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CAPÍTULO 2
Os vidrinhos rosa exerciam uma forte atração sobre Hermione. Quando Fred e
Jorge informaram que continham a poção do amor, ela recuou um pouco sem
graça. Enquanto olhava outros artigos da Gemialidades Weasley, os dois
irmãos se aproximaram. Fred parecia esconder algo e, com um gesto rápido,
tirou as mãos de trás das costas e ofereceu um daqueles vidros para a menina.
— Cortesia da casa! – anunciou com um sorriso.
— Não costumamos oferecer para ninguém e recomendamos com restrições –
completou Jorge.
— Essa poção costuma ser muito forte e tem efeitos colaterais – explicou Fred.
— Mas no caso de uma menina interessada em conquistar um cabeça-dura,
achamos que é a única solução! – disse Jorge com uma piscadela.
— Muito obrigada, eu não preciso disso – respondeu a menina.
— Tem certeza? – provocou Fred.
— Leve uma sem compromisso – Jorge sugeriu.
A menina virou as costas, antes que os gêmeos a convencessem a levar a
poção. Será que precisaria mesmo daquilo para Ron tomar coragem de se
declarar?
Sacudiu a cabeça assustada com os próprios pensamentos. Ron parecia em
alguns momentos gostar dela mais do que como amiga. No entanto, Mione
sabia que, mesmo se essa impressão fosse verdadeira, dificilmente ele teria
coragem de se declarar. Ainda assim precisava reconhecer que o rapaz estava
muito diferente. Tanto que pediu desculpas a ela com simplicidade e
sinceridade depois que se desentenderam por conta de Fleur.
Perdida nesses pensamentos, ela se surpreendeu ao chegar ao último corredor
da loja e se deparar com Lilá Brown e Ron conversando de forma muito
animada. Hermione não gostou nada de ver os dois juntos novamente.
Quando Ron veio em sua direção, foi logo perguntando:
— O que Lilá estava falando com você?
— Disse alguma coisa sobre continuar na escola, perguntou se meus pais não
estavam preocupados... Parece que os pais dela por pouco não a proibiram de
continuar em Hogwarts - ele olhava Mione com atenção.
— Ela estava muito sorridente para quem estava dizendo algo tão sério! -
Hermione manteve a fisionomia séria.
— Hermione! Por que você tem tanta implicância com Lilá? - Ron ergueu uma
das sobrancelhas.
— Cadê o Harry? – ela perguntou, na tentativa de escapar da pergunta do
ruivo.
— Eu sei lá! Tem tanta coisa aqui para ver que ele deve estar distraído em
algum corredor. Vou até a sessão de artefatos trouxas, que ainda não visitei –
o rapaz respondeu, saindo de perto da amiga.
Ela observou Ron passar novamente perto de Lilá, que deu um sorrisinho, e
falar alguma coisa para a menina. Saiu na direção contrária, bem chateada, e
esbarrou em Harry.
O amigo logo notou que ela não estava em seu estado normal.
— O que houve, Mione? - ele a interrogou.
— Aquela metida da Lilá Brown! Acho ela insuportável! - a garota bufou irritada.
— Desde o ano passado ela já demonstrava estar interessada em Ron. Não sei
por que a surpresa... - o amigo foi direto.
— Harry? Eu não ia dizer nada disso...
— Sei... Mas escuta, Hermione, Ron é tão desligado que nem percebeu - o
rapaz ponderou.
— Não é tão desligado assim não. Pelo menos quando se tratam de meninas
bonitas. E garanto que já percebeu que Lilá está interessada nele - Hermione
rebateu.
Harry, Hermione e Gina estavam no andar de cima d'A Toca. Ron tinha descido
até a cozinha para “beliscar” alguma coisa – não estava conseguindo esperar
até a hora do lanche – e a mãe o presenteou com uma deliciosa mousse de
chocolate.
— Mãe, isso aqui está bom demais... Em Hogwarts, as sobremesas são
ótimas, mas não se compararam às suas – o rapaz elogiou.
Molly deu um sorriso. Era tão fácil conquistar o filho. Bastava uma comida
caprichada, uma palavra, um carinho. Percebeu que aquele era o momento de
falar de um assunto delicado e importante.
— Eu e seu pai gostamos muito da Hermione. Ela tem ótimo coração, é muito
responsável e percebemos o quanto o ajuda e estimula nos estudos – disse
Molly introduzindo o assunto.
— Mione é legal, sim. Mas tem horas que se intromete demais em tudo, é
autoritária... – contrapôs o rapaz.
— Mas quem não tem defeitos, Ronald? - a mãe o questionou.
O ruivo olhou intrigado para a mãe, tentando entender onde ela queria chegar.
Antes dele conseguir pensar numa resposta, Molly continuou:
— Hermione vai fazer aniversário daqui a alguns dias e gostaria de repassar a
você algo muito valioso para presenteá-la. Se você achar que deve, é claro.
A mãe fez um gesto rápido com a varinha e no mesmo instante se materializou
em suas mãos um delicado cordão dourado com uma pedra em forma de
estrela como pingente. “Foi um presente que recebi da minha avó materna e
transmite uma atmosfera mágica muito envolvente. Estava com esse cordão no
dia em que eu e seu pai começamos a namorar. Pensava em passar para
Gina, mas depois decidi que daria para um dos meus filhos presentear uma
menina muito especial. Desde que Hermione chegou aqui, tenho sentido no
meu coração que esse colar deve ser dela”, Molly justificou.
— Mas por que a senhora mesma não entrega esse presente a ela? –
perguntou Ron, que intuía que dar aquele cordão era o mesmo que fazer uma
declaração de amor e não sabia se tinha coragem ou se esse era o momento
para aquele gesto tão comprometedor.
— Meu filho, Hermione é sua amiga e foi por causa da sua ligação com ela que
pensei em dar esse presente. Mas se você não quiser, passo para outro dos
seus irmãos – a mãe argumentou.
O rapaz de repente percebeu quão especial era aquele presente. Por alguns
segundos enfrentou um dilema. Uma parte dele desejava aproveitar todas as
oportunidades de fazer chegar o seu afeto à menina. Outra queria guardar
segredo daquele sentimento tão forte, mas ainda tão confuso, que ganhava
cada vez mais espaço no seu peito. O olhar de incentivo de sua mãe,
misturado ao maravilhoso sabor da mousse, fez optar pelo seu lado mais
irracional. Mesmo correndo o risco de se expor por completo, Ron decidiu que
não deixaria essa chance passar. “Mãe, muito obrigada. Eu aceito, sim. Acho
que Mione vai ficar muito feliz. Mas devo dizer que foi você que pensou em dar
o cordão para ela?”, ele perguntou.
— Diga que pertenceu a mim e que passei a você para presentear uma pessoa
que considerasse muito especial em sua vida – sugeriu Molly.
Com um novo rodopio da varinha, a mãe colocou o cordão numa delicada
caixinha lilás e a entregou ao filho. Ron guardou a caixa no bolso e, como já
tinha terminado a mousse, se levantou e deu um beijo em Molly. “Te amo,
mãe”, falou e, em troca, ganhou um sorriso, seguido por um beijo e palavras
afetuosas. “Eu também te amo, Ron. Tenho muito orgulho de você”.
Ao chegar à sala do segundo andar, Ron encontrou Hermione, Harry e Gina
conversando animadamente. O rapaz entrou muito quieto e logo seus olhos e
os de Hermione se cruzaram. Ele deu um sorriso um tanto misterioso para a
menina, que era sempre muito desconfiada. “Alguma coisa aconteceu”, ela
pensou, lembrando que o amigo tinha dito que iria à cozinha e já voltava.
— Você demorou, Ron. O que estava fazendo? - Mione perguntou.
Será que a amiga deduzira que havia conversado sobre ela com a mãe? Claro
que não, concluiu o rapaz. “Ron? Você não me respondeu!”, insistiu Hermione.
— Estava com fome e mamãe me serviu uma mousse deliciosa. É uma receita
trouxa, você deve conhecer. Acho que vai ser a sobremesa do jantar – ele deu
um sorriso.
—Você só pensa em comida, Ron – Gina não perderia aquela chance de
criticar o irmão.
O ruivo se limitou a fazer uma careta para a irmã. Sentou em frente à
Hermione, que escutava atentamente Gina falar que os rapazes em geral se
preocupam com comida e outros assuntos banais. Indiferente à conversa, Ron
contemplava o rosto da amiga com um olhar perdido, imaginando como ela
ficaria surpresa com o presente.
Mione olhou para ele de repente e se surpreendeu com a expressão sorridente
e distante do amigo. “Ron?”, chamou. O rapaz permaneceu quieto, sem mover
um músculo. Foi apenas na segunda vez que falou o nome do ruivo que ele
pareceu despertar.
— Estava lembrando da mousse de chocolate? - questionou Harry com uma
fisionomia divertida.
— É... mais ou menos – disse Ron, que não sabia mentir.
A garota ficou intrigada. Achou a expressão de Ron muito parecida com a que
tinha quando encontrava com alguma veela. O amigo não era de ficar com
aquela cara abobalhada à toa. O que será que estava acontecendo com ele?
CAPÍTULO 3
Os vidrinhos rosa exerciam uma forte atração sobre Hermione. Quando Fred e
Jorge informaram que continham a poção do amor, ela recuou um pouco sem
graça. Enquanto olhava outros artigos da Gemialidades Weasley, os dois
irmãos se aproximaram. Fred parecia esconder algo e, com um gesto rápido,
tirou as mãos de trás das costas e ofereceu um daqueles vidros para a menina.
— Cortesia da casa! – anunciou com um sorriso.
— Não costumamos oferecer para ninguém e recomendamos com restrições –
completou Jorge.
— Essa poção costuma ser muito forte e tem efeitos colaterais – explicou Fred.
— Mas no caso de uma menina interessada em conquistar um cabeça-dura,
achamos que é a única solução! – disse Jorge com uma piscadela.
— Muito obrigada, eu não preciso disso – respondeu a menina.
— Tem certeza? – provocou Fred.
— Leve uma sem compromisso – Jorge sugeriu.
A menina virou as costas, antes que os gêmeos a convencessem a levar a
poção. Será que precisaria mesmo daquilo para Ron tomar coragem de se
declarar?
Sacudiu a cabeça assustada com os próprios pensamentos. Ron parecia em
alguns momentos gostar dela mais do que como amiga. No entanto, Mione
sabia que, mesmo se essa impressão fosse verdadeira, dificilmente ele teria
coragem de se declarar. Ainda assim precisava reconhecer que o rapaz estava
muito diferente. Tanto que pediu desculpas a ela com simplicidade e
sinceridade depois que se desentenderam por conta de Fleur.
Perdida nesses pensamentos, ela se surpreendeu ao chegar ao último corredor
da loja e se deparar com Lilá Brown e Ron conversando de forma muito
animada. Hermione não gostou nada de ver os dois juntos novamente.
Quando Ron veio em sua direção, foi logo perguntando:
— O que Lilá estava falando com você?
— Disse alguma coisa sobre continuar na escola, perguntou se meus pais não
estavam preocupados... Parece que os pais dela por pouco não a proibiram de
continuar em Hogwarts - ele olhava Mione com atenção.
— Ela estava muito sorridente para quem estava dizendo algo tão sério! -
Hermione manteve a fisionomia séria.
— Hermione! Por que você tem tanta implicância com Lilá? - Ron ergueu uma
das sobrancelhas.
— Cadê o Harry? – ela perguntou, na tentativa de escapar da pergunta do
ruivo.
— Eu sei lá! Tem tanta coisa aqui para ver que ele deve estar distraído em
algum corredor. Vou até a sessão de artefatos trouxas, que ainda não visitei –
o rapaz respondeu, saindo de perto da amiga.
Ela observou Ron passar novamente perto de Lilá, que deu um sorrisinho, e
falar alguma coisa para a menina. Saiu na direção contrária, bem chateada, e
esbarrou em Harry.
O amigo logo notou que ela não estava em seu estado normal.
— O que houve, Mione? - ele a interrogou.
— Aquela metida da Lilá Brown! Acho ela insuportável! - a garota bufou irritada.
— Desde o ano passado ela já demonstrava estar interessada em Ron. Não sei
por que a surpresa... - o amigo foi direto.
— Harry? Eu não ia dizer nada disso...
— Sei... Mas escuta, Hermione, Ron é tão desligado que nem percebeu - o
rapaz ponderou.
— Não é tão desligado assim não. Pelo menos quando se tratam de meninas
bonitas. E garanto que já percebeu que Lilá está interessada nele - Hermione
rebateu.
Harry, Hermione e Gina estavam no andar de cima d'A Toca. Ron tinha descido
até a cozinha para “beliscar” alguma coisa – não estava conseguindo esperar
até a hora do lanche – e a mãe o presenteou com uma deliciosa mousse de
chocolate.
— Mãe, isso aqui está bom demais... Em Hogwarts, as sobremesas são
ótimas, mas não se compararam às suas – o rapaz elogiou.
Molly deu um sorriso. Era tão fácil conquistar o filho. Bastava uma comida
caprichada, uma palavra, um carinho. Percebeu que aquele era o momento de
falar de um assunto delicado e importante.
— Eu e seu pai gostamos muito da Hermione. Ela tem ótimo coração, é muito
responsável e percebemos o quanto o ajuda e estimula nos estudos – disse
Molly introduzindo o assunto.
— Mione é legal, sim. Mas tem horas que se intromete demais em tudo, é
autoritária... – contrapôs o rapaz.
— Mas quem não tem defeitos, Ronald? - a mãe o questionou.
O ruivo olhou intrigado para a mãe, tentando entender onde ela queria chegar.
Antes dele conseguir pensar numa resposta, Molly continuou:
— Hermione vai fazer aniversário daqui a alguns dias e gostaria de repassar a
você algo muito valioso para presenteá-la. Se você achar que deve, é claro.
A mãe fez um gesto rápido com a varinha e no mesmo instante se materializou
em suas mãos um delicado cordão dourado com uma pedra em forma de
estrela como pingente. “Foi um presente que recebi da minha avó materna e
transmite uma atmosfera mágica muito envolvente. Estava com esse cordão no
dia em que eu e seu pai começamos a namorar. Pensava em passar para
Gina, mas depois decidi que daria para um dos meus filhos presentear uma
menina muito especial. Desde que Hermione chegou aqui, tenho sentido no
meu coração que esse colar deve ser dela”, Molly justificou.
— Mas por que a senhora mesma não entrega esse presente a ela? –
perguntou Ron, que intuía que dar aquele cordão era o mesmo que fazer uma
declaração de amor e não sabia se tinha coragem ou se esse era o momento
para aquele gesto tão comprometedor.
— Meu filho, Hermione é sua amiga e foi por causa da sua ligação com ela que
pensei em dar esse presente. Mas se você não quiser, passo para outro dos
seus irmãos – a mãe argumentou.
O rapaz de repente percebeu quão especial era aquele presente. Por alguns
segundos enfrentou um dilema. Uma parte dele desejava aproveitar todas as
oportunidades de fazer chegar o seu afeto à menina. Outra queria guardar
segredo daquele sentimento tão forte, mas ainda tão confuso, que ganhava
cada vez mais espaço no seu peito. O olhar de incentivo de sua mãe,
misturado ao maravilhoso sabor da mousse, fez optar pelo seu lado mais
irracional. Mesmo correndo o risco de se expor por completo, Ron decidiu que
não deixaria essa chance passar. “Mãe, muito obrigada. Eu aceito, sim. Acho
que Mione vai ficar muito feliz. Mas devo dizer que foi você que pensou em dar
o cordão para ela?”, ele perguntou.
— Diga que pertenceu a mim e que passei a você para presentear uma pessoa
que considerasse muito especial em sua vida – sugeriu Molly.
Com um novo rodopio da varinha, a mãe colocou o cordão numa delicada
caixinha lilás e a entregou ao filho. Ron guardou a caixa no bolso e, como já
tinha terminado a mousse, se levantou e deu um beijo em Molly. “Te amo,
mãe”, falou e, em troca, ganhou um sorriso, seguido por um beijo e palavras
afetuosas. “Eu também te amo, Ron. Tenho muito orgulho de você”.
Ao chegar à sala do segundo andar, Ron encontrou Hermione, Harry e Gina
conversando animadamente. O rapaz entrou muito quieto e logo seus olhos e
os de Hermione se cruzaram. Ele deu um sorriso um tanto misterioso para a
menina, que era sempre muito desconfiada. “Alguma coisa aconteceu”, ela
pensou, lembrando que o amigo tinha dito que iria à cozinha e já voltava.
— Você demorou, Ron. O que estava fazendo? - Mione perguntou.
Será que a amiga deduzira que havia conversado sobre ela com a mãe? Claro
que não, concluiu o rapaz. “Ron? Você não me respondeu!”, insistiu Hermione.
— Estava com fome e mamãe me serviu um mousse delicioso. É uma receita
trouxa, você deve conhecer. Acho que vai ser a sobremesa do jantar – ele deu
um sorriso.
—Você só pensa em comida, Ron – Gina não perderia aquela chance de
criticar o irmão.
O ruivo se limitou a fazer uma careta para a irmã. Sentou em frente à
Hermione, que escutava atentamente Gina falar que os rapazes em geral se
preocupam com comida e outros assuntos banais. Indiferente à conversa, Ron
contemplava o rosto da amiga com um olhar perdido, imaginando como ela
ficaria surpresa com o presente.
Mione olhou para ele de repente e se surpreendeu com a expressão sorridente
e distante do amigo. “Ron?”, chamou. O rapaz permaneceu quieto, sem mover
um músculo. Foi apenas na segunda vez que falou o nome do ruivo que ele
pareceu despertar.
— Estava lembrando do mousse de chocolate? - questionou Harry com uma
fisionomia divertida.
— É... mais ou menos – disse Ron, que não sabia mentir.
A garota ficou intrigada. Achou a expressão de Ron muito parecida com a que
tinha quando encontrava com alguma veela. O amigo não era de ficar com
aquela cara abobalhada à toa. O que será que estava acontecendo com ele?
Depois que voltaram as aulas, os desentendimentos entre Ron e Hermione
também retornaram. Não eram tão intensos como nos anos anteriores, mas
ainda aconteciam. Ron estava mais tranquilo e paciente com a menina. A
morena, no entanto, como já manifestara no ano anterior, exigia que o rapaz
amadurecesse.
“Ele só pensa em comida, quadribol e momentos para relaxar. Imagina! Achar
que teremos horários livres para ficar mais tempo sentado, sem fazer nada?
Disse a ele que vamos precisar desse tempo para estudar, mas acho que nem
me escutou”, queixou-se a Harry.
— Ron sempre foi assim, Hermione. Tudo bem que pode amadurecer um
pouco e, acredite, ele já amadureceu bastante. Mas todos nós podemos
melhorar, não é mesmo? – disparou Harry que achava a amiga muito tensa,
exigente consigo mesmo e com os outros.
Talvez Harry tivesse razão, pensou Hermione. Enquanto alimentasse qualquer
expectativa que Ron fosse diferente, continuaria a se decepcionar. Era difícil
admitir. Mesmo se detestava algumas características do ruivo, era apaixonada
por ele. Ron tinha qualidades que ela amava e, devia reconhecer, não possuía.
“Dizem que os opostos se atraem. É, deve ser isso”, tentava se conformar.
No fundo, mesmo se não reconhecia, o que a deixava mais irritada era a
indecisão do rapaz. Já dera tantos sinais que gostava dela, mas não conseguia
se declarar. Ao mesmo tempo, era tão contraditório. Em muitos momentos
implicava com Hermione, não aceitava as suas opiniões. E ainda flertava com
mulheres bonitas na frente da amiga!
Foi com essa mistura de sentimentos que ela chegou à sala para a primeira
aula de Estudos Avançados de Poções do professor Slughorn. Para a sua
surpresa, Ron, que não estava matriculado nessa disciplina, chegou atrasado
com Harry e foi aceito na turma. Deu uma olhada para o ruivo com certa
decepção e se perguntou: “Será que ele nunca vai tomar uma decisão”?
Os três caldeirões no centro da sala de aula já tinham chamado a atenção de
Hermione. Em especial um deles, que exalava um cheiro que a atraia
fortemente.
Com sua inteligência rápida, Hermione logo identificou as poções que
continham cada caldeirão. Quando o professor Slughorn perguntou se alguém
sabia qual era a poção do primeiro, a menina levantou a mão e acertou a
resposta. Não foi diferente quando o professor perguntou sobre o conteúdo do
segundo.
Ron olhou da menina para o professor, que parecia impressionado com a
capacidade da nova aluna. Slughorn chegou ao último caldeirão e Ron tinha
certeza que a amiga responderia qual poção era aquela. Das três, essa era a
única que o próprio rapaz não identificara. No entanto, mesmo sabendo a
resposta, ele jamais levantaria a mão como fazia Hermione com tanta
desenvoltura.
— É Amortentia! – respondeu a menina.
Para surpresa do ruivo, Hermione informou com propriedade os seus efeitos.
“É a mais poderosa poção do amor no mundo”, disse. A garota mudou o tom de
voz e, com entusiasmado, continuou a falar. “Eu a reconheci também pela
fumaça subindo em suas espirais características. E ela deve cheirar
diferentemente para cada um, dependendo do que nos atrai. Eu posso sentir
grama recentemente cortada, pergaminho novo e...”. A voz de Hermione sumiu
de um jeito abrupto e ela ficou levemente rosada.
Ron estranhou a mudança, mas jamais suspeitaria do motivo. Era o cheiro
cítrico, tão característico do cabelo do ruivo, que a menina sentira. Ela se
afastou com o coração batendo forte, morrendo de medo que alguém,
especialmente o amigo, sempre tão intuitivo, desconfiasse de alguma coisa.
O que para quase todos foi apenas uma aula normal, para Hermione significou
muito. Se precisava de uma confirmação de que era Ron o amor de sua vida,
agora já tinha. Não conhecia mais ninguém com esse perfume maravilhoso,
que tão fortemente a atraia e a fazia se sentir tão bem.
CAPÍTULO 4
Na véspera do aniversário de Hermione, Ron abriu mais uma vez a caixinha
lilás e olhou o cordão. Por um instante teve medo de dar aquele presente à
menina. No fundo, sabia que era uma declaração silenciosa de amor. Ainda
não havia admitido para si mesmo que queria a morena como namorada.
Achava que a amiga jamais o aceitaria do jeito que era, sempre desejaria
mudar algo nele. Acreditava também que Mione tinha como meta conseguir um
namorado mais talentoso e bem-sucedido do que ele. Para que, então, correr o
risco de receber um não como resposta? E como iria encará-la depois? Com
certeza a amizade entre os dois acabaria.
Ao mesmo tempo, porém, sem saber explicar o porquê, algo o atraia
fortemente para a menina e o fazia intuir que ela também experimentava os
mesmos sentimentos confusos. Por isso logo se convenceu, mais uma vez,
que devia entregar o presente. Com medo de perder a coragem na hora que
estivesse frente a frente com ela, decidiu pedir a Gina que deixasse a delicada
caixinha na cabeceira da cama de Hermione.
“Por que você não entrega? O que vai dar para ela?”, questionava Gina, que
não parou de bombardeá-lo de perguntas. O rapaz foi evasivo e pediu
simplesmente que fizesse aquele favor e deixasse o presente próximo à amiga.
A irmã sugeriu que ele escrevesse ao menos um cartão.
Depois do jantar, Ron entregou à irmã a caixinha lilás acompanhada por um
pequeno envelope laranja. No cartão, apenas as palavras:
O rapaz ficou algum tempo perdido em seus pensamentos. O que a mãe queria
dizer com “seu único objetivo é dar otimismo, melhor percepção e crença nos
próprios sentimentos”? Será que a atração forte que sentira pela amiga é
porque percebera melhor algo já latente no próprio coração? E por que
Hermione o olhava daquele jeito enamorado? Estaria acontecendo o mesmo
com ela? Por que a mãe dizia “que precisavam amadurecer”?
Eram muitas perguntas sem resposta. Mas o pior é que Hermione, curiosa
como era, não sossegaria enquanto ele não dissesse tudo que estava na carta.
No intervalo da primeira aula da tarde, como Ron imaginara, Hermione foi
procurá-lo. Queria saber o que dizia a carta. “Não entendi muito bem. Vou ler
um pedaço para você. Talvez compreenda melhor que eu”, o ruivo disse,
tirando um papel dobrado do bolso da jaqueta.
— Aqui diz que o único objetivo da magia presente no colar é “dar otimismo,
melhor percepção e crença nos próprios sentimentos. Mas isso pode motivar
ações equivocadas, caso não haja maturidade para ultrapassar os impulsos e
agir segundo as próprias convicções”. Estranho, né? – ele não reparou no olhar
assustado da garota.
Hermione não achava nada estranho. Agora entendia perfeitamente o que tinha
experimentado. Por causa da magia do colar sentira convicção do seu amor
por Ron e ficara otimista quanto à correspondência do rapaz. “Mas espera aí!
Isso não faz sentido”, a menina refletiu ao lembrar que o ruivo dissera estar
sendo afetado pelo colar.
— Ron, sua mãe não falou nada sobre o cordão poder influenciar outras
pessoas além de quem o usasse? Você disse que estava sendo atingido pela
magia do colar...- ela foi direta.
— Acho que me enganei – ele respondeu reticente imaginando que a menina
iria bombardeá-lo de perguntas. – Mamãe disse que você pode escrever para
ela caso tenha mais alguma dúvida. Agora preciso ir.
A garota ficou quieta, mas logo viu que seria uma boa ideia escrever para
Molly. Ron sempre tivera dificuldade de falar sobre os próprios sentimentos.
Com certeza não havia contado tudo que estava na carta.
À noite, sentada em sua cama, Hermione escreveu para a mãe de Ron. Na
carta, agradeceu pela generosidade dela em passar o cordão para o filho
presentear uma amiga. Perguntou ainda mais detalhes da magia do colar e se
essa poderia afetar outras pessoas, revelando que Ron dissera estar sendo
atingindo pela mesma.
No final da tarde do dia seguinte, a coruja dos Weasley entregou uma carta a
Hermione. Sorte que Ron não estava por perto, pensou a menina. Gina, porém,
estava e logo foi perguntar por que Mione havia recebido uma correspondência
da casa dela.
“Eu queria tirar uma dúvida com sua mãe sobre uma magia da qual ela me
falou”, tentou sair pela tangente. A ruiva, é claro, não se satisfez com essa
resposta e quis saber mais. Hermione, no entanto, disse que nada mais podia
revelar. “Você, Ron e Harry têm tantos segredos... Tudo para derrotar Você-
Sabe-Quem, não é?”, ela questionou. Dizendo que sentia muito por não poder
falar mais, Mione despediu-se da amiga.
A garota correu para o quarto, torcendo para não encontrar com Ron. Queria
ler a carta com tranquilidade. Não entendia porque, mas sentia grande
ansiedade. Imaginava que Molly havia escrito algo revelador, que poderia
mudar a sua vida. Mas não compreendia a razão de tanta expectativa. Sem
perder mais tempo, abriu o envelope amarelado.
“Querida Hermione,
Lamento que o presente tenha causado alguns transtornos. Esse cordão
significou muito para mim, já que o usei em momentos felizes de minha vida.
Estava com ele quando comecei a namorar Arthur, por exemplo.
Como já expliquei a Ron, o colar não direciona as ações das pessoas que o
usam, apenas traz otimismo, convicção dos próprios sentimentos e escolhas,
força para seguir o coração.
Quanto a dar esses mesmos “efeitos” em outros, como relatou que pode ter
acontecido com Ron, caso exista muita afinidade entre quem usa e essa
pessoa, é possível sim. Agora me lembro que Arthur ficava mais romântico e
expressava melhor os seus sentimentos sempre que eu estava com o colar.
Com relação ao Ronald, sugiro que tenha paciência com ele. Geralmente os
rapazes demoram mais a amadurecer e têm mais dificuldade para entender e
mostrar os próprios sentimentos. Ron, por sinal, não tem o dom da palavra.
Mas, em compensação, é tão transparente! Se você prestar mais atenção no
seu olhar e em pequenos gestos, vai entender tudo o que se passa no coração
dele.
Como os efeitos do colar não foram bem compreendidos, especialmente por
Ron, ao que parece, sugiro que o deixe guardado por um tempo. Logo você
poderá voltar a usá-lo e entenderão plenamente como somos felizes quando
seguimos o coração.
Com os meus votos tardios de feliz aniversário, lhe desejo muitas alegrias,
Afetuosamente,
Molly”
CAPÍTULO 6
Tudo caminhou muito bem entre Ron e Hermione durante cerca de 10 dias e,
em duas semanas, seria a comemoração natalina do Clube do Sluge. O rapaz
já tinha tirado o seu traje de festa do malão e aguardava aquele momento com
expectativa. Planejava declarar seu amor para Hermione e a pedir em namoro,
mas ainda não sabia se teria coragem. Morria de medo de receber um fora,
mas precisava tentar.
Foi pensando em como falaria do seu sentimento por Hermione que Ron saiu
da Grifinória para jogar quadribol. Depois do tenso treino daquela noite,
encontrou Gina agarrada a Dino. O ruivo achava que a irmã namorava demais.
Não gostava de vê-la beijando algum rapaz pelos corredores de Hogwarts.
Explosivo como era, logo reclamou com a menina, dizendo que não deveria
agir assim em locais públicos.
As palavras de Ron despertaram a ira da ruiva, que sempre enfrentava o irmão
um ano mais velho. Harry, porém, nunca a vira tão zangada. “Quando ela quer
consegue ser cruel”, pensou o amigo ao ouvi-la dizer que Ron “nunca havia
beijado uma menina”. O pior, porém, foi quando afirmou que Hermione tinha
beijado Krum. “Você, ao contrário, tem a experiência de um garotinho de 12
anos”, vociferou Gina.
Ron dificilmente demorava a dormir, mas a confusão de sentimentos que
experimentava roubou o seu sono. Raiva. Decepção. Complexo de
inferioridade. Traição. Por que Hermione tinha ficado com Krum? Por que não
contou nada para ele? Gina, Harry, todos pareciam saber daquele beijo, menos
ele.
“Hermione e eu ainda não somos namorados, mas somos amigos. Ela devia
ser mais sincera comigo e não esconder tantos segredos”, queixava-se o rapaz
para si mesmo. Não entendia como a garota podia ter enchido o coração dele
de esperanças para depois decepcioná-lo assim.
Eram tantas perguntas sem resposta e o rapaz se sentia, mais do que nunca,
patético. “Agi como um bobo tratando Hermione com tanta atenção. Ela não
merecia”, refletia. A menina havia mentido ou pelo menos omitido algo muito
importante para Ron. E o ele sentia-se um idiota por nunca ter beijado alguém,
esperando, inconscientemente, por Mione.
“O primeiro beijo de Hermione deveria ter sido comigo”, concluiu para em
seguida se assombrar com o próprio pensamento.
Sentia tanta raiva misturada a tristeza que não conseguiu conter algumas
lágrimas. Escondeu o rosto no travesseiro e assim, derrotado e envergonhado,
pegou no sono.
Na manhã seguinte, ele levantou mais cedo que o habitual. Harry já estava
acordado e o ruivo o convidou para tomar café. “Não vai esperar Hermione?”, o
amigo perguntou. “Claro que não”, a resposta de Ron foi mal-humorado.
— Você ainda está chateado com ela? – insistiu Harry.
— Não quero falar sobre esse assunto. Nem quero ver Hermione hoje em
minha frente – Ron não se esforçava por esconder toda a mágoa que sentia.
Quando Hermione desceu para sala comunal, estranhou não ver Ron à sua
espera. “Será que ele perdeu a hora?”, perguntou-se. Imaginava que talvez o
treino tivesse sido bem difícil. Ao menos terminou tarde e ela não conseguiu
esperar acordada pelos amigos.
Enquanto fazia essas reflexões, Dino desceu do dormitório. “Ron e Harry ainda
estão dormindo?”, apressou-se a perguntar. “Eles já foram tomar café”, o
rapaz respondeu.
A garota, um tanto intrigada, chegou ao refeitório e logo encontrou os amigos,
que já estavam terminando a refeição.
— Ron! Harry! Bom dia! Vocês não me esperaram... – disse com um leve tom
de queixa.
Logo percebeu que Ron estava estranho e nem levantara os olhos para
encará-la. Harry respondeu em nome dos dois:
— Bom dia, Mione! Ron acordou com com muita fome. Depois do treino de
ontem, até eu fiquei bem faminto e não conseguimos esperar por você. Sinto
muito...
Ela mal olhou para Harry. Observava Ron, que mantinha os olhos baixos,
concentrado em devorar o último pedaço de pão.
— Ron? Tudo bem? – Hermione ficou intrigada com a indiferença dele.
— Tudo bem – respondeu entredentes. Se não fosse pela educação recebida
dos pais, ele teria permanecido calado.
A garota sentou em frente a Ron e continuou a observá-lo. Ele permanecia com
os olhos baixos, voltados para o prato onde agora só se encontrava uma fatia
de torta de chocolate, e suas orelhas estavam púrpuras.
Ela sabia que Ron só ficava com as orelhas vermelhas quando sentia vergonha
ou raiva. Como não havia motivo para o rapaz se envergonhar, Mione logo
deduziu que o amigo estava zangado.
Apesar do constrangimento que sentia com o comportamento do rapaz,
Hermione se esforçou para engrenar num bate-papo. Perguntou sobre jogo,
falou das tarefas que tinham para aquele dia...
Sempre quem respondia a qualquer indagação era Harry. Ron, que se serviu
de mais um copo de suco de abóbora, continuava em silêncio.
— Ron! Você não vai nem me olhar? - a menina não aguentou mais aquele
gelo.
Logo Hermione se arrependeu de ter feito aquela pergunta. Recebeu de Ron
um olhar cheio de raiva que a destruiu por dentro. Agora não restava dúvida. O
ruivo estava zangado com ela. Mas por quê?
Antes que a garota pudesse fazer outra pergunta, Ron pediu licença e se
levantou muito rápido.
— Não fica assim, Mione. Ron está chateado porque jogou muito mal no treino
– antecipou-se Harry.
Hermione queria que fosse apenas isso, mas tinha certeza que a verdade era
outra.
Na primeira aula, Hermione sentou-se ao lado de Harry, como sempre fazia. A
carteira à sua direita permanecia vazia, à espera de Ron. Mione olhava com
frequência para a porta, aguardando a chegada dele, que estava atrasado. O
ruivo entrou sem olhar para ninguém e sentou na última carteira.
Ron nunca ficava nos fundos, sempre estava ao lado dos amigos e foi assim
até no terceiro ano, quando Hermione e ele se desentenderam por conta de
Bichento e Perebas.
— Por que Ron ficou lá atrás? – perguntou baixinho a Harry.
— Vou até lá falar com ele - apressou-se Harry, que não suportava ver o
sofrimento dos amigos.
Apesar do pedido de Harry, Ron foi categórico ao afirmar que não queria sentar
ao lado de Hermione. Harry voltou sem graça ao seu lugar.
Para destruir ainda mais o coração da menina, Lilá estava sentada próxima ao
amigo e os dois trocaram algumas palavras e risinhos durante a aula.
Como Hermione imaginava, ele aproveitou o fato de estar nos fundos da sala e
saiu rapidamente, assim que a aula terminou, evitando mais uma vez a menina.
No final da tarde, quando saiam da última aula, Hermione o alcançou.
— Até quando você vai evitar falar comigo? Eu tenho direito de saber por que
você está tão chateado! – ela desabafou.
— Você não vai gostar do que eu tenho a dizer. Então é melhor eu ficar calado
– Ron continuava irritado.
— Isso é covardia. Eu tenho direito de saber! – Hermione insistiu.
— Saber que estou decepcionado com você, com a forma como me trata, com
o pouco valor que dá à nossa amizade? – a voz do bruxo foi ficando cada vez
mais alta e as orelhas dele estavam vermelhas.
— Isso não é verdade... – ela sentia-se confusa.
— É verdade sim, Hermione. Sem falar que omite muitas coisas de mim... – a
voz dele ficou mais baixa e triste.
— O que eu omiti de você? – Hermione o interrogava com o olhar.
— Eu preciso dizer? Você sabe muito bem tudo que guarda em segredo! – ele
voltou a impacientar-se.
— Mas Ron...
— Chega, Hermione. Não quero ouvir suas desculpas – o rapaz a cortou.
Ele se virou e saiu apressado. Hermione teve vontade de correr atrás do
amigo, segurá-lo pelo braço, dizer que não podia tratá-la daquele jeito. Mas
ficou tão desnorteada com as palavras que ouviu e, especialmente, com o tom
de raiva da voz de Ron que se sentiu paralisada, sem força para qualquer
reação.
Mesmo usando toda a sua Inteligência e raciocínio lógico, a garota não
conseguia entender qual era o motivo da agressividade do amigo. A única
coisa que poderia ter chateado Ron era a recusa dela em assistir ao treino da
noite anterior, apesar dos pedidos insistentes do ruivo. “Como ele não jogou
bem, talvez tenha sentido que faltou o meu apoio. Como fui insensível, deveria
ter ido ao invés de ficar estudando”, concluiu.
— Mione, não fica triste com o Ron. O treino foi horrível e o jogo está
chegando. Você sabe como ele fica nervoso – falou mais uma vez Harry, que
estava se esforçando ao máximo para os amigos não cortarem relação mais
uma vez.
Ela imaginou que teria oportunidade de falar com Ron na hora do jantar, mas
ele foi um dos primeiros a chegar ao refeitório e comeu apressadamente,
evitando a amiga.
Hermione não conseguiu dormir bem naquela noite. Mal o sol começou a
despontar no horizonte, trocou de roupa e desceu para a sala comunal
decidida. Considerava que a conversa com Ron tinha ficado pela metade e não
ia desistir enquanto não soubesse o que estava se passando no coração dele.
Ainda no alto da escada, Harry viu a amiga sentada na sala comunal. Ele virou-
se para Ron, que vinha um pouco atrás, e falou com firmeza: “Mione está te
esperando lá embaixo e você não pode passar a vida toda fugindo dela. Vocês
precisam conversar. Seja sincero, mas não seja agressivo”.
O ruivo olhou para o amigo e permaneceu em silêncio. Harry tinha razão. Não
adiantava continuar a fugir de Hermione.
— Bom dia, Mione! Vou me apressar para o café porque hoje devo ter aula
com o professor Dumbledore. Ron acompanha você no café da manhã –
dizendo isso, Harry foi saindo da sala e os dois frente a frente.
— Oi, Ron – Hermione ficou de pé e saudou o ruivo.
— Oi... – respondeu o rapaz sem conseguir encará-la.
Ele foi caminhando em direção ao quadro da Mulher Gorda e Hermione
apressou o passo para segui-lo.
— Eu queria pedir desculpas por não ter ido ao treino. Não pensei que fosse
algo tão importante para você... – ela tomou coragem para iniciar a conversa.
O bruxo continuou a olhar para frente e tinha a fisionomia muito séria.
Hermione falava pausadamente, como que procurando as melhores palavras.
— Não é segredo para você que não gosto muito de quadribol. Só assisto por
causa de você e Harry. Eu não deveria ter ficado estudando anteontem.
Imaginei que, como era apenas um treino, não precisaria tanto do meu
incentivo. Acho que me enganei. Você sabe como sou preocupada com os
trabalhos e as provas... Mas quero que saiba que, sinceramente, a sua
amizade é muito mais importante para mim do que o estudo – Hermione foi
sincera.
Ron, que permanecera em silêncio, ouvindo a amiga, não conseguiu mais ficar
quieto.
— Todo mundo sabe que a coisa mais importante no mundo para você é o
estudo! – ele parou de caminhar e fulminou a garota com o olhar.
— Não, Ron, você está enganado... – ela tentou argumentar.
— Eu estava enganado, achando que você tinha mudado. Mas você continua a
ser aquela sabe-tudo que valoriza apenas o que está nos livros, os bons
resultados no estudo e na vida. Vítor Krum, famoso jogador de quadribol
profissional, entra na sua lista de pessoas importantes. Ronald Weasley, um
bruxo pobre e sem talento especial, está fora. Eu sempre soube disso, desde o
dia em que a conheci. Mas como ajudava o Harry, este sim meu amigo de
verdade, achei que podia ter um bom relacionamento com você – cada palavra
era como uma alfinetada no coração de Hermione.
— Você está sendo injusto comigo. Repetiu as mesmas coisas que Rita
Skeeper disse e das quais você me defendeu. Por que está agindo assim?
Estávamos num momento tão bom... – a garota estava confusa.
— Eu falei ontem que não queria conversar. Sabia que ia te magoar, mas você
insistiu. Agora já sabe exatamente o que estou sentindo! – ele voltou a
caminhar, sendo acompanhado por Hermione.
— Mas você acha isso mesmo de mim? - ela perguntou muito magoada, mas
com esperança de que o rapaz pudesse se arrepender das próprias palavras.
— Acho que você é uma sabe-tudo insuportável. Não é minha amiga de
verdade. Se fosse não ia me menosprezar e esconder tantos segredos de mim!
– ele voltou a repetir as palavras que tinham machucado Hermione.
A menina queria falar alguma coisa, mas sentiu sua garganta fechar e as
lágrimas começarem a cair copiosas.
— Pode chorar à vontade! Você não vai me comover com suas lágrimas – as
orelhas do rapaz voltaram a ficar vermelhas.
Apressada e com as faces muito vermelhas, Hermione seguiu em direção
contrária ao refeitório e entrou no banheiro. Mais uma vez esse seria o seu
refúgio para chorar a mágoa causada por Ron. Como ele podia chamá-la de
sabe-tudo insuportável? Justamente ela que dividia tudo o que aprendia com
os amigos, seja para ajudar nas tarefas ou lutar contra Voldemort.
Ron foi para o salão principal sozinho. Quando Harry o viu com a cara mais
emburrada do mundo, entendeu que não tinha dado certo a sua tentativa de
reaproximar os dois amigos.
O mundo de Hermione parecia desmoronar. A inteligência e o estudo a tinham
introduzido no universo mágico. Mas agora reconhecia que havia sido o Ron e
sua adorável família que a introduziram realmente na comunidade bruxa.
Apesar de se sentir muito triste com a forma agressiva que estava sendo
tratada por Ron, ela não desistiu do amigo. Lembrava como o ruivo tinha sido
gentil a maior parte do tempo nos últimos meses e, especialmente, do
tratamento carinhoso dele desde que o havia convidado para o baile. Agora era
um Ron raivoso, mal-humorado e pouco educado que encontrava. Mas tinha
esperança que aquele outro Ron, tão amável e alegre, estivesse apenas
adormecido e pudesse acordar a qualquer momento, reconquistando o seu
espaço.
O rapaz parecia se autoflagelar toda vez que maltratava a amiga. Uma vez
havia dito a Hermione que, sempre que a magoava, primeiro magoava a si
mesmo, e essa era a mais pura verdade. Apesar de achar que corria o risco de
estar sendo injusto, não conseguia agir de outro modo. Era algo irracional, bem
típico de uma pessoa passional como ele. Não aceitava ser o segundo na vida
da garota que tanto amava. Mas, ao mesmo tempo, sentia uma dor no coração
ao lembrar-se das lágrimas derramadas por Mione.
Na véspera do jogo, Ron decidiu dar uma trégua. Não seria mais agressivo
com Hermione. Na verdade, queria ficar bem com ela e saber da amiga tudo o
que realmente tinha acontecido entre a garota e Krum. Se Mione não se
correspondia mais com o jogador, aquele relacionamento era algo do passado.
Claro que, ainda assim, não seria fácil esquecer que os dois tinha se beijado,
mas ele estava disposto a tentar.
No jantar, Hermione sentou-se em frente a Ron na expectativa de uma
reconciliação com o amigo. O rapaz tinha evitado a garota durante a semana
inteira e só dirigia palavras ásperas a ela. No entanto, pela cabeça do inseguro
bruxo passavam pensamentos contraditórios. “Mione está tão bonita, parece
triste por eu estar tratando-a assim”, falava para si mesmo. “Não, ela não foi
sincera comigo e me trocou por aquele búlgaro ridículo”, concluía em seguida.
— Ron? – Hermione chamou e, quando o rapaz a olhou para ela, com um
semblante indecifrável, continuou: - Eu tenho certeza que você se sairá bem no
jogo e vou torcer para que faça ótimas defesas.
— Você deve saber que estou jogando muito mal e não preciso de ninguém
mais para me azarar. Por mim, você nem precisa assistir ao jogo – ele mais
uma vez foi rude.
— Está achando que vou torcer contra Grifinória? Eu também sou dessa casa
e jamais torceria contra a nossa equipe... – ela rebateu.
— Acho que você vai perder tempo assistindo ao jogo. Melhor ficar lendo os
seus livros. Ou quem sabe escrever uma carta para Vítor Krum, ele sim um
excelente jogador de quadribol – o lado passional falou mais alto.
Enquanto Ron tratava Hermione com rudeza, o que parecia ser a sua melhor
habilidade na última semana, Harry tentava acalmar o ânimo do rapaz e dizer
algumas palavras de incentivo. “Esquece o Krum! Você é um ótimo goleiro e
tenho certeza de que vai fazer excelentes defesas”, falou para o amigo.
Ao mesmo tempo em que se sentia arrasada com a rudeza de Ron, Hermione
sofria por ver que ele estava tão para baixo, sem confiança em si mesmo e
desacreditado por todo o time. Apenas Harry parecia ainda levar fé no amigo e
incentivá-lo. Ela, por mais que quisesse, nada podia fazer. Qualquer palavra da
menina era mal interpretada pelo ruivo que, decididamente, parecia disposto a
jamais perdoá-la.
Mais tarde, no dormitório, já deitado na cama, Ron sentiu um grande
arrependimento. “Amanhã, depois do jogo, vou procurar Hermione e pedir
desculpas a ela. Vou explicar porque agi assim. Mione vai me achar patético,
mas essa é a única forma de me perdoar”. Quando tomou essa decisão, o ruivo
ficou com o coração em paz e conseguiu adormecer.
CAPÍTULO 7
O ruivo acordou desanimado no dia do jogo e, durante o café da manhã no
salão principal, foi saudado por uma exuberante e alegre Lilá. “Anime-se, Ron!
Eu sei que você será brilhante”, disse a menina, mas o rapaz a ignorou.
Hermione chegou à sala a tempo de ver Lilá cumprimentando o amigo. Porém,
ao perceber que ele se manteve indiferente à lourinha, ficou aliviada. Ela quase
nunca se atrasava para o café, mas havia dormido mal e não conseguiu
levantar cedo.
A causa para a insônia da garota era a preocupação com o ruivo. Ficara
pensando no comportamento estranho de Ron, preocupada com o péssimo
desempenho dele como goleiro no treino e com a possibilidade de fracassar no
jogo, o que o tornaria mais inseguro e mal-humorado.
“Como vocês estão se sentindo?”, Hermione perguntou, com os olhos fixos na
nuca de Ron, ao chegar à mesa na qual ele estava sentado com Harry.
Apenas Harry respondeu, dizendo que estavam bem, mas mal olhou para a
garota. O rapaz concentrava-se em dar a Ron um copo de suco de abóbora.
Imaginando que fosse Felix Felicis, Hermione falou com autoridade: “Não beba
isso, Ron”!
Em seguida, a bruxa olhou para Harry e acusou o amigo de ter colocado algo
na bebida. “Você ainda está com a garrafa em sua mão direita”, afirmou. As
palavras dela, como sempre acontecia ultimamente, soaram como um insulto
para Ron. “Pare de mandar em mim, Hermione”, respondeu o ruivo, bebendo
logo o suco.
Ron acreditou que havia tomado a poção. Afinal, de alguma forma, a sorte
pareceu sorrir para ele. Sentiu-se muito confiante e fez ótimas defesas. A
vitória tão esperada pelo ruivo no quadribol, e que parecia distante, aconteceu.
Ainda incrédulo com o próprio desempenho, Ron estava no vestiário com o
melhor amigo quando Hermione chegou. A menina, muito agitada, dessa vez
foi ainda mais clara, recriminando Harry por ter colocado a poção da sorte no
suco do ruivo. No mesmo momento, Harry tirou do bolso da jaqueta a garrafa
ainda lacrada com o precioso líquido dourado e Mione ficou boquiaberta.
“Eu posso defender gols sem ajuda, Hermione”, disse Ron, olhando com
desprezo para a menina e saindo do vestiário com a vassoura no ombro.
— Vamos para a festa, então? –um pouco sem graça, Harry fez o convite para
a amiga.
— Você vai! – a garota já começava a chorar. - Eu estou cansada de Ron. Não
sei o que é que eu fiz para ele passar a me tratar tão mal assim.
A inteligente bruxa também saiu tempestuosamente do vestiário e pesadas
lágrimas começaram a cair pelo rosto dela. Mesmo se não queria participar da
festa, teria que atravessar a sala comunal para chegar ao dormitório. Pensou
em se refugiar na biblioteca, mas o que faria no meio de tantos livros aos
prantos? Não achou uma boa ideia se esconder no banheiro. Corria o risco de
ser flagrada mais uma vez pela Murta que Geme. Decidiu, então, caminhar um
pouco mais pelos corredores, os mesmos corredores que, como monitora,
percorrera tantas vezes na companhia de Ron. Enquanto andava, tentou
acalmar um pouco o coração e refletir sobre os últimos acontecimentos.
Decepcionado com Hermione, Ron também fazia as suas reflexões. O rapaz
sentia-se um idiota por ter pensado em pedir a amiga em namoro na Festa do
Clube do Sluge. “Eu ia fazer um papel ridículo. Uma menina que conquistou um
famoso jogador de quadribol e que tem uma inteligência tão brilhante jamais se
interessaria por um cara como eu. As atitudes dela como as de agora, quando
duvidou da minha capacidade e só acreditou que eu fiz excelentes defesas
usando a poção da sorte, mostram isso. Tenho que esquecer de vez Mione e
ficar com alguém que goste de mim assim como sou”, concluiu.
Logo o rapaz lembrou-se de Lilá Brown. Desde que encontrou a loura na
Gemialidades Weasley, começou a desconfiar que a lourinha estava
interessada nele. A reação ciumenta de Hermione naquela ocasião foi uma
primeira confirmação. Na última semana, quando passou a tratar mal a amiga
depois de saber que ela tinha beijado Krum, notou ainda mais Lilá que, desde o
primeiro ano, era sua colega de classe.
Lilá tinha cabelos louros sedosos, cacheados nas pontas, um sorriso bonito e
encantadores olhos verdes. Sempre usava brincos, pulseiras e alguma
maquiagem e era considerava uma das mais belas alunas do sexto ano. Sem
falar que era divertida. Apesar da garota possuir tantos atributos, Ron não
havia se interessado por ela até o momento.
Com esses pensamentos, Ron chegou à festa de comemoração pela vitória no
salão comunal da Grifinória. O goleiro foi aplaudido por todos os colegas.
Alguém lhe ofereceu um copo de cerveja amanteigada, que bebeu num fôlego
só. Pouco depois, Lilá se aproximou para cumprimentá-lo. O ruivo imaginou
que receberia no máximo um abraço, mas, para a sua surpresa, a menina
pulou em seu pescoço e o beijou na boca.
Ron, a princípio assustado, logo retribuiu ao beijo. Foi espontâneo para ele
pensar: “Agora vou tirar Hermione da minha vida”.
Depois de dar algumas voltas a mais pelos corredores da escola, retardando
ao máximo a sua chegada à torre da Grifinória, Hermione ultrapassou o quadro
da Mulher Gorda. Sua intenção era subir direto para o dormitório, sem falar
com ninguém, e, de preferência, passando o mais longe possível de Ron. Já
tinha sido maltratada o suficiente por ele nos últimos dias.
No entanto, mal entrou no salão comunal, assistiu a uma cena que fez o seu
coração paralisar. Ron estava abraçado e beijava Lilá Brown. Lágrimas
sentidas correram no mesmo instante pelo rosto de Hermione enquanto uma
dor intensa a consumia por dentro. Precisava fugir dali e, passando mais uma
vez pela Mulher Gorda, buscou refúgio na primeira sala vazia que encontrou.
Pensamentos confusos passavam pela cabeça da garota, que já soluçava. Lilá
nunca tinha duvidado da capacidade do ruivo como goleiro, assistia aos
treinos, o incentivava, havia ocupado o espaço que Hermione não foi capaz de
preencher. Mas a grande verdade era que a loura era mais bonita, mais
simpática e mais atraente que ela. Ron sempre valorizara meninas assim. A
raiva e decepção a levaram a pegar a varinha e, intuitivamente, fazer aquilo em
que era brilhante.
— Avis! – murmurou, com muitas lágrimas escorrendo pelas faces, e um bando
de passarinhos amarelos se materializou e começou a voar sobre sua cabeça.
Inesperadamente, a porta se abriu e Harry entrou. A última coisa que queria
naquele momento era a companhia de alguém. Não desejava ser flagrada com
aquele semblante de dor e o rosto coberto de lágrimas. Sem olhar para o
amigo, o saudou.
— Oh, olá, Harry. Eu estava praticando – falou, sem conseguiu esconder a
amargura da voz.
— Estou vendo... São realmente bons... – a amigo não sabia o que dizer.
Ela imaginou que Harry a havia visto sair da sala comunal e queria conversar
sobre Ron, quem sabe para mais uma vez tentar defender o ruivo. Decidiu
tocar no assunto e assim encerrar logo aquele momento tão constrangedor.
Jamais tinha falado para Harry que era apaixonada por Ronald Weasley, mas
intuía que ele sabia disso.
— Ron parece estar se divertindo na comemoração – comentou com deboche.
Harry, que sempre tentava selar a paz entre os amigos, resolveu se fazer de
desentendido. “Ah... Está?”, foi tudo que ele conseguiu dizer, aumentando a
fúria da garota.
— Não finja que não viu! – o tom de voz de Hermione era agressivo. – Ele não
estava bem se escondendo, estava?
A porta se abriu mais uma vez e, para aumentar a angústia da garota, eram
Ron e Lilá. O ruivo dava aquela risada espontânea da qual Hermione tanto
gostava. Mas logo que os olhos azuis do rapaz encontraram os olhos
castanhos da amiga, ele ficou sério.
Quando encarou Hermione, o ruivo percebeu que a menina estava zangada
com ele. Os olhos vermelhos denunciavam que havia chorado. Será que era
por causa da forma como a vinha tratando? Ou por que o tinha visto com Lilá?
Não, isso não fazia sentido. Mione não gostava dele, pelo menos da forma
como o rapaz queria.
— Opa! – exclamou Lilá, afastando-se dele e saindo da sala que, para a sua
surpresa, estava ocupada. Claro que imaginava que o ruivo a seguiria, mas
Ron resolveu cumprimentar o amigo.
— Oi Harry! Estava me perguntando aonde você teria ido... – Ron estava sem
graça.
A mágoa cresceu dentro do coração de Hermione e transformou-se em raiva.
“Ron está ignorando minha presença aqui”, pensou. A menina sentia uma dor
tão intensa que chegava a ser física. Como o rapaz podia trocar a companhia
dela, uma amizade de seis anos, por uma menina tão superficial? “Superficial e
bonita”, pensou ainda com mais rancor.
— Você não devia deixar Lilá esperando lá fora. Ela vai se perguntar aonde
você terá ido - ela dirigiu-se ao ruivo no seu melhor tom de desdém enquanto
se encaminhava para a porta.
Quando viu que o rapaz não reagia à provocação, a raiva de Hermione
aumentou. Seu coração doía com tamanha intensidade que parecia sangrar.
Em um ato de desespero, com as mãos trêmulas, ela empunhou a varinha em
direção a Ron, que arregalou os olhos azuis.
— Oppugno! – ela gritou, comandando os pássaros que começaram a atacar o
garoto. Parecendo não escutar os gritos de dor do ruivo, Hermione saiu
correndo e esbarrou na porta com Lilá, que voltava para procurar por Ron.
Hermione passou de forma discreta e rápida pela sala comunal, que estava
repleta de alunos, sons de música, risos e conversas animadas. Tudo isso
contrastava ainda mais com a dor que parecia paralisar o seu coração. Subiu
correndo as escadas até o dormitório, que estava vazio, e jogou-se na cama.
A garota fechou as cortinas e usou o feitiço silenciador e o de
imperturbabilidade para poder se isolar de tudo e todos ao seu redor. Agora
finalmente se permitiria chorar com vontade, soluçando de dor e revolta.
Foi uma longa e dolorida crise de choro. Sentada na cama, o seu corpo todo
tremia e lágrimas pesadas desciam até o peito. Não saberia dizer quanto
tempo passou aos prantos, mas, aos poucos, foi se acalmando e começou a
pensar nas razões de tanto sofrimento e rancor.
Como sentia raiva de Ronald Weasley! Tinha esperado que o ruivo a
convidasse para o Baile de Inverno do quarto ano, mas ele só queria saber de
levar como acompanhante as bruxas mais bonitas. Acreditou que o rapaz se
declararia no quinto ano, depois de tantos momentos de confidência e
cumplicidade, mas Ron continuava tratando-a como amiga. Agora, no sexto
ano, ousou convidá-lo para o Baile do Sluge e o bruxo, depois de agir como um
verdadeiro cavalheiro por alguns dias, começou a tratá-la com desprezo, como
se ela tivesse cometido um crime! E para piorar, agora agarrava e beijava uma
menina na frente de todos, no meio da sala comunal.
Ela sabia que sentia tamanha raiva por que era muito grande o seu amor pelo
ruivo. Hermione guardava o seu sentimento pelo amigo em segredo. Não havia
compartilhado isso com ninguém, nem com a sua mãe.
Por alguns instantes, deixou o coração se esvaziar da raiva e naturalmente
recordou, como já fizera tantas vezes, a sua trajetória com Ron. Lembrava que,
quando anunciaram o Baile de Inverno, ela se surpreendeu com a força com
que desejou ser convidada pelo ruivo.
Naquele momento enxergou tudo com clareza: os seus sentimentos
contraditórios pelo rapaz indicavam que não o queria mais apenas como
amigo. Irritada com o fato de Ron não cogitar sequer sua companhia e pensar
em convidar apenas meninas que considerava bonitas, ela resolveu aceitar
Krum como seu par no baile.
Jamais imaginou que Ron teria aquela reação ciumenta ao vê-la com Krum no
baile. Pelo menos assim interpretara a atitude do amigo. Mas agora,
distanciada no tempo e desiludida com o rapaz, começava a achar que ele
reclamara dela estar com o búlgaro pelo motivo alegado na ocasião: o jogador
era rival de Hogwarts no Torneio Tribuxo.
Não conseguia convencer-se inteiramente. Lembrava do jeito intenso com que
Ron havia olhado para ela no baile, parecendo assustado e encantado. Cortou
essa recordação decidida: “Não importa mais. Aquele momento passou e eu
perdi Ron para Lilá”.
Logo uma outra imagem tomou conta de sua mente. Ela e Ron estavam no
quinto ano e andavam pelos corredores da escola cumprindo a função de
monitores. As muitas conversas desses momentos a levaram a conhecer ainda
mais profundamente o rapaz e fizeram com que, a cada dia, se tornasse mais
enamorada pelo ruivo.
Hermione, no entanto, era orgulhosa e reservada demais para expor esse
sentimento, que guardou como o seu mais precioso segredo. A aparente
indiferença do rapaz, o jeito desligado dele e o fato de não conseguir disfarçar
quando achava uma menina atraente a deixavam profundamente irritada.
Apesar de toda a mágoa pela cena que acabara de presenciar, Hermione não
conseguia evitar essas boas lembranças. No início do sexto ano, Ron estava
mais atencioso do que nunca e, depois que o convidou para o Baile do Sluge,
chegou a admitir que tinha ciúmes dela. Ciúmes de amigo?
Há uma semana tudo mudou de repente e Ron começou a tratá-la muito mal e
a evitar a companhia dela. Quando tentou descobrir o porquê, recebeu uma
resposta agressiva do rapaz, sendo acusada de sabe-tudo insuportável e de
esconder muitos segredos. Essa atitude do ruivo doía especialmente pelo fato
de estarem em um momento tão bom. Será que o amigo tinha mudado da noite
para o dia por causa da Lilá? Não valia a pena pensar mais sobre isso, até
porque não conseguira chegar a qualquer conclusão. O fato é que ela e Ron
estavam muito, muito distantes um do outro.
Foi nesse momento que a dura verdade a despertou. “Lilá, com certeza, não
ama Ron como eu amo. Não quer transmitir segurança a ele, ajudá-lo a
acreditar em si mesmo, a se esforçar para alcançar melhores resultados no
estudo e no quadridol”, refletia, voltando a chorar copiosamente.
Mas o seu lado racional lembrou-a que fracassara em sua missão. Ron
continuava inseguro no quadribol e tinha jogado bem apenas por acreditar
haver tomado a poção da sorte. O rapaz ainda não era muito empenhado nos
estudos e não precisava da amizade dela, pelo contrário, a desprezava. E o
pior: continuava interessado apenas em meninas bonitas, superficiais e
divertidas, como Lilá.
O coração de Hermione doía muito, parecia ter sido atingido por
uma Cruciatus. Como se sentia ridícula por prezar tanto a racionalidade e não
conseguir controlar a emoção, atacando o amigo com os pássaros.
Ela estava chorando há mais de uma hora e, no meio da desolação e do
abatimento, tomou uma decisão: “Ron está saindo definitivamente da minha
vida. Não vou derramar mais uma lágrima por quem não mereceu minha
amizade e muito menos o meu amor”.
Algumas lágrimas ainda teimaram em sair dos olhos da garota, mas o cansaço
a venceu e, em poucos minutos, adormeceu decidida. Já enfrentara desafios
maiores, agora dedicaria todo o seu empenho e inteligência para esquecer
Ronald Weasley.
Enquanto a bruxa chorava e lutava com seus sentimentos escondida no
dormitório, Ron tentava se divertir na festa e, de modo especial, esquecer da
existência da amiga. Se Hermione não acreditava nele, não a queria mais em
sua vida.
Não era fácil, porém, apagar a presença da amiga. Até as feridas nos braços e
mãos causadas pelos pássaros conjurados por Hermione o faziam lembrar,
mesmo se com raiva, dela.
Ron esforçava-se para concentrar toda a atenção em Lilá Brown. O rapaz
desejava sinceramente gostar da lourinha que era sempre tão simpática e
atenciosa com ele.
Foi dormir feliz com a dupla conquista: no quadribol e na vida amorosa. Porém,
ao fechar os olhos, não foi o rosto de Lilá e sim o de Hermione que invadiu os
pensamentos dele. “Mione não existe mais para mim”, repetiu para si mesmo
várias vezes antes de pegar no sono.
Nas semanas seguintes à festa pela vitória da Grifinória, Ron e Hermione se
distanciaram ainda mais. Parecia que nunca haviam sido amigos. Evitavam se
olhar, desviavam um do caminho do outro, sentavam distantes nas aulas, no
refeitório, na sala comunal. Não era muito fácil manter esse comportamento, já
que dividiam a mesma casa e o mesmo amigo. Harry sofria em ver toda aquela
situação, mas sabia que os dois eram cabeças-duras e não tinha muito o que
fazer.
Quando Ron reclamou com Gina da atitude de Hermione, dizendo que ela
perdera qualquer razão, caso tivesse alguma, ao atacá-lo com os pássaros,
ouviu algo inesperado da irmã. A ruiva lembrou que a garota, apesar de ter um
ótimo coração, era possessiva e temperamental.
— Ela não gostou de ver você agarrado com Lilá. Também eu não entendo
porque você foi se envolver com aquela menina – a irmã questionou-o.
Mas Ron só começou a se dar conta de que também havia cometido erros
quando Gina afirmou: “Você e Hermione estavam tão bem, iriam juntos à Festa
do Sluge, pareciam até um casal de namorados. Depois, sem qualquer
explicação, você começou a tratá-la mal e ainda ficou com outra garota.
— Mione e eu não temos compromisso algum. Portanto, é um problema meu
quem eu namoro ou deixo de namorar – o rapaz não escondeu a irritação que
sentia.
Gina lembrou Ron que ele também tinha agido de forma possessiva quando
soube do envolvimento de Hermione com Krum. Ainda mais emburrado, o
rapaz tratou de encerrar logo a conversa com a irmã.
Hermione também precisou se confrontar com a própria atitude ao ser
abordada, inesperadamente, por Luna.
— O que fez com Ron? Ele está com as mãos e braços todo machucados. Não
acredito que você mandou os pássaros que conjurou atacá-los... Isso vai contra
o Código da Magia que diz... – a aluna de Corvinal arregalou ainda mais os
olhos.
— Luna, por favor, eu dispenso a citação do código. Sei perfeitamente bem que
só podemos atacar inimigos – Hermione estava impaciente.
— Você considera Ron seu inimigo? – perguntou a menina que não tinha medo
de dizer tudo o que pensava.
— Digamos que sim... – a bruxa de cabelos volumosos queria encerrar aquela
conversa.
— E ele se transformou em inimigo simplesmente porque está namorando a
Lilá? – a amiga fez a pergunta mais difícil e ficou sem resposta.
Enquanto se distanciava de Luna, a garota voltou a lutar com os próprios
pensamentos. “Simplesmente porque está namorando a Lilá? Como ela diz
isso. Não é simplesmente, é algo muito grave.
Apesar de ter se arrependido por machucar Ron com os pássaros, Hermione
era orgulhosa demais para admitir o próprio erro e pedir desculpas. Continuava
muito chateada com o rapaz e disposta a manter o gelo até o fim. Também
nisso eram mais parecidos do que imaginavam. Os dois queriam cortar
relações e ignoravam a verdade: o sentimento de raiva escondia o grande
amor que tinham um pelo outro.
CAPÍTULO 8
Como havia prometido a si mesma, Hermione tentava manter-se indiferente a
Ron. Mas isso se tornava ainda mais difícil quando o rapaz estava agarrado a
Lilá. A menina só não imaginava que seriam especialmente as mais singelas
manifestações de carinho que a deixariam abatida. Ficou arrasada quando viu
o rapaz, de forma delicada, mexer nos cabelos da loura, sem falar no dia que o
observou beijar afetuosamente uma das mãos da namorada e depois abrir um
lindo sorriso. Como queria estar no lugar de Lilá, pensou, mas logo cortou esse
devaneio com decisão.
Precisava manifestar de alguma forma o seu desprezo por Ron. Quando o
rapaz errou grosseiramente um feitiço na sala de aula, ficando com um
engraçado bigode, Hermione deu sua gargalhada mais escandalosa e
debochou: “Que patético. Precisa treinar mais”. Teve vontade de completar
dizendo que ele deveria estudar “ao invés de ficar o tempo todo namorando”,
mas guardou esse pensamento para si mesma. O ruivo, que não levava
desaforo para casa, logo respondeu à altura.
“Claro! Eu deveria participar mais das aulas”, ele disse olhando Hermione com
frieza. Em seguida, afinando a voz, começou a levantar e sentar na carteira,
sempre com a mão erguida, imitando a menina: “Eu sei! Posso responder? Li
no livro, no segundo parágrafo da página 25, e já decorei tudo. Eu sei tudo,
tenho todas as respostas”.
Hermione ficou com os olhos marejados e segurou as lágrimas. Então era isso
que Ron pensava dela? O rapaz havia falado recentemente que a considerava
uma sabe-tudo insuportável. Só que agora ele a humilhava em frente a toda
turma e, o pior, Lilá e Parvati acharam isso muito divertido.
Ela teve vontade de sair correndo da sala, mas esperou o sinal tocar e
praticamente desaparatou. As lágrimas começaram a rolar dos seus olhos.
Estava tão magoada que nem percebeu que deixara todo o seu material para
trás. Chegou veloz ao banheiro e desabou a chorar, soluçando baixinho.
Logo alguns pensamentos invadiram mais uma vez a sua mente. Ron não
podia ter agido daquela forma, não podia ter a humilhado assim. Ele que
sempre a defendera, agora a estava atacando. A garota se lamentava por ser
tão racional assim. Por que não parava de pensar e refletir sobre os
acontecimentos?
Suspirando, Hermione não conseguia deixar de lembrar como se sentia segura
quando tinha a amizade do ruivo. E com um gosto amargo na boca recordou-se
de todas as vezes que Ron a defendera dos ataques de Malfoy e Snape, dos
muitos momentos nos quais a tratou de forma carinhosa.
Foi quando se deu conta que o seu plano de manter-se indiferente ao rapaz
havia fracassado até então. Com um lampejo, ela lembrou que Ron havia tido
fortes reações ciumentas quando ela foi ao baile com Krum e passou a se
corresponder com o jogador búlgaro. Concluiu que deveria tentar atingi-lo
nesse ponto. “Mas agora, que está com Lilá, será que ainda vai sentir ciúme de
mim”, perguntou a si mesma.
A dois dias da Festa do Clube do Sluge, Hermione decidiu: participaria da
comemoração e acompanhada por um rapaz, de preferência, que pudesse
deixar Ron enciumado. Logo lembrou que o próprio ruivo havia sugerido que
fosse a festa com McLaggen e da rivalidade que existia entre os dois desde o
teste para goleiro. “Com certeza ele vai ficar irado em me ver com Córmaco”, a
bruxa concluiu deixando-se levar pelo sentimento de rancor.
Bastou dar uma indireta, dizendo que ainda não tinha companhia, para
McLaggen convidá-la. À noite na sala comunal, num momento em que Ron e
Lilá estavam por perto, a morena aproveitou para falar do “namoro” com o
rapaz. Pela reação do ruivo, que interrompeu um beijo, Hermione percebeu que
seu plano surtira efeito. Sorriu interiormente. “Agora ele vai se morder de
ciúmes”, pensou.
Quando subiu para o dormitório, porém, Hermione foi tomada de grande
tristeza. Definitivamente, não queria ir ao baile com McLaggen.
“Talvez Ron fique apenas mais magoado comigo e conclua outra vez que só
dou importância às pessoas que têm um talento especial. Mas eu não devia
ligar para o que ele pensa. Ron escolheu Lilá e ainda passou a me tratar muito
mal. Tudo isso depois de eu ter tomado a iniciativa de convidá-lo para a festa”.
A garota concluiu, mais uma vez, que Ron não merecia o seu amor e nem
mesmo que perdesse tempo pensando nele. Enxugou algumas lágrimas
teimosas e começou a se concentrar na difícil missão de conseguir pegar no
sono.
Ron, que até o momento se mantinha indiferente à menina com relativo
sucesso, ficou confuso depois de ouvir Hermione falar que estava namorando
Mclaggen e iriam juntos ao baile. “Poderia ser eu e Mione, mas ela preferiu que
fosse assim. O problema é dela. Eu estou bem com a Lilá”, tentou convencer a
si mesmo.
A roupa tinha sido comprada no início do ano por Hermione para uma festa,
baile ou outra ocasião especial na qual pudesse ir com Ron. Olhou para o
vestido verde, simples e elegante, com certo desânimo. Foi um esforço se
produzir, pentear os cabelos, colocar maquiagem, cordão e brincos para ter a
companhia de McLaggen. Não gostava do jeito dele, rude, vaidoso, prepotente.
Melhor seria ir sozinha, mas queria mostrar para o amigo que, apesar dele não
a achar bonita, havia outros rapazes que se interessavam por ela.
Não imaginou que se sentira assim. Mas Ron estava impaciente no dormitório,
vendo Harry se arrumar para a festa. Havia marcado com Lilá no salão
comunal às vinte e trinta. Tinha ouvido Hermione combinar com MacLaggen
meia hora antes e assim não corria o risco de se encontrar com ela. No
entanto, experimentava uma grande angústia, parecia que lhe faltava ar e já
não conseguia mais ficar ali, fechado. Resolveu sair.
Enquanto Ron descia as escadas, Hermione apareceu na porta do dormitório
das meninas. “Ela está linda, ainda mais linda do que no Baile de Inverno”,
pensou o rapaz hipnotizado diante da beleza da menina.
Os dois se encararam e, diante do encontro inesperado, Hermione não teve
tempo de fazer a sua habitual expressão de zangada. Pelo contrário. Permitiu-
se contemplar os olhos azuis que tanta amava. “Por que, Ron, você fez isso
comigo? Por que se afastou tanto de mim?”, perguntou ao ruivo em
pensamento e, apressando o passo, deu às costas ao rapaz antes que ele
terminasse de descer as escadas.
McLaggen conseguiu ser pior companhia do que Hermione imaginava. Com
sua inteligência rápida, ela não teve dificuldade para se desvencilhar do rapaz.
Jamais beijaria aquele idiota e não estava disposta nem mesmo a dançar uma
única música com ele! Quando percebeu que seria complicado fugir de
Córmaco a noite toda, resolveu sair da festa.
Estava tão compenetrada em sua fuga que não pensou sequer na possibilidade
de encontrar com Ron na sala comunal. Mas o ruivo estava lá, abraçado com
Lilá. A garota passou veloz como um relâmpago, mas ainda assim os olhos
dela e do rapaz se cruzaram por poucos segundos com um misto de tristeza e
espanto.
Hermione não queria mais chorar por Ron, mas naquela noite foi inevitável. A
festa fora péssima. Poderia ter sido tão boa se ela e o ruivo estivessem
juntos... Ficou chateada consigo mesma ao pensar naquela possibilidade. O
rapaz estava lá, agarrado com Lilá, e não merecia mais nenhuma lágrima dela.
Em dois dias viajariam para passar o Natal fora e Mione poderia se esquecer
de tudo isso.
O ruivo também não pegou logo no sono. Lembrava o tempo todo de
Hermione, que parecia ter voltado tão triste do baile. Mesmo se a troca de
olhares entre eles foi rápida, conhecia-a muito bem para perceber isso. Achou
que seria muito bom ficar uma semana distante, durante o recesso de Natal.
Pelo menos não teria que suportar o constante mau-humor da amiga e nem o
jeito grudento de Lilá.
Por que tudo n’ A Toca o fazia lembrar a amiga? Ron não deixava de se
questionar sobre isso. Quando estavam em Hogwarts, a presença dela não era
tão forte como agora. É verdade que, ultimamente, a menina tinha uma
expressão raivosa sempre que encontrava com ele. Mas logo recordou que
Hermione não estava com um semblante zangado no momento em que seus
olhares se cruzaram no dia da festa... Será que a garota o perdoaria? Por
Merlin! Mione o havia magoado ao beijar Krum e ainda esconder esse fato! Por
que pensava em ser perdoado por ela?
Ron não esperava receber uma lembrança de Natal de Hermione. Também ele
não comprara nada para a amiga. Havia presenteado a sua namorada, claro,
com uma bonita tiara. Pavarti dera a dica, já que Gina se recusava a ajudá-lo.
Mas quando abriu o pacote enviado por Lilá, não conseguiu deixar de pensar
que Mione, com certeza, acertaria mais na escolha.
Fez Harry prometer que não contaria para os gêmeos que Lilá o havia
presenteado com aquele ridículo cordão. Já bastavam as brincadeiras que os
dois estavam tirando com ele desde que souberam que o irmão tinha uma
namorada.
Naquela tarde, Ron tentava se concentrar no livro de Herbologia. Estava com
muitos deveres atrasados agora que não contava com a ajuda de Hermione.
De repente, ouviu um estampido e os gêmeos se materializaram em sua frente.
Sabia que iriam provocá-lo e continuou lendo, ignorando a presença deles.
— Você acredita que Roniquinho preferiu a loura à morena? – perguntou Jorge.
— A loura tomou a iniciativa enquanto a morena está esperando a iniciativa
dele há seis anos – respondeu Fred.
— E pelo visto, se não voltar para o búlgaro, vai ter que esperar no mínimo
mais outros seis – disse Jorge dando um risinho abafado.
— Não sei se ele fez uma boa troca. Hermione pode até não ser muito bonita,
mas é mais inteligente – enfatizou Fred.
— E como nosso irmãozinho não tem uma capacidade intelectual
desenvolvida, precisa ter alguém assim por perto – completou Jorge.
O caçula dos meninos, que até aquele momento tentou manter-se indiferente,
estava com as orelhas vermelhas e não suportou mais ficar calado.
— Parem com isso! Em primeiro lugar, Hermione é uma menina bonita. Em
segundo, minha capacidade intelectual é muito maior do que a de vocês! – ele
desabafou irritado.
— Ah, nossa provocação surtiu efeito! – comemorou Fred.
— Finalmente admitiu que acha Mionizinha bonita! – Jorge soltou uma
gargalhada, sendo acompanhado pelo gêmeo.
Ron sacou a varinha do cós da calça e, antes que pudesse proferir um feitiço,
os irmãos desaparataram dando risadas.
Ele achava que apenas os gêmeos cogitavam que tivesse algum envolvimento
com Hermione. Como ninguém levava os dois a sério, não se preocupava
muito com isso. Não imaginava que ele e a menina já tinham se tornado
assunto de família e, portanto, a conversa que teve com o pai no dia seguinte
ao Natal foi uma surpresa.
— Ronald Billius, quero dar uma palavra com você – Arthur se dirigiu ao final
no final da manhã.
Já sabia que, quando o seu pai o chamava assim, era bronca ou um assunto
muito sério. Como não tinha aprontado, acreditou que Arthur queria conversar
sobre Voldemort, os Comensais da Morte e a Ordem da Fênix.
Acompanhou o pai até a garagem na qual ele guardava artefatos trouxas.
Arthur não fez rodeios e começou dizendo que já tomara conhecimento do
namoro dele com Lilá. “Sempre que seus irmãos começaram um
relacionamento sério, fiz questão de conversar com eles”, ele falou com
solenidade.
— Para nós, bruxos, isso é algo muito importante. Como você sabe, o amor é
uma força poderosa, capaz de interferir nas mais altas magias – explicou o
patriarca dos Weasley.
O jovem bruxo olhava o pai em silêncio, tentando imaginar onde ele queria
chegar com aquela conversa. Arthur foi mais objetivo do que ele poderia supor.
— Você realmente gosta dessa menina? Nunca tinha falado dela conosco... Eu
e sua mãe achávamos que você gostava de Hermione Granger – o pai
questionou-o.
Será que poderia gostar de alguém que conhecia ainda de forma tão
superficial? Enquanto entendia o que Hermione queria dizer apenas com um
olhar, Lilá nada lhe dizia. Ron, na verdade, achava a lourinha pegajosa demais.
Esforçava-se para ter conversas interessantes com a menina, queria
sinceramente se apaixonar por ela. Ignorava que não era possível mandar nos
próprios sentimentos.
Mas espera aí? O pai acabara de dizer que ele e Molly achavam que Ron
gostava de Hermione. “Mantenha a situação sob controle”, o rapaz falava para
si mesmo, respirando fundo antes de responder:
— Eu gosto da Lilá. Mas não sei se o sentimento por ela vai se tornar algo tão
forte a ponto de me levar a pensar em casamento, como o Gui. Ainda estamos
nos conhecendo melhor.
Arthur ouviu com atenção o filho, mas voltou a perguntar sobre Hermione.
“Você não sente nada especial por ela?”, indagou. Ron acabou revelando que
a amizade dele com a garota havia estremecido e já não estavam mais nem se
falando. “Nós sempre brigamos, mas dessa vez Mione exagerou e me atacou
com um bando de pássaros”, contou.
O pai surpreendeu-o mais uma vez. Perguntou se Ron não havia cogitado que
aquele ataque havia sido motivado por ciúmes de Hermione do namoro dele
com Lilá. Sim, o ruivo já se perguntara algumas vezes se podia ser isso, mas
sempre chegava à conclusão que a amiga não gostava dele.
— Fique atento, meu filho, para não perder o amor da sua vida. Muitas vezes
ele está ao nosso lado, mas fechamos os olhos e não conseguimos enxergar.
Quando finalmente despertamos, já é tarde demais – a voz de Arthur era
tranquila.
Enquanto o pai tinha essa conversa com Ron, na sala de estar os demais
Weasley falavam sobre o irmão.
— Quero ver qual vai ser a reação do Ron. Acho que não tinha ideia que
namoro para o sr. e srª Weasley era algo tão sério – disse Gui.
— Eu lembro quando papai teve uma conversa assim comigo. Foi decisivo para
eu resolver fazer do trabalho com os dragões o meu ideal de vida – afirmou
Carlinhos.
— Papai vai dar é uma chamada em Ron – garantiu Fred.
— Ele e mamãe não entendem como, gostando de uma menina, nosso caro
irmãozinho pode namorar outra – argumentou Jorge.
— Ron gosta de outra menina?! Vocês estão falando de Hermione? –
perguntou Harry, que até então não participara da conversa.
— Estamos falando de uma menina com pouco mais de um metro e meio,
muito inteligente, mas com um gênio péssimo, como Roniquinho – respondeu
Fred.
— Ele nunca me falou que gostava de Mione... – contrapôs Harry.
— Mas nem Ron sabe disso. Nega a verdade para si mesmo e ainda tem
certeza que Mionizinha não está nem aí para ele – enfatizou Jorge.
— Ron não entendeu que o ataque dos pássaros foi uma grande cena de
ciúmes – disse Gina, entrando na discussão.
Nesse instante Molly chega à sala e, ao perceber que os irmãos falavam de
Ron, trata de encerrar logo a conversa.
— Vamos dispersando vocês todos. Ron já vai voltar e não quero que o
aborreçam. Gina, Fred e Jorge, venham me ajudar na cozinha. Carlinhos e Gui,
deem uma limpeza nos jardins. Harry, querido, você pode ajudar os dois? –
ordenou a mulher, que sabia conduzir tudo e todos na Toca.
O sexto filho dos Weasley entrou na sala ainda pensando na conversa que
acabara de ter. Sentiu vontade de fazer tantas perguntas ao pai, mas ficou
bloqueado. Será que Arthur e Molly achavam que Hermione gostava dele?
Fred e Jorge sempre insinuavam isso, mas sempre por intermédio de
brincadeiras que ele não podia levar a sério.
Não podia mentir para si mesmo. Ele estava sentindo grande saudade da
amiga. Lembrava dela o tempo todo, dos natais e outros momentos nos quais
estiveram juntos n’A Toca. Como era bom conversar com a menina, dar risadas
juntos, fazer dupla com ela no quadribol. Hermione sempre se desesperava por
não conseguir ir bem no jogo e nessa hora os papéis se invertiam e era Ron
que dava dicas para a morena.
Tinha que reconhecer: os momentos passados junto com a amiga nunca eram
monótonos. Ela sempre tinha uma conversa interessante e, apesar de parecer
tão séria e responsável, sabia rir de suas piadas e quebrar regras quando
necessário. Como Hermione fazia falta em sua vida! Por que precisavam ter se
distanciado tanto, pensava com tristeza.
Sabia que a amiga estava muito magoada com ele. Reconhecia agora que
tinha sido muito rude com ela e, para piorar, a ridicularizou na frente de toda a
turma. Agiu assim em resposta ao deboche da menina, mas admitia que havia
exagerado. Percebeu quando os olhos de Hermione encheram de lágrima e
viu-a sair correndo da sala, esquecendo todo o material. Sentiu vontade de sair
disparado atrás dela e pedir desculpas. Mas agora tinha Lilá e não podia agir
assim.
Hermione nunca havia sentido tanta solidão e tristeza. Mesmo se lutava com
todas as forças para não se lembrar de Ron, sempre o seu pensamento se
voltava para ele. Recordava os dias felizes vividos com o ruivo e, de modo
especial, os natais que passaram juntos.
Gostava tanto de estar n’A Toca... Era uma casa muito simples e sinistra até.
Parecia que havia crescido à medida que a família aumentava, desafiando a
engenharia trouxa. Com certeza, só se mantinha de pé devido à magia. Ao
mesmo tempo era tão aconchegante!
Da cozinha vinha um aroma delicioso de guloseimas preparadas com carinho
por Molly. As salas de jantar e de estar eram sempre animadas por conversas
e risadas. Todos os ambientes tinham calor, luz e cor, assim como os Weasley.
Amava muito aquela família, cada um dos seus membros. Até mesmo Percy,
com seu nariz empinado. Sabia que no fundo ele tinha bom coração. Afinal, era
um Weasley e isso significava muita coisa. A menina tinha consciência dessa
realidade mais do que o próprio Ron.
Jamais conhecera, seja entre os trouxas e os bruxos, uma família mais
especial. Vivia sempre momentos felizes quando se encontrava n’A Toca. Mas
claro que era Ronald Billius o principal motivo para querer sempre estar ali.
Naquela casa torta compreendia, mais do que em qualquer outro lugar, quem
era Ron.
Observava o rapaz conversando de forma tão compenetrada com o pai,
recebendo os afagos e broncas da mãe, sendo caçoado pelos irmãos e como
conquistava seu espaço entre eles. Mesmo se dizia o contrário, Ron era muito
querido por todos.
Não era uma pessoa guiada pela cabeça, como Hermione. Tudo para o ruivo
passava primeiro pelo coração. Por isso as palavras saiam por vezes
impensadas de sua boca, mas por isso também pedia perdão e esquecia
mágoas com facilidade. Mas, acima de tudo, seguir o coração o levava a ter
coragem de fazer qualquer sacrifício pelos amigos e por todas as grandes
causas nas quais acreditava.
Era filha única e seus pais, os bem-sucedidos dentistas Albert e Jean Granger,
muito organizados, dedicados ao estudo e ao trabalho, ensinaram à menina
desde cedo que o conhecimento é um dos patrimônios mais importantes. O pai,
reservado e apaixonado por livros, e a mãe, comunicativa, prática e decidida,
estimularam a filha a ser independente e racional. A garota pensara ter
aprendido a lição, mas Ron a tirava do sério e a fazia mostrar seu lado
explosivo e passional.
A casa da menina, perto d’A Toca, parecia sempre fria. De modo particular este
ano, quando passava o Natal apenas com o sr e srª Granger. A família era
pequena: além dos pais, tinha apenas a avó materna e uma tia que morava na
França com o marido e duas filhas, uma da mesma idade de Hermione, outra
dois anos mais velha. Mas dessa vez todos decidiram ficar em Paris, para onde
seguiu também a avó, e o os pais de Hermione, por questões de trabalho,
permaneceram em Londres.
Por mais que Albert e Jean procurassem agradar a menina, fazendo suas
receitas preferidas e enchendo-a de presentes e mimos, ela experimentava um
grande vazio. Sentia falta do calor que emanava d’A Toca e, especialmente, de
Ron. Sorria ao pensar que assim como ela tinha essa ligação com a terra, com
tudo que era concreto, o menino se identificava com o fogo e até o seu cabelo
vermelho mostrava isso.
Hermione se esforçou ao máximo para que os seus pais não percebessem que
estava triste. Mas foi Albert, normalmente desligado, que primeiro perguntou o
que estava acontecendo com a filha.
— Estou achando você tão desanimada... Não quer passar o dia amanhã na
casa dos Weasley? Eu e sua mãe levamos você lá – ele sugeriu.
— Não, pai, obrigada. Quero ficar com vocês – Hermione respondeu, tentando
disfarçar o quanto ficara surpresa com essa proposta.
— Aquele rapaz... Ronald, não é mesmo? Ele deve telefonar ou mandar uma
mensagem pela coruja para você. Sempre faz isso. Com certeza vai convidá-la
para passar uns dias lá. Se você quiser... – Albert continuou.
— Pai, eu já falei. Não quero sair daqui! – a voz da garota saiu num tom mais
alto que o normal. – Agora me dá licença, por favor, que estou com um pouco
de dor de cabeça e vou para o meu quarto.
O dentista achava a filha muito madura e responsável. Por isso dificilmente se
preocupava com as decisões da menina, já que acreditava que ela sempre
fazia a escolha certa. Pela primeira vez, no entanto, sentia que Hermione era
mais frágil do que imaginava e precisava de seu apoio. Com respeitava demais
a privacidade da filha, não quis bater na porta do quarto dela. Mas pediu a
esposa Jean para ir falar com Mione.
Quando a garota abriu a porta do quarto, seus olhos ainda estavam vermelhos.
A mãe pediu licença para entrar, dizendo que precisava falar com ela.
Perguntou o que estava acontecendo com Hermione, por que andava tão triste
e se recusara visitar A Toca, lugar do qual tanto gostava.
Hermione tentou esconder tudo que se passava com ela. Primeiro porque era
reservada por natureza e não gostava de falar, nem com os próprios pais, dos
seus sentimentos. Depois porque não queria preocupá-los.
Percebeu logo, porém, que dessa vez seria impossível não falar para mãe o
que estava acontecendo. Antes que pudesse pensar na melhor forma de dizer
que havia rompido a amizade com Ron, a mãe tomou a iniciativa.
—Filha, a sua mãe conhece você melhor do que imagina. Desde que chegou
aqui notei que estava triste. Até o seu pai, que é mais desligado, percebeu o
seu abatimento. Você precisa confiar em nós. Não existe quem queira mais o
seu bem do que nós dois – com a voz suave, Jean Granger a incentiva a falar.
Aquelas palavras tocaram fundo o coração da menina, que se sentia tão
solitária. Ela, que tentava se manter forte até aquele momento, desmoronou e
lágrimas sentidas começaram a rolar por sua face. A mãe abraçou a filha em
silêncio e ficaram assim por alguns minutos.
No momento que se desprenderam do abraço, a menina sentou em sua cama
e Jean ocupou a cadeira da escrivaninha. Hermione não sabia por onde
começar nem o que dizer. Apenas uma vez havia insinuado algum interesse
por Ron. Foi no recesso depois do Baile de Inverno, quando perguntou a mãe
se era comum amigos terem ciúmes um do outro. A mãe quis saber o porquê
do questionamento e jovem acabou revelando que Ron tinha ficado muito
enciumado por ela ter ido ao baile com o jogador búlgaro.
Ainda recordava das palavras que a mãe lhe dirigiu na ocasião: “Amigos
podem ter ciúme, sim. Mas pode ser, também, que Ron não veja você apenas
como amiga. Talvez queira um relacionamento ainda mais próximo”.
Pensava no que dizer dessa vez quando a srª Granger tomou mais uma vez a
iniciativa. “Filha, você e Ronald brigaram? É por isso que está triste?”,
perguntou de forma carinhosa. Como a mãe podia saber exatamente o que
estava se passando? Será que também era uma bruxa e tinha uma bola de
cristal?
A garota abaixou os olhos e permaneceu em silêncio. Deveria contar para a
mãe que gostava de Ron, mas que ele namorava outra pessoa? Parecia tão
exagerada a sua reação diante do fato em si que não tinha coragem de falar.
Acreditava que os seus pais esperavam que sempre tivesse autocontrole,
firmeza e agisse de forma racional e inteligente. Como podia dizer que estava
se deixando guiar pelos sentimentos, que atacara o rapaz com um feitiço, sem
medir as consequências desse ato, por pura mágoa e ciúme?
— Minha filha, você cresceu, tornou-se uma adolescente, e jamais tivemos
uma conversa sobre como nossas emoções e sentimentos mudam nesse
período. O coração começa a falar mais alto e nos surpreendemos com a força
com que ele conduz a nossa vida. Você não precisa se envergonhar dos seus
sentimentos... – Jean incentivou a garota a se abrir.
— Mãe...eu... - Hermione respirou fundo e enxugou uma lágrima que teimava
em cair – eu e Ron não somos mais amigos.
Agora que ela começara a se abrir, a srª Granger, que era persistente como a
filha, não deixaria que a confidência ficasse pela metade. Lembrou que os dois
já tinham se desentendido várias outras vezes – isso Hermione havia contado
para a mãe – e sempre voltavam a se falar.
Hermione explicou que dessa vez não acreditava que voltariam a se falar.
“Magoamos demais um ao outro”, ela resumiu. A mãe disse que o
arrependimento sincero cura muitas feridas. Faltava, no entanto, a confidência
mais importante.
— Filha, você precisa confiar em mim e se abrir. O seu sentimento por Ron é
mais forte do que uma simples amizade, não é? – a mãe fez a pergunta mais
difícil.
O jeito era se render. Jean Granger já sabia de tudo. Para que negar? “Eu
gosto muito de Ron, muito mais do consigo expressar. Mas quero e vou
esquecer dele. Ron me tratou muito mal e agora ainda está com uma
namorada”.
Todos os argumentos em defesa do relacionamento dos dois foram usados
pela mãe: Hermione devia perdoar o rapaz, dar uma oportunidade dele se
justificar e retomar a amizade. Nenhum deles demoveu Hermione de sua
decisão. Ela estava muito magoada e convencida de que devia tratar Ron com
o máximo de desprezo. E foi com esse sentimento que ela voltou a Hogwarts
para o reinício das aulas.
CAPÍTULO 9
Quando partiu d’A Toca, Ron estava decidido a fazer as pazes com Hermione.
Tentou conversar com a menina ao reencontrá-la na porta da Grifinória, logo
assim que chegou à Hogwarts de volta do recesso de Natal. Mas ela o ignorou
completamente, falando apenas com Harry. A garota fazia de conta que ele
não existia? O rapaz também a trataria com indiferença.
Ron não conseguiu manter-se firme na sua resolução por muito tempo.
Lembrava-se de tudo que havia sentido nos dias de recesso n’A Toca.
Impossível esquecer uma amizade tão longa e especial assim. Hermione era
cabeça-dura, como ele. Mas o bruxo havia decidido mudar, ser menos
ciumento e inseguro. Não era fácil, porém, precisava tentar.
As aulas de Defesa contra as Artes das Trevas e de Herbologia não eram
frequentadas por Lilá, que preferiu fazer Adivinhação e História Avançada da
Magia. Ron não podia sequer virar o rosto para o lado da sala onde Hermione
sentava nas aulas em que estava com a namorada. A loura, muito ciumenta,
logo reclamava.
Nessas duas disciplinas, no entanto, podia tentar uma reaproximação da
amiga. Mione, porém, sequer o olhava, a não ser com aquele ar de desprezo e,
quando o ruivo fazia um comentário qualquer, fingia não ouvi-lo.
“Tudo bem, vou fazer mais uma tentativa. Não é possível que ela consiga
guardar toda essa mágoa para o resto da vida”, pensou ao decidir conversar
com Hermione no final da aula de Herbologia.
— Mione? Posso falar com você? – ele falou com certa hesitação.
— Já está falando, não é? – a garota foi ríspida.
— Eu estou com uma dúvida no trabalho de Herbologia e queria saber se
você... – Ron achou melhor não fazer rodeios.
— Não! A resposta é não! Consulta a biblioteca, a professora Sprout, o Neville,
que é bom nessa matéria. Não conte comigo – a garota tinha as faces
vermelhas e sequer esperou ele concluir a frase.
— Tudo bem. Obrigado de qualquer forma – o rapaz sabia que, quando ela
estava irritada, não adiantava insistir.
O bruxo concluiu que seria inútil tentar uma reaproximação. “Eu não devia
perder tempo tentando falar com ela. Não faço falta na vida de Hermione”,
concluiu, sem querer admitir o quanto sentia falta da amiga.
Mesmo se não deixava transparecer isso, a menina sentiu-se mal por ter
tratado Ron daquela forma. Mas ele tinha feito a própria escolha ao preferir a
companhia da Lilá a dela. Mal imaginava que o seu comportamento fazia com
que o rapaz se agarrasse ainda mais a loura.
Ele pensara várias vezes em terminar com Lilá. Achava a garota muito
possessiva e pegajosa. Mas, sem a amizade de Hermione, pelo menos tinha a
namorada para preencher sua vida e acabava mantendo o relacionamento.
Duas semanas da tentativa frustrada de uma reaproximação com Hermione, o
rapaz deu um novo passo. Abordou a menina na saída do refeitório, depois do
almoço. Falou do momento difícil que Harry atravessava e sugeriu que os dois
pudessem se encontrar com o amigo para que ele sentir-se mais apoiado.
— Tenho conversado bastante com Harry e o apoio sempre. Você é que está
distante porque parece ter outras prioridades. Melhor continuar do jeito que
está – ela respondeu com o seu tom de voz mais mal-humorado.
— Fiz minha parte. A decisão é sua – Ron argumentou, virando as costas.
Hermione se esforçava para manter-se indiferente ao ruivo. Ele ficava distante
porque percebia que a garota não o queria por perto e tentava se distrair na
companhia de Lilá. No entanto, a presença da namorada não substituía a
grande ausência de Mione. Por isso, no final de fevereiro, decidiu tentar
novamente selar a paz com a amiga.
Ele se apressou para alcançar Hermione ao final da aula de Defesa contra as
Artes das Trevas e a chamou pelo nome. A garota, que há quase três meses
se afastara de Ron, manteve a expressão zangada no rosto.
— Pelo bem de Harry, acho que devemos voltar a nos falar. Não precisamos
ser amigos, mas, pelo menos, podemos deixar de nos tratar como inimigos –
ele parecia aflito.
— Não quero mais falar com você, Ron. Faça de conta que eu não existo! – a
voz saiu mais estridente que o normal.
— Daqui a dois dias é meu aniversário... – o ruivo apelou.
— Ótimo! Comemore bastante com a Lilá e me deixe em paz. Você não
significa nada para mim – Hermione não conseguiu evitar uma grande dor no
coração. Essa era a pior mentira que podia falar.
O rapaz se irritou com a postura arrogante e fechada ao diálogo e respondeu à
altura.
— Não sei como você pode guardar tanto ódio e por tanto tempo! Isso vai
acabar lhe envenenando! – falou, saindo apressado.
Hermione dormiu mal mais uma noite. Isso já fazia parte de sua rotina. Ao
longo do dia se distraía com as aulas, leituras e consultas aos livros na
biblioteca, trabalhos e conversas com Harry, Gina e alguns outros colegas. Mas
quando deitava em sua cama sentia-se terrivelmente sozinha e quase sempre
não conseguia evitar algumas lágrimas.
Por mais que tentasse, não esquecia Ron. Como era difícil ficar sem a amizade
dele. Fazia tudo para mostrar a sua indiferença e dizer que não significava
nada para ela e podia passar muito bem, obrigada, sem o rapaz. Mas ao longo
do dia, em muitos momentos, olhava para ele distraidamente – sempre sem
que o ruivo percebesse – e se dava conta de quanto o amava. Esses
momentos eram seguidos por grande censura a si mesma. A menina não
admitia voltar atrás na própria decisão e tinha escolhido tirar Ronald Billius
Weasley de sua vida.
Era muito difícil dividir o mesmo dormitório com Lilá e Pavarti. De vez em
quando ouvia a loura falar, de um jeito apaixonado, sobre Ron, sem contar os
momentos que as duas amigas ficavam cochichando e dando risadinhas. Sorte
que tinha pelo menos a companhia de Gina e sempre podia usar o feitiço da
impertubalidade.
Naquela noite sentia-se ainda mais arrasada. Como podia ter sido tão
agressiva com ele? Era a quarta vez que o bruxo tentava se reaproximar dela
desde que voltaram do Natal. E havia falado de um jeito tão bonitinho que seria
o aniversário dele... Não, não podia pensar assim. Ron era um idiota, estava
namorando Lilá e a havia ridicularizado na sala de aula!
Ao abrir os olhos pela manhã, Hermione lembrou que era o dia do aniversário
de Ron. Deveria manter a atitude indiferente de sempre ou cumprimentá-lo?
Gostaria tanto de poder abraçar o amigo... Não! Ele estava com Lilá, tinha
escolhido a menina e a rejeitara.
Ainda assim, ao menos por educação, Hermione achou que deveria dar
parabéns a Ron. Seria difícil, já que tinham se distanciando tanto, mas iria
tentar... Decidiu não pensar mais sobre isso e desceu para tomar o café da
manhã.
Como era sábado, o refeitório ainda estava um pouco vazio. Harry, Gina e Ron
ainda não se encontravam no salão. Ela comeu rapidamente e resolveu voltar
ao dormitório para pegar alguns livros. Estava um dia bonito de sol e queria ler
na área externa.
Ela se preparava para atravessar o retrato da Mulher Gorda no momento que
ouviu Neville chamando o seu nome. O rapaz entregou um bilhete, dizendo que
era de Harry, e perguntou se a garota sabia onde estava Gina. Hermione
respondeu que a ruiva deveria ter ido para o refeitório. Assim que o rapaz se
despediu, abriu o bilhete sem fazer ideia do que se tratava. Com surpresa, leu
essas palavras, escritas com letra apressada:
Não se preocupe. Está tudo sob controle, mas Ron ainda precisa ficar na
enfermaria.
Harry
No mesmo instante, o coração de Hermione começou a bater
descontroladamente. O que aconteceu com Ron? O que Harry queria dizer
com as palavras “está tudo sob controle”? Ele tinha se machucado muito?
Havia sido atingido por algum feitiço ou maldição? Será que os Comensais da
Morte atacaram Hogwarts?
Esqueceu-se completamente que estava zangada com o ruivo e andou
apressada em direção à ala hospitalar. A mágoa acumulara ao longo dos
últimos meses agora não tinha razão de ser.
Jamais deixara de gostar do rapaz. Apenas estava chateada com as atitudes
dele. Mas sabia que Ron era imaturo e passional, por isso agia sem pensar
muitas vezes. Mas ela também fora impulsiva e o atacara com os pássaros.
Nada disso importava mais. O importante, agora, era saber como ele estava!
Enquanto caminhava em direção à enfermaria, o desespero começou a tomar
conta de Hermione. Por que Harry havia escrito um bilhete ao invés de ir falar
pessoalmente com ela e Gina? Será que a situação era tão séria que não podia
sair de perto de Ron? O amigo não disse que ele estava bem, nem que não
corria mais risco de vida. Limitou-se a informar que estava tudo sob controle. A
menina já entrara em pânico. Não suportaria perder Ron. Não conseguia
imaginar a sua vida sem ele! Precisava saber como o rapaz estava, tinha que
vê-lo com os seus próprios olhos.
Finalmente chegou ao corredor da ala hospitalar e avistou Harry, que estava de
cabeça baixa, parado em frente à porta da enfermaria. Ela correu até o amigo
com o coração mais acelerado do que nunca.
— Calma, Hermione! Ron está fora de perigo! – ele Harry ao ver a expressão
desesperada da amiga
No momento que soube que o rapaz não corria risco de vida, Hermione
rendeu-se finalmente à emoção. Cobriu o rosto com as mãos e caiu aos
prantos.
Harry, assustado com a reação da amiga, a segurou pelos ombros e perguntou
baixinho:
— Tudo bem, Mione? Você entendeu? Ron está fora de perigo.
— Tudo bem, Harry. Agora está tudo bem. Eu estava muito angustiada. Tive
medo que... ah, nem gosto de pensar nisso ... – a garota levou a mão ao rosto
para enxugar as lágrimas.
Pouco depois chegou Gina, com os passos apressados, o rosto vermelho e foi
logo perguntando o que tinha acontecido. Harry contou tudo para as duas.
Hermione fazia perguntas pontuais, ficando a maior parte do tempo em
silêncio.
Apesar de estar mais aliviada, Hermione ainda sentia uma dor no peito. Não
bastava Madame Pomfrey dizer que Ron reagia bem, tinha todos os sinais
vitais. Ela queria ver o ruivo com os seus próprios olhos.
Às oito horas da noite, depois de passar quase o dia todo na porta da
enfermaria junto com Gina e Harry – saíram apenas nos horários das refeições
-, Hermione pôde finalmente visitar Ron. O rapaz ainda estava desacordado e
pálido como ela nunca vira, com a boca um pouco arroxeada.
Hermione pegou uma cadeira e sentou-se em um canto da enfermaria, de onde
tinha uma visão completa do amigo. A menina, sempre tão corajosa, sentia
ainda muito medo e não conseguia se aproximar mais do rapaz. Dali ela
contemplava o ruivo, angustiada, esperando alguma reação que mostrasse que
estava bem.
Pouco depois, Jorge e Fred chegaram. Hermione ouvia Harry, Gina e os
gêmeos conversando, mas não conseguia prestar atenção no que diziam.
Sentia uma grande dor não apenas por vê-lo naquele estado, mas também ao
lembrar como o vinha tratando nos últimos meses. “Ele tentou se reaproximar,
eu não aceitei, fui muito agressiva”, pensou com enorme arrependimento. Será
que teria ainda uma chance de pedir desculpas? Não, não podia pensar nisso!
Ron ficaria bem, precisava ficar bem.
O ruivo tinha, sim, os seus defeitos e Hermione os conhecia muito bem. Mas as
suas qualidades eram muito maiores. Toda a insegurança do rapaz prejudicava
antes de tudo a ele mesmo, levando-o a se sentir desmotivado para os estudos
e se sair mal nas partidas de quadribol, esporte do qual tanto gostava. Mas isso
não impedia que fosse muito corajoso quando se tratava de defender os
amigos.
Lembrava-se de Ron salvando-a de um trasgo, e isso quando ainda estava no
primeiro ano, e defendo-a com a varinha quebrada das ofensas de Malfoy, o
que levou o ruivo a vomitar lesmas. Sem falar nas detenções que sofreu... Mas
também havia arriscado a vida por Harry, mostrando sua coragem e lealdade.
“Como pude pensar em tirar Ron da minha vida? Como se isso fosse
possível... É verdade que ele muitas vezes tem um comportamento infantil, é
ciumento, fala o que passa pela cabeça sem pensar. Mas nos momentos em
que mais precisei, ele estava sempre perto”, refletia enquanto contemplava a
face tão branca do rapaz.
A garota ainda não entendia o porquê de Ron ter sido tão frio e agressivo com
ela dias antes do jogo. E logo quando parecia que algo especial estava tão
perto de acontecer... "Não, não posso pensar nisso", se repreendia ao lembrar
do amigo com Lilá.
“Espera aí, Hermione? Desde quando você desiste fácil de algo que quer? Eles
são apenas namorados e podem terminar esse relacionamento!”, falou para si
mesma e assim tranquilizou o coração.
Foi quando Jorge, Fred, Harry e Gina começaram a levantar as hipóteses para
o envenenamento de Ron que a menina passou a prestar atenção na conversa
deles. Harry informou que Slugorn queria presentear a garrafa de hidromel a
Dumbledore e a menina finalmente falou, depois de horas, com voz de quem
pegara um forte resfriado.
— Então o envenenador não conhecia Slughorn muito bem. Qualquer um que
conhecesse Slughorn saberia que havia grande probabilidade de o professor
guardar uma coisa gostosa daquela para si mesmo – ela ponderou.
Ron começou a se mexer, parecendo reconhecer a voz da amiga, e a chamou
pelo nome, ainda desacordado. Todos se calaram, observando-o ansiosos,
mas, depois de resmungar palavras incompreensíveis por um momento, ele
simplesmente começou a roncar.
O coração de Hermione disparou em grande velocidade. “Oh, Merlin! Ele
chamou por mim?! Não foi o nome da Lilá e sim o meu nome que falou! Fica
bem, Ron. Não posso perder você”, pensava a menina que, finalmente, sentia
algum alívio e felicidade.
Com a chegada de Hagrid, a inteligente bruxa permaneceu atenta à discussão
sobre a relação dos ataques de Katie e Ron. Pouco depois entrou na
enfermaria o casal Weasley e, como apenas seis pessoas podiam permanecer
no local, Harry, Hermione e Hagrid se retiraram.
No dormitório, deitada em sua cama, Hermione continuou com a cabeça
tumultuada por muitos pensamentos. A imagem de Ron pálido e desacordado
não saía da mente da menina. Lamentava nunca ter dito que o achava um bom
goleiro. Pelo contrário, ao repreender Harry por ter, supostamente, trapaceado,
havia levado o ruivo pensar que ela não acreditava no potencial dele.
Essa lembrança abatia ainda mais a garota, que havia passado o dia inteiro
aterrorizada pela possibilidade de acontecer o pior ao amigo. Por que precisou
esperar uma situação tão séria para finalmente se decidir a perdoar Ron?
Ficava chateada com sua própria teimosia e orgulho.
Como havia sido difícil não ficar sentada em frente à lareira todas as noites,
como sempre fazia antes, conversando com Ron e Harry, no período que ela e
o ruivo deixaram de se falar. Mas, especialmente, o mais difícil tinha sido vê-lo
para cima e para baixo de mãos dadas, abraçado ou beijando Lilá. “Por acaso
seria diferente se soubesse do sentimento tão forte que tenho por ele?”,
questionava-se.
A jovem bruxa estava consciente que ela e Ron tinham muito a esclarecer
desde o Baile de Inverno. Não conseguia mais permanecer nessa incerteza e
com tanto medo do seu amor não ser correspondido. Seria tão mais fácil se ele
não fosse tão inseguro e dúbio, se tivesse coragem de falar o que se passava
em seu coração.
Algo dizia a Hermione que Ron também gostava dela, mas, por temer ser
rejeitado, não conseguia se declarar. Lembrou-se do dia que ele reconheceu
que tinha ciúme até de Bichento e um leve sorriso tomou conto do seu rosto.
“Eu preciso e vou me aproximar de Ron, mas agora não posso mais pensar
nisso. Tenho que estar inteira para visitá-lo amanhã. Quem saiba possamos
conversar e eu consiga finalmente pedir desculpas a ele”. Com essa resolução
e com muita esperança, a menina conseguiu pegar no sono.
CAPÍTULO 10
Precisava ver Ron, saber como ele estava. Dormira mal a noite inteira,
perturbada por pesadelos terríveis nos quais o ruivo aparecia todo
ensanguentado, como se estivesse sem vida. Desde o envenenamento, o
rapaz permanecia desacordado e Hermione só se tranquilizaria quando
soubesse que ele tivera alguma reação.
“Não vou tomar café agora. Preciso visitar Ron”, decidiu. Não falou com
ninguém, nem mesmo com Gina, da sua intenção. Lilá ainda dormia. A menina
desconfiava que a loura não sabia que o namorado fora envenenado e não
seria ela a contar.
— Está um pouco cedo, srta. Granger, para as visitas – disse Madame
Pomfrey.
— Mas as visitas não começam às 8h? – Hermione perguntou.
— Ainda são 7h30. Mas tudo bem, você pode entrar – a medibruxa balançou a
cabeça, provavelmente lembrando do quanto a garota era insistente. – Devo
avisá-la, no entanto, que o sr. Weasley continua desacordado.
A menina logo bombardeou a medibruxa de perguntas. Soube que o rapaz
passara bem à noite, reagindo positivamente à medicação. Só que ainda
continuava inconsciente. “Ele está se recuperando”, garantiu Madame Pomfrey.
Hermione sentou-se ao lado do ruivo e, ao ver como continuava pálido, sentiu
uma grande angústia. Sabia que só ficaria em paz quando pudesse contemplar
os olhos azuis do amigo. Instintivamente, ela segurou uma das mãos de Ron e
começou a falar baixinho.
— Ron? Sou eu, Hermione. Você está na enfermaria, mas já foi medicado.
Logo tudo vai voltar ao normal. Eu vou ficar aqui com você – a voz dela era
suave.
O rapaz balançou a cabeça e pareceu resmungar, reagindo às palavras da
garota, que prosseguiu:
— Talvez você não esteja me ouvindo, mas eu gostaria de pedir desculpas.
Percebi que tentou se reaproximar de mim, mas eu ainda estava muito
magoada e tratei você com desprezo. Eu não queria que tivesse sido assim...
Depois de dar um fraco gemido, Ron chamou a amiga pelo nome. Ela apertou
mais a mão do ruivo e falou: “Eu estou aqui”. O rapaz abriu os olhos com
esforço e mirou o rosto da amiga.
— Você está na enfermaria, mas está tudo bem – ela tentava tranquilizar a si
mesma.
— Não está mais chateada comigo? – ele perguntou com voz fraca.
Os olhos de Hermione se encheram de lágrimas e ela se segurou para não cair
no choro. Ron quase tinha morrido envenenado e se preocupava em saber se
a garota estava ou não chateada com ele.
— Não, Ron! Está tudo bem. Se você me desculpar...
— Eu também não estou chateado com você – o ruivo deu um sorriso fraco.
— Que bom! – Hermione também sorriu, aliviada.
— O que aconteceu? – o rapaz ainda estava muito abatido.
— Você não lembra de nada? – ela o encarou tentando analisar cada leve
mudança no semblante de Ron.
— Só lembro vagamente de ter acompanhado Harry até a sala do professor
Slughorm...
— Você foi envenenado. O professor serviu uma taça de hidromel sem saber
que continha veneno... Mas agora está tudo bem, fica tranquilo – Hermione
tentava acalmar o amigo, mas ela continuava tensa.
— Você está segurando minha mão... – Ron a encarou.
— Ah, desculpa... – Hermione ficou logo com as faces vermelhas e tentou
desprender a mão.
— Não, por favor, fica assim – o ruivo pediu apertando a mão da garota e
fechando novamente os olhos.
Depois de vários meses de angústia, desde que ela e Ron passaram a se
desentender, Hermione finalmente se sentia em paz, aliviada, feliz até. Como
tinha sido bom contemplar aqueles olhos azuis tão límpidos, mesmo se por
poucos minutos, já que o ruivo parecia ter voltado a dormir. Como era bom
estar de mãos dadas com ele e, o melhor, o amigo ter pedido para permanecer
assim. “Eu te amo demais, Ron. Pena ainda não poder falar em voz alta desse
meu sentimento”.
Hermione permaneceu uns 10 minutos ali, de mãos dadas com o rapaz,
contemplando o seu rosto ainda pálido, os lábios agora com um pouco mais de
vida, os cabelos vermelhos. Lembrava-se de alguns dos muitos momentos, de
perigo e alegria, que haviam passado juntos ao longo desses anos.
Quando seu estômago anunciou que ela ainda não havia tomado café,
conformou-se em sair de perto de Ron. Pensava em voltar à ala hospitalar no
horário da tarde. Depois de saber que Lilá finalmente havia sido informada do
envenenamento do namorado e resolvera fazer plantão na enfermaria, achou
melhor adiar a visita.
Naquela noite, conversando com Gina, ela descobriu que Ron passava a maior
parte do tempo desacordado. "Lilá ficou se queixando comigo, dizendo que
Uon-Uon está sempre dormindo quando vai visitá-lo", a ruiva fez uma espécie
de careta ao falar o apelido do irmão. Hermione sorriu ao lembrar que o rapaz
havia falado por alguns instantes com ela, mas preferiu guardar isso em
segredo.
Quando Hermione levantava, era sempre assim: logo se recordava de Ron.
Naquela manhã não foi diferente, mas, ainda assim, queria evitar a visita, como
no dia anterior. Quando lembrou que o primeiro tempo de aula era livre para ela
e não para Lilá, que fazia Adivinhação, decidiu voltar à enfermaria.
Ron estava dormindo e Hermione começou a fazer várias perguntas à Madame
Pomfrey. Ficou sabendo que o amigo recebia sedativos para diminuir a
agitação dele e permitir ao organismo se normalizar com maior rapidez.
— Por isso é que o sr. Weasley fica muito tempo desacordado, mas aos
poucos estou diminuindo a dosagem. O envenenamento que sofreu foi muito
sério. Ele só não faleceu por causa do benzoar, mas foi muito atingido e a
recuperação deve demorar cerca de uma semana – explicou a medibruxa,
garantindo, porém, que Ron ficaria completamente restabelecido.
No momento que saiu da área hospitalar, um pouco desanimada por Ron ainda
estar inconsciente, Hermione encontrou-se com Gina, Fred e Jorge. Os
gêmeos não podiam perder a oportunidade de tirar uma brincadeira com
a menina, mesmo diante da gravidade da situação.
— Madrugou, Mionizinha? Roniquinho já acordou? – perguntou Jorge.
— Não. Ele permanece desacordado a maior parte do tempo – ela tentou
passar certa indiferença.
— Fala a verdade! Ele é muito mais interessante desacordado, não é? –
provocou Fred.
— Pelo menos não fala besteira - completou Jorge e os dois caíram na
gargalhada.
— Meninos, vocês já encheram demais a paciência de Hermione por hoje. Vão
entrando para visitar Ron que eu preciso dar uma palavrinha com Mione –
disse Gina com a autoridade que lembrava Molly.
A caçula dos Weasley parecia mais ansiosa que o normal e foi logo pedindo
desculpas a Hermione por ter contado um segredo a Ron. “Ele me provocou
tanto que eu acabei falando, sem pensar”, justificou-se a ruiva.
— O que você falou para ele? – Hermione ficou assustada, achando que a
ruiva havia revelado a paixão secreta dela pelo amigo, apesar de nunca ter
conversado com Gina sobre o assunto.
— Eu contei que você tinha beijado o Krum – a garota respondeu sem mais
rodeios.
— Gina! Você não podia fazer isso! Eu pedi segredo. Aquele beijo não
significou nada para mim – a voz de Hermione ficou estridente e, o rosto,
vermelho.
— Você não podia guardar segredo a vida toda. Um dia Ron ia descobrir... –
contrapôs Gina.
— Mas quem tinha que contar isso para ele era eu, você não acha? –
Hermione questionou.
Gina explicou em detalhes como tudo tinha acontecido e finalizou contando o
conselho que deu ao irmão. “Eu falei que ele devia arrumar uma namorada,
beijar alguma menina, para não encher mais a minha paciência”.
Hermione não pôde deixar de pensar que, com essas palavras, Gina tinha
incentivado Ron a se jogar nos braços da Lilá.
— Poxa, Gina! Você sabe como o seu irmão é ciumento, especialmente com
relação a Krum. Eu e Ron estávamos nos entendendo tão bem. Nós dois
iríamos juntos à festa do Clube do Slugue... – Hermione finalmente começava a
entender o porquê do amigo passar a tratá-la tão mal de uma hora para outra.
— Não venha defender Ron. Se ele não fosse tão imaturo saberia que o seu
relacionamento com Krum era coisa do passado. Imagina... Um beijo que já
aconteceu há 2 anos! – Gina contrapôs.
Ele não era maduro, Hermione sabia disso. E ainda era ciumento, muito
ciumento, por sinal. Se gostava ao menos um pouquinho da amiga, da forma
como ela tanto desejava, a revelação daquele beijo, mesmo se muito distante
no tempo, o havia abalado.
A inteligente bruxa não queria mais falar daquele assunto. Era informação
demais em muito pouco tempo. Disse para Gina que precisava ir, ainda não
tinha tomado café da manhã. Mas foi surpreendida pela pergunta da ruiva.
— Hermione? Você gosta muito do meu irmão, não é? – a ruiva tinha um olhar
penetrante.
— Claro! Ele é meu amigo – tentou responder de forma displicente.
— Mas você não gosta dele só como amigo, eu sei disso – Gina disparou.
A garota ficou mais uma vez com o rosto vermelho. A última coisa que queria
ouvir era isso. Então o sentimento que tentou esconder por tanto tempo tinha
sido descoberto? Onde falhara, se perguntou. Queria negar, mas Gina fez
aquela afirmação de forma tão convicta que sentiu que era inútil. Preferiu ficar
quieta.
— Meu irmão é apaixonado por você – a ruiva continuou sem se importar com
a expressão perplexa da amiga. – Ele jamais vai admitir esse sentimento, que
nega para si mesmo. Pelo menos por enquanto. Mas lá em casa todos sabem
disso.
Aquelas palavras ainda gritavam dentro do coração de Hermione. “Meu irmão é
apaixonado por você”. A garota, porém, escondida atrás da sua tão conhecida
racionalidade, tentou manter o ar de indiferença.
— Gina, você está enganada. Ron não gosta de mim do jeito que você falou. E,
além do mais, ele está namorando a Lilá – ela tentou parecer indiferente.
— Eu sei que Ron não gosta dela e que esse namoro não deve durar muito.
Mas o que eu queria dizer mesmo é que, se você realmente ama o meu irmão,
tem que demonstrar isso de alguma forma. Toda vez que o critica, ele fica
arrasado e se distancia ainda mais de você. Sei que Ron tem muitos defeitos,
mas também é divertido, protetor, tem um ótimo coração! E o mais importante:
ama muito você! – ela deu um sorriso animado para a amiga.
Depois da conversa com Gina, a garota passou o dia fora do ar. Sentia-se feliz
quando algo dentro dela dizia que a amiga falara a verdade e que Ron a
amava. Mas logo essa certeza se dissipava e dava lugar a muitas dúvidas.
“Quem tem que dizer o que sente por mim é ele. Se me amasse, Ron não
estaria namorando Lilá. Poderia até ficar chateado por causa de Krum, mas
não procuraria outra pessoa”, a menina refletia.
Logo em seguida o lado persistente e batalhador da bruxa, que sabia lutar e
alcançar seus objetivos, tão eficiente no estudo, se manifestava. “Se gosto de
Ron, e eu sei o quanto gosto, como sou apaixonada por ele, preciso lutar por
esse sentimento”.
Para piorar, Lilá resolveu implicar com Hermione. “Você é minha colega de
turma, de casa e de dormitório. Tinha a obrigação de me contar que Ron foi
envenenado”, dizia a loura. Hermione argumentou que pensou que ela
soubesse, afinal, os dois eram namorados. E se questionava como a menina
podia ser tão desligada do mundo a ponto de não virar a escola de ponta à
cabeça atrás do rapaz que desaparecera justamente no dia do aniversário.
“Eu senti falta do Ron, é claro. Mas ele disse que queria passar o dia em
Hogsmeade. Eu não sabia que o passeio tinha sido cancelado e, como também
não vi Harry, achei que os dois tinham ido para lá juntos. Como podia imaginar
que Uon-Uon corria grave perigo”, Lilá choramingava, deixando Hermione
ainda mais irritada.
Para não ter a desagradável surpresa de encontrar a garota na enfermaria,
visitando o namorado, Hermione resolveu que não veria mais o amigo. Não era
fácil manter essa decisão. Ron ainda estava tão enfraquecido da última vez
que estivera com ele. Conseguiu manter-se firme por dois dias, e com muito
sacrifício.
Estudava na sala comunal, à noite, quando Gina foi ao encontro dela. "Ron
estava acordado e perguntou por você, queria saber se vai visitá-lo. Eu disse
que você tinha ido lá alguns vezes, mas que ele estava sempre dormindo”,
contou a ruiva.
Na manhã seguinte, Hermione acordou com uma doce lembrança. “Ron pediu
para segurar minha mão!”, pensou, recordando da primeira visita que fizera
sozinha ao amigo, e o seu coração disparou de felicidade. Ressoaram em sua
mente mais uma vez as palavras de Gina: “Meu irmão é apaixonado por você”.
Fosse ou não verdade, o fato é que estava morrendo de saudades de
contemplar aqueles olhos azuis. Esse argumento suplantou todos os demais,
com seus prós e contras, e, quando se deu conta, Hermione já estava entrando
na enfermaria.
Ron conversava com Madame Pomfrey. Parecia tentar convencê-la que podia
jogar quadribol no sábado. “Eu estou ótimo. Não sinto mais nada”, dizia. A
medibruxa, ao avistar Hermione, encerrou de vez a conversa. “Ronald
Weasley, tem uma visita para o senhor”. No mesmo instante, ao avista a
amiga, o ruivo abriu um lindo sorriso.
— Hermione! Então não foi um sonho – ele disse.
— Sonho, Ron? Não estou entendendo... – Hermione ficou surpreendida por
aquela afirmação.
— Achei que tinha sonhado que você veio me visitar, conversou comigo e
voltamos a ser amigos. Não foi um sonho, foi? – o rapaz insistiu.
— Não, Ron. Eu estive aqui no domingo pela manhã. E na segunda-feira
também. Mas você estava desacordado nessa segunda vez – ela sorriu.
— Lembro também que você segurou minha mão... – o ruivo mordeu o lábio
inferior.
A garota ficou com as faces vermelhas. Mas logo tratou de se recompor e agir
racionalmente como fazia, ou tentava fazer, sempre que estava com Ron.
—Você estava tão pálido, achei que precisava de mim... – ela tentou se
explicar.
— Preciso, sim – disse num fôlego só, para em seguida completar. – Preciso
muito da sua amizade.
“Por que da minha amizade, Ron? Eu não quero mais ser apenas a sua amiga.
Será que nunca vai perceber isso?”, a garota questionava-o em silêncio. O
ruivo se deu conta que Hermione havia saído do ar por alguns segundos.
“Mione? Está tudo bem?”, perguntou.
— Claro... tudo bem. E você, como está? – indagou a menina.
— Estou bem... Queria ter alta amanhã de manhã, mas Madame Pomfrey está
irredutível! – o rapaz bufou.
— Você tem que ter paciência, Ron. Envenenamento é algo muito sério! Eu
fiquei tão preocupada em ver você desacordado...
— Engraçado você estar preocupada comigo... – ele cortou Hermione. – Nos
dois últimos meses fazia questão de virar o rosto sempre que passava ao meu
lado. Achei que nunca voltaríamos a ser amigos...
— Eu também achei, mas agora, olhando para trás, vejo que nós dois agimos
como crianças. E eu queria pedir desculpas... – ela falou com certo
constrangimento.
— Por que? – ele não podia evitar essa pergunta.
— Por tantas coisas... Por desconfiar que havia tomado Felix Felicis antes do
jogo, pelo ataque dos pássaros, pela forma como tratei você nesse último
período. Mas quero que saiba que nunca duvidei da sua capacidade de goleiro.
Pelo contrário. Sabia que era apenas o nervosismo que atrapalhava o seu bom
desempenho – a garota sorriu com timidez.
— Eu também tenho que pedir desculpas... Sei que magoei muito você, usei
palavras muito duras... – Ron olhou para a amiga de um jeito muito sério.
— Então vamos deixar tudo isso para trás? – sorriso dela agora foi mais aberto.
— Combinado – disse o rapaz, que continuava pálido, retribuindo ao sorriso.
Quando Hermione se despediu, Ron pediu que ela voltasse no dia seguinte e
agradeceu, de forma carinhosa, pela visita. Os dois estavam felizes. Era
impressionante perceber que um mal-entendido tão grande podia se resolver
com poucas palavras.
CAPÍTULO 11