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1.

INTRODUÇÃO

A Didaquê é uma obra do início da história da igreja. Contudo, não há uma


precisão quanto à data de sua escrita. Gonzales (2004) ressalta que alguns eruditos
crêem que ela tenha sido escrita em 70 d.C., enquanto outros supõem uma data muito
posterior. Sendo provável que ela tenha sido escrita entre o fim do século 1º ou do
começo do segundo. Segundo Silva (2018), o livro lança luz a uma comunidade cristã
próxima do período dos apóstolos.
Foi uma obra importante nos quatro primeiros séculos, contudo passou por
um esquecimento na Idade Média, sendo redescoberto em Constantinopla, em 1873,
por Filoteo Bryennios. Há um lapso de 800 anos entre a perda do livro e a sua
redescoberta (SILVA, 2018). Em virtude disso, os estudos abordando a Didaquê são
recentes.
Há, portanto, pouca informação a respeito da obra. Sua data é incerta,
conforme mencionado acima. Sua autoria é desconhecida, enquanto o local de
escrita, segundo Gonzales (2004) foi alguma pequena comunidade na Síria ou
Palestina, distante das principais correntes de pensamento cristão. O autor destaca o
contraste entre a proximidade do documento aos tempos apostólicos em certos
aspectos e a distância dos apóstolos em outros.

2. DESENVOLVIMENTO

Quanto à estrutura, a Didaquê é constituída por 16 capítulos, divididos em 3


seções (Gonzales, 2004). A primeira delas discute os dois caminhos: o caminho da
vida e o caminho da morte. (DIDAQUÉ, 1997). O caminho da vida é apresentado até
o capítulo 4, e introduz conceitos da conduta humana, aborda mandamentos, apesar
de não referenciar diretamente o texto bíblico. Os capítulos 5 e 6 são um alerta aos
cristãos quanto ao caminho da morte, a perdição.
Gonzales (2004) destaca que o documento sobre os dois caminhos também
é encontrado na Epístola de Barnabé. Tal fato sugere que tal documento existiu
independentemente da Didaquê ou da Epístola de Barnabé.

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Sua segunda parte tem um enfoque na liturgia, com capítulos dedicados à
questões como o batismo, a eucaristia e o jejum. Logo na sequência, a vida em
comunidade é discutida, orientando os cristãos quanto à honra aos profetas, o cuidado
com os falsos profetas, a reunião e a escolha de bispos e diáconos. A obra se encerra
tratando do fim do mundo, encorajando os cristãos permanecerem vigilantes, quanto
aos sinais do fim dos tempos. (DIDAQUÉ, 1997)
Segundo Gonzales (2004, p. 70) “a Didaquê revela um período de transição
entre o sistema primitivo de autoridade carismática e a organização hierárquica que
se desenvolveu lentamente dentro da igreja”.

A Didaquê é mais que um tratado teológico, é um livro prático, visando a


comunidade cristã, os primeiros cristãos, a didaquê busca atender a um público
específico com necessidades específicas, a obra é construída para ser uma espécie
de manual de instruções, a Didaquê é um dos livros mais antigos da história da igreja,
como não temos uma data precisa em que o livro foi escrito, baseamos que se trata
de uma comunidade cristã, próxima ao período dos apóstolos, bem no começo das
estruturas eclesiásticas, vemos muitos desses conceitos empregados nas liturgias
anda hoje, mas mostra um tempo onde a igreja católica dominava o conceito de
Espiritualidade e Religião, isso implica diretamente nos costumes religiosos do
período dos primeiros cristão litúrgicos, pois todas as tradições que absorvemos hoje,
vieram dessa estrutura, na forma de pensar, agir e nos costumes, a Didaquê mesmo
que não em um período definido, se faria necessária para dar um norte para as
atividades que estavam se formando, ser influenciado por culturas fora da doutrina
poderiam implicar em mais de uma forma de liturgia, mais de uma forma de se
estruturar a igreja que se formava, mais de uma forma de se batizar. No geral, quando
citada, nos dá uma noção da prática do batismo, mas o livro abrange muito mais
conteúdo do que se imagina, levando a discussão não somente para a vida prática
dos cristãos, tópicos de liderança e temas como a oração, o jejum, a ceia, o batismo,
dentre outros.

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3. NOS DIAS DE HOJE

Nos dias de hoje podemos ver a presença dos conceitos da Didaquê nos
processos litúrgicos da igreja:

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● No Batismo: São encontradas referências de batismo tanto por imersão quanto por
infusão: “Sobre o batismo, batiza desta maneira: ditas com anterioridade todas estas
coisas, batiza em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo em água viva [corrente].
Se não tens água viva, batiza com outra água; se não podes fazê-lo com água fria,
faz com quente. Se não tiveres uma nem outra, derrama água na cabeça três vezes,
em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo. Antes do batismo, jejuem o batizante
e o batizando, e alguns outros que o possam. Ao batizando, contudo, lhe mandarás
jejuar um ou dois dias antes” (Didaquê 7,1-4).

O mais interessante nessa parte da doutrina dos apóstolos é que hoje em dia
se vê muita discussão a esse respeito, muito embora sabemos que a quantidade de
água pouco interfere na mudança de vida de alguém, muitas denominações usam
esse critério para estabelecer padrões de espiritualidade, a didaquê demonstra é que
essa forma do sacramento pode variar de acordo com as circunstâncias, além de
esclarecer pontos polêmicos como em nome de quem se batizar (Didaquê 9), se na
Igreja primitiva se batizava somente em nome de Jesus, como menciona Atos 2,38;
8,16; 10,48; 19,5, ou em nome da Trindade, como Jesus ordena em Mateus 28,19,
porém, quando indica as palavras a serem empregadas no momento de batizar, diz
que deve-se fazer "em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo": “Que ninguém
coma nem beba de vossa ação de graças, senão os batizados em nome do Senhor...”
(Didaquê 9), “...batizai em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo” (Didaquê 7).

● Na confissão de pecados: Um pouco diferente no que vemos em algumas


denominações protestantes onde a pessoa se confessa diretamente com Deus, na
Didaquê encontramos uma forma de penitência ou disciplina diferente, onde o

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indivíduo é colocado gente a igreja e aos presbíteros e faz uma condição pública dos
pecados como menciona a bíblia (Atos 19,18; Tiago 5,16), o que com passar do tempo
se desenvolveu na confissão feita pelo fiel ao padre em denominações católicas -
“Reunidos a cada dia do Senhor, fracionai o pão e daí graças, depois de haver
confessado vossos pecados, a fim de que o vosso sacrifício seja puro” (Didaquê 14,1).

● Na segunda vinda de Cristo: Os cristãos da igreja primitiva pensavam que não era
possível prever a Segunda vinda de Cristo, o que contrasta diretamente com algumas
denominações (Adventistas, Testemunhas de Jeová, Crescendo em Graça, etc.), para
eles era preciso se estar preparada para a segunda vinda , pois não se sabia nem o
dia e nem a hora, intenção era ser prudente para não ser pego de surpresa - “Vigiai
sobre vossa vida; não se apaguem vossas lanternas, nem descarregai vossos lombos,
mas estai preparados, porque não sabeis a hora em que vosso Senhor virá” (Didaquê
16,1-2).

● Na justificação e salvação: A didaquê contribui na doutrina da justificação pois rejeita


em parte que homem era totalmente responsável por sua própria salvação e que
minimizava o papel da graça divina, pensamento que surgiu pelo século V, onde o
homem se justificava pelos seus próprios méritos - “Logo, tampouco nós, que fomos
por Sua vontade chamados em Jesus Cristo, nos justificamos por nossos próprios
méritos, nem por nossa sabedoria, inteligência e piedade, ou pelas obras que fazemos
em santidade de coração, mas pela fé, pela qual o Deus onipotente justificou a todos
desde o princípio” (Didaquê 32,4).

Porém ao mesmo em um contexto católico rejeita o “Sola Fides”, onde para os


protestantes só a fé é o bastante para salvar, estado desacompanhada da obediência
- “Reuni-vos com frequência, inquirindo o que convém a vossas almas. Porque de
nada vos servirá todo o tempo de vossa fé se não estiverdes perfeitos no último
momento” (Didaquê 16,2-3).

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4. CONCLUSÃO

A Didaquê tem um valor significativo para a Igreja Cristã dos dias atuais, pois
o livro trata sobre os temas da vida cristã e da estrutura da igreja. Mas deve-se tomar
cuidado ao aplicar esse livro, pois, apesar de sua importância histórica, a igreja
contemporânea possui o Novo Testamento. A importância do livro pode ser
equiparada a livros espirituais complementares, não devemos colocá-lo no mesmo
patamar do Novo Testamento, mas, sem dúvidas, ele lança luz sobre o mundo do
Novo Testamento.
A Didaquê é relevante para a igreja cristã contemporânea, indo além de sua
contribuição para a discussão sobre o modo de batismo. A proximidade do período
apostólico é um fator de peso para essa relevância. A Didaquê tem um valor para
igreja atual e que, principalmente no Brasil, onde se identifica uma variedade de
doutrinas muito distante do que sonharam os antigos. É evidente que o livro tem um
objetivo prático, restrito geograficamente àquela comunidade, ou seja, não há
intenção de ser um manual eclesiástico universal, porém pode servir de inspiração
para edificação da igreja nos dias de hoje.

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5. REFERENCIAS

GONZALES, Justo. Uma história do pensamento cristão. Do início até o Concílio


da Calcedônia. v. 1. São Paulo, Cultura Cristã. 2004.

__________. DIDAQUÉ. Catecismo dos primeiros cristãos para as comunidades de


hoje. São Paulo: Paulus. 1997. 24 p.

SILVA, Anilton Oliveira da. Estudo introdutório à Didaquê: além da referência ao


batismo. Revista Ensaios Teológicos. v. 4. n. 1. Jun. 2018.

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