É necessário manter a distância de três metros
entre centros de furos, injetando a cada metro e alternando calda densa com baixa
pressão e calda rala com alta pressão (entre fileira de jusante e montante). Ainda é
necessário executar tapete de concreto de contato sobre a cortina. É importante
ressaltar que a cortina injetada diminui insuficientemente a permeabilidade (CRUZ,
1996). O tapete de montante não deve ser usado devido ao alto custo-benefício.

No sentido oposto, o poço de alívio se trata da execução de um poço em uma fundação


pouco permeável para aliviar a pressão proporcionada pela água. Este é um tratamento
de fundação a ser realizado à jusante do barramento.

47
5.7 Análise das tensões e deformações em barragens

A análise numérica das tensões e deformações pode ser realizada unidimensional no


eixo de simetria, ou bidimensional em variadas seções. A análise tridimensional somente
é justificada em casos mais complexos, como em casos de vales muito fechados.

Comumente, a análise é realizada com o Método dos Elementos Finitos, então é


necessário refinar a malha em locais de concentração de tensões. Deve-se adotar o
estado plano de deformação e considerar a deformação, as tensões totais efetivas,
totais e principais.

A análise numérica das tensões e deformações deve ser realizada durante diversas fases
de carregamentos, como no final de construção, durante o primeiro enchimento, o
período de operação, rebaixamento e simulando a construção da barragem, dividindo-
se em de seis a dez camadas. O enchimento também deve ser dividido em de três a seis
carregamentos.

No final de construção, deve-se considerar todo o peso próprio do barramento. Os


parâmetros ainda estão “virgens”, ou seja, não há ação da água e os materiais que
compõem ainda não finalizaram o adensamento, sendo uma análise entre UU (ensaio
não consolidado não drenado) e CU (ensaio consolidado não drenado). Há pressão
neutra positiva devido à água da compactação e o fator de segurança (FS) admissível é
de 1,3.

Por primeiro enchimento, considera-se 20% a 30% da altura total do reservatório. É


necessário verificar o FS somente para talude à montante e o fator de segurança (FS)
admissível é de 1,25.

Durante a operação, tem-se o maior dano e tempo de duração do carregamento. Nesta


fase, o material que compõe a barragem já está consolidado. É necessário verificar o FS
somente para talude à jusante e o fator de segurança (FS) admissível é de 1,50.

48
Por rebaixamento rápido, considera-se o rebaixamento por emergência ou por
estiagem. Podemos mencionar como exemplo um rebaixamento de vinte metros em
dois meses. Durante o processo é retirado parte do material estabilizante. Esta etapa
quase sempre define a inclinação do talude de montante. O fator de segurança (FS)
admissível é de 1,1 e o FS para liquefação é de 1,3. Um caso mais severo de
rebaixamento é o rebaixamento total, em que o nível do reservatório alcança a descarga
de fundo ou a base da soleira da tomada de água (volume morto do reservatório).

(a)

(b)

(c)

(d)

Fonte: MÜLLER, 2020

Figura 5.51 - Malha deformada (a), tensões totais (b), tensões efetivas (c) e tensões
principais (d) em fases distintas

49
5.8 Instrumentação

Normalmente as pressões neutras abaixo do NA são positivas, podendo aumentar pela


aplicação de esforços de compressão à camada em análise. As pressões neutras podem
também aumentar quando esforços de cisalhamento são aplicados a um solo fofo.

As pressões neutras medidas na fundação são denominadas subpressões por atuarem


de baixo para cima. Dependendo da constituição da ombreira (principalmente se houver
alguma camada mais permeável) deve-se colocar alguns piezômetros (SILVEIRA, 2006).

Há diversos tipos de piezômetros (Figura 5.52a e b). Os piezômetros standpipe, ou


também denominados piezômetros de tudo aberto, são confiáveis e robustos com vida
útil compatível com a barragem. Uma das suas desvantagens é o alto tempo de resposta
quando instalado em solos com baixa permeabilidade.

O elemento poroso disposto no final do tubo pode ser constituído por uma vela de filtro,
quando o piezômetro standpipe é do tipo Casagrande ou pode ser geossintético aplicado
diretamente sobre o trecho perfurado no bulbo do piezômetro. Há um trecho de areia
no bulbo do piezômetro e o tudo do piezômetro pode ser de aço galvanizado, quando
as pressões neutras forem mais elevadas ou de PVC. O filtro pode ser de polietileno
poroso de alta densidade (SILVEIRA, 2006).

Se instalados durante a construção, os piezômetros standpipe podem ter tubulação


flexível do tipo corrugado entre o topo do bulbo e a superfície do terreno. A vedação
pode ser realizada com bentonita, apesar de hoje ser ambientalmente incorreto utilizá-
la. O nível da coluna de água (Figura 5.52c) no interior do tubo do piezômetro é medido
por um pio elétrico (SILVEIRA, 2006).

Há outros tipos de piezômetros, como os hidráulicos de dupla tubulação, os


pneumáticos, os piezômetros de resistência elétrica, de corda vibrante e de fibra óptica.
Os piezômetros ainda podem ser do tipo multinível (SILVEIRA, 2006).

A resposta dos piezômetros do tipo standpipe instalados na fundação é praticamente


imediata durante a fase de enchimento do reservatório, sendo um bom indicador da
segurança da obra, por qualquer problema ser rapidamente detectado e analisado. É
importante comparar essas subpressões medidas com as teóricas para avaliar o acerto
das hipóteses de projeto (SILVEIRA, 2006).
50
Por ser muito frequente, a ocorrência de surgências de água junto do pé de jusante das
barragens de terra após a fase enchimento do reservatório, deve-se instalar
piezômetros nessa região para fazer o traçado da rede de percolação. Com o traçado,
faz-se uma melhor avaliação do problema de surgência e o acompanhamento do
sistema de drenagem implantado (SILVEIRA, 2006).

(a) (b)

(c)

Fonte: SILVEIRA, 2006.

Figura 5.52 - Piezômetro de tubo aberto (a), piezômetro de Casagrande modificado


(b) Aparelho para leitura do nível de água do tipo pio elétrico

Considerando que os materiais da fundação são em geral mais permeáveis do que os


aterros das barragens de terra, será analisada a evolução das linhas de isopressão
(Figura 5.54) da barragem de Marimbondo (SILVEIRA, 2006). Observa-se que, com a
subida do nível do reservatório, a saturação do aterro, pela evolução da linha freática,
estende-se inicialmente da fundação e da proximidade do talude de montante,
deslocando para cima até atingir sua posição definitiva, que é entre o nível máximo
normal do reservatório e o filtro vertical a jusante (SILVEIRA, 2006).
51
Fonte: SILVEIRA, 2006.

Figura 5.53 - Análise da piezometria da barragem de Marimbondo

O medidor de nível de água difere do piezômetro por ser perfurado em toda extensão e
não apenas no bulbo, como no piezômetro. Assim, mede-se apenas a carga de elevação
e, não a carga piezométrica.

A medição das pressões internas em maciços de barragens dá-se por células de pressão
inseridas no aterro durante a construção da barragem. Locais típicos de instalação são
o núcleo; entre o aterro e as estruturas de concreto; entre zonas com comportamento
mecânico distinto, logo, inclui zonas em que alívio de tensões; e na interface com as
galerias enterradas (SILVEIRA, 2006).

Zonas em que há alívio de pressão devido ao arqueamento do solo menos rígido são nos
cut offs profundos executados em rocha, no núcleo vertical de barragem de
enrocamento, na interface do aterro com as estruturas de concreto (SILVEIRA, 2006).
52
Os medidores de recalque instalados verticalmente são do tipo telescópico, do tipo
USBR e do tipo magnético (SILVEIRA, 2006). Os medidores de recalque instalados
horizontalmente são a célula de recalque, o medidor de recalque de corda vibrante e o
medidor contínuo de recalque. O recalque também pode ser medido com marcos de
deslocamento superficial.

O deslocamento horizontal pode ser medido com extensômetros múltiplos horizontais,


com inclinômetros, com eletroníveis, com fita de cisalhamento, com marcos superficiais,
dentre outros métodos.

A medição da vazão e da turbidez são essenciais para conhecer o funcionamento dos


drenos e a ocorrência de piping (carreamento do solo pela água). Os medidores de vazão
podem ser, dentre vários, os medidores triangulares, que medem vazões entre 30 l/s a
130 l/s, os medidores retangulares, que medem vazões entre 30 l/s a 300 l/s e a Calha
Parshall, que mede centenas de litros por segundo (SILVEIRA, 2006).

A frequência mínima de leituras da instrumentação de barragens de terra e/ou


enrocamento pode ser verificada a seguir (Tabela 5.34).

Tabela 5.1 - Frequência mínima recomendada para leitura da instrumentação de


barragens de terra e/ou enrocamento

Fonte: SILVEIRA, 2006.


53
5.9 Barragens de rejeito

O método mais comum para disposição de rejeito em mineração é por aterro hidráulico.
Por esta técnica, o próprio rejeito é utilizado como material de construção através da
técnica de hidromecanização, no qual a disposição do rejeito é realizada com auxílio de
água (PORTES, 2013). Inicialmente, é realizado um dique de partida em solo compactado
e após, o rejeito é lançado para constituir a fundação e o material de construção dos
alteamentos seguintes.

A construção pode ser realizada em etapa única ou em vários alteamentos ao longo da


vida útil da barragem. As empresas escolhem altear em tempos distintos devido aos
elevados custos iniciais, da disponibilidade de área, não obrigatoriedade de construir
com material compactado a ser retirado de área de empréstimo, dentre outros motivos.

O lançamento do rejeito pode ser realizado com canhões ou ciclones. Os ciclones são
utilizados para retirar água da polpa, separando as frações finas (overflow) e as
granulares (underflow). A fração granular é utilizada na construção do barramento e a
fração fina é disposta em reservatório.

Os métodos construtivos a serem realizados em várias etapas podem ser de jusante, de


montante e de linha de centro (PORTES, 2013). No método de montante os alteamentos
são realizados sobre materiais previamente depositados e não consolidados (Figura
5.54a). Sob condição saturada e estado de compacidade fofo, os rejeitos que compõem
o barramento podem apresentar baixa resistência ao cisalhamento e susceptibilidade à
liquefação (ARAUJO, 2006). Neste método construtivo há grande dificuldade em
implantar um sistema de drenagem eficiente, favorecendo a ocorrência de liquefação.

No método de jusante, o dique de partida é em material geológico (solo ou


enrocamento) compactado, assim como em todos os alteamentos, que são em solo
compactado elevados para jusante, portanto, não utilizando o rejeito como fundação
(Figura 5.54b). O sistema de drenagem pode ser implantado de maneira a ter controle
efetivo do fluxo e da percolação. É o método de alteamento mais seguro para barragens
de retenção de rejeito.

54
Por fim, em barragens alteadas pelo método de linha de centro, o alteamento da crista
é realizado pelo eixo central do dique de partida (Figura 5.54c). Parte da fundação dos
alteamentos é constituída por rejeito e parte é alteada sobre material compactado. O
controle eficiente da drenagem é possível por este método.

Fonte: Adaptado de Vick (1983) por Portes (2013).

Figura 5.54 - Métodos construtivos de barragens de rejeito com alteamentos pelo


método de montante (a), pelo método de jusante (b) e pelo método de linha de
centro (c)

5.10 Legislação e Segurança de Barragens

A legislação de barragens é composta por uma Lei Federal, quatro resoluções e uma
portaria que regulamentam sobre barragens no Brasil, além de normatizações
estaduais. Os entes fiscalizadores mais importantes para a segurança de barragens são
a Agência Nacional de Águas (ANA), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), a Agência Nacional de Mineração (ANM) e a
ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica).

55
A Lei nº 12.334, de 20 de setembro de 2010, antecede a Resolução do Conselho Nacional
de Recursos Hídricos (CNRH) nº 143/2012, a Resolução CNRH nº 144/2012, a Resolução
Normativa ANEEL nº 696/2015 e a Resolução ANA nº 70.389/2017.

A Lei nº 12.334, de 20 de setembro de 2010, estabelece a Política Nacional de Segurança


de Barragens (PNSB) e cria o Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de
Barragens (SNISB). A PNSB objetiva garantir a segurança; regulamentar e promover o
monitoramento; e acompanhar as ações de segurança implementadas pelos
empreendedores. Por sua vez, SNISB tem por objetivo coletar, armazenar, tratar e gerir
as informações relativas à segurança de barragens. A SNISB também tem a
responsabilidade de repassar à população tais informações.

A Lei nº 12.334 aplica-se a barragens que apresentem pelo menos uma das seguintes
características: altura do maciço maior ou igual a 15m (do ponto mais baixo da fundação
à crista); capacidade total do reservatório maior ou igual a 3.000.000 𝒎𝟑 ; reservatório
que contenha resíduos perigosos; e barragens de categoria de dano potencial associado
(DPA) médio ou alto em termos sociais, ambientais, econômicos, ou de perda de vidas
de vidas humanas.

Pela Lei nº 12.334, a ANA foi o agente fiscalizador que recebeu a maioria das atribuições.
Ela deve:

 Fiscalizar a segurança de barragens de uso múltiplo;

 Promover a articulação para a implementação da Política Nacional de Segurança


de Barragens (PNSB);

 Organizar, implantar e gerir o Sistema Nacional de Segurança de Barragens


(SNISB);

 Coordenar a elaboração do Relatório de Segurança de Barragens (RSB) e sua


entrega para o Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH).

A PNSB dispõe como obrigação dos empreendedores, responsáveis legais, a elaboração


do Plano de Segurança de Barragem (PSB). Os empreendedores tiveram até a data de
20 de setembro de 2012 para submeter o relatório especificando as ações e cronograma
para implantação do PSB. O PSB deve conter, minimamente, o seguinte conteúdo:

56
 Informações gerais da barragem e do empreendedor;

 A documentação técnica do empreendimento;

 Os planos e procedimentos relativos à operação, manutenção, inspeção,


monitoramento e instrumentação;

 Os registros e controles da operação, manutenção, inspeção,


monitoramento, instrumentação, teste de equipamentos hidráulicos,
elétricos, mecânicos, dentre outros;

 Os relatórios de inspeção (regulares e especiais);

 A revisão periódica de segurança de barragem;

 E o Plano de Ação de Emergência (PAE), quando exigido.

O PSB apresenta como um de seus elementos as Inspeções Regulares de Segurança de


Barragens (IRSB). O IRSB já foi regulamentado pela ANM e ANEEL, apresentando
importante papel no fornecimento de informações quanto ao estado de conservação da
barragem. As inspeções regulares são realizadas semestralmente para a ANM; e
semestralmente, anualmente ou bianualmente para a ANA e ANEEL. Para a ANA e ANM,
as inspeções devem conter:

 A ficha de inspeção regular.

 O relatório de inspeção regular.

 O extrato de inspeção regular.

 E, para a ANM, a declaração de condição de estabilidade.


Também é parte integrante do PSB o Plano de Ação de Emergência (PAE). O PAE é um
documento que deve estar disponível nas prefeituras envolvidas e no empreendimento.
Ele deve conter ao menos a identificação e análise das possíveis situações de
emergência, procedimentos a serem adotados em situação de emergência e estratégias
para divulgação e alerta à comunidade.

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CONCLUSÃO

Neste bloco foram apresentados os geossintéticos, além de tópicos sobre barragens. Em


barragens, foram expostas a suas finalidades; etapas de estudos e projetos; além dos
seus diversos tipos. Foram abordados os elementos básicos e a seção típica de
barragens.

Análise e controle da percolação, compactação e tratamento de fundação e análise das


tensões e deformações em barragens também foram tratados. Foram apresentados, por
fim, tópicos em instrumentação de barragens, legislação de barragens, além da
introdução em barragens de rejeito.

REFERÊNCIAS

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pela gestão das águas. PROGESTÃO, S.D. Disponível
em:<http://progestao.ana.gov.br>. Acesso em: 26 maio 2021.

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