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Os

meus haicais

Ao poeta Itige (“Neve do Crepúsculo”), meu amigo.

Ocidentalmente - ou acidentalmente, se quiserem - o velho Pierre Louys teve razão: -
“La poèsie est une fleur d’Orient qui ne vit pas dans nos serres cahudes. La Grèce elle -
mêne l’a recue d’Ionic et c’est de la aussi qu’Andre Chenier ou Keats l’aont transplantée
parmi nous, dans le désert poètique de leur époque, mais elle meurt avec chaque poete qui
nous la rapporte d’Asie. Il fault toujours aller la chercher à la source du soleil”.
Lá, onde nasce a luz, nasceram a humanidade e a sabedoria, e com elas, a sua mais
luminosa, mais humana e mais sábia forma: a poesia. E, como o sol, vem ela vindo para o
ocidente, e, como ele, talvez, brilhando mais, tanto mesmo que obrigou os homens a
fechar os olhos que não puderam resistir ao clarão. Incapazes de a contemplarem, dizem
eles, agora, nestas longitudes, que “a poesia morreu”. Não morreu: continuou a descer,
com o sol; teve o seu crepúsculo; e está agora, estará sempre renascendo no Levante.
Olho para aí e aí descubro, no seu aspecto mais simples e, pois, mais exato, a poesia:
toda consubstanciada no haicai.
Mas, o que é haicai? - Criada por Bashô (sec. XVII) e humanizada por Issa (séc.
XVIII), o haicai é a poesia reduzida à expressão mais simples. Um mero enunciado:
lógico, mas inexplicado. Apenas uma pura emoção colhida ao voo furtivo das estações que
passam, como se colhe uma flor na primavera, uma folha morta no outono, um floco de
neve no inverno… Emoção concentrada numa síntese fina, poeticamente apresentada em
dezessete sons, repartidos por três versos: o primeiro de cinco sílabas, o segundo de sete e
o terceiro de cinco. Impressão breve, mas tão extensível, desdobrável: “pastille
fumante”… Assim por exemplo:

“Furu ike ya
Kawazu tobi komu
Mizu no oto”

que é a muito citada e recitada “Solidão”, de Bashô, e que traduzida em prosa e livremente
dá isto: - “No tanque morto/ o ruído de uma/rã que mergulha”.
Vinte anos de poesia - uns trinta livros de versos escritos e uns vinte publicados -
levam-me hoje à conclusão calma (que não é uma negação à minha nem um sarcasmo à
obra dos outros) de que não há idéia poética, por mais complexa, que, despida de
roupagens atrapalhantes, lavada de toda excrecência, expurgada de qualquer impureza,
não caiba estrita e suficientemente, em última análise, nas dezessete sílabas de um haicai.
“O Melro”, “O Navio Negreiro”, “A Vingança da Porta”, o “Ouvir Estrelas”, os trinta e
três sonetos do meu “Nós” (no caso, não é pretensão, senão mero estoicismo, o colocar-me
em tão superior companhia) poderiam ter sido reduzidos a simples haicais.
Questões, apenas, de coragem: coragem de renunciar a si mesmo, a uma porção de
enfeites, de supérfluos mais ou menos bonitos, para só manter um essencial. Ao descrever
o primeiro, maravilhoso verso da sua “Brise Marine”, Mallarmé fez um haicai: “La chair
est triste, helas! et j’ais la tous les livres!” Mas, não teve coragem de parar aí: sob esse
essencial, alinhou quinze supérfluos. É a poesia dispersiva do Ocidente.
Uma tarde, há pouco tempo, eu me perguntei: - será possível o haicai em outra língua
que não a japonesa? Franceses de hoje, como Jules Supervielle, Tristan Derime, Robert de
Souza, Fernand Lot; alemães, como Ernst Wohlfarth, Otto Thonak, F. Rumpf; e ingleses, e
italianos e até já alguns patrícios meus, têm tentado o haicai, mas sem disciplina, sem um
eficiente trabalho de aclimatação, uma justa observância e adaptação dos processos e
ritmos originais: apenas li-vre-men-te. Referindo-se a tais tentativas, declarou um grande
espírito do Japão, na noite de 5 de maio de 1936, quando conviva de honra do jantar do
P.E.N. Club de Londres, rematando o seu discurso no Pagani’s Restaurant: “Penso que não
é possível tentar a forma de dezessete sons em língua alguma que não a japonesa. O Poeta,
que quisesse escrever poemas como os haicais, bem andaria em escolher uma pequena
forma poética que melhor se adaptasse à sua língua materna”…
Ora, eu quero até certo ponto contrariar - e contrariar é sempre a maneira mais evidente
de admirar - a absoluta autoridade do grande Takahama Kyoshi. Todos os elementos e
todos os processos do haicai podem ser encontrados e empregados na poesia nossa,
geograficamente antípoda da sua. Antípoda… “Os extremos se tocam” - este é, para mim,
um dos únicos provérbios que, até hoje, conseguiram “acontecer”.
As mesmas analogias plásticas que Georges Bonneau (o verdadeiro revelador do haicai
no Ocidente) notou entre a poesia japonesa e francesa, descubro, e mais estreitas ainda,
entre aquela e a nossa, a luso-brasileira. Estas, por exemplo:

1) A poesia é silábica (isto é, conta sílabas e não acentos) como a nossa.

2) São comuns a ambas as línguas as “sonoridades elementares” ou “vogais”: a,e,i,o,u.

3) Os ritmos ímpares “elementares” (de 5 e de 7 sílabas), peculiares à língua japonesa,
também o são à nossa. O verso segundo do haicai, o de 7 sílabas, é a redondilha, que
nasceu com a nossa poesia na Galiza, fez se a medida clássica de todos os nossos
importados “romances”, a música natural da nossa “trova popular”, o diapasão da
modinha Capadócia, a nossa expressão folclórica por excelência, e mesmo a medida
inconsciente, automática, da nossa fala. Diz-se até que nós falamos, sem o querer, por
septissílabos. Os provérbios, os ditados plebeus, são exemplos disso: - “Nem tudo o que é
luz é ouro”; “água mole em pedra dura - tanto dá até que fura”, etc… Outro ritmo do
haicai - o verso de 5 sílabas - é também velho habitual na nossa língua. Vem dos
estribilhos medievais, dos refrões dos “Cancioneiros”: “D’amores ei mal” (Ruy Paesde
Ribella);”Os amores ei” (Pero Alcobo), etc; tornou-se a toada musical nas serraninhas
brasileiras:

“Papagaio louro
Do bico dourado
Leva-me esta carta
Ao mesmo namorado”

das nossas tradicionais “Pastorelas”:

“Bela Pastorinha.
Que fazeis aqui?
- Pastoreando o gado
Que eu aqui perdi”

foi o verso das “Trayeras”, sob a “ação burlesca da raça negra” (Sílvio Romero):

“Virgem do Rosário
Senhora da mundo,
Dai-me uma coco d’água
Senão vou ao fundo”;

foi a cadência favorita das nossas “rondas” infantis:

“Tutu’Marambaia.
Saia do telhado.
Deixe este menino
Dormir sossegado”.

Servindo-se de todos esses recursos técnicos; e ainda das mesmas onomatopeias,
aliterações, etc., que caracterizam os epigramas japoneses dos dezessete sons, e mais,
procurando assimilar aquele “senso do símbolo” que possui, como nenhuma outra, a gente
do outro-lado-do-mundo (senso esse que é a grande lição levantina, e tão extremado que
faz, como diz Bonneau, com que, no haicai, “o sentido profundo do poema não tenha, às
vezes, qualquer analogia com as palavras que o compõe”); e, afinal, acrescentando à
minúscula pastilha nipônica um dourado todo nosso - a rima - a única corda que
conseguimos acrescentar à lira dos gregos, essa

“Rime, qui donnes leurs sons
Aux chansons” (Banuille);

chego a estabelecer a fórmula do “meu” haicai. Esta fórmula:

– os três versos japoneses, na sua ordem original: 5 - 7 - 5;
– o primeiro, rimando com o terceiro;
– o segundo - septissílabo - com uma rima interna: a segunda sílaba rimando com a
sétima - o que não se pode dizer que seja uma extravagância numa língua em que tal
artifício frequentemente aparece, como nos provérbios populares: “Por fora, bela viola, -
por dentro, pão bolorento” (“fora” com “viola”; “dentro” com “bolorento”); e processo
esse que cria um verso também de 5 sílabas pela subtração de 2 sílabas a que a rima força
(7 - 2 = 5), verso esse que se integra facilmente na música dominante da pequena estrofe,
que é a música do pentassílabo; sentir, pensar e não dizer: somente insinuar.
Mas… “res, non verba”; alguns exemplos, agora, desse haicai. (Dizem os japoneses
que o haicai não deve ser explicado. Nós, porém, apenas iniciados, ainda não
familiarizados com o espírito e a forma da exígua novidade, não podemos, por enquanto,
dispensar algumas explicações).
A flor, que se desfolha, é bem uma lição moral de alta caridade: dir-se-ia que ela se
despe do que é seu, que ela toda se dá à terra humilde, para que o pobre chão, a seus pés,
pense que também é capaz de florir:

CARIDADE
Desfolha-se a rosa
parece até que floresce
o chão cor-de-rosa.

Um dia do passado - céu azul varado de sol fino de ouro - que ficou numa vida, sugere
a ideia da borboleta que os colecionadores espetam no quadro melancólico. Colorida e
linda ainda, parece viva: mas está morta, bem morta:

AQUELE DIA
Borboleta anil
que um louro alfinete de ouro
espeta em Abril

O haicai japonês acompanha o processo: está sempre “a la page”, explora
frequentemente temas modernos (a aviação, o cinema, o rádio…). Aqui está um de
inspiração mecânica, atual: todo um romance - o das imperceptíveis criaturas pelas quais a
vida parece que passa sem nada deixar nem levar, como os trens-de-ferro pelas
estaçõezinhas insignificantes onde ninguém embarca nem desembarca:

HISTÓRIA DE ALGUMAS VIDAS
Noite. Um silvo no ar.
Ninguém, na estação. E o trem
passa sem parar.

Uma definição do amor: uma ave, voa alto, entre a terra e o sol; a sua sombra projeta-se
no chão, assustando-o, movimentando-o todo, e vai-se. Ela é a ave. Ele, o chão extático:

NÓS DOIS
Chão humilde. Então
riscou-o a sombra de um voo.
“Sou céu” - disse o chão

É das nossas lágrimas muitas vezes, que nascem as mais brilhantes alegrias. Pois não é
nas gotinhas de orvalho, de manhã, que o sol mais brilha? Desse pensamento derivou este
haicai:

N. W.
Dilaceramentos.
Pois tem espinhos também
a rosa-dos-ventos.

Uma imagem do silêncio das nossas caatingas - o silêncio agudo, todo aliterado em
“ii”, feito todo de tinidos de insetos sutis:

QUIRIRI
Calor. Nos tapetes
tranquilos da noite, os grilos
fincam alfinetes.

Descrição da velhice - a partida das ilusões como folhas de outono; o gesto sem verdes,
sem esperanças, para o céu; os cabelos grisalhos; a solidão e o egoísmo dos velhos:

VELHICE
Uma folha morta.
Um galho no céu grisalho.
Fecho a minha porta.

Um último exemplo: a definição do haicai num haicai. Que é ele, afinal? - o grãozinho
de ouro que os lavageiros pacientes descobrem lavando a terra aurífera e deixando
escorrer a ganga impura:

O HAICAI
Lava, escorre, agita
a areia. E enfim, na bateia,
fica uma pepita.

Aí está.
Compreende-se bem: trata-se ainda de uma experiência - mais nada. O que eu reclamo,
para esses versos, não são as rugas fundas na testa séria, para a sentença que absolve ou
condena; mas as rugas leves, nos cantos dos lábios espirituosos, para o sorriso que não
absolve nem condena porque… porque o sorriso é ainda a única coisa, no mundo, que não
pode ser ridícula.

Guilherme de Almeida
São Paulo, 23 de fevereiro de 1937
Os meus haicais
(Extraídos do livro
Poesia Vária)
O PENSAMENTO
O ar. A folha. A fuga.
No lago, um círculo vago.
No rosto, uma ruga.
HORA DE TER SAUDADE
Houve aquele tempo…
(E agora, que a chuva chora,
ouve aquele tempo!)
CARIDADE
Desfolha-se a rosa.
Parece até que floresce
O chão cor-de-rosa.
SILÊNCIO
Uma tosse rouca,
Lã male. O “store” que bole,
A noite opaca e oca.
A INSÔNIA
Furo a terra fria.
No fundo, em baixo do mundo,
trabalha-se: é dia.
MOCIDADE
Do beiral da casa
(ó telhas novas, vermelhas!)
vai-se embora uma asa.
HISTÓRIAS DE ALGUMAS VIDAS
Noite. Um silvo no ar.
Ninguém na estação. E o trem
passa sem parar.
INFÂNCIA
Um gosto de amora
comida com sol. A vida
chamava-se “Agora”.
LEMRANÇA
Confete. E um havia
de se ir esconder, e eu vir
a encontrá-lo, um dia.
O POETA
Caçador de estrelas.
Chorou: seu alhar voltou
com tantas! Vem vê-las!
CIGARRA
Diamante. Vidraça.
Arisca, áspera asa risca
o ar. E brilha. E passa.
GAROA
Por um mundo quase
aéreo, há um vago mistério.
Passa o Anjo de Gaze.
CIGARRO
Olho a noite pela
vidraça. Um beijo, que passa,
acenda uma estrela.
NÓS DOIS
Chão humilde. Então,
riscou-o a sombra de um voo.
“Sou céu!” disse o chão.
CONSOLO
A noite chorou
a bolha em que, sobre a folha,
o sol despertou.
VELHICE
Uma folha morta.
Um galho, no céu grisalho.
Fecho a minha porta.
CHUVA DE PRIMAVERA
Vê como se atraem
nos fios os pingos frios!
E juntam-se. E caem.
MEIO-DIA
Sombras redondinhas
Soldados de pau fincados
sobre rodelinhas.
NOTURNO
Na cidade, a lua:
a joia branca que boia
na lama da rua.
MERCADO DE FLORES
Fios. Alarido.
Assaltos de pedra. Asfaltos.
E um lenço perdido.
N. W.
Dilaceramentos.
Pois tem espinhos também
a rosa-dos-ventos.
EQUINÓCIO
No fim da alameda
há raios e papagaios
de papel de seda.
O SONO
Um corpo que é um trapo.
Na cara, as pálpebras claras
são de esparadrapo.
JANEIRO
Jasmineiro em flor.
Ciranda o luar na varanda.
Cheiro de calor.
DE NOITE
Uma árvore nua
aponta o céu. Numa ponta
brota um fruto. A lua?
QUIRIRI
Calor. Nos tapetes
tranquilos da noite, os grilos
fincam alfinetes.
PASSADO
Esse olhar ferido,
tão contra a flor que ele encontra
no livro já lido!
FILOSOFIA
Lutar? Para quê?
De que vive a rosa? Em que
pensa? Faz o quê?
UM SALGUERIO
A asa. A luz que pousa.
O vento… É o estremecimento
vão por qualquer cousa.
UM RITMO DA VIDA
O berço vai e vem.
Mas vai com a quê? – Um ai.
E vem? – Sem ninguém.
OS ANDAIMES
Na gaiola cheia
(pedreiros e carpinteiros)
o dia gorjeia.
TRISTEZA
Por que estás assim,
violeta? Que borboleta
morreu no jardim?
PERNILONGO
Funga, emaranhada
na trama que envolve a cama,
uma alma penada.
PESCARIA
Cochilo. Na linha
eu ponho a isca de um sonho.
Pesco uma estrelinha.
OUTONO
Sistema nervoso,
que eu vi, da folha sorvida
pelo chão poroso.
VENTO DE MAIO
Risco branco e teso
que eu traço a giz, quando passo.
Meu cigarro aceso.
FRIO
Neblina? ou vidraça
que o quente alento da gente,
que olha a rua, embaça?
OUTUBRO
Cessou o aguacerio.
Há bolhas novas nas folhas
do velho salguerio.
O BOÊMIO
Cigarro apagado
no canto da boca, enquanto
passa o seu passado.
FESTA MÓVEL
Nós dois? - Não me lembro.
Quando era que a primavera
caía em setembro?
ROMANCE
E cruzam-se as linhas
no fino tear do destino.
Tuas mãos nas minhas.
O HAICAI
Lava, escorre, agita
A areia. E, enfim, na bateia
Fica uma pepita.
NOROESTE
Dilaceramentos…
Pois tem espinhos também
A rosa-dos-ventos.
Haicais da colina
(Poemas extraídos do livro
O Anjo de Sal)
PACAEMBU
Chuva e sol. Repara
nas giestas atrás das frestas
das persianas claras.
PROGRESSO?
Enorme canhão,
o arranha-céu acompanha
o voo do avião.
CARRILHÃO
Assusta-se e foge o
enorme tempo que dorme
no velho relógio.
SABEDORIA
Uma ave, poisada
no pára-raio, olha para
o céu. E há trovoada.
INTERIOR
Havia uma rosa
no vaso. Veio do ocaso
a hora silenciosa.
BOLHA DE SABÃO
Dirás, quando a vires:
“A bola de vidro rola
debaixo do arco- íris”.
POETAS
Tive uma irmã gêmea.
Sonhou com o céu. Chorou.
Nuvenzinha boêmia.
Seis haicais
para campos do jordão
(Poemas extraídos do livro
O Anjo de Sal)
CAMPOS DO JORDÃO
Vão duas meninas
de suéter de lã. Cheira a éter.
Ondas de colinas.
O “LOGO DAS HAICAIS”
Esvoaça a libélula.
Esponja verde. Uma concha.
O logo é uma pérola.
MARCHA NUPCIAL
Ventos leves bolem.
Têm lerdos gestos os cedros
ao voo do pólen.
ÁRVORES NO OUTUBRO
Na casca, a ferida
é como mercurocromo.
A folha esquecida.
PRESENÇA
Hora sem ninguém.
No manso ondear do balanço
de lona está alguém.
Três haicais
(de Bashô)
(Traduçôes publicadas no livro
Acaso)
I.
O vento do inverno
assopra. Acendem-se e piscam
os olhos dos gatos.
II.
Quimonos secando
ao sol. Ah! a manga pequena
do menino morto.

III.
Ah! o antigo açude!
E quando uma rã mergulha,
o marulho da água.


Bibliografia

Almeida, Guilherme – Poesia Vária, São Paulo, Editora Cultrix, 1976
Almeida, Guilherme – Toda Poesia – Guilherme de Almeida, São Paulo, Livraria Martins,
Editora, 1952
Almeida, Guilherme – O Anjo de Sal, São Paulo, Alarico, 1951
Almeida, Guilherme – Acaso: versos de todo tempo. São Paulo, Editora Nacional, 1938
Pereira Filho, Genésio – Haikai, Poesia de Estação, São Paulo, Gazeta Magazine, 1941
Almeida, Guilherme – Os meus haicais, São Paulo, O Estado de S. Paulo, 1937
Guilherme de Andrade e Almeida nasceu em Campinas, SP, a 24 de julho de 1890. Filho
do jurista e professor de direito Estevão de Araújo Almeida e de Angelina de Andrade
Almeida, passou os primeiros anos da infância nas cidades de Limeira, Araras e depois
Rio Claro, onde realizou os estudos primários. Em 1902 tornou-se aluno do Ginásio de
Campinas e, em 1903, com a vinda da família à cidade de São Paulo, ingressou no Colégio
de São Bento. Formou-se, em 1907, no Ginásio Nossa Senhora do Carmo, dos Irmãos
Maristas. Em 1912, concluiu o curso da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco,
tendo, após a formatura, atuado como promotor público em Apiaí e em Mogi-Mirim. De
volta à Capital em 1914, trabalhou com o pai até 1923, quando passou a se dedicar
prioritariamente à atividade de escritor, iniciada alguns anos antes.
A estreia literária de Guilherme de Almeida se deu em 1916, com Mon Coeur Balance
e Leur Âme (teatro), peças escritas em colaboração com Oswald de Andrade e editadas
sob o título de Théatre Brésilien. Seu primeiro livro de poemas, Nós, veio a lume em
1917, seguindo-se A dança das horas e Messidor, ambos de 1919, e o Livro de Horas de
Sóror Dolorosa, publicado em 1920. Escreveu, em 1921, o ensaio Natalika e os atos em
verso Scheherazada e Narciso – A flor que foi um homem. Publicou Era uma Vez… em
1922. Nesse mesmo ano, atuou decisivamente na realização da Semana de Arte Moderna,
ao lado de Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Di Cavalcanti e Menotti del Picchia,
entre outros. Ajudou a fundar a revista Klaxon (porta-voz do movimento), integrando a
equipe de editores; criou a capa do periódico, além de anúncios publicitários dos
patrocinadores, de concepção precursora da visualidade da arte de vanguarda e da própria
propaganda moderna.
O poeta casou-se em 1923 com Belkiss Barroso do Amaral (Baby), e mudou-se para o
Rio de Janeiro, onde permaneceu até 1925. Nesse ano publicou quatro livros de poemas:
Narciso, Encantamento, Raça e Meu, consistindo, estes dois últimos (principalmente
Meu), no ápice de sua poesia modernista. Escreveu, também nesse ano, a conferência
“Revelação do Brasil pela poesia moderna” e a apresentou no Rio Grande do Sul, em
Pernambuco e no Ceará, a fim de difundir os ideais estéticos do Modernismo, regressando,
em seguida, a São Paulo.
Em 1932, Guilherme participou ativamente da Revolução Constitucionalista, chegando
a se alistar voluntariamente, como soldado raso, e a lutar na cidade de Cunha. Ao final
desse Movimento, foi preso e exilado em Portugal, onde permaneceu até o ano seguinte. A
estada naquele país forneceu elementos para a elaboração de crônicas reunidas no livro O
meu Portugal, publicado em 1933.
Eleito em 1928 para a Academia Paulista de Letras e, em 1930, para a Academia
Brasileira de Letras, Guilherme de Almeida foi, durante décadas, o mais popular poeta
paulista. Sua obra compreende mais de 70 publicações, entre poesia, prosa, ensaio,
tradução, além do extenso trabalho jornalístico, ainda esparso; deste, destaque-se sua
coluna “Cinematographos”, pioneira da crítica cinematográfica em nosso país, mantida no
jornal O Estado de S. Paulo entre as décadas de 1920 e 1940. Em 1959 foi eleito “Príncipe
dos Poetas Brasileiros” em concurso patrocinado pelo jornal Correio da Manhã, por meio
da seção “Escritores e livros” – escolhido por um “colégio eleitoral” de cerca de mil
componentes, concorreu com os poetas Manuel Bandeira, Carlos Drummond da Andrade,
Vinicius de Moraes e Mauro Mota.
Guilherme faleceu em 11 de julho de 1969, em sua casa da Rua Macapá, no Pacaembu,
em São Paulo – a “Casa da Colina” –, onde residia desde 1946. Adquirida pelo Governo
do Estado na década de 1970, a residência do poeta tornou-se o museu biográfico e
literário Casa Guilherme de Almeida, inaugurado em 1979, que abriga também, hoje, um
Centro de Estudos de Tradução Literária.

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