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diversos
gêneros
mas a Lírica foi o
gênero mais fecundo do autor.
Em outra figura de mulher misturam-se
neve e ouro, frieza e calor, doçura e
sedução. Essa mesma ambiguidade do
elemento feminino permeia a redondilha
em que o poeta pinta o retrato da mulher
que vai à fonte:
Maneirismo:
Movimento artístico europeu surgido
entre 1515 e 1600, como uma revisão
dos valores clássicos e naturalistas
prestigiados pelo Humanismo
renascentista. Manifestou-se na pintura,
escultura e arquitetura na Itália, onde se
originou, mas também influenciou as
outras artes e a cultura de praticamente
Ainda no epílogo do poema, o poeta seja, pelo imenso sofrimento provocado
reafirma o valor da experiência. Ao pelo distanciamento.
honesto estudo, o saber que vem dos
Neste poema, o poeta recupera a imagem
livros, juntam-se a experiência e o
da madrugada como um ser mitológico, a
engenho:
Aurora de róseos dedos, a deusa grega
’’Mas eu que falo, humilde, baixo e do amanhecer. A madrugada, que traz o
rudo, dia, a claridade e a luz, surpreende a
de vós não conhecido nem sonhado? partida, a separação. A dor e a mágoa dos
Da boca dos pequenos sei, contudo,
que o louvor sai às vezes acabado. amantes são tão intensas a ponto de
Nem me falta na vida honesto estudo, esfriar o próprio fogo dos infernos:
com longa experiência misturado, “tornar o fogo frio/ E dar descanso às
nem engenho, que aqui vereis presente, almas condenadas.” Neste discurso
cousas que juntas se acham raramente.
Que me quereis, perpétuas saudades? fundem-se, portanto, no tema da
Com que esperança ainda me enganais? saudade, paganismo e Cristianismo.
Que o tempo que se vai não torna mais
E, se torna, não tornam as idades.’’ Quanto à temática do desconcerto do
(Os Lusíadas, Canto IV, estrofe 154). mundo, podemos vê-la manifestando-se
claramente nas redondilhas a seguir:
Sobre o tema da saudade, podemos usar ’’Ao desconcerto do mundo
como exemplo, entre tantos, o soneto a Os bons vi sempre passar
seguir: No mundo graves tormentos;
E, para mais me espantar,
’’Aquela triste e leda madrugada, Os maus vi sempre nadar
Cheia toda de mágoa e de piedade, Em mar de contentamentos.
Enquanto houver no mundo saudade, Cuidando alcançar assim
Quero que seja sempre celebrada. O bem tão mal ordenado,
Fui mau, mas fui castigado:
Ela só, quando amena e marchetada Assim que, só para mim,
Saía, dando ao mundo claridade, Anda o mundo concertado.’’
Viu apartar-se duma outra vontade,
Que nunca poderá ver-se apartada. Percebe-se a clara inversão de valores:
Ela só viu as lágrimas em fio,
aos bons sobram os tormentos e aos
Que de uns e de outros olhos derivadas maus os contentamentos. O senso de
Se acrescentaram em grande e largo rio. injustiça amplia-se mais para o sujeito
poético que, ao agir mal, é castigado.
Ela ouviu as palavras magoadas
Que puderam tornar o fogo frio
Para ele, que constitui uma espécie de
E dar descanso às almas condenadas.’’ ser de exceção, paradoxalmente, até o
concerto é desconcerto, ou seja, até
aquilo que é bom torna-se ruim
O tema da partida, da despedida durante
especialmente para o sujeito.
a madrugada, desdobra-se no tema da ’’Mudam-se os tempos, mudam-se as
saudade gerada pela separação vontades,
involuntária, pelo apartamento de duas Muda-se o ser, muda-se a confiança;
vontades que não aceitam essa realidade. Todo o mundo é composto de mudança,
Tomando sempre novas qualidades.
Ao mesmo tempo, e por isso, continuam
unidas pelas “lágrimas em fio” que se Continuamente vemos novidades,
“acrescentam em grande e largo rio”, ou Diferentes em tudo da esperança;
Do mal ficam as mágoas na lembrança,
E do bem, se algum houve, as saudades. Em Portugal, no século XV, a
O tempo cobre o chão de verde manto,
necessidade de conhecimento e domínio
Que já coberto foi de neve fria, do espaço físico fez com que se
E enfim converte em choro o doce canto. desenvolvesse um espírito de ousadia
que levou a uma abertura de
E, afora este mudar-se cada dia,
Outra mudança faz de mor espanto: mentalidades, como disse o próprio
Que não se muda já como soía.’’. Camões: “Novos mundos ao mundo
irão mostrando” Canto II, estrofe 45.
Neste soneto, a temática da mudança Luís de Camões viveu em um período
está associada à temática do desconcerto em que Portugal atingiu o seu ponto mais
e da saudade. Tudo muda tanto que, no alto de domínio do mundo, por causa dos
último terceto, percebemos o paroxismo, Descobrimentos. Essa experiência que
o ponto máximo da mudança: até ela não lhe serviu de inspiração, aliada ao
muda como soía, ou seja, como renascimento cultural, lhe deu a
costumava mudar. conhecer as epopeias clássicas,
Analisamos alguns poemas da Lírica originando, então, a criação de uma
de Camões, no intuito de mostrar a epopeia nacional, pela necessidade que
importância de entrelaçar os portugueses tinham de uma obra
conhecimentos sobre contexto da que cantasse os feitos da nação. Os
época de produção, obras e vida do feitos Portugueses forneceram o
autor, para atribuir sentidos aos argumento, a demonstração da força
poemas que lemos. humana, do domínio da inteligência do
Homem sobre os elementos da natureza.
Camões épico: Os
Estrutura de Os Lusíadas
Lusíadas
Estrutura Externa:
Ao abordar a obra de Camões, não
poderíamos deixar de apresentar, mesmo O poema divide-se em dez cantos, cada
que resumidamente, sua grande obra um deles com um número variável de
épica: Os Lusíadas. Acompanhe, estrofes, que, no total, somam 1102. As
portanto, o texto a seguir. estrofes são todas oitavas, têm oito
versos, e estes são decassílabos, isto é,
Além da poesia lírica, Camões escreveu cada verso tem dez sílabas métricas,
a epopeia Os Lusíadas (1572), o mais obedecendo ao esquema de rimas
importante poema épico da literatura “abababcc” (rima cruzada, nos seis
portuguesa. Epopeia é uma narrativa, primeiros versos, e emparelhada, nos
geralmente em verso, que conta os dois últimos).
grandes feitos de um herói (Ulisses –
em Odisseia, Aquiles – em Ilíada, e Estrutura Interna:
Enéas em Eneida) ou de um povo, como
no caso de Os Lusíadas, que canta as Como a epopeia clássica, a obra de
glórias do povo português no período Camões é constituída por cinco partes:
das Grandes Navegações. O poema tem « Proposição:
como herói coletivo o povo português.
O
poeta
« Invocação:
Nessa parte, o poeta dirige-se às
Tágides (ninfas do Tejo), para lhes
pedir o estilo e eloquência necessários
à execução da sua obra; afinal, um
assunto tão grandioso exigia um estilo
elevado, uma eloquência superior, “de
tuba canora e belicosa” e não de flauta;
começa por declarar aquilo que se daí a necessidade de solicitar o auxílio
propõe fazer, indicando de forma das entidades protetoras dos artistas
sucinta o assunto da sua narrativa: (Canto I, estâncias 4 e 5). O poeta pede
falar não só sobre os navegadores que que as águas do Tejo sejam elevadas à
tornaram possível o império português categoria das águas da fonte de
no Oriente, sobre os reis que Hipocrene, uma nascente de água doce,
promoveram a expansão da Fé e do situada na encosta leste do Monte
Império, mas também sobre todos Hélicon, na Grécia, tradicionalmente
aqueles que se tornam dignos de consagrada a Apolo e às musas, que teria
admiração pelos seus feitos. Esta brotado de uma pedra a partir de uma
proposição ocupa as três primeiras patada de Pégaso, o cavalo alado. Ela
estrofes do Canto I: era considerada a fonte de inspiração
poética por excelência, sendo que
quem bebia das suas águas ficava em
comunhão com as musas.
isso, Camões recorreu a profecias
colocadas na boca de Júpiter,
« Dedicatória: Adamastor e Tétis, principalmente.
É a parte em que o poeta oferece a sua
obra ao rei D. Sebastião (Canto I, 3. Plano Mitológico: dos Deuses ou
estâncias 6-18). Maravilhoso (conflito entre os deuses
pagãos) — Camões imaginou um
« Narração: conflito entre os deuses pagãos: Baco
opõe-se à chegada dos Portugueses à
O poeta canta os feitos dos Portugueses, Índia, pois receia que o seu prestígio
tendo como ação central a viagem de seja colocado em segundo plano pela
Vasco da Gama à Índia. Paralelamente, glória dos Portugueses, enquanto
surge a narração da História de Portugal. Vênus, apoiada por Marte, os protege.
A narração começa “in media res”, ou O maravilhoso tem uma função
seja, no meio da história, já na viagem, o simbólica: esta intriga dos deuses
que é uma característica da epopeia reflete indiretamente as dificuldades
clássica. que os Portugueses tiveram que
A narração desenvolve-se em quatro vencer e inculca a ideia de que os
planos diferentes, mas estreitamente portugueses eram seres predestinados
articulados entre si: para estas façanhas do destino e que
os próprios deuses o desejavam. A
1. Plano da Viagem: A ação central do mitologia permite a evolução da ação
poema é a viagem de Vasco da Gama (os deuses assumem-se como
às Índias. adjuvantes ou como oponentes dos
2. Plano da História de Portugal: Para portugueses) e constitui, por isso, a
enaltecer seu povo, Camões usa intriga da obra. São eles: Júpiter,
artifícios para contar a história do Deus do Céu e da Terra, pai dos
país ao longo do poema: deuses e dos homens; Netuno, Deus
do mar; Vênus, Deusa do amor e da
a. Narrativa de Vasco da Gama ao rei de beleza; Baco, Deus do vinho e do
Melinde — O rei recebe Vasco da Oriente; Apolo, Deus do Sol, das
Gama e procura saber quem é ele e artes e das letras; Marte, Deus da
donde vem. Guerra, velho apaixonado de Vênus;
b. Narrativa de Paulo da Gama ao Mercúrio, Mensageiro dos deuses.
Catual — Em Calecut, uma 4. Plano das considerações o poeta:
personalidade hindu (Catual) visita o Por vezes, normalmente em final de
navio de Paulo da Gama, que se canto, a narração é interrompida para
encontra enfeitado com bandeiras o poeta apresentar reflexões de
alusivas a figuras históricas carácter pessoal sobre assuntos
portuguesas. diversos, a propósito dos fatos
narrados.
c. Profecias — Os acontecimentos
posteriores à viagem de Vasco da Epílogo: encerramento do poema,
Gama não podiam ser introduzidos na que ocupa as estrofes 145 a 156 do
narrativa como fatos históricos. Para Canto X, quando o poeta confessa
estar cansado de cantar para “Gente
surda e endurecida” e que sua pátria
está metida “no gosto da cobiça e na
rudeza de uma austera, apagada e vil
tristeza”: