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A partir do momento que a criança chega para o casal estes se tornam pais, e a
relação de maternidade/paternidade se inicia, com todas suas alegrias e desafios. Vale
destacar, que ao aceitar a adoção aquela criança se torna filho legítimo, não existindo a
necessidade de ressaltar que a criança é adotada a todo momento, deve se construir uma
relação de amor e aceitar o filho de forma total.
Max e Dutra (2010) apud Tinoco (2011), aponta que ao colocar suas exigências
sobre o perfil do filho que desejam, muitas vezes aponta que o foco da adoção é a
necessidade de realizar seus desejos do filho ideal, mesmo que de forma inconsciente.
Em alguns casos, é uma tentativa de imitar a família biológica, e assim manter o processo
de adoção como segredo frente aos familiares e sociedade.
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Psicóloga formada pela UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados) – CRP 14/08390-0. Email:
jackeline.talon@gmail.com
Vale destacar que a maioria das crianças que estão à espera de um lar são negras,
e os pretendentes a adoção são brancos, desse modo é preciso revisar as prioridades e
exigências ao preencher o perfil da criança que esperam, e trabalhar as projeções para
aceitar o filho real que está à espera de um lar.
Os prejuízos das crianças abrigadas são muitos, além dos vínculos afetivos com
os cuidadores, envolve tudo o que conhece do mundo: brinquedos, vizinhos, amigos,
cheiros, comidas, comunidade. Se afastar de tudo isso sem ter a certeza do que a espera
faz com que intensos comportamentos de busca sejam ativados. Em um primeiro
momento pode ser difícil aceitar todo o processo, leva um tempo para que seja
internalizado e assimilado todos os acontecimentos vivenciados, é necessário ter um
espaço de escuta para auxiliar na elaboração de todos os sentimentos que a situação trouxe
à tona, desta forma por mais que volte para a família biológica um novo vínculo será
criado, pois a relação foi modificada pelos acontecimentos.
Schofield e Beek (2005) apud Tinoco e Franco (2011) destacam, que para um
desenvolvimento emocional saudável, a criança precisa acreditar que o cuidador está
disponível. Ele deve ser acessível, atento, capaz de identificar as necessidades de proteção
e cuidado, sem ser intrusivo. Assim é formada uma base segura, como denomina
Bowlby(1969/1993), e a criança sente-se livre para explorar, aprender, desenvolver-se e
manejar a ansiedade, contando que pode voltar para o cuidador diante de algum perigo
ou ameaça.
Qualquer ameaça ou risco de perda desse laço gerará uma ação eu vise
preservação. Quanto maior o risco da perda, mais intensa serão as atitudes – agarrar,
chorar, experimentar a raiva, ou intensa aflição, protestar –quanto mais segura a criança
se sentir com a relação mais escassas e amenas serão as reações.
Importante dar voz a criança, pois esse processo de rupturas e mudanças é muito
difícil, gera medos, e incertezas, desse modo a criança vive com fantasias e expectativas,
está sempre a espera. Guarda consigo as memórias boas que viveu até então, e muitas
vezes os seus cuidadores eram bons em alguns momentos e são essas memórias afetivas
que irão cultivar na esperança de que possa voltar a tê-las novamente. O apego a estas
memórias é como uma proteção, e irão levar consigo para nova família, e junto a estas
memórias estarão suas fantasias da família dos sonhos, a família idealizada, aquela dos
contos de fadas que aparecem nas histórias infantis.
Algumas vezes diante da família real o sonho parece ter acabado por não ser aquilo
que imaginou. É nesse momento que podem aparecer os conflitos, se os pais não
estiverem seguros e bem resolvidos quanto a imagem do filho ideal/real essas projeções
podem entrar em atrito e gerar um mal-estar.
Hughes (2014) no diz que muitos cuidadores sentem dificuldades em lidar com as
crianças, questionando sua capacidade de cuidar e acabam atribuindo essa dificuldade a
problemas de comportamento da criança, algumas vezes o sentimento de raiva e
impotência acabam interferindo na relação com a criança, algumas dessas reações só
aumentam a desconfiança e dificuldade de criar vínculos na criança.
Assim, os sentimentos das crianças são ampliados, pois vivenciam muitas perdas
e a falta de acolhimento dos sentimentos faz com que se expressem de forma mais forte
e exagerada, afim de chamar a atenção para si. É comum, as crianças abrigadas serem
rotulados e “diagnosticadas”, queixas de mau comportamentos, agressividade são comuns
nos relatos das cuidadoras.
Quanto maior for a de-privação, mais difícil será fazer com que a criança confie
no ambiente, neste sentido, destaca-se a importância dos pais de sobreviverem aos ataques
de raiva da criança que vivenciou a adoção, pois a raiva somente pode existir nesta quando
o ambiente é confiável.
A mudança de família exige que acriança lide com dificuldades próprias de terem
sido adotadas e de terem ficado institucionalizadas, sendo que a separação da família
consanguínea e o processo de transição de um local de convivência para outro é um
momento permeado de angústias, o medo do novo, do que irá encontrar na nova casa?
Como serão esses pais? Será que serei amado? São muitos os questionamentos que
permeiam o psíquico da criança. Lembrando que por melhor que seja a instituição ela não
possui condições de se dedicar as demandas de todas as crianças acolhidas, Winnicott
ressalta que, a necessidade de atenção do mundo externo é de grande importância no
desenvolvimento da criança.
Um dos medos dos adotantes é da criança rejeita-los e ficar preso na relação com
a família biológica, por este fato tendem a evitar falar do processo da adoção com a
criança e não lhe dão espaço para que essa fale de como era sua vida anteriormente, porém
é necessário que haja momentos para esses diálogos, para que a criança vivencie esse
processo de transição e conheça sua história de maneira total, e assim acolha a família
real desapegando de suas fantasias e construindo sua identidade total, a partir de toda sua
história e trajetória de vida, por mais doloroso que tenha sido é importante que abrir o
diálogo para os questionamentos e dúvidas que a criança trará a respeito dos seus
genitores.
É preciso respeitar a trajetória de vida de cada indivíduo, sejam dos pais ou a
criança, cada um teve suas vivências até se encontrarem e a partir deste encontro juntos
vão construir novos capítulos.
Referências Bibliográficas.
Morelli, Ana B., Comin, Fabio Scorsolini, Santeiro, Tales Viera. (2025) – O “lugar” do
filho adotivo na dinâmica parental: revisão integrativa da literatura. Psic. Clin., Rio de
Janeiro, vol. 27, n. 1, p. 175 – 19.