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O C O LA P S O

DO
U N I V E RS O
ISAAC ASIMOV

O C O LA P S O
DO
UNI
NIVERSO

Tradução de
Donaldson M. Garschagen

6ª EDIÇÃO

Francisc o
Alves
Copyright © 1977 by Isaac Asimov
Título srcinal: The Collapsing Universe

Capa: Eugenio Hirsh

Impresso no Brasil
Printed in Brazil

Ficha Catalográfica
CIP-BRASIL. Catalogação-na-fonte
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ

Asimov, Isaac.
A857c O Colapso do Universo / Isaac Asimov; tradução de Donaldson
M. Garschagen. – Rio de Janeiro : Francisco Alves, 1989.
5ª ed.
1. Cosmogonia I. Título

CDD – 523.1
79-0638 CDU – 523.1

1989

Todos os direitos desta tradução reservados à


LIVRARIA FRANCISCO ALVES EDITORA S.A.
Rua Sete de Setembro, 177 – Centro
20.050 Rio de Janeiro, RJ

Não é permitida a venda em Portugal e países de língua portuguesa.


Para Phyllis e Al Balk,
que estavam lá a 30 de novembro de 1973
Sumário

PARTÍCULAS E FORÇAS ............................................................................................01


As quatro forças.................................................................................................01
Átomos ..............................................................................................................04
Densidade..........................................................................................................07
Gravitação .........................................................................................................10

OS PLANETAS...............................................................................................................16
A Terra ..............................................................................................................16
Os outros planetas .............................................................................................19
Velocidade de escape ........................................................................................22
Densidade e formação planetária ......................................................................25

MATÉRIA COMPRIMIDA............................................................................................30
Interiores planetários .........................................................................................30
Resistência à compressão ..................................................................................33
Estrelas ..............................................................................................................36
Matéria degenerada ...........................................................................................39

ANÃS BRANCAS ..........................................................................................................43


Gigantes vermelhas e companheiras escuras.....................................................43
Superdensidade..................................................................................................46
O desvio para o vermelho de Einstein...............................................................49
Formação de anãs brancas.................................................................................51

MATÉRIA EM EXPLOSÃO ..........................................................................................56


A grande explosão.............................................................................................56
A seqüência principal ........................................................................................59
Nebulosas planetárias........................................................................................64
Novas.................................................................................................................67
Supernovas ........................................................................................................71

ESTRELAS DE NÊUTRONS.........................................................................................76
Além da anã branca ...........................................................................................76
Além da luz .......................................................................................................78
Pulsares..............................................................................................................80
Propriedades das estrelas de nêutrons ...............................................................84
Efeitos de maré..................................................................................................88

BURACOS NEGROS .....................................................................................................94


Vitória final .......................................................................................................94
A detecção do buraco negro ..............................................................................97
Miniburacos negros .........................................................................................102
O uso dos buracos negros ................................................................................106

FINS E COMEÇOS.......................................................................................................108

i
O fim?..............................................................................................................108
Buracos de minhoca e buracos brancos...........................................................111
Quasares ..........................................................................................................114
O ovo cósmico.................................................................................................118

APÊNDICE ...................................................................................................................123
Números exponenciais ....................................................................................123

ii
Partículas e Forças

Desde 1960 o universo adquiriu uma fisionomia inteiramente nova. Tornou-se


mais excitante, mais misterioso, mais violento e mais extremo, pois nosso conhecimento
a seu respeito cresceu subitamente. E dentre todos os fenômenos, o mais excitante, o
mais misterioso, o mais violento e o mais extremo é o que tem o nome mais simples,
comum, tranqüilo e sereno. Trata-se tão somente de um “buraco negro”.
Um buraco é um nada. E se é negro, nem podemos vê-lo. Por que o entusiasmo
por um nada invisível?
Há causa para esse entusiasmo — se aquele buraco negro representa o estado
mais extremo possível da matéria, se representa o possível fim do universo, se
representa o possível começo do universo, se representa novas leis físicas e novos
métodos para ultrapassar o que antes eram consideradas limitações absolutas.
No entanto, para compreendermos o buraco negro, convém começar do começo
e seguir passo a passo o caminho que leva até ele.

AS QUATRO FORÇAS

As várias partículas que compõem o universo interagem entre si de quatro


maneiras diferentes. Cada uma dessas maneiras é uma forma particular de interação ou,
para usarmos um termo mais antiquado, porém mais comum, uma força. Os cientistas
jamais conseguiram detectar uma quinta força, ou mesmo descobrir qualquer razão pela
qual uma quinta força seria necessária.
O Quadro 1 relaciona as quatro forças em ordem decrescente de intensidade.

QUADRO 1 — Intensidade relativa das quatro forças


Força Intensidade relativa *
Nuclear 103
Eletromagnética 1
Fraca 10-11
Gravitacional 10-39

Toda
partícula partícula
serve existente
como centro no universo
de um volume deé fonte
espaçodeem
uma
queouessa
maisforça
dessas forças.
existe comCada
uma

*
As intensidades, relativas são dadas em números exponenciais, ou seja, 103 representa 1.000 e 10 -11 representa 1/100.000.000.000.
Alguns detalhes concernentes aos números exponenciais aparecem no Apêndice, caso o leitor n esteja familiarizado com eles.

1
intensidade que diminui ao aumentar a distância da fonte. O volume de espaço em que
aquela força pode atuar é o campo de força.
Qualquer partícula capaz de servir como fonte de um campo particular
responderá a um campo semelhante criado por outra partícula. Em geral, a resposta se
dá em termos de movimento: as partículas movem-se uma em direção à outra (atração)
ou afastando-se uma da outra (repulsão), a menos que obstáculos físicos o impeçam.

mover, Assim, qualquer


se colocado objetogravitacional
no campo capaz de produzir um campo
da Terra, gravitacional
em direção ao centrohaverá de —
da Terra se
isto é, cairá. A Terra, por sua vez, também se moverá em direção ao centro do objeto,
mas já que, com toda probabilidade, será muito maior do que o objeto, subirá
correspondentemente mais devagar — em geral, na verdade, com uma lentidão
incomensurável.
Dentre as quatro forças, duas — a nuclear e a fraca — só atuam em distâncias
incrivelmente pequenas, da ordem de 10 -13 centímetros ou menos. Essa distância
representa praticamente a largura do minúsculo núcleo existente no centro do átomo. Só
dentro do núcleo, na vizinhança imediata de partículas isoladas, é que essas forças
existem. Por esse motivo, a denominação força nuclear é, às vezes, dada a ambas, sendo
diferenciadas, no tocante à sua intensidade relativa, pelas expressões força nuclear forte
e força nuclear fraca.
Neste livro, entretanto, raramente haverá oportunidade para nos referirmos à
força fraca, de modo que nos referiremos simplesmente à força nuclear mais forte como
sendo a força nuclear, sem maiores qualificativos.
Não é provável que uma determinada partícula produza cada uma dessas forças,
nem que responda a cada uma delas. Somente certas partículas, por exemplo, produzem
força nuclear e respondem a ela. As que assim fazem são chamadas hadríons, termo
derivado de uma palavra grega que significa “forte”, uma vez que a força nuclear é a
mais forte das quatro. Os hadríons mais comuns e mais importantes para a estrutura do
universo são dois núcleons — o próton e o nêutron.
O próton foi descoberto em 1914 pelo físico britânico Ernest Rutherford (1871-
1937) e seu nome provém da palavra grega que significa “primeiro”, isso porque, ao
tempo de sua descoberta, era o menor objeto conhecido que possuía carga elétrica
positiva.
O nêutron foi descoberto em 1932 pelo físico inglês James Chadwick (1891-
1974). Não tem carga elétrica, positiva ou negativa. Em outras palavras, é eletricamente
neutro — donde seu nome.
Já em 1911 Rutherford havia demonstrado que um átomo contém quase toda sua
massa numa região pequeníssima em seu centro, o núcleo. Assim que se descobriram os
prótons, compreendeu-se que são partículas relativamente sólidas e que deviam estar
localizadas no núcleo. O número de prótons varia de uma espécie de átomo para outra: o
átomo de hidrogênio possui um único próton no núcleo, o átomo de hélio tem 2, o
átomo de lítio tem 3 e assim por diante — até o átomo de urânio, que tem 92 prótons.
Átomos de massa ainda maior já foram criados em laboratório.
Mas o que mantém os prótons juntos no núcleo, onde se acham todos eles
comprimidos em tamanha proximidade?
Antes de 1935, somente se conheciam duas forças — a eletromagnética e a
gravitacional. A força gravitacional é fraca demais para conservar os átomos juntos. A

2
força eletromagnética é suficientemente forte para isso, mas ela só pode se manifestar
como urna atração ou como uma repulsão. Entre duas partículas de carga elétrica oposta
(positiva e negativa) há uma atração. Entre duas partículas com a mesma carga elétrica
(positiva e positiva ou negativa e negativa) há uma repulsão. Todos os prótons têm
carga positiva e, por conseguinte, deveriam repelir-se mutuamente, sendo a repulsão
mais intensa quanto mais próximos estiverem os prótons uns dos outros. No núcleo
atômico, com os prótons apertados de tal maneira que se acham praticamente em
contato, a repulsão eletromagnética deve ser de uma intensidade enorme — e, no
entanto, os prótons permanecem juntos.
Além de prótons, no núcleo também existem nêutrons, mas isso não parece
resolver a situação. Como os nêutrons não têm carga elétrica, eles não produzem força
eletromagnética nem reagem a ela; por isso, não deveriam atrair nem repelir os prótons.
Não deveriam manter os prótons juntos nem acelerar sua separação.
Só em 1935 o físico japonês Hideki Yukawa (1907-) expôs uma teoria
satisfatória da força nuclear, mostrando que seria possível aos prótons e nêutrons,
quando muito próximos uns dos outros, produzir uma força de atração mil vezes maior
que a força de repulsão eletromagnética. O que a força nuclear junta, a força
eletromagnética não pode separar.

prótonsAeforça nuclear
nêutrons se só funciona
acham plenamente
presentes e mantém
em certas os átomos
proporções. estáveis
Para quandoque
os átomos os
contêm 40 partículas ou menos, a melhor proporção parece ser a de números iguais de
prótons e nêutrons. No caso de núcleos mais complicados, é preciso haver uma
preponderância de nêutrons, crescendo essa preponderância à medida que o núcleo se
torna mais complexo. Um núcleo de bismuto, por exemplo, contém 83 prótons, mas 126
nêutrons.
Quando um núcleo atômico é forçado a ter proporções fora da região de
estabilidade, ele não se mantém intacto. Sob a influência da força fraca, pequenas
partículas beta, (beta é a segunda letra do alfabeto grego) são emitidas até a proporção
ajustar-se às normas de estabilidade. Existem ainda outras formas pelas quais os átomos
podem ser decompostos, porém todas essas maneiras se reúnem sob o título de

radioatividade.
Por mais forte que seja a força nuclear, ela tem limites. A intensidade da força
nuclear diminui muito rapidamente com a distância, e ela pode se fazer sentir fora do
núcleo. Na verdade, sua influência atrativa reduz-se consideravelmente quando ela tem
de se estender de uma extremidade à outra dos núcleos maiores.
A força eletromagnética também diminui, porém mais lentamente, O tamanho
do núcleo é limitado, uma vez que por fim a repulsão eletromagnética de uma
extremidade à outra se tornará igual à atração nuclear rapidamente decrescente de uma
extremidade à outra. É por isso que os núcleos atômicos têm dimensões tão
infinitesimais. A força nuclear simplesmente não consegue produzir qualquer coisa
maior (exceto em condições raríssimas, de que trataremos mais tarde).
Concentremo-nos agora na interação eletromagnética, a qual, como já foi dito,
só é produzida por aquelas partículas que têm carga elétrica e às quais só as partículas
carregadas reagem. A carga é de dois tipos, positiva e negativa. A força entre cargas
positiva e negativa é uma atração, ao passo que a força entre cargas positiva e positiva
ou negativa e negativa é uma repulsão.

3
O próton, com sua carga elétrica positiva, é fonte de força nuclear e
eletromagnética e reage a ambas. O nêutron, que é eletricamente descarregado, é fonte
apenas de força nuclear e reage somente a ela.
Além dessas, existem as partículas denominadas léptons, cujo nome deriva de
uma palavra grega que significa “fraco”; os léptons são fonte da força fraca, à qual
reagem, mas jamais reagem à força nuclear. Alguns léptons, no entanto, têm carga
elétrica e são fonte de força eletromagnética e a ela respondem, da mesma forma que
são fonte de força fraca, à qual reagem.
O mais importante dos léptons, no que diz respeito à matéria ordinária, é o
elétron, que tem carga elétrica negativa. (As partículas beta produzidas por núcleos
instáveis, por intermédio da força fraca, são elétrons). O elétron foi descoberto em 1897
pelo físico inglês Joseph John Thomson (1856-1940), e recebeu esse nome por ser a
menor unidade de carga elétrica então conhecida (ou, aliás, conhecida até hoje).
As informações de que agora dispomos podem ser sumarizadas como mostra o
Quadro 2.

QUADRO 2 — Partículas e forças


Próton Nêutron Elétron
Força nuclear Sim Sim Não
Força eletromagnética Sim Não Sim

NOTA: Existem também partículas como o elétron, mas com carga elétrica positiva: são os antielétrons
ou pósitrons. Um próton com carga elétrica negativa é um antipróton. Um nêutron com algumas de suas
propriedades invertidas é um antinêutron. Como grupo, esses opostos são as antipartículas. Da mesma
forma que as partículas comuns compõem toda a matéria que nos rodeia, as antipartículas poderiam
compor a antimatéria. Tal antimatéria pode existir em algum ponto do universo, mas nunca pudemos
detectá-la; contudo, os cientistas podem produzi-la em quantidades ínfimas, em laboratório.

ÁTOMOS

Já que os elétrons não estão sujeitos à força nuclear, não podem fazer parte do
núcleo. Não obstante, um elétron é atraído para um próton graças à força
eletromagnética e tende a permanecer perto de um deles. Assim sendo, se um núcleo é
constituído de um único próton, existe a probabilidade de que um único elétron seja
mantido em sua vizinhança pela força eletromagnética. Se houver dois prótons no
núcleo, é provável que sejam dois os elétrons mantidos em sua vizinhança, e assim por
diante.
O núcleo e os elétrons próximos perfazem o átomo. (Átomo vem de uma palavra
grega que significa “inquebrável”, porque quando se começou a lidar com átomos
julgava-se que não pudessem ser decompostos em unidades menores.)
Sucede que a carga do elétron é exatamente igual à do próton (ainda que de
natureza oposta). Portanto, quando existem x prótons no núcleo, a existência de x

4
elétrons nas regiões vizinhas a ele significa que as duas espécies de carga elétrica se
neutralizarão de maneira precisa. Como um todo, o átomo é eletricamente neutro.
Ainda que o elétron e o próton sejam iguais no tamanho da carga elétrica, eles
não têm a mesma massa*. O próton tem massa 1.836,11 vezes maior que a do elétron.
Imaginemos, pois, um átomo com 20 prótons e 20 nêutrons no núcleo e 20 elétrons nas
regiões exteriores. A carga elétrica está equilibrada, porém mais de 99,97% da massa do
átomo se encontram no núcleo.
Entretanto, ainda que o núcleo contenha quase toda a massa de um átomo, ele
constitui uma fração minúscula de seu volume. (Isto é um ponto importante para o tema
deste livro, como haveremos de ver). O núcleo tem um diâmetro de aproximadamente
10-13 centímetros; o de um átomo é de mais ou menos 10-8 centímetros.
Isso significa que o átomo é 100.000 vezes mais largo que o núcleo. Seriam
necessários 100.000 núcleos, postos lado a lado, para cobrir o diâmetro do átomo de que
faz parte. Se o leitor imaginar que o átomo é uma esfera oca e começar a enchê-la de
núcleos, há de verificar que são necessários 1015 (um milhão de bilhões) de núcleos para
enchê-lo.
Consideremos agora dois átomos. Cada um deles tem uma carga elétrica geral
igual a zero. Poderíamos supor, nesse caso, que não se afetariam mutuamente; que, por
assim dizer, não tomariam conhecimento da existência um do outro, no que se refere à
força eletromagnética.
Idealmente seria assim. Se em vários átomos, a carga do elétron estivesse
espalhada com perfeita uniformidade numa esfera em torno do núcleo, e se a carga
positiva do núcleo estivesse uniformemente misturada à carga negativa dos elétrons,
nesse caso a força eletromagnética não desempenharia nenhum papel entre os átomos.
As coisas, entretanto, não sucedem assim. A carga negativa dos elétrons está
presente nas regiões externas do átomo e a carga positiva do núcleo está oculta em seu
interior; quando dois átomos aproximam-se um do outro, é a região externa
negativamente carregada de um deles que está se aproximando da região externa
carregada negativamente do outro. As duas regiões de carga negativa se repelem (cargas
iguais repelem-se), e isso significa que quando dois átomos se aproximam muito, eles se
desviam ou ricocheteiam. Uma amostra de hélio, por exemplo, é constituída de átomos
de hélio separados que giram eternamente um em volta do outro, num mútuo
movimento de ricochete. Em temperaturas normais, os átomos de hélio movem-se com
bastante rapidez e imprimem um ao outro um movimento de ricochete de força
considerável. À medida que a temperatura abaixa, entretanto, os átomos movem-se cada
vez mais devagar e ricocheteiam com crescente fraqueza. Os átomos de hélio juntam-se
mais, o hélio se contrai e seu volume diminui.
Por outro lado, se a temperatura aumenta, os átomos movem-se mais depressa,
ricocheteiam com mais força e o hélio se dilata.
Aparentemente, não haveria limite para a rapidez com que os átomos poderiam
mover-se (dentro do razoável), mas é fácil estabelecer um limite para seu movimento

*
Quando dizemos que um objeto possui massa, queremos dizer que é necessária uma força para fazê-lo mover-se, se está parado,
ou para alterar a velocidade ou o sentido do movimento, se já está se movendo. Quanto mais massa ele possui, mais força é
necessária. Em circunstâncias normais, aqui na superfície da Terra os objetos possuidores de grande massa impressionam nossos
sentidos como sendo “pesados”. Quanto mais massa têm, mais pesados são. Entretanto, massa e peso não são coisas idênticas, e
embora o significado fique claro se dissermos que o próton é muito mais pesado do que o elétron, é mais seguro dizer que “possui
mais massa”.

5
lento. Se a temperatura cair suficientemente, chega-se a um ponto em que eles se
movem tão lentamente que nenhuma energia poderá mais ser tirada deles. A esse nível
de frio alcançamos uma temperatura de zero absoluto, que é igual a -273,18°C.
Ainda que os átomos de hélio tenham uma distribuição de carga que se aproxima
bastante da perfeita simetria, ela não é completamente perfeita. A carga elétrica não se
distribui de maneira exatamente uniforme e, em conseqüência disso, certas partes da
superfície do átomo são um pouco menos carregadas negativamente do que outras. Por
isso, a carga positiva interna do átomo se infiltra pelas áreas menos negativas do
exterior, por assim dizer, e dois átomos vizinhos atraem-se mutuamente com muita
debilidade. Essa débil atração é denominada forças de van der Waals, por ter sido
definida pela primeira vez pelo físico holandês Johannes Diderik van der Waals (1837-
1923). Quando a temperatura cai e os átomos de hélio movem-se cada vez mais
lentamente, a força de ricochete acaba por não ser suficiente para vencer as minúsculas
forças de van der Waals. Os átomos se juntam e o hélio se liquefaz.
As forças de van der Waals são tão fracas no átomo do hélio, altamente
simétrico, que a temperatura tem de cair a 4,3 graus acima do zero absoluto para que o
hélio se torne líquido. Todos os demais gases têm uma distribuição de carga menos
simétrica em seus átomos; por conseguinte, experimentam forças de van der Waals
maiores e se liquefazem a temperaturas mais altas.
Às vezes os átomos podem se atrair de modo mais forte. Nas regiões externas
dos átomos os elétrons dispõem-se em camadas, e a estrutura tem estabilidade máxima
se todas as camadas estiverem cheias. Exceto no caso do hélio e de alguns elementos
semelhantes, em geral os átomos têm sua camada mais exterior incompleta ou possuem
alguns elétrons de sobra, depois de completada aquela camada.
Existe, por isso, uma tendência para que, no momento da colisão de dois átomos,
haja uma transferência de um ou dois elétrons do átomo em que são excedentes para
aquele em que faltam, o que deixa ambos com as camadas mais externas completas.
Mas, nesse caso, o átomo que recebe elétrons ganhou uma carga negativa e o que
perdeu elétrons não pode mais equilibrar completamente a carga de seu núcleo,
ganhando com isso uma carga positiva. Os dois átomos apresentam, então, tendência

para se Pode
aglutinarem.
ocorrer ainda que dois átomos, ao colidirem, partilhem elétrons, o que
ajuda a preencher a camada mais externa de ambos. Assim, os dois átomos passam a
apresentar suas camadas mais externas completas, desde que permaneçam em contato.
Em ambos os casos — transferência ou partilha de elétrons — é preciso uma
energia considerável para separar os átomos, e circunstâncias normais eles permanecem
juntos. Tais combinações de átomos são chamadas moléculas, de uma palavra latina que
significa “pequeno objeto”.
Às vezes, dois átomos em contato bastam para produzir estabilidade. Dois
átomos de hidrogênio formam uma molécula de hidrogênio; dois átomos de nitrogênio,
uma molécula de nitrogênio, e dois átomos de oxigênio, uma molécula de oxigênio.

todas asÀscamadas;
vezes, é apreciso que de
molécula mais de dois
água átomos entrem
é constituída de umem contato
átomo para completar
de oxigênio e dois
átomos de hidrogênio; a molécula de metano compõe-se de um átomo de carbono e
quatro átomos de hidrogênio; a molécula de bióxido de carbono é constituída por um
átomo de carbono e dois átomos de oxigênio, e assim por diante.

6
Em alguns casos, uma molécula pode ser formada por milhões de átomos. Isso
acontece porque os átomos de carbono, em particular, são capazes de partilhar elétrons
com até quatro outros átomos diferentes. Por conseguinte, é possível a formação de
longas cadeias e complicados anéis de átomos de carbono; tais cadeias e anéis formam a
base das moléculas que caracterizam o tecido vivo. As moléculas de proteínas e de
ácidos nucléicos, no corpo humano e em todas as demais coisas vivas, são exemplos
dessas macromoléculas (macro é uma palavra grega que quer dizer “grande”).
As combinações de átomos em que os elétrons são transferidos podem acarretar
a formação de cristais, nos quais os átomos existem em incontáveis milhões,
enfileirados em colunas uniformes.
De modo geral, quanto maior a molécula e quanto menos uniforme for a
distribuição da carga elétrica na mesma, mais provável será a reunião de muitas
moléculas e a formação de substância líquida ou sólida.
Todas as substâncias sólidas que vemos são mantidas fortemente coesas pelas
interações eletromagnéticas que existem, primeiro, entre elétrons e prótons, depois entre
diferentes átomos e, por fim, entre diferentes moléculas.
Além disso, essa capacidade que a força eletromagnética apresenta em manter
juntas miríades de partículas estende-se em direção ao exterior, indefinidamente. A
interação nuclear, que envolve uma atração que se dissipa com extrema rapidez ao
aumentar a distância, só é capaz de gerar o pequeníssimo núcleo atômico. A força
eletromagnética, que se dissipa lentamente com a distância, é capaz de amalgamar
qualquer coisa, desde partículas de pó a montanhas; pode produzir um corpo do
tamanho da Terra e corpos ainda muito mais colossais.
A força eletromagnética está intimamente relacionada conosco, e de maneiras
mais complexas que simplesmente nos possibilitando, e ao planeta em que vivemos, ser
mantidos coesos. Toda mudança química é resultado de deslocamentos ou
transferências de elétrons de um átomo para outro. Isso inclui os delicadíssimos e
versáteis deslocamentos e transferências nos tecidos de seres vivos, como nós. Todas as
mudanças que ocorrem dentro de nosso corpo — a digestão dos alimentos, a contração
dos músculos, o crescimento de novo tecido, os impulsos nervosos, a geração de
pensamentos no cérebro — são o resultado de mudanças sob o controle da força
eletromagnética.
Alguns deslocamentos de elétrons liberam considerável energia; a energia de
uma fogueira, da queima de carvão ou óleo, assim como a energia produzida dentro do
tecido vivo, resultam de mudanças sob o controle da força eletromagnética.

DENSIDADE

Ao se separarem os átomos ou moléculas de um dado fragmento de matéria,


devido ao aumento da temperatura ou por qualquer outro motivo, passa a haver menos
massa num determinado volume fixo daquela matéria. Acontece o oposto se os átomos
ou moléculas se juntarem mais.

7
A quantidade de massa por volume dado é dita densidade; em outras palavras,
quando a matéria se expande sua densidade diminui; quando a matéria se contrai, sua
densidade aumenta.
Usando o sistema métrico, os cientistas medem a massa em gramas e o volume
em centímetros cúbicos. Para darmos um exemplo típico de densidade, um centímetro
cúbico de água tem massa de um grama. (Não é por coincidência; as duas unidades de
medida foram definidas na década de 1790 para se ajustarem dessa maneira). Isso
significa que podemos dizer que a água tem uma densidade de 1 grama por centímetro
cúbico ou, abreviadamente, 1 g/cm3.
As mudanças de densidade não são apenas questão de dilatação ou contração.
Substâncias diferentes têm densidades diferentes devido à própria natureza de suas
estruturas.
Os gases apresentam densidade muito inferiores às dos líquidos porque são
constituídos de átomos ou moléculas separadas, com pequena atração uns pelos outros.
Enquanto as moléculas dos líquidos estão praticamente em contato, os átomos ou as
moléculas dos gases movem-se rapidamente, ricocheteando uns nos outros e assim
permanecendo bastante separados. A maior parte do volume de um gás é constituída do
espaço vazio entre os átomos e moléculas.
Por exemplo, uma amostra de hidrogênio gasoso preparada na Terra, a
temperaturas e pressões normais, teria uma densidade de aproximadamente 0,00009 (ou
9 x 10-5) g/cm3. A água líquida é um pouco mais de 11.000 vezes mais densa que o
hidrogênio gasoso.
A densidade do hidrogênio poderia ser tornada ainda mais baixa se fosse
permitido às moléculas de hidrogênio (ou átomos separados, no caso) se separarem
mais. No espaço exterior, por exemplo, há tão pouca matéria que só existe, em média,
um átomo de hidrogênio em cada centímetro cúbico. Nesse caso, a densidade do espaço
exterior seria alguma coisa semelhante a 0,0000000000000000000000017 g/cm3 —
praticamente nenhuma, na verdade. A densidade da água é cerca de 600 bilhões de
trilhões de vezes maior que a do espaço exterior.
Diferentes gases tendem a diferir em densidade. Em condições semelhantes, os
átomos e moléculas que compõem os gases estão separados por um espaço vazio
praticamente igual. A densidade depende então da massa dos átomos ou moléculas
individuais. Se um gás é composto de moléculas com o triplo da massa das moléculas
de outro, nesse caso a densidade do primeiro é três vezes maior que a do segundo.
Por exemplo, um gás com uma molécula de massa particularmente grande é o
hexafluoreto de urânio. Cada molécula compõe-se de um átomo de urânio e seis átomos
de flúor e o conjunto tem massa 176 vezes maior que as moléculas de hidrogênio, com
seus dois átomos de hidrogênio. O hexafluoreto de urânio é um líquido que se
transforma em gás com pequeno aquecimento, e a densidade do gás é de
aproximadamente 0,016 g/cm3. A água líquida é apenas 62,5 vezes mais densa que esse
gás.

Ainda assim,
principalmente qualquer
por espaços gás,
vazios. Se mesmo
tal gás foro comprimido
hexafluoreto—de
porurânio, é colocado
exemplo, formado
num recipiente fechado cujas paredes sejam então empurradas uma em direção à outra
— as moléculas são empurradas mais para perto uma das outras e a densidade aumenta.

8
O mesmo efeito é produzido com eficiência ainda maior se a temperatura for
baixada. As moléculas de gás se ajuntam mais, e a uma determinada temperatura,
suficientemente baixa, o gás se transforma em líquido, no qual as moléculas ficam
praticamente em contato.
Se o hidrogênio é esfriado a temperaturas baixíssimas, ele não só se liquefaz,
como, a 14 graus acima do zero absoluto, congela. As moléculas não só estão em
contato, como também permanecem mais ou menos fixas no lugar, de modo que a
substância é agora um sólido.
O hidrogênio sólido é a substância sólida menos densa que existe, com uma
densidade de 0,09 g/cm3 — um décimo da densidade da água sólida. Contudo, apesar de
sua baixa densidade, o hidrogênio sólido é apenas cinco vezes mais denso que o
hexafluoreto de urânio, um gás densíssimo.
De modo geral, a densidade dos líquidos e dos sólidos também aumenta ao
aumentar a massa dos átomos e moléculas individuais que os compõem. Um sólido
constituído de átomos de grande massa é geralmente mais denso que um sólido
composto de átomos de menor massa. Entretanto, a regra não é invariável. No caso dos
sólidos a situação é mais complexa que no caso dos gases.
A massa comparativa de diferentes átomos é dada por um número conhecido
como peso atômico. O peso atômico do hidrogênio é de aproximadamente 1, de modo
que o peso atômico de qualquer outro átomo nos dá uma idéia aproximada do número
de vezes que ele é mais pesado que um átomo de hidrogênio. O átomo de alumínio, por
exemplo, tem um peso atômico de aproximadamente 27, enquanto o átomo de ferro tem
um peso atômico de cerca de 56. O átomo de ferro tem 56 vezes a massa de um átomo
de hidrogênio e pouco mais do dobro da massa de um átomo de alumínio.
O ferro, no entanto, tem uma densidade de 7,85 g/cm 3, ao passo que a do
alumínio é de 2,7 g/cm3. O ferro é quase três vezes mais denso que o alumínio.
Se o ferro se compõe de átomos com massa duas vezes maior que os de
alumínio, por que o ferro tem densidade três vezes maior? Por que não apenas duas
vezes maior?

espaço Aque
resposta está em
é ocupada queelétrons
pelos outros fatores
de um intervêm; por átomo
determinado exemplo,
e oa fato
quantidade de
de certas
disposições atômicas serem mais compactas do que outras. Os átomos cujos elétrons
giram a uma distância grande do núcleo central são menos densos do que seria de se
esperar de sua massa; que está, afinal, concentrada no minúsculo núcleo. Os elétrons
representam quase que apenas espaço vazio, e se eles se estendem para fora e ocupam
mais espaço, a densidade diminui.
Assim, o césio, com um peso atômico de 132,91, tem uma densidade de apenas
1,873 g/cm3, pois seus elétrons ocupam grande quantidade de espaço. Os átomos de
cobre, muito mais compactos e com um peso atômico de 63,54, menos da metade do
peso atômico do césio, dão ao cobre uma densidade de 8,95 g/cm3, quase cinco vezes
superior à do césio.
Portanto, se desejarmos conhecer a substância com maior densidade conhecida
devemos procurar entre átomos de grande massa, mas não necessariamente entre
aqueles de massa máxima. O elemento de ocorrência natural que possui átomos de
maior massa é o urânio, com um peso atômico de 238,07. Sua densidade é alta — 18,68
g/cm3, dobro da do cobre — mas não estabelece um recorde: há nada menos que quatro

9
elementos com densidade maior, os quais, juntamente com o urânio, estão listados no
Quadro 3 em ordem de densidade crescente.

QUADRO 3 — Elementos de alta densidade


Elemento Peso atômico Densidade (g/cm3)

Urânio 238,07 18,68


Ouro 197,0 19,32
Platina 195,09 21,37
Irídio 192,2 22,42
Ósmio 190,2 22,48

O ósmio, um metal raro, mantém o recorde. Dentre os materiais que compõem a


crosta terrestre ou que dela podem ser obtidos, é o mais denso. Imagine-se um lingote
de ósmio puro, com 15 cm de comprimento, 5 cm de largura e 2 cm de espessura; não é
muito, mas esse lingote pesaria 3,37 kg.

GRAVITAÇÃO

Até aqui estendemo-nos longamente sobre as forças nuclear e eletromagnética e


deixamos de lado a força fraca, considerando-a relativamente sem importância para
nossos objetivos. Contudo, praticamente não fizemos menção à força gravitacional — e
ela é a mais importante de todas, no que se refere ao tema deste livro. Na verdade,
falaremos tanto dela que seria conveniente pouparmos algum esforço e nos referirmos à
força gravitacional simplesmente como gravitação, quando isso parecer natural.
A gravitação afeta qualquer partícula com massa, hadríons, léptons e qualquer
combinação deles — o que significa todos os objetos que vemos na Terra e no céu. *
Podemos agora expandir o Quadro 2, transformando-o no Quadro 4 pelo acréscimo da
força fraca e da gravitação.

QUADRO 4 — As partículas e as quatro forças


Próton Nêutron Elétron
Força nuclear Sim Sim Não
Força eletromagnética Sim Não Sim
Força fraca Não Não Sim

Força gravitacional Sim Sim Sim


*
Há certas partículas sem massa que não são afetadas, no sentido comum do termo, pela gravitação. Por exemplo, as partículas de
luz e de radiações semelhantes, chamadas fótons (de uma palavra grega que significa “luz”), não têm massa. Outro exemplo são
certas partículas sem carga elétrica, denominadas neutrinos. Ambas aparecerão mais tarde, neste livro.

10
Dentre todas as forças, a gravitação é de longe a mais fraca, como mostramos no
Quadro 1. Podemos demonstrar isso, ao invés de simplesmente afirmá-lo, com cálculos
matemáticos simples.
Suponhamos dois objetos dotados de massa, sozinhos no universo. A força
gravitacional entre eles pode ser expressa por uma equação elaborada pela primeira vez
em 1687, pelo cientista inglês Isaac Newton (1642-1727), e que é:

Gmm'
Fg =
(Equação 1)
d2

Nessa equação, Fg é a intensidade da força gravitacional entre os dois corpos, m


é a massa de um dos corpos, m’ é a massa do outro corpo, d a distância entre eles e G a
constante gravitacional universal.
Cumpre termos cuidado com nossas unidades de medida. Costuma-se medir a
massa em gramas e a distância em centímetros. G é medido em unidades um pouco mais
complicadas, com que não precisamos nos preocupar aqui. Se usarmos gramas e
centímetros, terminaremos determinando a força gravitacional em unidades chamadas
dinas.
O valor de G é fixo, pelo que sabemos, em todas as partes do universo *. Seu
valor nas unidades que estamos empregando para ele é de 6,67x10 -8, ou 0,0000000667.
Suponhamos que os dois corpos em questão estejam separados por exatamente 1 cm, de
modo que d = 1 e que, portanto, d = d x d = 1 x 1 = 1. Nesse caso, pois, a Equação 1
torna-se:

Fg = 6,67.10 8 mm'

(Equação 2)

Suponhamos agora que estamos lidando com um elétron e um próton. A massa


do elétron (m) é de 9,1x10-28 gramas. A massa do próton (m’) é de 1,7x10-24 gramas. Se
multiplicarmos esses dois números e multiplicarmos o produto por 6,67x10-8,
terminamos com um produto final de 1x10 -58 dinas, ou
0,0000000000000000000000000000000000000000000000000000000001 dinas.
(Temos aí um exemplo do motivo pelo qual os cientistas preferem usar números
exponenciais e não os decimais comuns).
Podemos, por conseguinte, dizer que para um próton e um elétron separados por
1 cm a atração gravitacional entre eles pode ser representada como:

Fg = 1.10 58

dinas (Equação 3)

Passemos agora para a força eletromagnética e montemos uma equação para sua
intensidade entre dois objetos carregados eletricamente, sozinhos no universo.

*
Há uma certa discussão a respeito disso, assunto que será abordado mais adiante.

11
Exatamente cem anos depois de Newton haver elaborado a equação para a força
gravitacional, o físico francês Charles Augustin de Coulomb (1736-1806) conseguiu
demonstrar que uma equação muito semelhante poderia ser empregada para determinar
a intensidade da força eletromagnética. A equação é:

qq' (Equação 4)
F =

e
d2

Nessa equação, Fe é a intensidade da força eletromagnética entre os dois corpos,


q é a carga elétrica de um corpo, q’ é á carga elétrica de outro e d é a distância entre
eles. Também neste caso a distância é medida em centímetros, e se medirmos a carga
elétrica nas chamadas unidades eletrostáticas não será necessário adotar um termo
análogo à constante gravitacional, desde que os objetos estejam separados pelo vácuo.
(Como estou supondo que os objetos se acham sozinhos no universo, é claro que há um
vácuo entre eles). Além disso, se usarmos essas unidades obteremos para F e um
resultado também expresso em dinas.
Se, mais uma vez, supusermos que os dois objetos em questão acham-se a 1 cm
2
de distância
seguinte um do outro, d é novamente igual a 1 e a equação pode ser escrita da
maneira:

Fe = qq' (Equação 5)

Suponhamos ainda que esses corpos sejam um elétron e um próton. As duas


partículas possuem cargas elétricas iguais (muito embora sejam de sinais contrários),
sendo cada uma dessas cargas de 4,8xl0 -10 unidades eletrostáticas. O produto qq’ é igual
a 4,8x10-10 x 4,8xl0-10 = 2,3x10-19 dinas.
Portanto, para um elétron e um próton separados por 1 cm, a força
eletromagnética entre eles é de:
19 (Equação 6)
Fe = 2,3.10 −

dinas

Se desejarmos saber o quanto a força eletromagnética é mais forte que a força


gravitacional, temos de dividir Fe por Fg. Como em nossos exemplos ambas as
intensidades estão sendo medidas em dinas, essas unidades se cancelarão mutuamente e
teremos como resultado um número “puro”, um número sem unidades.
Se dividirmos a Equação 6 pela Equação 3, teremos:

Fe 2,3.10 19 −

= = 2,3.10 39 (Equação 7)
Fg 1.10 58 −

12
Em outras palavras, a força eletromagnética é
2.300.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000 vezes mais forte que a força
gravitacional.
Para termos uma idéia da enormidade dessa diferença de intensidade,
suponhamos que representemos a força gravitacional por uma massa de 1 grama. Que
massa teríamos então de usar para representar a força eletromagnética? Teria de ser uma
massa igual a um milhão de corpos com a massa de nosso Sol.
Suponhamos, ainda, que a intensidade da força gravitacional seja simbolizada
por uma distância igual à largura de um átomo. A intensidade da força eletromagnética
teria então de ser representada por urna distância mil vezes maior que a largura de todo
o universo conhecido.
A gravitação, portanto, é a mais fraca das quatro forças. Mesmo a chamada força
fraca é 10.000 trilhões de trilhões de vezes mais forte que a gravitação.
Não é de admirar, assim, que os físicos nucleares, ao estudarem o
comportamento das partículas subatômicas, levem em consideração a força nuclear, a
força eletromagnética e a força fraca, mas ignorem inteiramente a força gravitacional. A
gravitação é tão fraca que simplesmente nunca influencia o rumo dos acontecimentos no
interior dos átomos e dos núcleos atômicos num nível mensurável.
Também é esse o caso na química: em todas as considerações das várias
mudanças químicas no corpo e no ambiente não-vivo, só é preciso levar em conta a
força eletromagnética — dedicando-se algum interesse à força nuclear e à força fraca,
no caso da radioatividade, mas nunca à força gravitacional. A gravitação é tão fraca que
não causa nenhum efeito mensurável nas mudanças químicas comuns.
Nesse caso, por quê não poderíamos simplesmente esquecer a gravitação?
Porque, seja como for, ela existe e porque, apesar de sua incrível debilidade, ela
se faz sentir. Percebemos sua influência toda vez que levamos um tombo. Sabemos que
se cairmos de uma pequena altura (digamos, da janela do terceiro andar até o chão) é
muito provável que venhamos a morrer por causa do puxão da gravitação. Sabemos que
é a gravitação que mantém a Lua em órbita ao redor da Terra e a Terra em redor do Sol.
Como é possível que uma força tão pequena tenha tais efeitos?
Consideremos novamente as quatro forças. A força nuclear e a fraca diminuem
tão depressa com a distância que não há necessidade de as levarmos em conta fora de
objetos como os núcleos atômicos.
A força eletromagnética e a gravitacional, no entanto, só diminuem na razão do
quadrado da distância, e esse ritmo de diminuição é suficientemente lento para
possibilitar que ambas as forças se façam sentir a grandes distâncias.
Contudo, há uma diferença crucial entre as duas forças. Existem dois tipos
opostos de carga elétrica e, até onde sabemos, apenas uma espécie de massa.
No caso da força eletromagnética, há atrações (entre cargas diferentes) e
repulsões (entre cargas iguais). Sendo a força eletromagnética tão forte como é, a
poderosa
um granderepulsão
númeroentre
delascargas iguais tende
em qualquer lugar.a dispersá-las, impedindopoderosa
A atração igualmente a acumulação
entre de
as
cargas de sinais contrários tende a juntá-las, neutralizando-as. No fim, as cargas
positivas e negativas (que se acham presentes no universo em quantidades iguais, ao que

13
sabemos) ficam inteiramente misturadas, e em nenhum lugar existe mais que um
minúsculo excesso de qualquer uma dessas cargas sobre a outra.
Por isso, embora a interação eletromagnética seja poderosa e esmagadora ao
manter os elétrons na vizinhança do núcleo e ao manter reunidos os átomos vizinhos,
um pedaço de matéria com dimensões razoáveis tem pouquíssima atração ou repulsão
eletromagnética por outro pedaço de matéria de dimensões razoáveis a alguma
distância, uma vez que em ambos objetos as duas diferentes espécies de carga acham-se
tão bem misturadas que os dois corpos terminam por apresentar uma carga geral
aproximadamente igual a zero.*
Todavia, já que só existe uma espécie de massa, só existe uma atração
gravitacional. Ao que sabemos, não existe nada que se poderia chamar de repulsão
gravitacional. Todo objeto com massa atrai todos os outros objetos, com massa, e a
força gravitacional total entre dois corpos quaisquer é proporcional à massa total dos
dois corpos tomados em conjunto; não existe limite superior. Quanto maior a massa dos
corpos, maior será a força gravitacional que atua entre eles.
Consideremos um objeto como a Terra, que possui massa igual a 3,5x10 51 vezes
a de um próton. Em outras palavras, a Terra tem uma massa 3.500 trilhões de trilhões de
trilhões de trilhões de vezes maior que um próton. Por conseguinte, a Terra produz um
51
campo
maneiragravitacional
de olharmos que é 3,5x10
a situação vezes
consiste emmaior que oque
considerar de toda
um simples
partículapróton. Outra
na Terra que
possui massa — todos os prótons, nêutrons e elétrons — é fonte de um pequeno campo
gravitacional, e que todos esses pequenos campos se juntam para formar o campo
gravitacional total da Terra.
A Terra possui também campos eletromagnéticos, para os quais todos os prótons
e elétrons agem como fonte. Os campos dos prótons e dos elétrons tendem a cancelar-
se, no entanto, de modo que o campo magnético da Terra é pequeníssimo. É suficiente
para afetar a agulha da bússola e para desviar partículas carregadas provenientes do Sol
e de outros corpos celestes, mas é terrivelmente fraco para um objeto do tamanho
enorme da Terra, constituído de tantas partículas carregadas.
Assim, muito embora a força gravitacional seja muito mais fraca que a força
eletromagnética,
Terra, como um quando
todo, é semuitíssimo
consideram partículas isoladas, a força gravitacional da
maior que sua força eletromagnética. A força
gravitacional da Terra é bastante forte para que a sintamos inequivocamente e até para
nos matar, se não tivermos cuidado.
O enorme campo gravitacional da Terra é capaz de interagir com o campo menor
da Lua, de modo que os dois corpos se mantêm fortemente unidos. Forças
gravitacionais mantêm juntos os planetas e o Sol. Há forças gravitacionais mensuráveis
entre os planetas e entre diferentes estrelas.
Na verdade, é a força gravitacional, e apenas ela, que mantém o universo e dita o
movimento de todos os seus corpos; todas as demais forças têm influência localizada.
Somente a força gravitacional, que é de longe a mais fraca de todas, guia os destinos do
universo — através da combinação de atuar a distância e só exercer atração.

*
É possível remover alguns elétrons de um objeto por fricção, deixando-o com uma pequena carga positiva, ou acrescentar alguns
elétrons, deixando-o com uma pequena carga negativa. Tais corpos podem atrair-se ou repelir-se mutuamente ou a outros objetos,
mas a força envolvida é inconcebivelmente pequena comparada ao que seria se todas as partículas carregadas em qualquer um dos
corpos pudesse exercer sua plena força eletromagnética.

14
Em particular, é a força gravitacional que representa a chave para qualquer
consideração dos buracos negros. Portanto, já estamos no caminho que leva a eles.
Estudemos com cuidado os marcos dessa estrada.

15
Os Planetas

A TERRA

Um dos primeiros marcos na estrada que conduz ao buraco negro (embora nem
por sonhos fosse considerado como tal na época) foi a determinação da massa da Terra,
o que foi efetuado através da força gravitacional.
Newton havia determinado que a intensidade do campo gravitacional produzido
por qualquer objeto é proporcional à sua massa. Com efeito, essa é outra maneira de se
definir massa: aquela propriedade da matéria que produz um campo gravitacional.
Não foi assim que eu defini massa no começo deste livro. Eu a descrevi como
aquela propriedade da matéria que faz com que seja necessário usar uma força, de
alguma espécie, a fim de produzir uma mudança no movimento da matéria, seja em
velocidade ou direção. Quanto maior a força necessária para produzir uma certa
mudança no movimento, maior será a massa do corpo ao qual a força é aplicada.
A primeira definição de massa, dada acima, é às vezes denominada massa
gravitacional. A segunda, por envolver a relutância da matéria em sofrer uma mudança
em seu movimento, propriedade essa chamada inércia, é denominada massa inercial. A
gravitação e a inércia parecem ser duas propriedades inteiramente diferentes, e não
parece haver qualquer razão para se supor que as duas espécies de massa devessem ser
exatamente iguais e que, sempre que uma massa tivesse o dobro da inércia de outra,
teria também um campo gravitacional de intensidade duas vezes maior. Não obstante, é
assim que as coisas parecem suceder. Ninguém pôde jamais mostrar qualquer distinção
entre a massa gravitacional e a massa inercial, de modo que atualmente não se discute
que sejam idênticas.
Assim, o campo gravitacional da Terra exerce uma força sobre um corpo em
queda livre, de modo que ele passa por uma mudança em seu movimento, ou
aceleração, caindo cada vez mais depressa. Como a massa inercial e a massa
gravitacional são iguais, podemos supor que o aumento de velocidade com que um
objeto cai pode ser usado para medir a intensidade da gravitação da Terra.
Essa aceleração foi medida pela primeira vez na década de 1590, pelo cientista
italiano Galileu Galilei (1564-1642). Ela é igual a 980 cm por segundo por segundo.
Isso significa que a cada segundo um corpo em queda livre está se movendo 980 cm por
segundo mais depressa do que estava no segundo anterior.
Voltemos agora à equação de Newton:

Gmm'
F =
d2 (Equação 8)

onde F é a intensidade do campo gravitacional e, portanto, o valor da aceleração de um


corpo em queda livre, o qual, como eu disse, é conhecido há muito tempo. G é a

16
constante gravitacional, m é a massa do corpo que cai, m’ é a massa da Terra e d é a
distância entre o corpo e a Terra. O que nos interessa realmente é a massa da Terra, de
modo que vamos alterar a equação lançando mão das habituais técnicas algébricas, de
modo a isolar m’ na porção esquerda da equação. Temos então:

Fd 2 (Equação 9)
=

m' Gm

Se tivermos valores para todos os símbolos do membro direito da equação


podemos multiplicar o valor de F pelo valor de d, multiplicar o produto novamente por
d, dividir esse resultado por G, dividir o quociente por m e isso dará o valor de m’, a
massa da Terra.
Bem, isso parece fácil, pois realmente dispomos do valor de F, como acabei de
explicar. Temos também o valor de m, a massa do corpo em queda livre, pois podemos
simplesmente pesá-lo numa balança, para encontrar sua massa em gramas.
A distância entre o corpo que cai e a Terra é um pouco complicada. Newton
mostrou que quando um corpo produz um campo gravitacional, esse campo se comporta
como se fosse produzido por toda a massa do corpo concentrada em seu centro de
gravidade. Quando um corpo possui forma e propriedades que preenchem certas
condições de simetria, o centro de gravidade encontra-se no centro geométrico do corpo.
Essas condições de simetria prevalecem para a Terra e para todos os corpos
mensuráveis que conhecemos no universo.
Isso significa que a Terra age como se seu campo gravitacional se srcinasse em
seu centro; d, portanto, representa a distância que vai do corpo em queda livre até o
centro da Terra, e não até a superfície do planeta. Se o corpo estiver perto da superfície
da Terra, então a distância será igual ao raio da esfera da Terra naquele ponto.
Esse valor foi demonstrado pela primeira vez mais ou menos em 240 a.C. por
um geógrafo grego chamado Eratóstenes (276-192 a.C.) que determinou o tamanho da
esfera terrestre
determinou através
medindo do ângulo
o ângulo de curvatura
com que os raios dodaSol
Terra, o em
caíam qual,diferentes
por sua partes
vez, ele
da
superfície da Terra ao mesmo tempo. O raio da Terra (a distância desde a superfície até
o centro) é igual a 637.000.000 de centímetros.
Temos agora os valores de F, m e d, mas até fins do século XVIII não tínhamos
o valor de G, e até obtermos esse valor não podíamos usar a Equação 9 para calcular m’,
a massa da Terra.
Há algum meio pelo qual possamos determinar o valor de G?
Bem, se G for verdadeiramente universal, suponhamos então que meçamos o
campo gravitacional entre duas bolas de chumbo e que façamos uso de outra forma da
Equação 8. Técnicas algébricas permitem converta-la em

Fd 2
G =
(Equação 10)
mm'

17
Podemos facilmente medir a massa de cada uma das bolas de chumbo, o que nos
fornece os valores de m e de m’. Podemos medir também a distância entre elas, e isso
nos dá o valor de d. Se pudermos então medir também a força gravitacional entre elas e
obter F, poderemos resolver a equação e calcular o valor de G. Depois poderemos
colocar o valor de G na Equação 9 e calcular imediatamente a massa da Terra.
Encontramos aí outra dificuldade. As forças gravitacionais são de tal forma
fracas, em relação à massa, que é preciso um objeto de massa descomunal, como a
Terra, para se ter um campo gravitacional suficientemente intenso para se medir
facilmente. Antes de podermos trabalhar com objetos pequenos o bastante para serem
levados ao labora tório, precisamos de algum dispositivo que possa medir essas forças
ínfimas.
O necessário aprimoramento na mensuração ocorreu com a invenção, em 1777,
da balança de torção, por Coulomb (aquele mesmo que definiu a Equação 4). Nesse tipo
de balança medimos forças minúsculas fazendo-as torcer um fio ou um arame fino. Para
se detectar a torção é preciso prender ao fio vertical uma longa barra horizontal
equilibrada no centro. Mesmo uma torção minúscula, quase imperceptível, produziria
um movimento mensurável na extremidade da barra. Se o fio utilizado for bastante fino
e a barra bastante longa, podemos medir a torção provocada pelos ultraminúsculos
campos gravitacionais de objetos de tamanho comum.
O fio ou arame, entendamos, é elástico, de modo que existe dentro dele uma
força que tende a destorcê-lo. Quanto mais ele for torcido, maior se torna a força de
destorção. Por fim, esta equilibra a força de tensão e a barra assume uma nova posição
de equilíbrio. É medindo-se a extensão em que a barra se torceu para alcançar um novo
equilíbrio que se determina a intensidade da força que age sobre ela.
Em 1798 o químico inglês Henry Cavendish (1731-1810) tentou a seguinte
experiência:
Começou com uma barra de 180 cm de comprimento e colocou em cada
extremidade dela uma bola de chumbo com 5 cm de diâmetro. Em seguida suspendeu a
barra com um fio metálico fino, preso a seu centro.
Depois Cavendish pendurou uma bola de chumbo com pouco mais de 20 cm de
diâmetro de um lado de uma das bolas de chumbo menores, na extremidade da barra
horizontal. Pendurou outra bola semelhante do lado oposto da outra bola de chumbo
menor. O campo gravitacional das bolas grandes serviria agora para atrair as pequenas e
girar o fio, dando-lhe uma nova posição. Pela mudança representada pela nova posição,
comparada com a antiga, Cavendish poderia medir a minúscula força gravitacional entre
as bolas de chumbo. (Evidentemente, Cavendish fechou tudo isso numa caixa e tomou
todas as precauções para evitar que o fio fosse agitado por correntes de ar).
Cavendish repetiu a experiência várias vezes, até se convencer de que tinha uma
boa medida para F. Como não havia nenhum problema em medir a massa das bolas de
chumbo ou as distâncias entre as bolas grandes e as pequenas, ele já dispunha dos
valores de m, m’ e d. Agora podia calcular o valor de G na Equação 10, e foi o que ele
fez.
Empregando aprimoramentos das experiências de Cavendish, acreditamos hoje
que a massa da Terra seja de 5,983x1027 gramas, ou aproximadamente 6.000 trilhões de
trilhões de gramas.

18
Podemos determinar a densidade de qualquer objeto dividindo sua massa por seu
volume. O volume da Terra tinha sido calculado corretamente, ou quase corretamente,
com base no número determinado por Eratóstenes para a circunferência da Terra. Tendo
Cavendish determinado a massa de nosso planeta, foi possível, portanto, calcular
imediatamente a densidade média da Terra —5,52 g/cm3.

OS OUTROS PLANETAS

A importância da determinação da massa da Terra está não apenas nesse cálculo


em si, mas também no fato de que ela permitiu aos astrônomos determinar a massa de
grande número de outros objetos no universo.
Temos, por exemplo, a Lua, o único satélite da Terra, que se encontra a 384.000
quilômetros de nós e que gira em torno da Terra uma vez a cada período de 27 1/3 dias.
Mais precisamente, tanto a Terra como a Lua giram em torno de um centro de
gravidade comum. Exigem as leis da mecânica que a distância entre cada corpo e seu
centro
tivesse de gravidade
a metade da esteja
massarelacionada com sua
da Terra estaria massa;
duas vezesemmais
outras palavras,
distante se a Lua
do centro de
gravidade do que a Terra; se tivesse uma massa três vezes menor, estaria três vezes mais
longe, e assim por diante.
A posição do centro de gravidade do sistema Terra-Lua pode ser determinada
pelos astrônomos, que o situam a cerca de 1.650 km sob a superfície da Terra e a cerca
de 4.720 km do centro de nosso planeta. (Não nos esqueçamos de que é o centro que
importa no que tange a questões gravitacionais). A Lua gira em torno daquele ponto, e o
mesmo faz a Terra, cujo centro bamboleia em torno desse ponto a cada 27 1/3 dias.
O centro de gravidade está 81,3 vezes mais distante do centro da Lua que do
centro da Terra, de modo que a massa da Lua é igual a 1/81,3 ou 0,0123 da massa da
Terra. Portanto, a massa da Lua é de 7,36x1025 gramas, mas é mais fácil expressar o
valor como uma fração da massa da Terra.
Os astrônomos podem também determinar a massa dos outros planetas do
sistema solar em relação à da Terra; uma das maneiras de fazê-lo consiste em comparar
o efeito do planeta sobre seu satélite como o da Terra sobre a Lua.
O tempo que um pequeno satélite leva para completar sua órbita em torno do
planeta depende apenas de duas coisas: da distância do satélite até o centro do planeta e
da intensidade do campo gravitacional do planeta.
Por exemplo, Júpiter possui um satélite, Io, que se encontra quase exatamente à
mesma distância de Júpiter que a Lua da Terra. Entretanto, Io circunda Júpiter em 1 3/4
dias, ao passo que a Lua circunda a Terra em 27 3/4 dias.
Pode-se calcular que a gravitação de Júpiter deve ser 318,4 vezes mais intensa
que a da Terra para que possa fazer Io circundar aquele planeta tão depressa. Em outras
palavras, Júpiter deve ter uma massa 318,4 vezes maior que a da Terra. Usando esse
método e outros, pode-se determinar a massa de todos os objetos do sistema solar.
No Quadro 5 temos as massas e as densidades dos nove planetas do sistema
solar, bem como de nossa Lua, em ordem de distância do Sol.

19
QUADRO 5 — Massa e densidade dos planetas
Massa (Terra = 1) Densidade (g/cm3)
Mercúrio 0,055 5,4
Vênus 0,8 15 5,2
Terra 1 5,52
Lua 0,0123 3,3
Marte 0,108 3,96
Júpiter 317,9 1,34
Saturno 95,2 0,71
Urano 14,6 1,27
Netuno 17,2 1,7
Plutão 0,1 4

A intensidade do campo gravitacional de cada um desses corpos é proporcional à


sua massa, e como o leitor pode ver, a Terra não possui de modo algum a maior
intensidade gravitacional ou a maior massa entre os planetas do sistema solar. Há quatro
planetas com maior massa do que a Terra — Júpiter, Saturno, Urano e Netuno. Júpiter é
o gigante do sistema planetário: sua massa é aproximadamente 2,5 vezes maior que a
dos outros oito planetas juntos.
A intensidade do campo gravitacional de cada planeta (ou de qualquer corpo)
diminui com o quadrado da distância, o que significa que a intensidade relativa do
campo gravitacional de dois corpos de massa diferente permanece a mesma a qualquer
distância.
Por exemplo, para uma nave espacial a 1 milhão de quilômetros do centro de
Júpiter o arrasto gravitacional de Júpiter seria 317,9 vezes maior do que seria o arrasto
gravitacional da Terra, se a nave estivesse a 1 milhão de quilômetros do centro da Terra.
Se a nave aumentasse sua distância do centro de Júpiter de 1 para 2 milhões de
quilômetros, o campo gravitacional de Júpiter passaria a ter um quarto da intensidade
que tinha antes. Se o mesmo fosse feito com relação à Terra, o campo gravitacional da
Terra também teria um quarto da intensidade na nova posição, em relação à anterior. O
campo de Júpiter, na nova localização da nave, continuaria a ser 317,9 vezes mais forte
do que o campo da Terra no novo ponto.
O campo gravitacional de Júpiter seria 317,9 vezes mais forte que o da Terra em
todo par de pontos correspondentes. Mas, e se os pontos não corresponderem?
Há um momento importante em que seríamos forçados a permanecer a uma
distância do centro de um planeta diferente da distância do centro de outro. Ocorreria
esse caso quando estivéssemos na superfície de um planeta e depois na superfície de
outro, e os dois planetas fossem de tamanhos diferentes.
Podemos demonstrar isto mais claramente comparando a Terra com a Lua, uma
vez que o homem já esteve em ambos e pôde confirmar a teoria.

20
A massa da Terra é 81,3 vezes maior do que a da Lua, e para posições a iguais
distâncias do centro de cada corpo a intensidade do campo gravitacional da Terra é
sempre 81,3 vezes maior que a da Lua.
Suponhamos, porém, que estejamos sobre a superfície da Lua; estamos, então, a
1.738 km do centro do satélite. Se estivermos de pé na superfície da Terra, estaremos a
6.371 km de seu centro.

A intensidade
superficial gravitacional
(conceito importante na superfície
na história denegros),
dos buracos um corpo
e paraé calculá-la
sua gravidade
temos
que levar em conta as diferenças de distância até o centro. A distância entre a superfície
e o centro da Terra é 3,666 vezes maior que a distância entre a superfície e o centro da
Lua.
A intensidade gravitacional enfraquece com o quadrado da distância, de modo
que a gravidade superficial da Terra torna-se fraca em relação à da Lua segundo um
fator igual a 3,666 x 3,666, ou 13,44. Por isso, temos que dividir a intensidade
gravitacional inata da Terra, que é de 81,3 (comparada com a da Lua) por 13,44, e isso
nos dá um resultado de 6,05.
Assim, embora a Terra tenha uma massa 81,3 vezes maior que a da Lua, sua
gravidade superficial é apenas 6,05 maior. Em outras palavras, a gravidade superficial
da Lua é aproximadamente um sexto da gravidade superficial da Terra.
De modo análogo, podemos calcular a gravidade superficial de todos os corpos
do sistema solar. Os quatro planetas gigantes constituem um problema porque o que
vemos como uma “superfície” é, na verdade, a camada exterior de suas gigantescas
atmosferas, cuja espessura não podemos avaliar com facilidade. Não podemos sequer
ter a certeza de que haja uma superfície sólida ou líquida em algum lugar. Entretanto, se
fizermos de conta que podemos ficar de pé no alto dessa camada de nuvens e se
calcularmos a intensidade do campo gravitacional naquele ponto, podemos chamá-la de
gravidade superficial. Tendo isso em mente, podemos elaborar o Quadro 6.

QUADRO 6 — Gravidade superficial


Gravidade superficial (Terra = 1)
Mercúrio 0,37
Vênus 0,88
Terra 1,00
Lua 0,165
Marte 0,38
Júpiter 2,64
Saturno 1,15
Urano 1,17
Netuno 1,18
Plutão 0,4

21
VELOCIDADE DE ESCAPE

E o campo gravitacional da Terra que faz com que tudo que suba acabe caindo.
Qualquer objeto atirado ao ar com uma dada velocidade está submetido à constante
atração da gravitação da Terra. Por isso ele perde velocidade continuamente, até chegar
a uma parada momentânea em algum ponto acima da superfície da Terra. Nesse ponto
ele começa a cair, ganhando velocidade continuamente, até atingir o chão com a mesma
velocidade com que foi srcinalmente atirado para o alto. *
Se dois objetos forem atirados para cima com velocidades diferentes, o de maior
velocidade levará mais tempo para perdê-la; por conseguinte, subirá mais alto, antes de
começar a descida. Poder-se-ia supor que não importa a velocidade com que um objeto
começasse sua subida, essa velocidade acabaria por ser erodida. O objeto poderia subir
100 km, 1.000 km, mas por fim o implacável arrasto do campo gravitacional se imporia.
Seria assim... se a intensidade do campo gravitacional não enfraquecesse com a
distância.
A gravidade superficial da Terra exerce uma certa força sobre um objeto na
superfície, que está a 6.371 km do centro do planeta. A intensidade da gravitação
decresce quando
sua distância qualquer
em relação aoobjeto
centrosujeito àquela
da Terra. força se ergue
O decréscimo da superfície
de intensidade e aumenta
é proporcional
ao quadrado da distância — mas à distância do centro, não da superfície.
Suponhamos que subamos à estratosfera, a cerca de 35 km sobre a superfície da
Terra. Esta é uma altitude, elevada segundo os padrões normais, mas a distância até o
centro da Terra só aumenta de 6.371 km para 6.406 km. Não é uma grande mudança; a
intensidade gravitacional a essa altitude ainda é de 98,9% da que existe na superfície.
Um homem que pesasse 70 kg na superfície da Terra ainda pesaria 69,23 kg na
estratosfera. Na vida comum não temos consciência de qualquer mudança na
intensidade da gravitação da Terra, de modo que nunca levamos essa mudança em
consideração.
Imaginemos, entretanto, que um objeto suba a uma distância realmente grande
— digamos, a 6.371 km acima da superfície da Terra. Ela estará, nesse caso, a 6.371 +
6.371 ou 12.742 km do centro do globo. Sua distância desse centro terá sido
multiplicada por dois e, com isso, a intensidade gravitacional terá diminuído para um
quarto do que era na superfície.
Se imaginarmos um objeto atirado para o alto com velocidade tal que atinja a
estratosfera antes que essa velocidade se dissipe, veremos então que nos estágios finais
de sua ascensão a intensidade gravitacional é ligeiramente menor do que era nos
estágios iniciais. A perda adicional de velocidade é menor, então, do que seria se a
intensidade da gravitação permanecesse a mesma em todo o percurso. O objeto, sobe
um pouco mais do que seria de se esperar, antes daquela pausa momentânea e do início
da descida.
Imaginemos agora que um segundo objeto seja lançado para o alto com uma
velocidade inicial duas vezes maior que a do primeiro objeto. Quando o segundo tiver
atingido a altura em que o primeiro perdeu toda sua velocidade, ele terá perdido apenas

*
Na verdade, a resistência do ar complica a situação e retarda ainda mais tanto a subida quanto a descida do objeto. Entretanto,
vamos partir do princípio, neste capítulo, de que a resistência do ar não existe. Esse fator envolve uma mudança muito pequena e
não altera a essência de nossa argumentação.

22
metade de sua velocidade. Estará agora movendo-se à velocidade que o primeiro objeto
possuía ao deixar a Terra.
O segundo objeto irá alcançar uma distância adicional igual à distância total
percorrida pelo primeiro objeto?
Não, pois o segundo está agora fazendo sua ascensão adicional através de uma
região de gravitação mais débil. Ele perde velocidade mais lentamente e percorrerá uma
distância maior do que a percorrida pelo primeiro objeto desde a superfície.
Devido ao declínio da intensidade gravitacional com a altura, a duplicação da
velocidade inicial de um objeto atirado para cima mais que duplica a altura por ele
alcançada. No Quadro 7 vemos a altura que os objetos sobem acima da superfície da
Terra com dadas velocidades iniciais.

QUADRO 7 — Corpos em ascensão


Velocidade inicial (km/s) Altura máxima sobre a superfície da Terra (km)
1,6 130
3,2 560
4,8 1.450
6,4 3.100
8,0 6.700
9,6 17.900

Aumentando a velocidade inicial a altura máxima aumenta também, e aumenta


cada vez mais depressa à medida que o objeto entra em regiões de gravitação cada vez
mais fraca. Entre a primeira e a última linha da tabela a velocidade inicial aumentou 6
vezes, mas a altura máxima aumentou 140 vezes.
Chega um ponto em que um objeto sobe tão rapidamente que seu decréscimo de
velocidade iguala-se ao declínio da intensidade gravitacional. Quando ele perdeu
metade de sua velocidade a intensidade gravitacional também caiu à metade, de modo
que, nesse momento, para que a menor intensidade removesse a metade restante da
velocidade seria preciso tanto tempo quanto o necessário para que a plena intensidade
gravitacional eliminasse a velocidade plena. O objeto em ascensão continua a perder
velocidade, mas a um ritmo cada vez mais lento, à medida que a gravitação se torna
cada vez mais fraca. O corpo em ascensão jamais perderá toda sua velocidade e, assim,
dar-se-ia o caso em que aquilo que sobe não cai, porque nunca deixa totalmente de
subir.
A velocidade mínima em que isso acontece é a velocidade de escape.
A velocidade de escape da superfície da Terra é de 11,23 km por segundo.
Qualquer
subirá coisa lançada
e jamais da superfíciecada
cairá, afastando-se da Terra a uma
vez mais dovelocidade igual ou coisa
planeta. Qualquer maiorque
que suba
essa

23
com uma velocidade inicial inferior a 11,23 km/s (sem que lhe seja dado outro impulso,
além daquele que já possui*) retornará a Terra.**
O valor da velocidade de escape depende da intensidade do campo gravitacional;
com o declínio daquela intensidade, diminui também a velocidade de escape. Verifica-
se que, ao aumentarmos nossa distância do centro da Terra, a velocidade de escape
diminui segundo a raiz quadrada daquela distância.

Suponhamos
vezes mais quecentro
longe desse estamos no estaríamos
do que espaço, a 57.400 km do centro
se estivéssemos da Terrada–Terra.
na superfície nove
A raiz quadrada de 9 é 3, e isso significa que a velocidade de escape a uma altura de
57.400 km do centro da Terra é apenas um terço do que é na superfície. Àquela altura
ela é de 11,23/3, ou seja, 3,74 km/s.
A velocidade de escape é diferente de planeta para planeta. Um mundo com
menos massa que a Terra e com gravidade superficial mais baixa apresentará também
menor velocidade de escape de sua superfície.
A velocidade de escape da superfície da Lua, por exemplo, é de apenas 2,40
km/s.
Por outro lado, os planetas com massa maior que a da Terra possuem maiores
velocidades de escape.visível
medidas na superfície No Quadro 8 estão
(ou seja, as velocidades
a camada de revestimento
superior do escape dos vários planetas,
de nuvens, no
caso dos planetas gigantes).

QUADRO 8 — Velocidades de escape dos planetas


Planeta Velocidade de escape (km/s)
Mercúrio 4,2
Vênus 10,3
Terra 11,23
Lua 2,40
Marte 5,0
Júpiter 60,5
Saturno 35,2
Urano 21,7
Netuno 24,0
Plutão 5,0

*
Um objeto que tenha uma velocidade inicial e nenhum impulso adicional está em vôo balístico, e precisa partir com a velocidade
de escape ou mais para se afastar indefinidamente da Terra. Um foguete, porém, pode ser impulsionado continuamente por seus
jatos, de modo que, embora se mova com velocidade inferior à de escape, pode subir tanto quanto queira. Contudo, nos casos em
que seres vivos não estão envolvidos, o movimento no universo é quase sempre balístico, com um impulso inicial e nada mais.
**
Se um objeto se move com velocidade inferior à de escape, porém não menor que 70% dela, e se tem, também um movimento
lateral poderá, nesse caso, não escapar da Terra, mas tampouco voltará à superfície. Poderá estabelecer uma órbita em torno da Terra
e nela permanecer indefinidamente. Um astronauta que orbite em torno da Terra a cerca de 200 km, apenas, acima da superfície
precisa mover-se a, pelo menos, 7,94 km/s a fim de permanecer em órbita.

24
Não surpreende que o gigante do sistema planetário, Júpiter, apresente a maior
velocidade de escape.
Além disso, por ser tão volumoso, Júpiter tem um campo gravitacional que
diminui, com a distância, mais lentamente que o da Terra. Como a superfície da Terra
acha-se a 6.371 km de seu centro, sua gravitação reduz-se a 1/4 de seu valor na
superfície a uma altura de 6.371 km sobre a mesma. A uma altura de 19.113 km da
superfície, a distância do centro da Terra é 4 vezes maior do que era na superfície, e a
gravitação representa apenas 1/16 de seu valor superficial.
A superfície de Júpiter, contudo, está a 71.450 km do centro. Por isso, seria
necessário que se subisse a uma altura de 71.450 km sobre a superfície para que a
gravitação jupiteriana caísse a 1/4 do valor superficial e a 214.350 km para que ela
caísse a 1/16 desse mesmo valor.
A intensidade da gravitação de Júpiter cai tão mais lentamente que a da Terra
que, a distâncias iguais no espaço, a intensidade gravitacional de Júpiter é 317,9 vezes a
da Terra (a que deveria ser, considerando-se as massas comparativas dos dois planetas),
muito embora a gravidade superficial de Júpiter seja apenas 2,64 vezes maior que a da
Terra.
A velocidade de escape de Júpiter também diminui, com a distância, mais
lentamente que a da Terra. A velocidade de escape é apenas 5,4 vezes maior que a da
superfície terrestre. Contudo, a velocidade de escape de Júpiter diminui tão lentamente
com a distância que mesmo a uma altura de 2.000.000 km ela ainda é igual à da
superfície da Terra.

DENSIDADE E FORMAÇÃO PLANETÁRIA

Apesar da grandeza da gravidade superficial e da velocidade de escape de


Júpiter, em comparação com as da Terra, a impressão que fica é a da tenuidade de
Júpiter.
Afinal de contas, a massa de Júpiter é 300 vezes maior que a da Terra e, em
conseqüência disso, o grande planeta tem um campo gravitacional mais de 300 vezes
maior que o da Terra; no entanto, a gravidade superficial de Júpiter é menos de três
vezes superior à da Terra e sua velocidade de escape é menos de seis vezes a do nosso
planeta. A mesma disparidade entre a intensidade gravitacional, de um lado, e a
gravidade superficial e a velocidade de escape, do outro, pode ser vista no caso dos
outros planetas gigantes.
A razão disso é que esses planetas são tão volumosos que suas superfícies (ou
pelo menos as superfícies de seus revestimentos de nuvens) se encontram de quatro a 11
vezes mais distantes de seus centros do que ocorre no caso da Terra.

significaE que
a explicação
a matérianão termina
de que aí: os planetas
se compõem não segigantes têm baixas
acha disposta densidades, oe que
compactamente, sim
dispersa de modo a ocupar um volume maior do que o normal, segundo os padrões da
Terra. Assim sendo, suas superfícies se acham mais distantes do centro do que estariam
se esses planetas fossem mais densos.

25
Imaginemos que a massa de Saturno pudesse ser comprimida, ao ponto em que
sua densidade média fosse igual à da Terra. Se isso acontecesse, Saturno teria sido
comprimido ao ponto em que seu volume seria apenas 1/8 do que é agora. Seu raio seria
apenas metade do que é: 30.000 km, ao invés dos atuais 60.000.
Nessas condições, Saturno ainda teria toda sua massa. Tanto sua massa como a
intensidade de seu campo gravitacional seriam ainda 95,2 vezes maiores que as da
Terra. A superfície ainda estaria mais distante do centro do que ocorre na Terra, porém
não tão distante para que a gravidade superficial fosse não 1,15 vezes maior que a da
Terra, mas 4,60 vezes maior.
Imaginemos que também Júpiter pudesse ser comprimido até a densidade média
da Terra. Seu volume seria apenas 1/4 do que é atualmente e seu raio equivaleria a 5/8
do atual: 44.200 km, ao invés dos 71.400. Com sua massa intacta e sua superfície muito
mais próxima ao centro, a gravidade superficial de Júpiter seria apenas 7 vezes maior
que a da Terra.
Haverá algum outro meio pelo qual possamos nos aproximar do centro de um
planeta e assim aumentar a intensidade gravitacional? Por exemplo, se mergulhássemos
na crosta da própria Terra, a força gravitacional sobre nós aumentaria cada vez mais à
medida que nos aproximássemos do centro?
Não!
Imaginemos que a Terra tivesse uma densidade uniforme de 5,52 g/cm 3 e que
por algum meio pudéssemos mergulhar em sua massa livremente. À medida que
cavássemos, parte da estrutura da Terra estaria sobre nossa cabeça. Na verdade, toda
uma esfera exterior da estrutura da Terra estaria mais longe do centro do que nós. A
matemática de Newton mostrou que essa parte exterior não contribuiria para a força
gravitacional que nos puxa para o centro. Somente a parte da Terra que estivesse mais
próxima do centro do que nós, a qualquer momento determinado, contribuiria para isso,
e essa parte diminuiria progressivamente, à medida que cavássemos mais e mais.
Isso significa que o arrasto gravitacional sobre nós se tornaria cada vez mais
fraco à medida que nos aprofundássemos na Terra, até atingirmos o centro exato do
planeta, quando o arrasto gravitacional seria zero. No centro da Terra, ou de qualquer
mundo esférico, toda a massa do planeta estaria nos arrastando para longe do centro,
uma vez que estaria inteiramente sobre nós. Estaria, entretanto, arrastando para fora
igualmente em todas as direções, e as atrações se cancelariam, deixando-nos com uma
gravidade zero.
Num buraco de grandes dimensões, no centro da Terra ou de qualquer planeta
esférico, a gravidade seria nula em qualquer ponto dentro desse buraco. Já se
escreveram contos de ficção científica em que a Terra era imaginada oca, com uma
superfície interior habitada, iluminada por um objeto de características solares no
centro. São exemplos, as histórias de Edgar Rice Burroughs sobre “Pellucidar”.
Contudo, os habitantes de tal mundo não sentiriam nenhuma atração gravitacional que
os prendesse àquela superfície interior, mas flutuariam livremente no espaço interno —
algo que Burroughs não percebeu.
Não, a única maneira de aumentar a atração gravitacional consiste em comprimir
todo o mundo, apertando toda a massa para que seja possível aproximar-se do centro, ao
mesmo tempo em que se mantém toda a massa entre o cavador do túnel e o centro –
esse conceito é de importância fundamental para a compreensão do buraco negro.

26
A única coisa no universo capaz de assim comprimir um mundo é a própria
gravitação, e isso já aconteceu no passado, quando, por exemplo, da formação dos
planetas de nosso sistema solar.
No princípio, o material de que se formaram os planetas era uma vasta massa de
poeira e gás. A maior parte desse material era hidrogênio, hélio, carbono, neônio,
oxigênio e nitrogênio, com o hidrogênio constituindo cerca de 90% de todos os átomos.
A totalidade desse material, rodopiando lentamente em remoinhos turbulentos e
separados, aos poucos caiu sob a atração, fraca mas sempre contínua, da gravitação
mútua de todos os átomos e moléculas.
Quanto mais o material se juntava, mais era comprimido, mais os campos
gravitacionais das partes constituintes se sobrepunham e se re forçavam. A intensidade
gravitacional aumentava e a compressão adicional acontecia mais depressa... cada vez
mais depressa.
A maior parte do material permaneceu gasosa. O hélio e o neônio continuaram
como átomos separados. Os átomos de hidrogênio combinaram-se em moléculas de dois
átomos, mas permaneceram moléculas separadas. Cada átomo de carbono combinou-se
com quatro átomos de hidrogênio para formar moléculas de metano, que permaneceram
separadas. Cada átomo de nitrogênio combinou-se com três átomos de hidrogênio para
formar moléculas
combinou-se com de amônia,
dois átomosquedepermaneceram separadas.
hidrogênio para formar Cada átomodedeágua,
moléculas oxigênio
que
permaneceram separadas.
Dois elementos moderadamente comuns não subsistiram como átomos
separados nem formaram pequenas moléculas separadas — o silício e o ferro. Os
átomos de silício combinaram-se com átomos de oxigênio, mas, no processo, não
formaram moléculas que permaneceram separadas. Nesse caso, a força eletromagnética
continuou em atuação, juntando sem limite mais e mais combinações silício-oxigênio.
Essas combinações, denominadas silicatos, eram capazes de crescer até o tamanho de
partículas de pó, depois de seixos, pedras e matacões. Acrescentaram-se átomos de
outros elementos capazes de participar da estrutura do silicato: magnésio, sódio,
potássio, cálcio, alumínio etc. É essa mistura de silicatos que forma os materiais

rochosos
Emdageral,
crostaosterrestre,
átomos osde quais
ferro tanto
conhecemos.
se reuniram, juntamente com outros metais, como
cobalto e níquel, que se misturavam com ele livremente.
Assim, enquanto a poeira e o gás giravam na direção de um centro, formando
uma massa cada ver mais densa, constituíram-se pedaços de rocha ou de metal (ou
combinações de ambos), cada vez maiores. Como o metal era mais denso que a rocha,
respondia mais à atração gravitacional; ao se formar um mundo, o metal era puxado
para o centro, formando um núcleo, ao passo que o material rochoso permanecia num
invólucro fora do núcleo metálico.
A Lua e Marte são constituídos basicamente de rocha; Mercúrio, Vênus e a
Terra compõem-se de rocha e metal. Pequenos fragmentos sólidos de matéria ainda se
acham dispersos pelo espaço, e alguns atingem a atmosfera terrestre como meteoros. Se
conseguem vencer a atmosfera e atingir a superfície sólida ou líquida da Terra, passam a
chamar-se meteoritos. Alguns meteoritos são de rocha, outros de metal, outros ainda
uma mistura das duas coisas.
Objetos pequenos, como os asteróides menores, não são suficientemente grandes
para ter um campo gravitacional bastante intenso, que os mantenha coesos. São

27
mantidos assim pela força eletromagnética que existe dentro dos átomos e entre eles,
força que é naturalmente, muitíssimo mais intensa do que a força gravitacional desses
pequenos corpos.
Os átomos e moléculas que permanecem separados e não formam combinações
intermináveis, mantidas eletromagneticamente, não se prendem a mundos por interação
eletromagnética — só podem ser retidos gravitacionalmente. Os átomos e moléculas
separadas que compõem uma atmosfera gasosa são exemplo disso.
Os pequenos mundos carecem de campos gravitacionais suficientemente
intensos para reter tais gases. A Lua, portanto, com uma gravidade superficial
equivalente a somente 1/6 da terrestre, não é capaz de reter moléculas de gás e não
possui atmosfera. Além disso, não é capaz de reter moléculas de líquidos que sejam
voláteis, isto é, que se evaporem e se transformem facilmente em gases; por esse
motivo, a Lua não tem água livre em sua superfície. Mundos ainda menores do que a
Lua também careceriam de atmosferas e líquidos voláteis.
Mercúrio, com uma gravidade superficial 2,3 vezes maior que a da Lua, mas que
vale apenas 3/8 da terrestre, não possui nem atmosfera nem oceanos, ao passo que
Marte, com uma gravidade superficial mais ou menos semelhante à de Mercúrio,
consegue ter uma atmosfera muito rarefeita — com uma densidade equivalente a 0,006
da nossa — juntamente com traços de água.
Por que?
Por causa do efeito da temperatura. Quanto mais alta a temperatura, mais
rapidamente movem-se os átomos e moléculas dos gases, mais aumenta a probabilidade
de que alguns se movam com rapidez maior que a velocidade de escape do planeta que
pertencem, mais provável será que a atmosfera (se existe alguma) venha a dissipar-se no
espaço e menos provável será que essa atmosfera tenha sequer chegado a formar-se.
Quanto mais baixa a temperatura, mais devagar se movem os átomos e as moléculas,
menos provável será que algum se mova com rapidez maior que a velocidade de escape,
menos provável será que a atmosfera se dissipe e mais provável será que essa atmosfera
tenha se formado.
Marte tem a mesma gravidade superficial de Mercúrio, porém se acha quase
quatro vezes mais longe do Sol que aquele planeta, e por isso é apreciavelmente mais
frio. Enquanto a superfície de Mercúrio pode alcançar temperaturas de 350 °C, a
temperatura média na superfície marciana é de apenas 20 °C.
Examinemos o caso de Titã, o maior satélite de Saturno. A gravidade superficial
de Titã provavelmente não passa da metade da de Marte, mas Titã tem uma temperatura
superficial de aproximadamente -180 °C, apenas 90 graus acima do zero absoluto. Por
isso, possui uma atmosfera que parece ser mais densa que a de Marte e que pode ser tão
densa quanto a da Terra.
Quanto menor é a massa de um átomo ou de uma molécula, mais depressa eles
se moverão a uma dada temperatura, mais provável será que escapem para o espaço e
mais difícil será que sejam retidos como parte de uma atmosfera.
Assim, o campo gravitacional da Terra tem intensidade suficiente para reter
átomos de argônio (com um peso atômico de 40). Pode reter também o bióxido de
carbono, uma vez que o átomo de carbono desse composto tem um peso atômico de 12,
e seus dois átomos de oxigênio têm um peso atômico total de 32, o que conduz a um
peso molecular total de 44.

28
Da mesma forma, o campo gravitacional da Terra tem intensidade suficiente
para reter o oxigênio (peso molecular 32) e o nitrogênio (peso molecular 28), mas não o
hélio (peso atômico 4) ou o hidrogênio (peso molecular 2).
Se a acumulação gradual do material que forma um planeta se torna bastante
grande para criar um campo gravitacional bastante intenso e que possa reter até o hélio e
o hidrogênio, o planeta começa então a crescer rapidamente, uma vez que o hélio e o
hidrogênio são os mais comuns dentre os materiais formadores. O planeta, na realidade,
aumenta como uma bola de neve, uma vez que, quanto mais cresce, mais intenso se
torna seu campo gravitacional e mais eficazmente ele pode continuar a coletar mais
hélio e hidrogênio.
Isso acontece com mais facilidade longe do Sol, onde é mais frio e os gases
leves são constituídos de átomos e moléculas que se movem relativamente devagar, o
resultado é a formação dos planetas gigantes Júpiter, Saturno, Urano e Netuno,
relativamente distantes do Sol; eles possuem densidades tão baixas por serem
constituídos basicamente por elementos leves.
Os planetas que se formam nas proximidades do Sol, onde as temperaturas são
mais elevadas, não podem reter os elementos leves: compõem-se principal ou
inteiramente daqueles átomos menos comuns, que podem se juntar pela força
eletromagnética. Por constituem
altas densidades, que isso são os aplanetas menores,
região interna compostos
no sistema de rocha e metais, com
solar.

29
Matéria Comprimida

INTERIORES PLANETÁRIOS

Quando as partículas que compõem um planeta se juntam — formando seixos,


matacões, montanhas e mundos — elas se aquecem. A gravitação produz um
movimento de aceleração de fora para dentro; quanto maiores se tornam os fragmentos
e quanto mais depressa se movem, mais energia cinética (cinética vem de uma palavra
grega que significa “movimento”) possuem. Os fragmentos maiores, planetesimais, que
se chocam com o mundo em crescimento, dispõem de energia para cavar imensas
crateras. Essas crateras são eliminadas pelos impactos e pelas novas crateras cada vez
mais intensas que se seguem, até que finalmente as últimas a se formarem permanecem
indefinidamente.
Vemos as crateras que marcam as últimas colisões na Lua, em Mercúrio, em
Marte e nos dois pequenos satélites marcianos, Fobos e Deimos. Poderíamos
seguramente vê-las em Vênus, se conseguíssemos enxergar além das nuvens, e nos
satélites de Júpiter, se conseguíssemos fotografias com detalhes suficientes.*
Sem dúvida, também a Terra tem sua cota de crateras. Em nosso planeta,
entretanto, a água corrente e a ação dos seres vivos as erodiram, e apenas vestígios delas
podem ser vistos.
Nem toda a energia cinética do impacto acumulativo de corpos em movimento
rápido se perde. A energia não pode ser perdida; só pode ser transformada em outras
formas de energia. Nesse caso, a energia cinética é transformada em calor e se concentra
no centro do mundo que se está formando. Isso se aplica a Terra e, indubitavelmente, a
todos os mundos suficientemente grandes para terem recebido muita energia cinética no
processo de formação. Em última análise, o calor interno é o produto da energia do
campo gravitacional,
formação planetária. ao se concentrar cada vez mais intensamente no processo de
No caso da Terra, coletaram-se provas, há muito tempo, de que o interior é
quente. Quando se cavam minas, a temperatura sobe continuamente com a progressão
do túnel. Há também indícios de calor interno na forma de fontes termais e de vulcões
(os quais, provavelmente, deram ao homem antigo a idéia de um inferno de fogo sob a
terra).
O conhecimento moderno a respeito do interior do planeta decorre da análise das
ondas sísmicas que percorrem o planeta. Pelos caminhos que seguem, pelo tempo que
levam para viajar e pela maneira como realizam ou não mudanças bruscas de direção
pode-se inferir muita coisa com relação às propriedades do interior da Terra. Acredita-
se que a temperatura aumente continuamente em direção ao núcleo, onde a temperatura
poderá chegar a 5.000 °C (quase tanto quanto os 6.000 °C da superfície do Sol).
O fato de o interior da Terra ser candente significa que grande parte de sua
estrutura interna estava (e ainda está) em estado líquido após formar-se e após o planeta

*
Essas fotos e a comprovação dessas crateras foram obtidas com a missão do “Voyager l”, em março de 1979. (N. do T.)

30
ter alcançado mais ou menos suas dimensões atuais. Isso significa que se a Terra fosse
constituída de espécies diferentes de matéria, que não se misturam facilmente umas com
as outras, elas se separariam, as mais densas movendo-se para mais perto do centro e as
menos densas flutuando sobre as mais densas.
Realmente, foi isso o que aconteceu. A Terra compõe-se principalmente de
silicatos rochosos e de uma mistura metálica de ferro e níquel, numa proporção de mais
ou menos nove para um. O metal depositou-se no centro, onde atualmente forma um
núcleo de níquel-ferro; em torno desse núcleo dispõe-se o manto de silicato. O manto é
sólido, pois sua temperatura no ponto mais quente (que é, naturalmente, o mais
profundo) provavelmente não ultrapassa 2.700 °C, que não é suficiente para fundir a
rocha. O núcleo, com uma temperatura consideravelmente mais alta, é quente o
suficiente para fundir o ferro; por isso a Terra tem um núcleo líquido.
O calor no interior da Terra formou-se srcinalmente nos primeiros estágios da
história do planeta — há 4,6 bilhões de anos. Talvez há 4 bilhões de anos tenham
chegado ao fim as grandes colisões dos planetesimais, e muito pouco, no que tange a
mais energia cinética; foi acrescentado à Terra. A gravitação havia terminado sua obra
de formação.
Seria de imaginar que nesses 4 bilhões de anos passados, desde então, o calor
interno
do manto houvesse escapado
e da crosta da Terra
é péssima e todo odeplaneta.
condutora se resfriado.
calor, de modo queRealmente, a rocha
o calor interno só
poderia escapar com grande lentidão, mas 4 bilhões de anos é muito tempo.
Na verdade, porém, a Terra, possui, como parte de seus constituintes, pequenas
quantidades de elementos como urânio e tório que, por meio da força nuclear e da força
fraca, lentamente se decompõem no decorrer das eras e liberam calor. (Depois de 4,6
bilhões de anos de existência na Terra, metade do urânio srcinal e 4/5 do tório srcinal
ainda se acham intactos). O calor liberado por esses elementos radioativos não é muito
grande, mas ele se acumula com o passar dos bilhões de anos; é pelo menos tão grande
quanto a quantidade de calor interno que escapa. Aquilo que começou com a força
gravitacional é agora mantido pelas forças nuclear e fraca; por isso, o interior da Terra
não se resfriará antes que se passem ainda muitos bilhões de anos.

energiaNaturalmente,
um planeta maior Em
que primeiro
a Terra lugar,
deve uma
ter recebido muito mais
cinética no processo de formação. massa total centenas
de vezes maior chocou-se contra o planeta em crescimento. Além disso, em virtude do
campo gravitacional cada vez mais intenso, essas massas colidiram com maior
velocidade. Tanto a massa como a velocidade contribuem para a energia cinética. Por
tudo isso, um planeta de grandes dimensões teria um interior mais quente que o da Terra
(e um planeta pequeno teria um interior mais frio).
Considera-se o caso de Júpiter. Em 1974 e 1975 duas sondas, a Pioneer 10 e a
Pioneer 11, passaram bastante perto do planeta (a 100.000 km de sua superfície) e, pelos
dados recebidos, os cientistas puderam estimar as temperaturas interiores do grande
planeta.
Da camada externa de nuvens até o centro de Júpiter vai uma distância de 71.400
km. Quando se alcança uma profundidade de 2.900 km abaixo da superfície das nuvens
(apenas 4% da distância até o centro), a temperatura já atinge cerca de 10.000 °C, o
dobro da que existe no centro da Terra.

31
A 24.000 km abaixo da superfície das nuvens, um terço da distância até o centro
de Júpiter, a temperatura já é de 20.000 °C. No centro, a temperatura atinge um nível
impressionante — 54.000 ºC, nove vezes a da superfície do Sol.
Entretanto, a interação gravitacional não produz apenas altas temperaturas nos
interiores dos planetas. Produz também elevadas pressões.
Sob a ação do campo gravitacional, as camadas mais externas de um planeta são
atraídas para oe comprimem
para o centro centro e comprimem
as camadasas abaixo
camadas inferiores,
delas. que de
Essa série sãocompressões
também puxadas
se faz
desde a superfície até o centro, cada camada transmitindo a compressão de tudo mais
que está sobre ela e acrescentando a sua própria, de modo que a pressão cresce
continuamente à medida que se penetra num planeta.
A pressão é freqüentemente medida como um certo peso distribuído sobre uma
certa área — por exemplo, o número de gramas que recai sobre um centímetro
quadrado. Tomemos como exemplo nossa atmosfera. Ela é atraída contra a superfície da
Terra, pela gravitação, com intensidade suficiente para comprimir aquela superfície com
considerável pressão.
Cada centímetro quadrado da superfície da Terra recebe a compressão (ou o
peso, como se diz freqüentemente) de 1.033,2 gramas de ar. Podemos dizer, então, que a
pressão do ar (pressão atmosférica) ao nível do mar é de 1.033,2 g/cm2, o que
chamamos de 1 atmosfera. Essa pressão também é exercida sobre nossos corpos, mas
em todas as direções, tanto de fora para dentro como de dentro para fora, de modo que é
cancelada e não tomamos conhecimento dela.
A pressão da água nas profundidades oceânicas é muito maior que a atmosférica,
uma vez que a água é muito mais densa que o ar e existe uma grande massa líquida a ser
puxada para baixo. Na parte mais profunda do oceano a pressão da água é pouco
superior a 1.000.000 g/cm2, ou cerca de 1.000 atmosferas. As criaturas vivas expostas a
tais pressões, tanto de fora para dentro como de dentro para fora, vivem perfeitamente à
vontade nessas condições. (Contudo, se uma criatura das fossas abissais é trazida à
superfície, a pressão interna diminui apenas ligeiramente, ao passo que a externa reduz-
se enormemente. As células do animal rebentam e ele morre. Nós próprios morreríamos,
por motivos inversos, se as pressões sobre nós fossem grandemente aumentadas).
Se considerarmos o interior da Terra, as pressões tornam-se ainda mais elevadas,
pois a rocha e o metal são mais densos do que a água e as profundidades são maiores (as
colunas de rocha e metal que comprimem as camadas inferiores são mais longas que as
colunas de água comprimindo o leito do oceano).
Assim, a uma profundidade de 2.200 km, um terço da distância da superfície ao
centro da Terra, a pressão já é de 1.000.000 atmosferas — mil vezes maior que a da
parte mais profunda do oceano. A uma profundidade de 4.000 km, a pressão é de
2.500.000 atmosferas, e no centro da Terra é possível que atinja 3.700.000 atmosferas.
Essa pressão titânica força o núcleo líquido a se endurecer e a tornar-se sólido no
próprio centro, apesar de sua enorme temperatura, de modo que no interior do núcleo
líquido de níquel-ferro há um pequeno núcleo sólido de níquel-ferro.
Júpiter, naturalmente, também nesse caso apresenta condições mais extremas.
Sua região central tem sobre si colunas de material onze vezes maiores do que o núcleo
da Terra (embora o material de Júpiter seja menos denso que o da Terra) e suporta uma
pressão de até 10.000.000 atmosferas.

32
RESISTÊNCIA À COMPRESSÃO

O que possibilita ao material no interior dos planetas resistir a tamanhas


pressões?
Para respondermos a essa pergunta, consideremos uma mesa sobre cuja
superfície colocamos um objeto, como um livro. A gravitação da Terra atua no sentido
de puxar o livro para baixo. Se esse objeto pudesse mover-se livremente cairia, em
resposta à gravitação da Terra, e continuaria a cair até o centro do planeta, se nada lhe
obstasse o caminho.
Mas há uma coisa que o impede de cair: a mesa. Na verdade, a mesa também é
puxada para baixo, mas é impedida de cair pelo chão onde repousa, o qual, por sua vez,
é impedido de cair pelo piso do edifício, que é impedido de cair pelos alicerces, que são
impedidos...
Se nos concentrarmos apenas no livro e na mesa, por que razão o livro, em
reação à atração da Terra, não cai simplesmente através da mesa?
Isso não pode acontecer, o livro é constituído de átomos, como também a mesa.
As partes exteriores de todos os átomos, tanto do livro como da mesa, são compostas de
elétrons. Isso significa que há uma superfície de elétrons, por assim dizer, no livro e na
mesa.
As duas superfícies de elétrons se repelem, e a força eletromagnética é tão mais
forte que a gravitação que nem toda a enorme atração da Terra é capaz de fazer o livro
atravessar a mesa, vencendo a resistência daqueles elétrons em repulsão. Em outras
palavras, a força gravitacional é neutralizada pela força eletromagnética, alcançando-se
um equilíbrio em que o livro repousa tranqüilamente sobre a mesa, nem a atravessando,
em resposta à atração gravitacional, nem se erguendo sobre ela, em resposta à repulsão
eletromagnética.
Contudo, se o peso dos objetos sobre a mesa se tornar suficiente mente grande,
se um número suficiente de livros de grande massa for empilhado sobre ela, a mesa se
quebrará em algum ponto débil; os átomos que a compõem se soltarão uns dos outros
num ponto em que o cimento eletromagnético for mais fraco.
Se o peso for exercido sobre um outro tipo de objeto — um bloco de cera, por
exemplo — as moléculas da cera, sob a pressão do peso, deslizarão umas sobre as
outras muito lentamente. O bloco se deformará e o peso afundará na cera — não
entrando na substância, mas passando pela superfície srcinal, porque a cera fluirá para
os lados a fim de abrir caminho. (Depois, possivelmente há de refluir sobre o peso).
Ambos os efeitos são produzidos na Terra, sob o peso de suas próprias camadas
superiores. Há fendas, por exemplo, que representam pontos fracos na crosta da Terra.
Na verdade, a crosta terrestre se compõe de várias grandes lâminas que eternamente se
separam, se juntam e se deslocam umas sobre as outras. Um movimento súbito do
material de um lado de uma fenda equivale a um rompimento repentino sob tensão, e
disso resulta
rocha um terremoto.
mais sujeita A alguma
a deformar-se distância
lentamente, comosoba cera,
a superfície, onde o calor
a rocha aquecida, torna a
ou magma,
pode esguichar através de pontos fracos nas camadas mais duras acima dela e produzir
uma erupção vulcânica.

33
À medida que cresce a profundidade no interior da Terra, porém, há menos
chances de fendas e rompimentos e a deformação se torna mais lenta. Alguma outra
coisa deve acontecer a materiais a grandes profundidades e sob grande pressão. Essa
alguma coisa é a compressão.
No laboratório, os cientistas estão familiarizados com os efeitos do aumento da
pressão nos gases. Os gases compõem-se de moléculas que se movem a alta velocidade,
separadas de outras moléculas por distâncias grandes, em comparação com seu próprio
tamanho. Quando os gases são comprimidos, as moléculas se agrupam mais e parte do
espaço vazio é, por assim dizer, eliminado pelo aperto. Então, os gases são facilmente
comprimidos, pela pressão, a volumes menores. Podem ser comprimidos a um volume
igual a um milésimo do srcinal ou menos, antes que todo o espaço vazio seja eliminado
e as moléculas entrem em contato.
Nos líquidos e sólidos, contudo, os átomos e moléculas já se acham em contato
e, por isso, não podem ser comprimidos como os gases, eliminando-se os espaços
vazios. É por isso que quando os líquidos ou sólidos são submetidos à espécie de
pressão suficiente para comprimir os gases nada parece lhes acontecer. Assim, diz-se
que os líquidos e sólidos são “incompressíveis”.
Essa afirmação é suficientemente verdadeira, em condições normais, para
possibilitar
No entanto,as prensas
não hidráulicas
é inteiramente funcionar e as vigas de aço sustentarem arranha-céus,
verdadeira.
Quando se exerce pressão sobre líquidos e sólidos os próprios átomos são
comprimidos; os elétrons são empurrados para dentro, em direção ao núcleo. Isso é feito
até mesmo sob a mais ligeira das pressões — a do livro sobre a mesa, por exemplo. Os
elétrons mais exteriores são empurrados para dentro, ao longo do plano de contato; o
grau em que os elétrons são empurrados para dentro, sob a espécie de pressão que
encontramos na vida diária, é tão microscopicamente pequeno, porém, que não pode ser
mensurado.
Ao serem os átomos comprimidos e os elétrons empurrados para mais perto do
núcleo, aumenta a intensidade da repulsão entre os elétrons dos átomos adjacentes (que
também são empurrados para mais perto uns dos outros, pela pressão). É mais ou menos
como
amboscomprimir
uma molaumquenovo
oferece cada vez maior resistência à compressão. Em
os casos alcança-se equilíbrio. Uma pressão de fora comprime o átomo
ou a mola até que a reação de dentro aumente a um ponto em que há equilíbrio com a
pressão exterior.
Ainda que uma compressão incomensurável baste para a pressão comum,
havendo pressão suficiente a compressão dos átomos se torna mensurável e os elétrons
são empurrados para dentro perceptivelmente. Isso significa que os átomos de
substâncias sob pressão ocupam menos espaço, o que quer dizer que passa a haver mais
massa num volume dado — uma outra maneira de dizer que a densidade aumenta.
Seria de esperar, portanto, que no interior da Terra as densidades das substâncias
que o compõem aumentassem e fossem maiores do que se tais substâncias estivessem
na superfície, submetidas apenas à pressão da atmosfera.
A densidade da substância da Terra realmente aumenta com a profundidade e
com a pressão sobre ela. Assim que Cavendish calculou a massa da Terra, tornou-se
óbvio que nosso planeta não poderia ter a mesma densidade uniformemente — era
forçoso que ele fosse consideravelmente mais denso em suas profundezas do que na
superfície.

34
O oceano tem uma densidade de 1 g/cm 3 e as rochas da crosta externa, ainda que
difiram em densidade, têm uma densidade média de aproximadamente 2,8 g/cm 3. No
entanto, a densidade média da Terra, como um todo, é de 5,52 g/cm3.
Como as camadas externas da Terra têm densidade inferior a 5,52 g/cm 3, as
internas têm de ter densidade superior. Realmente, o centro da Terra consiste em níquel
e ferro fundidos, que de fato são mais densos que as rochas exteriores. A densidade do
ferro, o principal componente do núcleo terrestre, é de 7,86 g/cm 3 aqui na superfície.
Isso tudo, não basta para explicar a densidade média da Terra. O que a explica é o
aumento de densidade através da ação da pressão e da compressão.
O manto da Terra estende-se desde as proximidades da superfície até uma
profundidade de 2.900 km, cerca de 4/9 da distância até o centro. Em toda sua extensão,
a composição química do manto não se altera significativamente, e uma amostra de sua
substância na superfície teria uma densidade um pouco acima de 3 g/cm3. Contudo, sua
densidade cresce continuamente com a profundidade e, no fundo do manto, chega perto
de 6 g/cm3. A densidade média do manto é de 4,5 g/cm3.
A uma profundidade de 2.900 km passa-se do manto rochoso para o núcleo
líquido de níquel-ferro e há um aumento súbito de densidade, já que o ferro é mais
denso que a rocha. Entretanto, embora o ferro tenha uma densidade de 7,86 g/cm 3 na
superfície, sob a pressão
sua parte inferior, do manto de 2.900
é de aproximadamente km de
9,5 g/cm3 espessura a densidade do ferro, em
. A densidade aumenta ainda mais ao
penetrarmos no núcleo, e no centro da Terra ela é de mais ou menos 12 g/cm3. A
densidade média do núcleo é de 10,7 g/cm 3. Contudo, até mesmo a densidade máxima
do núcleo ainda é de aproximadamente metade da densidade do ósmio na superfície da
Terra. Se o núcleo da Terra fosse feito de ósmio, a pressão levaria sua densidade a cerca
de 30 g/cm3.
(Observei anteriormente que se a Terra tivesse uma densidade uniforme, a
atração gravitacional diminuiria progressivamente, ao penetrarmos sob a superfície,
chegando a zero no centro. Mas devido à desigualdade de densidade no interior da Terra
as coisas não se passam exatamente assim. Uma parte tão grande da massa terrestre se
concentra em seu relativamente pequeno núcleo líquido — e esse núcleo contém 31,5%

da massa ligeiramente
aumenta da Terra em 16,2% de seu volume
ao penetrarmos — que
na Terra. Na averdade,
atração gravitacional,
no momento em na verdade,
que nos
encontrássemos, por hipótese, no limite entre o manto e o núcleo, a atração
gravitacional sobre nós seria 1,06 vezes maior do que na superfície. Contudo, ao
penetrarmos no núcleo, a atração gravitacional finalmente começaria a diminuir,
atingindo zero no centro).
No centro da Terra os átomos têm apenas cerca de 85% do diâmetro que têm na
superfície. Os elétrons foram comprimidos em cerca de 15% em direção ao núcleo
central, e isso basta para criar uma pressão de dentro para fora suficiente para equilibrar
os piores efeitos que a atração gravitacional da Terra, exercendo pressão para dentro,
poderia causar. Isso é outra indicação do grau em que a força eletromagnética é mais
intensa do que a gravitacional.

35
ESTRELAS

Vemos, portanto, que todos os objetos, pelo menos até o tamanho de Júpiter, são
estáveis graças à força eletromagnética.
Para começar, as moléculas individuais de gás, as pequenas partículas de pó e as
partículas sólidas maiores que alcançam as dimensões de seixos, pedras e montanhas,
tudo isso é mantido coeso apenas pela força eletromagnética. A força gravitacional
desses corpos pequenos é desprezível.
Quando começamos a lidar com objetos do tamanho de grandes asteróides, os
campos gravitacionais criados por esses objetos começam a puxar para dentro, com
força considerável, a matéria que os com põem. Por conseguinte, as regiões interiores
são submetidas a uma compressão gravitacional mensurável, e isso se torna mais
verdadeiro à medida que os objetos em consideração aumentam de tamanho: Lua —
Terra — Saturno — Júpiter. Em todos os casos os átomos do objeto são comprimidos
até que o nível de compressão produz uma contrapressão.
O equilíbrio assim estabelecido é essencialmente permanente.
Imaginemos um corpo, como a Terra ou Júpiter, sozinho no universo. A força
gravitacional e a eletromagnética em tal mundo permaneceriam num impasse perpétuo,
e a estrutura material do próprio corpo permaneceria, até onde sabemos, para sempre em
seu estado geral existente. Poderiam ocorrer agitações sísmicas de pequena monta
quando a substância do planeta realizasse pequenos ajustes em sua posição. O planeta
poderia resfriar-se lentamente até não ter mais nenhum calor, no centro ou na superfície,
e seus oceanos e atmosfera poderiam congelar-se, mas essas mudanças são
consideradas, do ponto de vista astronômico, triviais.
Entretanto, o equilíbrio não é entre fenômenos iguais. Embora a força
eletromagnética seja inimaginavelmente mais intensa que a gravitacional, esta última é a
mais importante.
A força eletromagnética, embora colossal e intensa, só atua através do átomo
individual. Cada um dos átomos está comprimido e não pode pedir qualquer ajuda, por
assim dizer, a seus vizinhos, que se acham igualmente comprimidos. Por conseguinte,
quando a resistência máxima à compressão é oferecida por um átomo, ela é oferecida
por todos os átomos submetidos à mesma pressão. Se a pressão aumenta ainda mais,
cada um dos átomos e todos eles juntos são encurralados.
A força gravitacional, no entanto, por mais inacreditavelmente fraca que seja,
acumula-se indefinidamente, à medida que mais e mais se agrupa num só lugar e
enquanto cada pedaço de matéria acrescenta seu próprio campo gravitacional ao total.
Embora a resistência à compressão só possa alcançar um determinado limite, as forças
que produzem a compressão podem aumentar ilimitadamente.
A força eletromagnética resiste à compressão e suporta (com gemidos, podemos
imaginar) as pressões das camadas da Terra, ao serem estas puxadas para o centro pelo
campofantasia)
nossa gravitacional da Terra.
as pressões Elamaiores
muito suportadas
(com gemidos
camadas de ainda mais
Júpiter, agonizantes,
atraídas em
para dentro
pelo campo gravitacional daquele planeta, muito maior.
Bem, nesse caso, o que acontece se juntarmos matéria suficiente para formar um
corpo ainda maior do que Júpiter? Não poderá chegar um ponto em que, tornando-se o

36
campo gravitacional cada vez mais intenso e as pressões no centro ainda maiores, os
átomos encarregados de suportar tudo isso finalmente desmoronem — como uma mesa
que se quebra sob um peso grande demais colocado sobre ela?
Mas poderemos honestamente dizer que são possíveis acumulações de matéria
maiores do que Júpiter? Pode ocorrer que, por algum motivo, Júpiter tenha o maior
tamanho possível para um objeto.

É claromas
observamos, quetemos,
isso não é verdade.
perto Júpiter
de nós, mais pode
perto doser,
quedeJúpiter,
longe, um
o maior
objetoplaneta
ainda que já
maior
– o Sol.
No que toca a dimensões, o Sol está para Júpiter assim como Júpiter está para a
Terra. O Sol tem um diâmetro de 1.391.400 km, ou seja, 9,74 vezes maior que o de
Júpiter. Seriam necessários quase dez planetas de tamanho de Júpiter, lado a lado, para
ocupar a largura do Sol. Por outro lado, seriam necessários onze planetas como a Terra,
lado a lado, para ocupar a largura de Júpiter.
E enquanto Júpiter tem uma massa 317,9 vezes maior que a da Terra, a massa do
Sol é 1.049 vezes maior do que a de Júpiter.
Outra indicação do tamanho enorme do Sol, em comparação com qualquer um
dos planetas,
visível do Sol mesmo Júpiter,
a atração de seuestá na questão
campo da gravidade
gravitacional é apenassuperficial. Na superfície
28 vezes maior que a da
Terra, ou 10,6 vezes a de Júpiter.
A velocidade de escape da superfície do Sol é de 617 km/s — 55 vezes a da
Terra e 10,2 vezes a de Júpiter. Na verdade, mesmo a uma distância de 149,5 milhões de
quilômetros do centro do Sol a velocidade de escape é ainda de 40,6 km/s.
Como 149,5 milhões de quilômetros é a distância do Sol à Terra, segue-se que a
velocidade de escape do Sol, a partir de uma posição na Terra, é consideravelmente
maior que a velocidade de escape da própria Terra. Isso significa que quando um
satélite é enviado à Lua, Marte ou Vênus, a uma velocidade suficiente para libertá-lo da
atração gravitacional da Terra, ele não é necessariamente libertado da atração do Sol.
Tal satélite poderá não circundar a Terra, mas permanece em órbita em torno do Sol.
Até hoje, apenas dois objetos feitos pelo homem atingiram velocidades bastante
grandes para libertá-los não só da Terra como também do Sol: as sondas jupiterianas
Pioneer 10 e a Pioneer 11. Isso foi conseguido fazendo-se as sondas roçarem na
atmosfera de Júpiter e deixando que o campo gravitacional desse planeta lhes desse a
aceleração necessária (sendo a velocidade de escape do Sol, em todo caso, menor à
distância de Júpiter do que à nossa própria distância).
Há diferenças mais importantes entre o Sol e Júpiter. Júpiter é muito maior que a
Terra, mas ainda assim é um planeta. Tanto Júpiter como a Terra são, pelo menos na
superfície, frios, e não seriam visíveis não fosse o fato de refletirem a luz do Sol.
O Sol, contudo, é uma estrela. Ele brilha com luz própria, fulgente e candente.
Será por coincidência que o Sol tem uma massa muito maior do que qualquer
planeta que entre
relacionadas conheçamos,
si? e que também emita luz própria? Ou essas coisas estão
Poderíamos argumentar que o tamanho e a luz têm ralação mútua, e da seguinte
forma:

37
Ao se formar, um mundo converte a energia cinética da queda de seus
componentes em calor, como vimos anteriormente. Quanto maior o mundo, mais
elevado será o calor interno. A Terra é incandescente em seu centro, e Júpiter é ainda
muito mais quente.
O Sol, portanto, sendo muito maior do que Júpiter, seria também muito mais
quente em seu centro suficientemente quente, talvez, para que a região externa não
servisse mais como isolamento suficiente para manter a superfície fria. Poderíamos
argumentar que o calor interno de um objeto do tamanho do Sol seria suficiente para
fluir de dentro para fora o bastante para manter a superfície solar à temperatura de 6.000
ºC.
O problema com essa concepção do Sol e de sua estrutura é que se pode
facilmente demonstrar sua impossibilidade.
O Sol, afinal de contas, está emitindo energia em quantidade enorme, e
evidentemente vem fazendo isto sempre. Parece que o faz há muitos milhões de anos, a
se julgar pelos sinais de vida na Terra. No entanto, se toda a energia possuída pelo Sol
fosse a que ele ganhou através da energia cinética de sua formação ele simplesmente
não teria à sua disposição, nesse caso, energia suficiente para ser o Sol que conhecemos.
Em 1853 o físico alemão Hermann Ludwig Ferdinand von Helmholtz (1821-
1894) tentou calcular qual seria a energia cinética necessária para abastecer a radiação
do Sol. Concluiu que seria preciso que o Sol tivesse se contraído de uma massa de
matéria com 300 milhões de quilômetros de diâmetro até seu tamanho atual, e isso num
período de aproximadamente 25 milhões de anos, para produzir toda a energia que
despendeu nesse tempo.
Com um diâmetro de 300 milhões de quilômetros, no entanto, o Sol teria
preenchido toda a órbita da Terra, que nesse caso teria uma idade máxima de 25 milhões
de anos. Mas isso era impossível. Geólogos e biólogos tinham absoluta certeza de que a
Terra era muito mais antiga.
Isso significava que o Sol estava, na verdade, ganhando energia de alguma outra
fonte que não sua própria contração, que essa energia estava se radiando sob a forma de
luz e calor e que poderia ter radiado durante toda a história da Terra, sem em nada se
resfriar. Durante todo o século XIX, no entanto, não se conseguiu imaginar nenhuma
fonte da qual o Sol estivesse recebendo energia, sem se introduzir na explicação
dificuldades intransponíveis.
A resposta começou a ser dada no fim do século, quando se veio a conhecer a
estrutura do átomo. Descobriu-se o núcleo atômico, e tornou-se claro que existe, dentro
do núcleo, energia muitíssimo maior que aquela existente nos elétrons, dos quais se
derivam as formas mais comuns de energia.
Por conseguinte, o Sol não é de maneira alguma uma bola de fogo comum. É
uma bola de fogo nuclear, por assim dizer. Em algum ponto, em seu centro, as energias
possibilitadas pela força nuclear, mil vezes mais intensa do que a força eletromagnética,
estão sendo aproveitadas de alguma forma.

38
MATÉRIA DEGENERADA

A densidade média do Sol é de 1,41 g/cm3 apenas um pouco superior à de


Júpiter. Trata-se de uma densidade associada aos líquidos e sólidos compostos das
variedades mais leves de átomos. Decididamente, não é uma densidade associada a
gases. Até mesmo o gás mais denso da Terra tem uma densidade apenas um pouco
maior que 1/100 da do Sol.
Além disso, o valor 1,41 g/cm3 representa apenas a densidade média do Sol.
Bem no interior do Sol sua substância, submetida às pressões colossais das camadas
superiores atraídas para baixo pela enorme gravitação do Sol, deve estar comprimida a
uma densidade consideravelmente maior do que a média.
A rigor, as camadas mais externas do Sol são claramente gasosas, uma vez que
podemos ver pelo telescópio, por exemplo, grandes jorros de gás incandescente que
saltam da superfície. Além disso, a temperatura superficial do Sol é de 6.000 °C, e não
conhecemos nenhuma substância capaz de permanecer líquida ou sólida a essa
temperatura, em condições normais de pressão.
O interior do Sol deve ser consideravelmente mais quente que sua superfície,
porém
naturalassupor
pressões
que,serão
sob decerto enormes.aMesmo
essas pressões, aindasolar
substância em fins do comprimida
fosse século XIX parecia
até se
transformar em sólidos ou líquidos incandescentes, e que isso explicasse a alta
densidade do Sol. (Sabe-se hoje que essa explicação é válida para Júpiter).
Contudo, um exame atento das propriedades do Sol, no primeiro quartel do
século XX, deixou claro que ele se comporta como se fosse inteiramente gasoso, até
mesmo no centro. Isto teria parecido inteiramente impossível para os cientistas da
década de 1890, mas, uma geração depois, o fato parecia bastante natural, pois já então
o homem passara a conhecer o interior do átomo. Sabia-se então que o pequenino átomo
é uma estrutura frouxa, de partículas ainda mais minúsculas.
É a seguinte a explicação que veio a ser dada.
Os átomos são comprimidos no centro da Terra e a força de expansão desses
átomos comprimidos é bastante grande par suportar toda a substância das camadas
externas do planeta, como se fossem pequenos Atlas a sustentar o mundo nas costas. Os
átomos são ainda mais comprimidos no centro de Júpiter, e por isso são capazes de
suportar a massa muitíssimo maior desse planeta gigante.
Contudo, até mesmo os pequeninos Atlas têm seu ponto de ruptura. A massa do
Sol, mil vezes maior que a de Júpiter, sob a atração de uma gravitação colossal alcança
e ultrapassa os limites da resistência de átomos intactos. A pressão no centro do Sol é
igual a 100 bilhões de atmosferas, ou seja, 10.000 vezes a de Júpiter.
A contínua acumulação de matéria aumenta a intensidade gravitacional até o
ponto em que ela supera a força eletromagnética que mantém os átomos intactos, e esses
átomos, por assim dizer, “implodem”.
Os envoltórios de elétrons são esmagados sob pressão e os elétrons passam a se
mover sem a restrição dos envoltórios. Juntam-se de modo a formar uma espécie de
fluido eletrônico desestruturado ocupando muito menos espaço do que ocupariam como
parte de envoltórios de átomos intactos. Ao se aglutinarem, a repulsão eletromagnética

39
entre eles aumenta ainda mais; o fluido eletrônico pode resistir mais que os átomos
intactos a uma compressão gravitacional muito maior.
Dentro do fluido eletrônico os núcleos podem mover-se livremente e aproximar-
se uns dos outros muito mais, ao acaso. Podem até mesmo colidir.
Nos átomos comuns, como os que existem na Terra e até no centro de Júpiter os
envoltórios de elétrons atuam como “pára-choques”. Os envoltórios de elétrons de um
átomo
têm denão podem serno
permanecer muito interpenetrados
centro pelos de eles
desses envoltórios, outro;sãoe uma vez que
mantidos os núcleos
relativamente
afastados. Quando os envoltórios de elétrons são esmagados e os elétrons se
comprimem no fluido eletrônico mais compacto, a separação média dos núcleos diminui
consideravelmente.
A matéria em que os envoltórios de elétrons se rompem e em que os núcleos
circulam num fluido eletrônico é chamada de matéria degenerada. Ela pode ser muito
mais densa do que a matéria ordinária. Os núcleos constituem a porção da matéria que
realmente apresenta massa, e são eles os verdadeiros responsáveis pela massa de
qualquer objeto. Se são forçados a se juntar na matéria degenerada mais do que na
matéria comum, passa a haver muito mais massa por volume e, por conseguinte, uma
densidade muito mais elevada.
Apesar dessa alta densidade, porém, os núcleos, ocupando apenas um
milionésimo de bilionésimo do volume dos átomos intactos, ainda podem se mover
livremente, tal como os átomos e as moléculas de gases comuns. Portanto, malgrado sua
elevada densidade, a matéria degenerada age como um gás e apresenta propriedades
características de um gás – um “gás nuclear”, poderíamos dizer.
A primeira análise desse conceito do Sol como um corpo gasoso apareceu em
1907, num livro do astrônomo suíço Jacob Robert Emden (1862-1940). A idéia ganhou
corpo e substância em 1916, com o trabalho do astrônomo inglês Arthur Stanley
Eddington (1882-1944).
Eddington raciocinou que se o Sol fosse composto como uma bola de gás, com
átomos ordinários nas camadas exteriores e átomos esmagados nas camadas interiores,
deveria comportar-se como qualquer outro gás. Quando se estudam os gases em
laboratório, há sempre um equilíbrio entre qualquer força que tenda a comprimir o gás e
a temperatura do gás, que tende a expandi-lo.
No Sol, portanto, a atração gravitacional deveria ser também neutralizada pela
temperatura interna. As dimensões do campo gravitacional do Sol e de seu efeito
compressivo eram conhecidas. Eddington dispôs-se, então, a calcular quais seriam as
temperaturas que o Sol deveria ter a fim de produzir um efeito expansivo que
neutralizasse o efeito compressivo.
Os resultados foram espantosos. As enormes compressões produzidas pela
gravitação solar resultam numa densidade do material, no centro do Sol, que deve orçar
em 100 g/cm3, quatro vezes maior que a do mais denso material na superfície da Terra.
No entanto, mesmo com um núcleo tão denso, o Sol e comporta como se fosse
inteiramente
uma gasoso.
temperatura A temperatura
dessa ordem paradomanter
centro do
o Sol ésuficientemente
de 15.000.000 °C. É necessária
expandido para
produzir uma densidade geral de apenas 1,41 g/cm3 em face de sua gravitação. (O
espantoso com relação a essa densidade, pelo que se vê, não é que seja tão grande, mas
que seja tão pequena).

40
E o que produz uma temperatura tão fantástica no centro do Sol? Na época de
Rutherford era evidente que só a energia nuclear poderia causá-la. As reações nucleares,
nas quais os núcleos absorvem, cedem e transferem hadríons, produzem muito mais
energia do que as reações químicas, com as quais estamos familiarizados, e nas quais os
átomos absorvem, cedem e transferem elétrons. As primeiras envolvem a força nuclear,
que é muito mais intensa do que a força eletromagnética envolvida nas segundas.
A pergunta seguinte, pois, era: quais as reações nucleares que estão envolvidas
na alimentação energética do Sol?
Para se responder a essa pergunta era preciso conhecer alguma coisa a respeito
da constituição química do Sol, para que se pudesse partir de uma idéia razoável quanto
aos núcleos que existem no centro e, portanto, quais as reações nucleares possíveis.
Felizmente, a composição química do Sol pode ser deduzida de uma análise de
sua luz. A luz compõe-se de pequenas ondas, e a luz solar consiste de uma mistura de
luz de todos os comprimentos de onda possíveis.
Átomos diferentes produzem luz com determinados comprimentos de onda, que
são característica exclusiva deles e, ocasionalmente, absorvem luz com exatamente
esses comprimentos de onda. A luz solar pode ser decomposta, por um instrumento
chamado espectroscópio, num espectro em que todos os comprimentos de onda estão
dispostos em ordem*. No espectro existem milhares de raias escuras que representam os
comprimentos de onda que foram absorvidos pelos átomos nas camadas mais externas
do Sol. A posições de tais raias no espectro podem ser determinadas com precisão, e de
acordo com essas posições identificam-se as várias espécies de átomos responsáveis
pela absorção.
Já em 1862 o físico suíço Anders Jonas Angstrom (1814-1874) havia detectado a
presença de hidrogênio no Sol. O conhecimento da composição do Sol aumentou
continuamente e, em 1929, o astrônomo americano Henry Norris Russell (1877-l957)
foi capaz de determinar a composição do Sol em detalhes apreciáveis.
Constatou-se que cerca de 90% de todos os átomos do Sol são de hidrogênio e,
portanto, parece plausível supor que os núcleos no centro sejam predominantemente
núcleos de hidrogênio, formados por um único próton. Por conseguinte, as reações
nucleares necessárias para suprir as vastas reservas de energia irradiadas constantemente
pelo Sol teriam, com quase toda a certeza, de envolver os núcleos de hidrogênio.
Simplesmente não existe qualquer outra espécie de núcleos suficiente para explicar toda
a energia que o Sol vem irradiando em seus 5 bilhões de anos de existência.
Em 1938 o físico germano-americano Hans Albrecht Bether (1906-) empregou o
conhecimento relacionado às reações nucleares em laboratório a fim de determinar o
que poderia estar acontecendo no Sol.
Nas condições de elevadas pressões e densidades do centro do Sol, os núcleos de
hidrogênio — prótons — estão muito agrupados e desprotegidos por envoltórios
intactos de elétrons. Sob a enorme temperatura do centro do Sol, eles se movem com
uma velocidade muito maior do que seria possível na Terra. Essa combinação de
proximidade
força imensa.e Ocasionalmente
velocidade significa que os prótons
permanecem juntos, chocam-se
fundindo-sefreqüentemente e com
num núcleo atômico
maior.

*
Percebemos os diferentes comprimentos de onda da luz como diferenças de cor, e o exemplo mais espetacular de espectro que
ocorre na natureza é o arco-íris.

41
Os detalhes sobre o que acontece podem ser controversos em aspectos
secundários, mas os resultados gerais parecem claros. No centro do Sol os núcleos de
hidrogênio se fundem para formar núcleos de hélio, que ocupam o segundo lugar na
escala de complexidade. Quatro prótons se combinam para formar um núcleo de hélio,
composto de quatro núcleons — dois prótons e dois nêutrons.
Temos aqui, pois, uma diferença fundamental entre um planeta e o Sol.

Em um
compressão planeta oo que
dos átomos, arrasto da um
produz gravitação,
empuxo dadeforça
fora eletromagnética
para dentro, resulta na
de dentro
para fora.
No Sol, o arrasto muito maior da gravitação não pode mais ser neutralizado pela
resistência dos átomos à compressão e os átomos se despedaçam, por assim dizer, sob a
pressão. Ao invés disso, a gravitação contrabalançada pelo empuxo expansivo do calor
produzido por reações nucleares que não são possíveis nas temperaturas e pressões mais
baixas do interior dos planetas.
Sem dúvida há alguma massa crítica abaixo da qual a compressão dos átomos é
suficiente, e o corpo é um planeta; e acima da qual os átomos se despedaçam, entra em
ignição uma reação nuclear e o corpo é uma estrela. Essa massa crítica deve encontrar-
se em algum ponto da variação de massa entre a de Júpiter e a do Sol.
Conhecem-se estrelas que têm massa muito menor que a do Sol. Uma estrela
relacionada em catálogos, como a Luyten 726-8B tem, por estimativa, 1/25 da massa do
Sol; no entanto, podemos vê-la fracamente pela luz débil que emite. Luyten 726-8B tem
uma massa apenas 40 vezes maior que a de Júpiter, mas é uma estrela e não um planeta.
Na verdade, o próprio Júpiter é suspeito, pois emite para o espaço cerca de três
vezes mais energia do que recebe do Sol. De onde virá essa energia extra?
É possível que Júpiter ainda esteja se contraindo ligeiramente, e que a energia
cinética daquela contração seja transformada em calor. É ainda possível que os átomos
no centro de Júpiter estejam submetidos a uma temperatura e a uma pressão que os
estejam levando à beira do ponto de ruptura, que um pouco de fusão de hidrogênio
esteja ocorrendo — apenas o suficiente para explicar aquela pequena emissão extra de
calor do planeta.
Se isso estiver acontecendo, Júpiter está à beira da ignição nuclear. Não há
perigo de ignição real, naturalmente; Júpiter não é bastante grande e permanecerá para
sempre à beira da ignição, apenas.

42
Anãs Brancas

GIGANTES VERMELHAS E
COMPANHEIRAS ESCURAS

Há uma diferença entre planetas e estrelas que, no fim das contas, é mais
importante que o simples fato de os planetas terem menos massa do que as estrelas ou
de os planetas serem frios e opacos, ao passo que as estrelas são quentes e brilhantes.
Os planetas se encontram num estado de estabilidade essencialmente estática. O
equilíbrio entre a gravitação, que puxa para dentro, e o campo eletromagnético de
átomos comprimidos, que empurra para fora, constitui um impasse eterno. Até onde nos
é dado saber, trata-se de um equilíbrio capaz de se manter para sempre, na ausência de
interferência externa. Se estivesse sozinha no universo, a Terra poderia ser gelada e sem
vida, mas sua estrutura física persistiria, talvez para sempre.
As estrelas, contudo, acham-se num estado de estabilidade dinâmica, pois
mantêm sua estrutura à custa de alguma coisa interna que está constantemente
mudando. A gravitação que puxa para dentro é, na verdade, essencialmente imutável,
mas o empuxo da temperatura no centro do Sol, que equilibra aquele arrasto, depende
de reações nucleares que consomem hidrogênio e produzem hélio. O Sol só continua a
ser o que é porque converte continuamente 600.000.000.000 kg de hidrogênio em
595.800.000.000 kg de hélio a cada segundo*.
Por felicidade, há no Sol uma quantidade tão grande de hidrogênio que até
mesmo a essa taxa de conversão não precisamos temer que algo de drástico venha a
acontecer no futuro próximo. O Sol vem consumindo hidrogênio em sua fornalha
nuclear há cerca de 5 bilhões de anos e, ainda assim, resta o suficiente para pelo menos
mais 5 a 8 bilhões de anos.
Entretanto, até mesmo 5 a 8 bilhões de anos não são a eternidade. O que
acontece quando o hidrogênio acaba?
Pelo que os astrônomos podem dizer atualmente, com base em seus estudos das
reações nucleares e da natureza das várias estrelas que podem ver, parece que a redução
do hidrogênio constitui prelúdio para mudanças sensíveis na estrutura de uma estrela.
À medida que o Sol, por exemplo, consumir hidrogênio e acumular hélio no
centro, o núcleo solar se contrairá mais, enquanto núcleos mais pesados concentrarem
ainda mais a porção interna do campo gravitacional. O miolo do Sol se tornará mais
quente e mais denso. Por fim, o calor desse miolo começará a aumentar bruscamente e o
calor adicional obrigará as regiões exteriores do Sol a se expandirem enormemente.
Muito embora o calor total das regiões externas do Sol venha, então, a ser
consideravelmente maior do que é hoje, esse calor se espalhará por uma superfície
imensamente maior. Cada trecho da superfície terá menos calor do que agora e a nova
superfície será mais fria que a atual. Enquanto o Sol possui atualmente uma temperatura

*
Os 4.200.000.000 kg restantes são convertidos na radiação que é despejada continuamente do Sol em todas as direções.

43
superficial de 6.000 °C, a superfície do Sol expandido não terá mais de 2.500 °C, e a
essa temperatura mais baixa ele emitirá apenas um brilho avermelhado. Essa
combinação de tamanho imenso e brilho rubro dá a essa fase da história de uma estrela
o nome de gigante vermelha. Conhecemos atualmente estrelas que já alcançaram essa
etapa, notadamente Betelgeuse e Antares.
Em sua extensão máxima, a gigante vermelha em que nosso Sol se transformará
será suficientemente grande para abranger a órbita de Mercúrio, ou até mesmo a de
Vênus*. A Terra estará então inteiramente inabitável; a vida no planeta ter-se-á tornado
impossível nas primeiras fases da expansão do Sol. (É possível que nessa época a
humanidade, se ainda existir, tenha deixado a Terra para viver em planetas de outras
estrelas ou em colônias artificiais longínquas).
Quando o Sol houver atingido sua expansão máxima como uma gigante
vermelha, ele estará reduzido aos restos finais de seu hidrogênio. O centro do Sol,
todavia, terá então atingido uma temperatura (pelo menos de 100.000.000 °C) suficiente
para fazer com que os átomos de hélio (que nas eras passadas tinham sido formados a
partir de átomos de hidrogênio) fundam-se para formar núcleos ainda maiores, e estes
em outros ainda maiores, até serem formados núcleos de ferro, cada um com 26 prótons
e 30 nêutrons.

equivaleA aquantidade
cerca de de
6%,energia proporcionada
apenas, pela ampliação
da proporcionada adicional
anteriormente peladefusão
núcleos
de
hidrogênio em hélio. Além disso, ao se formar o ferro a história chega ao fim. As
reações nucleares não podem mais proporcionar energia.
Depois que o hidrogênio for consumido, portanto, e a gigante vermelha se
encontrar em sua expansão máxima, o resto de sua vida como objeto alimentado por
reações nucleares tem de ser inferior a um bilhão de anos — ou consideravelmente
menos.
E quando as reações nucleares diminuírem e cessarem, não haverá então nada
que resista à inexorável atração do campo gravitacional produzida pela própria massa do
objeto. A gravitação esteve esperando, paciente e incansavelmente, durante bilhões de
anos; por fim, a resistência a essa atração chegou ao fim e o Sol, inchado, ou qualquer
outra estrela, não pode seguir outro caminho senão o do encolhimento.
E realmente ele encolhe, e é exatamente isso que nos coloca na reta final para o
buraco negro, com dois pontos de parada nos quais temos de fazer uma pausa em nosso
caminho.
A história do primeiro ponto de parada começa com um astrônomo alemão
chamado Friedrich Wilhelm Bessel (1784-1846), um dos primeiros a tentar medir a
distância que nos separam das estrelas e, na verdade, um dos primeiros a ter êxito na
empreitada.
As estrelas têm um movimento próprio, mas esse movimento é aparentemente
pequeníssimo devido à enorme distância em que se encontram. (Por exemplo, um avião
a uma altitude muito grande parece mover-se mais lentamente que um outro a baixa
altitude.)
Além de seu movimento próprio, as estrelas pareceriam mover-se em resposta à
mudança do ângulo do qual são vistas da Terra, à medida que nosso planeta percorre sua
*
É claro que se uma estrela for, para começar, maior do que o Sol, ela se expandirá ainda mais. Antares é tão grande que, se
estivesse no lugar do Sol, sua esfera gigantesca abrangeria as órbitas de Mercúrio, Vênus, Terra e Marte.

44
grande órbita elíptica em torno do Sol. Enquanto a Terra assim gira em torno do Sol,
uma estrela deveria traçar, como reflexo desse movimento, uma elipse minúscula no céu
(desde que subtraiamos o movimento próprio e outros efeitos interferentes). Quanto
mais distante a estrela, menor a elipse, e se o tamanho da elipse (denominada paralaxe)
puder ser determinado por um trabalho muito meticuloso no telescópio, pode-se
determinar a distância da estrela.
Em 1838 Bessel anunciou que havia realizado a tarefa com relação a uma estrela
pouco brilhante chamada 61 Cygni, a qual, conforme se verifica, está a cerca de 150
trilhões de quilômetros da Terra. Mesmo a luz, que viaja a uma velocidade de 299.792,5
km/s, não é capaz de vencer rapidamente essa distância tremenda. A luz leva 11 anos
para vir de 61 Cygni até nós; por conseguinte, diz-se que 61 Cygni está a 11 anos-luz de
nós.
A seguir, Bessel tentou determinar a distância de outras estrelas, e fixou-se em
Sírius que, por diversas razões, parecia estar mais perto do que 61 Cygni. Para começar,
Sírius é a estrela mais brilhante do céu, e esse brilho poderia ser decorrência de sua
relativa proximidade.
Bessel estudou cuidadosamente a posição de Sírius, noite após noite, e observou
a maneira como ela se move lentamente em relação às outras estrelas no curso de seu
movimento
alterasse de próprio, maior do
forma a indicar que a média.
a formação de umaEsperava Bessel
elipse, em que ao
resposta o movimento
movimento se
da
Terra em torno do Sol. A elipse existe, mas superposta a ela Bessel detectou uma
oscilação que evidentemente não tem nada a ver com a maneira pela qual a Terra se
move em torno do Sol.
Após uma análise meticulosa do estranho movimento de Sírius, Bessel concluiu
que ela se move numa elipse própria e que completa o giro daquela elipse em mais ou
menos 50 anos.
A única coisa capaz de fazer uma estrela mover-se numa elipse estranha como
aquela seria o fato de ela responder a um campo gravitacional. Não se conhecia, no
tempo de Bessel, outra coisa capaz de provocar aquela oscilação; aliás, também não
conhecemos ainda. Além disso, um campo gravitacional bastante grande e intenso para
tirar uma
paraestrela
de seuà caminho e forçá-la a descrever
provir de uma
elipse bastante
suficientemente
grande ser medida grande distância deve uma massa grande
para ser outra estrela.
Bessel não conseguia ver nada na vizinhança de Sírius que pudesse servir como
a fonte do campo gravitacional, mas, no entanto, tinha de haver alguma coisa ali. Por
isso, ele concluiu que existia realmente uma massa estelar no lugar certo, mas que ela se
srcinava não de uma estrela brilhante e sim de uma estrela escura. Seria um gigantesco
planeta, de dimensões estelares, por assim dizer. Por conseguinte, os astrônomos
passaram a se referir à “companheira escura” de Sírius.
A seguir, Bessel notou que Procyon, outra estrela brilhante, apresentava também
um movimento oscilante, e, portanto, concluiu que também ela provavelmente tinha
uma companheira escura. Chegou-se a crer que as companheiras escuras fossem
bastante comuns, mas que esse fato fosse mascarado pela impossibilidade de se vê-las
diretamente.
Hoje em dia encararíamos com bastante suspeita tal conclusão. Sabemos que
qualquer objeto com uma massa estelar tem de entrar em ignição nuclear no centro e
arder, para que seja semelhante a nosso Sol. Ter massa estelar e ser escuro, ao mesmo

45
tempo, exigiria um conjunto de condições diametralmente diferentes das que
conhecemos em nosso próprio Sol.
Para Bessel e seus contemporâneos, entretanto, uma companheira escura não
encerrava nada de misterioso. Tratava-se de uma estrela que, por algum motivo, havia
deixado de brilhar. Havia consumido toda sua reserva de energia (qualquer que fosse,
pois Bessel não tinha como saber a respeito de reações nucleares) e continuava a girar,
com o mesmo tamanho de sempre e o mesmo campo gravitacional, mas agora fria e
escura.
Como poderia Bessel ter adivinhado que havia descoberto um objeto
estranhíssimo? Evidentemente, não poderia saber da ligação desse objeto com gigantes
vermelhas, uma vez que a existência delas ainda não fora sonhada em sua época.

SUPERDENSIDADE

As trevas que envolviam as companheiras escuras terminaram em 1862, graças


ao trabalho de
(1832-1897). um estava
Clark fabricante de telescópios
preparando uma lentenorte-americano, Alvan
para um telescópio Graham Clark
encomendado pela
Universidade de Mississipi, pouco antes de começar a Guerra Civil. (Por causa da
guerra, ela não pôde ser entregue e acabou indo para a Universidade de Chicago).
Terminado o polimento da lente, Clark resolveu submetê-la a um teste final,
usando-a realmente para olhar o céu e verificar sua qualidade. Apontou-a para a estrela
Sírius, durante o teste, e observou uma minúscula centelha de luz em suas vizinhanças,
uma coisa que não aparecia em nenhuma carta celeste.
A princípio Clark julgou que a centelha fosse resultado de uma imperfeição da
lente, e que parte da luz de Sírius estivesse sendo desviada. Novos testes, porém,
revelaram que não havia nada de errado com a lente. Tampouco Clark podia fazer
qualquer coisa que levasse a centelha a desaparecer ou mudar de posição. Além disso,
essa posição parecia ser exatamente aquela em que deveria estar, na época, a
companheira escura de Sírius.
A conclusão de Clark foi de que estava vendo a companheira escura. Seu brilho
era muito débil, equivalente a apenas 1/10.000 do de Sírius, mas o objeto não era
inteiramente escuro. A companheira escura de Sírius tinha-se tornado a companheira
pálida e, atualmente, ela é designada como Sírius B, enquanto a própria Sírius pode ser
chamada de Sírius A. Sírius é hoje chamada de um binário, ou sistema estelar duplo.
Em 1895 o astrônomo germano-americano John Martin Schaeberle (1835-1924)
observou um ponto de luz perto de Procyon. Sua “companheira escura” também era
uma companheira pálida, hoje designada Procyon B.
Na verdade, isso não parecia mudar muito a essência das coisas. Significava que,
se as companheiras não eram estrelas totalmente mortas, eram pelo menos estrelas
moribundas; que, embora não inteiramente opacas, sua luz estava se apagando.
Contudo, na época em que Schaeberle observou a companheira pálida de
Procyon, as coisas estavam mudando.

46
Em 1893 o físico alemão Wilhelm Wien (1864-1928) havia demonstrado que a
natureza da luz emitida por qualquer objeto quente (seja ele uma estrela ou uma
fogueira) varia com a temperatura. Podemos estudar os comprimentos de onda da luz
emitida e a natureza das raias escuras no espectro, e chegar a uma conclusão segura
quanto à temperatura do corpo que está emitindo luz.
Segundo a lei de Wien, qualquer estrela que esteja se apagando e que, portanto,
esteja se resfriando e a caminho da escuridão, tem que ter coloração vermelha. No
entanto, Sírius B e Procyon B são brancas — baças, talvez, mas brancas.
O simples estudo visual dessas duas estrelas não bastava. Era preciso um
espectro, de modo que os comprimentos de onda e as raias escuras pudessem ser
estudados em detalhe. Isso não era fácil, já que as companheiras são tão baças e se
acham tão perto de estrelas muito mais brilhantes que tendiam a ser ofuscadas pelo
brilho destas.
Entretanto, em 1915 o astrônomo norte-americano Walter Sydney Adams (1876-
1956) conseguiu fazer a luz de Sírius B passar por um espectroscópio, produzindo um
espectro que ele pôde estudar. Assim que ele analisou esse espectro, não teve dúvidas de
que Sírius B não estava se apagando. Ela é quente, quase tão quente quanto Sírius A e
consideravelmente mais quente que o nosso Sol.
Enquanto Sírius A tem uma temperatura superficial de 10.000 °C, a de Sírius B é
de 8.000 ºC. A temperatura superficial do Sol é de apenas 6.000 ºC.
Pela temperatura de Sírius A sabemos qual o brilho que cada pequena porção de
sua superfície deve ter — quatro vezes mais que uma porção semelhante da superfície
do Sol. Sabemos ainda que brilho deve ter a superfície total, a partir de seu aspecto visto
da Terra, a uma distância de 8,8 anos-luz. Podemos calcular que ela deve irradiar 35
vezes mais luz que o Sol; e que para produzir essa quantidade de luz (considerando a
quantidade que cada pedaço de sua superfície produz), ela deve ter um diâmetro cerca
de 1,8 vezes maior que o Sol, ou seja, de 2.500.000 km.
(Ao fim do século, como vemos, os astrônomos começavam a compreender que
o Sol, que até então reinava como o mais glorioso de todos os corpos celestes e de cuja
energia dependiam todos os seres vivos na Terra é, afinal de contas, uma simples estrela
média e nada mais. Sírius A tem duas vezes o tamanho do Sol, quase o dobro da
temperatura e mais de 30 vezes sua luminosidade. No entanto, não há porquê nos
sentirmos diminuídos. Se Sírius A viesse substituir nosso Sol no céu, seria um luzeiro
realmente brilhante, mas brilhante demais... pois os oceanos da Terra ferveriam e se
evaporariam e, em breve, a Terra passaria a ser um mundo morto).
Contudo, o mistério era Sírius B. Em vista de sua temperatura superficial, cada
porção de sua superfície deveria estar emitindo não muito menos luz do que uma porção
semelhante da superfície de Sírius A. Nesse caso, para explicar porque Sírius B pode ser
tão menos brilhante do que Sírius A, temos de concluir que Sírius B tem menos
superfície — muito menos superfície. Face à temperatura de Sírius B, concluiu-se, que
este objeto deveria ter apenas 1/2.800 da superfície de Sírius A.

1/53 doPara ter talA,superfície,


de Sírius ou 47.000Sírius B deveria
km. Sendo assim,terSírius
um diâmetro
B tem umequivalente a apenas
tamanho planetário,
aproximadamente o mesmo de Urano ou Netuno. Tem apenas 1/3 do diâmetro de
Júpiter e somente 1/30 do volume deste. Na verdade, seu diâmetro é apenas 3,7 vezes
maior que o da Terra.

47
A descoberta de Clarke significava que Sírius B pertencia uma classe de estrelas
totalmente nova — um tipo de estrela de temperatura elevada e ao mesmo tempo de
tamanho ínfimo, em comparação com estrelas comuns como o Sol. Sírius B é uma anã
branca, tal qual Procyn B, como logo se verificou.
Se Sírius B fosse planetária não só em tamanho, mas também em massa, não
haveria como explicar sua elevada temperatura. Objetos com o tamanho e a massa de
Urano ou Netuno simplesmente não têm em seus centros a espécie de pressão suficiente
para alimentar as fogueiras nucleares.
Contudo, não havia possibilidade de Sírius B ter massa planetária, qualquer que
fosse seu tamanho. Não tivesse ela própria uma massa estelar, não poderia fazer com
que uma estrela grande como Sírius A se desviasse de seu rumo em linha reta. Pelo
menos, o desvio não seria tão acentuado.
Com base na distância conhecida de Sírius A e de Sírius B da Terra e de seu
afastamento aparente no céu, podemos calcular a distância que as separa. Sírius A e
Sírius B acham-se afastadas por uma distância média de 3.000.000.000 km, de modo
que a distância média entre os dois objetos é um pouco maior do que a existente entre
Urano e o Sol. No entanto, enquanto Urano leva 84 anos para dar uma volta em redor do
Sol, Sírius B leva apenas 50 anos para completar seu giro em torno de Sírius A.
Pode-se, pois, calcular que a intensidade dos campos gravitacionais de Sírius A e
de Sírius B é de 3,4 vezes os do Sol e de Urano. Isso significa que, em conjunto, Sírius
A e Sírius B têm uma massa 3,4 vezes maior que a massa conjunta do Sol e de Urano
(ou apenas do Sol, pois Urano acrescenta tão pouco à massa solar que pode ser
desprezado).
Na verdade, Sírius B não gira em tomo de Sírius A. As duas estrelas descrevem
órbitas em torno do centro de gravidade do sistema. Poderíamos imaginá-las como as
duas pontas de um haltere girando em torno de algum ponto, o centro de gravidade, ao
longo da barra que as liga. Se as duas esferas do haltere tiverem massa exatamente
igual, o centro de gravidade estará no centro da barra; se uma tiver mais massa que a
outra, o centro de gravidade estará mais perto de uma delas, e em proporção à diferença
de massa.
No caso do Sol e de qualquer um de seus planetas, o Sol tem massa tão maior
que o centro de gravidade está sempre suficientemente perto do centro do Sol para
tornar razoavelmente correto dizer que o planeta gira ao redor do Sol. O mesmo
princípio é válido para dizermos que a Lua gira em torno da Terra — uma vez que a
Terra tem 81,3 vezes mais massa que a Lua e o centro de gravidade do sistema Terra-
Lua está 81,3 vezes mais próximo da Terra, portanto, do que da Lua. O mesmo acontece
quando falamos de qualquer outro sistema de planeta e satélite entre a família de
mundos do Sol.
No caso de Sírius A e de Sírius B, no entanto, a massa está dividida mais ou
menos igualmente, de modo que o centro de gravidade do sistema acha-se quase no
meio da distância entre os dois objetos. As duas estrelas giram em torno desse centro, e
por isso mudam de posição consideravelmente enquanto descrevem essa órbita. (Não
fosse assim, Bessel não teria observado uma ondulação nítida no movimento de Sírius
no céu).
Com base nas órbitas de Sírius A e Sírius B, pode-se determinar o centro de
gravidade das duas estrelas. Pela posição do centro de gravidade em relação às duas
estrelas verifica-se que Sírius A deve ter massa 2,5 vezes maior que a de Sírius B. Como

48
o total da massa das duas estrelas é igual a 3,4 vezes a massa do Sol, vemos que Sírius
A, aquela fulgente estrela em nosso céu, tem 2,4 vezes a massa do Sol, enquanto Sírius
B, aquela centelha quase imperceptível, tem uma massa um pouco menor que a do Sol.
O fato de Sírius A ter 2,4 vezes a massa de nosso Sol não é surpreendente.
Afinal, ela é maior, mais quente e mais brilhante que o Sol. Sírius B, no entanto,
constitui um objeto claramente anormal. Com o tamanho de Urano ou Netuno, tem uma
massa quase semelhante à de nosso Sol.
Isso significa que deve ser um objeto densíssimo. Sua densidade média deve ser
da ordem de 35.000 g/cm3 o que representa uma densidade 3.000 vezes maior que a do
material do núcleo da Terra e 350 vezes maior que a do material do núcleo do Sol.
Na época em que Adams calculou o tamanho de Sírius B, era difícil aceitar
densidades dessa magnitude. No entanto, quatro anos antes da descoberta de Adams,
Rutherford havia descrito a estrutura do átomo e demonstrado que a maior parte de sua
massa se concentra no núcleo ultraminúsculo. Ainda assim, os cientistas não se haviam
habituado à idéia, e o conceito de átomos partidos, com as partes se agrupando muito
mais densamente do que era possível em átomos intactos, era difícil de ser engolido.
Havia considerável ceticismo, portanto, sobre a possibilidade da existência de tais anãs
brancas.

O DESVIO PARA O VERMELHO DE EINSTEIN

Pouco tempo depois da descoberta de Adams, entretanto, elaborou-se uma


maneira de conferir a hipótese de uma direção inteiramente diferente.
Em 1915 o físico Albert Einstein (1879-1955) publicou sua teoria geral da
relatividade, a qual representou uma perspectiva inteiramente nova do universo como
um todo. Segundo essa nova teoria, haveria alguns fenômenos capazes de serem
observados e que não seriam possíveis se as perspectivas mais antigas estivessem
corretas. Por exemplo,
gravitacional quando um
do corpo deveria, corpoade
segundo grande massa
relatividade geral,irradia luz, oefeito
ter algum forte sobre
campoa
luz.
Einstein, ampliando o trabalho realizado em 1900 por outro cientista alemão,
Max Karl Ernst Ludwig Planck (1858-1947), havia demonstrado que se poderia
considerar que a luz consistia não apenas em ondas, mas também em ondas que, em
alguns aspectos, agem como partículas. Essas partículas luminosas são chamadas de
fótons, de uma palavra grega que significa “luz”.
Os fótons têm massa zero quando em repouso e, por conseguinte, não atuam
como fonte de um campo gravitacional nem reagem a um campo gravitacional da
maneira ordinária. Contudo, os fótons nunca estão em repouso, mas viajam (num vácuo)
a uma determinada velocidade precisa: 299.792,5 km/s. (Da mesma forma que todas as
demais partículas sem massa). Ao viajarem a essa velocidade, os fótons possuem certas
energias; e ainda que a ação de um campo gravitacional não possa alterar a velocidade
dos fótons no vácuo (nada o pode fazer), ela pode modificar a direção em que a luz viaja
e reduzir a energia.

49
Essa mudança de direção foi observada em 1919. A 29 de maio daquele ano um
eclipse total do Sol podia ser observado da ilha Príncipe, na costa da África. Estrelas
brilhantes se tornaram visíveis nas proximidades do Sol eclipsado e a luz proveniente
dessas estrelas, a caminho da Terra, passou roçando pelo Sol. A teoria de Einstein
previa que essa luz se curvaria ligeiramente na direção do Sol ao passar por ele, de
modo que as próprias estrelas, avistadas ao longo da nova direção, pareceriam estar
localizadas um pouco mais distantes do disco do Sol do que realmente estavam. As
posições das estrelas foram cuidadosamente medidas durante o eclipse e também seis
meses depois, quando o Sol se encontrava no lado oposto do céu e não podia exercer
nenhum efeito sobre a luz dessas mesmas estrelas. Verificou-se que a luz se comportava
da forma prevista na teoria de Einstein, e esse fato contribuiu decisivamente para
garantir a validade da relatividade geral.
Naturalmente os astrônomos estavam ansiosos por submeter a teoria a novos
testes. O que dizer a respeito da perda de energia da luz num campo gravitacional? A
luz que deixava o Sol devia fazê-lo resistindo à atração da gravitação solar. Se os fótons
fossem partículas ordinárias, dotadas de massa, suas velocidades deveriam decrescer ao
deixarem o Sol. Como os fótons têm uma massa, em repouso, igual a zero, isso não
acontece, mas ainda assim cada fóton perde um pouco de sua energia.
Essa perda de energia deveria ser detectada no espectro do Sol. Quanto maior é o
comprimento de onda de um determinado fóton, menor é sua energia. No espectro, onde
a luz se dispõe em ordem de comprimentos de onda, desde o violeta (com o menor
comprimento de onda) ao vermelho (o maior comprimento de onda), há uma progressão
regular da alta energia do violeta para a baixa energia do vermelho.
Se a luz solar perde energia por resistir à atração da gravidade, toda ela deverá
terminar ligeiramente mais perto da extremidade vermelha do espectro, o que não
aconteceria se não existisse nenhum efeito gravitacional. Esse desvio para o vermelho
poderia ser detectado estudando-se as raias escuras no espectro solar e comparando-se
suas posições com as raias escuras nos espectros de objetos submetidos apenas a
pequenos efeitos gravitacionais — no espectro de objetos brilhantes em laboratórios na
Terra, por exemplo.

Infelizmente,
vermelho einsteinianonão
no havia nenhum
espectro sentido seu
solar, porque em efeito
procurar
é tãoesse desvioque
pequeno para o
nem
mesmo o poderoso campo gravitacional do Sol produz desvio suficiente para ser
medido.
Foi então que Eddington (que estava estudando a estrutura interna do Sol e
acolhia com entusiasmo a teoria da relatividade) observou que se Sírius B é realmente
tão pequena como parece e tem a enorme massa que parece ter, ela poderia ser a
resposta. O que afeta a luz é menos a atração gravitacional total do que a intensidade
dessa atração na superfície, na qual a luz é emitida e onde ela dá o salto inicial para o
espaço.
Ora, a intensidade do campo gravitacional do Sol é 333.500 vezes a da Terra,
mas a superfície do Sol acha-se tão distante de seu centro que a gravidade superficial do
Sol é apenas 28 vezes maior que a da Terra.
E Sírius B? Ela tem a massa do Sol, comprimida num objeto do tamanho de
Urano. Tem a mesma intensidade gravitacional do Sol, mas pode-se estar muito mais
perto do centro de Sírius B ficando-se em pé em sua superfície (apenas em imaginação,
é claro) do que jamais se poderia chegar perto do centro do Sol.

50
Portanto, a gravidade superficial de Sírius B é aproximadamente 840 vezes a do
Sol e 23.500 vezes a da Terra. O desvio einsteiniano para o vermelho seria muito mais
pronunciado na luz de Sírius B do que na luz do Sol.
Eddington sugeriu a Adams, que era o especialista em Sírius B, que estudasse
novamente o espectro de sua luz, a fim de verificar se podia detectar o desvio para o
vermelho. Em 1925 Adams realizou a experiência e viu que realmente podia detectar o
desvio, e precisamente no grau fixado pela teoria de Einstein.
Isso não só proporcionou outra comprovação importante da relatividade geral
como ofereceu também, a estar correta a teoria, forte indício de que Sírius B é realmente
tão pequena e tem tão grande massa como sustentara Adams, pois somente assim ela
pode possuir gravidade superficial suficiente para produzir o desvio para o vermelho
observado.
Em 1925, portanto, a existência das anãs brancas teve de ser aceita. Desde então
não se duvidou mais delas.
A enorme gravidade superficial de Sírius B implica numa enorme velocidade de
escape. Partindo da superfície da Terra, um foguete lançado ao espaço, sem outra fonte
de energia senão seu impulso inicial, tem que sair com uma velocidade mínima de 11,23
km/s, para que deixe a Terra permanentemente. Partindo da superfície do Sol, a
velocidade de escape seria de 617 km/s. Da superfície de Sírius B a velocidade de
escape é de, aproximadamente, 3.300 km/s.
Mesmo 11,23 km/s é uma alta velocidade pelos padrões da Terra. Contudo, uma
velocidade de 3.300 km/s é fantástica: apenas 1/90 da velocidade da luz.

FORMAÇÃO DE ANÃS BRANCAS

Examinemos outra vez o que acontecerá depois que o Sol chegar ao estágio de
gigante vermelha e consumir toda a energia nuclear em seu interior. A atração
gravitacional, não contando mais com a oposição do efeito expansivo do calor,
começará a encolher o Sol (como parece estar fazendo agora com outras estrelas que se
encontram nesse estágio) até um ponto em que a gravitação passe a enfrentar a
resistência de outra coisa além do calor.
À medida que o Sol se encolher, ganhará densidade até chegar ao ponto em que
poderá compor-se de átomos intactos em contato, a exemplo de corpos planetários como
a Terra e Júpiter. No entanto, uma massa de dimensão estelar produz um campo
gravitacional suficientemente forte para esmagar esses átomos. Assim, o encolhimento
continuará. A interrupção do processo, se houver, terá de ser feita pelas partículas
subatômicas que compõem os átomos.
Quais são essas partículas subatômicas, e de que maneira elas mudam à medida

que o Sol (Ou qualquer outra estrela) envelhece?


O Sol, ou qualquer outra estrela, é constituído principalmente de hidrogênio. O
hidrogênio consiste num núcleo composto de um único próton, carregado
positivamente, que é equilibrado por um único elétron, carregado, negativamente, e que
completa o restante do átomo.

51
À proporção que o Sol envelhece, seu hidrogênio pouco a pouco sofre fusão:
quatro núcleos de hidrogênio se fundem para formar um único núcleo de hélio. Uma vez
que um núcleo de hélio é constituído de dois prótons e dois nêutrons (sem carga
elétrica), podemos dizer que quando todo o hidrogênio se houver fundido e
desaparecido, metade dos prótons da estrela ter-se-á transformado em nêutrons. À
medida que os núcleos de hélio sofrem fusão adicional durante a formação da gigante
vermelha, até que finalmente sejam formados núcleos de ferro, mais alguns prótons se
transformam em nêutrons e, por fim, a estrela compõe-se de uma mistura de prótons e
nêutrons na proporção de 45 para 55.
Entrementes, o que acontece com os elétrons?
Toda vez que um próton (de carga positiva) é convertido num nêutron (sem
carga), alguma coisa tem que ser feita com aquela carga positiva. Ela não pode
simplesmente desaparecer. O que ocorre é que ela é ejetada dos núcleos em fusão,
juntamente com uma quantidade mínima de massa. Essa quantidade mínima de massa é
suficiente para produzir uma partícula exatamente igual ao elétron, com a única
diferença de apresentar uma carga elétrica positiva e não negativa. Esse elétron
carregado positivamente é denominado pósitron. Para cada quatro prótons fundidos num
núcleo de hélio, formam-se dois pósitrons.

Assim
presentes que(eseem
no Sol forma
toda um pósitron,
matéria ele forçosamente
ordinária) em número colide com
elevado. um dos
Embora umaelétrons
carga
elétrica positiva não possa desaparecer por si só, da mesma forma que uma carga
elétrica negativa não pode também desaparecer, as duas cargas podem cancelar-se
mutuamente no caso de se encontrarem. Quando um pósitron e um elétron colidem, há
um aniquilamento mútuo, tanto da carga elétrica como da massa, e os dois são
convertidos em fótons energéticos chamados raios gama, que não possuem nem carga
elétrica nem massa.
Dessa maneira, cerca de metade dos elétrons do Sol ter-se-á destruído no curso
de sua vida como uma estrela normal. A metade restante será suficiente para compensar
a metade dos prótons que terão permanecido como prótons.
Na conversão de prótons para nêutrons e no aniquilamento mútuo de elétrons e
pósitrons perde-se massaemsuficiente
sua vida para
comoser
convertida
de fusão nas
vastas quantidades de
radiação que o Sol emite reator de hidrogênio. Um volume
adicional de massa se perde porque o Sol está constantemente emitindo um fluxo de
prótons em todas as direções, o chamado vento solar.
Toda essa perda é trivial em comparação com a massa total do Sol. Ao tempo
em que o Sol, ou qualquer outra estrela isolada, houver completado seu período de
gigante vermelha e estiver pronto para encolher, poderá ter retido até 98% de sua massa
srcinal; é essa massa que começa então a encolher.
Tanto os elétrons, como os prótons e nêutrons têm propriedades ondulatórias,
além de propriedades de partículas. Quanto maior a massa de uma partícula, mais curtas
serão as ondas a ela associadas e mais pronunciadas as propriedades dessa partícula.
Quanto menor a massa, mais longas as ondas e mais pronunciadas as propriedades
dessas ondas.
Os prótons têm muito mais massa que os elétrons — 1.836 vezes mais. Os
nêutrons têm 1.838 vezes mais massa do que os elétrons. Os prótons e os nêutrons estão
associados a ondas curtíssimas e são classificados como partículas de tamanho

52
extremamente diminuto. O elétron está associado a ondas relativamente longas e por
isso ocupa muito mais espaço do que os prótons e os nêutrons.
Quando uma estrela encolhe além do limite imposto por átomos intactos, as
partículas que primeiro entram em contato, por assim dizer, são os volumosos elétrons.
Os elétrons postos em contato acham-se apertados muito mais entre si do que
estariam em átomos intactos. Assim, por exemplo, Sírius B e o Sol têm massas
aproximadamente iguais,
Sol. (É mais ou menos mas aSírius
como B ocupa
diferença apenasocupado
do espaço 1/27.000por
do cem
espaço ocupado
bolas pelo
de pingue-
pongue intactas e pelas mesmas cem bolas reduzidas a pó de plástico).
Não obstante, mesmo depois de os elétrons terem sido postos em contato, os
prótons e os nêutrons muito menores (porém dotados de mais massa) e os núcleos
atômicos por eles constituídos ainda encontrarão muito espaço para se movimentar.
Esses núcleos estão muito mais próximos entre si do que estariam como parte de átomos
intactos, mas ainda estão suficientemente separados para que as distâncias entre eles
sejam enormes, em comparação com seu próprio tamanho.
No que diz respeito aos núcleos, uma anã branca, por densa que seja, ainda se
compõe primordialmente de espaços vazios. Em Sírius B, por exemplo, que quase
poderia ser considerada como um fluido eletrônico contínuo, os núcleos ocupam apenas
1/4.000.000.000 de seu volume. Os núcleos, portanto, mostram as propriedades de
gases.
Uma anã branca, naturalmente, não apresenta estrutura sempre uniforme, tanto
quanto qualquer outro objeto dotado de massa. Encontra-se uma pressão crescente ao se
mover, em imaginação, da superfície para o centro.
Uma anã branca tem uma pele quase normal, uma camada externa de átomos
intactos que são puxados para baixo com força pela intensa atração gravitacional na
superfície, mas que não têm o peso de outras camadas sobre si. Várias espécies
diferentes de átomos podem existir nessa “atmosfera” de uma anã branca — até mesmo
uma pequena quantidade de hidrogênio que, de alguma forma, no decorrer de toda a
vida da estrela, escapou à fusão devido ao fato de aqueles átomos em particular nunca
terem feito parte das profundezas estelares. Essa atmosfera poderá ter apenas algumas
centenas de metros de espessura.
Ao nos imaginarmos mergulhando no material da anã branca, veremos que esses
átomos atmosféricos gradualmente se rompem em elétrons e núcleos, todos movendo-se
livremente. Ali, pequenos restos de reações nucleares continuam a se desenrolar, até que
todo o hidrogênio tenha sido consumido. À medida que continuamos a descer, os
elétrons entram em contato e começam a resistir a uma maior compressão. Quanto mais
forem comprimidos, mais resistem à compressão adicional, e é essa resistência que
finalmente detém a contração da estrela no estágio de anã branca.
No núcleo da estrela o material da anã branca é consideravelmente mais denso
que a média de toda a estrela. A densidade central pode ser da ordem de 100.000.000
g/cm3.
Quando se forma uma anã branca ela é quentíssima porque a energia cinética da
contração foi transformada em calor. Uma anã branca recém-formada pode ter uma
temperatura superficial superior a 100.000 °C.
À medida que a anã branca irradia calor para o espaço circundante, porém, seu
conteúdo energético tem de decrescer, e muito pouco desse decréscimo pode ser

53
compensado pelas reações nucleares nos restos de matéria razoavelmente normal que, a
princípio, permanece nas camadas exteriores. Aos poucos, a anã branca se resfria.
Conhecem-se velhas anãs brancas com uma temperatura superficial não superior a 5.000
ºC.
Essa perda de calor não afeta seriamente sua estrutura.
As estrelas comuns se contrairiam se perdessem calor, uma vez que é o calor
produzido
anã brancano centro
resiste que as mantém
à contração expandidas,
gravitacional com aresistindo aodos
resistência puxão da gravidade.
elétrons Uma
comprimidos,
e isso não depende de calor. Os elétrons resistem à maior compressão com a mesma
eficiência, tanto frios quanto quentes.
Presumivelmente, pois, a perda de temperatura há de continuar, sem qualquer
mudança significativa na estrutura da anã branca, até que ela não seja mais
suficientemente quente para brilhar. Ela se torna uma anã negra e continuará a se
resfriar por eras a fio, até que seu conteúdo energético seja apenas igual à média para
todo o universo — alguns graus acima do zero absoluto.
Este é um processo lentíssimo, e toda a duração do universo até o presente não
foi bastante para que tenha ocorrido o esgotamento total da energia de qualquer anã
branca. Todas as anãs brancas que jamais se formaram ainda fulgem hoje, mas, com o
tempo, haverão de escurecer.
Até este ponto, portanto, só examinamos neste livro dois tipos de objetos eternos
— isto é, objetos capazes de resistir à atração da gravidade por períodos de tempo
indefinidamente longos. Há os objetos planetários, que são de massa suficientemente
pequena para jamais terem iniciado uma fusão nuclear e nos quais a compressão
gravitacional é perpetuamente equilibrada pela força, de dentro para fora, de átomos
intactos comprimidos, situados no centro.
Há, também (ou haverá, algum dia), anãs negras, que possuem massa bastante
grande para ter iniciado uma fogueira nuclear, mas que, com o tempo, se apagaram e
nas quais a compressão gravitacional é perpetuamente equilibrada pela pressão, de
dentro para fora, de elétrons comprimidos.

Sol, nãoTodos os objetos


são objetos que vemos
eternos. no céu,ordinárias
As estrelas fora de nosso
que próprio sistema são
contemplamos solar,estruturas
além do
temporárias que estão ardendo, a caminho da condição de anã negra (ou, como veremos,
de outros objetos ainda mais estranhos).
Podemos ver também nuvens de poeira e gás no espaço interestelar, mas sob a
atração de seu próprio campo gravitacional grande parte dessas nuvens terminará por se
condensar e formar estrelas, iniciando também o longo caminho na direção do estado de
anã negra. Algumas das nuvens poderão, ao se condensar, formar corpos com massa
demasiado pequena para iniciar uma fogueira nuclear, e serão corpos planetários. Se
qualquer parte da nuvem escapar à condensação e se unir ao tênue vapor de átomos
individuais, moléculas e partículas de pó que se estende entre as estrelas e as galáxias,
então esses corpúsculos poderão ser considerados corpos planetários separados
ultrapequenos.
Restam-nos, portanto, os corpos planetários e as anãs brancas como as duas
classes de objetos eternos do universo que até agora examinamos neste livro.
Já se observaram várias centenas de anãs brancas, e esse número não parece
muita coisa entre os bilhões e bilhões de estrelas no céu. Convém recordarmos, porém,

54
que as anãs brancas, ainda que brilhantes para seu tamanho, são de maneira geral
objetos baços. Elas têm somente de 1/1.000 a 1/10.000 da luminosidade das estrelas
ordinárias médias, e por isso não podem ser vistas, a menos que estejam muito perto de
nós.
Se vemos tão poucas anãs brancas é porque às distâncias estelares comuns, onde
estrelas ordinárias ainda são bastante brilhantes para serem vistas e estudadas, as anãs
brancas são baças demais para serem reconhecidas ou até mesmo vistas, talvez. Por isso,
a única maneira de que dispomos para avaliar com justeza o número de anãs brancas
consiste em estudar a vizinhança imediata do Sol.
No espaço contido dentro de 35 anos-luz do Sol, por exemplo, há cerca de 300
estrelas. Dessas, oito são anãs brancas. Supondo-se que esta seja aproximadamente a
proporção habitual no espaço, de modo geral (e não temos nenhum motivo para julgar
que não seja), podemos então dizer que entre 2 e 3% de todas as estrelas são anãs
brancas. É possível que haja nada menos que 4 bilhões de anãs brancas somente em
nossa galáxia.

55
Matéria em Explosão

A GRANDE EXPLOSÃO

Por que existirão tantas anãs brancas? Por que elas serão em número de 4
bilhões somente em nossa galáxia?
Afinal de contas, uma estrela não se transforma em anã branca antes de haver
consumido todo seu combustível nuclear, e nosso Sol, por exemplo, dispõe ainda de
combustível nuclear suficiente para bilhões de anos. Talvez se possa dizer o mesmo de
um número infindável dos 135 bilhões de estrelas que compõem nossa galáxia. Nesse
caso, por que razão 4 bilhões dessas estrelas viram esgotar seu combustível,
expandiram-se e depois encolheram?
Ou vejamos o problema pelo ângulo oposto. Por que há tão poucas anãs
brancas? Se bilhões de estrelas utilizaram todo seu combustível nuclear e chegaram ao
fim, por que o mesmo não aconteceu a todas as demais estrelas?
Para dar uma resposta a essas perguntas, precisamos saber primeiramente qual é
a idade do universo e, portanto, há quanto tempo as estrelas se formaram. Poderemos
então ter uma idéia do tempo em que elas vêm usando combustível nuclear e da
quantidade desse combustível que ainda resta a ser fundido.
Mas como podemos afirmar a idade do universo?
A resposta a essa pergunta nasceu, inesperadamente, de um exame dos espectros
das estrelas.
Estudando-se esses espectros podemos dizer se uma estrela está se movendo em
nossa direção ou para mais longe de nós e, em ambos os casos, com que velocidade. Se
as linhas espectrais se desviam para a extremidade vermelha do espectro, a estrela está
se afastando de
aproximando nós. Se elas se desviam para a extremidade violeta, a estrela está se
de nós.
Evidentemente, cabe a pergunta: como podemos saber se o desvio para o
vermelho das linhas espectrais é causado por um afastamento ou por um efeito
gravitacional, como o descrito no capítulo anterior? A resposta é que a maioria das
estrelas não é suficientemente densa para produzir um desvio para o vermelho
mensurável resultante de um efeito gravitacional. Portanto, a menos que haja razões
para se acreditar no contrário, todo desvio para o vermelho é considerado resultante de
um movimento de afastamento.
Naturalmente, algumas estrelas se afastam e outras se aproximam de nós, de
modo que os desvios para o vermelho e para o violeta se distribuem em número mais ou
menos igual.
A partir de 1912, mais ou menos, os astrônomos começaram a estudar o espectro
das galáxias (que são coleções, vastas e distantes, de milhões, bilhões ou mesmo trilhões
de estrelas, semelhantes à nossa própria galáxia, a Via Láctea) que se situam além da
nossa. Em 1917 tornou-se evidente que, com exceção de duas das galáxias mais
próximas, todas as demais exibem um desvio espectral para o vermelho e que, portanto,

56
estão se afastando de nós. Além disso, esses desvios são mais acentuados do que os
associados às estrelas de nossa própria galáxia.
Com o estudo de um número cada vez maior de galáxias, constatou- se que todas
elas (com exceção das mesmas duas, as mais próximas) apresentam um desvio para o
vermelho e que o grau desse desvio aumenta progressivamente, quanto mais distantes
estão as galáxias de nós.

HubbleLevando tudoenunciou
(1889-1953) isso ememconta,
1929 ao chamada
astrônomo norte-americano
lei de Edwin
Hubble. Segundo essa Powell
norma,
a velocidade com que uma galáxia se afasta está relacionada diretamente à sua distância
de nós. Ou seja, se a galáxia A está se afastando 5,6 vezes mais depressa do que a
galáxia B, então a galáxia A está 5,6 vezes mais distante de nós do que a galáxia B.
Não é fácil determinar a taxa de aumento da velocidade de recessão de acordo
com a distância. A princípio os astrônomos julgaram que a velocidade aumentasse
bastante depressa, mas novos dados levaram a crer que o aumento é muito menor do que
de início se supôs.
Atualmente os astrônomos acreditam que a velocidade de recessão aumente 16
km por segundo para cada milhão de anos-luz de distância. Por exemplo, uma galáxia
situada a 10.000.000 de anos-luz está se afastando a uma velocidade de 160 km/s; a que
se situa a 20.000.000 de anos-luz afasta-se com uma velocidade de 320 km/s; e uma
terceira situada a 50.000.000 de anos-luz se afasta a 800 km/s, e assim por diante.
Mas por que isso? Por que deveriam estar todas as galáxias se afastando, e por
que motivo a velocidade de afastamento deveria ser proporcional à distância que estão
de nós? O que nos torna a chave para o comportamento do universo?
Não somos!
Já em 1917 o astrônomo holandês Willem de Sitter (1872-1934) demonstrou que
de um ponto de vista teórico, usando as equações da relatividade geral, o universo
deveria estar se expandindo. A rigor, galáxias individuais e, às vezes, aglomerados que
variam de dezenas a milhares de galáxias, são mantidos juntos pela atração
gravitacional. Mas as unidades galácticas (sejam galáxias isoladas ou aglomerados
delas) que éestão
gravitação fraca separadas
demais paradeafetá-las
suas vizinhas por uma participam
suficientemente, distância tão grande que
da expansão gerala
do universo. Isso significa que as unidades galácticas individuais estão, todas elas,
separando-se umas das outras a alguma velocidade constante.
De um posto de observação em qualquer galáxia ter-se-ia a impressão de que
todas as outras (com exceção das que fazem parte do aglomerado local, se houver) estão
se afastando. Além disso, a velocidade constante de expansão amplia-se com a
distância, de modo que terminaríamos com a lei de Hubble, não importa a galáxia em
que vivêssemos.
Se as unidades galácticas se dispersam cada vez mais à medida que o tempo
passa e o universo envelhece, então se voltássemos o olhar no tempo (como se
virássemos um filme de cinema para que fosse projetado ao contrário) veríamos as
unidades galácticas se aproximando umas das outras cada vez mais. Em outras palavras,
quanto mais jovem for, mais compacto é o universo. E se retrocedermos suficientemente
no tempo, poderemos ver como todas as galáxias devem ter-se chocado numa vasta
coleção de matéria.

57
Em 1927 o astrônomo belga Georges Lemaître (1894-1966) sugeriu que as
coisas tinham-se passado exatamente assim — que há um certo número de bilhões de
anos toda a matéria do universo estava agrupada num único lugar e formava uma
estrutura denominada átomo primordial. Outros a denominaram ovo cósmico.
Durante quanto tempo o ovo cósmico existiu ou como veio a se formar,
Lemaître não se aventurou a dizer, mas em algum momento esse ovo cósmico deve ter
explodido. Essa deve ter sido certamente a maior explosão que o universo jamais havia
experimentado; foi a explosão que criou o universo que conhecemos. O físico russo-
americano George Gamow (1904-1968) denominou-a “a grande explosão”.
A partir dos vastos fragmentos do ovo cósmico, terminaram por se formar as
estrelas e galáxias, e é por causa do impulso da grande explosão que o universo ainda
hoje está se expandindo. No último meio século acumularam-se provas em favor da
grande explosão, e hoje em dia quase todos os astrônomos acreditam que foi assim que
se formou o universo.
Entretanto, a pergunta importante é: quando ocorreu a grande explosão? Os
astrônomos sabem (ou julgam saber) com que velocidade o universo se expande
atualmente. Se supõem que essa velocidade sempre foi e sempre continuará a ser a
mesma, então, se lançarmos o olhar adiante no tempo, o universo simplesmente se
expandirá
Finalmente,para
um todo o sempre;
astrônomo as unidades
que olhar galácticas
o universo se separarão
de um ponto cada vez
de observação mais.
na Terra
verá apenas nossa própria galáxia e aquelas outras que fazem parte de nossa
aglomeração local. Todo o resto estará longe demais para ser visto.
Por outro lado, se olharmos para trás e supusermos que o universo se contrairá
constantemente a uma velocidade uniforme, ele se agrupará no átomo primordial de há
20 bilhões de anos.
Contudo, as diversas galáxias exercem uma força gravitacional umas sobre as
outras. Essa atração pode não bastar para impedir a expansão, mas tenderá a retardá-la.
Isso significa que, ao olharmos para o futuro, a velocidade de expansão se tornará cada
vez menor e levará mais tempo do que imaginamos para que todas as galáxias distantes,
fora do aglomerado local, venham a perder-se de vista. Da mesma forma, significa que
ao
queolharmos
a atraçãopara
o passado,seasfizer
galáxias se reunirão cada vezPortanto,
mais depressa, à medida
gravitacional progressivamente maior. o tempo do ovo
cósmico e da grande explosão deve situar-se a menos de 20 bilhões de anos.
Não podemos afirmar com segurança em que grau a força gravitacional no
universo está retardando a velocidade de expansão. Isso depende da quantidade de
matéria que existe (em média) por volume de espaço — em outras palavras, da
densidade média de matéria no universo.
Se a densidade for suficientemente grande, então o efeito retardante é bastante
pronunciado para fazer com que a velocidade de expansão caia a zero. A expansão do
universo haverá um dia de interromper-se. Assim que isso acontecer, o universo, sob a
atração de suas próprias forças gravitacionais, começará a se contrair — a princípio
muito lentamente, depois mais depressa, mais depressa, até o ovo cósmico se formar e
explodir novamente. Esse ciclo pode repetir-se várias vezes, e teremos então um
universo oscilante. O astrônomo norte-americano Allan Rex Sandage (1928-) sugeriu
que um ovo cósmico se forma e explode a cada 80 bilhões de anos.
Se a densidade da matéria do universo for exatamente suficiente para
interromper a expansão das galáxias (uma densidade igual a 6x10-30 g/cm3, ou cerca de

58
um próton ou nêutron para cada 350.000 cm3 de espaço), então a expansão está se
retardando numa taxa tal que a grande explosão deve ter ocorrido a aproximadamente
13,3 bilhões de anos.
Na verdade os astrônomos, ainda não têm uma idéia segura quanto à densidade
da matéria no universo, em média, de modo que não podemos saber com exatidão
quando ocorreu a grande explosão ou se o universo está oscilando ou não. No momento,
acredita-se em geral que a densidade média não seja suficientemente alta para oscilação,
de modo que a grande explosão deve ter ocorrido entre 13,3 bilhões e 20 bilhões de
anos atrás.
Neste livro partiremos do pressuposto razoável (sujeito a modificações, com a
coleta de novos dados) de que o universo tem 15 bilhões de anos.
Se o universo tem 15 bilhões de anos, isso significa que as próprias estrelas não
podem ter mais do que essa idade.
Contudo, poderiam ser mais jovens, o Sol, por exemplo, deve ser mais jovem,
pois de outra forma já teria consumido seu combustível nuclear, transformando-se em
gigante vermelha e depois em anã branca.
Serão, pois, as anãs brancas remanescentes de estrelas antiqüíssimas que vêm
brilhando desde
fusão nuclear o começo
foram do universo,
formadas muito maisenquanto as estrelas
tarde e são, que
portanto, aindamais
muito fulgem devido à
jovens?
É possível que haja alguma verdade nisso, mas não toda. Muitas estrelas devem
ter-se formado após a grande explosão, e se todas elas tivessem, chegado já ao estágio
da anã branca, haveria muito mais anãs brancas em nossa galáxia do que existem, na
verdade. Além disso, consideremos os casos de Sírius A e Sírius B. Parece lógico supor
que as duas estrelas de um binário se formaram ao mesmo tempo (da mesma forma que
o Sol e os planetas devem ter-se formado mais ou menos à mesma época), mas, ainda
assim, uma delas é uma anã branca e a outra não é.
Ocorrerá, porventura, que a idade não seja o único fator importante? Por acaso
algumas estrelas queimam seu combustível nuclear mais devagar do que outras? Ou será
que algumas possuem maior quantidade de combustível nuclear do que outras?
Ocorrendo uma
contração do quecoisa ou outra, algumas estrelas levam mais tempo para chegar à fase de
outras?
A resposta para essas perguntas também foi proporcionada pelos estudos dos
espectros.

A SEQÜÊNCIA PRINCIPAL

Para começar, uma estrela nasce de uma massa de poeira e gás que gira
lentamente e que, por força de sua própria atração gravitacional, lentamente se torna
coesa. À medida que essa massa de poeira e gás (espalhados pelo espaço como
resultado da grande explosão) se une, a atração gravitacional se faz cada vez mais
intensa, de modo que o processo se acelera.

59
Quando a nuvem se condensa, a temperatura e a pressão no centro aumentam
progressivamente, até que finalmente se tornam suficientes para romper os átomos no
centro e iniciar a fusão nuclear. Nesse momento de ignição nuclear, nasce a estrela.
O período de condensação não é muito longo em comparação com os muitos
bilhões de anos de vida total da estrela. Quanto maior for a estrela e quanto mais massa
ela tiver, mais forte será a atração gravitacional em todas as fases e menor será o tempo
de condensação. Uma estrela com a massa de nosso Sol poderia levar 30 milhões de
anos para atingir a ignição nuclear, ao passo que uma outra, de massa dez vezes maior,
poderia condensar-se e atingir a ignição nuclear em apenas 10 mil anos. Por outro lado,
uma estrela com apenas um décimo da massa do Sol poderia levar cem milhões de anos
para entrar em ignição.
É claro que todas as estrelas que vemos no céu já alcançaram a ignição nuclear.
Assim que chegam a esse estágio, continuam a produzir e a irradiar energia a um ritmo
constante durante um longo período. O ritmo em que qualquer estrela produz e emite
energia depende de sua massa.
Quando Eddington calculou as temperaturas reinantes no interior de uma estrela,
compreendeu que quanto mais massa tiver uma estrela, mais forte será a atração
gravitacional que ela exercerá sobre si própria. Isso significa que quanto maior for a
massa de uma
permanecer estrela, maior
expandida, será àa temperatura
opondo-se interna mais
gravidade. Quanto necessária
alta forpara obrigá-la a
a temperatura
interna, mais energia será produzida e mais a estrela irradiará. Em outras palavras,
quanto mais massa tiver uma estrela, mais luminosa ela será. A regra de Eddington é
chamada lei da massa-luminosidade.
Se estudarmos as estrelas que vemos, concluiremos que elas formam uma
seqüência regular: desde as estrelas de muita massa, muito luminosas e muito quentes,
passando por estágios de massa, luminosidade e calor cada vez menores, até estrelas de
pouquíssima massa, pouquíssima luminosidade e superfícies bastante frias. Essa
seqüência denomina-se principal, porquanto abrange aproximadamente 90% de todas as
estrelas que conhecemos. (Os 10% restantes são constituídos de estrelas invulgares,
como as gigantes vermelhas e as anãs brancas).

Os espectros das estrelas da seqüência principal formam cada


uma seqüência própria.
Ao percorrermos a seqüência principal em direção às estrelas vez mais frias, os
espectros refletem as temperaturas constantemente mais baixas na natureza das raias
escuras que contêm. Por conseguinte, as estrelas podem ser divididas em classes
espectrais, segundo o desenho das raias escuras.
As classes espectrais em que se dividem as estrelas da seqüência principal são O,
B, A, F, G, K e M. Dessas classes, a O inclui as de mais massa, as mais luminosas e as
mais quentes; a classe M compreende as de menos massa, menos luminosidade e mais
frias. Cada classe espectral subdivide-se em subclasses numeradas de 0 a 9. Assim,
podemos falar de B0, B1, B2 e assim por diante, até chegarmos a B9, seguida por A0.
Nosso próprio Sol pertence à classe espectral G2.
O Quadro 9 relaciona a massa e a luminosidade das estrelas por classe espectral.
Será a distribuição quantitativa dessas estrelas igual? Não.

60
QUADRO 9 — A seqüência principal
Classe espectral Massa (Sol = 1) Luminosidade (Sol = 1)
O5 32 6.000.000
B0 16 6.000
B5 6 600
A0 3 60
A5 2 20
F0 1,75 6
F5 1,25 3
G0 1,06 1,3
G5 0,92 0,8
K0 0,80 0,4
K5 0,69 0,1
M0 0,48 0,02
M5 0,20 0,001

No universo, como um todo, os objetos grandes são sempre excepcionais e


menos comuns que objetos pequenos da mesma categoria. Existem menos animais
grandes que animais pequenos (compare-se o número de elefantes com o de moscas),
menos rochas grandes que grãos de areia, menos planetas grandes que asteróides
pequenos etc.
Seria de se esperar, pois, que existissem menos estrelas de grande massa e
luminosidade que estrelas pequenas e pálidas, e é isso que acontece. Os levantamentos,
feitos pelos astrônomos, das estrelas que podem ver e as deduções que fizeram com
base nesses levantamentos levam-nos a supor que quase 3/4 de todas as estrelas em
nossa galáxia pertencem à classe espectral M, a mais baça de todas. Os resultados
detalhados são apresentados no Quadro 10.

QUADRO 10 — Freqüência de classe espectral


Classe espectral Percentagem de estrelas Número de estrelas na galáxia
O 0,00002 20.000
B 0,1 100.000.000
A 1 1.200.000.000
F 3 3.700.000.000
G 9 11.000.000.000
K 14 17.000.000.000
M 73 89.000.000.000

61
(Podemos pressupor, naturalmente, que tudo que for válido para nossa galáxia
será também para a grande maioria de outras galáxias. Não temos nenhum motivo para
acreditar que nossa própria galáxia seja particularmente diferente).
A pergunta seguinte é se as estrelas das várias classes espectrais levam tempo
diferente para consumir seu combustível nuclear e se, portanto, algumas permanecem na
seqüência principal mais tempo que outras e retardam a expansão e a contração
inevitáveis.
Se supusermos, por exemplo, que todas as estrelas começam suas carreiras com
uma constituição composta basicamente de hidrogênio, o principal combustível nuclear,
constatamos então que quanto mais massa tiver uma estrela, maior será seu suprimento
de combustível. Uma estrela O5, com 32 vezes a massa (e, portanto, o suprimento de
energia nuclear) do Sol poderia (supomos apenas) levar 32 vezes mais tempo para
consumir seu combustível e assim permanecer tranqüilamente na seqüência principal
um período 32 vezes mais longo que o de nosso Sol — e um período 160 vezes mais
longo que o de uma estrela M5.
Contudo, as estrelas não consomem o combustível nuclear com a mesma
rapidez, independentemente de suas massas. Quanto mais massa tiver uma estrela, com
mais força seu próprio campo gravitacional consome sua matéria e mais quente tem de
ser seu núcleo
o núcleo, maisa combustível
fim de compensar a compressão
tem de gravitacional.
ser consumido Quanto
por segundo mais
a fim dequente
manterfora
temperatura. Em suma, quanto maior for a massa de uma estrela, mais depressa ela tem
que consumir seu combustível nuclear.
Eddington pôde demonstrar, na verdade, que à medida que passamos das estrelas
de menor para as de maior massa, o ritmo em que elas têm que consumir seu
combustível nuclear aumenta muito mais depressa que o suprimento de combustível
nuclear. Em resumo, ainda que uma estrela O5 possa possuir 32 vezes mais energia
nuclear que o Sol, aquela estrela O5 deve consumir combustível nuclear 10.000 vezes
mais depressa que o Sol — portanto, haverá de consumir seu maior suprimento de
combustível nuclear muito mais cedo do que o Sol consumirá o seu, bem menor. Dentro
do mesmo raciocínio, o Sol tem que usar seu combustível nuclear muito mais

rapidamente que uma baça estrela M5, que possui apenas um quinto do suprimento do
Sol.
Em suma, quanto maior for a massa de uma estrela, mais curta será sua
permanência na seqüência principal e mais depressa ela se tomará uma gigante
vermelha e depois se contrairá. O período de vida das várias classes espectrais aparece
no Quadro 11.

62
QUADRO 11 — Período de vida da seqüência principal
Classe espectral Duração da vida (anos)
O 1.000.000 ou menos
B0 10.000.000
B5 100.000.000
A0 500.000.000
A5 1.000.000.000
F0 2.000.000.000
F5 4.000.000.000
G0 10.000.000.000
G5 15.000.000.000
K0 20.000.000.000
K5 30.000.000.000
M0 75.000.000.000
M5 200.000.000.000

Uma vez que são as estrelas maiores e menos comuns as que se contraem
primeiro, eis uma explicação para a relativa raridade das anãs brancas. Nenhuma estrela
da classe espectral K ou M, que em conjunto perfazem 87% de todas as estrelas, já teve
oportunidade de utilizar todo seu combustível nuclear, mesmo que todas elas estejam
emitindo energia desde a grande explosão. Somente as estrelas O, B, A, F e algumas G
podem já haver deixado a seqüência principal, e constituem menos de 10% de todas as
estrelas.
Mesmo assim, não explicamos inteiramente a raridade das anãs brancas. Se
todas as estrelas da galáxia tivessem se formado logo após a grande explosão e se
nenhuma se formasse desde então, não haveria na galáxia quaisquer estrelas maiores e
mais luminosas do que as pequenas estrelas da classe G. Todas as mais brilhantes do
que essas já teriam se expandido e contraído. No entanto, não é isso que ocorre. Existem
hoje no céu estrelas extraordinariamente brilhantes — até mesmo da classe O.
Evidentemente, as estrelas brilhantes que existem atualmente não podem ter
existido durante toda a vida do universo. Nosso próprio Sol (pertencente à classe
espectral G2) deve ser muito mais jovem do que o universo, pois de outra forma já se
teria convertido em anã branca. Na verdade, ele parece ter sido formado a cerca de 5
bilhões de anos, quando o universo já tinha 10 bilhões de anos. E há lugares na galáxia
onde se crê haver estrelas se condensando, rumo à ignição nuclear, neste exato
momento. E haverá estrelas que se formarão daqui a um bilhão de anos.
Durante muito, muito tempo haverá estrelas luminosas e de vida breve no céu,
nascendo e morrendo, enquanto as anãs brancas continuam a brilhar firmemente.
Mesmo assim, se supusermos que o universo se expandirá eternamente, então
finalmente todas as estrelas, até mesmo as menores, consumirão todo seu combustível
nuclear, passando à expansão e depois à contração. E podemos supor que daqui a muitos

63
trilhões de anos o universo venha a consistir em apenas dois tipos de corpos “eternos”
— anãs negras, que são as cinzas das estrelas, e objetos planetários negros, que jamais
foram estrelas.
Mas se supusermos que este é o fim, estaremos certos? Por acaso todo objeto
suficientemente grande para tornar-se uma estrela acaba como uma anã branca que se
resfria até tornar-se uma anã negra? Ou haverá objetos no universo ainda mais estranhos
que as anãs brancas?
Sim, existem objetos mais invulgares no horizonte. Não nos esqueçamos de que
estamos avançando rumo aos buracos negros.

NEBULOSAS PLANETÁRIAS

Quando uma estrela se contrai e se transforma numa anã branca, sua massa, sob
a influência de sua própria gravidade, se contrai e se torna cada vez menor, até que o
fluido eletrônico comprimido no núcleo torna-se bastante resistente a uma contração
adicional para suportar o peso das camadas de matéria sobre ele.
Quanto maior for a massa de uma estrela em contração, com mais força ela se
encolherá e mais intensamente comprimirá o fluido eletrônico.
Para fazermos mais uma analogia, a situação é semelhante à dos pneus que
sustentam um automóvel. O peso do carro comprime o ar dentro das câmaras de ar. A
força feita pelo ar nos pneus, de dentro para fora, aumenta à medida que é comprimido,
de modo que por fim ele passa a suportar o peso do carro. Se carregarmos o veículo com
bagagem, o ar nos pneus é comprimido ainda mais, até ele fazer força suficiente para
suportar a carga adicional. Quanto mais peso houver, mais o ar dentro dos pneus será
comprimido.
Se tivermos isso em mente no caso de uma estrela, percebemos ser provável que
quanto maior for a massa de uma anã branca, menor em tamanho ela deverá ser. Por
isso, uma anã branca denominada Van Maanem 2 tem apenas 3/4 da massa de Sírius B
— ela não se comprime tanto e tem um diâmetro mais ou menos igual ao de Júpiter, ou
seja, três vezes o de Sírius B. Por outro lado, algumas anãs brancas de massa
relativamente grande não têm volume maior do que nossa Lua.
Mas até que ponto uma anã branca pode aumentar em massa e diminuir de
tamanho? Afinal de contas, se continuarmos a colocar peso dentro de um carro, chegará
um momento em que o material dos pneus não será suficientemente forte para resistir à
compressão cada vez maior do ar. Mais cedo ou mais tarde, o pneu acabará por estourar.
Existe também um ponto em que o núcleo da anã branca simplesmente não
consegue sustentar a massa que o comprime.
A questão foi estudada pelo astrônomo norte-americano de srcem indiana,
Subrahmanyan Chandrasekhar (1910-). Em 1931 ele conseguiu demonstrar que há uma
determinada massa crítica (limite de Chandrasekhar) além da qual uma anã branca não
pode existir, uma vez que nesse ponto o fluido eletrônico não é capaz de suportar o
peso, não importa o quanto esse fluido esteja comprimido. O núcleo de tal estrela haverá
simplesmente de desabar.

64
A massa crítica, mostrou Chandrasekhar, é 1,4 vezes a do Sol. O limite poderia
ser um pouco mais alto se a anã branca estivesse girando rapidamente, pois a força
centrífuga ajudaria a levantar uma parte da massa. As anãs brancas, contudo, não
parecem girar com rapidez suficiente para que esse fator se torne substancial.
O limite de Chandrasekhar não é muito elevado. Todas as estrelas da classe
espectral O, B e A, juntamente com as estrelas de maior massa da classe F, possuem
massas que são 1,4 vezes maiores que a do Sol. Essas são também as estrelas de menor
período de vida, e estrelas como essas, que se tenham formado nos primeiros tempos do
universo, com toda certeza já se expandiram e se contraíram. E depois disso,
transformaram-se em quê? Seria crível que algumas tivessem se convertido em anãs
brancas de massa muito grande, muito além do limite de Chandrasekhar — mostrando
assim que a análise desse astrônomo estava errada?
Seria concebível que sim, mas a verdade é que todas as anãs brancas estudadas
mostraram possuir massa inferior ao limite de Chandrasekhar, e quanto mais estrelas
desse tipo são descobertas, mais correto parece o limite estabelecido.
Outra alternativa é a de que as estrelas com massa superior ao limite de
Chandrasekhar pudessem ter perdido parte de sua massa, em alguma fase antes ou
durante sua contração.
Essa alternativa parece bastante fantasiosa. Como pode uma estrela perder
massa? O fato, entretanto, é que conhecemos vários meios pelos quais isso pode ocorrer,
e é tão provável que uma estrela com massa particularmente grande venha a perder
massa por um desses modos que poderíamos considerar essa perda inevitável.
Consideremos o fato de que toda estrela se expande, quando sua permanência na
seqüência principal chega ao fim porque seu suprimento de combustível nuclear caiu
abaixo de algum valor crítico, transformando-se numa gigante vermelha, que depois se
contrairá.
Quanto mais massa tiver uma estrela, mais quente será seu núcleo por ocasião da
expansão. A combinação de mais massa e mais calor produz uma gigante vermelha cada
vez maior. Por outro lado, quanto maior for a massa de uma estrela, mais rapidamente
ela se contrai quando chega o momento da contração, pois maior é o campo
gravitacional que impulsiona a contração.
Suponhamos uma estrela, portanto, que tenha massa consideravelmente maior
que a de nosso Sol e que, ao inchar, se transforme numa gigante vermelha bastante
grande. As camadas mais externas da gigante vermelha, as quais se encontram muito
distantes das camadas internas mais densas, acham-se submetidas a um puxão
gravitacional relativamente fraco. Quando a estrela se contrai, então, as camadas
internas desabam rapidamente, deixando para trás as camadas externas mais rarefeitas.
A parte da estrela que está se contraindo se aquece brutalmente, à medida que a energia
da contração é convertida em calor. A onda de calor atinge as camadas mais externas,
que estão sendo atraídas para dentro relativamente devagar, e as empurra novamente
para fora.

vermelhaPortanto,
bastantesevolumosa,
uma estrela for sua
somente suficientemente
porção interiordensa
poderáe contrair,
formar uma gigante
ao passo que
a porção externa poderá ser expulsa como um turbulento invólucro de gás. Nesse caso,
embora toda a estrela possa estar acima do limite de Chandrasekhar, a porção que se
contrai pode estar abaixo dele e formar, assim, uma anã branca.

65
O resultado, portanto, é uma anã branca cercada por um invólucro de gás. A anã
branca se acha quentíssima ao irradiar as vastas energias da rápida contração, e a
radiação se faz na forma de luz ultravioleta e radiações ainda mais carregadas de
energia. O invólucro de gás absorve essa radiação e a reirradia como uma fluorescência
de cores brandas.
O que vemos da Terra, pois, é uma estrela circundada por um anel nebuloso. Na
verdade é um invólucro, mas as partes do invólucro gasoso viradas para nós (na frente
da estrela) e as escondidas de nós (do outro lado) são difíceis de ver porque estamos
olhando o invólucro através de sua pequena espessura. Nos lados da estrela (visível para
nós) nossa linha de visão passa pela extremidade do invólucro, atravessando uma
espessura de material relativamente grande. Por conseguinte, o invólucro mostra-se
como um anel de fumaça. O exemplo mais notável disso é a nebulosa do Anel, na
constelação da Lira.
Tais nebulosas são denominadas planetárias porque o invólucro de gás parece
circundar a estrela como se estivesse numa órbita planetária.
Conhecem-se cerca de mil nebulosas planetárias; evidentemente, talvez existam
muitas outras que não podemos enxergar. Cada uma das nebulosas planetárias
conhecidas tem uma estrela densa, quente e pequena no centro — provavelmente uma
anã branca, ainda que isso, na verdade, só pôde ser demonstrado em alguns poucos
casos.
Se as estrelas centrais das nebulosas planetárias forem realmente anãs brancas,
elas devem ter-se formado recentemente e tiveram pouco tempo para irradiar grande
parte do calor que obtiveram através da contração. E, na verdade, essas são as estrelas
com as mais elevadas temperaturas superficiais conhecidas, variando de pelo menos
20.000 °C até, em certos casos, mais de 100.000 °C.
Os invólucros gasosos que vemos parecem ter, ao que se pode avaliar, massa
equivalente a 1/5 da solar, porém talvez sejam possíveis invólucros maiores, também.
Alguns astrônomos acreditam que uma estrela possa perder mais da metade de sua
massa na forma de um invólucro gasoso e que, se isso realmente acontecer, uma estrela
com massa 3,5 vezes maior que a do Sol pode perder massa suficiente, através da
formação de uma
denebulosa
planetária, parauma
permitir que o núcleo em contração caia
abaixo do limite Chandrasekhar e forme anã branca.
Naturalmente, tendo sido expulso para a periferia pelas energias da contração do
núcleo, o invólucro gasoso da nebulosa planetária está se afastando da estrela. A
velocidade desse movimento pode ser medida, sendo característicos números entre 20 e
30 km/s.
À medida que o invólucro de gás se afasta cada vez mais da estrela, adquire
volume cada vez maior e sua matéria se faz cada vez menos densa. Com isso, qualquer
porção do invólucro passa a receber menos radiação da estrela e produz cada vez menos
fluorescência. O resultado é que o invólucro se torna cada vez mais opaco e menos
visível, à medida que aumenta.

Na nebulosa
estrela central, planetária
ou seja, cerca detípica, o invólucro
500 vezes de gás
a distância situa-se
entre Plutãodee nosso
1/4 a 1/2
Sol.ano-luz da
É possível que tenham sido necessários de 20.000 a 50.000 anos de expansão
para o invólucro afastar-se a essa distância, e isso é muito pouco na vida das anãs

66
brancas. O simples fato de o invólucro ser visível é, portanto, prova cabal de que a anã
branca formou-se recentemente.
Cerca de 100.000 anos depois da formação da anã branca, o invólucro gasoso
ter-se-á espalhado e rarefeito ao ponto em que será insuficientemente luminoso para ser
divisado da Terra. É possível, então, que aquelas anãs brancas que não têm em volta de
si um invólucro de gás só não o possuam por terem bem mais de 100.000 anos de idade.

Entretanto,
uma estrela a formação
pode perder massa.deNa
uma nebulosa
verdade, sãoplanetária
muitos osnão é a única
modos pelosforma
quais pela qual
podemos
encontrar matéria em explosão. A grande explosão pode ter sido a maior e a mais
sensacional manifestação desse fenômeno, mas existem “pequenas” explosões de uma
espécie ou outra, de magnitude suficiente para serem de grandiosidade espantosa.

NOVAS

Qualquer pessoa que contemplar o céu sem nuvens, noite após noite, a olho
desarmado, observará
igual. A tal ponto essa um espetáculo tem
imutabilidade que sido
parece sercomo
vista de serenidade e imutabilidade
sinal de segurança, semà
em meio
vida turbulenta, durante a história do mundo, que qualquer alteração rara — um eclipse,
uma estrela cadente, um cometa — causa susto.
Essas mudanças intensas, perceptíveis por qualquer observador casual, não
afetavam, porém, as estrelas; eram fenômenos de nosso sistema solar. Para um
observador atento, todavia, mesmo no universo estrelado surgiam mudanças.
Ocasionalmente aparecia uma nova estrela no céu, num ponto onde nenhuma antes
havia sido detectada. Não se tratava de uma estrela cadente; ela permanecia ali. Mas não
era uma residente permanente, tampouco. Por fim, ela desmaiava e voltava a
desaparecer.
O maior dos astrônomos da antiguidade, Hiparco de Nicéia (190-120 a.C.),
observou umapara
mapa estelar, novaque
estrela desseastipo
no futuro em 134
intrusas a.C. reconhecidas
fossem e isso o levoucom
a preparar o primeiro
mais facilidade.
Uma estrela temporária particularmente brilhante apareceu em novembro de
1572 na constelação Cassiopéia, e um astrônomo dinamarquês, Tycho Brahe (1546-
1601), escreveu sobre ela um livro intitulado De Nova Stella (que em latim significa A
respeito da estrela nova). Devido a esse título, a palavra “nova” passou a ser aplicada às
estrelas temporárias em geral.
De certa forma a designação é ruim, pois as estrelas chamadas novas não são
realmente novas, nem são verdadeiramente estrelas criadas do nada ou de material não-
estelar, que depois retornam ao nada ou a um material não-estelar.
Logo depois que se inventou o telescópio, em 1608, tornou-se claro que existem

milhões podiam,
estrelas de estrelas
porcom luz motivo,
algum fraca demais
brilharpara
comserem
muitovistas
maisaintensidade
olho nu. Algumas
por umdessas
breve
período e depois sumir outra vez. Podia ocorrer que uma estrela pálida demais para ser
vista sem o telescópio passasse a brilhar a ponto de ser vista a olho nu e depois
retornasse a uma palidez abaixo do nível da visão ordinária. Antes da invenção do
telescópio pensar-se-ia que a estrela tinha vindo do nada e retornado ao nada.

67
Essa idéia seria bastante fortalecida se alguma estrela baça pudesse ser realmente
vista alcançando brilho suficiente para ser detectada pela visão ordinária, mas só em
1848 é que uma nova foi realmente apanhada em flagrante. Por acaso, um astrônomo
inglês, John Russell Hind (1823-1895), estava observando uma estrela pálida,
ordinariamente invisível a olho nu, quando ela começou a aumentar de brilho. Atingiu o
máximo na quinta grandeza, e então já podia ser contemplada, como uma estrela débil,
por qualquer pessoa que olhasse para o ponto certo do céu. Depois, desvaneceu-se.
Após a invenção da fotografia, partes do céu passaram a ser fotografadas em
épocas diferentes e, por comparação entre as fotos podia-se dizer se alguma estrela
havia mudado de brilho. Outras novas puderam ser detectadas assim; não teriam sido
descobertas no ato real de aumentar de brilho. Viu-se que as novas não eram fenômeno
tão incomum como se pensava antes. Calcula-se hoje que seria possível haver até 30
novas por ano, em média, em nossa galáxia.
Mas, o que provoca uma nova?
Seja o que for, tem de ser alguma coisa violenta. A estrela que se transforma em
nova pode tornar-se milhares ou mesmo dezenas de milhares de vezes mais brilhante do
que era antes. Além disso, o aumento de brilho pode ocorrer muito depressa — num dia,
ou menos ainda. Depois que é atingido o brilho máximo, o declínio nunca é tão rápido
como a ascensão.
empalidecimento À medida
adicional quede uma
diminui, modoestrela
que porempalidece,
fim ela podea levar
velocidade do
anos para
regressar totalmente a seu estado primitivo.
É bastante provável, portanto, que o súbito aumento explosivo de brilho seja
explosivo no sentido literal. Um estudo pormenorizado do espectro das novas faz supor
que tais estrelas emitam invólucros de gás.
Poderia uma nova ser o inicio da formação de uma nebulosa planetária? Pode a
explosão da nova ser o último arquejo de brilho antes de a estrela se contrair numa anã
branca?
Provavelmente não. Antes de se formar a anã branca, a estrela deveria estar no
estágio de gigante vermelha; no entanto, nos casos em que se pôde observar uma estrela
antes de se transformar em nova, ela não parecia ser uma gigante vermelha. Além disso,
a massa de gás ejetada por uma nova representa apenas 1/50.000 da massa de nosso Sol.
Uma nebulosa planetária ejeta milhares de vezes mais massa.
Poderíamos esperar outras espécies de explosão além das que formam nebulosas
planetárias?
As possibilidades poderiam parecer pequenas, de início. Afinal, a maioria das
estrelas parece ser bastante estável — como nosso Sol, por exemplo. O puxão
gravitacional e a resistência oposta pela temperatura acham-se em equilíbrio, e uma
estrela como nosso Sol pode brilhar bilhões de anos sem quaisquer mudanças súbitas de
tamanho ou temperatura. Há as manchas solares, que resfriam ligeiramente o Sol, e as
chamas, que o aquecem ligeiramente, mas as mudanças são pequeníssimas e
microscópicas em comparação com aquelas que ocorrem nas novas.
Nem todas as estrelas, contudo, são estáveis como o Sol. Há, por exemplo,
estrelas cujo brilho varia continuamente, às vezes com regularidade rítmica. Talvez isso
ocorra porque uma estrela brilhante seja eclipsada em parte ou no todo por uma
companheira mais pálida que, em sua órbita em torno da estrela brilhante, passe
periodicamente entre ela e nós.

68
Outras vezes, a variação decorre de mudanças na própria estrela. Em 1784, um
astrônomo inglês de srcem holandesa, John Goodricke (1764-1786) — surdo-mudo
que morreu com 21 anos — observou que a estrela Delta Cephei (na constelação Cefeu)
variava de brilho. Não é uma mudança muito grande: ela aumenta da grandeza 4,3 para
a 3,6*, e depois volta a 4,3, repetindo esse vaivém incessantemente. Em seu ponto mais
brilhante, Delta Cephei tem apenas o dobro do brilho do ponto mais pálido, e não era
provável que isso fosse notado sem um telescópio — como não é, realmente.
Contudo, a natureza da mudança é notável. A estrela aumenta de brilho com
rapidez, empalidece mais lentamente, aumenta de brilho rapidamente, empalidece mais
lentamente, com grande regularidade, em ciclos de 5,4 dias. Nos últimos 200 anos
foram detectadas em nossa galáxia cerca de 700 estrelas com o mesmo padrão de
aumento de brilho rápido e lento empalidecimento, e todas elas são chamadas variáveis
cefeidas, em homenagem à primeira a ser descoberta.
As variáveis cefeidas diferem quanto à duração de seus períodos. Algumas
chegam a ter um período de 100 dias, enquanto o de outras não vai além de 1 dia. (Na
verdade, há um grupo especial de estrelas variáveis, muito semelhantes às cefeidas, que
têm períodos de 6 a 12 horas e que são chamadas estrelas Lyrae RR, por causa da
primeira a ser descoberta).

Em 1915
demonstrou que a aduração
astrônoma norte-americana
do período depende daHenrietta Swan
massa e do Leabitt
brilho (1868-1921)
da estrela. Quanto
maior for a massa de uma variável cefeida e maior sua luminosidade, mais longo é seu
período.
Aparentemente as variáveis cefeidas pulsam, e essa é a razão para sua mudança
de brilho. A variável cefeida atingiu um estágio em sua evolução em que o equilíbrio
entre a gravitação e a temperatura já não é estável. Talvez o suprimento de combustível
nuclear esteja caindo ao ponto em que a temperatura interior comece a diminuir. Por
isso, a estrela começa a desabar, mas o próprio desabamento comprime seu interior,
acelera as reações nucleares e aumenta a temperatura. Isso obriga a substância da estrela
a se expandir novamente, e o próprio ato de expansão diminui a densidade do interior e
o resfria, de modo que recomeça uma compressão.

Quanto completarem
maior a massaodeciclo.
uma Esse
estrela, mais tempo é necessáriobreve
para aem
contração
e a expansão estágio é provavelmente termos
astronômicos, e após certo tempo virão as mudanças finais que levam à expansão (e
transformação numa gigante vermelha) e depois à contração (e transformação numa anã
branca).
As novas serão, porventura, variáveis cefeidas nas quais a pulsação se tornou
extrema? É possível que, com a continuação dos pulsos, eles se tornem cada vez mais
violentos, até que a expansão se torne explosiva e a parte mais externa de uma cefeida
seja expulsa, num processo que faz a estrela aumentar de brilho temporariamente, não
duas ou três vezes mais, porém dez mil vezes mais. A perda de massa poderia acalmar a
variável cefeida e devolvê-la a um estágio de pulsação tranqüila (a qual pode,
entretanto, após certo tempo, tornar-se explosiva outra vez). É possível que haja várias
explosões antes da expansão e da contração finais.
Com efeito, já se observaram novas recorrentes, as quais já explodiram duas ou
três vezes no breve período de pouco mais de um século em que os astrônomos têm

*
À medida que o brilho aumenta, o valor da grandeza diminui.

69
observado as estrelas detidamente. Além disso, todas as variáveis cefeidas, mesmo as
menores delas, têm massa consideravelmente maior que a do Sol. São estrelas grandes e
brilhantes — exatamente o tipo de estrelas que teriam de perder massa para
permanecerem dentro do limite de Chandrasekhar e serem capazes de formar uma anã
branca.
Tudo isso parece juntar-se como partes de um quebra-cabeças, mas a idéia não
se sustenta. Um estudo de estrelas que se transformam em novas, tanto antes de isso
ocorrer como depois de voltarem a empalidecer, mostra que elas simplesmente não são
variáveis cefeidas. Elas não são sequer estrelas grandes; são pequenas e pálidas, ainda
que possuam altas temperaturas superficiais.
A combinação de pequenez e pouco brilho, com altas temperaturas superficiais,
sugere anãs brancas; no entanto, as anãs brancas são de tal modo compactas e densas e
possuem gravidade superficial tão elevada que têm de ser muito estáveis. Como
poderiam passar por uma expansão explosiva?
Uma idéia que parece estar ganhando apoio, e que foi proposta pela primeira vez
em 1955 pelo astrônomo russo-americano Otto Struve (1897-1963), sugere que toda
nova pode ser um dos membros de um binário estreito, uma dentre duas estrelas que
giram a uma distância relativamente pequena. Uma delas, a que chamaremos A, é a
maior e por isso
companheira chega
menor, B. ao fim de que
À medida sua permanência
A se expande na seqüência
rumo principal
ao estágio de anãantes de sem
branca, sua
passar pelo estágio de nebulosa planetária, a qual ainda não iniciou sua expansão. Como
resultado disso, B ganha massa e A perde massa. A pode então encolher diretamente
para o estágio de anã branca, sem passar pelo estágio de nebulosa planetária, ainda que
sua massa possa ter sido, de início, um pouco superior à do limite de Chandrasekhar.
Por fim chega a vez de B deixar a seqüência principal, tendo seu período de vida
sido ligeiramente abreviado pelo ganho de massa às expensas de A. À medida que B se
expande em direção ao estágio de gigante vermelha, ela devolve o presente: parte de sua
matéria se derrama sobre A, que agora é uma anã branca.
A gravidade superficial de A é extremamente intensa e a matéria que ela ganha
sofre uma súbita compressão. Como a matéria recebida conterá alguns átomos
suscetíveis de fusão,
se elaa compressão
pode suficiente
eventualmente produzir
que uma
essereação
nuclear
muito rápida, coletar material e assim material for
suficientemente comprimido. A reação nuclear libera energias imensas, que produzem
um vasto clarão, o qual explica o repentino e enorme aumento de brilho que vemos
como uma nova, bem como a expulsão do gás candente. A nova pode repetir-se ao
receber incrementos adicionais de matéria expulsa pela expansão de B.
Dessa maneira, B poderá terminar por se contrair e transformar-se numa anã
branca, muito embora tenha ganho massa suficiente para ultrapassar um pouco o limite
de Chandrasekhar, quando A se expandiu.
Sírius A e Sírius B seriam um bom exemplo dessa teoria, se estivessem mais
perto uma da outra. Infelizmente, a distância média entre elas é um pouco maior que a
existente entre Urano e o Sol, de modo que a influência recíproca é limitada.
Quando ambas se formaram, há talvez 250 milhões de anos, a estrela que hoje é
Sírius B deve ter sido a maior e mais brilhante das duas, com talvez três vezes a massa
do Sol; era vista da Terra (que se achava então na era dos dinossauros) com um brilho
semelhante ao de Vênus.

70
Sírius B não permaneceu na seqüência principal por muito tempo; expandiu-se,
transformando-se em gigante vermelha, e depois formou uma nebulosa planetária com
talvez 2/3 de sua massa no invólucro de gás. Esse invólucro desde então afastou-se tanto
que se tornou invisível; mas parte dele deve ter sido capturado pela distante Sírius A,
cujo brilho certamente aumentou e cuja vida por isso será abreviada. Estivesse Sírius A
consideravelmente mais perto de Sírius B e teria capturado uma porção muito maior das
camadas externas de Sírius B; poderia, então, ter ganho massa suficiente para deixar, ela
própria, a seqüência principal pouco depois de Sírius B. Nesse caso, é possível que
Sírius A fosse hoje um binário de anãs brancas.
Da forma como estão hoje, em algum momento no futuro Sírius A se expandirá
para se transformar numa gigante vermelha, e então formará uma nebulosa planetária.
Sírius B haverá de receber parte do invólucro de gás, possivelmente o suficiente para
aumentar de brilho, como nova. O espetáculo deverá ser deslumbrante para os homens
que estiverem vivos e o observarem.
Conhecemos agora dois métodos pelos quais as estrelas de grande massa podem
livrar-se de massa em quantidade suficiente para cair abaixo do limite de Chandrasekhar
e formar uma Ana branca. Esses dois métodos — a formação de nebulosas planetárias e
a troca de matéria entre os pares de um binário próximo — funcionam para estrelas de
tamanho moderado, até três vezes a massa do Sol. No entanto, há estrelas com massa
ainda maior. E o que dizer delas? Voltemos à questão das novas.

SUPERNOVAS

Antes do telescópio, as únicas novas que certamente poderiam ser notadas


seriam aquelas de brilho excepcional.
A nova sobre a qual Tycho Brahe escreveu seu livro, a que deu nome ao
fenômeno, foi um exemplo desse tipo. Ao atingir seu ponto máximo, o brilho da nova
de Tycho era 5 a 10 vezes maior que o de Vênus, e talvez 100 vezes maior que o da
estrela estável mais brilhante, Sírius. A nova de Tycho podia ser vista de dia, e à noite
chegava a lançar uma sombra fraca, capaz de ser vista se a Lua não estivesse no céu.
Mais tarde, em 1604, apareceu outra nova brilhante na constelação Ofiuco. Essa
nova teria, talvez, apenas 1/30 do brilho da de Tycho, mas ainda era cerca de três vezes
mais brilhante do que Sírius. Desde então não apareceu nenhuma outra nova tão
espetacular quanto essas duas.
Entretanto, houve um caso anterior de uma outra nova brilhante — a que
apareceu em julho de 1054 na constelação do Touro. Não há registros de sua observação
na Europa, que estava então emergindo de uma “idade das trevas” durante a qual a
astronomia praticamente deixou de existir. Dispomos de registros, entretanto, feitos por
astrônomos da China e do Japão.
A nova de 1054, tal como a de Tycho, era muito mais brilhante do que Vênus.
Na verdade, era provavelmente a mais brilhante das duas e pôde ser vista em pleno dia
durante 23 dias. Lentamente empalideceu após ter alcançado seu brilho máximo, mas
passaram-se quase dois anos antes que ela voltasse a ser invisível a olho nu.

71
Por que essas novas são muito mais brilhantes do que outras? Uma resposta
lógica seria, aparentemente, que elas simplesmente estavam mais perto de nós e por isso
pareceram mais brilhantes.
Em 1885, entretanto, apareceu uma nova na região que era então denominada
nebulosa de Andrômeda (a palavra “nebulosa” vem do latim nebula, que significa
“nuvem”). A “nebulosa de Andrômeda” é uma mancha nevoenta de luz que os
astrônomos julgavam ser uma nuvem de gás e poeira dentro de nossa própria galáxia. A
nova, que eles simplesmente supuseram estar por acaso na direção da nuvem, não tinha
nada de particularmente notável, pois alcançou apenas um brilho máximo de sétima
grandeza e jamais foi suficientemente brilhante para ser observada sem auxílio de
telescópio.
Não obstante, com a observação atenta da nebulosa de Andrômeda nos anos
seguintes descobriram-se em seus limites inúmeras outras novas. Tamanha quantidade
de novas não poderia ser descoberta numa só direção; isso seria atribuir à coincidência
coisas demais. Surgiu então a idéia de que a nebulosa de Andrômeda fosse um grupo
distante de estrelas, pálidas demais para serem vistas individualmente, exceto quando
uma se transformava em nova. Por fim, por volta da década de 1920, havia um consenso
geral de que devíamos falar da galáxia de Andrômeda, que é uma galáxia muito distante
da nossa, e bem maior.
Todas as novas observadas na galáxia de Andrômeda após a nova de 1885 eram
notavelmente pálidas e equivaliam às novas ordinárias de nossa própria galáxia.
Mas a nova de 1885 era diferente. Tinha de ser muito mais brilhante que as
novas comuns, tanto as da galáxia de Andrômeda quanto da nossa. Era tão brilhante
que, sozinha, havia momentaneamente fulgido quase com o mesmo brilho de toda a
galáxia de Andrômeda. Ao atingir o máximo, era 10 bilhões de vezes mais brilhante que
nosso Sol e 100.000 vezes mais que uma nova comum. Era o que passou a ser chamado
de supernova, de modo que a nova de 1885 veio a ser designada como S Andromedae, o
S significando supernova.
Estabelecido isso, ficou claro que as novas brilhantes de 1054, 1572 e 1604 eram
supernovas de nossa própria galáxia.
As supernovas são muito mais raras que as novas. Os astrônomos as vêem de
vez em quando, aqui e ali, numa galáxia distante ou noutra. Assim que uma supernova
passa a existir, sua detecção é fácil. Quando uma estrela fulge em alguma galáxia e
atinge um brilho máximo que lhe dá o mesmo brilho de todo o resto da galáxia junta,
um astrônomo sabe que está diante de uma supernova. Talvez se possa dizer que há, em
média, 3 supernovas por milênio por galáxia, em comparação com 30.000 novas
comuns. Em outras palavras, para cada 10.000 novas há uma supernova.
É difícil estudar com detalhes as supernovas, quando estão em galáxias situadas
a milhões de anos-luz. Uma supernova em nossa própria galáxia seria muito mais útil,
mas por azar nenhuma foi vista desde 1604, de modo que nenhum objeto próximo,
desse tipo, jamais pôde ser investigado com o telescópio. Na verdade, nos quatro
séculos transcorridos desde 1604, S Andromedae foi a supernova mais próxima que se
pôde observar.
É obvio que a supernova deve representar uma imensa explosão de uma estrela
de tamanho e massa particularmente grandes. De outra forma, não poderia produzir
radiação 10 bilhões de vezes maior que a do Sol.

72
Além disso, uma supernova emite invólucros de gás, os quais são
incomparavelmente maiores que os produzidos por nebulosas planetárias, tanto em
termos de massa como de energia. O exemplo mais conhecido está em Touro, no local
da grande supernova de 1054. Temos ali uma grande mancha de gás fulgurante.
Essa mancha foi observada pela primeira vez em 1731 pelo astrônomo inglês
John Bevis (1693-1771). Em 1844 o astrônomo irlandês William Parsons, Lord Rosse
(1800-1867), examinou-a atentamente com um grande telescópio que ele havia
construído e observou que a nuvem está cheia de filamentos irregulares que lhe
lembraram as pernas de um caranguejo. Chamou-a de nebulosa do Caranguejo, e este é
o nome pela qual é conhecida até hoje.
Um estudo detido dos gases da nebulosa do Caranguejo mostra que eles ainda
estão se expandindo a uma velocidade de aproximadamente 1.300 km/s. (Essa
velocidade, tão maior do que a do invólucro de uma nebulosa planetária, é por si só
prova do poder incomparável da explosão da supernova). Calculando-se no sentido
inverso, parece que todo o gás estava no centro justamente na época da supernova de
1054.
Os astrônomos fazem os cálculos retrocederem em outros casos. Se encontram
tênues filamentos de gás que parecem fazer parte de um invólucro, suspeitam que em
alguma época,donoinvólucro
de expansão centro daquele
podeminvólucro,
até mesmoexplodiu
avaliaruma
há supernova.
quanto tempoPelasevelocidade
deu essa
explosão. Cerca de 14 supernovas, inclusive as três que conhecemos, parecem ter
explodido em nossa galáxia nos últimos 20.000 anos. Se o número de supernovas em
nossa galáxia for igual ao de outras, deve ter havido 60 ou 65. As 50, aproximadamente,
que não vimos, devem ter explodido em partes distantes da galáxia, partes que não
conseguimos ver por causa da interposição das nuvens de poeira.
Dentre as supernovas restantes que podemos detectar, a mais próxima parece ter
sido uma na constelação de Vela. Essa supernova, que deu srcem a uma nuvem de gás
chamada nebulosa Gum (em homenagem ao astrônomo australiano Colin S. Gum, que
foi o primeiro a estudá-la em detalhes, nos anos 50, e que morreu num acidente de
esqui, em 1960) tem seu centro situado a apenas 1.500 anos-luz da Terra, ao passo que a

do Caranguejo
nebulosa Gum está a 300
acha-se a somente 4.500 anos-luz
anos-luz de nós. A borda mais próxima da
da Terra.
A supernova de Vela, que deu srcem à nebulosa Gum, fulgiu há cerca de
15.000 anos, quando a Era Glacial chegava ao fim. Em seu momento de brilho máximo
pode ter sido tão brilhante como a Lua cheia, durante alguns dias, e os homens pré-
históricos teriam assistido a um espetáculo maravilhoso.
O que acontece para provocar uma supernova?
Quanto maior for a massa de uma estrela, mais alta será sua temperatura interna,
em todas as fases de sua evolução. Uma estrela de massa realmente grande atinge
temperaturas internas que estrelas menores jamais atingem nem podem atingir, e para
explicar as supernovas temos de investigar as coisas que acontecem a essas altíssimas
temperaturas.
O astrônomo sino-americano Hong-Yee Chiu (1932-) propôs uma explicação
interessante. As reações nucleares no centro da estrela, diz ele, provocam a emissão de
duas espécies de partículas sem massa, que viajam à velocidade da luz. Uma delas é o
fóton, a partícula fundamental da luz e das radiações semelhantes à luz. A outra é o
neutrino.

73
Essas duas espécies de partículas diferem no seguinte:
Os fótons são facilmente absorvidos pela matéria, de modo que tão logo se
formam são absorvidos. A seguir, formam-se de novo e são reabsorvidos, um número
indefinido de vezes, pelo que só podem mover-se à velocidade da luz durante os
diminutos e raros intervalos entre a formação e a absorção. O resultado é que os fótons
levam cerca de um milhão de anos para percorrer a distância entre o núcleo da estrela,
onde são formados, até a superfície, de onde escapam. Assim, a exaustão da energia
central por meio de fótons é pequeníssima, e as estrelas, ao emitirem fótons, irradiam
sua energia de uma maneira lenta e contínua, podendo por isso durar bilhões de anos.
Os neutrinos formados não reagem absolutamente com a matéria (ou reagem
muito pouco), e uma vez formados no núcleo da estrela eles atravessam as suas camadas
externas à velocidade da luz, como se nada existisse ali. São necessários cerca de 3
segundos para os neutrinos viajarem do núcleo de nosso Sol à sua superfície e depois
saltarem para o espaço. Poderiam levar 12 segundos para percorrer o mesmo caminho
nas estrelas maiores da seqüência principal. Assim sendo, toda energia emitida na forma
de neutrinos se perderia quase no mesmo instante.
Nas estrelas comuns, entretanto, a percentagem de energia emitida sob a forma
de neutrinos é muito pequena, de modo que em geral só temos de levar em consideração
os fótons.
Chiu sugere, no entanto, que a temperaturas extremamente elevadas — da ordem
de 6 bilhões de graus, digamos — as espécies de reações nucleares ocorridas começam
a formar neutrinos em grande quantidade. A temperatura interna do Sol, atualmente, é
de apenas 15.000.000 ºC aproximadamente, e o Sol jamais atingirá uma temperatura de
6 bilhões de graus, em nenhuma circunstância. Contudo, as estrelas possuidoras de
massa suficientemente grande atingem essas temperaturas, e quando se chega ao ponto
crítico, no qual de repente uma enorme quantidade de neutrinos começa a se formar,
todos eles escapam da estrela em segundos, levando energia consigo e esgotando o
núcleo da energia necessária para manter a estrela expandida, em face da atração da
gravidade.
Como resultado disso, o centro da estrela esfria-se rapidamente, talvez em
questão de minutos, e a estrela
nadesaba
sobre si mesma com uma violência que sobrepuja
tudo quanto possa acontecer formação de nebulosas planetárias.
Nessas estrelas de grande massa, cujos centros têm uma temperatura da ordem
de 6 bilhões de graus e nas quais os núcleos atômicos chegaram. ao nível do ferro,
através do processo de fusão, as camadas exteriores ainda se acham relativamente frias e
ainda se compõem de núcleos atômicos menores. Se nos imaginarmos passando do
centro da estrela para a superfície, percorremos regiões crescentemente isentas de
evolução, onde se encontra um número cada vez maior de núcleos menores que são
capazes de se combinar e produzir energia e que apresentam temperaturas cada vez
menores, de modo que as reações de fusão ainda não ocorrem. Nas regiões mais
periféricas da estrela é possível que ainda haja abundância de hidrogênio.
Com a súbita e esmagadora implosão da estrela, a temperatura como um todo se
eleva a níveis colossais, devido à conversão da energia gravitacional em calor, e todo o
combustível nuclear restante na estrela entra em fusão quase instantaneamente. Isso dá
srcem à enorme explosão da supernova e possibilita à estrela fulgir temporariamente
com o mesmo brilho de toda uma galáxia.

74
Na fúria da explosão, acontecem duas coisas. Em primeiro lugar, formam-se
muitos núcleos atômicos que são mais complexos que o ferro, pois há um vasto
excedente temporário de energia que possibilita a formação de tais núcleos. Em segundo
lugar, a explosão expulsa da estrela vastas quantidades de matéria, sob a forma de um
invólucro de gases aquecidos contendo todos os átomos complexos que se formaram —
até aqueles com núcleos cinco vezes maiores que os do ferro. No decurso de um período
de milhares de anos, essa matéria gradualmente se espalha pelo espaço, se rarefaz e
torna-se parte dos tenuíssimos gases do espaço interestelar.
Por fim, formam-se novas estrelas de segunda geração, a partir dos gases que
são, em parte, remanescentes dessas antigas estrelas.
As estrelas de primeira geração, formadas da matéria primeva da grande
explosão, compõem-se quase inteiramente de hidrogênio e hélio, e o mesmo terá que
acontecer com seus planetas. Núcleos mais complexos que o hélio só são encontrados
no centro dessas estrelas, e ali eles permanecem — se não houver explosões como as
das supernovas.
As estrelas de segunda geração, como nosso próprio Sol, começam com núcleos
complexos que as supernovas dispersaram, acrescentados em pequenas quantidades ao
hidrogênio e ao hélio. Os planetas das estrelas de segunda geração, como a Terra,
possuem tambémque
mais complexos esses núcleos
o hélio, atômicos.
e todos A vidanoseria
os átomos impossível
interior semcorpos,
de nossos esses elementos
exceto o
hidrogênio, se encontravam no passado no centro de estrelas que explodiram como
supernovas.
A fantástica explosão de uma supernova pode expulsar para o espaço até 9/10 da
matéria de uma estrela, deixando apenas um pequeno resto para desabar e assim
permanecer. Não é difícil imaginar que uma supernova deixe sempre um resto inferior
ao limite de Chandrasekhar, de modo que, independentemente do tamanho anterior de
uma estrela, ela sempre possa tornar-se uma anã branca — serenamente, se tiver menos
de 1,4 vezes a massa do Sol, ou com uma explosão de violência tanto maior quanto mais
acima ela estiver daquele limite.
Como existem, segundo cálculos, três supernovas por milênio em cada galáxia, e
como
havidosecerca
estima
de que
o universo
de tenha
cercadedesupernovas
15 bilhões em
de anos,
nossaéprópria
possívelgaláxia.
que tenha
45 milhões explosões Se
todas essas supernovas deram srcem a anãs brancas, elas representariam mais ou
menos 1 % do número total de anãs brancas que se julga existir em nossa galáxia.
Isso parece razoável. Podemos supor que somente as estrelas de massa muito
grande passam por uma explosão do tipo supernova, ao passo que as estrelas menores
chegam ao estágio de anã branca por meio de explosões do tipo nebulosa planetária ou
mesmo por contrações mais tranqüilas. E existem mais estrelas pequenas que estrelas
grandes, de modo que haverá muito mais anãs brancas do que houve explosões de
supernovas. (Cumpre lembrar, todavia, que mesmo as “estrelas pequenas” aqui
mencionadas não são muito menores que nosso Sol. Nenhuma das estrelas realmente
pequenas que constituem a grande maioria já viveu o suficiente para atingir o ponto de
expansão
explosão).e contração, nem mesmo que houvessem nascido no momento da grande
Assim, seria crível que já tenhamos uma imagem clara do fim das estrelas, e que
esse fim seja sempre a anã branca se resfriando e se transformando em anã negra. No
entanto, alguns astrônomos não ficaram satisfeitos...

75
Estrelas de Nêutrons

ALÉM DA ANÃ BRANCA

Já se descobriram estrelas com até 50 e, possivelmente, 70 vezes a massa do Sol.


Quando tal estrela explode, ocorre algo de indescritível. Além disso, quando ela explode
tem de perder 97 ou 98 % de sua massa para que o restante tenha apenas 1,4 vezes a
massa do Sol e possa contrair-se com segurança para o estágio de anã branca.
Isso pode acontecer, é claro. Mas, e se não acontecer? Os astrônomos sabem que
as supernovas se libertam de grande quantidade de massa, mas não há nada no processo,
ao que saibam, que afirme que uma supernova tenha de libertar-se de massa suficiente
para deixar apenas um corpo abaixo do limite de Chandrasekhar. E se, após a explosão
de supernova, o que restar de uma estrela tenha uma massa duas vezes maior que a do
Sol e essa massa de dois sóis se contrair? O fluido eletrônico assim formado se
contrairá... se contrairá... e pam! A atração da gravidade será simplesmente intensa
demais para ser neutralizada pelo fluido eletrônico em sua compressão máxima.
Os elétrons serão então impelidos para dentro, atingindo densidades em que na
verdade não podem existir. Dentro do fluido eletrônico os prótons e nêutrons vinham se
movimentando livremente; agora os elétrons se combinarão com os prótons para formar
nêutrons adicionais. Os elétrons e os prótons acham-se presentes em qualquer pedaço de
matéria, seja ele um fragmento de poeira ou uma estrela, em quantidades
aproximadamente iguais, de modo que o resultado da união será que, na prática, a
estrela em contração consistirá apenas de nêutrons.
Esses nêutrons serão impelidos pela contração gravitacional até ficarem
praticamente em contato. Então, e apenas então, essa contração se interromperá. A força
nuclear, que governa a interação das partículas com massa, impede os nêutrons de se
aproximarem mais.
eletromagnética, Nãoacontece
como se trata agora de forçanas
nos planetas, gravitacional equilibrada
estrelas comuns e atépela
nas força
anãs
brancas. Trata-se da força gravitacional equilibrada pela força nuclear, que é muito mais
forte do que a eletromagnética.
Uma estrela composta de nêutrons em contato denomina-se estrela de nêutrons.
Ela é constituída de um fluido neutrônico que às vezes é chamado neutrônio. Em certo
sentido, um núcleo atômico é composto de neutrônio e, inversamente, uma estrela de
nêutrons é como um gigantesco núcleo. O neutrônio é inacreditavelmente denso; atinge
um pico de algo como 1.000.000.000.000.000 (ou 10 15) vezes a densidade da matéria
comum.
Se uma esfera de matéria comum fosse convertida numa esfera de neutrônio, seu
diâmetro se reduziria a 1/100.000 do srcinal, sem perda de massa. Assim, se a Terra
fosse subitamente
reduziria convertida
a 0,127 km em neutrônio,
(127 metros). Uma esferaseucom
diâmetro,
diâmetroque é de
igual 12.740
a um km, se
quarteirão e
meio conteria toda a massa da Terra.

76
Da mesma forma, se o Sol, cujo diâmetro é de 1.400.000 km, fosse convertido
em neutrônio, passaria a ser uma esfera com 14 km de diâmetro. Teria o volume de um
pequeno asteróide, mas conteria toda a massa do Sol.
Não é seguro, como veremos, imaginar estrelas de nêutrons com massa muito
maior que a do nosso Sol, mas apenas para termos uma imagem clara podemos imaginar
que a estrela conhecida de maior massa se transforme, de algum modo, em neutrônio e
não perca nem um pouco de sua massa. Ela passaria a ser uma esfera com apenas 50 ou
60 km de diâmetro.
Até mesmo o ovo cósmico já foi imaginado como uma gigantesca bola de
neutrônio contendo toda a massa do universo — um “universo de nêutrons”, por assim
dizer. Ele teria 300.000.000 km de diâmetro. Se tal ovo cósmico fosse colocado onde se
encontra o Sol, ele alcançaria apenas o cinturão dos asteróides e, no entanto, conteria
toda a massa dos 100.000.000.000 de estrelas de nossa galáxia e de todas as estrelas de
100.000.000.000 de outras galáxias.
Tampouco precisamos imaginar que somente massas acima do limite de
Chandrasekhar formem estrelas de nêutrons. Quando uma supernova explode, a
contração daquela porção da estrela que não é expulsa é tão repentina que ela esmaga o
fluido eletrônico com incrível velocidade. Portanto, é menos a pura massa do que a
rápida contração
eletrônico que rompe
é esmagado, a barreira do
esse esmagamento fluidoirreversível;
se torna eletrônico.o Assim que o fluido
fluido eletrônico não
pode reconstituir-se. Em conseqüência disso, surge uma estrela de nêutrons com apenas
1/5 da massa de nosso Sol e com um diâmetro de apenas 8,2 km.
A probabilidade de que a força do desabamento de uma supernova possa
esmagar o fluido eletrônico, mesmo quando a massa em contração está abaixo do limite
de Chandrasekhar, faz com que as supernovas pareçam forçosamente formar estrelas de
nêutrons. Só haverá formação de anãs brancas quando estrelas pequenas demais para
explodirem como supernovas atinja seu ciclo de expansão e contração sem nada pior do
que o surgimento de uma nebulosa planetária.
Em 1934 o astrônomo suíço-americano Fritz Zwicky (1898-1974) e o astrônomo
germano-americano Walter Baade (1893-1960) foram os primeiros a especular quanto à
possibilidade da formação e existência de estrelas de nêutrons.
e umAlguns
anosGeorge
depois,M.o
físico norte-americano J. Robert Oppenheimer (1904-1967) aluno seu,
Volkoff, pormenorizaram a teoria.
Entretanto, veio a II Guerra Mundial, que se tornou a preocupação única dos
cientistas. Oppenheimer, por exemplo chefiou a equipe que criou a bomba nuclear.
Contudo, mesmo se descontando as pressões do trabalho de guerra, o interesse
pelas estrelas de nêutrons não era muito generalizado entre os cientistas. Afinal, o
assunto parecia excessivamente teórico. Um astrônomo seria capaz de explicar
exatamente o que poderia acontecer na explosão de uma supernova. Podia calcular a
maneira como a matéria seria expulsa, em que ponto o fluido eletrônico seria esmagado
e como se poderia formar o neutrônio — no entanto, tudo isso permaneceria como
números no papel.
Como se poderia provar que a teoria estava correta e que existem as estrelas de
nêutrons? Seria razoável supor que um objeto com 8 a 15 km de diâmetro e,
seguramente, a anos-luz de distância, pudesse ser visto?

77
Mesmo que uma estrela de nêutrons tivesse o mesmo brilho intenso da estrela
mais brilhante, sua superfície reduzidíssima emitiria somente um lampejo fosco. Mesmo
que o maior e mais bem construído telescópio fosse assestado em sua direção, ela
apareceria, na melhor das hipóteses, como uma estrela muito, muitíssimo pálida. Como
seria possível a uma pessoa dizer que se tratava de uma estrela de nêutrons que se
encontrava perto o bastante para ser detectada, ao invés de uma estrela comum, que só
parecia pálida por se encontrar extremamente distante?
Então, por que nos preocuparmos com as estrelas de nêutrons?
Enquanto a única maneira importante pela qual os astrônomos podiam estudar o
céu era observando a luz emitida pelos objetos, era inútil pensar nas estrelas de
nêutrons. Contudo, com o avanço do século XX, os astrônomos se tornaram cada vez
mais conscientes de radiações cósmicas, diferentes da luz e, por fim, o problema de se
detectar uma estrela de nêutrons acabou não parecendo tão impossível assim.

ALÉM DA LUZ

Em 1911 o físico austríaco-americano Victor Francis Hess (1883-1964)


demonstrou que algumas formas de radiação muito fortes atingem a Terra, vindas do
espaço; por isso, foram chamadas de raios cósmicos.
Os raios cósmicos compõem-se de núcleos atômicos muito velozes, carregados
eletricamente, que com toda certeza se srcinaram nos milhões de supernovas que já
explodiram em nossa galáxia. Entretanto, como os raios cósmicos são carregados
eletricamente, seus caminhos descrevem curvas, em respostas aos vários campos
magnéticos associados às estrelas e à Galáxia como um todo. Terminam chegando até
nós de todas as direções, e não há nenhum meio de sabermos de qual direção específica
uma determinada partícula de raio cósmico iniciou suas viagens. Embora os raios
cósmicos continuem a interessar aos astrônomos, não podem ser usados para nos prestar
informações a respeito de estrelas particulares.
Em 1931 o engenheiro eletrônico norte-americano Karl Guthe Jansky (1905-
1950) descobriu que existem microondas que chegam até nós, provenientes do céu. As
microondas são radiações semelhantes à luz e sem carga elétrica, de modo que viajam
em linha reta, sem serem afetadas por campos magnéticos. Como o nome indica, as
microondas são constituídas de ondas, tal como a luz, mas são cerca de um milhão de
vezes mais longas do que as ondas luminosas.
Apesar disso, o micro de microondas é uma palavra grega que significa
“pequeno”, pois as microondas pertencem a um grupo de radiações chamadas ondas de
rádio, sendo as menores desse grupo. (Aliás, as microondas são comumente chamadas
de ondas de rádio).
Em virtude de as microondas serem tão longas, comparadas com as ondas
luminosas, têm menos energia e são detectadas com menos facilidade. Além disso, a
exatidão com que uma fonte de ondas pode ser determinada diminui com o
comprimento da onda, se todas as outras circunstâncias forem iguais. Por conseguinte,
era muito mais difícil descobrir o ponto de srcem das microondas do que o da luz.
Durante longo tempo, portanto, pouco se pôde fazer com as microondas.

78
A existência de microondas provenientes do céu deixou claro que as estrelas
emitem radiações em todos os comprimentos de onda. Sucede que os comprimentos
curtos da luz ordinária e os comprimentos longos das microondas conseguem penetrar
em nossa atmosfera, enquanto os demais comprimentos de onda não o podem fazer. Por
um motivo ou outro, a atmosfera é mais ou menos opaca aos comprimentos de onda
mais curtos que o da luz visível, mais longos do que os das microondas, ou
intermediárias entre as duas.
No começo da década de 1950 começaram a ser enviados foguetes além da
atmosfera, a fim de estudar e medir essas faixas de ondas bloqueadas pela atmosfera. A
princípio os foguetes só conseguiam permanecer além da atmosfera durante curtos
períodos, antes de voltarem à Terra.
A partir de 1957, entretanto, a União Soviética e depois os Estados Unidos
começaram a colocar satélites em órbita ao redor da Terra, além da atmosfera. Esses
satélites podiam permanecer ali durante períodos indeterminados e eram capazes de
transportar instrumentos para detectar toda a faixa de radiações vindas do espaço. Com
os instrumentos apropriados, podiam detectar: radiação ultravioleta, que tem
comprimentos de onda mais curtos do que os da luz visível; raios X, cujos
comprimentos de onda são ainda menores; e até raios gama, que apresentam
comprimentos de onda ainda mais curtos.
Isso despertou esperanças, pois acontecimentos violentos envolvem
temperaturas mais elevadas e, portanto, radiação mais energética. Qualquer estrela pode
emitir luz, mas apenas as estrelas violentas — e por isso interessantes – emitem raios X,
por exemplo.
Para ilustrarmos, nosso próprio Sol emite raios X a partir de sua tênue atmosfera
exterior, a corona. Isso porque o calor produzido pelo Sol é absorvido pelos átomos
escassamente dispersos da corona, e por tanto cada átomo tem sua temperatura elevada
a um milhão de graus ou mais. (Contudo, o calor total da corona não é muito grande,
pois embora cada um dos átomos tenha temperatura tão alta, eles são muito poucos).
Por estar tão perto da Terra, o Sol é para nós o mais importante emissor de raios
X no espaço, mas se ele estivesse, a uma distância igual às das estrelas mais próximas
sua radiação de raios éXconsideravelmente
seria tão diluída pela distância
e maisque
não poderia ser edetectada.
Sírius, por exemplo, maior quente que o Sol, portanto
emite raios X com intensidades várias vezes superior à do Sol. No entanto, Sírius acha-
se a uma distância de quase nove anos-luz e seus raios X não podem ser detectados.
Se os raios X pudessem ser detectados a distâncias estelares, indicariam
violência realmente sem par, mas a princípio os astrônomos julgaram que tais detecções
não poderiam ser feitas. No começo de 1960 pressupunham que o Sol fosse a única
fonte de raios X detectável no espaço. Não obstante, havia algum interesse em estudar o
céu noturno, pois era possível que os raios X solares pudessem ser refletidos da Lua e
que isso nos pudesse prestar alguma informação a respeito da superfície lunar. (Isso foi
antes que os astronautas caminhassem na Lua).
Em 1963, sob a orientação do astrônomo americano Herbert Friedman (1916-),
realizaram-se investigações além da atmosfera para detecção de raios X provenientes da
Lua. Esses raios X não foram detectados, mas, surpreendentemente, detectaram-se
outros, vindos de outras direções. Desde então foram lançados alguns satélites com o
objetivo precípuo de mapear o céu em busca de fontes de raios X, sendo localizadas
centenas delas.

79
Isso deu ao universo um aspecto inteiramente novo. Uma fonte de raios X que
pode ser detectada a distância das estrelas e, até mesmo, em muitos casos, a distância
das outras galáxias, só pode assinalar acontecimentos muito invulgares.
Para começar, a existência de tais fontes de raios X deu srcem a esperanças de
que se pudesse detectar estrelas de nêutrons. Quando uma estrela de nêutrons se forma,
ela é, por assim dizer, como o âmago exposto de uma estrela e possui, em sua
superfície, a temperatura de um interior estelar. Cálculos teóricos fazem crer que a
superfície de uma estrela de nêutrons fulgiria a uma temperatura de 10.000.000 ºC*.
Uma estrela de nêutrons com superfície tão quente emitiria radiação
principalmente na região dos raios X. Conseqüentemente, imaginou-se se algumas das
fontes de raios X no espaço não poderiam srcinar-se de estrelas de nêutrons.
Essa não era a única possibilidade, é claro. Os raios X poderiam srcinar-se dos
gases quentíssimos expulsos pelas supernovas, por exemplo, da mesma forma como se
srcinam da coroa solar.
Essas duas possibilidades poderiam ser distinguidas da seguinte maneira: uma
estrela de nêutrons seria um ponto diminuto no céu, ao passo que uma região de gases
representaria claramente uma mancha. Muito dependeria, pois, de os raios X parecerem
provir de um único ponto ou de uma área mais ampla.
Uma das primeiras áreas suspeitas foi a nebulosa do Caranguejo. Essa nebulosa
constitui os remanescentes de uma tremenda supernova, e poderia haver uma estrela de
nêutrons em algum ponto, no meio de todos aqueles gases. E, naturalmente, os gases
estão ali, e eles se acham evidentemente num turbilhão energético. Os raios X poderiam
vir de uma estrela de nêutrons, se houvesse uma ali, ou dos gases, ou de ambos.
Em 1964 sabia-se que a Lua haveria de passar em frente da nebulosa do
Caranguejo e, à medida que ela avançasse, bloquearia a emissão de raios X. Se esses
raios estivessem vindo apenas da estrela de nêutrons, continuariam a chegar com plena
intensidade, enquanto a Lua avançasse, e de repente cairiam a zero. Se os raios X
estivessem vindo do gás; diminuiriam de intensidade paulatinamente. Se proviessem de
ambos, diminuiriam aos poucos, de início, depois sofreriam uma queda repentina, e
depois continuariam a diminuir regularmente, como no início.
No momento apropriado, foi lançado um foguete para medir a intensidade dos
raios X provenientes da nebulosa do Caranguejo, e os valores caíram gradualmente,
enquanto a Lua avançava. Os raios X pareciam provir do gás turbulento e, com isso,
desvaneceram-se as esperanças de detecção de uma estrela de nêutrons.

PULSARES

Enquanto isso, entretanto, os astrônomos haviam começado a trabalhar com

microondas,altae acomplexidade
ganhando ciência da radioastronomia
e eficiência. Oshavia se transformado
astrônomos rapidamente,
aprenderam a utilizar
complexos sistemas de dispositivos detectores (radiotelescópios) de maneira a poder

*
Se o ovo cósmico fosse uma gigantesca estrela de nêutrons, sua temperatura superficial seria provavelmente de, pelo menos,
1.000.000.000.000 °C e ela emitiria raios gama.

80
localizar fontes de microondas com grande precisão e descrever suas propriedades com
muitos detalhes.
No começo da década de 1960, por exemplo, os radioastrônomos perceberam
que algumas fontes de microondas mudam de intensidade com bastante rapidez, como
se estivessem cintilando. Começaram a projetar radiotelescópios adaptados
especialmente para captar as rápidas mudanças. Um desses radiotelescópios foi
projetado no observatório da Universidade de Cambridge, por Anthony Hewish (1924-)
e compunha-se de 2.048 dispositivos de recepção separados, espalhados por uma área
de 18.000 m2.
Em julho de 1967 o novo radiotelescópio começou a sondar os céus, e daí a um
mês uma jovem estudante, Jocelyn Bell, estava recebendo jorros de microondas
provenientes de um ponto entre as estrelas Vega e Altair. A princípio ela pensou que se
tratasse de interferência no radiotelescópio, devido a aparelhos elétricos nas
vizinhanças. Entretanto, descobriu que as fontes das emissões de microondas se moviam
regularmente, noite após noite, acompanhando as estrelas. Alguma coisa fora da Terra
tinha de ser responsável por elas, e Jocelyn transmitiu os resultados a Hewish.
Em fins de novembro o fenômeno podia ser estudado em detalhes. Hewish havia
esperado flutuação rápida, mas não tão rápida. Cada emissão de microondas durava
apenas
verdade,1/20 de segundo,
ocorriam e as emissões
com extraordinária ocorriam —
regularidade a intervalos de 1 1/3 segundos.
a cada 1,33730109 segundos. Na
O novo instrumento captava essas emissões de microondas com facilidade, pois
cada uma das emissões tinha energia suficiente para ser detectada sem problemas.
Contudo, os radiotelescópios comuns não haviam sido projetados para captar essas
emissões curtíssimas; haviam detectado apenas uma intensidade de microonda média,
inclusive o período morto entre as emissões. Essa média é apenas 3,7 % das máximas
das emissões, e isso tinha passado despercebido.
A pergunta que se fazia era: o que representava esse fenômeno? Como a fonte de
microondas parecia ser um simples ponto no espaço, Hewish pensou que ela poderia
representar algum tipo de estrela. Como as microondas emergiam em pulsos curtos, ele
pensou nessa estrela como uma espécie de estrela pulsante. A expressão foi abreviada
quase imediatamente para pulsar, e foi assim que o novo objeto passou a ser conhecido.
Hewish procurou outros objetos desse tipo entre os longos registros de suas
observações anteriores, com seus instrumentos, e encontrou mais três pulsares. Conferiu
os registros e a 9 de fevereiro de 1968 anunciou sua descoberta ao mundo.
Outros astrônomos começaram a pesquisar avidamente, e mais pulsares foram
rapidamente descobertos. Em 1975 já se conheciam 100 pulsares, e é possível que haja
até 100.000 delas em nossa galáxia.
Dois terços dos pulsares descobertos situam-se nas direções em que as estrelas
de nossa galáxia estão mais concentradas. Isso constitui bom sinal de que, de modo
geral, os pulsares pertencem a nossa própria galáxia. (Não há motivos para se supor que
não existam em outras galáxias, também, mas às grandes distâncias em que estão as
outras galáxias
próximo provavelmente
pulsar conhecido são fracos
pode estar a poucademais paradeserem
distância nós —detectados). O mais
mais ou menos 300
anos-luz.

81
Todos os pulsares caracterizam-se por uma extrema regularidade de pulsação,
mas é claro que o período exato varia de um para outro. O período mais longo de um
pulsar é de 3,75491 segundos.
O pulsar com menor período até hoje conhecido foi descoberto em outubro de
1968 por astrônomos de Green Bank, no estado norte-americano de Virgínia Ocidental.
Ele se localiza na nebulosa do Caranguejo (estabelecendo o primeiro vínculo claro entre
pulsares e supernovas) e foi possível constatar que apresenta um período de 0,033099
segundo. Pulsa 30 vezes por segundo, ou 113 vezes mais depressa que o pulsar com o
maior período conhecido.
Mas o que é capaz de produzir tais emissões curtas de maneira tão
fantasticamente regular?
Tão atônitos ficaram Hewish e seus colaboradores diante dos primeiros pulsares
que imaginaram se não seria possível que fossem sinais enviados por formas
inteligentes de vida no espaço. Na verdade, entre eles, referiam-se à questão, antes que a
palavra pulsar passasse a ser usada, como LGM — iniciais de little green men
(homenzinhos verdes).
Entretanto, essa idéia não durou muito. Para produzir os pulsos, seria necessário
10 bilhões de vezes a quantidade total de energia que a humanidade fosse capaz de
gerar. Não parecia provável que tamanha quantidade de energia fosse esbanjada apenas
para enviar sinais regularíssimos que praticamente não transmitiam nenhuma
informação. Além disso, à medida que mais e mais pulsares eram descobertos, pareceu
improvável que tantas formas diferentes de vida estivessem enviando sinais para nós. A
teoria foi rapidamente abandonada.
Entretanto, alguma coisa os estava produzindo; algum corpo astronômico devia
estar passando por uma mudança periódica regular — uma revolução em torno de
algum outro corpo, uma rotação em volta de seu próprio eixo, uma pulsação — a
intervalos suficientemente rápidos para gerar os pulsos.
Forçar mudanças tão rápidas com a liberação de tanta energia exigiria um campo
gravitacional de intensidade descomunal. Os astrônomos só conheciam uma coisa que
atendia a essas condições, e instantaneamente pensaram nas anãs brancas.
Os teóricos meteram mãos à obra incontinenti, mas por mais que se esforçassem
não parecia haver nenhum meio de conceber uma anã branca circundando outra, girando
em seu eixo ou pulsando, com um período suficientemente curto para explicar os
pulsares. Poderiam existir anãs brancas pequenas e com intenso campo gravitacional,
mas não podiam ser bastante pequenas nem ter campos gravitacionais suficientemente
intensos para a tarefa. As anãs brancas literalmente se esfacelariam se começassem a
orbitar, girar ou pulsar em períodos inferiores a 4 segundos.
Era necessária alguma coisa menor e mais densa que uma anã branca, e o
astrônomo Thomas Gold (1920-) sugeriu que os pulsares deveriam ser as estrelas de
nêutrons que Oppenheimer havia previsto teoricamente. Gold observou que uma estrela
de nêutrons é suficientemente pequena e densa para poder girar em torno de seu eixo em
quatro segundos ou menos.
Além disso, uma estrela de nêutrons teria um campo magnético, da mesma
forma que uma estrela comum, mas esse campo magnético estaria comprimido e
concentrado, como a matéria da estrela de nêutrons. Por esse motivo, o campo
magnético de uma estrela de nêutrons é imensamente mais intenso que o de uma estrela

82
comum. Ao girar em torno de seu eixo uma estrela de nêutrons emite elétrons, mas
esses elétrons são detidos por seu campo magnético e só são capazes de escapar nos
pólos magnéticos, localizados nos lados opostos da estrela.
Não há nada que obrigue os pólos magnéticos a coincidirem com os pólos
rotacionais. (No caso da Terra, por exemplo, não coincidem). Cada pólo magnético
poderia circundar o pólo rotacional em segundos ou numa fração de segundo, e espalhar
elétrons ao fazê-lo (da mesma forma que um espargidor giratório de água esguicha
água). Ao serem disparados, os elétrons descrevem uma curva, em resposta ao campo
magnético e ao campo gravitacional da estrela de nêutrons. Perdendo energia, não
podem escapar inteiramente, mas a energia que perdem toma a forma de microondas.
Assim, toda estrela de nêutrons esguicha dois jorros de microondas dos lados
opostos de seu pequeno globo. Se uma estrela de nêutrons, ao girar, por acaso emite um
desses jatos de elétrons diante de nossa linha de visão, a Terra receberá um brevíssimo
pulso de microondas em cada rotação. Alguns astrônomos calculam que apenas uma em
cem estrelas de nêutrons envia fortuitamente microondas em nossa direção, de modo
que das possíveis 100.000 delas que existirão em nossa galáxia, é de se crer que jamais
consigamos detectar mais de mil.
Em prosseguimento, Gold observou que, a estar correta sua teoria, a estrela de
nêutrons está perdendo
estar diminuindo. energia pelos
Isso significa pólos magnéticos
que quanto mais rápido efor
suao velocidade
período de de
umrotação
pulsar deve
mais
jovem, provavelmente, ele será e mais rapidamente estará perdendo energia e
desacelerando seu movimento.
O mais rápido pulsar conhecido e que possui os pulsos mais enérgicos é o da
nebulosa do Caranguejo, e é bem possível que seja o mais jovem que já observamos até
agora, já que a explosão de supernova que provocou o surgimento dessa estrela de
nêutrons ocorreu há apenas 900 anos. No exato momento de sua formação, o pulsar da
nebulosa do Caranguejo poderia estar girando em volta de seu eixo 1.000 vezes por
segundo, mas com isso teria perdido energia rapidamente; nos primeiros 900 anos de
sua existência mais de 97% de sua energia se perdeu, até atingir sua velocidade atual, de
apenas 30 giros por segundo.

E deve estar diminuindo sua velocidade ainda mais; embora cada vez mais
lentamente.
Por isso estudou-se cuidadosamente o período do pulsar da nebulosa do
Caranguejo e verificou-se que ele estava se retardando, exatamente como previsto por
Gold. O período está aumentando em 36,48 bilionésimos de segundo a cada dia, e a esse
ritmo ele duplicará em 1.200 anos. O mesmo fenômeno foi descoberto em outros
pulsares, cujos períodos são mais longos que o da nebulosa do Caranguejo e cujo ritmo
de retardamento também é mais lento. O primeiro pulsar descoberto, hoje denominado
CP1919, tem um período 40 vezes mais longo que o da nebulosa do Caranguejo e está
se retardando a um ritmo que só duplicará seu período daqui a 16 milhões de anos. Ao
diminuir o período de um pulsar, seus pulsos tornam-se menos enérgicos. Quando o
período vai além de 4 segundos, o pulsar torna-se fraco demais para ser detectado.
Contudo,
milhões deéanos.
possível que os pulsares durem, como objetos detectáveis, dezenas de
Como resultado desses estudos do retardamento dos pulsos, os astrônomos
acham-se bastante convencidos de que os pulsares são estrelas de nêutrons.

83
Às vezes um pulsar acelera de repente seu período, muito ligeiramente, para
depois retomar a tendência ao retardamento. Isso foi descoberto em fevereiro de 1969,
quando o período do pulsar Vela X-1 (detectado entre os destroços da supernova que
explodiu há 15.000 anos) alterou-se repentinamente. Essa súbita modificação foi
denominada glitch, uma palavra iídiche que significa “escorregão”, e por isso o termo
entrou para o vocabulário científico.
Suspeitam alguns astrônomos que os glitches possam ser resultado de um
starquake, uma modificação da distribuição da massa dentro da estrela de nêutrons que
levaria seu diâmetro a reduzir-se em um centímetro ou menos. Ou talvez fosse resultado
do choque de um meteoro de grande dimensão com a estrela de nêutrons, com o que ele
adicionaria seu próprio momento ao da estrela.
Não há, naturalmente, nenhum motivo para que os elétrons que emergem de uma
estrela de nêutrons só percam energia como microondas; eles deveriam produzir ondas
em toda a extensão do espectro. Deveriam, por exemplo, emitir também raios X, e com
efeito a estrela de nêutrons da nebulosa do Caranguejo os emite. Cerca de 10 a 15% de
todos os raios X que a nebulosa do Caranguejo produz provêm de sua estrela de
nêutrons; são os outros 85% ou mais que vêm dos gases em turbulência que
obscureceram esse fato e desalentaram os astrônomos que procuraram ali uma estrela de
nêutrons em 1964.
Uma estrela de nêutrons deveria também produzir emissões de luz visível. Em
janeiro de 1969 observou-se que a luz de uma pálida estrela de 16ª grandeza na
nebulosa do Caranguejo realmente pisca, acompanhando precisamente os pulsos de
microondas. Os lampejos e o período entre eles são tão breves que foi preciso
equipamento especial para captá-los; sob observação comum, a estrela parece ter luz
constante. A estrela de nêutrons da nebulosa do Caranguejo foi o primeiro pulsar óptico
a ser descoberto, a primeira estrela de nêutrons visível — e até agora é a única.

PROPRIEDADES DAS ESTRELAS DE NÊUTRONS

Os astrônomos têm procurado detalhar a composição das estrelas de nêutrons.


Na superfície, é possível que haja uma fina camada de matéria normal, principalmente
ferro, e até mesmo uma atmosfera de ferro gasoso, talvez com meio centímetro de
espessura. Há também partículas carregadas, como elétrons e núcleos atômicos, presos
ao superintenso campo magnético da estrela. Essas partículas, sobretudo os elétrons, são
aquelas emitidas pelos pólos magnéticos e que produzem os pulsos de radiação
detectados na Terra.
Abaixo desse invólucro externo de matéria normal acham-se núcleos de ferro
muito compactos, apresentando características que consideraríamos como “sólidas”,
muito embora essa crosta possua uma temperatura de milhões de graus. A borda exterior
dessa crosta tem uma densidade de apenas 100.000 g/cm3, mas essa densidade aumenta
rapidamente com a profundidade.
É essa superfície sólida, com uma resistência um quatrilhão de vezes superior à
do aço e com “montanhas” de talvez um centímetro de altura, que se reajusta
ocasionalmente para aceitar uma forma mais compacta, produzindo os glitches, que
diminuem ligeiramente o período de rotação.

84
Abaixo da crosta, ao aumentar a densidade, os núcleos atômicos não conseguem
manter sua integridade e o material transforma-se numa massa de nêutrons. Nas
proximidades do centro pode haver um mar de partículas com massa ainda maior,
denominadas híperons*.
Uma propriedade importante da estrela de nêutrons é sua massa. Em 1975 foi
determinada, pela primeira vez, a massa de uma estrela de nêutrons; o objeto em
questão, Vela X-1, tem uma massa de 1,5 vezes a do Sol. A descoberta foi interessante,
pois a massa estava ligeiramente acima do limite de Chandrasekhar. Nenhuma anã
branca poderia ter massa tão grande (embora devamos lembrar que estrelas de nêutrons
com massas consideravelmente abaixo do limite de Chandrasekhar também são
possíveis, em teoria).
A massa de Vela X-1 pôde ser determinada porque essa estrela de nêutrons é
parte de um binário. Sua companheira é uma estrela da seqüência principal, com 30
vezes a massa do Sol. Indubitavelmente os membros de um binário, se tiverem massa
suficiente, podem trocar matéria mutuamente quando da expansão de cada um deles,
formando por fim um par de estrelas de nêutrons, da mesma forma que binários de
maior massa podem, dessa maneira, produzir um par de anãs brancas.
Vela X-l deve ter sido, srcinalmente, a estrela mais brilhante do par, e há
15.000 anos, quando
um milésimo tornou-se
da matéria umapela
expulsa supernova, sua aumentando
explosão, companheiraconsideravelmente
pode ter capturado até
em
massa e brilho; com isso, naturalmente, encurtou sua própria vida na seqüência
principal. Dentro de um milhão de anos ou menos a companheira de Veta X-1 também
explodirá como uma supernova, e poderá haver então duas estrelas de nêutrons girando
em torno de um centro de gravidade comum. O fato de uma estrela de nêutrons poder
fazer parte de um binário, como Vela X-1, mostra que quando uma estrela de um par se
transforma em supernova, a outra pode sobreviver.
A troca de matéria entre uma estrela e outra, quando primeiro uma e depois a
outra se expandem, resulta na conversão de energia gravitacional em radiação,
sobretudo quando está envolvida uma anã branca ou uma estrela de nêutrons, com um
campo gravitacional muito intenso. Até 40% da massa de matéria podem ser

transformados
que em energiaemdessa
pode ser convertida maneira
energia — mais
por meio de 100
de fusão vezes aIsso
nuclear. quantidade de massa
é outro ponto que
ajuda a explicar o brilho das novas e das supernovas.
Consideremos agora algumas das propriedades gravitacionais de uma estrela de
nêutrons, tomando como espécime médio uma que possua exatamente a mesma massa
do Sol, mas o diâmetro 100.000 vezes menor. Para atender a essas especificações, tal
estrela deverá ter um diâmetro de 14 km e uma densidade média de
1.400.000.000.000.000 g/cm3.
Se examinarmos primeiramente o Sol, sua gravidade superficial é igual a 28
vezes a da Terra. Assim, uma pessoa que pese 70 kg na Terra pesaria quase 2.000 kg na
superfície do Sol (supondo-se que o Sol tenha uma superfície no sentido terrestre e que
uma pessoa pudesse sobreviver à experiência).
Ora, se imaginarmos um corpo com uma dada massa sendo comprimido cada
vez mais, qualquer objeto em sua superfície torna-se cada vez mais próximo do centro.
De acordo com a lei da gravitação de Newton, a gravidade superficial (supondo-se que a
*
Os híperons podem ser produzidos em laboratório, mas nas condições terrestres eles se decompõem em menos de um bilionésimo
de segundo.

85
massa não mude) se altera segundo a razão inversa* do quadrado do diâmetro. Assim, se
comprimirmos uma estrela, de modo que ela passe a ter apenas metade de seu diâmetro
srcinal, a gravidade superficial será de 2 x 2, ou 4 vezes a srcinal. Se ela for
comprimida a um sexto do diâmetro srcinal, então a gravidade superficial será de 6 x 6
ou 36 vezes a srcinal, e assim por diante.
Sírius B, que tem um diâmetro equivalente a 1/30 do diâmetro do Sol e uma
massa aproximadamente igual à dele, deve ter uma gravidade superficial de 30 x 30, ou
900 vezes a do Sol. Nossa hipotética pessoa de 70 kg, capaz de sobreviver à
experiência, pesaria na superfície de Sírius B 1.800.000 kg.
Uma estrela de nêutrons com a massa do Sol e um diâmetro de 14 km
(1/100.000 do Sol) deve ter uma gravidade superficial de 100.000 x 100.000, ou
10.000.000.000 de vezes a do Sol. Nossa pessoa de 70 kg pesaria 20 trilhões de quilos.
E os períodos de rotação?
A Terra, com uma circunferência de 40.000 km, gira em torno de seu eixo em
um dia. Isso significa que um ponto no equador, que descreve num dia de rotação um
círculo maior do que qualquer outro ponto fora do equador, está se movendo em torno
do eixo da Terra a uma velocidade constante de aproximadamente 0,5 km por segundo.
Essa velocidade diminui uniformemente ao nos afastarmos do equador, para o norte ou
para o sul, até chegar a zero nos pólos.
Uma velocidade rotacional acarreta um efeito centrífugo que tende a neutralizar
a atração da gravidade. Esse efeito centrífugo aumenta com a velocidade de rotação, de
modo que é nulo nos pólos e aumenta progressivamente até chegar ao máximo no
equador. O efeito centrífugo tende a arrastar material para longe do eixo, sendo mais
forte no equador, de modo que podemos dizer que a Terra tem uma protuberância
equatorial. Não é muito grande; o diâmetro equatorial (a distância que vai de qualquer
ponto no equador ao ponto oposto, passando pelo centro da Terra) é 43 km maior do
que o diâmetro polar (de pólo, a pólo). O diâmetro equatorial da Terra é, grosso modo,
1/300 mais longo que o diâmetro polar, e essa é uma medida do achatamento da Terra.
Por outro lado, Júpiter, o maior planeta do sistema solar, tem uma circunferência
equatorial de 449.000 km e gira em torno de si mesmo em 9,85 horas. Por conseguinte,
um ponto situado no equador jupiteriano move-se a uma velocidade de 12,7 km/s, quase
25 vezes mais depressa que um ponto no equador da Terra.
Apesar da maior gravidade de Júpiter, essa enorme velocidade de rotação,
combinada com o fato de que a substância de Júpiter compõe-se de elementos mais
leves, muito menos comprimidos que os da substância da Terra, tem como resultado um
maior achatamento de Júpiter. O diâmetro equatorial de Júpiter é 8.700 km mais longo
que seu diâmetro polar; seu achatamento é de 1/16**.
Para comparar: o Sol tem uma circunferência de 4.363.000 km e gira em torno
de seu eixo em 25,04 dias. Portanto, um ponto em seu equador move-se com uma
velocidade de cerca de 2 km/s — quatro vezes maior que a velocidade de um ponto no
equador terrestre, mas apenas 1/6 da velocidade de um ponto no equador jupiteriano. A
combinação de velocidade de rotação relativamente baixa e imensa gravidade
*
Com razão inversa queremos dizer que a gravidade superficial e o diâmetro mudam em direções opostas. Se o diâmetro diminui, a
gravidade superficial aumenta; se o diâmetro aumenta, a gravidade superficial diminui.
**
Saturno é um pouco menor que Júpiter e não gira tão depressa, mas seu campo gravitacional também é menor, e Saturno é ainda
mais achatado que Júpiter.

86
superficial é tal que, no caso do Sol, nenhum achatamento pode ser medido. Até onde
podemos dizer, o Sol é uma esfera perfeita.
Não sabemos qual seja o período de rotação de Sírius B, nem o de nenhuma
outra anã branca, mas sabemos que uma estrela de nêutrons típica gira em torno de seu
próprio eixo em cerca de 1 segundo, a julgar pelo período de pulsação dos pulsares. Se
nossa estrela de nêutrons de 14 km de diâmetro gira em torno de si mesma em 1
segundo, então um ponto em seu equador estará se movendo a uma velocidade de
aproximadamente 44 km/s.
Essa velocidade é 3,5 vezes maior que a de um ponto no equador de Júpiter, 21,8
vezes maior que a de um ponto no equador do Sol e 95 vezes maior que a de um ponto
no equador da Terra. Não obstante, considerando-se o intensíssimo campo gravitacional
de uma estrela de nêutrons, podemos ter certeza absoluta de que sua velocidade de
rotação, por grande que pudesse ser pelos padrões do sistema solar, simplesmente não é,
nem de longe, capaz de erguer qualquer quantidade de material contra a gravidade,
através de um efeito centrífugo. Apesar de tudo, a estrela de nêutrons tem de ser uma
esfera perfeita. Podemos ter quase a mesma certeza de que uma anã branca deve ser
também uma esfera perfeita.
Se não é provável que a força centrífuga seja capaz de erguer a substância das
anãs brancas
gravidade, e das estrelas
podemos imaginardequenêutrons a uma dedistância
a velocidade escape mensurável, vencendo
de tais objetos deve sera
altíssima.
A velocidade de escape varia na razão inversa da raiz quadrada do diâmetro
(pressupondo-se nenhuma mudança na massa). Assim, se reduzirmos uma estrela a 1/36
de seu diâmetro srcinal, a velocidade de escape aumenta seis vezes (uma vez que 6 é a
raiz quadrada de 36).
Com base nisso, vemos que Sírius B, com uma massa igual à do Sol e um
diâmetro 30 vezes menor, deve ter uma velocidade de escape 5,5 vezes maior que a do
Sol. Como a velocidade de escape do Sol é de 617 km/s, a da superfície de Sírius B será
de 3.400 km/s.
Por outro lado, nossa estrela de nêutrons, com uma massa igual à do Sol mas um
diâmetro igual a apenas 1/100.000 do solar, terá uma velocidade de escape maior que a
do Sol por um fator igual à raiz quadrada de 100.000, ou 316. Será igual a 617 x 316, ou
cerca de 200.000 km/s.
Esses números referentes à velocidade de escape são particularmente
importantes para nós porque representam outro marco no caminho para o buraco negro.
Por isso, vamos apresentá-los em forma tabular.

87
QUADRO 12 — Velocidades de escape

Objeto km/s Velocidade de escape


(fração da velocidade da luz)
Terra 11,2 0,0000373
Júpiter 60,5 0,00020

Sol 617 0,0020


Sírius B 3.400 0,011
Estrela de nêutrons 200.000 0,67

Para os objetos de matéria ordinária, as velocidades de escape são frações


diminutas da velocidade da luz. Mesmo para o Sol a velocidade de escape equivale a
apenas 1/500 da velocidade da luz. No caso da anã branca, a velocidade de escape é de
1/100 da velocidade da luz, e a própria luz perde uma quantidade mensurável de energia
ao deixar o corpo. Foi por intermédio dessa perda de energia e por causa do conseqüente
pequeno desvio para o vermelho na luz de Sírius B que Adams pôde verificar sua
natureza densa.
Uma estrela de nêutrons terá provavelmente uma velocidade de escape igual a
2/3 da velocidade da luz, e o desvio de Einstein seria muito maior. Podemos receber
raios X de uma estrela de nêutrons, mas se não fosse o intenso efeito gravitacional da
estrela os raios X que recebemos teriam ondas muito mais curtas do que realmente têm.
E quanto à radiação de ondas longas que recebemos — as ondas de luz visível e as
microondas, muito mais longas — grande parte dela não existiria se não fossem os
efeitos alongadores de onda do campo gravitacional da estrela de nêutrons.

EFEITOS DE MARÉ

Existe um outro efeito gravitacional que podemos desprezar na superfície da


Terra, mas que adquire importância primordial nas vizinhanças de uma estrela de
nêutrons. É o efeito de maré.
A intensidade da atração gravitacional entre dois objetos de massa dada depende
da distância entre seus centros. Por exemplo, quando estamos em pé na superfície da
Terra, a intensidade da atração gravitacional da Terra sobre nós depende de nossa
distância até o centro da Terra.
Contudo, nem todo o corpo da pessoa se acha a mesma distância do centro da
Terra; os pés estão quase dois metros mais perto do centro da Terra do que a cabeça.
Isso significa que os pés são mais atraídos para a Terra do que a cabeça, pois a atração
gravitacional aumenta com a distância. Essa diferença na atração gravitacional entre
duas extremidades de um objeto é o efeito de maré.
Em circunstâncias normais, os efeitos de maré não são pronunciados.
Imaginemos uma pessoa corpulenta, com 2 metros de altura e 90 kg de peso. Se ela
estiver de pé ao nível do mar, nos Estados Unidos, as solas de seus pés estarão a
aproximadamente 6.370.000 m do centro da Terra. Digamos que estejam exatamente a

88
essa distância. Nesse caso, o alto de sua cabeça estará a cerca de 6.370.002 m do centro
da Terra.
A atração gravitacional no alto de sua cabeça é igual a (6.370.000/ 6.370.002)2
vezes a atração gravitacional nas solas de seus pés. Isso significa que a atração sobre
seus pés é aproximadamente 1,0000008 vezes maior que a atração sobre sua cabeça, o
que equivale a dizer que ela está numa roda de tortura, com o alto da cabeça e as solas
dos pés sendo distendidas pelo peso de 0,000071 kg — mais ou menos o equivalente a
quatro gotas de água. Esse tipo de puxão é pequeno demais para ser sentido, e é por isso
que não tomamos consciência dos efeitos de maré produzidos pela Terra sobre nosso
corpo.
O efeito de maré é maior se o objeto submetido a um campo gravitacional tiver
maiores dimensões, de modo que haja uma diferença maior na força exercida sobre as
duas extremidades do objeto. Ao invés de uma pessoa, escolhamos como exemplo a
Lua.
A Lua tem um diâmetro de 3.475 km e seu centro acha-se a uma distância média
de 384.321 km do centro da Terra. Se imaginarmos que a Lua está sempre a essa
distância (na verdade há uma pequena variação para mais e para menos durante o mês,
mas não é grande), então a parte de sua superfície voltada diretamente para a Terra
estaria
386.058a km.
382.584 km do centro da Terra e a parte oposta de sua superfície estaria a
Nessas circunstâncias, a atração gravitacional da Terra sobre o lado próximo da
Lua seria 1,018 vezes maior que sobre o lado mais afastado.
A força total da atração gravitacional da Terra sobre a Lua (o peso que
imaginaríamos que ela tivesse se repousasse numa plataforma atraída para o centro da
Terra e com 384.321 km de altura) seria de 20.000.000.000.000.000.000 kg.
Se toda a Lua estivesse à distância de sua superfície mais próxima, ela pesaria
800.000.000.000.000.000 kg mais do que se toda ela estivesse à distância da parte mais
remota de sua superfície. Podemos então imaginar a Lua sendo esticada para perto e
para longe da Terra por esse grau de atração; 800 quatrilhões de quilos não é uma
atração a ser desprezada, e a Lua mostra uma pequena protuberância nessa direção. O
diâmetro que aponta para a Terra é ligeiramente maior que o diâmetro perpendicular a
esse.
O efeito funciona inversamente também. A Lua exerce atração sobre a Terra, e
essa atração é mais intensa sobre o lado da Terra mais próximo a ela que sobre o lado
oposto. Como a Terra tem diâmetro maior que o da Lua, há uma distância mais longa,
na qual a atração gravitacional pode decrescer, o que leva a um aumento do efeito de
maré. A Lua é um corpo menor que a Terra e produz uma atração gravitacional total
menor, e isso leva a uma diminuição do efeito de maré.
A diminuição vence. O menor campo gravitacional da Lua é fator mais
importante que o maior diâmetro da Terra. Se o efeito gravitacional fosse
preponderante, o efeito de maré exercido pela Lua sobre a Terra seria 1/81 do efeito de
da Lua
maré da Terra sobre
sobre a Lua.
a Terra O maior
é igual a 1/70diâmetro
do efeitodadeTerra
maré compensa isso,aeLua.
da Terra sobre o efeito de
A Terra é esticada na direção da Lua em grau perceptível. A sólida esfera da
Terra é esticada em cerca de 33 cm. As águas dos oceanos cedem mais facilmente e
esticam-se pouco mais de 1 metro.

89
Por conseguinte, há uma protuberância no oceano (e uma outra, menor, na crosta
sólida) no lado que dá para a Lua e outra no lado oposto da Terra. À medida que a Terra
gira, as superfícies terrestres entram e saem da protuberância, e depois entram e tornam
a sair da outra protuberância. Em resultado disso, o oceano invade um pedaço da praia e
se afasta dela duas vezes por dia (de uma forma fortemente afetada pelo feitio da linha
de costa e por outros fatores que podemos deixar de lado neste livro). Esse movimento
oceânico bidiário é denominado maré, e por isso o fenômeno é chamado de efeito de
maré.
Os efeitos de maré de corpos como a Terra e a Lua não são realmente muito
grandes, comparados com a força gravitacional total, mas aumentam com o tempo. À
medida que a Terra gira sobre as protuberâncias, a fricção da água sobre o fundo das
porções mais rasas do oceano converte parte da energia rotacional em calor. E resultado
disso, a Terra está sofrendo uma lenta diminuição de sua velocidade de rotação e um
lento aumento da duração de seu dia. O dia torna-se 1 segundo maior a cada 100.000
anos. Isso não parece muito, mas se esse ritmo de diminuição tiver sido constante, a
Terra girava em apenas 12,7 horas quando se formou.
A Terra não pode perder momento angular (algo que envolve sua velocidade de
rotação) sem que essa perda seja ganha em outro ponto do sistema Terra-Lua; no caso, a
Lua ganha esse momento angular e, por causa disso, está lentamente se afastando da
Terra, uma vez que esse é o resultado de ela aumentar seu momento angular.
O efeito de maré da Terra sobre a Lua retardou o movimento de rotação de nosso
satélite até o ponto de fazer com que ele nos mostre a mesma face constantemente.
Tal como a gravitação como um todo, o efeito de maré muda com a distância
entre dois corpos dados, mas de uma maneira um pouco diferente.
Suponhamos que a Terra e a Lua estivessem se aproximando lentamente. A
atração gravitacional total aumentaria à medida que se aproximassem, variando na razão
inversa do quadrado da distância. Se a Terra e a Lua estivessem na metade de sua
distância atual, a atração gravitacional aumentaria 2 x 2, ou 4 vezes. Se estivessem a um
terço da distância atual, a atração gravitacional entre ambas aumentaria 3 x 3, ou 9
vezes, e assim por diante.
O efeito de maré depende do tamanho do corpo submetido a um campo
gravitacional; quanto maior o corpo, maior será o efeito de maré. Contudo, o que conta
não é apenas o tamanho do corpo, porém seu tamanho comparado com a distância total
até o centro da atração gravitacional.
Atualmente, o diâmetro da Lua, de 3.475 km, equivale a quase 0,009 vez a
distância entre a Terra e a Lua. Se a distância entre os dois corpos fosse dividida ao
meio, o diâmetro da Lua (que continuaria a ser o mesmo) passaria a equivaler a 0,018
vez essa distância. Em outras palavras, à medida que a distância diminuísse, o efeito de
maré aumentaria proporcionalmente à diminuição, uma vez que o diâmetro da Lua
representaria uma fração cada vez maior da distância total.
Temos então dois fatores que tendem a aumentar os efeitos de maré — um deles
variando
da na razão
distância. inversa do quadrado
Se dividíssemos ao meio a da distância
distância e oaoutro
entre Terravariando
e a Lua, na razãode
o efeito inversa
maré
aumentaria 2 x 2 vezes devido ao primeiro fator, e 2 vezes devido ao segundo. O
aumento total seria de 2 x 2 x 2, ou 8 vezes. Ora, 2 x 2 x 2 é o cubo de 2, de modo que o
que estamos dizendo é que o efeito de maré varia na razão inversa do cubo da distância.

90
Se a distância entre dois corpos triplicar, então o efeito de maré será reduzido
para 1/3 x 1/3 x 1/3, ou 1/27 do que era. Inversamente, se a distância entre o corpo
reduzir-se a 1/3, o efeito de maré aumentará 3 x 3 x 3, ou 27 vezes.
Se a Terra e a Lua estivessem se aproximando um do outro, portanto, o efeito de
maré recíproco aumentaria constantemente e muito depressa. (Qualquer que fosse a
distância, porém, o efeito de maré da Terra sobre a Lua continuaria a ser 70 vezes maior
que o da Lua sobre a Terra).
Por fim, chegaria um ponto, bem antes de ser feito contato, em que o efeito
retesador sobre a Lua seria tão forte que a própria estrutura do satélite se partiria. Nesse
momento, a Terra, sofrendo apenas 1/70 do efeito de maré sofrido pela Lua, ainda
conseguiria manter sua integridade, muito embora as enormes marés oceânicas
indubitavelmente viessem a destruir tudo na superfície continental.
Em 1849 o matemático francês Edouard A. Roche (1820-1883) demonstrou que
se um satélite for mantido íntegro apenas pela atração gravitacional — se for líquido,
por exemplo — ele se partirá ao aproximar-se de um planeta a uma distância inferior a
2,44 vezes o raio desse planeta. Esse é o chamado limite de Roche. Se um satélite for
mantido íntegro por forças eletromagnéticas, como é o caso da Lua, pode aproximar-se
um pouco mais de 2,44 vezes o raio da Terra, antes que o retesamento provocado pelo
efeito de maré o esmague e destrua.
O raio da Terra no equador é de 6.378,5 km, de modo que para a Terra o limite
de Roche é de aproximadamente 15.500 km — apenas 1/25 da distância verdadeira até a
Lua. Se um dia a Lua chegasse tão perto da Terra, seria despedaçada e suas partículas se
espalhariam em órbita ao redor da Terra; a Lua se transformaria num conjunto de anéis,
como os de Saturno, porém com maior massa, e não mais exerceria qualquer efeito de
maré substancial sobre a Terra, uma vez que as diversas partes do anel puxariam
igualmente em todas as direções.
O despedaçamento não prosseguiria indefinidamente. À medida que a Lua se
desintegrasse em fragmentos menores, cada fragmento, sendo de tamanho menor,
experimentaria um menor efeito de maré. Por fim, cada fragmento seria pequeno demais
para que o decrescente efeito de maré continuasse a quebrá-lo.
Chega-se a um ponto em que o efeito de maré é insuficiente para quebrar o
corpo, mesmo que ele entre em contato com o corpo que o atrai. É por isso que uma
nave espacial pode pousar na Lua sem se romper e nós, e todos os outros objetos sobre a
superfície da Terra, podemos permanecer intactos. O efeito de maré para objetos de
nosso tamanho e para o tamanho das coisas que construímos é insignificante.
Quanto mais intenso um campo gravitacional, contudo, mais intenso é o efeito
de maré e mais fina se torna a pulverização dos objetos que se desfazem ao atingir o
limite de Roche.
Para examinarmos campos gravitacionais mais intensos que o da Terra,
consideremos o caso do Sol, que tem uma massa 333.500 vezes maior que a da Terra e
que, por conseguinte, tem um campo gravitacional 333.500 mais intenso. O maior
diâmetro dodaSolTerra
superfície faz com
está que
do sua superfície
centro estejae mais
da Terra; comodistante de seu centro
a intensidade que a
da atração
gravitacional varia na razão inversa do quadrado da distância, a gravidade superficial do
Sol é apenas 28 vezes maior que a da Terra.

91
O efeito de maré, no entanto, varia na razão inversa do cubo da distância. Como
o diâmetro do Sol é 109,2 vezes maior que o da Terra, temos que dividir 333.500 (a
intensidade do campo gravitacional do Sol em comparação com o da Terra) por 109,2 x
109,2 x 109,2, ou 1.302.170. Dividindo 333.500 por 1.302.170, obtemos 0,256.
Segue-se, pois, que o efeito de maré exercido pelo Sol sobre objetos em sua
superfície equivale a apenas 1/4 o efeito de maré exercido pela Terra sobre objetos em
sua superfície.
Suponhamos, porém, que o Sol se contraísse, sem perder nada de sua massa. Um
objeto em sua superfície estaria cada vez mais perto de seu centro, e o efeito de maré
sobre ele aumentaria rapidamente.
Sírius B tem massa igual à do Sol, mas diâmetro 30 vezes menor. O efeito de
maré sobre a superfície de Sírius B seria 30 x 30 x 30 ou 27.000 vezes o exercido sobre
a superfície solar, e 7.000 vezes o da superfície da Terra.
Se pudermos imaginar um ser humano (com 2 m de altura e 90 kg de peso) de pé
sobre uma anã branca, sem ser afetado por sua radiação, calor ou gravidade total, ele
ainda não se sentiria muito prejudicado pelo efeito de maré, mesmo que esse efeito
fosse muito maior do que na superfície da Terra. Multiplicando-se o efeito terrestre por
7.000 ainda veríamos esse ser humano ser esticado por um puxão de apenas 0,5 kg
aproximadamente.
E quanto ao limite de Roche? Como o limite de Roche é de 2,44 vezes o raio do
corpo que exerce a atração gravitacional, e como o cubo de 2,44 é 14,53, o efeito de
maré produzido por qualquer corpo em seu limite de Roche é de 1/14,53 do efeito de
maré que ele produz em sua superfície. Se o efeito de maré de Sírius B sobre sua
superfície é 7.000 vezes o da Terra em sua superfície, e se ambos os efeitos forem
divididos por 14,53, a proporção continua ainda a mesma; o efeito de maré ao limite de
Roche de Sírius B é 7.000 vezes o do limite de Roche da Terra.
Isso significa que qualquer objeto de grandes dimensões que se encontre perto
demais de uma anã branca será despedaçado em fragmentos muito mais finos do que se
estiver perto demais do Sol ou da Terra. Significa também que objetos pequenos que
fossem capazes de resistir aos efeitos de maré do Sol ou da Terra, em seus limites de
Roche, e permanecessem intactos, poderiam, entretanto, despedaçar-se sob a influência
de uma anã branca.
Indo além, imaginemos que um objeto com a massa do Sol se contraia até chegar
ao estágio da estrela de nêutrons e tenha apenas 14 km de diâmetro. Agora, um objeto
colocado em sua superfície estará a apenas 1/100.000 da distância até seu centro do que
estaria se estivesse na superfície do Sol. Portanto, o efeito de maré sobre a superfície da
estrela de nêutrons é 100.000 x 100.000 x 100.000, ou um quatrilhão de vezes maior
que na superfície do Sol, ou 250 trilhões de vezes maior do que na superfície da Terra.
Um ser humano de 2 m de altura que ficasse de pé numa estrela de nêutrons e
que fosse imune à sua radiação, calor e gravidade total, seria, entretanto, repuxado pelas
suas extremidades por uma força de 18 bilhões de quilos, e é evidente que esse ser

ahumano, ou qualquer
estrela de nêutrons,outra coisa,
em seu se desintegraria
limite de Roche (34numa nuvem
km de de pó. Da
seu centro), mesma forma,
transformaria os
objetos em pó fino.
(Um segundo efeito de maré decorre do fato de que um corpo em um objeto
esférico tem suas duas extremidades atraídas para o centro em direções ligeiramente

92
diferentes; isso tende a comprimi-lo latitudinalmente. Desde que o corpo seja bastante
grande para que sua superfície seja praticamente plana sobre a largura, esse efeito é
mínimo. Até mesmo numa estrela de nêutrons é bastante pequeno para ser ignorado —
pelo menos em comparação com o enorme efeito distensor sobre as extremidades
longitudinais).
Mesmo a uma distância de 5.000 km do centro de uma estrela de nêutrons, um
ser humano sentiria um esticamento de aproximadamente 45 kg se o eixo longitudinal
de seu corpo estivesse apontando para a estrela, e esse efeito seria deveras doloroso.
Se uma espaçonave do futuro, devidamente protegida contra o calor e a radiação,
se aproximasse a 5.000 km de uma estrela de nêutrons (distância essa à qual ela seria
meramente um pontinho vago a olho nu), não haveria necessidade de seus ocupantes se
preocuparem com o efeito gravitacional total. A nave poderia passar pela estrela em
queda livre numa órbita curva e afastar-se novamente (caso se movesse a uma
velocidade suficientemente grande). Não sentiria então nenhuma gravitação, da mesma
forma como não sentimos a atração gravitacional do Sol, quando, juntamente com a
Terra e tudo que nela existe, orbitamos em torno do Sol em queda livre.
Contudo, não haveria meio de se eliminar o efeito de maré, e deslizar a 5.000 km
da estrela seria uma experiência das mais emocionantes. (A distâncias menores, os
astronautas seriam mortos e a nave poderia despedaçar-se).
Em 1966 o escritor de ficção científica Larry Niven escreveu um excelente conto
intitulado Estrela de Nêutrons no qual os efeitos de maré de uma delas quase destroem
um astronauta descuidado que se aproxima demais. No ano seguinte esse conto
conquistou o prêmio Hugo (que para o mundo da literatura de ficção científica
corresponde ao Oscar).
Na verdade, entretanto, os fatos narrados na história são inverossímeis. Os
efeitos de maré não constituem mistério para os astrônomos desde o tempo de Isaac
Newton, há 300 anos. Qualquer grupo de cientistas capaz de construir uma nave
espacial destinada a se aproximar de uma estrela de nêutrons certamente perceberia o
perigo do efeito de maré, e evidentemente (excluindo-se a possibilidade de defeito no
equipamento) o astronauta permaneceria a uma distância segura.

93
Buracos negros

VITÓRIA FINAL

Ainda não chegamos ao fim do caminho.


A força nuclear que mantém o neutrônio é capaz de suportar um puxão
gravitacional suficientemente intenso para esmagar átomos ordinários e até o fluido
eletrônico. O neutrônio é capaz de tolerar o peso de massa além do limite de
Chandrasekhar. No entanto, é certo que nem a força nuclear tem poder infinito. Nem
mesmo o neutrônio pode suportar massas empilhadas interminavelmente.
Uma vez que existem estrelas com massa 50 a 70 vezes superiores à do Sol, não
é inconcebível que, começada a contração, ela possa ser ocasionalmente impulsionada
por uma fúria gravitacional ainda maior e mais intensa que a suportável por uma estrela
de nêutrons. E aí?
Em 1939, quando Oppenheimer estava estudando as implicações teóricas da
estrela de nêutron ele levou em conta também essa possibilidade; parecia-lhe que uma
estrela em contração, se tivesse massa suficientemente grande, poderia contrair-se com
tanta força que mesmo os nêutrons cederiam sob o impacto; até mesmo a força nuclear
terá que curvar-se ante a gravitação.
Qual seria, então, o próximo ponto de parada da contração?
Oppenheimer percebeu que não há nenhum — não há o que interrompa a
contração, nesse caso. Quando a força nuclear falha, não subsiste nada que possa deter a
gravitação — a mais fraca de todas as forças e que, quando ampliada sem cessar, pelo
acúmulo interminável de massas, finalmente torna-se a mais forte. Se, ao se contrair,
uma estrela ultrapassa a barreira de neutrônio, a gravitação conquista a vitória final.
Depois disso a estrela continuará a se contrair indefinidamente, com seu volume
reduzindo-se até zero e sua gravidade superficial aumentando sem limites.
Verificou-se que o ponto crítico situa-se em 3,2 vezes a massa do Sol. Da
mesma forma como uma anã branca não pode ter mais que 1,4 vezes a massa do Sol
sem se contrair ainda mais, nenhuma estrela de nêutrons pode ter mais que 3,2 vezes a
massa do Sol sem levar adiante sua contração.
Qualquer objeto em contração com mais de 3,2 vezes a massa do Sol não pode
interromper sua contração, seja no estágio da anã branca ou no estágio da estrela de
nêutrons, mas terá que ir avante. Além disso, acredita-se que qualquer estrela da
seqüência principal que tenha uma massa mais de 20 vezes a do Sol não poderá livrar-se
de massa suficiente através de uma explosão tipo supernova, que crie uma anã branca
ou uma estrela de nêutrons, mas terá, por fim, de contrair-se a zero. Portanto, para
qualquer estrela
logo chegue da classe
ao fim espectral
o suprimento de O, a vitória final da gravitação parece inevitável tão
combustível.
(Embora as massas maiores que 3,2 vezes a do Sol tenham de passar por essa
contração final assim que começa o processo, massas menores que essas podem fazê-lo,
como havemos de ver).

94
O que acontece quando ocorre essa vitória final da gravitação e até o neutrônio
cede? O que acontece se uma estrela de nêutrons se contrai ainda mais?
Para começar, a gravidade superficial de uma estrela de nêutrons em contração
aumenta constantemente, o mesmo acontecendo com a velocidade de escape, pois a
superfície do objeto em contração se aproxima cada vez mais do ponto central para o
qual tende toda contração. Já vimos antes que uma estrela de nêutrons com a massa de
nosso Sol tem uma velocidade de escape de 200.000 km/s, o que representa 2/3 da
velocidade da luz.
Se a matéria de uma estrela de nêutrons continuar a se contrair e a gravidade
superficial se tornar ainda mais intensa, evidentemente se chegará a um ponto em que a
velocidade de escape se tornará igual à velocidade da luz. O valor do raio do corpo em
que isso acontece é chamado raio de Schwarzschild, pois foi calculado pela primeira vez
pelo astrônomo alemão Karl Schwarzschild (1873-1916). O ponto zero, no centro,
denomina-se singularidade de Schwarzschild.
Para uma massa igual à do Sol, o raio de Schwarzschild é pouco inferior a 3 km.
Portanto, o diâmetro é de 6 km.
Imaginemos, pois, uma estrela de nêutrons, com a massa do Sol, que se contraia
além da barreira de neutrônio e cujo diâmetro passe de 14 km para 6 km. Sua densidade
aumenta 13 vezes e se torna igual à 17.800.000.000.000.000 g/cm 3 sua gravidade
superficial é de 1.500.000.000.000 vezes a da Terra, de modo que um ser humano
normal pesaria 100 trilhões de quilos se estivesse de pé sobre tal objeto. O efeito de
maré desse objeto é 13 vezes mais intenso que o de uma estrela de nêutrons.
Contudo, a propriedade mais importante desse objeto supercontraído é o fato de
sua velocidade de escape ser igual à velocidade da luz. (Evidentemente, se o objeto se
reduzir a dimensões ainda menores que o raio de Schwarzschild, a velocidade de escape
torna-se maior que a velocidade da luz).
Os físicos estão absolutamente seguros de que nenhum objeto físico, dotado de
massa, pode mover-se a uma velocidade igual à da luz; isso significa que nenhum corpo
com o raio de Schwarzschild ou menos pode perder massa por ejeção. Nada que possua
massa pode escapar à sua apreensão final, nem mesmo objetos como elétrons, que são
capazes de, com dificuldade, escapar da estrela de nêutrons.
Os objetos podem cair sobre tal corpo supercontraído, mas não podem ser
expulsos dele. É como se ele fosse um buraco sem fundo no espaço.
Além disso, nem a luz ou qualquer radiação semelhante pode escapar. A luz
consiste em partículas sem massa, de modo que se poderia pensar que a força
gravitacional de qualquer objeto, por mais forte que fosse, não tivesse nenhum efeito
sobre ela. Segundo a teoria da relatividade geral de Einstein, contudo, sabemos que a
luz, ao se contrapor à gravidade, perde parte de sua energia e sofre o desvio para o
vermelho de Einstein. Isso é fato sabido e comprovado desde que Adams o detectou
com relação a Sírius B. Quando um objeto possui o raio de Schwarzschild ou menos, a
luz que dele emana perde toda sua energia e sofre um desvio para o vermelho infinito.
Isso significa que nenhuma luz emerge.
Esse objeto supercontraído age não só como um buraco, mas também como um
buraco negro, pois não pode emitir nenhuma luz ou radiação semelhante. Daí seu nome.
Essa expressão — buraco negro — não parece de modo algum apropriada para
um objeto astronômico cuja existência é comprovada por complexos raciocínios

95
teóricos; é uma expressão demasiado comum e cotidiana. Por isso, sugeriu-se o nome
collapsar, do inglês collapsed star, ou estrela contraída. Entretanto, a imagem dramática
de um “buraco negro” e a própria simplicidade de seu nome levam a crer que a
expressão continuará a ser usada.
Temos, então, quatro tipos de objetos possivelmente estáveis:
1) Objetos planetários, variando de pequenas partículas subatômicas até massas
igual a, digamos,
constituídos (exceto50 asvezes a de Júpiter,
partículas mas não
subatômicas) de mais queintactos,
átomos isso. Todos eles são
e geralmente
3
possuem densidades gerais inferiores a 10 g/cm .
2) Anãs negras, que são anãs brancas que perderam uma parte tão grande de sua
energia que não podem mais brilhar visivelmente. Esses objetos têm massas que vão até
1,4 vezes a de nosso Sol, mas não mais que isso; são constituídos de fluido eletrônico,
dentro do qual se encontram núcleos atômicos em movimento livre e apresentam
densidades na faixa de 20.000 g/cm3.
3) Estrelas negras de nêutrons, que são estrelas de nêutrons que perderam tanta
energia que não podem mais brilhar visivelmente. Possuem massa de até 3,2 vezes a de
nosso Sol, mas não mais que isso. São constituídas de neutrônio, com densidades na
faixa de 1.500.000.000.000.000 g/cm3.
4) Buracos negros, que não emitem nenhuma luz, têm massas que atingem
qualquer valor e são constituídos de matéria num estado que não podemos descrever e
com densidades de qualquer valor, até o infinito.
Mas serão essas quatro variedades de objetos verdadeiramente estáveis, no
sentido de que não sofrerão nenhuma outra mudança, independentemente de quanto
venham a durar?
Se um membro de qualquer uma dessas quatro classes de objetos estivesse
sozinho no universo, até onde podemos dizer que ele seria estável e jamais sofreria
qualquer mudança apreciável. O problema, contudo, é que nenhuma dessas coisas está
sozinha no universo, o qual é uma vasta mistura de objetos nas diferentes classes de
estabilidade, juntamente com objetos instáveis como as estrelas, que estão evoluindo
para
luz a uma das três
caminho últimas classesfinal
do enegrecimento ou, etendo chegado a uma delas, ainda estão radiando
da estabilidade.
Então, e daí?
Consideremos o caso da Terra, por exemplo. Ela tende a perder parte de sua
massa, à medida que sua atmosfera lentamente se esvai. Tende também a ganhar um
pouco de massa, à medida que colide com matéria meteórica — cerca de 35.000.000
quilos por dia. Isso não é muito, comparado com a massa total da Terra, mas é
consideravelmente maior que a quantidade de massa perdida pela Terra a cada dia.
Podemos dizer, portanto, que a Terra está, lenta mas constantemente, adquirindo maior
massa.
Da mesma forma, o Sol está constantemente perdendo massa, em parte pela
conversão de hidrogênio em hélio e em parte pela ejeção de prótons e outras partículas,
na forma do vento solar. Contudo, também ele deve estar coletando pó e matéria
meteórica no espaço que percorre.
Essa capacidade de perder massa é comum a todos os objetos, exceto os buracos
negros. (No entanto, segundo certas sugestões científicas teóricas, que examinaremos,

96
também os buracos negros podem perder massa, em casos especiais). Até mesmo as
estrelas de nêutrons emitem elétrons, ou não seríamos capazes de detectar aqueles
pulsos de microondas. E as supernovas ejetam massas que podem ser várias vezes
maiores que a do Sol.
Não obstante, é fácil argumentar que a tendência geral no universo é de os
objetos grandes crescerem às expensas dos pequenos. Poderíamos imaginar, pois
(simplesmente como uma concepção abstrata) que um objeto planetário chegasse, por
fim, a ganhar tanta massa que sofresse uma ignição nuclear e se tornasse uma estrela —
uma estrela muito pequena, é claro — que terminasse por atingir o estágio da anã branca
e finalmente se tornasse uma anã negra.
Poderíamos ainda imaginar que depois que uma estrela alcançasse, de uma
maneira ou de outra, o estágio presumivelmente estável da anã negra, ela pudesse
coletar em sua viagem pelo espaço massa suficiente para esmagar o fluido eletrônico e
contrair-se ainda mais, atingindo o estágio da estrela de nêutrons. Da mesma forma,
uma estrela de nêutrons poderia ganhar massa suficiente para romper o neutrônio e
contrair-se ainda mais, tornando-se um buraco negro — o qual, como pareceria a um
primeiro exame perplexo, não pode jamais perder massa e só pode ganhá-la, sem limite
superior a esse ganho.

Só há
eternidade, um objeto
e esse objeto,éportanto,
o buraco que pareceria
negro. No fim,verdadeiramente estávele para
portanto — no distante todafima
remoto
— e sempre supondo-se que as coisas continuem a e mover na direção em que parecem
estar se movendo atualmente, poderíamos decidir que o universo consistirá apenas de
buracos negros... e, finalmente, talvez, num único buraco negro que contenha tudo.
Todo o universo ter-se-á entrado em colapso (como sugere o título deste livro).
Ou talvez as coisas não sejam tão simples. Voltaremos à questão de qual poderia
ser o destino final do universo em termos de buracos negros depois que tivermos
examinado um pouco mais suas propriedades.
E, evidentemente, a primeira propriedade que devemos considerar é a questão da
existência. Em teoria, os buracos negros devem existir. Mas, existirão de fato?

A DETECÇÃO DO BURACO NEGRO

Detectar um buraco negro não é fácil. As anãs brancas, devido a seu pequeno
tamanho e sua palidez, foram muito mais difíceis de detectar que as estrelas comuns. As
estrelas de nêutrons, menores e menos luminosas, foram de detecção ainda mais difícil;
se os astrônomos tivessem que depender apenas da radiação luminosa, talvez nunca
tivessem sido detectadas; foram os pulsos de microondas que as revelaram.
Obviamente, um buraco negro, que não emite luz, nem microondas nem qualquer
radiação semelhante poderia evadir-se inteiramente à observação.
No entanto, a situação não é de todo irremediável: há o campo gravitacional.
Aconteça o que acontecer à massa que parece ser interminavelmente acumulada e
comprimida dentro de um buraco negro, essa massa tem que continuar a existir (até
onde sabemos) e tem que continuar a ser fonte de um campo gravitacional.

97
A rigor, a atração gravitacional total exercida por um buraco negro a uma grande
distância não é em nada maior que a atração gravitacional total exercida por aquela
massa em qualquer outra forma. Assim, se estivermos a 100 anos-luz de uma estrela
gigantesca, com 50 vezes a massa do Sol, sua atração gravitacional estará de tal forma
diluída pela distância que será imperceptível. Se, de alguma forma, essa estrela tornar-se
um buraco negro com 50 vezes a massa do Sol, sua atração gravitacional a uma
distância de 100 anos-luz será exatamente a mesma de antes e, portanto, ainda
imperceptível.
A diferença é a seguinte: um objeto pode chegar muito mais perto do centro de
um buraco negro que do centro de uma estrela gigantesca, de modo que pode sofrer um
puxão gravitacional imensamente mais concentrado na vizinhança imediata de um
buraco negro do que jamais poderá sentir perto da superfície de uma grande estrela da
mesma massa, pois a superfície desta estará distante do centro.
Será possível, de alguma maneira, a detecção, a grandes distâncias, de tais
intensidades gravitacionais imensamente concentradas?
Segundo a teoria da relatividade geral de Einstein, a atividade gravitacional
libera ondas gravitacionais, as quais, em seu aspecto de partícula, são denominadas
grávitons (da mesma forma que os aspectos de partículas das ondas de luz são

denominados
não podem ser fótons). Contudo, os grávitons
concebivelmente têma muito
detectáveis, menosmenos
que energia
presentesqueem
os energias
fótons e
invulgarmente altas e, mesmo assim, mal. Não conhecemos nada que venha,
provavelmente, a produzir grávitons detectáveis — exceto, talvez, um grande buraco
negro no processo de formação e crescimento.
Em fins da década de 1960 o físico norte-americano Joseph Weber (1919-) usou
grandes cilindros de alumínio, de várias toneladas cada um e separados por centenas de
quilômetros, como detectores de grávitons; tais cilindros sofreriam uma ligeira
compressão e expansão ao passarem ondas gravitacionais. Weber detectou assim as
ondas gravitacionais, o que despertou considerável interesse científico. A conclusão
mais fácil, se os dados de Weber estivessem corretos, era a de que acontecimentos de
fantástica energia estão tendo lugar no centro da galáxia. Poderia estar localizado ali um

grande buraco negro.


Entretanto, outros cientistas tentaram repetir as verificações de Weber e não
conseguiram, de modo que a questão de os grávitons terem sido detectados ou não
permanece duvidosa. Pode haver um buraco negro no centro da galáxia, mas o caminho,
utilizado por Weber para sua detecção está hoje abandonado, sendo necessário
considerar outros meios de detectá-lo.
Um desses meios, ainda utilizando o intenso campo gravitacional de um buraco
negro em suas vizinhanças, consiste em estudar o comportamento da luz ao passar por
perto de um buraco negro. A luz descreverá uma ligeira curva na direção de uma fonte
de gravitação; esse desvio é detectável mesmo quando a luz passa por um objeto como o
Sol, que tem um campo gravitacional comum.
Suponhamos, pois, que haja um buraco negro exatamente entre uma galáxia
distante e a Terra. Nesse caso, a luz da galáxia passaria pelo buraco negro, puntiforme e
invisível, por todos os lados. A luz se curvaria em direção ao buraco negro de todos os
lados e seria forçada a convergir em nossa direção. Assim, o buraco negro desviaria a
luz, gravitacionalmente, do mesmo modo que uma lente a desvia de forma mais
convencional. Por isso, o efeito é chamado de lente gravitacional.

98
Se virmos uma galáxia que, apesar de sua distância, parece anormalmente
grande, podemos suspeitar que ela esteja sendo ampliada por uma lente gravitacional e
que entre nós e essa galáxia haja um buraco negro.
No entanto, tal fenômeno ainda não foi observado.
Os buracos negros, entretanto, não estão sozinhos no universo; poderia haver
matéria ordinária em suas vizinhanças. Se isso acontecer, objetos de dimensões
razoáveis
juntamenteque
comsematéria
aproximem demasiadamente
já na forma de pó e gás,deles serão
ficarão transformados
girando em buraco
em volta do pó e,
negro como um disco de acreção, aproximadamente 200 km além do raio de
Schwarzschild.
A poeira e o gás em torno de um buraco negro poderiam permanecer nessa
órbita eternamente, se cada uma das partículas não sofresse interferência. Entretanto,
colisões mútuas provocam uma transferência de energia e algumas partículas, perdendo
energia, aproximam-se do buraco negro e, por fim, podem ultrapassar o raio de
Schwarzschild, para nunca mais saírem.
De modo geral, haveria uma pequena e contínua fuga de partículas em direção
ao buraco negro; essas partículas, entretanto, perdem energia gravitacional, que é
convertida em calor, e são aquecidas ainda mais pelo esticamento e pela compressão dos
efeitos de maré. O resultado é que atingem temperaturas colossais e emitem raios X.
Assim, embora, não possamos detectar um buraco negro propriamente dito,
cercado pelo vácuo completo, poderíamos, teoricamente, detectar um buraco negro que
esteja tragando matéria, uma vez que essa matéria haveria de emitir raios X, como um
canto de morte.
A radiação X tem de ser suficientemente intensa para ser detectada após muitos
anos-luz de espaço, de modo que seria necessário que a matéria envolvesse mais que
uma nuvem tênue de poeira ocasional. Deveriam ser torrentes de matéria rodopiando em
direção ao buraco negro, e isso significa que o buraco negro teria de estar em um
ambiente bastante preciso.
Por exemplo, é mais provável que os buracos negros sejam encontrados onde
houver imensas
acumulação concentrações
de matéria de atingir
pudesse estrelas,com
muito próximas
mais umas
facilidade o das
grauoutras
em quee onde
fossea
inevitável, mais cedo ou mais tarde, a formação de buracos negros.
Existem, por exemplo, aglomerados globulares de estrelas em que algumas
dezenas de milhares ou mesmo centenas de milhares de estrelas se aglomeram numa
esfera bastante compacta. No ponto do universo em que nos encontramos as estrelas
acham-se separadas por uma distância média de aproximadamente 5 anos-luz, ao passo
que no centro de um aglomerado globular podem estar separadas por uma distância
média de 1/2 ano-luz. Um volume dado de espaço num aglomerado globular poderia
incluir 1.000 vezes mais estrelas que o mesmo volume em nossa área do universo.
Na realidade, vários aglomerados globulares têm sido classificados como fontes
de raios X, havendo a possibilidade de que existam de fato buracos negros em seu
centro. Calculam alguns astrônomos que tais buracos negros em aglomerados globulares
possam ter massa 10 a 100 vezes maior que a do Sol.
As regiões centrais das galáxias assemelham-se a gigantescos aglomerados
globulares contendo dezenas de milhões ou mesmo centenas de milhões de estrelas. A
separação média nas regiões centrais pode ser de 1/10 de ano-luz, podendo mesmo

99
reduzir-se a 1/40 de ano-luz no centro. Um dado volume de espaço, num coração
galáctico, pode ter centenas de milhares (ou mesmo milhões) de estrelas para cada
estrela de volume semelhante em nossa própria área do universo.
Esse amontoado não significa que as estrelas estejam batendo umas nas outras.
Mesmo 1/40 de ano-luz representa 40 vezes a distância entre o Sol e Plutão; no entanto,
a possibilidade de acontecimentos violentos certamente aumentaria ao crescer a
densidade estelar no espaço. Nos últimos anos foram coletados indícios crescentes de
explosões nos centros de galáxias — explosões tão violentas que os astrônomos não
sabem definir as energias liberadas. Poderiam os buracos negros serem responsáveis, de
uma forma ou de outra? Talvez!
Nem mesmo nossa própria galáxia está imune; foi detectada no centro de nossa
galáxia uma fonte muito compacta e enérgica de microondas, e é tentador supor que
haja ali um buraco negro. Certos astrônomos chegam mesmo a especular que nosso
buraco negro galáctico tenha uma massa de 100 milhões de estrelas, de modo que ele
deve ter massa igual a 1/1.000 de toda a Galáxia. Teria um diâmetro de 700.000.000
km, o que lhe dá dimensões de uma grande gigante vermelha. No entanto, sua massa é
tão maior que destroça estrelas inteiras através de efeitos de maré, se elas se
aproximarem excessivamente, ou as engole inteiras antes que se possam fragmentar,
caso a aproximação seja suficientemente rápida.
Talvez todo aglomerado globular e toda galáxia tenham um buraco negro em seu
centro, só recebendo sem nunca dar, tragando matéria normal implacavelmente e
sempre crescendo. Terminarão por engolir tudo? Teoricamente sim, mas a um ritmo
lentíssimo. O universo tem 15 bilhões de anos e, no entanto, ainda existem aglomerados
globulares e galáxias que não foram engolidos. Já houve até mesmo a sugestão de que
os buracos negros centrais sejam antes criadores que devoradores de aglomerados e
galáxias. Os buracos negros podem ter surgido primeiro e depois servido como
“semente”, juntando estrelas em torno de si como superdiscos de acreção, que se
tornaram aglomerados e galáxias.
Por mais construtivo, porém, que o buraco negro tenha sido de início, no
momento ele está tragando matéria, e por mais lentamente que a absorva, não seria nada

confortável
no centro deestar
toda nas proximidades
galáxia, o que estáde umpróximo
mais deles. Sederealmente
nós é o dohouver
centroum buracoprópria
de nossa negro
galáxia — a 30.000 anos-luz. Essa é uma distância confortável, mesmo com um
gigantesco buraco negro na outra extremidade.
Se realmente houver um buraco negro no centro de todo aglomerado globular, o
mais próximo de nós é o do aglomerado conhecido como Omega Centauri, que se acha
a 22.000 anos-luz de distância — ainda uma distância tranqüilizante.
Até agora, porém, a existência de buracos negros nos centros de aglomerados e
galáxias não passa de especulação; não podemos ver o interior de um aglomerado ou de
um coração galáctico para estudar seu centro diretamente. A vasta quantidade de
estrelas periféricas o oculta, e toda indicação indireta que obtemos, na forma de raios X
ou mesmo ondas gravitacionais, provavelmente não será conclusiva no futuro
previsível.
Haverá alguma coisa mais, então?
Suponhamos que consideremos não vastas conglomerações de estrelas, mas
apenas pares. Suponhamos que consideremos binários.

100
Podemos inferir a massa total de um binário se a distância a que se encontra de
nós e seu período de revolução puderem ser determinados. Se uma estrela parece muito
pequena, mas, no entanto, apresenta grande massa, podemos afirmar que ela se acha
numa ou noutra fase de contração. Foi assim que se detectou a companheira de Sírius e
foi assim que finalmente ela foi classificada como uma anã branca.
Suponhamos, a seguir, um binário cujos dois membros se contraíram em buracos
negros. Suas massas, por mais invisíveis que sejam por observação direta, ainda giram
uma em torno da outra e ainda estão, com toda probabilidade — se forem
suficientemente jovens — coletando destroços da matéria explodida durante a
ocorrência de uma supernova. Assim, seria detectada uma fonte dupla de raios X,
revolvendo em torno de um centro de gravidade. Conhecem-se hoje oito binários
emissores de raios X, mas a natureza da fonte permanece desconhecida.
E se apenas uma estrela de um sistema binário se transformar num buraco
negro? Sua companheira, que poderia facilmente estar a bilhões de quilômetros, será
impelida pela energia e se verá percorrendo um volume de espaço muito mais cheio de
poeira do que era antes, devido à matéria ejetada na supernova que precedeu a formação
do buraco negro.
Essa companheira pode tornar-se mais quente, ao coletar parte da matéria, o que
encurtará suaa vida,
gravitacional mas por ora
que é submetida nãoela permanece
aumenta, como na seqüência
resultado principal.
do novo buracoAnegro
atração
que
tem como companheiro; ao invés disso, é provável que diminua, devido à perda de
massa na explosão tipo supernova de sua companheira.
Da Terra, o que se observaria seria uma estrela normal da seqüência principal,
movendo-se em torno de um centro de gravidade em cujo lado oposto não haveria nada
senão uma intensa fonte de raios X.
Esses raios X indicariam a presença de uma estrela de nêutrons ou de um buraco
negro? Há diferenças que poderiam ser utilizadas para identificação. Os raios X de uma
estrela de nêutrons talvez apresentassem a forma de pulsos regulares correspondendo
aos pulsos de microondas. Com efeitos já se detectaram dois desses pulsares de raios X,
Centauro X-3 e Hércules X-1. Os raios X provenientes de um buraco negro variariam
irregularmente, pois a esparsas.
matéria seria tragada
disso, às
se vezes
empuntiforme
quantidadesdeabundantes,
vezes em quantidades Além tal fonte raios X tiveroutras
uma
massa superior a 3,2 vezes a do Sol, terá que ser um buraco negro. (Se vier a ser
comprovado que um objeto com massa superior a 3,2 vezes a do Sol é, sem qualquer
dúvida, uma estrela de nêutrons, isso destruirá toda a teoria dos buracos negros. Até
hoje uma estrela de nêutrons de massa tão grande não foi encontrada).
No começo dos anos 60, quando se descobriram as primeiras fontes de raios X
no céu, localizou-se uma fonte particularmente intensa, por meio de observação através
de foguetes, na constelação do Cisne. Essa fonte, localizada em 1965, foi denominada
Cisne X-l.
Em 1969, assinalando o quinto aniversário da independência do Quênia, foi
lançado da costa desse país um satélite detector de raios X. Esse satélite, que recebeu o
nome de Uhuru, palavra swahili que significa “liberdade”, multiplicou o conhecimento
das fontes de raios X a níveis inimaginados, detectando 161 dessas fontes, metade delas
em nossa própria galáxia e 3 em aglomerados globulares.
Em 1971 o Uhuru detectou uma acentuada mudança na intensidade dos raios X
de Cisne X-1, o que praticamente eliminou esse objeto como uma possível estrela de

101
nêutrons, aumentando a possibilidade de ser ele um buraco negro. Concentrando-se as
atenções em Cisne X-1 detectaram-se também microondas, e isso possibilitou localizar
com exatidão a fonte, bem ao lado de uma estrela visível.
Essa estrela era a HD-226868, uma estrela grande, azul e quente, da classe
espectral B e com massa aproximadamente 30 vezes maior que a de nosso Sol. C. T.
Bolt, da Universidade de Toronto, demonstrou que HD-226868 era um binário, que gira
claramente em órbita com um período de 5,6 dias — órbita cuja natureza faz crer que a
outra estrela tenha de 5 a 8 vezes a massa do Sol.
A estrela companheira não pode ser vista, porém, ainda que seja uma intensa
fonte de raios X; se não pode ser vista, deve ser muito pequena. Tem massa
excessivamente grande para ser uma anã branca ou uma estrela de nêutrons, e daí se
infere, portanto, que seja um buraco negro.
Além disso, HD-226868 parece estar se expandindo, como se estivesse entrando
no estágio de gigante vermelha. Sua matéria estaria, nesse caso, derramando-se sobre o
buraco negro que tem como companhia, e isso explicaria por que esse buraco negro
constitui uma fonte tão intensa de raios X.
Esses, no entanto, são indícios indiretos, e nem todos os astrônomos concordam
que Cisne X-1 seja um buraco negro, o que depende muito da distância entre os
membros do binário. Quanto maior for a distância, maior será a massa que deverão ter
as estrelas para apresentarem um período orbital tão curto, e mais provável será que
Cisne X-1 tenha massa suficientemente grande para ser um buraco negro. Alguns
astrônomos sustentam que o binário acha-se consideravelmente mais próximo que os
10.000 anos-luz geralmente considerados como a distância que separa os dois membros
do binário, e nesse caso Cisne X-1 não é um buraco negro. O consenso, todavia, parece
favorecer (pelo menos por enquanto) a hipótese do buraco negro.
Já se observaram alguns outros binários nos quais um dos membros do par pode
ser um buraco negro; entre eles estão fontes de raios X conhecidas como X Persei e
Circinus X-1.
Existem também possibilidades da existência de buracos negros em que a
emissão de raios X não é um fator; em certos casos pode-se deduzir a existência de um
binário muito próximo pelo comportamento das raias espectrais. A julgar pelo
comportamento dessas raias espectrais Epsilon Aurigae parece estar girando em torno
de uma companheira invisível, Epsilon Aurigae B. Além disso, dados espectroscópicos
fazem crer que Epsilon Aurigae A, a estrela visível, tenha massa 17 vezes maior que a
do Sol, ao passo que Epsilon Aurigae B, a estrela invisível, tem massa 8 vezes maior
que a solar. Mais, uma vez, a combinação de invisibilidade e grande massa indica a
possibilidade de que Epsilon Aurigae B seja um buraco negro (embora alguns
astrônomos afirmem que ela é invisível por se tratar de uma nova estrela em período de
formação e que ainda não entrou em ignição).

MINIBURACOS NEGROS

Se os buracos negros existem apenas nos centros das galáxias, haveria então
somente um em nossa galáxia. Se existissem também no centro dos aglomerados

102
globulares, haveria cerca de 200 em nossa galáxia. Entretanto, se existirem também
como parte de sistemas binários comuns, poderão existir em grande número. Afinal de
contas, existem dezenas de bilhões de binários em nossa galáxia.
Ademais, não há porque serem apenas parte de sistemas binários. Sucede que a
companheira próxima revela a existência de um buraco negro, e é por isso que
pensamos neles como parte de binários. Os buracos negros poderiam também surgir a
partir de estrelas isoladas e, nesse caso, sem matéria próxima que produza raios X e sem
uma companheira próxima que possibilite uma comparação de massa poderiam ser de
detecção impossível, mas nem por isso deixariam de existir.
Levando tudo isso em conta, alguns astrônomos suspeitam que é possível existir
pelo menos um bilhão de buracos negros de dimensões estelares em qualquer galáxia
como a nossa. Se isso for verdade e se os buracos negros tiverem uma distribuição mais
ou menos uniforme, a distância média entre eles é de 40 anos-luz e qualquer estrela
estaria, em média, a 20 anos-luz de um ou outro buraco negro.
Evidentemente, o mais provável é que os buracos negros estejam distribuídos
com a mesma falta de uniformidade das estrelas. Noventa por cento de todas as estrelas
de nossa galáxia (ou de qualquer galáxia semelhante) situam-se na região central,
relativamente pequena. Apenas 10% se encontram nos braços espiralados, volumosos
mas esparsamente
portanto, que apenaspovoados, onde senegros
10% dos buracos localiza nosso galáxia
de nossa próprioestejam
Sol. Poderia ocorrer,
localizados nos
braços em espiral, mas eles se acham bem espalhados ali, e é provável que o buraco
negro, mais próximo de nós se encontre a várias centenas de anos-luz.
É claro que, ao falarmos sobre os buracos negros, estivemos falando até agora de
buracos negros com massas iguais às das estrelas de grande massa, e há realmente
astrônomos que julgam que o buraco negro típico tenha uma massa 10 vezes maior que
a de nosso Sol.
Seria de crer que buracos negros muito menores não possam existir, posto que
apenas objetos de dimensões estelares possuem campo gravitacional suficientemente
grande para produzir uma compressão bastante intensa para romper a barreira de
neutrônio e produzir um buraco negro.
Contudo, segundo a teoria da relatividade geral de Einstein, os buracos negros
podem ser de qualquer tamanho. Todo objeto que possua massa, não importa quão
pequena ela seja, possui também um campo gravitacional; se o objeto for comprimido
num volume cada vez menor, esse campo gravitacional torna-se cada vez mais intenso
em sua vizinhança imediata e por fim a velocidade de escape de sua superfície passa a
ser maior que a velocidade da luz. Esse objeto terá, em outras palavras, encolhido além
de seu raio de Schwarzschild.
A Terra se tornaria um buraco negro se encolhesse até um diâmetro de 0,87 cm
(tamanho de uma pérola grande). Uma massa do tamanho do Everest se tornaria um
buraco negro se reduzido às dimensões de um núcleo atômico.
Poderíamos continuar com esses exemplos até chegarmos à menor massa
conhecida,
menos a -5dogramas
de 10 elétron,sejam
mas incapazes
há sutis razões teóricas
de formar para negros.
buracos supormos quemassa
Uma massas
de com
10 -5
gramas (um pedacinho de matéria no limite da visão desarmada) se tomaria um buraco
negro se fosse reduzida a um diâmetro de aproximadamente 10 -33 cm, quando teria uma
densidade de 1094 g/cm3. (A tal densidade, um objeto do tamanho de um núcleo atômico
teria uma massa igual à de todo o universo).

103
Mas o que poderia, concebivelmente, comprimir objetos pequenos e transformá-
los nesses miniburacos negros? Não poderiam ser seus próprios campos gravitacionais,
de forma que teria de ser uma força compressiva externa. Mas que força externa pode
ser tão forte para produzi-los?
Em 1971 o astrônomo inglês Stephen Hawking sugeriu que uma força possível
ter-se-ia feito sentir no momento em que se formou o universo — a força da própria
grande explosão. Havendo vastas quantidades de matéria explodindo por todo lado,
algumas partes diferentes da substância em expansão poderiam colidir. Parte dessa
matéria em colisão poderia ser então apertada, sob pressões fantásticas de todos os
lados. A matéria comprimida poderia encolher ao ponto em que a intensidade
gravitacional acumulada a mantivesse encolhida para sempre.
Não existe, evidentemente, nenhuma prova da existência desses miniburacos
negros, nem mesmo no grau em que Cisne X-1 proporciona indícios da existência de
buracos negros de dimensões estelares. Além disso, certos astrônomos desdenham
inteiramente a idéia e acreditam que só existam buracos negros com massas
apreciavelmente maiores que as de nosso próprio Sol.
Não obstante, se os miniburacos negros existem, é provável então que sejam
muito mais numerosos que os de dimensões estelares. Seria crível, pois, que se existem
buracos
luz, hajanegros de dimensões
toda uma legião de estelares espalhados
buracos negros com separações
de tamanho médias
moderado de 40 anos-
a microscópico,
separados por intervalos muito menores? Poderia o espaço estar cheio deles? Acredita
Hawking que possa haver até 300 por ano-luz cúbico no universo.
É importante recordar que não há nenhum indício que confirme essa teoria. Mas
se os miniburacos negros estiverem densamente espalhados pelo espaço, o efeito
gravitacional total é diminuto e só pode ser detectado na vizinhança imediata do objeto
— à distância de alguns quilômetros, alguns centímetros, alguns micrômetros,
dependendo de seu tamanho.
A rigor, tais minúsculos buracos negros só podem estar crescendo
incessantemente, pois tragarão qualquer partícula de poeira com que colidam – pelo
menos é essa a idéia geral que se tem da questão. (Hawking adianta também razões sutis
para se supor que os antes
miniburacos negros possam
muitaperder
massa, e que os realmente
pequenos “evaporem” que possam ganhar massa).
Se um miniburaco negro colidir com um objeto maior, ele simplesmente o
perfurará, saindo do outro lado. O miniburaco negro engolirá o primeiro pedaço de
matéria com que colidir, liberando, no processo, energia suficiente para derreter e
vaporizar a matéria imediatamente seguinte. Depois disso ele atravessará o vapor
quente, absorvendo-o de passagem, aumentando o calor e saindo do objeto por fim,
como um buraco negro consideravelmente maior do que era ao entrar.
(Se um miniburaco negro entrar num corpo maior que tenha muito pouca energia
de movimento, ele poderá ficar preso dentro do corpo e alojar-se, por fim, em seu
centro, onde poderá gradualmente cavar um buraco para si e continuar a crescer num
ritmo cada vez mais lento, como um parasita consumindo seu hospedeiro).
A rigor, o volume de tais miniburacos negros é tão pequeno, a gravitação total
tão diminuta e o volume e o vazio do espaço tão enormes que as colisões devem ser
realmente raríssimas. Em todos os 15 bilhões de anos desde a grande explosão a vasta
maioria dos minúsculos buracos negros devem ter ganho tão pouca massa que estes são
ainda minúsculos e de detecção impossível.

104
É claro que, probabilisticamente, um miniburaco negro poderia colidir com a
Terra. O calor produzido durante sua passagem pela atmosfera seria suficiente para
produzir efeitos espetaculares que as pessoas não poderiam deixar de notar, e sua
passagem através da Terra poderia também produzir efeitos.
Isso já aconteceu?
Não sabemos. Não há nenhum indício, ao que saibamos, de que algo semelhante
tenha ocorrido
destruída nosà colisão
devido tempos com
pré-históricos, mas como
o buraco negro? Comosaber ao certo?A Teria
sabermos? Sodoma
destruição sido
poderia
ter sido causada por um meteorito comum, uma erupção vulcânica e um terremoto, ou
toda a história poderia ser mítica. Os dados são insuficientes para uma avaliação.
Teria acontecido nos tempos históricos alguma coisa passível de ser atribuída a
um miniburaco negro?
A 30 de junho de 1908 algo que se pensou de início ser a colisão de um grande
meteoro ocorreu na região de Tunguska, na Sibéria central. Num raio de 30 km, em
todas as direções, todas as árvores foram derrubadas e um rebanho de 500 cabeças de
renas foi dizimado. Posteriormente, pesquisas rigorosas na área não revelaram nenhuma
cratera e nenhum fragmento de meteoro.

Alguns Os pesquisadores
supunham concluíram
que poderia queum
ter sido a explosão
pequeno devia
cometaterconstituído
ocorrido nadeatmosfera.
materiais
congelados e que se derreteram e vaporizaram na passagem pela atmosfera, criando uma
explosão colossal e dispersando sobre a Terra fragmentos de cascalho (incrustados no
gelo) de modo que não se puderam descobrir marcas perceptíveis.
Outros acreditavam tratar-se de um exemplo da colisão de antimatéria com a
Terra. A antimatéria é composta de material semelhante à matéria ordinária, com a
diferença de que as partículas subatômicas que a constituem têm propriedades opostas
às que constituem a matéria ordinária. A antimatéria interage com a matéria,
convertendo tudo, de ambos os lados, em energia. Uma partícula de antimatéria que
atinja a matéria normal da Terra desaparecerá, levando consigo uma massa igual de
matéria normal e produzindo uma explosão idêntica à de uma bomba de hidrogênio com
uma ogiva nuclear com massa cerca de 15 ou mais vezes maior que a sua própria.
Já se chegou mesmo a sugerir que a explosão foi causada pelo sinistro de uma
espaçonave de propulsão nuclear, tripulada por seres extraterrestres.
Uma outra sugestão, entretanto, é de que a explosão foi provocada por um
miniburaco negro, o qual criou uma enorme explosão ao passar pela atmosfera, entrou
na Terra obliquamente, atravessou-a e absorveu mais matéria, emergindo por fim no
Atlântico Norte, onde produziu um imenso esguicho de água e uma explosão que não
foram vistos nem ouvidos pelo homem. Depois disso, continuou seu caminho pelo
espaço, consideravelmente maior do que antes, mas ainda assim um miniburaco negro.
Evidentemente, essa idéia não passa de especulação, também. Alguns
astrônomos observam que um miniburaco negro que atravessasse a Terra e saísse pelo
oceano poderia ter dado início a terremotos e teria certamente provocado uma onda de
maré — e nada disso aconteceu juntamente com o episódio de 1908.
Simplesmente não há, ainda, maneira de se corroborar ou desmentir a explicação
do acontecimento de 1908 como tendo sido causado por um miniburaco negro. Talvez
nunca tenhamos uma maneira de fazê-lo, a menos que um fato idêntico torne a

105
acontecer hoje, época em que os cientistas têm conhecimento a respeito do universo
muito maior que em 1908.

O USO DOS BURACOS NEGROS

É claro que nenhum cientista, por mais dedicado que seja, pode encarar com
satisfação a possibilidade de uma colisão entre um miniburaco negro e a Terra. Se o
acontecimento de 1908 não houvesse, por felicidade, ocorrido numa das poucas áreas da
Terra onde não viviam seres humanos em muitos quilômetros em todas as direções,
talvez ele provocasse uma medonha destruição de vidas e bens.
Pode-se facilmente imaginar que tal colisão devastaria inteiramente cidades
como Washington ou Moscou, por exemplo. Os resultados poderiam assemelhar-se de
tal modo à explosão de uma bomba de hidrogênio que a superpotência atingida poderia
lançar um ataque de retaliação antes de vir a tomar conhecimento da verdade, e toda a
Terra poderia ser arrasada.

causadoNaturalmente, nunca é negro;


por um miniburaco demais que
repetir
podequenão
o incidente siberiano podeminiburacos
haver absolutamente não ter sido
negros e que, se existirem, as probabilidades de colisão podem ser muito menores que
as de um homem ser atingido por um meteorito enquanto está dormindo na cama.
Ainda assim... e se os miniburacos negros existirem?
Poderíamos aprender a nos proteger deles. Se os homens algum dia chegarem a
ter observatórios e colônias em outros mundos do sistema solar e em estruturas
artificiais no próprio espaço, poderá haver oportunidade de estudar os miniburacos
negros em seu terreno nativo, por assim dizer, e em condições que não envolvam uma
colisão com a Terra.
Na verdade, podemos até mesmo sonhar com o desenvolvimento de técnicas
para captura de um miniburaco negro, através de seu campo gravitacional (intensíssimo
em sua vizinhança imediata, mas ínfima no total) e obrigá-lo a desviar-se em sua rota,
se ele estivesse a caminho da Terra. Esse seria um efeito colateral da exploração do
espaço que justificaria qualquer investimento.
Aqueles que especulam muito além da atual capacidade da ciência e que gostam
de construir visões fantásticas do futuro* poderiam até mesmo nutrir esperanças de que
estejamos relativamente perto de um buraco negro (ainda que a uma distância suficiente
para nos sentirmos seguros).
Um buraco negro é, afinal de contas, uma fantástica fonte de energia; qualquer
objeto que nele penetre irradiará, no processo, grande quantidade de energia.
A maior parte da energia de qualquer objeto reside em sua massa, uma vez que
cada grama de massa equivale a 9x10 20 ergs de energia. A energia que obtemos ao
queimar petróleo ou carvão, por exemplo, utiliza apenas uma pequena fração de 1% da
massa do combustível. Mesmo as reações nucleares liberam apenas cerca de 2% da
massa. Um objeto que rodopie em direção a um buraco negro ou, em certas condições,
*
Entre essa categoria de pessoas incluo a m mesmo, uma vez que (como o leitor talvez saiba) sou um escritor de ficção científica
de alguma reputação.

106
que passe perto dele sem verdadeiramente colidir pode converter até 30% de sua massa
em energia.
Além disso, somente certas substâncias podem ser queimadas para proporcionar
energia; apenas certos núcleos atômicos podem ser fissionados ou fundidos para gerar
energia. Entretanto, qualquer coisa criará energia ao cair num buraco negro. O buraco
negro é uma fornalha universal, e tudo quanto exista e tenha massa é seu combustível.

Talvez
explorando possamos
a energia imaginarnegro,
do buraco alguma civilização
lançando avançadíssima
asteróides do futuro
em seu interior como
atiramos carvão numa fornalha comum. Nesse caso, se a galáxia possuir centenas ou
mesmo milhares de civilizações avançadas (como alguns astrônomos suspeitam que
pode ocorrer), essas civilizações seriam aquelas suficientemente próximas a buracos
negros de dimensões razoáveis, que detenham o mais abundante suprimento de energia
disponível e que floresçam como fazem as nações terrestres quando dispõem de grandes
recursos energéticos.
Na verdade, é muitíssimo improvável que venhamos a encontrar grandes buracos
negros que possam ser usados como uma fornalha universal. Tampouco poderíamos
estar realmente ansiosos por encontrar um deles a poucos anos-luz de distância, uma vez
que quanto maiores são, mais perigosos se tornam.
Talvez seja melhor, até chegar uma época em que nossa tecnologia tenha
avançado o suficiente, tirarmos proveito dos miniburacos negros, muito mais comuns
(se é que existem mesmo) e fazer uso de meios mais convencionais de produzir energia.
Suponhamos que encontremos um miniburaco negro em algum ponto do sistema
solar, atravessando o Sol, ou, melhor ainda, orbitando em torno dele. Poderíamos, em
ambos os casos, capturá-lo através de seu campo gravitacional, atrelá-lo a algum objeto
de grande massa e colocá-lo em órbita em torno da Terra (se uma humanidade nervosa o
permitir).
Uma corrente de pelotas de hidrogênio congeladas poderia ser disparada na
direção do miniburaco negro, de modo que roçassem o raio de Schwarzschild sem
penetrar nele. Efeitos de maré aquecerão o hidrogênio ao ponto de fusão, de modo que
na outra extremidade sairá hélio. O miniburaco negro constituirá então o mais seguro e
o mais simples reator de fusão nuclear possível, e a energia que ele produzir poderá ser
armazenada e enviada à Terra.

107
Fins e Começos

O FIM?

É inevitável que sintamos curiosidade quanto ao que pode ocorrer à matéria que
cai num buraco negro.
É dificílimo satisfazer essa curiosidade; com efeito, tudo que podemos fazer é
especular, pois não temos meios de saber se qualquer uma das leis da natureza que
foram tão penosamente definidas pela observação do universo em torno de nós se aplica
nas condições extremas do buraco negro. Não podemos de modo algum duplicar essas
condições aqui na Terra, nem podemos observá-las no céu, uma vez que não temos
conhecimento de nenhum buraco negro em nossa vizinhança.
Daí, só nos resta pressupor que as leis da natureza continuarão válidas e tentar
imaginar o que poderia acontecer.
Uma coisa que poderia acontecer é que o pior não aconteça ou, pelo menos, não
seja observado. Por exemplo, como pode a massa ser comprimida a volume zero e
densidade infinita na singularidade de Schwarzschild? Isso de tal forma tortura o
pensamento que temos de procurar alguma coisa que o impeça.
Por exemplo, a teoria de Einstein leva a crer que o aumento da intensidade da
gravidade tenha o efeito de retardar a passagem do tempo. Isso não é algo que possamos
observar com facilidade no universo, pois fora dos buracos negros e das estrelas de
nêutrons as intensidades gravitacionais que encontramos têm efeito desprezível sobre o
ritmo do tempo.
Por isso, se pudéssemos observar alguma coisa caindo num buraco negro, nós a
veríamos movendo-se cada vez mais devagar à medida que se aproximasse do raio de
Schwarzschild, cada vez mais lentamente, até que ao chegar nele não a veríamos parar.
Contudo, à medida que se aproxima, o desvio para o vermelho de Einstein, também
dependente da intensidade gravitacional, rouba à luz e à radiação análoga a esta uma
parcela cada vez maior de sua energia. O objeto que cai se torna mais opaco enquanto
retarda seu movimento, e ao chegar ao raio de Schwarzschild, onde se detém, também
se torna invisível. O resultado é que não podemos observar coisa alguma dentro do raio
de Schwarzschild.
Se imaginarmos um astronauta caindo num buraco negro e conservando a
consciência e a capacidade de perceber o meio ambiente, ele não sentiria nenhuma
modificação no ritmo da passagem do tempo; essa mudança é uma coisa cuja existência
só um observador externo perceberia.
O astronauta que caísse num buraco negro ultrapassaria o raio de Schwarzschild
sem saber quecontudo,
singularidade; havia alguma espéciede de
uma forma barreira eoscontinuaria
interpretar a cairque
acontecimentos emsedireção
seguemà
consiste em supor que do ponto de vista do astronauta a distância diante dele se
expandiria enquanto ele caísse, de modo que mesmo que ele caísse eternamente, jamais
atingiria o centro. Dentro dessa perspectiva, o buraco negro é um buraco sem fundo.

108
Ainda que, segundo qualquer dessas duas maneiras de se imaginar objetos
caindo num buraco negro, não haja nem chegada ao centro, nem volume zero, nem
densidade infinita — não existe também volta. A queda é irreversível, de modo que
mais uma vez vamos considerar o possível fim do universo.
Se não existe, realmente, nenhuma maneira de inverter ou neutralizar o buraco
negro, então os que existem atualmente só podem crescer; e podem surgir novos.

Se existe
aglomerado um então,
globular, buracopor
negro no centro
fim (por de toda
mais tempo quegaláxia e no
isso leve) todacentro dehátodo
galáxia de
se tornar um grande buraco negro cercado por buracos negros satélites, muito menores.
Dois buracos negros podem colidir e formar um só, mas, uma vez formado, um
buraco negro não pode dividir-se. Por conseguinte, podemos imaginar que mais cedo ou
mais tarde os buracos negros dos aglomerados globulares, em sua órbita em torno do
buraco negro galáctico, venham a fundir-se uns com os outros e, por fim, com o central,
de modo que, havendo tempo suficiente, toda a galáxia será um só buraco negro.
As unidades galácticas podem consistir em apenas uma galáxia, mas podem
também compor-se de várias galáxias (em casos extremos, de vários milhares delas)
unidas pela atração gravitacional. Cada galáxia numa unidade pode ser um buraco
negro, e também esses podem fundir-se.
Será lícito prosseguirmos e supor que todos os buracos negros do universo
venham por fim a fundir-se num buraco negro universal?
Não necessariamente. O universo está em expansão, de modo que as distâncias
que separam as unidades galácticas (sejam elas galáxias isoladas ou aglomerados
galácticos) estão incessantemente aumentando. A maioria dos astrônomos parece crer
que isso continuará a ocorrer indefinidamente no futuro; se assim for, temos a visão de
um universo constituído de bilhões de buracos negros, cada qual com uma massa de
milhões a trilhões de vezes maior que a de nosso Sol, afastando-se interminavelmente
uns dos outros.
Contudo, o próprio ato de expansão pode criar uma mudança.
Em 1937 o físico inglês Paul Adrien Maurice Dirac (1902-) fez a sugestão
espantosa de que a intensidade da força gravitacional em geral depende das
propriedades do universo. Quanto maior a densidade média do universo, mais forte é a
força de gravidade em relação às outras forças do universo.
Uma vez que o universo está se expandindo, a densidade geral da matéria está
diminuindo, ao espalhar-se por um volume cada vez maior. É devido a grande expansão
que já teve lugar (segundo essa concepção) que a força gravitacional é tão fraca em
comparação com as outras, e à medida que o universo continuar a expandir-se, ela se
tornará ainda mais fraca.
Ainda não foi possível comprovar pela observação a teoria de Dirac, e muitos
físicos suspeitam de que a constante gravitacional (o valor que determina a intensidade
básica da força gravitacional) seja não só a mesma em todas as partes do espaço como
também não varie no tempo. Não obstante, se a hipótese de Dirac vier a ser
comprovada, ela alterará o quadro que acabamos de descrever.
À medida que o universo se expande e a gravitação se torna cada vez mais fraca,
os objetos mantidos coesos basicamente pela força da gravidade se expandirão,
tornando-se menos compactos e menos densos. Isso incluirá as anãs brancas, as estrelas

109
de nêutrons já formadas e também os buracos negros. A tendência será no sentido de
todos os objetos incharem, transformando-se em matéria mantida coesa pela força
eletromagnética, ou mesmo deixarem de ser coesos. Até os buracos negros haverão de
restituir sua matéria, pouco a pouco, e por fim o universo será uma nuvem vasta e
incrivelmente tênue de cascalho, poeira e gás, tornando-se interminavelmente mais
vasta e mais tênue.
Nesse caso, seria de crer que o universo começou como uma gigantesca massa
de matéria comprimida e que há de terminar como um imenso volume de matéria
rarefeita.
Isso levanta um problema: de onde veio a matéria comprimida? Não há porque
nos preocuparmos com a matéria em si, pois ela representa apenas uma forma muito
compacta de energia, e poderíamos supor que a energia tenha sempre existido e que há
de existir para sempre — grande parte dela na forma de matéria. A questão é saber
como a matéria veio a ser comprimida no ovo cósmico, para começar.
Poderíamos supor que se considerarmos que o universo progride de comprimido
para expandido, estamos levando em conta somente metade do ciclo vital.
Suponhamos que o universo tenha começado com um volume
interminavelmente tênue de cascalho, poeira e gás. Lentamente, no decurso de eras e
eras, ele se condensou até formar o ovo cósmico, que então explodiu e que, no decurso
de eras e eras incrivelmente longas, vem restaurando a matéria como ela era. Por acaso,
estamos vivendo no breve período (apenas 15 bilhões de anos) após a explosão.
No entanto, de alguma forma a idéia do universo como uma coisa acontecida
uma vez só parece vagamente insatisfatória. Se a matéria dispersa pôde juntar-se,
fundir-se, contrair-se e finalmente formar um ovo cósmico, por que não pode a matéria
dispersa que constitui o produto final da explosão do ovo cósmico (quer consista de
buracos negros, quer seja composta de matéria dispersa) juntar-se novamente, contrair-
se mais uma vez e formar um segundo ovo cósmico?
Por que isso não pode repetir-se indefinidamente? Por que, em suma, não
poderia haver um incessante universo oscilante?

Os aastrônomos
oscilante; estudaram
escolha depende as condições
de alguma necessárias
coisa como para produzir
a velocidade um universo
de escape. Há uma
certa força gravitacional entre as unidades galácticas do universo em geral, e há uma
velocidade de escape associada a essa força. Se o universo estiver se expandindo a uma
velocidade maior que a de escape, então ele se expandirá para sempre e jamais se
contrairá. Se a expansão for a uma velocidade menor que a de escape, então a atual
expansão terá que interromper-se um dia, tendo início então a contração.
Mas a atual velocidade de expansão é maior ou menor que a velocidade de
escape? Isso depende do valor da velocidade de escape, a qual depende do valor da
força gravitacional geral entre as unidades galácticas, que depende, por sua vez, da
densidade média da matéria no universo.
Quanto maior essa densidade média de matéria no universo, maior a força
gravitacional entre as galáxias, maior a velocidade de escape — e maior a probabilidade
de que a atual velocidade de expansão não seja maior que a velocidade de escape e de
que o universo haverá de oscilar, de que ele seja fechado.
Evidentemente, é difícil determinar a densidade média do universo, já que é
difícil saber quanta massa total existe num volume suficientemente grande para ser

110
representativo do todo. Utilizando os melhores dados disponíveis, alguns astrônomos
parecem convictos de que a densidade média é aproximadamente igual a apenas 1/100
do valor necessário para a oscilação e que o universo é aberto e destinado a se expandir
perpetuamente. (Se a força gravitacional estiver diminuindo à medida que o universo se
expande, então uma densidade média ainda maior é necessária para a oscilação, e a
densidade aparente afasta-se ainda mais daquele valor necessário).
No entanto, embora os argumentos contrários a um universo fechado e oscilante
pareçam fortes, serão eles realmente a palavra final? Aglomerados de galáxias que
parecem ser mantidos juntos pela atração gravitacional não parecem ter, entretanto,
massa suficiente para proporcionar essa atração. Deveriam estar se dispersando, em
resposta à expansão geral do universo e, no entanto, não parecem estar procedendo
assim. Existe, por conseguinte, aquilo que se convencionou chamar de problema da
massa perdida.
Poderá essa massa perdida consistir em buracos negros? Exceto em
pouquíssimos casos, não há meio de se detectar buracos negros, e não temos a mais
remota idéia da quantidade de massa que está presa indetectavelmente nesses buracos
negros, de todos os tamanhos. Parece difícil acreditar que os buracos negros encerrem
centenas de vezes a massa total de todos os objetos visíveis do universo. No entanto,
estamos pisando a fronteira do que podemos observar e deduzir, e não podemos ter
muita certeza disso ou daquilo. Os indícios parecem apontar para um universo aberto e
em constante expansão, mas pode ser que, computando-se os buracos negros, exista
afinal de contas matéria suficiente para manter o universo fechado e oscilando.

BURACOS DE MINHOCA
E BURACOS BRANCOS

A aflição causada por um universo aberto, em contínua expansão e de ocorrência


única é talnessa
apontam que direção.
os astrônomos parecem debater-se num esforço de fugir aos indícios que
Em 1948 Thomas Gold, juntamente com os astrônomos ingleses Fred Hoyle e
Hermann Bondi, tentou contornar esses indícios com uma sugestão que veio a ser
conhecida como a do universo em criação contínua; a idéia era a de que a matéria seria
criada continuamente, um átomo de cada vez, aqui e ali no universo. A criação da
matéria se faria a um ritmo tão lento que não poderíamos detectá-la.
Não obstante, à medida que o universo se expandisse e o espaço entre as
unidades galácticas aumentasse, seria formada matéria suficiente para se transformar em
novas galáxias nesse espaço intermediário. Ao todo, formar-se-iam galáxias suficientes
para compensar a dispersão das antigas; o universo seria uma vasta colcha de retalhos
de galáxias, variando desde as recém-formadas até as moribundas, passando por todos
os estágios
duração de no
eterna evolução.
tempo. O universo
Estrelas ocuparianasceriam
e galáxias um espaço infinitamente
e morreriam, masgrande e de
o universo
como um todo seria imortal, nem nascendo nem morrendo.
Tratava-se de uma teoria cativante, mas os indícios a seu favor eram quase
inexistentes e assim permaneceram. Na verdade, diminuíram. Se o universo de criação

111
contínua era o que realmente existia, então jamais teria ocorrido uma grande explosão.
Por esse motivo, tudo quanto parecesse consubstanciar a teoria da grande explosão
tendia a desmentir a criação contínua.
Em 1964 o físico americano Robert Henry Dicke (1916-) observou que a grande
explosão, se ocorreu há 15 bilhões de anos atrás, deve ter deixado vestígios que ainda
agora poderiam ser visíveis a 15 bilhões de anos-luz de distância (pois a luz leva 15
bilhões de anos para chegar aqui, vinda daquela distância, de modo que a luz da grande
explosão está chegando agora).
A radiação da grande explosão, de um tipo muito enérgico e de ondas curtas,
sofreu um pronunciado desvio, devido a essa vasta distância, para a extremidade
vermelha do espectro, de baixa energia. No desvio, ela passou além do vermelho,
entrando na porção de microondas, muito mais longa e de baixa energia, do espectro.
Como a grande explosão deve ser visível a 15 bilhões de anos-luz em qualquer direção,
as microondas têm de vir de todas as partes do céu como uma radiação de fundo.
Em 1965 dois cientistas da Bell Telephone Laboratories, Arno A. Penzias e
Robert W. Wilson, demonstraram a existência de uma leve radiação de fundo com
exatamente as características previstas por Dicke. A grande explosão havia sido
detectada e a criação contínua está morta (pelo menos por ora).
Esse caminho para evitar o universo aberto não deu em nada; entretanto, há
outros, e para chegarmos a esses, voltemos aos buracos negros.
Até agora temos falado sobre buracos negros que têm apenas uma propriedade
— massa. Se um quilo de platina, de hidrogênio ou de tecido vivo é acrescentado a um
buraco negro, o que se acrescenta é um quilo de massa, sem qualquer história de seu
estado anterior.
Um buraco negro pode possuir duas outras propriedades — e apenas duas. Uma
delas é carga elétrica; a segunda, momento angular. Isso significa que qualquer buraco
negro pode ser descrito completamente medindo-se sua massa, sua carga elétrica e seu
momento angular. (É possível que tanto a carga elétrica como o momento angular sejam
iguais a zero; mas a massa não pode ser zero, pois nesse caso o objeto não seria um
buraco negro).
Embora um buraco negro possa ter carga elétrica, só pode tê-la se a massa que o
formou ou que lhe foi acrescentada depois tivesse carga elétrica. Na verdade, as cargas
elétricas, positivas e negativas, em pedaços de matéria de grandes dimensões tendem a
se apresentar em quantidades iguais, de modo que a carga geral é zero.
Conseqüentemente, é bastante provável que os buracos negros tenham essencialmente
carga zero.
O mesmo não ocorre com o momento angular; nesse caso, com efeito, a situação
se inverte e é bastante provável que todo buraco negro possua um considerável
momento angular.
O momento angular é uma propriedade de todo objeto que gira em torno de seu
eixo ou que revolve ao redor de um ponto externo, ou que faz ambas as coisas. O
momento angular inclui tanto a velocidade de rotação ou revolução do objeto como a
distância de suas várias partes até o eixo ou centro em torno do qual gira. O momento
angular total de um sistema fechado (um sistema em que nenhum momento pode ser
ganho ou perdido) tem de ser conservado — isto é, não pode aumentar nem diminuir.

112
Isso significa que se a distância aumenta, a velocidade de giro tem de diminuir, e
vice-versa. Um patinador tira partido desse fato quando se põe a girar com os braços
abertos; quando ele puxa os braços para perto do corpo, diminuindo a distância média
das partes de seu corpo do eixo de rotação, sua velocidade de giro aumenta
acentuadamente. Se ele abre os braços novamente, seu movimento retarda-se no mesmo
instante.
Todas as estrelas que conhecemos giram em torno do eixo e por isso apresentam
alto grau de momento angular rotacional. Quando uma estrela se contrai, para
compensar isso sua velocidade de rotação deve aumentar; quanto mais extrema a
contração, maior será o ganho em velocidade de rotação. Uma estrela de nêutrons
recente poderá girar até mil vezes por segundo. Os buracos negros devem ter um
movimento de rotação ainda mais rápido. Não há como evitar isso.
Podemos dizer, então, que todo buraco negro tem massa e momento angular.
A análise matemática de Schwarzschild aplicava-se apenas a buracos negros
destituídos de rotação, mas em 1963 o astrônomo Roy P. Kerr encontrou uma solução
para os buracos negros com rotação.
Nos buracos negros com rotação ainda existe o raio de Schwarzschild, mas fora
dele há um limite estacionário, que forma uma espécie de protuberância equatorial em
torno do buraco negro, como se de alguma forma ele fosse dilatado pelo efeito
centrífugo.
Um objeto que caia dentro do limite estacionário, mas que permaneça fora do
raio de Schwarzschild está semicapturado. Isto é, ainda pode sair, mas apenas em
circunstâncias especiais. Se por acaso ele se mover na direção do giro, o buraco negro
rotativo tenderá a fazê-lo girar como uma pedra numa funda e a atirá-lo de volta, além
do limite estacionário, com mais energia do que ao entrar. Essa energia adicional é dada
às expensas da rotação do buraco negro. Em outras palavras, transfere-se momento
angular do buraco negro para o objeto e o buraco negro diminui de velocidade.
Teoricamente, pode-se retirar até 30% de toda a energia de um buraco negro em
rotação pelo envio cuidadoso de objetos para o limite estacionário, com mais energia do
que ao entrar. Essa energia adicional qual algumas civilizações adiantadas poderiam
utilizar os buracos negros como fonte de energia *. Assim que toda energia rotacional
houver desaparecido, o buraco negro terá apenas massa; o limite estacionário coincide
com o raio de Schwarzschild. Diz-se então que o buraco negro está “morto”, pois
nenhuma energia adicional pode ser obtida dele diretamente (embora se possa obter
alguma da matéria que rodopie em direção a ele).
Mais estranho ainda que a possibilidade de se roubar energia rotacional do
buraco negro é o fato de a análise de Kerr oferecer um novo tipo de fim para a matéria
que entra num buraco negro. Esse novo fim foi prenunciado por Albert Einstein e por
um colaborador chamado Rosen, cerca de 30 anos antes.
A matéria que penetre num buraco negro rotativo (e é muito provável que não
exista outra espécie de buraco negro) pode, em teoria, ser esguichada em algum outro

*
Nem todos os astrônomos concordam com esse conceito de se roubar a energia rotacional de um buraco negro. Na verdade, quase
tudo quanto alguns astrônomos sugerem com relação a um buraco negro é desmentido por outros astrônomos. Situamo-nos aqui na
própria fronteira do conhecimento e tudo, de uma forma ou de outra, é muito incerto e sujeito a condições.

113
lugar, como pasta de dentes que salte de um furo fino num tubo rígido submetido à lenta
pressão de um rolo compressor*.
A transferência de matéria pode, aparentemente, ter lugar através de distâncias
enormes — milhões ou bilhões de anos-luz — num período de tempo mínimo. Tais
transferências não podem ocorrer da maneira ordinária, uma vez que no espaço que
conhecemos a velocidade da luz é o limite para qualquer objeto dotado de massa.
Transferir massa, da maneira ordinária, a distâncias de milhões ou bilhões de anos-luz
leva milhões ou bilhões de anos.
Por conseguinte, tem-se de supor que a transferência se faça através de túneis ou
pontes que não têm, falando-se em termos rigorosos, as características de tempo de
nosso universo familiar. O percurso é às vezes chamado de ponte de Einstein-Rosen ou,
mais pitorescamente, de buraco de minhoca.
Se a massa atravessa o buraco de minhoca e aparece de repente a um bilhão de
anos-luz de distância, novamente no espaço ordinário, alguma coisa deve equilibrar essa
grande transferência na distância. Ao que parece, essa passagem impossivelmente
rápida pelo espaço é equilibrada por uma passagem compensatória pelo tempo, de modo
que a massa ressurge há um bilhão de anos no passado.
Assim que a massa surge do outro lado do buraco de minhoca, ela se expande
repentinamente e se transforma em matéria ordinária novamente e, ao assim fazer,
incandesce com energia irradiada — a energia que tinha ficado, por assim dizer, presa
no buraco negro. O que estamos vendo surgir, então, é um buraco branco, um conceito
sugerido pela primeira vez em 1964.
Se tudo isso é realmente assim, seria crível que se pudesse detectar buracos
brancos, ou pelo menos alguns deles.
Isso dependeria, é claro, do tamanho do buraco branco e de sua distância de nós.
Talvez miniburacos negros formem miniburacos brancos a vastas distâncias, e com toda
certeza jamais os veríamos. Contudo, enormes buracos negros formariam enormes
buracos brancos, e esses poderiam ser vistos por nós. Existirão sinais de tais buracos
brancos?

Talvez...

QUASARES

Na década de 1950 detectaram-se fontes de ondas de rádio que, pareciam ser


muito compactas, surgindo de áreas puntiformes no céu. Normalmente, as fontes de
ondas de rádio encontradas naquele tempo vinham de nuvens de poeira ou de galáxias e,
por isso, apresentavam-se mais ou menos espalhadas por uma área maior do céu.
Entre essas fontes compactas de ondas de rádio estavam as conhecidas como
3C48, 3C147, 3C196, 3C273 e 3C286. (Muitas outras foram descobertas desde então).
O 3C é abreviatura de Third Cambridge Catalog of Radio Stars(Terceiro Catálogo de

*
Essa sugestão também é negada por alguns astrônomos.

114
Radioestrelas de Cambridge), lista compilada pelo radioastrônomo inglês Martin Ryle
(1918-).
Em 1960 as áreas contendo essas fontes compactas foram investigadas pelo
astrônomo norte-americano Allen Rex Sandage (1926-) e, em cada caso, as ondas
pareciam provir de uma estrela pálida. Contudo, havia indícios de que talvez não fossem
estrelas normais. Várias delas pareciam estar envoltas em tênues nuvens de poeira ou
gás e uma delas, 3C273, mostrava sinais de emitir um minúsculo jato de matéria. Na
verdade, havia duas fontes de ondas de rádio relacionadas com 3C273, uma da estrela e
outra do jato.
Houve certa relutância, portanto, em denominar esses objetos de estrelas, e por
isso foram chamadas de fontes de rádio quase-estelares (quasi-stellar radio sources). Em
1964 Hong-Yee Chiu abreviou essa designação para quasar, e desde então tem-se usado
esse nome.
Os espectros desses quasares foram obtidos em 1960, mas apresentavam um
conjunto de raias que era completamente irreconhecível, como se fossem produzidas por
substâncias inteiramente desconhecidas no universo. Em 1963, entretanto, o astrônomo
holandês-americano Maarten Schmidt (1929-) solucionou o problema. As raias teriam
sido perfeitamente normais se existissem muito além do limite do ultravioleta. O
aparecimento
acentuadamentedelas na faixa
na direção da luz visíveldesignificava
dos comprimentos que haviam se desviado
onda maiores.
A explicação mais simples para isso era a de que os quasares estavam muito
distantes; como o universo está se expandindo, as unidades galácticas estão se
separando, e tudo parece afastar-se de nós. Por isso, as raias espectrais de todos os
objetos distantes sofrem um desvio para as ondas mais longas, pois isso é o que se deve
esperar quando uma fonte de luz está se afastando de nós. Além disso, como o universo
está em expansão, quanto mais distante o objeto mais depressa ele se afasta de nós e
maior é o desvio nas raias espectrais. Portanto, pode-se calcular a distância de um objeto
por seu desvio espectral.
Verificou-se que os quasares estavam a bilhões de anos-luz. Um deles, 3C172,
está a cerca de 12 bilhões de anos-luz de distância, e mesmo o mais próximo, 3C273,
está
outroseparado
tipo de de
nós por mais de um bilhão deque
anos-luz,
haja atémais
15 distante
milhões do
de que
qualquer
objeto conhecido. É possível quasares no
universo.
Percebemos os quasares como objetos muito pálidos, mas para que sejam
visíveis a toda essa distância, mesmo palidamente, devem ser extraordinariamente
luminosos. O quasar 3C273 é cinco vezes mais luminoso que nossa galáxia, e alguns
quasares chegam a ter uma luminosidade 100 vezes maior que a de uma galáxia
mediana.
No entanto, assim sendo, se os quasares fossem simplesmente galáxias que
tivessem até 100 vezes mais o número de estrelas de uma galáxia média e fossem, por
isso, muito mais brilhantes, deveriam ter dimensões suficientemente grandes para que
aparecessem, mesmo a distância em que se encontram, como minúsculas manchas de
luz e não como pontos semelhantes a estrelas. Assim, apesar do brilho, devem ser muito
mais compactos que as galáxias comuns.
Já em 1963 descobriu-se que os quasares variavam na energia emitida, tanto na
região da luz visível como na região das microondas. Aumentos e diminuições de até
três magnitudes foram registrados no intervalo de poucos anos.

115
Para que a radiação varie tanto em período tão breve, um corpo tem que ser
pequeno. Tais variações devem envolver o corpo como um todo, e nesse caso algum
efeito deve se fazer sentir sobre toda a largura do corpo no decurso do tempo da
variação. Como nenhum efeito pode viajar mais depressa que a luz, isso significa que se
um quasar mostra variação acentuada num período de poucos anos, ele não pode ter
mais que um ano-luz de diâmetro e talvez seja consideravelmente menor.
Há um quasar, o 3C446, capaz de duplicar seu brilho em dois dias e, por
conseguinte, não é possível que ele tenha diâmetro superior a 0,005 ano-luz (50 bilhões
de quilômetros), ou menos de cinco vezes a largura da órbita de Plutão em torno do Sol.
Podemos confrontar esse cálculo com os dados referentes a uma galáxia comum, que
pode apresentar um diâmetro de 100.000 anos-luz e cujo denso núcleo central pode ter
até 15.000 anos-luz de diâmetro.
A combinação de dimensões diminutas e enorme luminosidade faz com que os
quasares pareçam uma classe de objetos inteiramente diferentes de tudo mais que
conhecemos. Sua descoberta tornou os astrônomos conscientes da possibilidade de
fenômenos no universo até então ignorados e os estimulou, pela primeira vez, a estudar
esses fenômenos, inclusive os buracos negros.
E é possível que haja um elo entre os buracos negros e os quasares. Os
astrônomos
a hipótese deIgor
os Novikov, soviético,
quasares serem e Yuval buracos
gigantescos Ne’emanbrancos
(1925-),naisraelense, propuseram
outra extremidade de
um buraco de minhoca que parte de um gigantesco buraco negro, em alguma outra parte
do universo*.
Examinemos outra vez os quasares. Serão mesmo objetos sui-generis, como
parecem ser, ou serão simplesmente exemplos extremos de alguma coisa mais familiar?
Em 1943 um estudante de astronomia, Carl Seyfert, descreveu uma galáxia
especial, que posteriormente foi identificada como pertencente a um grupo hoje
denominado galáxias de Seyfert. É possível que constituam 1% de todas as galáxias
conhecidas (o que significa ao todo, um bilhão delas), ainda que na verdade apenas uma
dezena de espécimes tenha sido descoberta.
De modo geral, as galáxias de Seyfert parecem normais e não se acham
extraordinariamente distantes. Contudo, seus núcleos são muito compactos, muito
brilhantes e parecem invulgarmente quentes e ativos — na verdade, assemelham-se a
quasares. Mostram variações de radiação que indicam que os centros radioemissores em
seus núcleos não são maiores do que julgamos que sejam os quasares. Uma dessas
galáxias, a 3C120, tem um núcleo que compreende menos de 1/8 do diâmetro da
galáxia, como um todo; mas apresenta luminosidade três vezes maior que o resto da
galáxia junta.
O centro fortemente ativo seria visível a distâncias maiores que as camadas
exteriores da galáxia de Seyfert, e se tal galáxia estivesse suficientemente distante, tudo
quanto veríamos, quer através de telescópios ópticos, quer empregando
radiotelescópios, seria seu núcleo. Diríamos então que o objeto era um quasar, e assim,
os quasares muito distantes podem ser simplesmente os núcleos intensamente luminosos
de galáxias de Seyfert muito grandes e muito ativas.

*
Isso não passa de pura especulação, naturalmente, e o restante do livro também é formado de especulações, algumas minhas.

116
Analisemos, porém, o núcleo de uma galáxia de Seyfert — muito compacto,
muito quente e ativo. Uma delas, a NGC 4151, talvez tenha 10 bilhões de estrelas num
núcleo com diâmetro de apenas 12 anos-luz.
São exatamente as condições que estimulariam a formação de buracos negros.
Talvez o simples fato de um determinado volume de espaço estar sujeito à formação de
buracos negros também possa torná-lo sujeito ao florescimento de um buraco branco.

Podemos
produzindo imaginartensão
uma enorme buracos negrosuniforme
na trama formando-se aqui e A
do espaço. aliformação
no universo, cada qual
de buracos de
minhoca entre eles é possível, e a matéria poderá passar por essa ponte a um ritmo lento,
em comparação com a quantidade total existente no buraco negro que serve de fonte,
mas bastante grande para produzir enormes quantidades de radiação, em certos casos. O
ritmo do fluxo da matéria pode variar por motivos que ainda não compreendemos, e isso
poderá provocar as variações no brilho dos quasares.
Talvez haja muitos buracos brancos, de todos os tamanhos, cada qual ligado a
seu buraco negro (os quais também podem ter todos os tamanhos), e é possível que
apenas tomemos conhecimento dos de dimensões gigantescas. Talvez, se todos os
buracos, negros e brancos, fossem levados em conta, fosse possível ver que os buracos
de minhoca que os ligam cruzam o universo densamente.
Esse pensamento estimulou as faculdades imaginativas de astrônomos como
Carl Sagan (1934-1996). Se é impossível imaginar qualquer meio pelo qual um pedaço
de matéria se mantenha intacto ao se aproximar de um buraco negro, mais difícil ainda é
imaginá-lo atravessando um buraco de minhoca e saindo pelo buraco branco, mas Sagan
não permite que isso limite suas especulações.
Afinal de contas, somos capazes de coisas que nossos antepassados primitivos
julgariam, inconcebíveis, e Sagan conjectura se uma civilização avançada não poderia
imaginar meios de bloquear os efeitos gravitacionais e de maré, de modo que uma nave
espacial pudesse tirar partido dos buracos de minhoca e percorrer enormes distâncias
num momento.
Suponhamos que houvesse no universo uma civilização avançada, neste mesmo
instante, e que tivesse elaborado um mapa detalhado dos buracos de minhoca, com suas
entradas de buracos negros e suas saídas de buracos brancos. Os buracos de minhoca
menores seriam mais numerosos, evidentemente, e por isso mais úteis.
Imaginemos um império cósmico interligado por uma rede desses buracos de
minhoca, com centros civilizados localizados perto das entradas e das saídas. Afinal,
para um mundo seria tão importante estar perto de um centro de transporte desse tipo
quanto para uma cidade da Terra é importante localizar-se num porto ou num estuário
de rio.
Os planetas mais próximos aos túneis poderiam estar a uma distância segura
deles, porém haveria enormes estações espaciais, construídas como bases para as naves
que percorressem os túneis e como usinas de força para os planetas.
E como a teoria do buraco de minhoca afeta o passado e o futuro do universo?
Mesmo que o universo se esteja expandindo, será possível que a expansão seja
compensada pela transferência de matéria para o passado, através dos buracos de
minhoca?

117
Seguramente, todos os poucos quasares detectados estão a bilhões de anos-luz da
Terra, e por conseguinte nós os vemos como eram há bilhões de anos; além disso, estão
sendo impulsionados fortemente para distâncias maiores e para um passado mais
remoto. Calcula-se que se os quasares estivessem espacejados uniformemente por todo
o universo, várias centenas deles estariam mais perto de nós e seriam mais brilhantes
que 3C273, que é atualmente o mais próximo e mais brilhante.
Pois bem, temos então, afinal de contas, um universo eterno, uma espécie de
criação contínua em outro sentido?
Porventura o universo vem se expandindo há eras sem conta, durante toda a
eternidade, na verdade sem jamais se ter expandido além do nível atual porque os
buracos de minhoca criam um circuito fechado, enviando matéria para o passado mais
concentrado, a fim de reiniciar a expansão?
Porventura o universo nunca esteve na verdade inteiramente contraído, e
portanto jamais houve verdadeiramente uma grande explosão? Sucederá, por acaso, que
só julgamos que houve essa grande explosão porque temos consciência apenas de
metade do ciclo que envolve as galáxias — a expansão — e não temos consciência da
matéria que retorna através dos buracos de minhoca?
Contudo, se não houve a grande explosão, como explicar a radiação de fundo
que é o eco dessa grande explosão? Poderá essa radiação ser produto do fluxo
retrógrado geral da matéria para o passado remoto? Serão os buracos brancos ou os
quasares numerosas “pequenas explosões” que se superpõem à grande explosão e
produzem a radiação de fundo?
E se as coisas se passam assim, de onde vem a energia que mantém o universo
em interminável reciclagem? Se o universo se retarda ao expandir-se (isso é chamado
pelos físicos de aumento de entropia), por acaso ele se acelera novamente (entropia
decrescente) ao voltar no tempo, através dos buracos de minhoca?
Não há, no momento, resposta para nenhuma dessas perguntas. Tudo é
conjectura, até mesmo a própria existência de buracos de minhoca e buracos brancos.

O OVO CÓSMICO

Cumpre admitir que a idéia de que o universo esteja reciclando-se


continuamente é uma conjectura bastante tênue.
Se a descartamos, entretanto, sobra-nos apenas a grande explosão — uma única,
se vivemos num universo aberto, ou um fenômeno perpetuamente repetido, se o
universo é fechado e oscilante. Ambas as suposições são problemáticas. Qual é a
natureza do ovo cósmico?
Quando se sugeriu pela primeira vez a idéia do ovo cósmico, ele era imaginado
de modo muito semelhante ao que hoje representa as estrelas de nêutrons. O problema é
que um ovo cósmico contendo toda a massa do universo (igual à massa de
100.000.000.000 de galáxias, talvez) é certamente grande demais para ser uma estrela
de nêutrons. Se for verdade que qualquer coisa com massa superior a 3,2 vezes a de

118
nosso Sol tem de formar um buraco negro ao se contrair, nesse caso o ovo cósmico era o
maior de todos os buracos negros.
Então, como pode ter explodido e provocado o nascimento do universo? Buracos
negros não explodem.
Imaginemos um universo em contração que formasse buracos negros de várias
dimensões ao se contrair; cada um deles poderia perder parte de sua massa através de
buracos de minhoca,
para detê-la contrabalançando
inteiramente a contração
(pois caso contrário nemtotal, mas nãoem
o universo emexpansão
medida suficiente
nem nós
estaríamos aqui, hoje).
Ao se comprimir o universo, os buracos negros crescem às expensas de matéria
alheia a eles e, com freqüência cada vez maior, colidem e se fundem. Por fim,
naturalmente, todos os buracos negros estarão fundidos no ovo cósmico. Esse ovo perde
matéria, através de seu buraco de minhoca, a um ritmo fenomenal, provocando na outra
extremidade o maior buraco branco concebível. Portanto, o buraco branco do ovo
cósmico é que foi a grande explosão que criou nosso universo em expansão. Essa
hipótese valeria tanto para o caso de o universo ser aberto como para o caso de ser
fechado, quer o ovo cósmico se tenha formado apenas uma vez, quer ele se repita
ciclicamente.
Evidentemente, essa solução só se mantém de pé se os buracos de minhoca e os
buracos brancos verdadeiramente existirem, o que é incerto. E mesmo que existam, só
será válida se o ovo cósmico tiver rotação. Mas, terá?
Existe certamente momento angular no universo, mas ele pode ter sido criado,
apesar da lei da conservação, onde não existia antes.
Isso porque há dois tipos de momento angular, em sentidos apostos. Um objeto
pode girar no sentido horário ou no sentido anti-horário (positivo ou negativo, se o leitor
preferir). Dois objetos com momento angular igual, um positivo e outro negativo,
haverão de terminar, se colidirem e se fundirem, com momento angular zero — e a
energia dos dois movimentos de rotação se converterá em calor. Inversamente, um
objeto com momento angular zero pode, com a adição de energia apropriada, dividir-se
para formar dois subobjetos, um com momento angular positivo e outro com momento
angular negativo.
É possível que todos os objetos do universo tenham momento angular, mas é
muito provável que para alguns ele seja positivo e para outros negativo. Não temos
condições de saber se um desses tipos existe em maior incidência que o outro. Se existir
realmente essa diferença, quando toda a matéria do universo se contrair e formar um
ovo cósmico, esse ovo terminará com uma quantidade de momento angular igual ao
excesso de um tipo em relação ao outro.
Pode ocorrer, todavia, que não exista no universo maior incidência de um tipo de
momento angular. Nesse caso, ao se formar o ovo cósmico, ele não terá momento
angular, e estará morto. Por conseguinte, não poderemos contar com buracos de
minhoca e buracos brancos para o surgimento da grande explosão.
Que mais?
Da mesma forma como existem dois tipos oposto de momento angular, existem
também dois tipos opostos de matéria.

119
Um elétron é equilibrado por um antielétron, ou pósitron. Quando um elétron e
um pósitron se combinam, há um aniquilamento mútuo das duas partículas; não resta
nenhuma massa, que é convertida em energia, na forma de raios gama.
Semelhantemente, um próton e um antipróton se combinam para perder massa e formar
energia; o mesmo farão um nêutron e um antinêutron.
Podemos ter matéria constituída de prótons, nêutrons e elétrons; e antimatéria
constituída de antiprótons, antinêutrons e antielétrons. Nesse caso, se qualquer massa de
matéria se combinar com uma massa igual de antimatéria haverá aniquilamento mútuo e
serão formados raios gama.
Inversamente, a massa pode formar-se a partir de energia, mas jamais como uma
espécie de partícula, apenas. Para cada elétron formado, haverá forçosamente um
antielétron; para cada próton, um antipróton, e para cada nêutron um antinêutron. Em
resumo, quando a energia se transforma em matéria, há também a formação de igual
quantidade de antimatéria.
No entanto, se for assim, onde está a antimatéria que se formou ao mesmo tempo
que a matéria do universo?
A Terra é com certeza constituída inteiramente de matéria (afora vestígios de
antimatéria formada em laboratório ou encontrada nos raios cósmicos). Com efeito,
todo o sistema solar compõe-se de matéria, e com toda probabilidade o mesmo acontece
em toda a unidade galáctica de que somos parte.
Onde está a antimatéria? Talvez haja também unidades galácticas compostas
inteiramente de antimatéria. É possível que haja unidades galácticas e unidades
antigalácticas que, por causa da expansão geral do universo, nunca entram em contato e
nunca provocam aniquilamento mútuo. Como a matéria forma buracos negros, a
antimatéria formará antiburacos negros. Esses dois tipos de buracos negros são em
todos os sentidos idênticos, salvo serem constituídos de substâncias opostas.
Se o universo passou, algum dia, por uma contração, os buracos negros e os
antiburacos negros ter-se-ão formado ainda mais facilmente; e ao prosseguir a
contração, aumentariam as possibilidades de colisão entre dois buracos negros de
natureza oposta e do conseqüente aniquilamento mútuo. Na fusão final houve o maior
de todos os cataclísmicos aniquilamentos mútuos.
A massa total do universo desapareceu, levando consigo o campo gravitacional
que mantém existente o buraco negro e, aliás, também o ovo cósmico. Em seu lugar
ficou uma radiação inacreditavelmente enérgica, a expandir-se para a periferia. Essa
seria a grande explosão.
Algum tempo após a grande explosão, a energia, tornando-se menos intensa
através da expansão, ter-se-ia abrandado o suficiente para novamente formar matéria e
antimatéria — formando, as duas, unidades galácticas separadas por meio de algum
mecanismo que, cumpre admitir, não foi ainda explicado — e o universo em expansão
tomaria forma.
Segundo essa concepção, a grande explosão foi o aniquilamento mútuo da
matéria e da antimatéria, independentemente de o ovo cósmico ter rotação ou não ou de
estar vivo ou morto.
No entanto, não dispomos de indicações da existência de unidades
antigalácticas. Será que, por alguma razão que ainda não compreendemos, o universo
consiste simplesmente de matéria?

120
Poderíamos argumentar que isso é impossível; o universo não pode consistir
simplesmente de matéria porque isso impossibilitaria a grande explosão. Ou poderíamos
pensar numa maneira de explicar a grande explosão, mesmo num universo composto
unicamente de matéria e mesmo que, ao se contrair, aquele universo formasse um ovo
cósmico destituído de rotação e que seria, portanto, um buraco negro morto.
Bem, segundo as equações usadas para explicar a formação dos buracos negros,
o raio de Schwarzschild é proporcional à massa do buraco negro.
Um buraco negro com a massa de nosso Sol tem um raio de Schwarzschild de 3
km; portanto, tem uma largura de 6 km. Um buraco negro com o dobro da massa do Sol
tem largura duas vezes maior — 12 km. Contudo, uma esfera duas vezes mais larga que
outra tem volume oito vezes maior que esta; segue-se que um buraco negro com o dobro
da massa do Sol terá o dobro dessa massa espalhada por um volume oito vezes maior. A
densidade do buraco negro maior será apenas 1/4 da do buraco negro menor.
Em outras palavras, quanto mais massa tiver um buraco negro, maior e menos
denso ele será.
Suponhamos que toda a nossa galáxia, que possui cerca de 100 bilhões de vezes
a massa do Sol, fosse comprimida e transformada num buraco negro. Seu diâmetro seria
de 600.000.000.000 km e sua densidade média seria da ordem de 0,000001 g/cm 3. O
buraco negro galáctico teria um diâmetro 50 vezes maior que a órbita de Plutão e não
seria mais denso do que um gás.
Suponhamos que todas as galáxias do universo, possivelmente em número de
100 bilhões, se transformassem num único buraco negro. Tal objeto, contendo toda a
massa do universo, teria um diâmetro de 10 bilhões de anos-luz e sua densidade média
seria igual à de um gás indescritivelmente tênue.
No entanto, não importa a tenuidade desse gás, a estrutura é um buraco negro.
Suponhamos que a massa total do universo seja 2,5 vezes maior do que
acreditam os astrônomos. Nesse caso, o buraco negro formado por toda a matéria do
universo teria um diâmetro de 25 bilhões de anos-luz, número que coincide com o
diâmetro do universo real em que vivemos (até onde sabemos).
É inteiramente possível, então, que todo o universo seja um buraco negro (como
foi sugerido pelo físico Kip Thorne).
Se for, é bem provável que sempre tenha sido um buraco negro e que sempre o
será. Nesse caso, vivemos dentro de um buraco negro e, se desejarmos saber como são
as condições num buraco negro (desde que ele tenha enorme massa), basta olharmos em
torno.
Ao se contrair o universo, então, poderíamos imaginar a formação de qualquer
número de buracos negros relativamente pequenos (buracos negros dentro de um buraco
negro!) e com diâmetros muito limitados. Contudo, nos últimos segundos antes da
catastrófica contração final, quando todos os buracos negros se fundem num único
buraco negro cósmico, o raio de Schwarzschild salta para fora, cada vez mais longe, até
a extremidade do universo conhecido.
E pode ser que dentro do raio de Schwarzschild haja a possibilidade de explosão.
É possível que, ao se afastar o raio de Schwarzschild bilhões de anos-luz num átomo, o
ovo cósmico, no instante mesmo de sua formação, se dilate para acompanhá-lo e que
isso seja a grande explosão.

121
Sendo assim, poderíamos argumentar que o universo não pode ser aberto,
quaisquer que sejam os indícios atuais, uma vez que ele não pode expandir-se além do
seu raio de Schwarzschild. De alguma forma a explosão terá que cessar naquele ponto e,
então, terá inevitavelmente de recomeçar a contrair-se e começar o ciclo outra vez. (Há
quem acredite que a cada grande explosão comece um universo, em expansão
inteiramente diferente, com diferentes leis naturais).
Porventura o que vemos então, à nossa volta, será o ciclo respiratório
inimaginavelmente lento (dezenas de bilhões de anos de inspiração e outras dezenas de
bilhões de anos de expiração) de um buraco negro de proporções universais?
E pode então suceder que, separados de nosso universo por algum meio que
ainda não podemos vislumbrar, haja muitos outros buracos negros de vários tamanhos,
talvez em número infinito, todos se expandindo e se contraindo, cada qual a seu próprio
ritmo?
E nós estamos em um deles — e, através dos prodígios do pensamento e da
razão, é possível que, de nossa posição num fragmento menor que um grão de pó,
perdidos no recôndito de um desses universos, tenhamos traçado um quadro da
existência e do comportamento de todos eles.

122
Apêndice

NÚMEROS EXPONENCIAIS

Para maior conveniência, os números podem ser escritos como múltiplos de 10.
Assim, 100 = 10x10; 1.000 = 10x10x10; 1.000.000 = 10x10x10x10x10x10; e assim por
diante. Uma maneira abreviada de escrever tais números consiste em indicar o número
de dezenas envolvidas na multiplicação como um pequeno número (“expoente”) no alto
do 10.
Assim, se 100 = 10 x 10, podemos dizer que 100 = 102. Da mesma forma, 1.000
= 10 e 1.000.000 = 106. Verificamos, na verdade, que o expoente é igual ao número de
3

zeros do número maior. Por exemplo, o número


1.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000.000 (1 trilhão de trilhões de trilhões)
tem 36 zeros e pode ser grafado 1036.
2
O sistema
bons motivos exponencial
algébricos paratambém
grafá-loserve
10-2para frações; o 1/1.000
. Igualmente, número 1/100
= 1/10é31/l0
= 10, e-3 háe
6 -6
1/1.000.000 = 1/10 = 10 . Se escrevemos esse número em decimais, o expoente é
sempre uma unidade maior que o número de zeros. Assim, 1/1.000.000 = 0,000001,
havendo cinco zeros à direita da vírgula, de modo que o número exponencial é 10-6. Se
preferirmos contar o zero, geralmente colocado à esquerda da vírgula, o expoente será
igual ao número total de zeros.
Desse modo, 0,00000000000000000000000000000000001 (um trilionésimo de
trilionésimo de trilionésimo) é 10-36.
Se tivermos um número como 6.000.000, ele é igual a 6x1.000.000 ou 6x10 6.
Igualmente, 45.200.000 é igual a 4,52 x 10.000.000 = 4,52 x 107. E 0,000013 é igual a
1,3 x 0,00001 = 1,3 x 10 -5.

123

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