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CAPÍTULO 1

Ron e Hermione trocaram várias cartas durante as férias. O rapaz finalmente


entendera que era apaixonado pela amiga e sentia muita falta dela, uma
saudade tão forte que chegava a doer. Nas correspondências enviadas para a
menina tentava convencê-la a ir logo para A Toca. “Harry também deve vir e
será muito divertido, sem as tensões e obrigações da escola. Vamos poder
conversar sobre outros assuntos”, escreveu o rapaz.  
Mione sentia-se lisonjeada ao ver que o ruivinho fazia tanta questão da
presença dela. Lembrou que o convite insistente para que visitasse A Toca
começou a ser feito em Londres, quando desembarcaram para o início das
férias. Até mesmo Molly entrou na jogada, pedindo aos pais da menina que a
deixassem passar alguns dias na sinistra e aconchegante residência dos
Weasley.
A jovem não alimentou as esperanças do amigo, mas também desejava, de
todo coração, poder passar alguns dias das férias com ele. Os pais de Mione,
porém, queriam ficar a maior parte do tempo possível com a menina. E não
seria fácil convencê-los a abrir mão da companhia da filha.
Ele queria que Hermione chegasse à Toca antes de Harry. Tinha a impressão
que, sempre quando os três se encontravam, Mione dava mais atenção a
Harry. No ano anterior, é verdade, desde que passaram a ser monitores,
Hermione e Ron ficaram muito mais tempo juntos, apenas os dois. Mas ainda
assim o rapaz percebia que o tratamento dispensado pela amiga ao Menino-
que-Sobreviveu era diferente.
A verdade é que Ron não estava enganado. Hermione tratava ele e Harry de
formas diferente sim, mas isso era inconsciente. Harry era o amigo que
precisava dela, da sua inteligência, para vencer Voldemort, mas,
especialmente, era o irmão que nunca tivera. Enquanto Ron... Era seu amigo, é
verdade. Sempre a ajudava, a defendia, a elogiava por suas ideias que dizia
serem brilhantes. Ao mesmo tempo, no entanto, a contradizia, criticava,
confrontava com suas opiniões.
Mas ela não queria Ron como irmão e sim como namorado! Pensar nisso
sempre a deixava muito agitada, com o coração acelerado. Não conseguia
entender por que gostava tanto do ruivo e, ao mesmo tempo, se chateava tanto
com ele. Um dos maiores motivos de sua irritação era aparente indiferença do
rapaz aos seus sentimentos.
Devia reconhecer que, desde o último ano, Ron tinha mudado muito. Estava
mais afetuoso e próximo. As cartas que trocara com o amigo desde o início das
férias a deixaram muito feliz. O rapaz parecia querer tanto passar parte das
férias com ela e chegou a falar com o pai da menina ao telefone – algo que
detestava, Hermione sabia – para pedir que a deixasse ficar uns dias na Toca.
Por tudo isso, a ansiedade em rever o ruivo era grande. E o mês e meio de
espera parecia uma eternidade, tanto para a menina como para Ron.
Finalmente, porém, aquele dia tinha chegado. Mione trocou três vezes de
roupa. Não queria parecer arrumada demais, mas ao mesmo tempo desejava
ser especialmente notada pelo amigo.
Na última carta, Ron tinha informado que iria à estação do trem com o pai para
esperar pela amiga. Quando desceu do vagão, no entanto, não foi o sorriso
dele que Mione recebeu e sim o de Gina.
Hermione deu um abraço na amiga. Mas logo seus olhos miraram mais longe.
Alguns metros adiante estava Arthur, que acenava. Ela olhou ao redor,
tentando ver um outro vulto ruivo, sem sucesso.
— Ele não veio! - disse Gina notando a expectativa de Hermione.
— Ron não veio? Por quê? - Hermione mordeu os lábios tentando disfarçar a
ansiedade.
— Mamãe falou que Ron tinha que arrumar o quarto. Harry deve chegar em
três dias. Ele ficou lá, muito emburrado, para variar - a ruiva revirou os olhos.
No momento que Hermione entrou na sala d'A Toca, alguém gritou o nome
dela. Era Ron, que estava no andar de cima e desceu correndo as escadas.
Que diferença dos anos anteriores. Hermione olhava feliz e incrédula para o
rapaz.
Quando já estava próximo à menina, o ruivo hesitou por um instante. Mas logo
a envolveu num abraço e beijou os cabelos de Hermione. Afastou-se um pouco
e ganhou um beijo na bochecha. Com certeza nem desconfiava como este
cumprimento carinhoso deixara feliz a amiga.
Um pouco sem jeito, tirou o braço do ombro de Hermione. "Que bom que você
veio", falou dando um sorriso tímido.
— Eu também estou feliz por estar aqui. Senti muitas saudades suas... e do
Harry –  a garota apressou-se a completar.
— Do Harry?! Mas por que falou no Harry? Ele nem está aqui – Ron não
conseguiu esconder que ficara chateado.
— Mas ele é nosso amigo, não é? E é natural ter saudades dos amigos –  ela
rebateu com segurança.
— É, Hermione, deve ser. Fica à vontade que eu vou terminar de arrumar o
meu quarto - o rapaz falou com a voz baixa, se virando para subir as escadas.
Mas logo se deteve ao ouvir o apelo da menina.
— Você está chateado comigo só por que eu falei do Harry? - a voz saiu
estridente.
— Ele é o Menino-que-Sobreviveu. E eu sou apenas mais um dos ruivos da
família Weasley e amigo do famoso Harry Potter. Eu já devia ter me
acostumado com isso - ele começou a subir as escadas tortas d'A Toca.
— O que está acontecendo, Ron? Eu não consigo entender... - Mione ainta
tentou detê-lo, mas foi em vão.
— Você não precisa entender tudo, Hermione. Tem muitas coisas que eu
também não consigo entender... - a voz dele já ficara distante.
O rapaz continuou a subir as escadas e deixou para trás uma Hermione
perplexa. Antes que ela pudesse organizar os pensamentos, Gina apareceu no
andar de cima e falou em um tom autoritário que lembrava Molly:
— Não acredito que você já está brigando com Mione!
—Nós não estamos brigando. Apenas conversando – Ron respondeu ao
passar próximo da irmã.
— E desde quando alguém conversa com um tom de voz tão irritado? - Gina
falava alto pra que a conversa fosse acompanhada por Hermione.
Sem dar uma resposta, ele passou pela irmã que o fitava de forma
ameaçadora. Subiu o segundo lance de escadas, que dava para o seu quarto,
com passos rápidos.
Gina olhou para Hermione, que estava com os braços cruzados e expressão
abismada. Ron tinha sido tão afetuoso nas cartas e agora a tratava daquele
jeito. Será que o ruivo realmente tinha ciúmes de Harry? Não era possível.
Nunca perceberia que era dele que ela gostava?
No meio desses pensamentos confusos, nem se deu conta que Gina já estava
ao seu lado. “Mione? Desculpa pelo meu irmão. Eu morro de vergonha dessas
atitudes dele”.
— Não se preocupe. Eu conheço Ron e sei que ele perde o controle fácil. Não
vou dizer que me acostumo com isso, mas...
— Por que ele tratou você assim? - Gina a confrontou.
— Sei lá... Ficou chateado depois que eu disse que estava com saudades do
Harry... - ela mesma não entendia muito bem a atitude do rapaz.
— Meu irmão é muito ciumento, você deve saber disso. Morre de ciúmes de
mim com a mamãe, acha que recebo mais atenção porque sou menina... Deve
ser ciúme. Mas nada justifica a falta de educação, com certeza! - Gina foi
enfática. 
O ruivo logo se arrependeu de ter sido tão rude com a amiga, mas ao mesmo
tempo continuava enciumado. “Mas por que Hermione nunca se esquece do
Harry, mesmo quando estamos só eu e ela juntos?” Queria pedir desculpas,
mas era orgulhoso demais para tomar essa atitude.
Gina invadiu o quarto do rapaz com a pior cara possível. “Como você trata a
Mione daquele jeito? Ela chegou tão feliz na estação, foi logo perguntando por
você. Eu achei que você tinha evoluído um pouco. Deu aquele perfume para
ela, começou a se aproximar mais e não a fugir de Hermione, como se
temesse uma azaração. Agora você dá uma bola fora dessas?”
Ele detestava admitir isso, mas Gina tinha razão. Justamente quando estavam
numa excelente fase, ele vacilava daquele jeito. A menina respirou fundo e,
vendo que o seu discurso surtia efeito, continuou:
— Você tem que ir até ela e pedir desculpas. Dessa vez foi você que errou.
Ouviu, Ron?!
— Tudo bem. Mas acho difícil ela aceitar meu pedido de desculpas... - o rapaz
deu de ombros.
— Pelo menos tome a iniciativa e vá logo até lá. Ela está sentada na sala lendo
- Gina deu uma piscadela.
O ruivo seguiu o conselho da irmã e, para surpresa dela, não reclamou.
Hermione tinha o rosto escondido atrás de um grande livro e, aos seus pés,
estava Bichento.
— Mione... – ele a chamou no seu melhor tom de arrependimento.
A bruxa de cabelos volumosos abaixou o livro e olhou para o rapaz sem
conseguir esconder a mágoa que ainda sentia.
— Eu queria pedir desculpas... Não devia ter falado com você daquele jeito.
Sempre que te magoo, eu magoo antes a mim mesmo, pode ter certeza -
aquelas palavras passaram tanta sinceridade e foram ditas de forma tão
sentida que fizeram o coração de Hermione falhar uma batida.
Ela o mirou com profundidade, tentando entendê-lo além das palavras. Ron
permanecia um mistério. Um mistério que a atraia irresistivelmente. 
— Ok. Vamos esquecer isso então, Ron - respondeu com simplicidade.
O rapaz, surpreendendo-a mais uma vez, abriu um sorriso e aproximou-se
dela. O ruivo depositou em seguida um beijo no rosto da menina.
— Obrigado, Hermione – foi tudo que ele conseguiu dizer.
Com as orelhas vermelhas, parecendo tomar consciente do que havia feito,
Ron se virou e subiu mais uma vez as escadas. A bruxo tentou voltar a ler, mas
perdera toda a concentração.
 
 
 
 Depois do reencontro tenso, Ron e Hermione passaram três dias felizes
juntos. O bruxo, sempre muito atencioso, se interessava pelos livros que ela lia
e até ensaiou um afago em Bichento. Conversavam sobre vários assuntos e, é
claro, davam muitas risadas. “Como é bom quando Ron está bem-humorado”,
ela pensou. A garota mal imaginava que logo entrariam de novo em confronto.
Hermione sempre sentia o sangue subir quando Ron olhava com cara de bobo
para alguma mulher bonita. Mas agora já era demais! Fleur era namorada do
irmão dele e o ruivo ficava com aquele jeito de idiota contemplando a loura.
Quando Fleur saiu do quarto depois de levar o café da manhã de Harry, que
chegara na noite anterior, e Ron continuou mirando a porta, Hermione se
postou em frente ao ruivo e fuzilou o amigo com o olhar. No momento em que
Ron finalmente se deu conta de estar sendo observado, ficou assustado ao
encarar um rosto tão raivoso.
À tarde a casa ficou vazia - Fleur e Gui haviam saído com Molly, Arthur estava
no ministério e Gina e Harry jogavam quadribol com os gêmeos –  e Ron tomou
coragem de abordar a menina. "Está zangada comigo? Você me olhou de um
jeito tão estranho de manhã, quando estávamos com Harry..."
— Eu não estou apenas zangada não. Minha vontade é de lançar em você uma
azaração poderosa com duração de mil anos. No mínimo! - o rosto
dela adquiriu um tom escarlate.
O bruxo olhou para a amiga boquiaberto. "O que aconteceu, Hermione?",
perguntou confuso.
— Você tem que amadurecer, Ronald Weasley! Não é possível ficar com
aquela cara de abobado toda vez que vê uma mulher bonita. Isso é ridículo! -
ela disparou.
— Do que você está falando? - Ron estava perplexo.
— Não se faça de desentendido! Ou você pensa que não vi o jeito como olhou
a Fleur?! - a voz dela agora era estridente.
— Hermione... eu...
— Você é um idiota, admita! - Hermione o cortou.
Ele não queria brigar com a amiga. Não agora que, finalmente, pareciam viver
um tempo de paz e isso o deixava muito feliz. Sabia que, se não cedesse, a
discussão pioraria cada vez mais e acabariam ficando vários dias sem se falar.
— Está certa, Mione. Eu sou um idiota. Mas você precisa saber que não me
interesso por nenhuma dessas mulheres. Simplesmente as acho bonitas. Mas
beleza não é tudo - ele ergueu as sobrancelhas.
— O quê?! Ronald Weasley, aquele que fez questão de só convidar meninas
bonitas para o Baile de Inverno, agora diz que beleza não é tudo? - a garota foi
irônica.
— Podia parar de me tratar desse jeito, né? Depois reclama que sou rude com
você... - ele falou em tom de queixa.
— Falo isso para o seu próprio bem. Você precisa amadurecer. É ridículo olhar
para a sua futura cunhada com aquele jeito de bobo... - ela suavizou a voz.
— Hermione, eu não tenho interesse algum em Fleur ou em qualquer outra
menina no momento - ele ainda não tinha coragem de declarar a sua paixão
pela amiga.
— Então pare de olhar para toda mulher bonita com essa cara de panaca! -
Hermione falou com firmeza.
Sempre com respostas desaforadas na ponta da língua, dessa vez Ron não
sabia o que dizer. De fato, tinha um "fraco" por mulheres bonitas. Mas nunca se
dera conta que todos percebiam isso, muito menos que Hermione ficava tão
chateada toda vez que ele se encantava com a beleza de alguém. De qualquer
forma, entendeu que não devia ficar em silêncio.
— Vamos parar por aqui, Mione... Não quero brigar - ele pediu.
Hermione ainda não se acalmara. Morria de raiva do descaramento do rapaz
em flertar outras meninas na frente dela. Não suportava saber que dava tanto
valor a beleza física e, especialmente, que não a achava bonita.
— Quero ver se quando tiver namorada... Ah, isso se você conseguir uma
garota louca o suficiente para querer um cara como você - falou de um jeito
debochado. -Eu jamais namoraria alguém com um comportamento tão
estranho e infantil como o seu!
A menina virou as costas e saiu para a área externa da Toca, onde acontecia o
jogo de quadribol, com passadas firmes.
Sem saber qual atitude tomar, ele simplesmente subiu para o seu quarto.
Melhor evitar Hermione, pelo menos naquele momento, pensou. Sabia que
demoraria um pouco até ela se acalmar.
O ruivo ainda tentava entender a reação da menina. Seria ciúme? E por que
ela disse que jamais namoraria um cara como ele? “Isso eu já sei há muito
tempo”, pensou. “Não precisava que ela falasse”. Ainda estava perdido nesses
pensamentos quando Harry entrou no quarto.
— Ron? O que houve? Nunca vi Hermione com tanta raiva de você - Harry
olhava intrigado para ele.
— Eu não sei o que aconteceu com ela... Não consigo entender as meninas.
São tão complicadas... - ele fez uma careta engraçada.
Harry lembrava da conversa que acabara de ter com Hermione. A garota saiu
d'A Toca quase chorando e seguiu em direção contrária ao campo improvisado
de quadribol. Para onde ela iria?
Pediu licença aos ruivos e foi atrás dela. "Hermione, espera! O que o Ron fez
dessa vez?", Harry questionou-a. Sempre que a via irritada era certo que
brigara com o amigo.
— Não aguento mais o Ron, Harry. Ele é tão imaturo. Fica com aquela cara de
bobo quando vê uma menina bonita. Não sabe se posicionar, não sabe o que
quer da vida. Não sei por que eu ainda tenho esperança que ele mude. Devia
saber que isso é impossível - a garota tentava segurar as lágrimas.
Harry já desconfiava há muito tempo que os dois eram apaixonados. No último
ano, Ron e Mione se tornaram mais próximos, embora ainda não admitissem o
sentimento que tinham um pelo outro. Agora, quando pensava que finalmente
começavam a reconhecer para si mesmos que se amavam, voltavam a brigar.
— Ron pode ser um pouco imaturo sim, mas também é um cara muito legal e,
o mais importante, é nosso amigo - Harry amenizou.

CAPÍTULO 2
Os vidrinhos rosa exerciam uma forte atração sobre Hermione. Quando Fred e
Jorge informaram que continham a poção do amor, ela recuou um pouco sem
graça. Enquanto olhava outros artigos da Gemialidades Weasley, os dois
irmãos se aproximaram. Fred parecia esconder algo e, com um gesto rápido,
tirou as mãos de trás das costas e ofereceu um daqueles vidros para a menina.
— Cortesia da casa! – anunciou com um sorriso.
— Não costumamos oferecer para ninguém e recomendamos com restrições –
completou Jorge.
— Essa poção costuma ser muito forte e tem efeitos colaterais – explicou Fred.
— Mas no caso de uma menina interessada em conquistar um cabeça-dura,
achamos que é a única solução! – disse Jorge com uma piscadela.
— Muito obrigada, eu não preciso disso – respondeu a menina.
— Tem certeza? – provocou Fred.
— Leve uma sem compromisso – Jorge sugeriu.
A menina virou as costas, antes que os gêmeos a convencessem a levar a
poção. Será que precisaria mesmo daquilo para Ron tomar coragem de se
declarar?
Sacudiu a cabeça assustada com os próprios pensamentos. Ron parecia em
alguns momentos gostar dela mais do que como amiga. No entanto, Mione
sabia que, mesmo se essa impressão fosse verdadeira, dificilmente ele teria
coragem de se declarar. Ainda assim precisava reconhecer que o rapaz estava
muito diferente. Tanto que pediu desculpas a ela com simplicidade e
sinceridade depois que se desentenderam por conta de Fleur.
Perdida nesses pensamentos, ela se surpreendeu ao chegar ao último corredor
da loja e se deparar com Lilá Brown e Ron conversando de forma muito
animada. Hermione não gostou nada de ver os dois juntos novamente.
Quando Ron veio em sua direção, foi logo perguntando:
— O que Lilá estava falando com você?
— Disse alguma coisa sobre continuar na escola, perguntou se meus pais não
estavam preocupados... Parece que os pais dela por pouco não a proibiram de
continuar em Hogwarts - ele olhava Mione com atenção.
— Ela estava muito sorridente para quem estava dizendo algo tão sério! -
Hermione manteve a fisionomia séria.
— Hermione! Por que você tem tanta implicância com Lilá? - Ron ergueu uma
das sobrancelhas. 
— Cadê o Harry? – ela perguntou, na tentativa de escapar da pergunta do
ruivo.
— Eu sei lá! Tem tanta coisa aqui para ver que ele deve estar distraído em
algum corredor. Vou até a sessão de artefatos trouxas, que ainda não visitei –
o rapaz respondeu, saindo de perto da amiga.
Ela observou Ron passar novamente perto de Lilá, que deu um sorrisinho, e
falar alguma coisa para a menina. Saiu na direção contrária, bem chateada, e
esbarrou em Harry.
O amigo logo notou que ela não estava em seu estado normal.
— O que houve, Mione? - ele a interrogou.
— Aquela metida da Lilá Brown! Acho ela insuportável! - a garota bufou irritada.
— Desde o ano passado ela já demonstrava estar interessada em Ron. Não sei
por que a surpresa... - o amigo foi direto.
— Harry? Eu não ia dizer nada disso...
— Sei... Mas escuta, Hermione, Ron é tão desligado que nem percebeu - o
rapaz ponderou.
— Não é tão desligado assim não. Pelo menos quando se tratam de meninas
bonitas. E garanto que já percebeu que Lilá está interessada nele - Hermione
rebateu.
 
 
 
Harry, Hermione e Gina estavam no andar de cima d'A Toca. Ron tinha descido
até a cozinha para “beliscar” alguma coisa – não estava conseguindo esperar
até a hora do lanche – e a mãe o presenteou com uma deliciosa mousse de
chocolate.
— Mãe, isso aqui está bom demais... Em Hogwarts, as sobremesas são
ótimas, mas não se compararam às suas – o rapaz elogiou.
Molly deu um sorriso. Era tão fácil conquistar o filho. Bastava uma comida
caprichada, uma palavra, um carinho. Percebeu que aquele era o momento de
falar de um assunto delicado e importante.
— Eu e seu pai gostamos muito da Hermione. Ela tem ótimo coração, é muito
responsável e percebemos o quanto o ajuda e estimula nos estudos – disse
Molly introduzindo o assunto.
— Mione é legal, sim. Mas tem horas que se intromete demais em tudo, é
autoritária... – contrapôs o rapaz.
— Mas quem não tem defeitos, Ronald? - a mãe o questionou.
O ruivo olhou intrigado para a mãe, tentando entender onde ela queria chegar.
Antes dele conseguir pensar numa resposta, Molly continuou:
— Hermione vai fazer aniversário daqui a alguns dias e gostaria de repassar a
você algo muito valioso para presenteá-la. Se você achar que deve, é claro.
A mãe fez um gesto rápido com a varinha e no mesmo instante se materializou
em suas mãos um delicado cordão dourado com uma pedra em forma de
estrela como pingente. “Foi um presente que recebi da minha avó materna e
transmite uma atmosfera mágica muito envolvente. Estava com esse cordão no
dia em que eu e seu pai começamos a namorar. Pensava em passar para
Gina, mas depois decidi que daria para um dos meus filhos presentear uma
menina muito especial. Desde que Hermione chegou aqui, tenho sentido no
meu coração que esse colar deve ser dela”, Molly justificou.
— Mas por que a senhora mesma não entrega esse presente a ela? –
perguntou Ron, que intuía que dar aquele cordão era o mesmo que fazer uma
declaração de amor e não sabia se tinha coragem ou se esse era o momento
para aquele gesto tão comprometedor.
— Meu filho, Hermione é sua amiga e foi por causa da sua ligação com ela que
pensei em dar esse presente. Mas se você não quiser, passo para outro dos
seus irmãos – a mãe argumentou.
O rapaz de repente percebeu quão especial era aquele presente. Por alguns
segundos enfrentou um dilema. Uma parte dele desejava aproveitar todas as
oportunidades de fazer chegar o seu afeto à menina. Outra queria guardar
segredo daquele sentimento tão forte, mas ainda tão confuso, que ganhava
cada vez mais espaço no seu peito. O olhar de incentivo de sua mãe,
misturado ao maravilhoso sabor da mousse, fez optar pelo seu lado mais
irracional. Mesmo correndo o risco de se expor por completo, Ron decidiu que
não deixaria essa chance passar. “Mãe, muito obrigada. Eu aceito, sim. Acho
que Mione vai ficar muito feliz. Mas devo dizer que foi você que pensou em dar
o cordão para ela?”, ele perguntou.
— Diga que pertenceu a mim e que passei a você para presentear uma pessoa
que considerasse muito especial em sua vida – sugeriu Molly.
Com um novo rodopio da varinha, a mãe colocou o cordão numa delicada
caixinha lilás e a entregou ao filho. Ron guardou a caixa no bolso e, como já
tinha terminado a mousse, se levantou e deu um beijo em Molly. “Te amo,
mãe”, falou e, em troca, ganhou um sorriso, seguido por um beijo e palavras
afetuosas. “Eu também te amo, Ron. Tenho muito orgulho de você”.
Ao chegar à sala do segundo andar, Ron encontrou Hermione, Harry e Gina
conversando animadamente. O rapaz entrou muito quieto e logo seus olhos e
os de Hermione se cruzaram. Ele deu um sorriso um tanto misterioso para a
menina, que era sempre muito desconfiada. “Alguma coisa aconteceu”, ela
pensou, lembrando que o amigo tinha dito que iria à cozinha e já voltava.
— Você demorou, Ron. O que estava fazendo? - Mione perguntou.
Será que a amiga deduzira que havia conversado sobre ela com a mãe? Claro
que não, concluiu o rapaz. “Ron? Você não me respondeu!”, insistiu Hermione.
— Estava com fome e mamãe me serviu uma mousse deliciosa. É uma receita
trouxa, você deve conhecer. Acho que vai ser a sobremesa do jantar – ele deu
um sorriso.
—Você só pensa em comida, Ron – Gina não perderia aquela chance de
criticar o irmão.
O ruivo se limitou a fazer uma careta para a irmã. Sentou em frente à
Hermione, que escutava atentamente Gina falar que os rapazes em geral se
preocupam com comida e outros assuntos banais. Indiferente à  conversa, Ron
contemplava o rosto da amiga com um olhar perdido, imaginando como ela
ficaria surpresa com o presente.
Mione olhou para ele de repente e se surpreendeu com a expressão sorridente
e distante do amigo. “Ron?”, chamou. O rapaz permaneceu quieto, sem mover
um músculo. Foi apenas na segunda vez que falou o nome do ruivo que ele
pareceu despertar.
— Estava lembrando da mousse de chocolate? - questionou Harry com uma
fisionomia divertida.
— É... mais ou menos – disse Ron, que não sabia mentir.
A garota ficou intrigada. Achou a expressão de Ron muito parecida com a que
tinha quando encontrava com alguma veela. O amigo não era de ficar com
aquela cara abobalhada à toa. O que será que estava acontecendo com ele? 

Depois que voltaram as aulas, os desentendimentos entre Ron e Hermione


também retornaram. Não eram tão intensos como nos anos anteriores, mas
ainda aconteciam. Ron estava mais tranquilo e paciente com a menina. A
morena, no entanto, como já manifestara no ano anterior, exigia que o rapaz
amadurecesse.
“Ele só pensa em comida, quadribol e momentos para relaxar. Imagina! Achar
que teremos horários livres para ficar mais tempo sentado, sem fazer nada?
Disse a ele que vamos precisar desse tempo para estudar, mas acho que nem
me escutou”, queixou-se a Harry.
— Ron sempre foi assim, Hermione. Tudo bem que pode amadurecer um
pouco e, acredite, ele já amadureceu bastante. Mas todos nós podemos
melhorar, não é mesmo? – disparou Harry que achava a amiga muito tensa,
exigente consigo mesmo e com os outros.
Talvez Harry tivesse razão, pensou Hermione. Enquanto alimentasse qualquer
expectativa que Ron fosse diferente, continuaria a se decepcionar. Era difícil
admitir. Mesmo se detestava algumas características do ruivo, era apaixonada
por ele. Ron tinha qualidades que ela amava e, devia reconhecer, não possuía.
“Dizem que os opostos se atraem. É, deve ser isso”, tentava se conformar.
No fundo, mesmo se não reconhecia, o que a deixava mais irritada era a
indecisão do rapaz. Já dera tantos sinais que gostava dela, mas não conseguia
se declarar. Ao mesmo tempo, era tão contraditório. Em muitos momentos
implicava com Hermione, não aceitava as suas opiniões. E ainda flertava com
mulheres bonitas na frente da amiga!
Foi com essa mistura de sentimentos que ela chegou à sala para a primeira
aula de Estudos Avançados de Poções do professor Slughorn. Para a sua
surpresa, Ron, que não estava matriculado nessa disciplina, chegou atrasado
com Harry e foi aceito na turma. Deu uma olhada para o ruivo com certa
decepção e se perguntou: “Será que ele nunca vai tomar uma decisão”?
Os três caldeirões no centro da sala de aula já tinham chamado a atenção de
Hermione. Em especial um deles, que exalava um cheiro que a atraia
fortemente.
Com sua inteligência rápida, Hermione logo identificou as poções que
continham cada caldeirão. Quando o professor Slughorn perguntou se alguém
sabia qual era a poção do primeiro, a menina levantou a mão e acertou a
resposta. Não foi diferente quando o professor perguntou sobre o conteúdo do
segundo.
Ron olhou da menina para o professor, que parecia impressionado com a
capacidade da nova aluna. Slughorn chegou ao último caldeirão e Ron tinha
certeza que a amiga responderia qual poção era aquela. Das três, essa era a
única que o próprio rapaz não identificara. No entanto, mesmo sabendo a
resposta, ele jamais levantaria a mão como fazia Hermione com tanta
desenvoltura.
— É Amortentia! – respondeu a menina.
 Para surpresa do ruivo, Hermione informou com propriedade os seus efeitos.
“É a mais poderosa poção do amor no mundo”, disse. A garota mudou o tom de
voz e, com entusiasmado, continuou a falar. “Eu a reconheci também pela
fumaça subindo em suas espirais características. E ela deve cheirar
diferentemente para cada um, dependendo do que nos atrai. Eu posso sentir
grama recentemente cortada, pergaminho novo e...”. A voz de Hermione sumiu
de um jeito abrupto e ela ficou levemente rosada.
Ron estranhou a mudança, mas jamais suspeitaria do motivo. Era o cheiro
cítrico, tão característico do cabelo do ruivo, que a menina sentira. Ela se
afastou com o coração batendo forte, morrendo de medo que alguém,
especialmente o amigo, sempre tão intuitivo, desconfiasse de alguma coisa.
O que para quase todos foi apenas uma aula normal, para Hermione significou
muito. Se precisava de uma confirmação de que era Ron o amor de sua vida,
agora já tinha. Não conhecia mais ninguém com esse perfume maravilhoso,
que tão fortemente a atraia e a fazia se sentir tão bem. 

CAPÍTULO 3
Os vidrinhos rosa exerciam uma forte atração sobre Hermione. Quando Fred e
Jorge informaram que continham a poção do amor, ela recuou um pouco sem
graça. Enquanto olhava outros artigos da Gemialidades Weasley, os dois
irmãos se aproximaram. Fred parecia esconder algo e, com um gesto rápido,
tirou as mãos de trás das costas e ofereceu um daqueles vidros para a menina.
— Cortesia da casa! – anunciou com um sorriso.
— Não costumamos oferecer para ninguém e recomendamos com restrições –
completou Jorge.
— Essa poção costuma ser muito forte e tem efeitos colaterais – explicou Fred.
— Mas no caso de uma menina interessada em conquistar um cabeça-dura,
achamos que é a única solução! – disse Jorge com uma piscadela.
— Muito obrigada, eu não preciso disso – respondeu a menina.
— Tem certeza? – provocou Fred.
— Leve uma sem compromisso – Jorge sugeriu.
A menina virou as costas, antes que os gêmeos a convencessem a levar a
poção. Será que precisaria mesmo daquilo para Ron tomar coragem de se
declarar?
Sacudiu a cabeça assustada com os próprios pensamentos. Ron parecia em
alguns momentos gostar dela mais do que como amiga. No entanto, Mione
sabia que, mesmo se essa impressão fosse verdadeira, dificilmente ele teria
coragem de se declarar. Ainda assim precisava reconhecer que o rapaz estava
muito diferente. Tanto que pediu desculpas a ela com simplicidade e
sinceridade depois que se desentenderam por conta de Fleur.
Perdida nesses pensamentos, ela se surpreendeu ao chegar ao último corredor
da loja e se deparar com Lilá Brown e Ron conversando de forma muito
animada. Hermione não gostou nada de ver os dois juntos novamente.
Quando Ron veio em sua direção, foi logo perguntando:
— O que Lilá estava falando com você?
— Disse alguma coisa sobre continuar na escola, perguntou se meus pais não
estavam preocupados... Parece que os pais dela por pouco não a proibiram de
continuar em Hogwarts - ele olhava Mione com atenção.
— Ela estava muito sorridente para quem estava dizendo algo tão sério! -
Hermione manteve a fisionomia séria.
— Hermione! Por que você tem tanta implicância com Lilá? - Ron ergueu uma
das sobrancelhas. 
— Cadê o Harry? – ela perguntou, na tentativa de escapar da pergunta do
ruivo.
— Eu sei lá! Tem tanta coisa aqui para ver que ele deve estar distraído em
algum corredor. Vou até a sessão de artefatos trouxas, que ainda não visitei –
o rapaz respondeu, saindo de perto da amiga.
Ela observou Ron passar novamente perto de Lilá, que deu um sorrisinho, e
falar alguma coisa para a menina. Saiu na direção contrária, bem chateada, e
esbarrou em Harry.
O amigo logo notou que ela não estava em seu estado normal.
— O que houve, Mione? - ele a interrogou.
— Aquela metida da Lilá Brown! Acho ela insuportável! - a garota bufou irritada.
— Desde o ano passado ela já demonstrava estar interessada em Ron. Não sei
por que a surpresa... - o amigo foi direto.
— Harry? Eu não ia dizer nada disso...
— Sei... Mas escuta, Hermione, Ron é tão desligado que nem percebeu - o
rapaz ponderou.
— Não é tão desligado assim não. Pelo menos quando se tratam de meninas
bonitas. E garanto que já percebeu que Lilá está interessada nele - Hermione
rebateu.
 
Harry, Hermione e Gina estavam no andar de cima d'A Toca. Ron tinha descido
até a cozinha para “beliscar” alguma coisa – não estava conseguindo esperar
até a hora do lanche – e a mãe o presenteou com uma deliciosa mousse de
chocolate.
— Mãe, isso aqui está bom demais... Em Hogwarts, as sobremesas são
ótimas, mas não se compararam às suas – o rapaz elogiou.
Molly deu um sorriso. Era tão fácil conquistar o filho. Bastava uma comida
caprichada, uma palavra, um carinho. Percebeu que aquele era o momento de
falar de um assunto delicado e importante.
— Eu e seu pai gostamos muito da Hermione. Ela tem ótimo coração, é muito
responsável e percebemos o quanto o ajuda e estimula nos estudos – disse
Molly introduzindo o assunto.
— Mione é legal, sim. Mas tem horas que se intromete demais em tudo, é
autoritária... – contrapôs o rapaz.
— Mas quem não tem defeitos, Ronald? - a mãe o questionou.
O ruivo olhou intrigado para a mãe, tentando entender onde ela queria chegar.
Antes dele conseguir pensar numa resposta, Molly continuou:
— Hermione vai fazer aniversário daqui a alguns dias e gostaria de repassar a
você algo muito valioso para presenteá-la. Se você achar que deve, é claro.
A mãe fez um gesto rápido com a varinha e no mesmo instante se materializou
em suas mãos um delicado cordão dourado com uma pedra em forma de
estrela como pingente. “Foi um presente que recebi da minha avó materna e
transmite uma atmosfera mágica muito envolvente. Estava com esse cordão no
dia em que eu e seu pai começamos a namorar. Pensava em passar para
Gina, mas depois decidi que daria para um dos meus filhos presentear uma
menina muito especial. Desde que Hermione chegou aqui, tenho sentido no
meu coração que esse colar deve ser dela”, Molly justificou.
— Mas por que a senhora mesma não entrega esse presente a ela? –
perguntou Ron, que intuía que dar aquele cordão era o mesmo que fazer uma
declaração de amor e não sabia se tinha coragem ou se esse era o momento
para aquele gesto tão comprometedor.
— Meu filho, Hermione é sua amiga e foi por causa da sua ligação com ela que
pensei em dar esse presente. Mas se você não quiser, passo para outro dos
seus irmãos – a mãe argumentou.
O rapaz de repente percebeu quão especial era aquele presente. Por alguns
segundos enfrentou um dilema. Uma parte dele desejava aproveitar todas as
oportunidades de fazer chegar o seu afeto à menina. Outra queria guardar
segredo daquele sentimento tão forte, mas ainda tão confuso, que ganhava
cada vez mais espaço no seu peito. O olhar de incentivo de sua mãe,
misturado ao maravilhoso sabor da mousse, fez optar pelo seu lado mais
irracional. Mesmo correndo o risco de se expor por completo, Ron decidiu que
não deixaria essa chance passar. “Mãe, muito obrigada. Eu aceito, sim. Acho
que Mione vai ficar muito feliz. Mas devo dizer que foi você que pensou em dar
o cordão para ela?”, ele perguntou.
— Diga que pertenceu a mim e que passei a você para presentear uma pessoa
que considerasse muito especial em sua vida – sugeriu Molly.
Com um novo rodopio da varinha, a mãe colocou o cordão numa delicada
caixinha lilás e a entregou ao filho. Ron guardou a caixa no bolso e, como já
tinha terminado a mousse, se levantou e deu um beijo em Molly. “Te amo,
mãe”, falou e, em troca, ganhou um sorriso, seguido por um beijo e palavras
afetuosas. “Eu também te amo, Ron. Tenho muito orgulho de você”.
Ao chegar à sala do segundo andar, Ron encontrou Hermione, Harry e Gina
conversando animadamente. O rapaz entrou muito quieto e logo seus olhos e
os de Hermione se cruzaram. Ele deu um sorriso um tanto misterioso para a
menina, que era sempre muito desconfiada. “Alguma coisa aconteceu”, ela
pensou, lembrando que o amigo tinha dito que iria à cozinha e já voltava.
— Você demorou, Ron. O que estava fazendo? - Mione perguntou.
Será que a amiga deduzira que havia conversado sobre ela com a mãe? Claro
que não, concluiu o rapaz. “Ron? Você não me respondeu!”, insistiu Hermione.
— Estava com fome e mamãe me serviu um mousse delicioso. É uma receita
trouxa, você deve conhecer. Acho que vai ser a sobremesa do jantar – ele deu
um sorriso.
—Você só pensa em comida, Ron – Gina não perderia aquela chance de
criticar o irmão.
O ruivo se limitou a fazer uma careta para a irmã. Sentou em frente à
Hermione, que escutava atentamente Gina falar que os rapazes em geral se
preocupam com comida e outros assuntos banais. Indiferente à conversa, Ron
contemplava o rosto da amiga com um olhar perdido, imaginando como ela
ficaria surpresa com o presente.
Mione olhou para ele de repente e se surpreendeu com a expressão sorridente
e distante do amigo. “Ron?”, chamou. O rapaz permaneceu quieto, sem mover
um músculo. Foi apenas na segunda vez que falou o nome do ruivo que ele
pareceu despertar.
— Estava lembrando do mousse de chocolate? - questionou Harry com uma
fisionomia divertida.
— É... mais ou menos – disse Ron, que não sabia mentir.
A garota ficou intrigada. Achou a expressão de Ron muito parecida com a que
tinha quando encontrava com alguma veela. O amigo não era de ficar com
aquela cara abobalhada à toa. O que será que estava acontecendo com ele? 
 
Depois que voltaram as aulas, os desentendimentos entre Ron e Hermione
também retornaram. Não eram tão intensos como nos anos anteriores, mas
ainda aconteciam. Ron estava mais tranquilo e paciente com a menina. A
morena, no entanto, como já manifestara no ano anterior, exigia que o rapaz
amadurecesse.
“Ele só pensa em comida, quadribol e momentos para relaxar. Imagina! Achar
que teremos horários livres para ficar mais tempo sentado, sem fazer nada?
Disse a ele que vamos precisar desse tempo para estudar, mas acho que nem
me escutou”, queixou-se a Harry.
— Ron sempre foi assim, Hermione. Tudo bem que pode amadurecer um
pouco e, acredite, ele já amadureceu bastante. Mas todos nós podemos
melhorar, não é mesmo? – disparou Harry que achava a amiga muito tensa,
exigente consigo mesmo e com os outros.
Talvez Harry tivesse razão, pensou Hermione. Enquanto alimentasse qualquer
expectativa que Ron fosse diferente, continuaria a se decepcionar. Era difícil
admitir. Mesmo se detestava algumas características do ruivo, era apaixonada
por ele. Ron tinha qualidades que ela amava e, devia reconhecer, não possuía.
“Dizem que os opostos se atraem. É, deve ser isso”, tentava se conformar.
No fundo, mesmo se não reconhecia, o que a deixava mais irritada era a
indecisão do rapaz. Já dera tantos sinais que gostava dela, mas não conseguia
se declarar. Ao mesmo tempo, era tão contraditório. Em muitos momentos
implicava com Hermione, não aceitava as suas opiniões. E ainda flertava com
mulheres bonitas na frente da amiga!
Foi com essa mistura de sentimentos que ela chegou à sala para a primeira
aula de Estudos Avançados de Poções do professor Slughorn. Para a sua
surpresa, Ron, que não estava matriculado nessa disciplina, chegou atrasado
com Harry e foi aceito na turma. Deu uma olhada para o ruivo com certa
decepção e se perguntou: “Será que ele nunca vai tomar uma decisão”?
Os três caldeirões no centro da sala de aula já tinham chamado a atenção de
Hermione. Em especial um deles, que exalava um cheiro que a atraia
fortemente.
Com sua inteligência rápida, Hermione logo identificou as poções que
continham cada caldeirão. Quando o professor Slughorn perguntou se alguém
sabia qual era a poção do primeiro, a menina levantou a mão e acertou a
resposta. Não foi diferente quando o professor perguntou sobre o conteúdo do
segundo.
Ron olhou da menina para o professor, que parecia impressionado com a
capacidade da nova aluna. Slughorn chegou ao último caldeirão e Ron tinha
certeza que a amiga responderia qual poção era aquela. Das três, essa era a
única que o próprio rapaz não identificara. No entanto, mesmo sabendo a
resposta, ele jamais levantaria a mão como fazia Hermione com tanta
desenvoltura.
— É Amortentia! – respondeu a menina.
 Para surpresa do ruivo, Hermione informou com propriedade os seus efeitos.
“É a mais poderosa poção do amor no mundo”, disse. A garota mudou o tom de
voz e, com entusiasmado, continuou a falar. “Eu a reconheci também pela
fumaça subindo em suas espirais características. E ela deve cheirar
diferentemente para cada um, dependendo do que nos atrai. Eu posso sentir
grama recentemente cortada, pergaminho novo e...”. A voz de Hermione sumiu
de um jeito abrupto e ela ficou levemente rosada.
Ron estranhou a mudança, mas jamais suspeitaria do motivo. Era o cheiro
cítrico, tão característico do cabelo do ruivo, que a menina sentira. Ela se
afastou com o coração batendo forte, morrendo de medo que alguém,
especialmente o amigo, sempre tão intuitivo, desconfiasse de alguma coisa.
O que para quase todos foi apenas uma aula normal, para Hermione significou
muito. Se precisava de uma confirmação de que era Ron o amor de sua vida,
agora já tinha. Não conhecia mais ninguém com esse perfume maravilhoso,
que tão fortemente a atraia e a fazia se sentir tão bem. 
CAPÍTULO 4
Na véspera do aniversário de Hermione, Ron abriu mais uma vez a caixinha
lilás e olhou o cordão. Por um instante teve medo de dar aquele presente à
menina. No fundo, sabia que era uma declaração silenciosa de amor. Ainda
não havia admitido para si mesmo que queria a morena como namorada.
Achava que a amiga jamais o aceitaria do jeito que era, sempre desejaria
mudar algo nele. Acreditava também que Mione tinha como meta conseguir um
namorado mais talentoso e bem-sucedido do que ele. Para que, então, correr o
risco de receber um não como resposta? E como iria encará-la depois? Com
certeza a amizade entre os dois acabaria.
Ao mesmo tempo, porém, sem saber explicar o porquê, algo o atraia
fortemente para a menina e o fazia intuir que ela também experimentava os
mesmos sentimentos confusos. Por isso logo se convenceu, mais uma vez,
que devia entregar o presente. Com medo de perder a coragem na hora que
estivesse frente a frente com ela, decidiu pedir a Gina que deixasse a delicada
caixinha na cabeceira da cama de Hermione.
“Por que você não entrega? O que vai dar para ela?”, questionava Gina, que
não parou de bombardeá-lo de perguntas. O rapaz foi evasivo e pediu
simplesmente que fizesse aquele favor e deixasse o presente próximo à amiga.
A irmã sugeriu que ele escrevesse ao menos um cartão.
Depois do jantar, Ron entregou à irmã a caixinha lilás acompanhada por um
pequeno envelope laranja. No cartão, apenas as palavras:

“Feliz aniversário, Mione!


Afetuosamente,
Ron”
Quando Hermione acordou, no dia do aniversário, a primeira coisa que viu foi a
caixinha lilás, pousada ao lado da cama. Quem poderia ter lhe dado aquele
presente tão delicado? No mesmo instante se lembrou de Ron e do perfume
que havia recebido no Natal. Seu coração acelerou e parecia que sairia do
peito. Depois de respirar fundo, ela pegou a caixinha e abriu o envelope. Os
olhos da menina logo encontraram a assinatura do ruivo. Mione na mesma
hora sentiu o sangue subir e o rosto queimar. Ainda bem que estava sozinha e
a cortina da cama, fechada.
Ainda nervosa, leu a mensagem. Ron, como sempre, era o mais econômico
possível com as palavras. Dessa vez, porém, tinha exagerado. Apenas
desejava feliz aniversário. Mas aquele afetuosamente, na despedida, vinha
cercado de significados.
Com muita expectativa, ela finalmente abriu a caixinha. Sorriu ao ver a
delicadeza do cordão. Como Ron adivinhara o seu gosto? Será que Gina havia
ajudado o irmão a escolher?
Ao tocar no pingente, percebeu que uma magia cercava o cordão, mas não
sabia identificar qual era. Intuía apenas que era algo bom, porque seu coração
sentia uma grande paz. Não resistiu ao impulso de colocar o cordão no
pescoço e escondeu a caixinha e o cartão debaixo do travesseiro.
Quando finalmente abriu a cortina, encontrou Gina sentada na cama em frente.
“Achei que não ia levantar nunca. Já ia te chamar! Feliz aniversário”, falou a
ruiva, dando um abraço na amiga e entregando o seu presente.
Hermione ficou feliz com o estojo de maquiagem que recebeu de Gina, mas
não sabia se teria coragem de usar todos aqueles produtos. Nos seis anos que
estava em Hogwarts, havia feito uma maquiagem completa apenas no Baile de
Inverno. No máximo usava um brilho ou batom claro nos lábios. A amiga,
parecendo ler os seus pensamentos, falou:
— Escolhi as cores mais discretas. É só para realçar ainda mais a sua beleza.
— Realçar minha beleza? Como você é generosa, Gina. Sei que não sou
bonita – Hermione rebateu.
— Você é bonita, sim. E não sou só eu que acho isso... Ron acha... – tentou
argumentar Gina sem sucesso, sendo interrompida por Hermione.
— Não adianta dizer que Ron me acha bonita! Ele pode até me achar
inteligente, estudiosa, legal, uma boa amiga, qualquer coisa... Mas bonita,
definitivamente não! – respondeu com ênfase.
— Bem, se você prefere pensar assim... Mas não vai deixar de usar a
maquiagem, hein? – a ruiva deu uma piscadela.
A menina sorriu e Gina reparou no discreto e bonito colar que ela usava. Sem
rodeios, como sempre fazia, perguntou se aquele era o presente de Ron.
Contou que ela deixara a caixinha ao lado da cama da amiga a pedido dele,
mas desta vez o irmão nem a havia consultado sobre o presente. Notou que a
amiga estava levemente rosada.
Hermione chegou à sala comunal acompanhada por Gina e encontrou Harry,
Ron e Neville, que esperavam por ela. O ruivo, como sempre, estava mais
distante do grupo. “Por que ele é sempre o último a me cumprimentar?”, ela se
questionava.
Antes que Mione pudesse formular uma resposta, Harry já a abraçava e
entregava o seu presente, a última edição, revista e atualizado, sobre História
da Magia. Neville, que ficou vermelho ao abraçar a amiga, lhe deu um caderno
no qual apenas quem escrevia podia ler as próprias palavras, uma invenção
dos gêmeos Weasley, é claro.
A garota olhou para Ron com um ar de cumplicidade reservado apenas aos
grandes amigos, mas o semblante dela trazia, ao mesmo tempo, um quê de
mistério. O ruivo ficou visivelmente constrangido. “Você não vai me
cumprimentar?”, ela por fim o interpelou. O rapaz se aproximou, de forma
displicente, dizendo: “Estava esperando todo mundo terminar”. Deu um beijo na
face da menina e segurando o braço dela, disse baixinho, quase sussurrando:
“Feliz aniversário, Mione”.
Ela sentia-se feliz como nunca e, ao mesmo tempo, muito à vontade ao lado do
amigo. Por isso foi espontâneo dizer que havia amado o colar. “Eu já estou até
usando”, Hermione sorriu. “Eu reparei”, disse Ron. Os dois trocaram olhares
por alguns instantes. As orelhas do ruivo logo ficaram vermelhas. A inteligente
bruxa, que normalmente experimentava um grande constrangimento numa
situação como aquela, manteve a paz e a tranquilidade.
Os cinco amigos desceram juntos para tomar o café da manhã. Gina colou ao
lado de Hermione. Foi um alívio para Ron, que estava ainda perturbado com o
jeito da amiga. Harry aproveitou para tirar uma brincadeira. “O cordão é o
pedido oficial de namoro? Imagina o que você vai dar para Mione por ocasião
do noivado!”, ele encarou o ruivo com ar divertido.
— Para com isso, Harry. É simplesmente um presente de aniversário. Cansei
de dar livros. Ela já tem livros demais - contrapôs Ron que, com sua cara
fechada, demonstrava claramente não gostar daquela insinuação.
Ron e Hermione não demoraram a descobrir que algo muito estranho estava
acontecendo entre eles. Os dois experimentavam uma atração muito forte um
pelo outro e uma vontade quase incontrolável de declarar os próprios
sentimentos. À noite, quando se encontraram sozinhos, cada um em seu
dormitório, chegaram à mesma conclusão: tudo havia ficado diferente depois
que a menina passou a usar o cordão.
O rapaz, desde o ano anterior, sentia uma atração crescente por Hermione.
Tinha a impressão que ela ficava mais bonita a cada dia. Tentava negar para si
mesmo tudo isso. Afinal, Mione era a sua amiga de muito tempo. No entanto,
jamais experimentara algo tão forte assim antes.
Durante todo o dia, Ron ficou terrivelmente perturbado com a simples visão da
menina. “Será que Hermione é uma veela?”, perguntou para si mesmo. Com
medo das próprias reações, fugiu da amiga o máximo que pôde. Ainda assim,
por duas vezes sentiu o impulso de se ajoelhar diante dela e repetir uma
declaração que agora soava muito antiquada e ridícula: “Mione, você é a garota
mais encantadora que existe e me faria o bruxo mais feliz do mundo se me
aceitasse como namorado”.
— Mamãe não me falou toda a verdade sobre aquele cordão. Preciso impedir
Hermione de usá-lo senão nem imagino quais serão as consequências. Mas
como vou fazer isso? - perguntava-se o rapaz.
A confusão de Hermione neste mesmo momento não era muito diferente. Ela,
como nunca, estava convicta de que amava Ron e o queria como namorado.
Mas o que a deixava desconcertada era o fato de estar agindo de formar
completamente diferente do habitual. Mione era sempre muito discreta e
eficiente em esconder os próprios sentimentos. Dessa vez, porém, parecia que
atração por Ron e o desejo de estar com o amigo eram tão grandes que ela
não temia expor o seu maior segredo.
Num momento de maior lucidez, quando se deu conta de que tudo havia
mudado depois do cordão, pensou em tirar a delicada joia do pescoço, mas
não conseguiu. Desde que começou a usá-lo, há dois dias, sentia uma grande
paz. E foi segurando o pingente em forma de estrela e pensando em Ron que a
menina mergulhou no mundo dos sonhos.
Ela e Ron, de mãos dadas, caminhavam descalços em um belíssimo jardim.
Estavam muito felizes e trocavam olhares e sorrisos. Os dois vestiam roupas
brancas. A morena usava um vestido longo e esvoaçante, o rapaz, uma calça e
uma bata de manga comprida. Entraram juntos em um palácio de cristal, muito
iluminado.
Os dois andavam por uma extensa sala, em direção a uma forte luz. Quando
chegaram próximos àquela fonte luminosa, ouviram uma voz feminina que
dizia. “Vocês vieram aqui porque querem descobrir que força é essa, tão
intensa, que os liga e os mantém unidos. Hoje vocês poderão entender a magia
que os atrai um para o outro e também estarão livres para decidir se querem
manter-se ligados assim ou não”.
Nesse instante, o pingente começou a brilhar. Outra voz, suave a princípio e
depois cada vez mais decidida, chamou pela menina. “Hermione... Hermione...
Hermione! Acorda!”, falou, arrebatando a garota daquele sonho tão real.
Quando abriu os olhos, Hermione viu Gina à sua frente. Ficou tão
decepcionada por ter sido retirada daquele sonho que reclamou com a ruiva.
“Por que você me acordou?!”. A amiga pediu desculpas e explicou que Ron e
Harry estavam preocupados com ela. “Você nunca acorda tarde e, se não se
apressar, além de ficar sem café, vai chegar atrasada na primeira aula”,
retrucou Gina.
Hermione não estava acreditando. Tinha a impressão de que acabara de
dormir e mergulhara naquele lindo sonho. Mas o relógio e a amiga diziam o
contrário. Já eram 7h40 e a primeira aula começava às oito. “Gina, por favor,
fala para Ron e Harry não se preocuparem comigo. Estarei na aula no horário,
como sempre”, ela garantiu.
A ruiva, que a olhava sem piscar, não se moveu e Hermione precisou ser direta
com ela. “Pode ir, por favor. Eu me arrumo mais rápido quando estou sozinha”,
justificou.  Assim que Gina saiu, Mione pegou a varinha. Lógico que iria usar
magia para cumprir o prometido.
Quando Ron e Harry entraram na sala para a aula de Poções, Hermione já se
encontrava lá. Estava com o cabelo muito bem penteado, preso com uma
trança lateral, usava uma maquiagem leve e trazia o cordão no pescoço. Para
completar, havia passado algumas gotas do perfume delicado e intenso que
ganhara do ruivo no Natal.
Se a intenção de Hermione era impressionar ainda mais o ruivo, ela conseguiu!
Ron ficou a aula toda completamente desconcentrado, ou melhor, concentrado
na menina. Tentava não olhar para a amiga, mas, quando se distraía, estava
lá, hipnotizado por ela, com aquela expressão abobalhada que antes reservava
apenas às veelas. A garota também não ficou indiferente ao rapaz. Quando
seus olhos se encontravam, Mione tinha sempre aquela expressão feliz de
quem sabe que é amada e não tem medo de corresponder a esse sentimento.
Ron havia escrito para a mãe pela manhã perguntando mais sobre os poderes
do cordão. Mesmo se a resposta ainda não chegara, o rapaz tinha certeza que
Hermione estava enfeitiçada. Acreditava que ele também, de alguma forma,
havia sido atingido pela magia da joia. Por isso decidira convencer a amiga a
tirar o colar. Não seria fácil, mas era a única opção. O ruivo tomou coragem e
escreveu o bilhete, que entregou para a amiga.
“Mione, me espere no fim da aula.  Preciso falar com você.
Ron”
Ao ler o bilhete, Mione lançou para Ron um olhar apaixonado e ele convenceu-
se ainda mais que a garota não estava no seu estado normal. Portanto, não
podia deixar-se levar por aquelas atitudes diferentes da menina. Quando ela
tirasse o cordão, tudo voltaria a ser como antes, acreditava o ruivo.
— Ron, o que está acontecendo? –Harry perguntou ao ver que o amigo não se
levantara quando tocou o sinal.
— Vou esperar Hermione. Tenho que falar com ela – Ron respondeu
constrangido.
Harry nem precisou ouvir que a conversa era particular para entender tudo e
despediu-se do amigo, desejando-lhe boa sorte. Ron sentiu certo medo de ficar
sozinho com a garota. Ela estava tão bonita e o olhava de um jeito tão
sedutor... Hermione, que arrumava o seu material mais devagar que o normal,
finalmente alcançou a porta, onde o ruivo a aguardava. “Vamos conversar num
lugar mais tranquilo”, o rapaz puxou-a pela mão até a sala de leitura, que
normalmente ficava vazia.
Quando chegaram à sala e Ron olhou nos olhos de Hermione, que estava linda
como nunca, intuiu que precisava agir rápido.
— Você não percebeu algo diferente desde que começou a usar o cordão? –
ele questionou.
— Estou me sentindo diferente, sim. Mas não sei se isso é ruim. Acho que
comecei a ver certas realidades com maior clareza e perdi o medo de mostrar
os meus sentimentos – a bruxa encarou o ruivo de forma decidida.
— Hermione, me desculpa, mas tenho motivos para acreditar que esse cordão
tem um poder muito forte e não é seguro continuar a usá-lo sem saber
exatamente qual magia é essa – ele falou antes de perder a coragem.
Quando a menina perguntou se tinha sido o amigo a escolher o cordão e onde
o havia conseguido, Ron revelou a verdade ao seu jeito. “O colar era da
mamãe e ela me deu para eu presentear alguém por quem tivesse
consideração”, explicou. “Apenas consideração?”, perguntou-se Hermione que
gostaria de ter do ruivo ao menos admiração. Naquele momento, no entanto,
algo dizia a Mione que o sentimento de Ron por ela era muito mais forte.
— Mas eu não vou tirar o cordão. Estou me sentindo muito bem com ele – a
garota estava decidida.
— Por favor, Mione. Deixa que eu tiro o cordão para você... É só por alguns
minutos, para a gente poder conversar... A magia do cordão também está me
atingindo... – o ruivo foi sincero.
A menina finalmente concordou e Ron foi mais ágil que nunca. Com um
rodopio da varinha, abriu o fecho do cordão que logo estava em sua mão.
Hermione sentiu que parte de sua energia havia sido retirada. Levou as mãos
ao rosto e curvou a cabeça, experimentando um misto de tristeza e cansaço.
Ron percebeu que algo estava errado. “Mione? Tudo bem com você?”, ele a
olhava com atenção.
— Estou me sentindo estranha... O que aconteceu? – Hermione parecia
realmente desanimada.
— Você não lembra? Acabei de tirar o cordão que lhe dei de presente... – Ron
continuava temeroso.
— É... estou lembrando. Você acha que o cordão está enfeitiçado, não é? – a
voz da garota tinha um tom de tristeza.
— Eu não sei, Hermione. Você não ouviu falar que os Comensais da Morte
enfeitiçam muitos objetos? Esse cordão era da mamãe, é verdade. Mas Você-
Sabe-Quem tem tantos poderes que nada é impossível – o ruivo estava
nervoso.
— Acredita que esse cordão tem uma magia ruim? Claro que não! Eu me senti
muito bem usando ele. Mas parece que você foi mais afetado do que eu. O que
estava sentindo? – ela recobrou a energia e o jeito questionador.
— Eu?! Bom... eu... eu estava me sentindo... fora do meu estado normal. Isso!
Fora do meu estado normal - repetiu ao encontrar as palavras que considerou
mais adequadas.
— Fora do seu estado normal? Como assim?  - Hermione colocou as mãos na
cintura.
— Com uns pensamentos estranhos, como se estivesse sendo conduzido por
algo muito forte e não por mim mesmo – Ron respondeu com simplicidade.
A garota olhou para o bruxo um pouco decepcionada. As reações de Ron
naquele último dia e, especialmente, a forma como olhara para ela a levaram a
acreditar que o seu sentimento pelo rapaz estava sendo correspondido. O que
o ruivo dizia agora - não estar agindo por si mesmo - parecia confirmar ser um
feitiço o causador daquela mudança no amigo. Será que Molly, interessada em
poções de amor na adolescência, havia enfeitiçado o cordão? Mas por que
faria aquilo? Ou seriam mesmo os Comensais da Morte que estavam agindo?
Hermione lembrou-se de uma aula de História da Magia, quando o professor
falou que a poção de amor já havia sido usada como arma nas guerras bruxas.
Segundo ele, as pessoas enamoradas ficavam tão fora de si, concentradas
apenas no objeto de sua paixão, que não conseguiam agir com lógica e muito
menos lutar.
Mas a menina não precisava dessa magia. Já estava suficientemente
apaixonada por Ron. Talvez ele sim, como os próprios gêmeos sugeriram. Mas
era um absurdo necessitar de um artifício assim para conquistar alguém,
especialmente porque não seria um amor verdadeiro e sim uma paixonite que
poderia passar a qualquer momento. Hermione não queria aquilo para ela. Se o
ruivo não a amava, nada tinha a fazer além de esquecer que sonhara um dia
em ser sua namorada.
Ron percebeu que Hermione parecia estar em outro mundo e ficou preocupado
com ela. A insegurança do ruivo não o permitia ver que a menina já estava
completamente apaixonada por ele. O cordão apenas lhe dera coragem de
expor os seus sentimentos. Desconfiava que a mãe, não sabia exatamente
porque, havia colocado um feitiço do amor na joia. O que mais explicaria o fato
dele ter experimentado um forte impulso em se declarar para Mione? Verdade
era que estava cada dia mais encantado pela amiga, mas jamais admitiria isso
espontaneamente.
— Você está bem? – ele perguntou em tom preocupado.
— Agora está tudo bem. Eu e você nos livramos do estranho poder do cordão.
Não era isso que você queria? – a garotava estava decepcionada.
Ron não sabia o que dizer. Percebia que a amiga estava magoada com ele e
se perguntava se havia feio algo errado. “Hermione, me desculpe. Eu não devia
ter dado esse cordão de presente para você sem antes saber que uma magia o
envolvia”, dizendo isso, o rapaz esticou a delicada joia em direção da garota.
“Pegue. Mas sugiro que não use enquanto eu não souber por mamãe algo
mais do cordão. Já escrevi para ela hoje de manhã”, informou.
— Ron, prefiro que o cordão fique com você. Ele exerce uma forte atração
sobre mim e não sei se foi conseguir deixar de usá-lo –  Hermione
confidenciou.
O rapaz concordou e, pouco depois, eles saíram da sala. A magia, que havia
tornado tão transparente o forte sentimento existente entre os dois e dado
coragem para revelarem esse amor, agora desaparecera. Tudo parecia um
sonho distante. Ron e Hermione voltaram a acreditar que não eram
correspondidos e que tudo não passara de um feitiço ilusório.
 
Logo depois do almoço, quando ainda saboreava a sobremesa, Ron recebeu
uma coruja trazendo a resposta de Molly. Hermione, que estava no final da
mesa, sentada com Gina, olhou-o com um semblante triste. O ruivo também
não estava feliz. Sentia que tinha feito algo errado. Talvez se precipitara ao
seguir o conselho da mãe e presentear a amiga com o cordão. Guardou a carta
no bolso, pensando em lê-la quando estivesse sozinho, no dormitório.
Não imaginava que seria abordado pela morena ao se levantar da mesa. “É a
carta da sua mãe, não é? Eu gostaria de saber o que ela falou sobre o cordão”,
Mione foi corajosa. Ron prometeu que informaria a garota sobre o conteúdo da
correspondência assim que a lesse. Conversaram ainda sobre outros assuntos
e, quando entraram na torre da Grifinória e o rapaz já começava a se despedir,
a menina entregou para ele a caixinha lilás, pedindo para que guardasse o
cordão ali.
Ron subiu ao dormitório ainda com a lembrança do olhar triste de Hermione.
Por que tinha que ser assim? Queria tanto fazer a amiga feliz, foi com esse
objetivo que lhe dera o cordão, e parecia ter fracassado uma vez mais. Não se
fixou muito nesses pensamentos porque queria logo abrir a carta da mãe. Com
ansiedade, começou a ler a correspondência.
“Querido Ron,
Você fez muito bem em escrever relatando o que está acontecendo. A magia
desse cordão é muito poderosa, mas de modo algum muda destinos ou
direciona os corações. O seu único objetivo é dar otimismo, melhor percepção
e crença nos próprios sentimentos. Mas isso pode motivar ações equivocadas,
caso não haja maturidade para ultrapassar os impulsos e agir segundo as
próprias convicções.
A impressão que tenho – e por isso peço desculpas – é que me precipitei ao
sugerir que você presenteasse Hermione com o cordão. Claro que o colar
pertence a ela e deveria ser entregue por você, mas tudo indica que esse não
era o momento. Vocês dois precisam amadurecer ainda mais.
Talvez o melhor seja sugerir a Hermione para deixar o cordão guardado por
algum tempo. Caso ela não entenda e queira alguma explicação a mais,
coloco-me à disposição para falar com Mione.
Com todo meu amor, um beijo afetuoso,
Mamãe”

O rapaz ficou algum tempo perdido em seus pensamentos. O que a mãe queria
dizer com “seu único objetivo é dar otimismo, melhor percepção e crença nos
próprios sentimentos”? Será que a atração forte que sentira pela amiga é
porque percebera melhor algo já latente no próprio coração? E por que
Hermione o olhava daquele jeito enamorado? Estaria acontecendo o mesmo
com ela? Por que a mãe dizia “que precisavam amadurecer”?
Eram muitas perguntas sem resposta. Mas o pior é que Hermione, curiosa
como era, não sossegaria enquanto ele não dissesse tudo que estava na carta.
No intervalo da primeira aula da tarde, como Ron imaginara, Hermione foi
procurá-lo. Queria saber o que dizia a carta. “Não entendi muito bem. Vou ler
um pedaço para você. Talvez compreenda melhor que eu”, o ruivo disse,
tirando um papel dobrado do bolso da jaqueta.
— Aqui diz que o único objetivo da magia presente no colar é “dar otimismo,
melhor percepção e crença nos próprios sentimentos. Mas isso pode motivar
ações equivocadas, caso não haja maturidade para ultrapassar os impulsos e
agir segundo as próprias convicções”. Estranho, né? – ele não reparou no olhar
assustado da garota.
Hermione não achava nada estranho. Agora entendia perfeitamente o que tinha
experimentado. Por causa da magia do colar sentira convicção do seu amor
por Ron e ficara otimista quanto à correspondência do rapaz. “Mas espera aí!
Isso não faz sentido”, a menina refletiu ao lembrar que o ruivo dissera estar
sendo afetado pelo colar.
— Ron, sua mãe não falou nada sobre o cordão poder influenciar outras
pessoas além de quem o usasse? Você disse que estava sendo atingido pela
magia do colar...- ela foi direta.
— Acho que me enganei – ele respondeu reticente imaginando que a menina
iria bombardeá-lo de perguntas. – Mamãe disse que você pode escrever para
ela caso tenha mais alguma dúvida. Agora preciso ir.
A garota ficou quieta, mas logo viu que seria uma boa ideia escrever para
Molly. Ron sempre tivera dificuldade de falar sobre os próprios sentimentos.
Com certeza não havia contado tudo que estava na carta.
À noite, sentada em sua cama, Hermione escreveu para a mãe de Ron. Na
carta, agradeceu pela generosidade dela em passar o cordão para o filho
presentear uma amiga. Perguntou ainda mais detalhes da magia do colar e se
essa poderia afetar outras pessoas, revelando que Ron dissera estar sendo
atingindo pela mesma.
No final da tarde do dia seguinte, a coruja dos Weasley entregou uma carta a
Hermione. Sorte que Ron não estava por perto, pensou a menina. Gina, porém,
estava e logo foi perguntar por que Mione havia recebido uma correspondência
da casa dela.
“Eu queria tirar uma dúvida com sua mãe sobre uma magia da qual ela me
falou”, tentou sair pela tangente. A ruiva, é claro, não se satisfez com essa
resposta e quis saber mais. Hermione, no entanto, disse que nada mais podia
revelar. “Você, Ron e Harry têm tantos segredos... Tudo para derrotar Você-
Sabe-Quem, não é?”, ela questionou. Dizendo que sentia muito por não poder
falar mais, Mione despediu-se da amiga.
A garota correu para o quarto, torcendo para não encontrar com Ron. Queria
ler a carta com tranquilidade. Não entendia porque, mas sentia grande
ansiedade. Imaginava que Molly havia escrito algo revelador, que poderia
mudar a sua vida. Mas não compreendia a razão de tanta expectativa. Sem
perder mais tempo, abriu o envelope amarelado.
“Querida Hermione,
Lamento que o presente tenha causado alguns transtornos. Esse cordão
significou muito para mim, já que o usei em momentos felizes de minha vida.
Estava com ele quando comecei a namorar Arthur, por exemplo.
Como já expliquei a Ron, o colar não direciona as ações das pessoas que o
usam, apenas traz otimismo, convicção dos próprios sentimentos e escolhas,
força para seguir o coração.
Quanto a dar esses mesmos “efeitos” em outros, como relatou que pode ter
acontecido com Ron, caso exista muita afinidade entre quem usa e essa
pessoa, é possível sim. Agora me lembro que Arthur ficava mais romântico e
expressava melhor os seus sentimentos sempre que eu estava com o colar.
Com relação ao Ronald, sugiro que tenha paciência com ele. Geralmente os
rapazes demoram mais a amadurecer e têm mais dificuldade para entender e
mostrar os próprios sentimentos. Ron, por sinal, não tem o dom da palavra.
Mas, em compensação, é tão transparente! Se você prestar mais atenção no
seu olhar e em pequenos gestos, vai entender tudo o que se passa no coração
dele.
Como os efeitos do colar não foram bem compreendidos, especialmente por
Ron, ao que parece, sugiro que o deixe guardado por um tempo. Logo você
poderá voltar a usá-lo e entenderão plenamente como somos felizes quando
seguimos o coração.
Com os meus votos tardios de feliz aniversário, lhe desejo muitas alegrias,
Afetuosamente,
Molly”

A menina releu a carta algumas vezes. Cada palavra estava repleta de


significados. Então a magia do cordão só confirmava o seu forte sentimento por
Ron? De fato, isso parecia se comprovar.
Muitas vezes Mione tinha dúvidas se deveria seguir o coração, já que o ruivo
parecia não gostar dela da mesma forma e em alguns momentos chegava a
destratá-la. Quando usou a joia, perdeu todas essas dúvidas e teve certeza de
que era correspondida. Parecia que tudo que experimentara se encaixava
exatamente na descrição de Molly sobre a magia do colar. Hermione estava
mais otimista, convicta do amor que tinha pelo ruivo e sem medo de seguir o
próprio coração.
O trecho da carta em que Molly dizia que Arthur ficava mais romântico e
expressava melhor os seus sentimentos quando ela usava o colar fez o
coração de Hermione bater mais rápido. Será que Ron também experimentava
o impulso de revelar seu amor pela amiga e por isso ficara tão incomodado
com o colar? Não, isso não fazia sentido, pensava a menina, sempre tão
racional. O ruivo parecia ter medo dela, talvez por perceber a paixão que
tinha por ele.
No entanto, foi o conselho de Molly para que tivesse paciência com Ron que a
fez estremecer. A menina perdeu as contas das vezes que releu aquele
parágrafo, parando em cada palavra.
“Geralmente os rapazes demoram mais a amadurecer e têm mais dificuldade
para entender e mostrar os próprios sentimentos”. O que Molly queria dizer
com isso? Será que o amigo gostava dela, mas não tinha convicção plena
disso ou sentia medo?
A garota voltou à leitura. “Ron, por sinal, não tem o dom da palavra. Mas, em
compensação, é tão transparente! Se você prestar mais atenção no seu olhar e
em pequenos gestos vai entender tudo o que se passa em seu coração”.
Com a respiração suspensa, Hermione lembrou as muitas e significativas
trocas de olhares com Ron. Em alguns desses momentos teve certeza de que
o rapaz não a queria apenas como amiga, que a desejava como namorada. As
palavras dele, por vezes agressivas, contradiziam isso. Mas agora Molly dizia
que ela deveria estar mais atenta ao olhar e aos pequenos gestos do rapaz.
Lembrava das vezes que o amigo a defendera, expressara o seu carinho com
sorrisos, presentes, elogios. Precisava acreditar mais nisso, seguir o próprio
coração, como dissera Molly.
Para completar o texto recheado de entrelinhas, Molly terminou a carta, sempre
direcionada à menina, na segunda pessoa do singular, dirigindo-se à segunda
pessoa do plural. “Entenderão plenamente como somos felizes quando
seguimos o coração”. Parecia que agora Molly falava para ela e Ron. “Mas por
que?”, Hermione se perguntava.
Na manhã seguinte, Mione encontrou Ron na sala comunal e os dois desceram
juntos para o refeitório. Gina não tinha guardado segredo sobre a
correspondência recebida pela amiga e o ruivo foi logo perguntando se a mãe
tinha escrito para ela. Quando a garota disse que sim, o rapaz quis saber o que
Molly havia falado e foi a vez da morena economizar palavras.
— Ron, sua mãe apenas explicou, de uma forma mais didática, o que já tinha
escrito para você. Nada de mais. Mas agora entendi que é melhor mesmo não
usar o colar. Pelo menos por enquanto – ela deu um suave e enigmático
sorriso.
CAPÍTULO 5
Depois do episódio do cordão, Ron e Hermione tentaram resgatar a mesma
amizade de sempre. Externamente, tudo estava igual, com as mesmas
implicâncias e brigas, motivadas por insegurança, ciúme, desejo de atenção e
correspondência dos sentimentos. Nos corações dos dois, porém, algo havia
mudado. Tinham experimentado a certeza de que se amavam e o amor não
passa sem deixar marcas.
Em poucas semanas, o assunto principal passou a ser o quadribol, já que
haveria nova seleção para os jogadores da Grifinória. Apesar de achar aquele
esporte uma perda de tempo, Hermione reconhecia que o quadribol fazia a
felicidade de muitos alunos, especialmente dos seus amigos Harry e Ron.
A garota devia confessar que desde quando o ruivo entrara para o time, no ano
anterior, assistir aos jogos se tornara mais interessante. Hermione, porém,
sofria com o nervosismo dele. Era uma tortura vê-lo errar as jogadas por pura
insegurança e não poder fazer nada para ajudar.
Um pouco contrariada com Ron, que colocava o quadribol acima dos estudos,
Hermione foi para a arquibancada assistir ao teste para goleiro. Observou que
Lilá sentou um pouco adiante e não tirava os olhos do rapaz.
“Boa sorte!”, gritou Lilá da arquibancada. Ron deu um sorriso nervoso para a
loura. Hermione ficou vermelha de raiva.
O ruivo estava num dia excepcionalmente inspirado e defendeu uma, duas,
três, quatro, cinco faltas seguidas. Hermione comemorava cada defesa de
forma animada. Mas voltava a ficar tensa à espera das próximas performances
de Ron.
Depois daquelas defesas brilhantes, restava torcer para que Córmaco
McLaggen não se saísse tão bem. Para desespero de Mione, ele agarrou
quatro goles e só faltava a última para empatar com o ruivo. Sem pensar muito,
movida pelo grande amor que tinha pelo amigo e temendo o quanto ele sofreria
se não conquistasse a vaga, Hermione usou da magia para “confundir”
Córmaco. O rapaz falhou na quinta tentativa e pediu outra chance a Harry, que
não aceitou. Ron era o novo goleiro do time de quadribol da Grifinória!
 “Você foi brilhante, Ron!” gritou Hermione da arquibancada e recebeu em troca
o sorriso mais lindo do mundo. Como era bom ver Ron assim tão feliz, pensou
a menina. O melhor foi assistir Lilá ir embora um pouco sem jeito. “Dessa vez
todas as atenções foram para mim”, a morena concluiu feliz.
Hermione ainda pôde saborear o bom humor do ruivo enquanto se dirigiam
para a cabana de Hagrid. “Eu pensei que não iria pegar a quarta falta”, Ron
disse feliz. “Arremesso complicado de Demelza, você viu, teve um pouco de
curva nela...”.
 “Sim, sim, você foi magnífico”, respondeu Hermione, temendo que ele falasse
da falha de Córmaco. Mas não teve jeito. “Você viu McLaggen virar a vassoura
na direção errada em sua quinta falta? Ele pareceu confuso...”, continuou o
rapaz.
Harry percebeu que Hermione corou profundamente quando ouviu essas
palavras. O ruivo, que continuava a descrever cada jogada de forma
apaixonada, não desconfiou de nada.
A seleção de Ron para a posição de goleiro deixou o rapaz bem por vários dias
e isso o motivou mais também para o estudo. Observando a dedicação do
ruivo, e os bons resultados que obtinha quando se esforçava, Hermione
percebeu ainda melhor o quanto o amigo era inteligente. “Se Ron estudasse
mais, seria muito melhor do que eu”, constatava com orgulho.
Ao saber que podia levar um convidado para a Festa de Natal do Clube do
Sluge, Hermione logo pensou em Ron. Afinal, não havia outra pessoa com a
qual gostasse mais de estar do que o ruivo. Ainda mais agora, quando o rapaz
se demonstrava tão atencioso e educado com ela a maior parte do tempo. Só
aguardava a oportunidade de estar sozinha com ele para fazer o convite.
De vez em quando Ron tinha uma recaída e tratava mal Hermione,
especialmente quando se sentia excluído. Nesses momentos, a sua já
conhecida insegurança se manifestava. E foi isso que aconteceu quando a
menina conversava com Harry sobre as reuniões do Clube do Sluge durante a
aula de Herbologia.
 - Clube do Sluge... - repetiu Ron com uma zombaria típica do Malfoy.  - É
patético. Bem, eu espero que você desfrute sua festa. Por que você não tenta ir
com McLaggen, aí Slughorn poderia fazer de vocês o Rei e a Rainha Sluge?
Ele havia conseguido mais uma vez! Ron tinha o estranho talento de fazer a
menina perder a paciência. E mesmo agora, que queria convidá-lo para a festa,
o amigo a deixava irritada com suas palavras debochadas. Mione poderia ter
ficado quieta, mas o sangue subiu mais rápido e ela precisou desabafar.
— É permitido levar convidados e eu ia pedir para que você fosse comigo. Mas
se é tão patético quanto você pensa, não o aborrecerei mais! –o rosto de Mione
ficou muito vermelho.
Ron logo se deu conta que tinha vacilado mais uma vez. Por que não
conseguia se controlar? Por que precisava ser tão ciumento? Todas essas
perguntas passaram pela cabeça do ruivo. Apesar de se dar conta do seu erro,
a alegria por saber que a menina queria convidá-lo foi mais forte que a dor do
arrependimento.
— Você ia me chamar? - perguntou Ron, com uma voz completamente
diferente.
— Sim - ela ainda estava furiosa - Mas, obviamente, se você acha que eu
deveria ir com McLaggen...
— Não, eu não acho - Ron agora tinha uma voz muito baixa.
Os dois se olharam um tanto constrangidos. O rapaz deu um sorriso tímido que
foi retribuído por Hermione. Toda a raiva que a garota sentiu um minuto atrás já
desaparecera.
Foi apenas quando Harry quebrou a tigela usada na aula, gritando “Reparo”
logo em seguida, que os dois saíram de uma espécie de êxtase. Hermione
ficou agitada e imediatamente começou a folhear de modo exagerado a sua
cópia do livro “Árvores Carnívoras do Mundo” para descobrir o modo correto de
fazer o suco pedido na aula.
Ron, apesar de um pouco embaraçado, não conseguia disfarçar a alegria que
sentia. “Ele realmente se surpreendeu”, pensou Harry, que não entendia
porque até agora o rapaz ainda não percebera que a menina era apaixonada
por ele.
O convite da amiga foi tão inesperado que deixou Ron perplexo. Era até
engraçado ver a fisionomia abobalhada dele. Logo o ruivo passou a tratar
Hermione de um jeito muito gentil. Ela chegou a se perguntar se o rapaz não
estaria sob o poder de algum feitiço.
Harry, que percebeu como tudo mudara entre os dois, começou a se apressar
ou atrasar para as refeições, possibilitando que Ron e Hermione ficassem
esses momentos juntos. O ruivo continuava a esperá-la na Sala Comunal, mas
agora sem a companhia do amigo.
A menina nunca se atrasava, embora, como não tivesse tanta fome como Ron,
também não se apressava em descer para as refeições. Naquela manhã, no
entanto, depois de ler até tarde na cama, perdeu a hora. Arrumou-se
rapidamente e, quando abriu a porta, Bichento a aguardava na saída. Pegou o
gato no colo e acariciou seus pelos laranja.
Ao colocar o gato no chão foi que percebeu Ron, de pé, em frente à escada.
Ela cumprimentou o rapaz com um sorriso e foi surpreendida com a pergunta
do ruivo.
— Sabe que eu morro de ciúmes desse gato? –ele deu um sorriso torto.
— Como assim, Ron? – Hermione ergueu as sobrancelhas.
— Ah, você entendeu... – o rapaz desconversou.
— Você acha que eu gosto mais do gato do que de você... É isso?  - ela não
podia perder a chance de entender melhor os sentimentos do amigo.
— Disso eu tenho certeza! – ele deu uma leve gargalhada.
— Ron!!! – a garota o censurou.
— E não gosta? – a voz e olhar traziam curiosidade.
— Bem... Na verdade, Bichento me dá muito menos trabalho e chateação que
você. Mas, ainda assim, eu prefiro a sua companhia, Ron – a garota abriu um
sorriso.
Os dois se encararam sorridentes. Mas o rapaz logo revirou os olhos. “Vou
fazer de conta que acredito”, ele encerrou aquela inusitada conversa.
Hermione estava feliz. Curtia aquelas pequenas cenas de ciúme que
confirmavam para o seu coração que Ron gostava dela.
 
O ruivo parecia ter se transformado num verdadeiro cavalheiro e Hermione se
divertia com isso. A menina se segurava para não rir quando ele dava
passagem para ela na entrada e saída da sala de aula. Sem falar que sempre
se oferecia para carregar os seus livros. Antes, até que já tinha levado livros
para a amiga, mas só quando os títulos eram pesados. Agora, bastava Mione
estar com um volume de bolso que rapaz já perguntava se queria ajuda.
Por vezes pareciam já ser namorados, tal a proximidade e felicidade que
sentiam quando estavam juntos. Ainda assim, Harry tinha mais facilidade para
abraçar a amiga do que Ron. Depois daquele beijo no rosto durante as férias, o
ruivo se mantinha distante nesse aspecto. Mas Hermione acreditava que tudo
aconteceria no tempo certo.
— Ficou surpreso por eu ter convidado você para a festa? – perguntou
Hermione quando se dirigiam para o almoço.
— Na verdade, sim. Até porque sei que sou sua última opção – o rapaz
adorava testar a reação da menina às suas palavras.
— Você está sendo sarcástico, Ron – ela reclamou.
— Mas é verdade. A companhia perfeita para você é a dos livros. Mas não dá
para dançar com um livro, não é? Sua segunda opção seria Vítor Krum, mas
como a Bulgária não é tão perto... – ele divagou.
Ele insistia em falar do jogador de quadribol e isso deixava a menina chateada.
Será que nunca passaria da reação – o ciúme – para ação? Será que nunca
declararia o sentimento que tinha por ela? Ou será que todos aqueles olhares
tão intensos, atitudes ciumentas e, em especial, os gestos carinhosos do último
período nada significavam?
— Ron! Você fala essas coisas para me irritar. Eu nem me correspondo mais
com Krum. E você sabe disso! – ela fez questão de enfatizar.
— Ainda teria a sua terceira opção, o Bichento. Mas acho que animais não são
aceitos em festas... A quarta seria o Harry e em seguida qualquer outra
pessoa, inclusive eu - O rapaz continuou, parecendo não dar importância à
reação da menina.
— Por que você é tão ciumento? Tem ciúmes de Harry, do Bichento, até dos
livros... Sem falar no Krum. Gina disse que você é assim também em casa –
ela o olhou com especial interesse.
— Se você tivesse seis irmãos, como eu, talvez entendesse. Como sou o
sexto, nasci tendo que disputar espaço com eles. Não sou o mais bonito, o
mais extrovertido e despachado, nem o mais inteligente ou o mais divertido e
esperto. Sendo assim, acho que só me restou ser o mais ciumento e
temperamental. Ainda tem a Gina que, como menina, corre por fora e vai ter
sempre uma atenção especial – ele nunca havia falado com tanta clareza sobre
aquele assunto.
— Eu entendo o que sente. Mas sempre que vou À Toca vejo como você é
querido na sua família. Todos gostam muito de você. Até Jorge e Fred, pode
ter certeza. Toda aquela implicância é a forma que encontraram de dizer isso –
Mione foi sincera.
— Preferia então que os dois gostassem menos de mim... – o ruivo fez uma
careta.
— Ron! – a garota voltou a usar o tom de voz repreensivo que já era tão
familiar ao ruivo.
Hermione sentia que era importante aprofundar ainda mais aquele assunto.
Queria que o amigo percebesse, de uma vez por todos, que tinha um lugar só
dele no seu coração.
— Sabe, Ron, você não precisa disputar espaço em todos os campos de sua
vida. Deve confiar mais na amizade que eu e Harry temos por você... – a
garota aconselhou.
— Mas você deve reconhecer que não é fácil ser amigo do Escolhido e da
menina mais inteligente de Hogwarts. Claro que fico sempre em terceiro plano,
pelo menos – Ron desabafou.
— Para mim não é assim. Eu o considero um amigo bem especial e não tem
ninguém disputando esse espaço com você – a menina mordeu os lábios.
— Tem o Harry! – o ruivo respondeu à queima-roupa.
— Ron! Harry é nosso amigo em comum! – ela protestou.
O bruxo começou a rir e a menina, aliviada, também caiu na gargalhada. No
subconsciente de Ron, no entanto, era exatamente assim: Harry era o seu mais
constante rival na disputa pela atenção de Hermione.

CAPÍTULO 6
Tudo caminhou muito bem entre Ron e Hermione durante cerca de 10 dias e,
em duas semanas, seria a comemoração natalina do Clube do Sluge. O rapaz
já tinha tirado o seu traje de festa do malão e aguardava aquele momento com
expectativa. Planejava declarar seu amor para Hermione e a pedir em namoro,
mas ainda não sabia se teria coragem. Morria de medo de receber um fora,
mas precisava tentar.
Foi pensando em como falaria do seu sentimento por Hermione que Ron saiu
da Grifinória para jogar quadribol. Depois do tenso treino daquela noite,
encontrou Gina agarrada a Dino. O ruivo achava que a irmã namorava demais.
Não gostava de vê-la beijando algum rapaz pelos corredores de Hogwarts.
Explosivo como era, logo reclamou com a menina, dizendo que não deveria
agir assim em locais públicos.
As palavras de Ron despertaram a ira da ruiva, que sempre enfrentava o irmão
um ano mais velho. Harry, porém, nunca a vira tão zangada.  “Quando ela quer
consegue ser cruel”, pensou o amigo ao ouvi-la dizer que Ron “nunca havia
beijado uma menina”. O pior, porém, foi quando afirmou que Hermione tinha
beijado Krum. “Você, ao contrário, tem a experiência de um garotinho de 12
anos”, vociferou Gina.
Ron dificilmente demorava a dormir, mas a confusão de sentimentos que
experimentava roubou o seu sono. Raiva. Decepção. Complexo de
inferioridade. Traição. Por que Hermione tinha ficado com Krum? Por que não
contou nada para ele? Gina, Harry, todos pareciam saber daquele beijo, menos
ele.
“Hermione e eu ainda não somos namorados, mas somos amigos. Ela devia
ser mais sincera comigo e não esconder tantos segredos”, queixava-se o rapaz
para si mesmo. Não entendia como a garota podia ter enchido o coração dele
de esperanças para depois decepcioná-lo assim.
Eram tantas perguntas sem resposta e o rapaz se sentia, mais do que nunca,
patético. “Agi como um bobo tratando Hermione com tanta atenção. Ela não
merecia”, refletia. A menina havia mentido ou pelo menos omitido algo muito
importante para Ron. E o ele sentia-se um idiota por nunca ter beijado alguém,
esperando, inconscientemente, por Mione.
“O primeiro beijo de Hermione deveria ter sido comigo”, concluiu para em
seguida se assombrar com o próprio pensamento.
Sentia tanta raiva misturada a tristeza que não conseguiu conter algumas
lágrimas. Escondeu o rosto no travesseiro e assim, derrotado e envergonhado,
pegou no sono.
Na manhã seguinte, ele levantou mais cedo que o habitual. Harry já estava
acordado e o ruivo o convidou para tomar café. “Não vai esperar Hermione?”, o
amigo perguntou. “Claro que não”, a resposta de Ron foi mal-humorado.
— Você ainda está chateado com ela? – insistiu Harry.
— Não quero falar sobre esse assunto. Nem quero ver Hermione hoje em
minha frente – Ron não se esforçava por esconder toda a mágoa que sentia.
Quando Hermione desceu para sala comunal, estranhou não ver Ron à sua
espera. “Será que ele perdeu a hora?”, perguntou-se. Imaginava que talvez o
treino tivesse sido bem difícil. Ao menos terminou tarde e ela não conseguiu
esperar acordada pelos amigos.
Enquanto fazia essas reflexões, Dino desceu do dormitório. “Ron e Harry ainda
estão dormindo?”, apressou-se a perguntar.  “Eles já foram tomar café”, o
rapaz respondeu.
A garota, um tanto intrigada, chegou ao refeitório e logo encontrou os amigos,
que já estavam terminando a refeição.
— Ron! Harry! Bom dia! Vocês não me esperaram... – disse com um leve tom
de queixa.
Logo percebeu que Ron estava estranho e nem levantara os olhos para
encará-la. Harry respondeu em nome dos dois:
— Bom dia, Mione! Ron acordou com com muita fome. Depois do treino de
ontem, até eu fiquei bem faminto e não conseguimos esperar por você. Sinto
muito...
Ela mal olhou para Harry. Observava Ron, que mantinha os olhos baixos,
concentrado em devorar o último pedaço de pão.
— Ron? Tudo bem? – Hermione ficou intrigada com a indiferença dele.
— Tudo bem – respondeu entredentes. Se não fosse pela educação recebida
dos pais, ele teria permanecido calado.
A garota sentou em frente a Ron e continuou a observá-lo. Ele permanecia com
os olhos baixos, voltados para o prato onde agora só se encontrava uma fatia
de torta de chocolate, e suas orelhas estavam púrpuras.
Ela sabia que Ron só ficava com as orelhas vermelhas quando sentia vergonha
ou raiva. Como não havia motivo para o rapaz se envergonhar, Mione logo
deduziu que o amigo estava zangado.
Apesar do constrangimento que sentia com o comportamento do rapaz,
Hermione se esforçou para engrenar num bate-papo. Perguntou sobre jogo,
falou das tarefas que tinham para aquele dia...
Sempre quem respondia a qualquer indagação era Harry. Ron, que se serviu
de mais um copo de suco de abóbora, continuava em silêncio.
— Ron! Você não vai nem me olhar? - a menina não aguentou mais aquele
gelo.
Logo Hermione se arrependeu de ter feito aquela pergunta. Recebeu de Ron
um olhar cheio de raiva que a destruiu por dentro. Agora não restava dúvida. O
ruivo estava zangado com ela. Mas por quê?
Antes que a garota pudesse fazer outra pergunta, Ron pediu licença e se
levantou muito rápido.
— Não fica assim, Mione. Ron está chateado porque jogou muito mal no treino
– antecipou-se Harry.
Hermione queria que fosse apenas isso, mas tinha certeza que a verdade era
outra.
Na primeira aula, Hermione sentou-se ao lado de Harry, como sempre fazia. A
carteira à sua direita permanecia vazia, à espera de Ron. Mione olhava com
frequência para a porta, aguardando a chegada dele, que estava atrasado. O
ruivo entrou sem olhar para ninguém e sentou na última carteira.
Ron nunca ficava nos fundos, sempre estava ao lado dos amigos e foi assim
até no terceiro ano, quando Hermione e ele se desentenderam por conta de
Bichento e Perebas.
— Por que Ron ficou lá atrás? – perguntou baixinho a Harry.
— Vou até lá falar com ele - apressou-se Harry, que não suportava ver o
sofrimento dos amigos.
Apesar do pedido de Harry, Ron foi categórico ao afirmar que não queria sentar
ao lado de Hermione. Harry voltou sem graça ao seu lugar.
Para destruir ainda mais o coração da menina, Lilá estava sentada próxima ao
amigo e os dois trocaram algumas palavras e risinhos durante a aula.
Como Hermione imaginava, ele aproveitou o fato de estar nos fundos da sala e
saiu rapidamente, assim que a aula terminou, evitando mais uma vez a menina.
No final da tarde, quando saiam da última aula, Hermione o alcançou.
— Até quando você vai evitar falar comigo? Eu tenho direito de saber por que
você está tão chateado! – ela desabafou.
— Você não vai gostar do que eu tenho a dizer. Então é melhor eu ficar calado
– Ron continuava irritado.
— Isso é covardia. Eu tenho direito de saber! – Hermione insistiu.
— Saber que estou decepcionado com você, com a forma como me trata, com
o pouco valor que dá à nossa amizade? – a voz do bruxo foi ficando cada vez
mais alta e as orelhas dele estavam vermelhas.
— Isso não é verdade... – ela sentia-se confusa.
— É verdade sim, Hermione. Sem falar que omite muitas coisas de mim... – a
voz dele ficou mais baixa e triste.
— O que eu omiti de você? – Hermione o interrogava com o olhar.
— Eu preciso dizer? Você sabe muito bem tudo que guarda em segredo! – ele
voltou a impacientar-se.
— Mas Ron...
— Chega, Hermione. Não quero ouvir suas desculpas – o rapaz a cortou.
Ele se virou e saiu apressado. Hermione teve vontade de correr atrás do
amigo, segurá-lo pelo braço, dizer que não podia tratá-la daquele jeito. Mas
ficou tão desnorteada com as palavras que ouviu e, especialmente, com o tom
de raiva da voz de Ron que se sentiu paralisada, sem força para qualquer
reação.
Mesmo usando toda a sua Inteligência e raciocínio lógico, a garota não
conseguia entender qual era o motivo da agressividade do amigo. A única
coisa que poderia ter chateado Ron era a recusa dela em assistir ao treino da
noite anterior, apesar dos pedidos insistentes do ruivo. “Como ele não jogou
bem, talvez tenha sentido que faltou o meu apoio. Como fui insensível, deveria
ter ido ao invés de ficar estudando”, concluiu.
— Mione, não fica triste com o Ron. O treino foi horrível e o jogo está
chegando. Você sabe como ele fica nervoso – falou mais uma vez Harry, que
estava se esforçando ao máximo para os amigos não cortarem relação mais
uma vez.
Ela imaginou que teria oportunidade de falar com Ron na hora do jantar, mas
ele foi um dos primeiros a chegar ao refeitório e comeu apressadamente,
evitando a amiga.
Hermione não conseguiu dormir bem naquela noite. Mal o sol começou a
despontar no horizonte, trocou de roupa e desceu para a sala comunal
decidida. Considerava que a conversa com Ron tinha ficado pela metade e não
ia desistir enquanto não soubesse o que estava se passando no coração dele.
Ainda no alto da escada, Harry viu a amiga sentada na sala comunal. Ele virou-
se para Ron, que vinha um pouco atrás, e falou com firmeza: “Mione está te
esperando lá embaixo e você não pode passar a vida toda fugindo dela. Vocês
precisam conversar. Seja sincero, mas não seja agressivo”.
O ruivo olhou para o amigo e permaneceu em silêncio. Harry tinha razão. Não
adiantava continuar a fugir de Hermione.
— Bom dia, Mione! Vou me apressar para o café porque hoje devo ter aula
com o professor Dumbledore. Ron acompanha você no café da manhã –
dizendo isso, Harry foi saindo da sala e os dois frente a frente.
— Oi, Ron – Hermione ficou de pé e saudou o ruivo.
— Oi... – respondeu o rapaz sem conseguir encará-la.
Ele foi caminhando em direção ao quadro da Mulher Gorda e Hermione
apressou o passo para segui-lo.
— Eu queria pedir desculpas por não ter ido ao treino. Não pensei que fosse
algo tão importante para você... – ela tomou coragem para iniciar a conversa.
O bruxo continuou a olhar para frente e tinha a fisionomia muito séria.
Hermione  falava pausadamente, como que procurando as melhores palavras.
— Não é segredo para você que não gosto muito de quadribol. Só assisto por
causa de você e Harry. Eu não deveria ter ficado estudando anteontem.
Imaginei que, como era apenas um treino, não precisaria tanto do meu
incentivo. Acho que me enganei. Você sabe como sou preocupada com os
trabalhos e as provas... Mas quero que saiba que, sinceramente, a sua
amizade é muito mais importante para mim do que o estudo – Hermione foi
sincera.
Ron, que permanecera em silêncio, ouvindo a amiga, não conseguiu mais ficar
quieto.
— Todo mundo sabe que a coisa mais importante no mundo para você é o
estudo! – ele parou de caminhar e fulminou a garota com o olhar.
— Não, Ron, você está enganado... – ela tentou argumentar.
— Eu estava enganado, achando que você tinha mudado. Mas você continua a
ser aquela sabe-tudo que valoriza apenas o que está nos livros, os bons
resultados no estudo e na vida. Vítor Krum, famoso jogador de quadribol
profissional, entra na sua lista de pessoas importantes. Ronald Weasley, um
bruxo pobre e sem talento especial, está fora. Eu sempre soube disso, desde o
dia em que a conheci. Mas como ajudava o Harry, este sim meu amigo de
verdade, achei que podia ter um bom relacionamento com você – cada palavra
era como uma alfinetada no coração de Hermione.
— Você está sendo injusto comigo. Repetiu as mesmas coisas que Rita
Skeeper disse e das quais você me defendeu. Por que está agindo assim?
Estávamos num momento tão bom... – a garota estava confusa.
— Eu falei ontem que não queria conversar. Sabia que ia te magoar, mas você
insistiu. Agora já sabe exatamente o que estou sentindo! – ele voltou a
caminhar, sendo acompanhado por Hermione.
— Mas você acha isso mesmo de mim?  - ela perguntou muito magoada, mas
com esperança de que o rapaz pudesse se arrepender das próprias palavras.
— Acho que você é uma sabe-tudo insuportável. Não é minha amiga de
verdade. Se fosse não ia me menosprezar e esconder tantos segredos de mim!
– ele voltou a repetir as palavras que tinham machucado Hermione.
A menina queria falar alguma coisa, mas sentiu sua garganta fechar e as
lágrimas começarem a cair copiosas.
— Pode chorar à vontade! Você não vai me comover com suas lágrimas – as
orelhas do rapaz voltaram a ficar vermelhas.
Apressada e com as faces muito vermelhas, Hermione seguiu em direção
contrária ao refeitório e entrou no banheiro. Mais uma vez esse seria o seu
refúgio para chorar a mágoa causada por Ron. Como ele podia chamá-la de
sabe-tudo insuportável? Justamente ela que dividia tudo o que aprendia com
os amigos, seja para ajudar nas tarefas ou lutar contra Voldemort.
Ron foi para o salão principal sozinho. Quando Harry o viu com a cara mais
emburrada do mundo, entendeu que não tinha dado certo a sua tentativa de
reaproximar os dois amigos.
O mundo de Hermione parecia desmoronar. A inteligência e o estudo a tinham
introduzido no universo mágico. Mas agora reconhecia que havia sido o Ron e
sua adorável família que a introduziram realmente na comunidade bruxa.
Apesar de se sentir muito triste com a forma agressiva que estava sendo
tratada por Ron, ela não desistiu do amigo. Lembrava como o ruivo tinha sido
gentil a maior parte do tempo nos últimos meses e, especialmente, do
tratamento carinhoso dele desde que o havia convidado para o baile. Agora era
um Ron raivoso, mal-humorado e pouco educado que encontrava. Mas tinha
esperança que aquele outro Ron, tão amável e alegre, estivesse apenas
adormecido e pudesse acordar a qualquer momento, reconquistando o seu
espaço.
O rapaz parecia se autoflagelar toda vez que maltratava a amiga. Uma vez
havia dito a Hermione que, sempre que a magoava, primeiro magoava a si
mesmo, e essa era a mais pura verdade. Apesar de achar que corria o risco de
estar sendo injusto, não conseguia agir de outro modo. Era algo irracional, bem
típico de uma pessoa passional como ele. Não aceitava ser o segundo na vida
da garota que tanto amava. Mas, ao mesmo tempo, sentia uma dor no coração
ao lembrar-se das lágrimas derramadas por Mione.
Na véspera do jogo, Ron decidiu dar uma trégua. Não seria mais agressivo
com Hermione. Na verdade, queria ficar bem com ela e saber da amiga tudo o
que realmente tinha acontecido entre a garota e Krum. Se Mione não se
correspondia mais com o jogador, aquele relacionamento era algo do passado.
Claro que, ainda assim, não seria fácil esquecer que os dois tinha se beijado,
mas ele estava disposto a tentar.
No jantar, Hermione sentou-se em frente a Ron na expectativa de uma
reconciliação com o amigo. O rapaz tinha evitado a garota durante a semana
inteira e só dirigia palavras ásperas a ela. No entanto, pela cabeça do inseguro
bruxo passavam pensamentos contraditórios. “Mione está tão bonita, parece
triste por eu estar tratando-a assim”, falava para si mesmo. “Não, ela não foi
sincera comigo e me trocou por aquele búlgaro ridículo”, concluía em seguida.
— Ron? –  Hermione chamou e, quando o rapaz a olhou para ela, com um
semblante indecifrável, continuou: - Eu tenho certeza que você se sairá bem no
jogo e vou torcer para que faça ótimas defesas.
— Você deve saber que estou jogando muito mal e não preciso de ninguém
mais para me azarar. Por mim, você nem precisa assistir ao jogo – ele mais
uma vez foi rude.
— Está achando que vou torcer contra Grifinória? Eu também sou dessa casa
e jamais torceria contra a nossa equipe... – ela rebateu.
— Acho que você vai perder tempo assistindo ao jogo. Melhor ficar lendo os
seus livros. Ou quem sabe escrever uma carta para Vítor Krum, ele sim um
excelente jogador de quadribol – o lado passional falou mais alto.
Enquanto Ron tratava Hermione com rudeza, o que parecia ser a sua melhor
habilidade na última semana, Harry tentava acalmar o ânimo do rapaz e dizer
algumas palavras de incentivo. “Esquece o Krum! Você é um ótimo goleiro e
tenho certeza de que vai fazer excelentes defesas”, falou para o amigo.
Ao mesmo tempo em que se sentia arrasada com a rudeza de Ron, Hermione
sofria por ver que ele estava tão para baixo, sem confiança em si mesmo e
desacreditado por todo o time. Apenas Harry parecia ainda levar fé no amigo e
incentivá-lo. Ela, por mais que quisesse, nada podia fazer. Qualquer palavra da
menina era mal interpretada pelo ruivo que, decididamente, parecia disposto a
jamais perdoá-la.
Mais tarde, no dormitório, já deitado na cama, Ron sentiu um grande
arrependimento. “Amanhã, depois do jogo, vou procurar Hermione e pedir
desculpas a ela. Vou explicar porque agi assim. Mione vai me achar patético,
mas essa é a única forma de me perdoar”. Quando tomou essa decisão, o ruivo
ficou com o coração em paz e conseguiu adormecer.
CAPÍTULO 7
O ruivo acordou desanimado no dia do jogo e, durante o café da manhã no
salão principal, foi saudado por uma exuberante e alegre Lilá. “Anime-se, Ron!
Eu sei que você será brilhante”, disse a menina, mas o rapaz a ignorou.
Hermione chegou à sala a tempo de ver Lilá cumprimentando o amigo. Porém,
ao perceber que ele se manteve indiferente à lourinha, ficou aliviada. Ela quase
nunca se atrasava para o café, mas havia dormido mal e não conseguiu
levantar cedo.
A causa para a insônia da garota era a preocupação com o ruivo. Ficara
pensando no comportamento estranho de Ron, preocupada com o péssimo
desempenho dele como goleiro no treino e com a possibilidade de fracassar no
jogo, o que o tornaria mais inseguro e mal-humorado.
“Como vocês estão se sentindo?”, Hermione perguntou, com os olhos fixos na
nuca de Ron, ao chegar à mesa na qual ele estava sentado com Harry.
Apenas Harry respondeu, dizendo que estavam bem, mas mal olhou para a
garota. O rapaz concentrava-se em dar a Ron um copo de suco de abóbora.
Imaginando que fosse Felix Felicis, Hermione falou com autoridade: “Não beba
isso, Ron”!
Em seguida, a bruxa olhou para Harry e acusou o amigo de ter colocado algo
na bebida. “Você ainda está com a garrafa em sua mão direita”, afirmou. As
palavras dela, como sempre acontecia ultimamente, soaram como um insulto
para Ron. “Pare de mandar em mim, Hermione”, respondeu o ruivo, bebendo
logo o suco.
Ron acreditou que havia tomado a poção. Afinal, de alguma forma, a sorte
pareceu sorrir para ele. Sentiu-se muito confiante e fez ótimas defesas. A
vitória tão esperada pelo ruivo no quadribol, e que parecia distante, aconteceu.
Ainda incrédulo com o próprio desempenho, Ron estava no vestiário com o
melhor amigo quando Hermione chegou. A menina, muito agitada, dessa vez
foi ainda mais clara, recriminando Harry por ter colocado a poção da sorte no
suco do ruivo. No mesmo momento, Harry tirou do bolso da jaqueta a garrafa
ainda lacrada com o precioso líquido dourado e Mione ficou boquiaberta.
“Eu posso defender gols sem ajuda, Hermione”, disse Ron, olhando com
desprezo para a menina e saindo do vestiário com a vassoura no ombro.
— Vamos para a festa, então? –um pouco sem graça, Harry fez o convite para
a amiga.
— Você vai! – a garota já começava a chorar. - Eu estou cansada de Ron. Não
sei o que é que eu fiz para ele passar a me tratar tão mal assim.
A inteligente bruxa também saiu tempestuosamente do vestiário e pesadas
lágrimas começaram a cair pelo rosto dela. Mesmo se não queria participar da
festa, teria que atravessar a sala comunal para chegar ao dormitório. Pensou
em se refugiar na biblioteca, mas o que faria no meio de tantos livros aos
prantos? Não achou uma boa ideia se esconder no banheiro. Corria o risco de
ser flagrada mais uma vez pela Murta que Geme. Decidiu, então, caminhar um
pouco mais pelos corredores, os mesmos corredores que, como monitora,
percorrera tantas vezes na companhia de Ron. Enquanto andava, tentou
acalmar um pouco o coração e refletir sobre os últimos acontecimentos.
Decepcionado com Hermione, Ron também fazia as suas reflexões. O rapaz
sentia-se um idiota por ter pensado em pedir a amiga em namoro na Festa do
Clube do Sluge. “Eu ia fazer um papel ridículo. Uma menina que conquistou um
famoso jogador de quadribol e que tem uma inteligência tão brilhante jamais se
interessaria por um cara como eu. As atitudes dela como as de agora, quando
duvidou da minha capacidade e só acreditou que eu fiz excelentes defesas
usando a poção da sorte, mostram isso. Tenho que esquecer de vez Mione e
ficar com alguém que goste de mim assim como sou”, concluiu.
Logo o rapaz lembrou-se de Lilá Brown. Desde que encontrou a loura na
Gemialidades Weasley, começou a desconfiar que a lourinha estava
interessada nele. A reação ciumenta de Hermione naquela ocasião foi uma
primeira confirmação. Na última semana, quando passou a tratar mal a amiga
depois de saber que ela tinha beijado Krum, notou ainda mais Lilá que, desde o
primeiro ano, era sua colega de classe.
Lilá tinha cabelos louros sedosos, cacheados nas pontas, um sorriso bonito e
encantadores olhos verdes. Sempre usava brincos, pulseiras e alguma
maquiagem e era considerava uma das mais belas alunas do sexto ano. Sem
falar que era divertida. Apesar da garota possuir tantos atributos, Ron não
havia se interessado por ela até o momento.
Com esses pensamentos, Ron chegou à festa de comemoração pela vitória no
salão comunal da Grifinória. O goleiro foi aplaudido por todos os colegas.
Alguém lhe ofereceu um copo de cerveja amanteigada, que bebeu num fôlego
só. Pouco depois, Lilá se aproximou para cumprimentá-lo. O ruivo imaginou
que receberia no máximo um abraço, mas, para a sua surpresa, a menina
pulou em seu pescoço e o beijou na boca.
Ron, a princípio assustado, logo retribuiu ao beijo. Foi espontâneo para ele
pensar: “Agora vou tirar Hermione da minha vida”.
Depois de dar algumas voltas a mais pelos corredores da escola, retardando
ao máximo a sua chegada à torre da Grifinória, Hermione ultrapassou o quadro
da Mulher Gorda. Sua intenção era subir direto para o dormitório, sem falar
com ninguém, e, de preferência, passando o mais longe possível de Ron. Já
tinha sido maltratada o suficiente por ele nos últimos dias.
No entanto, mal entrou no salão comunal, assistiu a uma cena que fez o seu
coração paralisar. Ron estava abraçado e beijava Lilá Brown. Lágrimas
sentidas correram no mesmo instante pelo rosto de Hermione enquanto uma
dor intensa a consumia por dentro. Precisava fugir dali e, passando mais uma
vez pela Mulher Gorda, buscou refúgio na primeira sala vazia que encontrou.
Pensamentos confusos passavam pela cabeça da garota, que já soluçava. Lilá
nunca tinha duvidado da capacidade do ruivo como goleiro, assistia aos
treinos, o incentivava, havia ocupado o espaço que Hermione não foi capaz de
preencher. Mas a grande verdade era que a loura era mais bonita, mais
simpática e mais atraente que ela. Ron sempre valorizara meninas assim. A
raiva e decepção a levaram a pegar a varinha e, intuitivamente, fazer aquilo em
que era brilhante.
— Avis! – murmurou, com muitas lágrimas escorrendo pelas faces, e um bando
de passarinhos amarelos se materializou e começou a voar sobre sua cabeça.
Inesperadamente, a porta se abriu e Harry entrou. A última coisa que queria
naquele momento era a companhia de alguém. Não desejava ser flagrada com
aquele semblante de dor e o rosto coberto de lágrimas. Sem olhar para o
amigo, o saudou.
— Oh, olá, Harry. Eu estava praticando – falou, sem conseguiu esconder a
amargura da voz.
— Estou vendo... São realmente bons... – a amigo não sabia o que dizer.
Ela imaginou que Harry a havia visto sair da sala comunal e queria conversar
sobre Ron, quem sabe para mais uma vez tentar defender o ruivo. Decidiu
tocar no assunto e assim encerrar logo aquele momento tão constrangedor.
Jamais tinha falado para Harry que era apaixonada por Ronald Weasley, mas
intuía que ele sabia disso.
— Ron parece estar se divertindo na comemoração – comentou com deboche.
Harry, que sempre tentava selar a paz entre os amigos, resolveu se fazer de
desentendido. “Ah... Está?”, foi tudo que ele conseguiu dizer, aumentando a
fúria da garota.
— Não finja que não viu! – o tom de voz de Hermione era agressivo. – Ele não
estava bem se escondendo, estava?
A porta se abriu mais uma vez e, para aumentar a angústia da garota, eram
Ron e Lilá. O ruivo dava aquela risada espontânea da qual Hermione tanto
gostava. Mas logo que os olhos azuis do rapaz encontraram os olhos
castanhos da amiga, ele ficou sério.
Quando encarou Hermione, o ruivo percebeu que a menina estava zangada
com ele. Os olhos vermelhos denunciavam que havia chorado. Será que era
por causa da forma como a vinha tratando? Ou por que o tinha visto com Lilá?
Não, isso não fazia sentido. Mione não gostava dele, pelo menos da forma
como o rapaz queria.
— Opa! – exclamou Lilá, afastando-se dele e saindo da sala que, para a sua
surpresa, estava ocupada. Claro que imaginava que o ruivo a seguiria, mas
Ron resolveu cumprimentar o amigo.
— Oi Harry! Estava me perguntando aonde você teria ido... – Ron estava sem
graça.
A mágoa cresceu dentro do coração de Hermione e transformou-se em raiva.
“Ron está ignorando minha presença aqui”, pensou. A menina sentia uma dor
tão intensa que chegava a ser física. Como o rapaz podia trocar a companhia
dela, uma amizade de seis anos, por uma menina tão superficial? “Superficial e
bonita”, pensou ainda com mais rancor.
— Você não devia deixar Lilá esperando lá fora. Ela vai se perguntar aonde
você terá ido - ela dirigiu-se ao ruivo no seu melhor tom de desdém enquanto
se encaminhava para a porta.
Quando viu que o rapaz não reagia à provocação, a raiva de Hermione
aumentou. Seu coração doía com tamanha intensidade que parecia sangrar.
Em um ato de desespero, com as mãos trêmulas, ela empunhou a varinha em
direção a Ron, que arregalou os olhos azuis.
— Oppugno! – ela gritou, comandando os pássaros que começaram a atacar o
garoto. Parecendo não escutar os gritos de dor do ruivo, Hermione saiu
correndo e esbarrou na porta com Lilá, que voltava para procurar por Ron.
Hermione passou de forma discreta e rápida pela sala comunal, que estava
repleta de alunos, sons de música, risos e conversas animadas. Tudo isso
contrastava ainda mais com a dor que parecia paralisar o seu coração. Subiu
correndo as escadas até o dormitório, que estava vazio, e jogou-se na cama.
A garota fechou as cortinas e usou o feitiço silenciador e o de
imperturbabilidade para poder se isolar de tudo e todos ao seu redor. Agora
finalmente se permitiria chorar com vontade, soluçando de dor e revolta.
Foi uma longa e dolorida crise de choro. Sentada na cama, o seu corpo todo
tremia e lágrimas pesadas desciam até o peito. Não saberia dizer quanto
tempo passou aos prantos, mas, aos poucos, foi se acalmando e começou a
pensar nas razões de tanto sofrimento e rancor.
Como sentia raiva de Ronald Weasley! Tinha esperado que o ruivo a
convidasse para o Baile de Inverno do quarto ano, mas ele só queria saber de
levar como acompanhante as bruxas mais bonitas. Acreditou que o rapaz se
declararia no quinto ano, depois de tantos momentos de confidência e
cumplicidade, mas Ron continuava tratando-a como amiga. Agora, no sexto
ano, ousou convidá-lo para o Baile do Sluge e o bruxo, depois de agir como um
verdadeiro cavalheiro por alguns dias, começou a tratá-la com desprezo, como
se ela tivesse cometido um crime! E para piorar, agora agarrava e beijava uma
menina na frente de todos, no meio da sala comunal.
Ela sabia que sentia tamanha raiva por que era muito grande o seu amor pelo
ruivo. Hermione guardava o seu sentimento pelo amigo em segredo. Não havia
compartilhado isso com ninguém, nem com a sua mãe.
Por alguns instantes, deixou o coração se esvaziar da raiva e naturalmente
recordou, como já fizera tantas vezes, a sua trajetória com Ron. Lembrava que,
quando anunciaram o Baile de Inverno, ela se surpreendeu com a força com
que desejou ser convidada pelo ruivo.
Naquele momento enxergou tudo com clareza: os seus sentimentos
contraditórios pelo rapaz indicavam que não o queria mais apenas como
amigo. Irritada com o fato de Ron não cogitar sequer sua companhia e pensar
em convidar apenas meninas que considerava bonitas, ela resolveu aceitar
Krum como seu par no baile.
Jamais imaginou que Ron teria aquela reação ciumenta ao vê-la com Krum no
baile. Pelo menos assim interpretara a atitude do amigo. Mas agora,
distanciada no tempo e desiludida com o rapaz, começava a achar que ele
reclamara dela estar com o búlgaro pelo motivo alegado na ocasião: o jogador
era rival de Hogwarts no Torneio Tribuxo.
Não conseguia convencer-se inteiramente. Lembrava do jeito intenso com que
Ron havia olhado para ela no baile, parecendo assustado e encantado. Cortou
essa recordação decidida: “Não importa mais. Aquele momento passou e eu
perdi Ron para Lilá”.
Logo uma outra imagem tomou conta de sua mente. Ela e Ron estavam no
quinto ano e andavam pelos corredores da escola cumprindo a função de
monitores. As muitas conversas desses momentos a levaram a conhecer ainda
mais profundamente o rapaz e fizeram com que, a cada dia, se tornasse mais
enamorada pelo ruivo.
Hermione, no entanto, era orgulhosa e reservada demais para expor esse
sentimento, que guardou como o seu mais precioso segredo. A aparente
indiferença do rapaz, o jeito desligado dele e o fato de não conseguir disfarçar
quando achava uma menina atraente a deixavam profundamente irritada.
Apesar de toda a mágoa pela cena que acabara de presenciar, Hermione não
conseguia evitar essas boas lembranças. No início do sexto ano, Ron estava
mais atencioso do que nunca e, depois que o convidou para o Baile do Sluge,
chegou a admitir que tinha ciúmes dela. Ciúmes de amigo?
Há uma semana tudo mudou de repente e Ron começou a tratá-la muito mal e
a evitar a companhia dela. Quando tentou descobrir o porquê, recebeu uma
resposta agressiva do rapaz, sendo acusada de sabe-tudo insuportável e de
esconder muitos segredos. Essa atitude do ruivo doía especialmente pelo fato
de estarem em um momento tão bom. Será que o amigo tinha mudado da noite
para o dia por causa da Lilá? Não valia a pena pensar mais sobre isso, até
porque não conseguira chegar a qualquer conclusão. O fato é que ela e Ron
estavam muito, muito distantes um do outro.
Foi nesse momento que a dura verdade a despertou. “Lilá, com certeza, não
ama Ron como eu amo. Não quer transmitir segurança a ele, ajudá-lo a
acreditar em si mesmo, a se esforçar para alcançar melhores resultados no
estudo e no quadridol”, refletia, voltando a chorar copiosamente.
Mas o seu lado racional lembrou-a que fracassara em sua missão. Ron
continuava inseguro no quadribol e tinha jogado bem apenas por acreditar
haver tomado a poção da sorte. O rapaz ainda não era muito empenhado nos
estudos e não precisava da amizade dela, pelo contrário, a desprezava. E o
pior: continuava interessado apenas em meninas bonitas, superficiais e
divertidas, como Lilá.
O coração de Hermione doía muito, parecia ter sido atingido por
uma Cruciatus. Como se sentia ridícula por prezar tanto a racionalidade e não
conseguir controlar a emoção, atacando o amigo com os pássaros.
Ela estava chorando há mais de uma hora e, no meio da desolação e do
abatimento, tomou uma decisão: “Ron está saindo definitivamente da minha
vida. Não vou derramar mais uma lágrima por quem não mereceu minha
amizade e muito menos o meu amor”.
Algumas lágrimas ainda teimaram em sair dos olhos da garota, mas o cansaço
a venceu e, em poucos minutos, adormeceu decidida. Já enfrentara desafios
maiores, agora dedicaria todo o seu empenho e inteligência para esquecer
Ronald Weasley.
Enquanto a bruxa chorava e lutava com seus sentimentos escondida no
dormitório, Ron tentava se divertir na festa e, de modo especial, esquecer da
existência da amiga. Se Hermione não acreditava nele, não a queria mais em
sua vida.
Não era fácil, porém, apagar a presença da amiga. Até as feridas nos braços e
mãos causadas pelos pássaros conjurados por Hermione o faziam lembrar,
mesmo se com raiva, dela.
Ron esforçava-se para concentrar toda a atenção em Lilá Brown. O rapaz
desejava sinceramente gostar da lourinha que era sempre tão simpática e
atenciosa com ele.
Foi dormir feliz com a dupla conquista: no quadribol e na vida amorosa. Porém,
ao fechar os olhos, não foi o rosto de Lilá e sim o de Hermione que invadiu os
pensamentos dele. “Mione não existe mais para mim”, repetiu para si mesmo
várias vezes antes de pegar no sono.
 
Nas semanas seguintes à festa pela vitória da Grifinória, Ron e Hermione se
distanciaram ainda mais. Parecia que nunca haviam sido amigos. Evitavam se
olhar, desviavam um do caminho do outro, sentavam distantes nas aulas, no
refeitório, na sala comunal. Não era muito fácil manter esse comportamento, já
que dividiam a mesma casa e o mesmo amigo. Harry sofria em ver toda aquela
situação, mas sabia que os dois eram cabeças-duras e não tinha muito o que
fazer.
Quando Ron reclamou com Gina da atitude de Hermione, dizendo que ela
perdera qualquer razão, caso tivesse alguma, ao atacá-lo com os pássaros,
ouviu algo inesperado da irmã. A ruiva lembrou que a garota, apesar de ter um
ótimo coração, era possessiva e temperamental.
— Ela não gostou de ver você agarrado com Lilá. Também eu não entendo
porque você foi se envolver com aquela menina – a irmã  questionou-o.
Mas Ron só começou a se dar conta de que também havia cometido erros
quando Gina afirmou: “Você e Hermione estavam tão bem, iriam juntos à Festa
do Sluge, pareciam até um casal de namorados. Depois, sem qualquer
explicação, você começou a tratá-la mal e ainda ficou com outra garota.
— Mione e eu não temos compromisso algum. Portanto, é um problema meu
quem eu namoro ou deixo de namorar – o rapaz não escondeu a irritação que
sentia.
Gina lembrou Ron que ele também tinha agido de forma possessiva quando
soube do envolvimento de Hermione com Krum. Ainda mais emburrado, o
rapaz tratou de encerrar logo a conversa com a irmã.
Hermione também precisou se confrontar com a própria atitude ao ser
abordada, inesperadamente, por Luna.
— O que fez com Ron? Ele está com as mãos e braços todo machucados. Não
acredito que você mandou os pássaros que conjurou atacá-los... Isso vai contra
o Código da Magia que diz... – a aluna de Corvinal arregalou ainda mais os
olhos.
— Luna, por favor, eu dispenso a citação do código. Sei perfeitamente bem que
só podemos atacar inimigos – Hermione estava impaciente.
— Você considera Ron seu inimigo? – perguntou a menina que não tinha medo
de dizer tudo o que pensava.
— Digamos que sim... – a bruxa de cabelos volumosos queria encerrar aquela
conversa.
— E ele se transformou em inimigo simplesmente porque está namorando a
Lilá? – a amiga fez a pergunta mais difícil e ficou sem resposta.
Enquanto se distanciava de Luna, a garota voltou a lutar com os próprios
pensamentos. “Simplesmente porque está namorando a Lilá? Como ela diz
isso. Não é simplesmente, é algo muito grave.
Apesar de ter se arrependido por machucar Ron com os pássaros, Hermione
era orgulhosa demais para admitir o próprio erro e pedir desculpas. Continuava
muito chateada com o rapaz e disposta a manter o gelo até o fim. Também
nisso eram mais parecidos do que imaginavam. Os dois queriam cortar
relações e ignoravam a verdade: o sentimento de raiva escondia o grande
amor que tinham um pelo outro.
CAPÍTULO 8
Como havia prometido a si mesma, Hermione tentava manter-se indiferente a
Ron. Mas isso se tornava ainda mais difícil quando o rapaz estava agarrado a
Lilá. A menina só não imaginava que seriam especialmente as mais singelas
manifestações de carinho que a deixariam abatida. Ficou arrasada quando viu
o rapaz, de forma delicada, mexer nos cabelos da loura, sem falar no dia que o
observou beijar afetuosamente uma das mãos da namorada e depois abrir um
lindo sorriso. Como queria estar no lugar de Lilá, pensou, mas logo cortou esse
devaneio com decisão.
Precisava manifestar de alguma forma o seu desprezo por Ron. Quando o
rapaz errou grosseiramente um feitiço na sala de aula, ficando com um
engraçado bigode, Hermione deu sua gargalhada mais escandalosa e
debochou: “Que patético. Precisa treinar mais”. Teve vontade de completar
dizendo que ele deveria estudar “ao invés de ficar o tempo todo namorando”,
mas guardou esse pensamento para si mesma. O ruivo, que não levava
desaforo para casa, logo respondeu à altura.
“Claro! Eu deveria participar mais das aulas”, ele disse olhando Hermione com
frieza. Em seguida, afinando a voz, começou a levantar e sentar na carteira,
sempre com a mão erguida, imitando a menina: “Eu sei! Posso responder? Li
no livro, no segundo parágrafo da página 25, e já decorei tudo. Eu sei tudo,
tenho todas as respostas”.
Hermione ficou com os olhos marejados e segurou as lágrimas. Então era isso
que Ron pensava dela? O rapaz havia falado recentemente que a considerava
uma sabe-tudo insuportável. Só que agora ele a humilhava em frente a toda
turma e, o pior, Lilá e Parvati acharam isso muito divertido.
Ela teve vontade de sair correndo da sala, mas esperou o sinal tocar e
praticamente desaparatou. As lágrimas começaram a rolar dos seus olhos.
Estava tão magoada que nem percebeu que deixara todo o seu material para
trás. Chegou veloz ao banheiro e desabou a chorar, soluçando baixinho.
Logo alguns pensamentos invadiram mais uma vez a sua mente. Ron não
podia ter agido daquela forma, não podia ter a humilhado assim. Ele que
sempre a defendera, agora a estava atacando. A garota se lamentava por ser
tão racional assim. Por que não parava de pensar e refletir sobre os
acontecimentos?
Suspirando, Hermione não conseguia deixar de lembrar como se sentia segura
quando tinha a amizade do ruivo. E com um gosto amargo na boca recordou-se
de todas as vezes que Ron a defendera dos ataques de Malfoy e Snape, dos
muitos momentos nos quais a tratou de forma carinhosa.
Foi quando se deu conta que o seu plano de manter-se indiferente ao rapaz
havia fracassado até então. Com um lampejo, ela lembrou que Ron havia tido
fortes reações ciumentas quando ela foi ao baile com Krum e passou a se
corresponder com o jogador búlgaro. Concluiu que deveria tentar atingi-lo
nesse ponto. “Mas agora, que está com Lilá, será que ainda vai sentir ciúme de
mim”, perguntou a si mesma.
A dois dias da Festa do Clube do Sluge, Hermione decidiu: participaria da
comemoração e acompanhada por um rapaz, de preferência, que pudesse
deixar Ron enciumado. Logo lembrou que o próprio ruivo havia sugerido que
fosse a festa com McLaggen e da rivalidade que existia entre os dois desde o
teste para goleiro. “Com certeza ele vai ficar irado em me ver com Córmaco”, a
bruxa concluiu deixando-se levar pelo sentimento de rancor.
Bastou dar uma indireta, dizendo que ainda não tinha companhia, para
McLaggen convidá-la. À noite na sala comunal, num momento em que Ron e
Lilá estavam por perto, a morena aproveitou para falar do “namoro” com o
rapaz. Pela reação do ruivo, que interrompeu um beijo, Hermione percebeu que
seu plano surtira efeito. Sorriu interiormente. “Agora ele vai se morder de
ciúmes”, pensou.
Quando subiu para o dormitório, porém, Hermione foi tomada de grande
tristeza. Definitivamente, não queria ir ao baile com McLaggen.
“Talvez Ron fique apenas mais magoado comigo e conclua outra vez que só
dou importância às pessoas que têm um talento especial. Mas eu não devia
ligar para o que ele pensa. Ron escolheu Lilá e ainda passou a me tratar muito
mal. Tudo isso depois de eu ter tomado a iniciativa de convidá-lo para a festa”.
A garota concluiu, mais uma vez, que  Ron não merecia o seu amor e nem
mesmo que perdesse tempo pensando nele. Enxugou algumas lágrimas
teimosas e começou a se concentrar na difícil missão de conseguir pegar no
sono.
Ron, que até o momento se mantinha indiferente à menina com relativo
sucesso, ficou confuso depois de ouvir Hermione falar que estava namorando
Mclaggen e iriam juntos ao baile. “Poderia ser eu e Mione, mas ela preferiu que
fosse assim. O problema é dela. Eu estou bem com a Lilá”, tentou convencer a
si mesmo.
A roupa tinha sido comprada no início do ano por Hermione para uma festa,
baile ou outra ocasião especial na qual pudesse ir com Ron. Olhou para o
vestido verde, simples e elegante, com certo desânimo. Foi um esforço se
produzir, pentear os cabelos, colocar maquiagem, cordão e brincos para ter a
companhia de McLaggen. Não gostava do jeito dele, rude, vaidoso, prepotente.
Melhor seria ir sozinha, mas queria mostrar para o amigo que, apesar dele não
a achar bonita, havia outros rapazes que se interessavam por ela.
Não imaginou que se sentira assim. Mas Ron estava impaciente no dormitório,
vendo Harry se arrumar para a festa. Havia marcado com Lilá no salão
comunal às vinte e trinta. Tinha ouvido Hermione combinar com MacLaggen
meia hora antes e assim não corria o risco de se encontrar com ela. No
entanto, experimentava uma grande angústia, parecia que lhe faltava ar e já
não conseguia mais ficar ali, fechado. Resolveu sair.
Enquanto Ron descia as escadas, Hermione apareceu na porta do dormitório
das meninas. “Ela está linda, ainda mais linda do que no Baile de Inverno”,
pensou o rapaz hipnotizado diante da beleza da menina.
Os dois se encararam e, diante do encontro inesperado, Hermione não teve
tempo de fazer a sua habitual expressão de zangada. Pelo contrário. Permitiu-
se contemplar os olhos azuis que tanta amava. “Por que, Ron, você fez isso
comigo? Por que se afastou tanto de mim?”, perguntou ao ruivo em
pensamento e, apressando o passo, deu às costas ao rapaz antes que ele
terminasse de descer as escadas.
McLaggen conseguiu ser pior companhia do que Hermione imaginava. Com
sua inteligência rápida, ela não teve dificuldade para se desvencilhar do rapaz.
Jamais beijaria aquele idiota e não estava disposta nem mesmo a dançar uma
única música com ele! Quando percebeu que seria complicado fugir de
Córmaco a noite toda, resolveu sair da festa.
Estava tão compenetrada em sua fuga que não pensou sequer na possibilidade
de encontrar com Ron na sala comunal. Mas o ruivo estava lá, abraçado com
Lilá. A garota passou veloz como um relâmpago, mas ainda assim os olhos
dela e do rapaz se cruzaram por poucos segundos com um misto de tristeza e
espanto.
Hermione não queria mais chorar por Ron, mas naquela noite foi inevitável. A
festa fora péssima. Poderia ter sido tão boa se ela e o ruivo estivessem
juntos... Ficou chateada consigo mesma ao pensar naquela possibilidade. O
rapaz estava lá, agarrado com Lilá, e não merecia mais nenhuma lágrima dela.
Em dois dias viajariam para passar o Natal fora e Mione poderia se esquecer
de tudo isso.
O ruivo também não pegou logo no sono. Lembrava o tempo todo de
Hermione, que parecia ter voltado tão triste do baile. Mesmo se a troca de
olhares entre eles foi rápida, conhecia-a muito bem para perceber isso. Achou
que seria muito bom ficar uma semana distante, durante o recesso de Natal.
Pelo menos não teria que suportar o constante mau-humor da amiga e nem o
jeito grudento de Lilá.
 
Por que tudo n’ A Toca o fazia lembrar a amiga? Ron não deixava de se
questionar sobre isso. Quando estavam em Hogwarts, a presença dela não era
tão forte como agora. É verdade que, ultimamente, a menina tinha uma
expressão raivosa sempre que encontrava com ele. Mas logo recordou que
Hermione não estava com um semblante zangado no momento em que seus
olhares se cruzaram no dia da festa... Será que a garota o perdoaria? Por
Merlin! Mione o havia magoado ao beijar Krum e ainda esconder esse fato! Por
que pensava em ser perdoado por ela?
Ron não esperava receber uma lembrança de Natal de Hermione. Também ele
não comprara nada para a amiga. Havia presenteado a sua namorada, claro,
com uma bonita tiara. Pavarti dera a dica, já que Gina se recusava a ajudá-lo.
Mas quando abriu o pacote enviado por Lilá, não conseguiu deixar de pensar
que Mione, com certeza, acertaria mais na escolha.
Fez Harry prometer que não contaria para os gêmeos que Lilá o havia
presenteado com aquele ridículo cordão. Já bastavam as brincadeiras que os
dois estavam tirando com ele desde que souberam que o irmão tinha uma
namorada.
Naquela tarde, Ron tentava se concentrar no livro de Herbologia. Estava com
muitos deveres atrasados agora que não contava com a ajuda de Hermione.
De repente, ouviu um estampido e os gêmeos se materializaram em sua frente.
Sabia que iriam provocá-lo e continuou lendo, ignorando a presença deles.
— Você acredita que Roniquinho preferiu a loura à morena? – perguntou Jorge.
— A loura tomou a iniciativa enquanto a morena está esperando a iniciativa
dele há seis anos – respondeu Fred.
— E pelo visto, se não voltar para o búlgaro, vai ter que esperar no mínimo
mais outros seis – disse Jorge dando um risinho abafado.
— Não sei se ele fez uma boa troca. Hermione pode até não ser muito bonita,
mas é mais inteligente – enfatizou Fred.
— E como nosso irmãozinho não tem uma capacidade intelectual
desenvolvida, precisa ter alguém assim por perto – completou Jorge.
O caçula dos meninos, que até aquele momento tentou manter-se indiferente,
estava com as orelhas vermelhas e não suportou mais ficar calado.
— Parem com isso! Em primeiro lugar, Hermione é uma menina bonita. Em
segundo, minha capacidade intelectual é muito maior do que a de vocês! – ele
desabafou irritado.
— Ah, nossa provocação surtiu efeito! – comemorou Fred.
— Finalmente admitiu que acha Mionizinha bonita! – Jorge soltou uma
gargalhada, sendo acompanhado pelo gêmeo.      
Ron sacou a varinha do cós da calça e, antes que pudesse proferir um feitiço,
os irmãos desaparataram dando risadas.
Ele achava que apenas os gêmeos cogitavam que tivesse algum envolvimento
com Hermione. Como ninguém levava os dois a sério, não se preocupava
muito com isso. Não imaginava que ele e a menina já tinham se tornado
assunto de família e, portanto, a conversa que teve com o pai no dia seguinte
ao Natal foi uma surpresa.
— Ronald Billius, quero dar uma palavra com você – Arthur se dirigiu ao final
no final da manhã.
Já sabia que, quando o seu pai o chamava assim, era bronca ou um assunto
muito sério. Como não tinha aprontado, acreditou que Arthur queria conversar
sobre Voldemort, os Comensais da Morte e a Ordem da Fênix.
Acompanhou o pai até a garagem na qual ele guardava artefatos trouxas.
Arthur não fez rodeios e começou dizendo que já tomara conhecimento do
namoro dele com Lilá. “Sempre que seus irmãos começaram um
relacionamento sério, fiz questão de conversar com eles”, ele falou com
solenidade.  
— Para nós, bruxos, isso é algo muito importante. Como você sabe, o amor é
uma força poderosa, capaz de interferir nas mais altas magias – explicou o
patriarca dos Weasley.
O jovem bruxo olhava o pai em silêncio, tentando imaginar onde ele queria
chegar com aquela conversa. Arthur foi mais objetivo do que ele poderia supor.
— Você realmente gosta dessa menina? Nunca tinha falado dela conosco... Eu
e sua mãe achávamos que você gostava de Hermione Granger – o pai
questionou-o.
Será que poderia gostar de alguém que conhecia ainda de forma tão
superficial? Enquanto entendia o que Hermione queria dizer apenas com um
olhar, Lilá nada lhe dizia. Ron, na verdade, achava a lourinha pegajosa demais.
Esforçava-se para ter conversas interessantes com a menina, queria
sinceramente se apaixonar por ela. Ignorava que não era possível mandar nos
próprios sentimentos.
Mas espera aí? O pai acabara de dizer que ele e Molly achavam que Ron
gostava de Hermione. “Mantenha a situação sob controle”, o rapaz falava para
si mesmo, respirando fundo antes de responder:
— Eu gosto da Lilá. Mas não sei se o sentimento por ela vai se tornar algo tão
forte a ponto de me levar a pensar em casamento, como o Gui. Ainda estamos
nos conhecendo melhor.
Arthur ouviu com atenção o filho, mas voltou a perguntar sobre Hermione.
“Você não sente nada especial por ela?”, indagou. Ron acabou revelando que
a amizade dele com a garota havia estremecido e já não estavam mais nem se
falando. “Nós sempre brigamos, mas dessa vez Mione exagerou e me atacou
com um bando de pássaros”, contou.
O pai surpreendeu-o mais uma vez. Perguntou se Ron não havia cogitado que
aquele ataque havia sido motivado por ciúmes de Hermione do namoro dele
com Lilá. Sim, o ruivo já se perguntara algumas vezes se podia ser isso, mas
sempre chegava à conclusão que a amiga não gostava dele.
— Fique atento, meu filho, para não perder o amor da sua vida. Muitas vezes
ele está ao nosso lado, mas fechamos os olhos e não conseguimos enxergar.
Quando finalmente despertamos, já é tarde demais – a voz de Arthur era
tranquila.
Enquanto o pai tinha essa conversa com Ron, na sala de estar os demais
Weasley falavam sobre o irmão.
— Quero ver qual vai ser a reação do Ron. Acho que não tinha ideia que
namoro para o sr. e srª Weasley era algo tão sério – disse Gui.
— Eu lembro quando papai teve uma conversa assim comigo. Foi decisivo para
eu resolver fazer do trabalho com os dragões o meu ideal de vida – afirmou
Carlinhos.
— Papai vai dar é uma chamada em Ron – garantiu Fred.
— Ele e mamãe não entendem como, gostando de uma menina, nosso caro
irmãozinho pode namorar outra – argumentou Jorge.
— Ron gosta de outra menina?! Vocês estão falando de Hermione? –
perguntou Harry, que até então não participara da conversa.
— Estamos falando de uma menina com pouco mais de um metro e meio,
muito inteligente, mas com um gênio péssimo, como Roniquinho – respondeu
Fred.
— Ele nunca me falou que gostava de Mione... – contrapôs Harry.
— Mas nem Ron sabe disso. Nega a verdade para si mesmo e ainda tem
certeza que Mionizinha não está nem aí para ele – enfatizou Jorge.
— Ron não entendeu que o ataque dos pássaros foi uma grande cena de
ciúmes – disse Gina, entrando na discussão.
Nesse instante Molly chega à sala e, ao perceber que os irmãos falavam de
Ron, trata de encerrar logo a conversa.
— Vamos dispersando vocês todos. Ron já vai voltar e não quero que o
aborreçam. Gina, Fred e Jorge, venham me ajudar na cozinha. Carlinhos e Gui,
deem uma limpeza nos jardins. Harry, querido, você pode ajudar os dois? –
ordenou a mulher, que sabia conduzir tudo e todos na Toca.
O sexto filho dos Weasley entrou na sala ainda pensando na conversa que
acabara de ter. Sentiu vontade de fazer tantas perguntas ao pai, mas ficou
bloqueado. Será que Arthur e Molly achavam que Hermione gostava dele?
Fred e Jorge sempre insinuavam isso, mas sempre por intermédio de
brincadeiras que ele não podia levar a sério.
Não podia mentir para si mesmo. Ele estava sentindo grande saudade da
amiga. Lembrava dela o tempo todo, dos natais e outros momentos nos quais
estiveram juntos n’A Toca. Como era bom conversar com a menina, dar risadas
juntos, fazer dupla com ela no quadribol. Hermione sempre se desesperava por
não conseguir ir bem no jogo e nessa hora os papéis se invertiam e era Ron
que dava dicas para a morena.
Tinha que reconhecer: os momentos passados junto com a amiga nunca eram
monótonos. Ela sempre tinha uma conversa interessante e, apesar de parecer
tão séria e responsável, sabia rir de suas piadas e quebrar regras quando
necessário. Como Hermione fazia falta em sua vida! Por que precisavam ter se
distanciado tanto, pensava com tristeza.
Sabia que a amiga estava muito magoada com ele. Reconhecia agora que
tinha sido muito rude com ela e, para piorar, a ridicularizou na frente de toda a
turma. Agiu assim em resposta ao deboche da menina, mas admitia que havia
exagerado. Percebeu quando os olhos de Hermione encheram de lágrima e
viu-a sair correndo da sala, esquecendo todo o material. Sentiu vontade de sair
disparado atrás dela e pedir desculpas. Mas agora tinha Lilá e não podia agir
assim.

Hermione nunca havia sentido tanta solidão e tristeza. Mesmo se lutava com
todas as forças para não se lembrar de Ron, sempre o seu pensamento se
voltava para ele. Recordava os dias felizes vividos com o ruivo e, de modo
especial, os natais que passaram juntos.
Gostava tanto de estar n’A Toca... Era uma casa muito simples e sinistra até.
Parecia que havia crescido à medida que a família aumentava, desafiando a
engenharia trouxa. Com certeza, só se mantinha de pé devido à magia. Ao
mesmo tempo era tão aconchegante!
Da cozinha vinha um aroma delicioso de guloseimas preparadas com carinho
por Molly. As salas de jantar e de estar eram sempre animadas por conversas
e risadas. Todos os ambientes tinham calor, luz e cor, assim como os Weasley.
Amava muito aquela família, cada um dos seus membros. Até mesmo Percy,
com seu nariz empinado. Sabia que no fundo ele tinha bom coração. Afinal, era
um Weasley e isso significava muita coisa. A menina tinha consciência dessa
realidade mais do que o próprio Ron.
Jamais conhecera, seja entre os trouxas e os bruxos, uma família mais
especial. Vivia sempre momentos felizes quando se encontrava n’A Toca. Mas
claro que era Ronald Billius o principal motivo para querer sempre estar ali.
Naquela casa torta compreendia, mais do que em qualquer outro lugar, quem
era Ron.
Observava o rapaz conversando de forma tão compenetrada com o pai,
recebendo os afagos e broncas da mãe, sendo caçoado pelos irmãos e como
conquistava seu espaço entre eles. Mesmo se dizia o contrário, Ron era muito
querido por todos.
Não era uma pessoa guiada pela cabeça, como Hermione. Tudo para o ruivo
passava primeiro pelo coração. Por isso as palavras saiam por vezes
impensadas de sua boca, mas por isso também pedia perdão e esquecia
mágoas com facilidade. Mas, acima de tudo, seguir o coração o levava a ter
coragem de fazer qualquer sacrifício pelos amigos e por todas as grandes
causas nas quais acreditava.
Era filha única e seus pais, os bem-sucedidos dentistas Albert e Jean Granger,
muito organizados, dedicados ao estudo e ao trabalho, ensinaram à menina
desde cedo que o conhecimento é um dos patrimônios mais importantes. O pai,
reservado e apaixonado por livros, e a mãe, comunicativa, prática e decidida,
estimularam a filha a ser independente e racional. A garota pensara ter
aprendido a lição, mas Ron a tirava do sério e a fazia mostrar seu lado
explosivo e passional.
A casa da menina, perto d’A Toca, parecia sempre fria. De modo particular este
ano, quando passava o Natal apenas com o sr e srª Granger. A família era
pequena: além dos pais, tinha apenas a avó materna e uma tia que morava na
França com o marido e duas filhas, uma da mesma idade de Hermione, outra
dois anos mais velha. Mas dessa vez todos decidiram ficar em Paris, para onde
seguiu também a avó, e o os pais de Hermione, por questões de trabalho,
permaneceram em Londres.
Por mais que Albert e Jean procurassem agradar a menina, fazendo suas
receitas preferidas e enchendo-a de presentes e mimos, ela experimentava um
grande vazio. Sentia falta do calor que emanava d’A Toca e, especialmente, de
Ron. Sorria ao pensar que assim como ela tinha essa ligação com a terra, com
tudo que era concreto, o menino se identificava com o fogo e até o seu cabelo
vermelho mostrava isso.
Hermione se esforçou ao máximo para que os seus pais não percebessem que
estava triste. Mas foi Albert, normalmente desligado, que primeiro perguntou o
que estava acontecendo com a filha.
— Estou achando você tão desanimada... Não quer passar o dia amanhã na
casa dos Weasley? Eu e sua mãe levamos você lá – ele sugeriu.
— Não, pai, obrigada. Quero ficar com vocês – Hermione respondeu, tentando
disfarçar o quanto ficara surpresa com essa proposta.
— Aquele rapaz... Ronald, não é mesmo? Ele deve telefonar ou mandar uma
mensagem pela coruja para você. Sempre faz isso. Com certeza vai convidá-la
para passar uns dias lá. Se você quiser... – Albert continuou.
— Pai, eu já falei. Não quero sair daqui! – a voz da garota saiu num tom mais
alto que o normal. – Agora me dá licença, por favor, que estou com um pouco
de dor de cabeça e vou para o meu quarto.
O dentista achava a filha muito madura e responsável. Por isso dificilmente se
preocupava com as decisões da menina, já que acreditava que ela sempre
fazia a escolha certa. Pela primeira vez, no entanto, sentia que Hermione era
mais frágil do que imaginava e precisava de seu apoio. Com respeitava demais
a privacidade da filha, não quis bater na porta do quarto dela. Mas pediu a
esposa Jean para ir falar com Mione.
Quando a garota abriu a porta do quarto, seus olhos ainda estavam vermelhos.
A mãe pediu licença para entrar, dizendo que precisava falar com ela.
Perguntou o que estava acontecendo com Hermione, por que andava tão triste
e se recusara visitar A Toca, lugar do qual tanto gostava.
Hermione tentou esconder tudo que se passava com ela. Primeiro porque era
reservada por natureza e não gostava de falar, nem com os próprios pais, dos
seus sentimentos. Depois porque não queria preocupá-los.
Percebeu logo, porém, que dessa vez seria impossível não falar para mãe o
que estava acontecendo. Antes que pudesse pensar na melhor forma de dizer
que havia rompido a amizade com Ron, a mãe tomou a iniciativa.
—Filha, a sua mãe conhece você melhor do que imagina. Desde que chegou
aqui notei que estava triste. Até o seu pai, que é mais desligado, percebeu o
seu abatimento. Você precisa confiar em nós. Não existe quem queira mais o
seu bem do que nós dois – com a voz suave, Jean Granger a incentiva a falar.
Aquelas palavras tocaram fundo o coração da menina, que se sentia tão
solitária. Ela, que tentava se manter forte até aquele momento, desmoronou e
lágrimas sentidas começaram a rolar por sua face. A mãe abraçou a filha em
silêncio e ficaram assim por alguns minutos.
No momento que se desprenderam do abraço, a menina sentou em sua cama
e Jean ocupou a cadeira da escrivaninha. Hermione não sabia por onde
começar nem o que dizer. Apenas uma vez havia insinuado algum interesse
por Ron. Foi no recesso depois do Baile de Inverno, quando perguntou a mãe
se era comum amigos terem ciúmes um do outro. A mãe quis saber o porquê
do questionamento e jovem acabou revelando que Ron tinha ficado muito
enciumado por ela ter ido ao baile com o jogador búlgaro.
Ainda recordava das palavras que a mãe lhe dirigiu na ocasião: “Amigos
podem ter ciúme, sim. Mas pode ser, também, que Ron não veja você apenas
como amiga. Talvez queira um relacionamento ainda mais próximo”.
Pensava no que dizer dessa vez quando a srª Granger tomou mais uma vez a
iniciativa. “Filha, você e Ronald brigaram? É por isso que está triste?”,
perguntou de forma carinhosa. Como a mãe podia saber exatamente o que
estava se passando? Será que também era uma bruxa e tinha uma bola de
cristal?
A garota abaixou os olhos e permaneceu em silêncio. Deveria contar para a
mãe que gostava de Ron, mas que ele namorava outra pessoa? Parecia tão
exagerada a sua reação diante do fato em si que não tinha coragem de falar.
Acreditava que os seus pais esperavam que sempre tivesse autocontrole,
firmeza e agisse de forma racional e inteligente. Como podia dizer que estava
se deixando guiar pelos sentimentos, que atacara o rapaz com um feitiço, sem
medir as consequências desse ato, por pura mágoa e ciúme?
— Minha filha, você cresceu, tornou-se uma adolescente, e jamais tivemos
uma conversa sobre como nossas emoções e sentimentos mudam nesse
período. O coração começa a falar mais alto e nos surpreendemos com a força
com que ele conduz a nossa vida. Você não precisa se envergonhar dos seus
sentimentos... – Jean incentivou a garota a se abrir.
— Mãe...eu... - Hermione respirou fundo e enxugou uma lágrima que teimava
em cair – eu e Ron não somos mais amigos.
Agora que ela começara a se abrir, a srª Granger, que era persistente como a
filha, não deixaria que a confidência ficasse pela metade. Lembrou que os dois
já tinham se desentendido várias outras vezes – isso Hermione havia contado
para a mãe – e sempre voltavam a se falar.
Hermione explicou que dessa vez não acreditava que voltariam a se falar.
“Magoamos demais um ao outro”, ela resumiu. A mãe disse que o
arrependimento sincero cura muitas feridas. Faltava, no entanto, a confidência
mais importante.
— Filha, você precisa confiar em mim e se abrir. O seu sentimento por Ron é
mais forte do que uma simples amizade, não é? – a mãe fez a pergunta mais
difícil.
O jeito era se render. Jean Granger já sabia de tudo. Para que negar? “Eu
gosto muito de Ron, muito mais do consigo expressar. Mas quero e vou
esquecer dele. Ron me tratou muito mal e agora ainda está com uma
namorada”.
Todos os argumentos em defesa do relacionamento dos dois foram usados
pela mãe: Hermione devia perdoar o rapaz, dar uma oportunidade dele se
justificar e retomar a amizade. Nenhum deles demoveu Hermione de sua
decisão. Ela estava muito magoada e convencida de que devia tratar Ron com
o máximo de desprezo. E foi com esse sentimento que ela voltou a Hogwarts
para o reinício das aulas.
CAPÍTULO 9
Quando partiu d’A Toca, Ron estava decidido a fazer as pazes com Hermione.
Tentou conversar com a menina ao reencontrá-la na porta da Grifinória, logo
assim que chegou à Hogwarts de volta do recesso de Natal. Mas ela o ignorou
completamente, falando apenas com Harry. A garota fazia de conta que ele
não existia? O rapaz também a trataria com indiferença.
Ron não conseguiu manter-se firme na sua resolução por muito tempo.
Lembrava-se de tudo que havia sentido nos dias de recesso n’A Toca.
Impossível esquecer uma amizade tão longa e especial assim. Hermione era
cabeça-dura, como ele. Mas o bruxo havia decidido mudar, ser menos
ciumento e inseguro. Não era fácil, porém, precisava tentar.
As aulas de Defesa contra as Artes das Trevas e de Herbologia não eram
frequentadas por Lilá, que preferiu fazer Adivinhação e História Avançada da
Magia. Ron não podia sequer virar o rosto para o lado da sala onde Hermione
sentava nas aulas em que estava com a namorada. A loura, muito ciumenta,
logo reclamava.
Nessas duas disciplinas, no entanto, podia tentar uma reaproximação da
amiga. Mione, porém, sequer o olhava, a não ser com aquele ar de desprezo e,
quando o ruivo fazia um comentário qualquer, fingia não ouvi-lo.
“Tudo bem, vou fazer mais uma tentativa. Não é possível que ela consiga
guardar toda essa mágoa para o resto da vida”, pensou ao decidir conversar
com Hermione no final da aula de Herbologia.
— Mione? Posso falar com você? – ele falou com certa hesitação.
— Já está falando, não é? – a garota foi ríspida.
— Eu estou com uma dúvida no trabalho de Herbologia e queria saber se
você... – Ron achou melhor não fazer rodeios.
— Não! A resposta é não! Consulta a biblioteca, a professora Sprout, o Neville,
que é bom nessa matéria. Não conte comigo – a garota tinha as faces
vermelhas e sequer esperou ele concluir a frase.
— Tudo bem. Obrigado de qualquer forma – o rapaz sabia que, quando ela
estava irritada, não adiantava insistir.
O bruxo concluiu que seria inútil tentar uma reaproximação. “Eu não devia
perder tempo tentando falar com ela. Não faço falta na vida de Hermione”,
concluiu, sem querer admitir o quanto sentia falta da amiga.
Mesmo se não deixava transparecer isso, a menina sentiu-se mal por ter
tratado Ron daquela forma. Mas ele tinha feito a própria escolha ao preferir a
companhia da Lilá a dela. Mal imaginava que o seu comportamento fazia com
que o rapaz se agarrasse ainda mais a loura.
Ele pensara várias vezes em terminar com Lilá. Achava a garota muito
possessiva e pegajosa. Mas, sem a amizade de Hermione, pelo menos tinha a
namorada para preencher sua vida e acabava mantendo o relacionamento.
Duas semanas da tentativa frustrada de uma reaproximação com Hermione, o
rapaz deu um novo passo. Abordou a menina na saída do refeitório, depois do
almoço. Falou do momento difícil que Harry atravessava e sugeriu que os dois
pudessem se encontrar com o amigo para que ele sentir-se mais apoiado.  
— Tenho conversado bastante com Harry e o apoio sempre. Você é que está
distante porque parece ter outras prioridades. Melhor continuar do jeito que
está – ela respondeu com o seu tom de voz mais mal-humorado.
— Fiz minha parte. A decisão é sua – Ron argumentou, virando as costas.
Hermione se esforçava para manter-se indiferente ao ruivo. Ele ficava distante
porque percebia que a garota não o queria por perto e tentava se distrair na
companhia de Lilá. No entanto, a presença da namorada não substituía a
grande ausência de Mione. Por isso, no final de fevereiro, decidiu tentar
novamente selar a paz com a amiga.
Ele se apressou para alcançar Hermione ao final da aula de Defesa contra as
Artes das Trevas e a chamou pelo nome. A garota, que há quase três meses
se afastara de Ron, manteve a expressão zangada no rosto.
— Pelo bem de Harry, acho que devemos voltar a nos falar. Não precisamos
ser amigos, mas, pelo menos, podemos deixar de nos tratar como inimigos –
ele parecia aflito.
— Não quero mais falar com você, Ron. Faça de conta que eu não existo! – a
voz saiu mais estridente que o normal.
— Daqui a dois dias é meu aniversário...  – o ruivo apelou.
— Ótimo! Comemore bastante com a Lilá e me deixe em paz. Você não
significa nada para mim – Hermione não conseguiu evitar uma grande dor no
coração. Essa era a pior mentira que podia falar.
O rapaz se irritou com a postura arrogante e fechada ao diálogo e respondeu à
altura.
— Não sei como você pode guardar tanto ódio e por tanto tempo! Isso vai
acabar lhe envenenando! – falou, saindo apressado.
Hermione dormiu mal mais uma noite. Isso já fazia parte de sua rotina. Ao
longo do dia se distraía com as aulas, leituras e consultas aos livros na
biblioteca, trabalhos e conversas com Harry, Gina e alguns outros colegas. Mas
quando deitava em sua cama sentia-se terrivelmente sozinha e quase sempre
não conseguia evitar algumas lágrimas.
Por mais que tentasse, não esquecia Ron. Como era difícil ficar sem a amizade
dele. Fazia tudo para mostrar a sua indiferença e dizer que não significava
nada para ela e podia passar muito bem, obrigada, sem o rapaz. Mas ao longo
do dia, em muitos momentos, olhava para ele distraidamente – sempre sem
que o ruivo percebesse – e se dava conta de quanto o amava. Esses
momentos eram seguidos por grande censura a si mesma. A menina não
admitia voltar atrás na própria decisão e tinha escolhido tirar Ronald Billius
Weasley de sua vida.
Era muito difícil dividir o mesmo dormitório com Lilá e Pavarti. De vez em
quando ouvia a loura falar, de um jeito apaixonado, sobre Ron, sem contar os
momentos que as duas amigas ficavam cochichando e dando risadinhas. Sorte
que tinha pelo menos a companhia de Gina e sempre podia usar o feitiço da
impertubalidade.
Naquela noite sentia-se ainda mais arrasada. Como podia ter sido tão
agressiva com ele? Era a quarta vez que o bruxo  tentava se reaproximar dela
desde que voltaram do Natal. E havia falado de um jeito tão bonitinho que seria
o aniversário dele... Não, não podia pensar assim. Ron era um idiota, estava
namorando Lilá e a havia ridicularizado na sala de aula!
 
Ao abrir os olhos pela manhã, Hermione lembrou que era o dia do aniversário
de Ron. Deveria manter a atitude indiferente de sempre ou cumprimentá-lo?
Gostaria tanto de poder abraçar o amigo... Não! Ele estava com Lilá, tinha
escolhido a menina e a rejeitara.
Ainda assim, ao menos por educação, Hermione achou que deveria dar
parabéns a Ron. Seria difícil, já que tinham se distanciando tanto, mas iria
tentar...  Decidiu não pensar mais sobre isso e desceu para tomar o café da
manhã.
Como era sábado, o refeitório ainda estava um pouco vazio. Harry, Gina e Ron
ainda não se encontravam no salão. Ela comeu rapidamente e resolveu voltar
ao dormitório para pegar alguns livros. Estava um dia bonito de sol e queria ler
na área externa.
Ela se preparava para atravessar o retrato da Mulher Gorda no momento que
ouviu Neville chamando o seu nome. O rapaz entregou um bilhete, dizendo que
era de Harry, e perguntou se a garota sabia onde estava Gina. Hermione
respondeu que a ruiva deveria ter ido para o refeitório. Assim que o rapaz se
despediu, abriu o bilhete sem fazer ideia do que se tratava. Com surpresa, leu
essas palavras, escritas com letra apressada:
Não se preocupe. Está tudo sob controle, mas Ron ainda precisa ficar na
enfermaria.
Harry 
No mesmo instante, o coração de Hermione começou a bater
descontroladamente. O que aconteceu com Ron? O que Harry queria dizer
com as palavras “está tudo sob controle”? Ele tinha se machucado muito?
Havia sido atingido por algum feitiço ou maldição? Será que os Comensais da
Morte atacaram Hogwarts?
Esqueceu-se completamente que estava zangada com o ruivo e andou
apressada em direção à ala hospitalar. A mágoa acumulara ao longo dos
últimos meses agora não tinha razão de ser.
Jamais deixara de gostar do rapaz. Apenas estava chateada com as atitudes
dele. Mas sabia que Ron era imaturo e passional, por isso agia sem pensar
muitas vezes. Mas ela também fora impulsiva e o atacara com os pássaros.
Nada disso importava mais. O importante, agora, era saber como ele estava!
Enquanto caminhava em direção à enfermaria, o desespero começou a tomar
conta de Hermione. Por que Harry havia escrito um bilhete ao invés de ir falar
pessoalmente com ela e Gina? Será que a situação era tão séria que não podia
sair de perto de Ron? O amigo não disse que ele estava bem, nem que não
corria mais risco de vida. Limitou-se a informar que estava tudo sob controle. A
menina já entrara em pânico. Não suportaria perder Ron. Não conseguia
imaginar a sua vida sem ele! Precisava saber como o rapaz estava, tinha que
vê-lo com os seus próprios olhos.
Finalmente chegou ao corredor da ala hospitalar e avistou Harry, que estava de
cabeça baixa, parado em frente à porta da enfermaria. Ela correu até o amigo
com o coração mais acelerado do que nunca.
— Calma, Hermione! Ron está fora de perigo! – ele Harry ao ver a expressão
desesperada da amiga
No momento que soube que o rapaz não corria risco de vida, Hermione
rendeu-se finalmente à emoção. Cobriu o rosto com as mãos e caiu aos
prantos.
Harry, assustado com a reação da amiga, a segurou pelos ombros e perguntou
baixinho:
— Tudo bem, Mione? Você entendeu? Ron está fora de perigo.
— Tudo bem, Harry. Agora está tudo bem. Eu estava muito angustiada. Tive
medo que... ah, nem gosto de pensar nisso ... – a garota levou a mão ao rosto
para enxugar as lágrimas.
Pouco depois chegou Gina, com os passos apressados, o rosto vermelho e foi
logo perguntando o que tinha acontecido. Harry contou tudo para as duas.
Hermione fazia perguntas pontuais, ficando a maior parte do tempo em
silêncio.
Apesar de estar mais aliviada, Hermione ainda sentia uma dor no peito. Não
bastava Madame Pomfrey dizer que Ron reagia bem, tinha todos os sinais
vitais. Ela queria ver o ruivo com os seus próprios olhos.
Às oito horas da noite, depois de passar quase o dia todo na porta da
enfermaria junto com Gina e Harry – saíram apenas nos horários das refeições
-, Hermione pôde finalmente visitar Ron. O rapaz ainda estava desacordado e
pálido como ela nunca vira, com a boca um pouco arroxeada.
Hermione pegou uma cadeira e sentou-se em um canto da enfermaria, de onde
tinha uma visão completa do amigo. A menina, sempre tão corajosa, sentia
ainda muito medo e não conseguia se aproximar mais do rapaz. Dali ela
contemplava o ruivo, angustiada, esperando alguma reação que mostrasse que
estava bem.
Pouco depois, Jorge e Fred chegaram. Hermione ouvia Harry, Gina e os
gêmeos conversando, mas não conseguia prestar atenção no que diziam.
Sentia uma grande dor não apenas por vê-lo naquele estado, mas também ao
lembrar como o vinha tratando nos últimos meses. “Ele tentou se reaproximar,
eu não aceitei, fui muito agressiva”, pensou com enorme arrependimento. Será
que teria ainda uma chance de pedir desculpas? Não, não podia pensar nisso!
Ron ficaria bem, precisava ficar bem.
O ruivo tinha, sim, os seus defeitos e Hermione os conhecia muito bem. Mas as
suas qualidades eram muito maiores. Toda a insegurança do rapaz prejudicava
antes de tudo a ele mesmo, levando-o a se sentir desmotivado para os estudos
e se sair mal nas partidas de quadribol, esporte do qual tanto gostava. Mas isso
não impedia que fosse muito corajoso quando se tratava de defender os
amigos.
Lembrava-se de Ron salvando-a de um trasgo, e isso quando ainda estava no
primeiro ano, e defendo-a com a varinha quebrada das ofensas de Malfoy, o
que levou o ruivo a vomitar lesmas. Sem falar nas detenções que sofreu... Mas
também havia arriscado a vida por Harry, mostrando sua coragem e lealdade.
“Como pude pensar em tirar Ron da minha vida? Como se isso fosse
possível... É verdade que ele muitas vezes tem um comportamento infantil, é
ciumento, fala o que passa pela cabeça sem pensar. Mas nos momentos em
que mais precisei, ele estava sempre perto”, refletia enquanto contemplava a
face tão branca do rapaz.
A garota ainda não entendia o porquê de Ron ter sido tão frio e agressivo com
ela dias antes do jogo. E logo quando parecia que algo especial estava tão
perto de acontecer... "Não, não posso pensar nisso", se repreendia ao lembrar
do amigo com Lilá. 
“Espera aí, Hermione? Desde quando você desiste fácil de algo que quer? Eles
são apenas namorados e podem terminar esse relacionamento!”, falou para si
mesma e assim tranquilizou o coração.
Foi quando Jorge, Fred, Harry e Gina começaram a levantar as hipóteses para
o envenenamento de Ron que a menina passou a prestar atenção na conversa
deles. Harry informou que Slugorn queria presentear a garrafa de hidromel a
Dumbledore e a menina finalmente falou, depois de horas, com voz de quem
pegara um forte resfriado.
— Então o envenenador não conhecia Slughorn muito bem. Qualquer um que
conhecesse Slughorn saberia que havia grande probabilidade de o professor
guardar uma coisa gostosa daquela para si mesmo – ela ponderou.
Ron começou a se mexer, parecendo reconhecer a voz da amiga, e a chamou
pelo nome, ainda desacordado. Todos se calaram, observando-o ansiosos,
mas, depois de resmungar palavras incompreensíveis por um momento, ele
simplesmente começou a roncar.
O coração de Hermione disparou em grande velocidade. “Oh, Merlin! Ele
chamou por mim?! Não foi o nome da Lilá e sim o meu nome que falou! Fica
bem, Ron. Não posso perder você”, pensava a menina que, finalmente, sentia
algum alívio e felicidade.
Com a chegada de Hagrid, a inteligente bruxa permaneceu atenta à discussão
sobre a relação dos ataques de Katie e Ron.  Pouco depois entrou na
enfermaria o casal Weasley e, como apenas seis pessoas podiam permanecer
no local, Harry, Hermione e Hagrid se retiraram.
No dormitório, deitada em sua cama, Hermione continuou com a cabeça
tumultuada por muitos pensamentos. A imagem de Ron pálido e desacordado
não saía da mente da menina. Lamentava nunca ter dito que o achava um bom
goleiro. Pelo contrário, ao repreender Harry por ter, supostamente, trapaceado,
havia levado o ruivo pensar que ela não acreditava no potencial dele.
Essa lembrança abatia ainda mais a garota, que havia passado o dia inteiro
aterrorizada pela possibilidade de acontecer o pior ao amigo. Por que precisou
esperar uma situação tão séria para finalmente se decidir a perdoar Ron?
Ficava chateada com sua própria teimosia e orgulho.
Como havia sido difícil não ficar sentada em frente à lareira todas as noites,
como sempre fazia antes, conversando com Ron e Harry, no período que ela e
o ruivo deixaram de se falar. Mas, especialmente, o mais difícil tinha sido vê-lo
para cima e para baixo de mãos dadas, abraçado ou beijando Lilá. “Por acaso
seria diferente se soubesse do sentimento tão forte que tenho por ele?”,
questionava-se.
A jovem bruxa estava consciente que ela e Ron tinham muito a esclarecer
desde o Baile de Inverno. Não conseguia mais permanecer nessa incerteza e
com tanto medo do seu amor não ser correspondido. Seria tão mais fácil se ele
não fosse tão inseguro e dúbio, se tivesse coragem de falar o que se passava
em seu coração.
Algo dizia a Hermione que Ron também gostava dela, mas, por temer ser
rejeitado, não conseguia se declarar. Lembrou-se do dia que ele reconheceu
que tinha ciúme até de Bichento e um leve sorriso tomou conto do seu rosto.
“Eu preciso e vou me aproximar de Ron, mas agora não posso mais pensar
nisso. Tenho que estar inteira para visitá-lo amanhã. Quem saiba possamos
conversar e eu consiga finalmente pedir desculpas a ele”. Com essa resolução
e com muita esperança, a menina conseguiu pegar no sono.
CAPÍTULO 10
Precisava ver Ron, saber como ele estava. Dormira mal a noite inteira,
perturbada por pesadelos terríveis nos quais o ruivo aparecia todo
ensanguentado, como se estivesse sem vida. Desde o envenenamento, o
rapaz permanecia desacordado e Hermione só se tranquilizaria quando
soubesse que ele tivera alguma reação.
“Não vou tomar café agora. Preciso visitar Ron”, decidiu. Não falou com
ninguém, nem mesmo com Gina, da sua intenção. Lilá ainda dormia. A menina
desconfiava que a loura não sabia que o namorado fora envenenado e não
seria ela a contar.
— Está um pouco cedo, srta. Granger, para as visitas – disse Madame
Pomfrey.
— Mas as visitas não começam às 8h? – Hermione perguntou.
— Ainda são 7h30. Mas tudo bem, você pode entrar – a medibruxa balançou a
cabeça, provavelmente lembrando do quanto a garota era insistente. – Devo
avisá-la, no entanto, que o sr. Weasley continua desacordado.
A menina logo bombardeou a medibruxa de perguntas. Soube que o rapaz
passara bem à noite, reagindo positivamente à medicação. Só que ainda
continuava inconsciente. “Ele está se recuperando”, garantiu Madame Pomfrey.
Hermione sentou-se ao lado do ruivo e, ao ver como continuava pálido, sentiu
uma grande angústia. Sabia que só ficaria em paz quando pudesse contemplar
os olhos azuis do amigo. Instintivamente, ela segurou uma das mãos de Ron e
começou a falar baixinho.
— Ron? Sou eu, Hermione. Você está na enfermaria, mas já foi medicado.
Logo tudo vai voltar ao normal. Eu vou ficar aqui com você – a voz dela era
suave.
O rapaz balançou a cabeça e pareceu resmungar, reagindo às palavras da
garota, que prosseguiu:
— Talvez você não esteja me ouvindo, mas eu gostaria de pedir desculpas.
Percebi que tentou se reaproximar de mim, mas eu ainda estava muito
magoada e tratei você com desprezo. Eu não queria que tivesse sido assim...
Depois de dar um fraco gemido, Ron chamou a amiga pelo nome. Ela apertou
mais a mão do ruivo e falou: “Eu estou aqui”. O rapaz abriu os olhos com
esforço e mirou o rosto da amiga.
— Você está na enfermaria, mas está tudo bem – ela tentava tranquilizar a si
mesma.
— Não está mais chateada comigo? – ele perguntou com voz fraca.
Os olhos de Hermione se encheram de lágrimas e ela se segurou para não cair
no choro. Ron quase tinha morrido envenenado e se preocupava em saber se
a garota estava ou não chateada com ele.
— Não, Ron! Está tudo bem. Se você me desculpar...
— Eu também não estou chateado com você – o ruivo deu um sorriso fraco.
— Que bom! – Hermione também sorriu, aliviada.
— O que aconteceu? – o rapaz ainda estava muito abatido.
— Você não lembra de nada? – ela o encarou tentando analisar cada leve
mudança no semblante de Ron.
— Só lembro vagamente de ter acompanhado Harry até a sala do professor
Slughorm...
— Você foi envenenado. O professor serviu uma taça de hidromel sem saber
que continha veneno... Mas agora está tudo bem, fica tranquilo – Hermione
tentava acalmar o amigo, mas ela continuava tensa.
— Você está segurando minha mão... – Ron a encarou.
— Ah, desculpa... – Hermione ficou logo com as faces vermelhas e tentou
desprender a mão.
— Não, por favor, fica assim – o ruivo pediu apertando a mão da garota e
fechando novamente os olhos.
Depois de vários meses de angústia, desde que ela e Ron passaram a se
desentender, Hermione finalmente se sentia em paz, aliviada, feliz até. Como
tinha sido bom contemplar aqueles olhos azuis tão límpidos, mesmo se por
poucos minutos, já que o ruivo parecia ter voltado a dormir. Como era bom
estar de mãos dadas com ele e, o melhor, o amigo ter pedido para permanecer
assim. “Eu te amo demais, Ron. Pena ainda não poder falar em voz alta desse
meu sentimento”.
Hermione permaneceu uns 10 minutos ali, de mãos dadas com o rapaz,
contemplando o seu rosto ainda pálido, os lábios agora com um pouco mais de
vida, os cabelos vermelhos. Lembrava-se de alguns dos muitos momentos, de
perigo e alegria, que haviam passado juntos ao longo desses anos.
Quando seu estômago anunciou que ela ainda não havia tomado café,
conformou-se em sair de perto de Ron. Pensava em voltar à ala hospitalar no
horário da tarde. Depois de saber que Lilá finalmente havia sido informada do
envenenamento do namorado e resolvera fazer plantão na enfermaria, achou
melhor adiar a visita.
Naquela noite, conversando com Gina, ela descobriu que Ron passava a maior
parte do tempo desacordado. "Lilá ficou se queixando comigo, dizendo que
Uon-Uon está sempre dormindo quando vai visitá-lo", a ruiva fez uma espécie
de careta ao falar o apelido do irmão. Hermione sorriu ao lembrar que o rapaz
havia falado por alguns instantes com ela, mas preferiu guardar isso em
segredo.
Quando Hermione levantava, era sempre assim: logo se recordava de Ron.
Naquela manhã não foi diferente, mas, ainda assim, queria evitar a visita, como
no dia anterior. Quando lembrou que o primeiro tempo de aula era livre para ela
e não para Lilá, que fazia Adivinhação, decidiu voltar à enfermaria.
Ron estava dormindo e Hermione começou a fazer várias perguntas à Madame
Pomfrey. Ficou sabendo que o amigo recebia sedativos para diminuir a
agitação dele e permitir ao organismo se normalizar com maior rapidez.
— Por isso é que o sr. Weasley fica muito tempo desacordado, mas aos
poucos estou diminuindo a dosagem. O envenenamento que sofreu foi muito
sério. Ele só não faleceu por causa do benzoar, mas foi muito atingido e a
recuperação deve demorar cerca de uma semana – explicou a medibruxa,
garantindo, porém, que Ron ficaria completamente restabelecido.
No momento que saiu da área hospitalar, um pouco desanimada por Ron ainda
estar inconsciente, Hermione encontrou-se com Gina, Fred e Jorge. Os
gêmeos não podiam perder a oportunidade de tirar uma brincadeira com
a menina, mesmo diante da gravidade da situação.
— Madrugou, Mionizinha? Roniquinho já acordou? – perguntou Jorge.
— Não. Ele permanece desacordado a maior parte do tempo – ela tentou
passar certa indiferença.
— Fala a verdade! Ele é muito mais interessante desacordado, não é? –
provocou Fred.
— Pelo menos não fala besteira - completou Jorge e os dois caíram na
gargalhada.
— Meninos, vocês já encheram demais a paciência de Hermione por hoje. Vão
entrando para visitar Ron que eu preciso dar uma palavrinha com Mione –
disse Gina com a autoridade que lembrava Molly.
A caçula dos Weasley parecia mais ansiosa que o normal e foi logo pedindo
desculpas a Hermione por ter contado um segredo a Ron. “Ele me provocou
tanto que eu acabei falando, sem pensar”, justificou-se a ruiva.
— O que você falou para ele? – Hermione ficou assustada, achando que a
ruiva havia revelado a paixão secreta dela pelo amigo, apesar de nunca ter
conversado com Gina sobre o assunto.
— Eu contei que você tinha beijado o Krum – a garota respondeu sem mais
rodeios.
— Gina! Você não podia fazer isso! Eu pedi segredo. Aquele beijo não
significou nada para mim – a voz de Hermione ficou estridente e, o rosto,
vermelho.
— Você não podia guardar segredo a vida toda. Um dia Ron ia descobrir... –
contrapôs Gina.
— Mas quem tinha que contar isso para ele era eu, você não acha? –
Hermione questionou.
Gina explicou em detalhes como tudo tinha acontecido e finalizou contando o
conselho que deu ao irmão. “Eu falei que ele devia arrumar uma namorada,
beijar alguma menina, para não encher mais a minha paciência”.
Hermione não pôde deixar de pensar que, com essas palavras, Gina tinha
incentivado Ron a se jogar nos braços da Lilá.
— Poxa, Gina! Você sabe como o seu irmão é ciumento, especialmente com
relação a Krum. Eu e Ron estávamos nos entendendo tão bem. Nós dois
iríamos juntos à festa do Clube do Slugue... – Hermione finalmente começava a
entender o porquê do amigo passar a tratá-la tão mal de uma hora para outra.
— Não venha defender Ron. Se ele não fosse tão imaturo saberia que o seu
relacionamento com Krum era coisa do passado. Imagina... Um beijo que já
aconteceu há 2 anos! – Gina contrapôs.
Ele não era maduro, Hermione sabia disso. E ainda era ciumento, muito
ciumento, por sinal. Se gostava ao menos um pouquinho da amiga, da forma
como ela tanto desejava, a revelação daquele beijo, mesmo se muito distante
no tempo, o havia abalado.
A inteligente bruxa não queria mais falar daquele assunto. Era informação
demais em muito pouco tempo. Disse para Gina que precisava ir, ainda não
tinha tomado café da manhã. Mas foi surpreendida pela pergunta da ruiva.
— Hermione? Você gosta muito do meu irmão, não é? – a ruiva tinha um olhar
penetrante.
— Claro! Ele é meu amigo – tentou responder de forma displicente.
— Mas você não gosta dele só como amigo, eu sei disso – Gina disparou.
A garota ficou mais uma vez com o rosto vermelho. A última coisa que queria
ouvir era isso. Então o sentimento que tentou esconder por tanto tempo tinha
sido descoberto? Onde falhara, se perguntou. Queria negar, mas Gina fez
aquela afirmação de forma tão convicta que sentiu que era inútil. Preferiu ficar
quieta.
— Meu irmão é apaixonado por você – a ruiva continuou sem se importar com
a expressão perplexa da amiga. – Ele jamais vai admitir esse sentimento, que
nega para si mesmo. Pelo menos por enquanto. Mas lá em casa todos sabem
disso.
Aquelas palavras ainda gritavam dentro do coração de Hermione. “Meu irmão é
apaixonado por você”. A garota, porém, escondida atrás da sua tão conhecida
racionalidade, tentou manter o ar de indiferença.
— Gina, você está enganada. Ron não gosta de mim do jeito que você falou. E,
além do mais, ele está namorando a Lilá – ela tentou parecer indiferente. 
— Eu sei que Ron não gosta dela e que esse namoro não deve durar muito.
Mas o que eu queria dizer mesmo é que, se você realmente ama o meu irmão,
tem que demonstrar isso de alguma forma. Toda vez que o critica, ele fica
arrasado e se distancia ainda mais de você. Sei que Ron tem muitos defeitos,
mas também é divertido, protetor, tem um ótimo coração! E o mais importante:
ama muito você! – ela deu um sorriso animado para a amiga.
 
 
 
Depois da conversa com Gina, a garota passou o dia fora do ar. Sentia-se feliz
quando algo dentro dela dizia que a amiga falara a verdade e que Ron a
amava. Mas logo essa certeza se dissipava e dava lugar a muitas dúvidas.
“Quem tem que dizer o que sente por mim é ele. Se me amasse, Ron não
estaria namorando Lilá. Poderia até ficar chateado por causa de Krum, mas
não procuraria outra pessoa”, a menina refletia.
Logo em seguida o lado persistente e batalhador da bruxa, que sabia lutar e
alcançar seus objetivos, tão eficiente no estudo, se manifestava. “Se gosto de
Ron, e eu sei o quanto gosto, como sou apaixonada por ele, preciso lutar por
esse sentimento”.
Para piorar, Lilá resolveu implicar com Hermione. “Você é minha colega de
turma, de casa e de dormitório. Tinha a obrigação de me contar que Ron foi
envenenado”, dizia a loura. Hermione argumentou que pensou que ela
soubesse, afinal, os dois eram namorados. E se questionava como a menina
podia ser tão desligada do mundo a ponto de não virar a escola de ponta à
cabeça atrás do rapaz que desaparecera justamente no dia do aniversário.
“Eu senti falta do Ron, é claro. Mas ele disse que queria passar o dia em
Hogsmeade. Eu não sabia que o passeio tinha sido cancelado e, como também
não vi Harry, achei que os dois tinham ido para lá juntos. Como podia imaginar
que Uon-Uon corria grave perigo”, Lilá choramingava, deixando Hermione
ainda mais irritada.
Para não ter a desagradável surpresa de encontrar a garota na enfermaria,
visitando o namorado, Hermione resolveu que não veria mais o amigo. Não era
fácil manter essa decisão. Ron ainda estava tão enfraquecido da última vez
que estivera com ele. Conseguiu manter-se firme por dois dias, e com muito
sacrifício.
Estudava na  sala comunal, à noite, quando Gina foi ao encontro dela. "Ron
estava acordado e perguntou por você, queria saber se vai visitá-lo. Eu disse
que você tinha ido lá alguns vezes, mas que ele estava sempre dormindo”,
contou a ruiva.
Na manhã seguinte, Hermione acordou com uma doce lembrança. “Ron pediu
para segurar minha mão!”, pensou, recordando da primeira visita que fizera
sozinha ao amigo, e o seu coração disparou de felicidade. Ressoaram em sua
mente mais uma vez as palavras de Gina: “Meu irmão é apaixonado por você”.
Fosse ou não verdade, o fato é que estava morrendo de saudades de
contemplar aqueles olhos azuis. Esse argumento suplantou todos os demais,
com seus prós e contras, e, quando se deu conta, Hermione já estava entrando
na enfermaria.
Ron conversava com Madame Pomfrey. Parecia tentar convencê-la que podia
jogar quadribol no sábado. “Eu estou ótimo. Não sinto mais nada”, dizia. A
medibruxa, ao avistar Hermione, encerrou de vez a conversa. “Ronald
Weasley, tem uma visita para o senhor”. No mesmo instante, ao avista a
amiga, o ruivo abriu um lindo sorriso.
— Hermione! Então não foi um sonho – ele disse.
— Sonho, Ron? Não estou entendendo... – Hermione ficou surpreendida por
aquela afirmação.
— Achei que tinha sonhado que você veio me visitar, conversou comigo e
voltamos a ser amigos. Não foi um sonho, foi? – o rapaz insistiu.
— Não, Ron. Eu estive aqui no domingo pela manhã. E na segunda-feira
também. Mas você estava desacordado nessa segunda vez – ela sorriu.
— Lembro também que você segurou minha mão... – o ruivo mordeu o lábio
inferior.
A garota ficou com as faces vermelhas. Mas logo tratou de se recompor e agir
racionalmente como fazia, ou tentava fazer, sempre que estava com Ron.
—Você estava tão pálido, achei que precisava de mim... – ela tentou se
explicar.
— Preciso, sim – disse num fôlego só, para em seguida completar. – Preciso
muito da sua amizade.
“Por que da minha amizade, Ron? Eu não quero mais ser apenas a sua amiga.
Será que nunca vai perceber isso?”, a garota questionava-o em silêncio. O
ruivo se deu conta que Hermione havia saído do ar por alguns segundos.
“Mione? Está tudo bem?”, perguntou.
— Claro... tudo bem. E você, como está? – indagou a menina.
— Estou bem... Queria ter alta amanhã de manhã, mas Madame Pomfrey está
irredutível! – o rapaz bufou.
— Você tem que ter paciência, Ron. Envenenamento é algo muito sério! Eu
fiquei tão preocupada em ver você desacordado...
— Engraçado você estar preocupada comigo... – ele cortou Hermione. – Nos
dois últimos meses fazia questão de virar o rosto sempre que passava ao meu
lado. Achei que nunca voltaríamos a ser amigos...
— Eu também achei, mas agora, olhando para trás, vejo que nós dois agimos
como crianças. E eu queria pedir desculpas... – ela falou com certo
constrangimento.
— Por que? – ele não podia evitar essa pergunta.
— Por tantas coisas... Por desconfiar que havia tomado Felix Felicis antes do
jogo, pelo ataque dos pássaros, pela forma como tratei você nesse último
período. Mas quero que saiba que nunca duvidei da sua capacidade de goleiro.
Pelo contrário. Sabia que era apenas o nervosismo que atrapalhava o seu bom
desempenho – a garota sorriu com timidez.
— Eu também tenho que pedir desculpas... Sei que magoei muito você, usei
palavras muito duras... – Ron olhou para a amiga de um jeito muito sério.
— Então vamos deixar tudo isso para trás? – sorriso dela agora foi mais aberto.
— Combinado – disse o rapaz, que continuava pálido, retribuindo ao sorriso.
Quando Hermione se despediu, Ron pediu que ela voltasse no dia seguinte e
agradeceu, de forma carinhosa, pela visita. Os dois estavam felizes. Era
impressionante perceber que um mal-entendido tão grande podia se resolver
com poucas palavras.
CAPÍTULO 11

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